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A inovação educativa e os desafios para a educação no século XXI

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Maria Helena Horta


Universidade do Algarve
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A inovação educativa
e os desafios para a
educação no século XXI

Comunicações apresentadas
no 1.º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação
5 e 6 de junho de 2015
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco
A inovação educativa e os desafios
para a educação no século XXI

Comunicações apresentadas no
1.º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação

5 e 6 de junho de 2015
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco
Ficha Técnica
Edição
Instituto Politécnico de Castelo Branco
Av. Pedro Álvares Cabral, nº 12
6000-084 Castelo Branco. Portugal
Título
A inovação educativa e os desafios para a educação no século XXI

Organização
Cristina Pereira e Clotilde Agostinho

Fotografia de capa
Paula Peres

Capa, projecto gráfico e paginação


Rui Tomás Monteiro

ISBN: 978-989-8196-61-3

Comissão Científica
António Pereira Pais, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Ernesto Candeias Martins, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Henrique Teixeira Gil, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Joaquim Armando Gomes Alves Ferreira, Universidade de Coimbra;
Juan de Dios González Hermossel – Universidad de Extremadura;
Gabriela Correia de Castro Portugal, Universidade de Aveiro;
Mª Cruz Sánchez Gómes – Universidad de Salamanca;
Mª José Pinto Lopes Pereira Infante, Instituto Politécnico de Castelo Branco.

Comissão Organizadora
Membros da equipa de coordenação do CeADIn
Ana Cristina Ferreira de Almeida, Universidade de Coimbra;
Ana Rita Santos Silva Martins de Carvalho, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Clotilde Alves Nunes Agostinho, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Cristina Maria Gonçalves Pereira, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Hugo Miguel Pires Ribeiro Pinto, Instituto Politécnico de Castelo Branco.
Estudantes
Ana Luís, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico
Ania Estanislau, Mestrado em Intervenção Social Escolar;
Carina Silva, Mestrado em Gerontologia Social.
Elsa Antunes, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico
Inês Fortunato, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico;
Nuno Santos, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico;
Sofia Caetano, Mestrado em Intervenção Social Escolar;
Stéphanie Farinha, Mestrado em Intervenção Social Escolar.

Secretariado
Ana Gamas, Instituto Politécnico de Castelo Branco.

Revisores científicos dos artigos


Ana Cristina Ferreira de Almeida, Universidade de Coimbra;
António Pereira Pais, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Clotilde Alves Nunes Agostinho, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Cristina Maria Gonçalves Pereira, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Ernesto Candeias Martins, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Gabriela Correia de Castro Portugal, Universidade de Aveiro;
Henrique Teixeira Gil, Instituto Politécnico de Castelo Branco;
Mª Cruz Sánchez Gómes – Universidad de Salamanca;
Mª José Pinto Lopes Pereira Infante, Instituto Politécnico de Castelo Branco.
Índice

Nota de Abertura 1

A ABORDAGEM À LINGUAGEM ESCRITA EM CONTEXTO DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR:


UM INSTRUMENTO ORIENTADOR
Maria Helena Horta 3

A MULTICULTURALIDADE NOS RELATÓRIOS DA PRÁTICA DE ENSINO


SUPERVISIONADA NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES
Maria do Carmo Vieira da Silva 15

AS TIC, AS PRÁTICAS DE ENSINO SUPERVISIONADAS, A INVESTIGAÇÃO


E A INOVAÇÃO: OS BLOGUES EDUCATIVOS & A SEGURANÇA NA INTERNET
Henrique Gil, Vera Caroço e Carina Félix 27

A TRAMA DA CRIAÇÃO DO JARDIM DE INFÂNCIA JOÃO DE DEUS DE BRAGANÇA EM 1915


Luís Castanheira 37

DISEÑO METODOLÓGICO PARA LA PROPUESTA DE POLÍTICAS EDUCATIVAS


IGUALITARIAS CON ALLUMNADO DE PRIMER GRADO DE SECUNDARIA
EN EL ESTADO DE MICHOACÁN
Elva Morales Robles 49

ENSINO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA NÃO MATERNA: CRUZAMENTOS DE TAREFAS


COMUNICATIVAS EM DIDÁTICA DA LÍNGUA E DA LITERATURA
Mª da Graça Sardinha e João Machado 61

ESTADO DA ARTE NA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO:


O CASO DOS ESTUDOS SOBRE DIFICULDADES ESPECÍFICAS DE APRENDIZAGEM
Mª Cruz Sánchez-Gómez e Mª Vitoria Martín-Cilleros 69

EU E OS OUTROS - UM ESTUDO DE CASO SOBRE AS CONCEÇÕES DAS CRIANÇAS


ACERCA DA DIFERENÇA
Liliane Baltazar e Cristina Pereira 79
LIGAÇÕES CRIANÇA/ESPAÇO EM EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA PROMOVER
APRENDIZAGENS SIGNIFICATIVAS
Miguel Castro 95

MOTIVAÇÕES NA ORIGEM DO ABANDONO ESCOLAR – ESTUDO DE CASO


COM JOVENS SINALIZADOS NA CPCJ DE CASTELO BRANCO
Ana Raquel Lourenço 105

NOVOS MODELOS ESTÉTICOS NA EDUCAÇÃO MUSICAL DA CRIANÇA


Susana Maia Porto 115

PARCERIAS EUROPEIAS DE INOVAÇÃO EM EDUCAÇÃO


Margarida Morgado 127

PRÁTICAS DE ESCRITA NA AULA DE ESPANHOL LÍNGUA ESTRANGEIRA:


