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Racionalismo

O racionalismo é uma corrente filosófica pertencente ao campo


da filosofia chamado de epistemologia ou teoria do conhecimento. As primeiras
inclinações racionalistas remontam à Antiguidade clássica, mas o racionalismo mesmo
surgiu no fim do Renascimento e ganhou forças na modernidade, com pensadores
como os filósofos René Descartes e Gottfried Wilhelm Leibniz.

As ideias racionalistas opõem-se, no âmbito da teoria do conhecimento, às


teorias formuladas pelos filósofos empiristas, que acreditavam que todo o
conhecimento advinha unicamente da experiência prática do ser humano. Os
racionalistas, por sua vez, admitem que a única fonte do conhecimento é a
racionalidade pura.

Características do racionalismo

Como uma teoria do conhecimento (ramo da filosofia também chamado de


epistemologia e que tenta entender como se forma o conhecimento humano, ou seja,
como o ser humano pode conhecer), o racionalismo defende que a única forma
plausível e aceitável de conhecimento correto do ser humano é a razão e a capacidade
de raciocinar.

Para os filósofos racionalistas, todo o conhecimento que advém da experiência


prática (empírica) deve ser rejeitado, pois é passível ao erro e pode nos enganar. Nesse
sentido, filósofos como o francês moderno René Descartes propõem uma espécie de
ceticismo quanto ao conhecimento proporcionado pela experiência captada pelos
sentidos do corpo.

É a epistemologia o campo filosófico que pergunta como é possível que o ser


humano obtenha conhecimento, e o racionalismo parte da tese de que todo e
qualquer conhecimento que se julgue correto deve partir apenas do raciocínio puro. É
complexo, de início, entender esse conceito de conhecimento puro, mas isso faz
referência à ideia de que o conhecimento deve ser apenas aquele que obtemos por
ideais e raciocínios que surgem em nosso pensamento e só. Tudo aquilo que surge a
partir da experiência que temos com nossos sentidos, ou seja, pela visão, audição,
tato, paladar e olfato, é elemento das impressões. Os racionalistas partem da mesma
tese de que o filósofo grego Platão partia: o conhecimento advindo da experiência
engana.

São considerados filósofos racionalistas modernos o holandês Baruch de


Espinoza, o francês René Descartes e o alemão Gottfried Wilhelm Leibniz. Todos eram
também matemáticos. Espinoza, como os demais e qualquer pensador de seu tempo,
também era um polímata, ou seja, um estudioso de vários tipos de ciências, técnicas e
conhecimento.

Em geral, para entendermos o racionalismo, devemos nos atentar ao tipo de


raciocínio proporcionado pela matemática: um raciocínio abstrato e amparado apenas
na razão e na racionalidade, buscando fugir das aspirações práticas. Até mesmo
a geometria, que lida com formas geométricas, pode ser estudada por alguém que não
possui visão, pois é uma ciência exata baseada em relações numéricas abstratas e leis
geométricas puramente racionais. Podemos perceber, a partir disso, que a essência do
racionalismo consiste em confiar apenas no conhecimento, que, tal como a
matemática, advém única e exclusivamente do raciocínio.

Então, se o conhecimento racional advém única e exclusivamente da razão e


dessa capacidade de o espírito humano pensar abstrata e racionalmente, por que nós
já não possuímos todo o conhecimento que adquirimos ao longo da vida, visto que a
experiência pouco importa? Para responder a essa pergunta, devemos voltar ao que
propôs a mais remota influência dos racionalistas, o filósofo Platão.

Platão era o que chamamos de inatista. Ele acreditava que o conhecimento era
inato ao ser humano (já nascia com ele), mas de uma forma ainda embaçada,
esquecida. O ser humano, por meio do processo de educação, desenvolveria
e redescobriria esse conhecimento escondido em sua memória.

Descartes teceu uma defesa parecida: o conhecimento humano era inato,


habitando o plano racional, o qual qualquer humano minimamente saudável e bem
formado em suas faculdades mentais pode e consegue alcançar. É necessária, para o
filósofo, uma espécie de treino das faculdades mentais para se alcançar tal
conhecimento.

Racionalismo e Renascimento

O racionalismo enquanto escola filosófica epistemológica surgiu apenas no


século XVII. No entanto, o Renascimento (ou Renascentismo), que teria perdurado até
o início da modernidade (século XVI), foi um período muito importante para a
consolidação do racionalismo e também essencialmente racionalista (utilizando essa
palavra em sentido mais amplo).

Os renascentistas buscaram uma ruptura com a profunda submissão do


conhecimento à crença, tipo de postura predominante durante a Idade Média. Eles
também valorizaram o modo de vida e de cultivo do conhecimento filosófico e artístico
dos antigos povos greco-romanos, que desde Platão tinham uma aspiração
profundamente racionalista. Os renascentistas eram racionalistas (lembrando, no
sentido amplo da palavra) por valorizarem o conhecimento racional e a necessidade de
se abandonar as antigas amarras do conhecimento, buscando uma nova forma, mais
aprofundada e racional, de ver o mundo, a filosofia, as artes e as ciências.

Racionalismo moderno

Foi na modernidade, mais precisamente a partir do início do século XVII, que os


ideais racionalistas tomaram corpo e formaram uma das duas principais vertentes
filosóficas da modernidade, ou seja, o racionalismo. A outra vertente epistemológica,
mas completamente oposta ao racionalismo, era o empirismo.
A modernidade contou com o impulso científico proporcionado por pensadores
renascentistas, como Leonardo da Vinci e Nicolau Copérnico, além de teorias
científicas e estudos promissores de pensadores que atravessaram a linha entre o
Renascimento e a modernidade, como o astrônomo Johannes Kepler e o físico e
astrônomo Galileu Galilei. Esse período de transição, na época de Galileu e Kepler,
observou a chamada Revolução Científica e a alta valorização do conhecimento
racional como a única chave para se desvendar os “mistérios” da natureza.