AS COMPETÊNCIAS COMUNICATIVA E SOCIOLINGUÍSTICA
André Costa, Maria da Graça Sardinha e Paulo Osório 139

SUPERVISÃO PROMOTORA DE MUDANÇA E INOVAÇÃO NA AVALIAÇÃO


DO DESEMPENHO DOCENTE - ESTUDO DE CASO
Graça Figueiredo Monteiro 151

(TOOLS OF MIND) FERRAMENTAS DA MENTE: PROGRAMA DE EDUCAÇÃO


PRÉ-ESCOLAR, DE INSPIRAÇÃO EM VYGOTSKY
Ana Paula Couceiro Figueira 161
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 1

Nota de Abertura
O I Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação (CEPI) foi organizado no âmbito das ati-
vidades do Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento da Infância (CeADIn) que funciona na
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco (ESECB) desde maio de
2014. Subordinado ao tema “ A inovação educativa e os desafios da educação para o séc. XXI”,
este evento teve como objetivo promover o debate e a reflexão entre investigadores, professores e
outros profissionais especialistas nas áreas das ciências sociais e humanas, em torno dos desafios
da educação para o séc. XXI e do papel dos agentes educativos na promoção da aprendizagem e
inovação na escola e outros contextos de desenvolvimento humano. Pretendemos também que
os diplomados pela ESECB, os colaboradores institucionais e os consultores da comunidade do
CeADIn aceitassem o desafio e a oportunidade de apresentar evidências dos seus percursos inves-
tigativos e de boas práticas educativas.
A realização do congresso assentou a sua motivação nos valores e pressupostos fundamentais
que norteiam o funcionamento do CeADIn:

• Construir uma comunidade de aprendizagem e de investigação na área da educação e da psico-


logia pedagógica.
• Permitir que os nossos estudantes sejam co-construtores neste projeto.
• Promover boas práticas, visando o desenvolvimento e a aprendizagem da criança e do ser huma-
no, em geral.
• Assumir a conceção da natureza global e integrada do desenvolvimento e da aprendizagem, o
valor do brincar, de aprendizagens ativas e desafiadoras, a importância do desenvolvimento da
expressão/comunicação, da expressão artística e o papel do Outro na co-construção da indivi-
dualidade e da mudança.

O programa do 1º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação integrou uma apreciável


quantidade de contributos apresentados em formato de conferência, comunicação oral, poster e
workshop, permitindo evidenciar que os pressupostos que norteiam o CeADIn estão na origem de
pesquisas, experiências e reflexões pedagógicas que os participantes aceitaram partilhar a propósito
deste evento.
2 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Com este livro pretende-se reunir uma parte significativa dos trabalhos apresentados em forma-
to de artigo, de modo a promover a sua divulgação mais alargada, contribuindo para a continuida-
de da reflexão sobre a temática central que o orientou o 1º Congresso em Educação, Pedagogia e
Inovação.
Cristina Pereira e Clotilde Agostinho
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 3

A ABORDAGEM À LINGUAGEM ESCRITA EM


CONTEXTO DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR: UM
INSTRUMENTO ORIENTADOR
Maria Helena Horta (hhorta@ualg.pt)
Escola Superior de Educação e Comunicação da Universidade do Algarve

Resumo
Segundo Ríos (2014) não existe consenso entre os educadores de infância no que à linguagem
escrita diz respeito, quer em termos de objetivos a alcançar e de competências a promover nas
crianças, como de que práticas a desenvolver.
Em Portugal existem vários documentos normativos e orientadores para apoio à ação educativa
do educador de infância, entre os quais desatacamos as Orientações Curriculares para a Educação
Pré-Escolar (Ministério da Educação, 1997), a Circular N.º 17/CSDC/DEPEB/2007 e o Projeto
“Metas de Aprendizagem” (Ministério da Educação, 2010). Estes documentos, em termos gené-
ricos, são apenas guias para o educador na condução da sua prática e melhor gestão que, no seu
entender, deve fazer do currículo, designadamente da abordagem que faz à linguagem escrita no
seu dia-a-dia e nenhum deles determina ou condiciona o modelo pedagógico a ser adotado.
Foi no desenvolvimento de um estudo, desenvolvido na região do sotavento algarvio, com vista à
obtenção do grau de Doutor pela Universidade de Huelva (2015), que senti a necessidade de cons-
truir uma grelha de observação com o objetivo de conhecer:

• O modo como era feita a organização e a gestão do ambiente educativo nas salas de atividades
dos Jardins de Infância envolvidos (7 no total), com enfoque na linguagem escrita;
• A intervenção educativa da educadora relativamente à abordagem feita à linguagem escrita.
4 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Apresento em seguida o instrumento que poderá constituir-se como uma ferramenta útil e,
quiçá, orientador da prática educativa de cada educador, no que à abordagem da linguagem escri-
ta diz respeito, em contexto de educação pré-escolar, exemplificando cada uma das partes que o
constituem.

Palavras-chave: Linguagem escrita; educação pré-escolar; práticas educativas; educador reflexivo.

Abstract
According Ríos (2014) there is no consensus among kindergarten teachers in the written lan-
guage is concerned, in terms of objectives to be achieved and skills to facilitate in children, as that
practice to develop.
In Portugal there are several regulatory and policy documents to support the education of
pre- school teacher action, including the Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar
(Ministério da Educação, 1997), the Circular N.º 17/CSDC/DEPEB/2007 and the Projeto “Metas
de Aprendizagem” (Ministério da Educação, 2010). These documents, in general, are only guides
for the teacher in the conduct of practice and better management which, in their view, should do
the curriculum, in particular the approach that makes the written language in their day- to- day and
none of them determines or affects the pedagogical model to be adopted.
It was in the development of a study carried out in the Eastern Algarve region, in order to obtain a
PhD. from the University of Huelva (2015), which I felt the need to construct an observation grid
in order to meet:

• The way was made the organization and management of the educational environment in kin-
dergartens involved (7 in total), with a focus on written language;
• The educational intervention of the educator to the approach made the written language.

Believing in the school as a “ learning community “ (Day, 2001), in which educators and teachers
should be provided with intervention strategies to be allowed knowledge of a micro and mesosys-
tem environment (Bronfenbrenner, 2002), so they can act accordingly, and recognize the importan-
ce of a teacher as reflective practitioner, whose capacity gives it power and provides opportunities
for their own development (Oliveira e Serrazina, 2002), I believe that the application of this instru-
ment for each educator can constitute itself as a useful tool and, perhaps, guiding their own educa-
tional practice , as the written language approach concerns in the context of pre-school education.

Keywords: Written language; pre-school education; educational practice; reflective educator.

Introdução
Tal como Pokorny (2011), também defendo que os primeiros anos de vida são os mais impor-
tantes na formação das crianças. E é precisamente nestes primeiros anos de vida, em contexto de
jardim de infância, que a criança necessita de tempo para brincar, devendo esse tempo ser conside-
rado como a atividade mais importante que ocorre na sala de atividades (Armstrong, 2008).
Armstrong (2008) explica ainda que esse tempo de brincadeira, a que designa de «processo de
liberdade», juntamente com o respeito e com a atenção dos educadores pelas ideias, pelos desejos
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 5

e pelos resultados das crianças enquanto brincam, serve para promover um ambiente de aprendi-
zagem de confiança, entusiasmo e descobertas, o que acredito ser possível através da metodologia
do trabalho de projeto.
Descobertas que se espera que aconteçam, de forma natural e espontânea, também em relação
à linguagem escrita, através de um educador que assume o seu papel como um guia experimentado,
no desenvolvimento de um ambiente comunicativamente estimulante. Contudo, essas competên-
cias, apesar de ensinadas, nem sempre são possíveis de serem adquiridas. Apenas as desenvolve
quem se assume como um profissional reflexivo, que permanentemente se questiona e indaga
sobre a sua própria profissionalidade, buscando incessantemente respostas às suas permanentes
questões.
Em contexto de jardim de infância, é fundamental que o educador seja, por um lado, um provo-
cador e, por outro, um mediador. Um provocador, na medida em que promove situações desenca-
deadoras de conflito cognitivo, em que as crianças são impelidas a colocar questões, experimentar,
organizar-se e reorganizar-se. Um mediador entre a criança e a linguagem escrita porque apoia as
crianças na explicitação do que fazem, ajudando a clarificar as situações menos claras e a evoluir
nas suas concepções precoces.
É por meio da experiência, da observação e da exploração do seu ambiente que a criança constrói
o seu conhecimento, modifica situações e concepções, reestrutura os seus esquemas de pensamen-
to, interpreta e busca soluções para factos novos, desenvolvendo assim competências cognitivas.
Nesse sentido, considero ser dever do educador de infância, que têm responsabilidades no pro-
cesso de aprendizagem e desenvolvimento das crianças com quem trabalham, «construir paralela-
mente saberes didáticos e transversais bastante ricos e profundos para equipar o olhar e a reflexão
sobre a realidade» (Perrenoud, 2008, p. 17).

A linguagem escrita na educação pré-escolar


Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999) explicam-nos que as crianças em idade pré-escolar
possuem muitos conhecimentos sociais sobre a linguagem escrita, o que as leva a afirmar que as
crianças nesta idade são letradas antes de serem alfabetizadas.
A aprendizagem da linguagem escrita é alicerçada numa construção social que ocorre, no jardim
de infância, em interação com crianças e com um educador que intencionalmente intervém nesse
sentido.
Tal como todas as outras aprendizagens do mundo social que a criança realiza, em contexto de
educação pré-escolar, também a linguagem escrita deve emergir dos interesses das próprias crianças
que a devem apreender como uma necessidade, devendo o educador, para isso, transmitir-lhe não
apenas o gosto por aprender, mas também o interesse em querer saber mais, tomando a linguagem
escrita como uma “porta aberta” para o mundo da cultura, num processo de aprendizagem que se
pretende ao longo da vida.
Já Vygotsky (1991) nos esclarecia no sentido de uma orientação funcional de produção de texto
escrito em situação de alfabetização e que facilmente adaptamos ao contexto da educação pré-es-
colar, enquanto nível educativo onde apenas se desenvolve uma abordagem à linguagem escrita, tal
como o descrevemos ao longo deste capítulo, tomando a metodologia de trabalho de projeto como
referencial à atuação dos educadores de infância:

• O processo educativo tem que ser organizado de modo a que a escrita se torne necessária à
criança;
6 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

• A escrita deve ter significado para a criança, despertando nela uma necessidade intrínseca e que
deve ser incorporada numa tarefa necessária e relevante para a vida;
• A escrita deve ser “ensinada” naturalmente, assumida como um momento natural no desenvol-
vimento das crianças e não como um treino imposto de fora para dentro.