Foi nesse período que surgiram filósofos como René Descartes (1596 – 1650),
Espinoza (1632 – 1677) e Leibniz (1646 – 1717), os três principais pensadores
racionalistas modernos.

Filósofos racionalistas

René Descartes

Filósofo e matemático francês, Descartes é um dos mais influentes pensadores


da modernidade e do racionalismo. Criador do plano cartesiano, a mentalidade
metódica e organizada do pensador o fez propor um método para tornar a análise
filosófica mais clara, objetiva e correta. Descartes afirmou a necessidade de se fugir do
erro e do engano, e o primeiro passo para se chegar a um conhecimento mais preciso
era eliminar o conhecimento advindo da experiência e dos sentidos para caminhar
rumo a um conhecimento mais racional.

À primeira vista, o filósofo deveria duvidar de tudo e de todo o conhecimento


que obteve até então, inclusive duvidar da sua própria existência, fundando assim
o ceticismo cartesiano. Ao duvidar, o filósofo entraria em um processo racional que o
faria perceber que, duvidando, ele estava pensando. Ao constatar que pensa, o filósofo
percebe também que existe. “Penso, logo existo!”, esse é o cogito cartesiano.

Baruch de Espinoza

Filósofo holandês de origem portuguesa e judaica, Espinoza foi um grande


pensador racionalista moderno. Desenvolveu teses acerca da existência objetiva dos
seres, classificando a existência em dois planos distintos, o imanente e o
transcendente. Imanente era tudo o que estava na matéria,
enquanto transcendente era o que estava fora da matéria.

Imanente Adjetivo de dois gêneros

1. Que está inseparavelmente contido na natureza de um ser


ou um objeto; inerente. 2. Filosofia – Que permanece no
âmbito da experiência material possível, agindo na captação
da realidade através do sentido. 3. Tudo o que está na
matéria.

Transcendente Adjetivo de dois gêneros


1. Tudo que excede os limites normais; superior, sublime. 2.
Que transcende a natureza física das coisas; metafísico. 3.
Tudo o que está fora da matéria.

Espinoza desenvolveu uma teoria teológica panteísta que atribuía a Deus a


imanência e a característica de estar presente materialmente em todos os seres. Sua
teoria panteísta lhe rendeu problemas com autoridades religiosas judaicas, e o fato de
ser judeu também lhe rendeu problemas com a Igreja Católica. Espinoza acreditava
que tanto a imanência quanto a transcendência somente poderiam ser conhecidas por
meio do intelecto racional, isto é, até a imanência, que era material, era fruto de
observações intelectuais da razão.

Gottfried Leibniz

Um dos mais complexos teóricos do racionalismo, Leibniz era também


matemático. Na matemática, o pensador ficou conhecido pelo desenvolvimento do
cálculo infinitesimal (na verdade, não se sabe ao certo se essa descoberta pode ser
atribuída a Leibniz ou ao físico Isaac Newton, pois ambos parecem ter descoberto a
mesma coisa separadamente. Eles também brigaram até o fim da vida de Newton pela
paternidade da descoberta).

Em sua filosofia, profundamente influenciada pela matemática, eram os


postulados matemáticos que deveriam coordenar o modo como se estabelece um
pensamento filosófico, sempre guiado pela racionalidade. Como teoria do
conhecimento e também de formação de tudo o que existe, Leibniz desenvolveu um
complexo sistema, chamado monadologia, que explicaria a existência dos diversos
seres como um grupo infinito de mônadas, que se relacionam entre si e com outros
grupos de mônadas. Uma mônada seria a unidade mais elementar de qualquer ser
existente. Conhecer seria como transitar intelectualmente entre o universo das
mônadas.

Racionalismo e empirismo

Um longo e intenso debate foi travado na modernidade entre racionalistas e


empiristas. Enquanto Descartes, Espinoza e Leibniz desenvolviam suas teorias
afirmando que o conhecimento correto somente poderia nascer do intelecto puro,
outros pensadores lançaram ideias completamente opostas. Esses pensadores eram os
empiristas. Os filósofos ingleses Francis Bacon, John Locke e David Hume podem ser
considerados como símbolos maiores do empirismo.
Para os empiristas, todo o conhecimento humano é adquirido por meio da
experiência. Há um papel importante da racionalidade humana em entender e
classificar os dados da experiência, mas até esse raciocínio é desenvolvido por meio da
experiência humana prática e da utilização dos sentidos.

Essa querela da modernidade somente foi resolvida com o filósofo


alemão Immanuel Kant, que anunciou uma espécie de teoria conciliatória, apesar de
pender muito mais para o racionalismo. Segundo Kant, o conhecimento humano era
esse jogo duplo entre intuições e conceitos. Intuições são os dados da experiência
sensível que nos chegam por intermédio dos sentidos do corpo. Conceitos são os
dados intelectuais que nomeiam e classificam os dados empíricos. Portanto, um
depende do outro e sem um desses dois elementos não há conhecimento efetivo.

Fonte: PORFÍRIO, Francisco. Site: UOL Educação. Disponível em:


https://mundoeducacao.uol.com.br/filosofia/racionalismo.htm. Acesso em 27 de mar. 2022.
Sublinhados são meus.

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