Numa alusão a um estudo apresentado pelo Conselho Nacional de Educação, no final dos anos
90 do século XX, em que foi manifesto o deficiente uso que os portugueses fazem da escrita, em
contextos da sua vida quotidiana, Niza (1997) sublinha «a necessidade e a urgência de conjugar
esforços para o ensino e aprendizagem da linguagem escrita nos jardins de infância e nos primeiros
anos da Educação Básica» (p. 341).
Sabemos, tal como nos refere Day (2001, p. 293), que a academia continua a ocupar uma po-
sição-chave determinante, a partir da qual pode (e deve) potencialmente promover, sustentar e
ampliar os contextos que encerram, simultaneamente, um desafio e uma estratégia de apoio, atra-
vés da investigação que está ao nosso serviço para nos informar, sendo esta inerente ao próprio
desenvolvimento. Acrescenta ainda que
Os formadores de professores são, de certo modo, interventores que tentam desenvolver as
questões consideradas pelos professores e pelas escolas como relevantes para as suas necessidades,
investigar respostas para essas questões de forma colaborativa e colocar o ónus da acção nos pró-
prios professores e nas escolas.
Todavia, tal como afirmámos ao longo do capítulo, e adotando as palavras de Perrenoud (1993),
é necessário preparar os professores para funcionar no “mundo real”. Apesar de pretendermos
educadores curiosos, ativos, reflexivos, investigadores e cooperantes, necessitamos, essencialmente,
de educadores que centrem as suas práticas e, designadamente, o seu constructo e desenvolvimento
curricular, na criança.
Necessitamos de educadores que, na posse dos conhecimentos teóricos, provindos da sua for-
mação inicial, bem como na procura constante de dados científicos e didáticos atuais oriundos da
investigação, entendam que é «essencial dispor do tempo e do espaço necessários para desenvolver
a atividade pedagógica (Jensen, 2013, p. 22).
É desejável que, cada um no seu contexto próprio possa melhorar passo a passo a relação edu-
cativa que constitui a base das aprendizagens com e para as crianças, confiando nelas e no seu po-
tencial e procurando alargar o mais possível as suas oportunidades de se exprimirem em múltiplas
linguagens (Balaguer, 2014).
As crianças precisam de tempo, do seu tempo, para fazerem descobertas, para construir as suas
aprendizagens, designadamente sobre a linguagem escrita, apoiadas por um educador que lhes
serve de «modelo escritor», ao mesmo tempo que se preocupa em criar, organizar e manter um
ambiente «comunicativamente estimulante» na sua sala de atividades.
Do ponto de vista pedagógico, não é para nós importante saber se a criança adquiriu uma
determinada competência no tempo “certo”. Trata-se, essencialmente, de aproveitar esse tempo
educativo para valorizar e apoiar a individualidade de cada criança, bem como os seus processos de
desenvolvimento e educação (Beller, 2013).
Assumimos que «a criança está no centro da ação pedagógica e é necessário ajudá-la a ir mais
longe, à medida que descobre e cultiva toda e cada uma das suas capacidades» (Balaguer, 2014, p. 41).
A finalidade e função pedagógica de um educador, tal como o descrevemos, é estimular a criança
respeitando o seu estádio de desenvolvimento individual, tomando em consideração as suas com-
petências e interesses, realmente observáveis e tentando descortinar os “escondidos”, nos diferen-
tes domínios do desenvolvimento, em particular na aprendizagem da linguagem escrita.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 7

Contextualização metodológica
Inicio este ponto com as palavras de Anguera (1989, p. 19): «A ciência começa com a obser-
vação», acrescentando ainda que, no âmbito das ciências humanas, a observação consiste no mais
antigo e no mais moderno método de recolha de dados.
No entanto, ao longo do tempo, o sentido atribuído à observação tem vindo a ser alterado. A
emergência do paradigma qualitativo-interpretativo, bem como o desenvolvimento das ciências so-
ciais, vieram contrariar a hegemonia do paradigma positivista, em que o ato de observar significava
recolher dados de forma neutra e distanciada, através da aplicação de instrumentos estruturados. O
ato de observar passou a integrar o próprio observador, entendido este como o primeiro e último
instrumento de observação, rejeitando-se a ambição de neutralidade e distanciamento (Rodrigues,
2001).
Ainda segundo a mesma autora, foi a verificação da impossibilidade do isolamento laboratorial
das variáveis que fez aceitar a inevitabilidade e a premente necessidade da intervenção, da partici-
pação, da implicação do observador na elaboração do seu modelo de análise em construção e na
consequente interpretação dos dados recolhidos no processo de observação.
Neste sentido, concorre também a ideia de Anguera (2003), segundo a qual esta autora nos
explica que a metodologia observacional, que se desenvolve em contextos naturais ou habituais –
como é o caso de uma situação educativa – consiste num procedimento científico que destaca a
ocorrência de comportamentos percetíveis, para que se possa proceder ao seu registo e posterior
análise – tanto qualitativa como quantitativa – mediante um instrumento adequado e parâmetros
convenientes. Estes comportamentos, pela sua espontaneidade ou frequência com que acontecem,
dão ênfase, de forma natural, a todos os elementos que se querem destacar como forma de alcançar
os objetivos delineados.
Neste estudo, constitui-se como opção a metodologia observacional, considerando que a mes-
ma tem por objeto de estudo «o indivíduo (perspetiva ideográfica) inserido num determinado con-
texto» (Prudente et al., 2004, p. 51) .
Uma vez que a observação nos permite registar a realidade objetivamente por forma a analisá-la,
a delimitação dos objetivos torna-se necessária e tem a primordial função de delimitar a parcela da
realidade que nos interessa estudar.
Como tal, antes de estabelecer as categorias deste instrumento de observação, tive em conta os
seguintes objetivos para esta fase da investigação:

a) Conhecer o modo como era feita a organização e gestão do ambiente educativo com enfoque
na linguagem escrita;
b) Conhecer a intervenção educativa da educadora relativamente à abordagem feita à linguagem
escrita.

Como forma de alcançar os objetivos por delineados, foi eleita a observação direta, nomea-
damente uma observação (considerada) participante, de envolvimento tendencialmente passivo e
aberto (Spradley, 1980; Patton, 1990; Edwards & Skinner, 2009), porque, de alguma forma, houve a
participação na vida do grupo estudado, e a obtenção dos dados realizou-se mediante um contacto
direto com o mesmo (Bogdan e Biklen, 1994; Estrela, 1994; Anguera, 2003; Coutinho, 2011).
Foi ainda uma observação ocasional e naturalista, caracterizada por ser feita de forma direta e
algo distanciada (Estrela, 1994), estando consciente de que, num estudo de caso, ao longo da obser-
vação, nem sempre é possível manter-se um papel completamente constante em termos da relação
observação/participação (Yin, 2005, 2010).
8 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Construção da grelha de observação


Foi após a análise de conteúdo e a categorização comparativa dos dados, obtidos através de
entrevista, que foi possível construir a grelha de observação utilizada nas diferentes sessões de
observação, para recolha de dados.
Foi opção intencional a construção de um instrumento organizado pelo sistema de categorias.
Nas palavras de Anguera (2003) trata-se de uma construção, por parte do observador, que permite
dispor, em sentido figurado, de uma espécie de recetáculos ou moldes, que são elaborados a partir
de duas componentes: da realidade (que se conhece) e de um quadro teórico que a suporta.
Além disso, a diversidade de situações suscetíveis de serem observadas no comportamento edu-
cativo e pedagógico obriga-nos a prescindir de instrumentos estandardizados (sendo que também
não tive conhecimento de nenhum que respondesse aos objetivos do estudo) e, pelo contrário, a
dedicar o tempo necessário à construção de um ad hoc, de acordo com as finalidades da investiga-
ção (Prudente et al., 2004).
As categorias foram cuidadosamente definidas, por forma a contemplar todas as suas matrizes.
Tais categorias deram origem a diversas subcategorias correspondentes, sendo cada uma delas
acompanhada de vários exemplos ilustrativos (Anguera, 2003; Coutinho, 2011).
Passaremos a explicar de seguida a grelha de observação, que constitui o cerne deste artigo.

Temas Categorias Subcategorias


Organização Presença da linguagem Suportes escritos existentes na sala
e gestão do escrita na sala Introdução de novos ou a substituição dos suportes escritos existentes na sala
ambiente (periodicidade)
educativo Introdução de novos ou a substituição dos suportes escritos existentes na sala
(em negociação com as crianças)
Utilização de suportes escritos nos espaços e períodos de brincadeira livre
das crianças
Formas de linguagem escrita Diversidade de funções associadas aos suportes escritos da sala
presentes na sala Utilização dos suportes de escrita nas rotinas do dia-a-dia
Espaços para a exploração Existência de um espaço próprio para a exploração/produção de escrita
da linguagem escrita Utilização/valorização do espaço pelas crianças
Locais da sala onde se explora a funcionalidade da linguagem escrita
Materiais existentes Tipos de suportes/materiais de produção escrita
no espaço da escrita Suportes/modelos de escrita
A intervenção Atitude da educadora Apoio e incentivo dado às crianças nas suas explorações e tentativas de escrita
educativa
da educadora Estratégias/ Propostas de realização de atividades de registo escrito
/atividades promovidas Espontaneidade do registo escrito das vivências das crianças
Realização de atividades em que as crianças veem utilizar a escrita com diferentes
objetivos
Atividades resultantes das vivências de cada criança/grupo
Tipologia das atividades Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências visuomotoras
e visuopercetivas
Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências metalinguísti-
cas – consciência fonológica
A escrita pelas crianças Participação das crianças na escolha e/ou construção dos registos escritos expos-
tos na sala
Autonomia e iniciativa das crianças para utilizarem a escrita na realização das suas
tarefas
Explorações e tentativas de escrita
Envolvimento e participação das crianças nas atividades de escrita
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 9

Como se pode observar, pela leitura da grelha, foram definidas oito categorias, quatro para cada
um dos dois temas definidos:

1. Organização e gestão do ambiente educativo, que compreende as categorias – “Presença da


linguagem escrita na sala”; “Formas de linguagem escrita presentes na sala”; “Espaços para a
exploração da linguagem escrita”; e “Materiais existentes no espaço da escrita”.
2. A intervenção educativa da educadora, que engloba as categorias – “Atitude da educadora”;
“Estratégias/atividades promovidas”; “Tipologia das atividades”; e “A escrita pelas crianças”.

Passamos agora a apresentar cada uma das categorias, de forma individualizada, com as respe-
tivas subcategorias que lhes estão agregadas, bem como os exemplos ilustrativos para cada uma
delas.
Na categoria “Presença da linguagem escrita na sala”, despontaram as subcategorias: ‘Suportes
escritos existentes na sala’ (localização, estado de conservação, acessibilidade à criança, qualidade
do registo gráfico – tipo de letra, cor, ilustração, clareza de conteúdo – e qualidade estética); ‘In-
trodução de novos ou substituição dos suportes escritos’ (periodicidade – com que regularidade
os registos são substituídos); ‘Introdução de novos ou substituição dos suportes escritos existentes
na sala’ (em negociação com as crianças – é solicitada e valorizada a sua opinião); ‘Utilização de
suportes escritos nos espaços e períodos de brincadeira livre das crianças’ (nos diferentes espaços
organizados da sala: nomeadamente jogos, expressão plástica, casinha, entre outros).
A categoria “Formas de presença da linguagem escrita presentes na sala” suportou duas sub-
categorias: ‘Diversidade de funções associadas aos suportes escritos da sala’ (registos de vivências,
registos de histórias, projetos e atividades desenvolvidos/em desenvolvimento, cartazes, avisos,
etiquetas de material, nomes das crianças, nomes dos espaços e títulos dos registos, entre outros);
e ‘Utilização dos suportes de escrita nas rotinas do dia-a-dia’ (mapa de tarefas, mapa do tempo e
mapa de presenças).
A terceira categoria, “Espaços para a exploração da linguagem escrita” comportou as seguintes
subcategorias: ‘Existência de um espaço próprio para a exploração/produção de escrita’ (espaço
organizado e destinado à exploração de tentativas de escrita por parte das crianças); ‘Utilização/
valorização do espaço pelas crianças’ (utilização espontânea do espaço, por sugestão da educadora,
frequência, rotatividade, individualmente, a pares, por exemplo); e ‘Locais da sala onde se explora a
funcionalidade da linguagem escrita’ (como biblioteca, mesas e espaço da casinha).
Continuando, a categoria seguinte “Materiais existentes no espaço da escrita”, deu origem às
subcategorias: ‘Tipos de suportes/materiais de produção escrita (computador, impressora, máqui-
na de escrever, quadro grande, quadros individuais, lápis, borrachas, canetas, cadernos individuais e
folhas, entre outros); e ‘Suportes/modelos de escrita’ (por exemplo, ficheiros de letras, ficheiros de
palavras, imagem associada à palavra, revistas, jornais, panfletos).
Na categoria “Atitude da educadora”, as subcategorias definidas foram: ‘Apoio e incentivo dado
às crianças nas suas explorações e tentativas de escrita’ (a educadora dirige-se à criança incentivan-
do-a a escrever, expõe as tentativas de escrita das crianças, valoriza-as perante o grupo e dá resposta
às suas solicitações, além de outros aspetos); ‘Proposta de realização de atividades de registo escrito’
(a educadora faz propostas de atividades que impliquem a escrita por parte das crianças, incentiva-
-as a escreverem conforme sabem, escreve à frente das crianças, lê o que escreveu e acompanha a
leitura com o dedo, por exemplo); e ‘Espontaneidade do registo escrito das vivências das crianças’
(a educadora, espontaneamente, regista as vivências das crianças).
Na categoria “Estratégias/atividades promovidas” foram constituídas as seguintes subcatego-
rias: ‘Realização de atividades em que as crianças viram utilizar a escrita com diferentes objetivos’
(caso do registo das vivências do fim de semana, do registo espontâneo de vivências, do registo de
10 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

uma história, do registo de vivências de grupo e do título da atividade); e ‘Atividades resultantes das
vivências de cada criança/grupo’ (os registos escritos das vivências das crianças são posteriormente
explorados por estas e/ou pela educadora).
À penúltima categoria “Tipologia das atividades”, pertenceram duas subcategorias: ‘Atividades
direcionadas para o desenvolvimento de competências visuomotoras e visuopercetivas’ (nomea-
damente treino do traço/grafismos, da escrita, de letras, cópia de frases, de palavras, de letras; e
reconhecimento da grafia das letras constituintes das palavras); e ‘Atividades direcionadas para o
desenvolvimento de competências metalinguísticas – consciência fonológica’ (como trava-línguas,
lengalengas, som das letras, início ou terminação das palavras, rimas, adivinhas, nome das letras,
consciência da palavra, consciência silábica e reconhecimento de palavras começadas pela mesma
letra).
Por fim, a última categoria “A escrita pelas crianças” compreendeu quatro subcategorias: ‘Par-
ticipação das crianças na escolha e/ou construção dos registos expostos na sala’ (registo gráfico
nos registos escritos elaborados pela educadora e imitação da escrita da educadora, por exemplo);
‘Autonomia e iniciativa das crianças para utilizarem a escrita na realização das suas tarefas’ (as
crianças, espontaneamente, fazem uso da escrita nas suas diferentes atividades, livres ou orienta-
das); ‘Explorações e tentativas de escrita’ (tais como, tentativas de escrita de forma espontânea por
parte das crianças, reconhecimento da palavra em contexto – o próprio nome, o nome dos colegas
– a escrita do seu nome e/ou dos colegas – com ou sem recurso a modelo); e ‘Envolvimento das
crianças nas atividades de escrita’ (interesse demonstrado pelas crianças nas atividades relacionadas
com a linguagem escrita).
Todas estas categorias e subcategorias foram definidas à priori, de forma exaustiva, mas cons-
truídas de forma aberta e flexível de forma a possibilitarem a inclusão de novos dados, caso tal
fosse necessário no processo de observação, o que não se veio a verificar.
Após a sua construção, contei com o apoio de dois ‘juízes externos’ e ainda de uma especialista
na área da educação pré-escolar, como forma de validação do instrumento, cujos contributos se
revestiram de especial importância e pertinência para a elaboração do mesmo.
Após este processo, o instrumento foi submetido à Direção-Geral de Inovação e Desenvolvi-
mento Curricular (Ministério da Educação), por forma a corresponder aos requisitos oportuna-
mente explicitados. Apenas após a aprovação, por parte desta entidade, do instrumento em causa,
foi combinado com as protagonistas os períodos em que iriam ser realizadas as observações.

Realização das observações e recolha dos dados


Se tivermos em conta o tempo que se torna necessário para realizar uma análise de conteúdo
que seja “precisa e operacional” (Bardin, 1995), a somar ao período de espera entre a construção
do instrumento e a sua aprovação por parte daquela entidade, facilmente se chega à compreensão
de que as sessões de observação – a serem realizadas no mesmo ano letivo em que foram efetuadas
as entrevistas – foram concretizadas a partir do mês de maio (do ano letivo de 2011/2012).
As sessões de observação possíveis de serem concretizadas, foram duas para cada uma das pro-
tagonistas e ocorreram entre os meses de maio e julho do ano letivo de 2011/2012.
À exceção de uma das protagonistas, que no seu segundo momento de observação solicitou à
investigadora que o mesmo se desenvolvesse no período da tarde (dados os seus objetivos de ação
educativa), todos eles ocorreram no período da manhã, altura em que se desenvolve a maioria das
atividades letivas orientadas por parte dos educadores de infância – sensivelmente entre as 9h00 e
as 12h00 (período entre a entrada das crianças na sala de atividades e o almoço, com um pequeno
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 11

intervalo para o recreio de, sensivelmente, quinze a vinte minutos).


Tal como o descrito, a duração das sessões de observação, na sua maioria, foi de três horas cada
e assenta-se a justificação para a mesma nos factos que a seguir se apresentam:

• Considero que a linguagem escrita tem uma dimensão transversal no currículo e, como tal, a sua
presença na sala de atividades é constante e permanente;
• Uma observação reduzida poderia causar uma maior reação induzida por parte do observado –
neste caso, as educadoras – enquanto se acontecesse num período mais longo (no decorrer da
manhã) mais facilmente se poderia captar a naturalidade das suas atitudes e atos educativos;
• A presença da investigadora durante todo o período da manhã configurou-se como mais natural
do que se acontecesse apenas numa parte da mesma;
• Em certa medida, crê-se que a presença da investigadora, de uma forma mais continuada, evitou
que a educadora pudesse preparar a sua ação fazendo aparecer elementos e processos não usuais
na sua prática, expressamente para a observação;
• A observação não se baseou apenas em elementos estáticos, mas também em processos dinâmi-
cos – estes últimos apenas visíveis em observações mais longas.

Embora consciente da necessidade de treino para a arte da observação, como investigadora – na


sua fase exploratória (Anguera, 2003) – bem como da importância de um pré-teste feito ao instru-
mento de avaliação, no sentido de perceber se o mesmo respondia aos objetivos da observação,
não foi possível, por falta de tempo útil, testar o instrumento ou sequer a perspicácia em termos de
observação, pelo que apenas contei com a minha experiência como supervisora, bem como com o
conhecimento que detenho do contexto observado, enquanto educadora de infância.
Anguera (2003) também chama a atenção para algumas tendências e dificuldades que podem
advir do processo de observação, enquanto método de recolha de dados, aspetos a que tentei dar
resposta, por forma a evitá-los, da melhor forma possível:

i. A reatividade por parte dos observados. Neste aspeto, tentei ser o mais natural possível em
todas as observações: todas as educadoras explicaram às crianças qual seria o meu papel dentro
da sala de atividades e tentei sempre interagir com estas para que aceitassem a minha presença
no seu quotidiano de jardim de infância. Além disso, esforcei-me por não interferir no normal
desenvolvimento da atividade educativa por parte das educadoras, sendo que estas, no decorrer
da sua ação, dirigiam-se-me, de forma espontânea, para elucidar acerca do que estavam a apre-
sentar, em forma de propostas, ao grupo de crianças ou ainda para me contextualizar acerca de
alguma reação por parte de alguma criança.
ii. As expectativas por parte do observador. Talvez este tenha sido o conspecto mais exigente nas
sessões de observação. Tínha a grelha de observação previamente construída, mas senti que este
foi o aspeto em que mais me esforcei no sentido de ser o mais rigorosa e isenta possível, pois
muito naturalmente se formam expectações em relação aos diferentes contextos de observação.
iii. Tendências e falhas de carácter técnico. Já tive oportunidade de enunciar as limitações em ter-
mos de sessões temporais de observação, pelo que assumo que possa ter havido imperfeições e/
ou omissões no processo de recolha de dados. No entanto, investi bastante no preenchimento
da grelha de observação por construída, tendo o cuidado de responder a todas as suas categorias
nos diferentes momentos de recolha de dados. Os itens foram apresentados de forma clara e
precisa, a mais detalhada possível, por forma a evitar erros de preenchimento (Estrela, 1994).
12 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Conclusões
É na pessoa do educador, enquanto ator social, técnico, profissional reflexivo, mestre e artesão
(Paquay, 1994), que assenta o modo como vai conceber, planificar e desenvolver a sua intenciona-
lidade educativa, numa gestão curricular, que se pretende integrada e sustentada numa reflexão na
e sobre a prática.
Na verdade, a diversidade das características pessoais e dos diferentes percursos pessoais, profis-
sionais, escolares e de formação das protagonistas, veem-se refletidas no seu pensamento, discurso
e modo de atuar, o que nos leva a considerar o educador como um todo, no desenvolvimento das
suas práticas, porque «são os seus selfes que dão significado ao sentido do ato de ensino e aprendi-
zagem» (Day, 2001, p. 315).
É também na organização e gestão do ambiente educativo que as educadoras promovem, pro-
porcionando um espaço apropriado para a exploração da linguagem escrita, com materiais diver-
sificados e apresentando propostas desafiadoras e motivantes para as crianças, que as atitudes de
apoio e de estímulo ganham consistência, com vista à evolução das suas concepções precoces, num
ambiente que se pretende «comunicativamente estimulante».
Cada educadora, como profissional que valoriza os conhecimentos das crianças nesta área, pro-
porciona uma sensibilização à escrita para que as crianças se consciencializem de determinadas
características desta forma de linguagem e que adota o papel de «modelo escritor» e de mediador
entre as crianças e o escrito, incentivando-as à reflexão sobre este tipo de linguagem. Note-se,
porém, que algumas delas partilham a convicção de que o tempo no jardim de infância é o tempo
privilegiado para brincar, em que qualquer educador deve ter em atenção a motivação intrínseca da
criança, sendo o aspeto lúdico o referencial da sua atuação (Horta, 2007).
Acreditando na Escola como uma «comunidade de aprendizagem» (Day, 2001), em que os edu-
cadores e professores devem ser dotados de estratégias de intervenção para que lhes seja permi-
tido o conhecimento de um ambiente micro e mesossistémico (Bronfenbrenner, 2002), para que
possam atuar em conformidade, além de reconhecer a importância de um educador como práti-
co reflexivo, cuja capacidade lhe confere poder e proporciona oportunidades para o seu próprio
desenvolvimento (Oliveira e Serrazina, 2002), considero que a aplicação deste instrumento por
cada educador poderá constituir-se como uma ferramenta útil e, quiçá, orientadora da sua própria
prática educativa, no que à abordagem da linguagem escrita diz respeito, em contexto de educação
pré-escolar.

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Legislação:

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Direção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular.
14 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 15

A MULTICULTURALIDADE NOS
RELATÓRIOS DA PRÁTICA DE ENSINO
SUPERVISIONADA NA FORMAÇÃO
INICIAL DE PROFESSORES
Maria do Carmo Vieira da Silva (mcvs@fcsh.unl.pt)
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
Faculty of Social and Humanity Sciences of Universidade Nova de Lisboa
CICS.NOVA - Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais
Interdisciplinary Centre of Social Sciences – CICS.NOVA

Resumo
Os problemas relacionados com as questões da multiculturalidade têm sido objeto de temáticas
abordadas por estudantes universitários da formação inicial de professores da Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, aquando da sua prática de ensino supervisio-
nada nas escolas, durante o segundo ano do respetivo mestrado de ensino. A escolha desta temática
poderá dever-se ao facto de, no primeiro ano dos mestrados de ensino, os estudantes frequentarem
a unidade curricular de Educação, Currículo e Multiculturalismo, por nós lecionada e, de algum
modo, se mostrarem mais sensibilizados para os problemas colocados pela diversidade cultural dos
alunos nas escolas. Nesta comunicação propomo-nos apresentar alguns destes relatórios, elabora-
dos sob a nossa orientação científica e por nós escolhidos por apresentarem abordagens diferentes
sobre a temática, e refletir sobre as estratégias utilizadas, as inovações introduzidas e os resultados
obtidos junto dos alunos. Consideramos da maior pertinência esta disseminação como forma de
sensibilização e de motivação para a abordagem desta temática por outros docentes.

Palavras-chave: multiculturalidade; relatórios da prática de ensino supervisionada; formação ini-


cial de professores.
16 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
The problems related with multiculturalism have been approached by college students of the
Faculty of Social and Humanity Sciences of the New University of Lisbon in their teachers’ initial
training during supervised teaching practices in schools in the second year of their teaching master.
Their preference for this theme may be due to the fact that, in the first year of their master, the
students attend to a course named Education, Curriculum and Multiculturalism, taught by us, and
also because they seem to be more aware of the problems raised by students’ cultural diversity
in schools. In our communication we propose to present some of these reports, prepared under
our scientific supervision and chosen by different approaches, and reflect on the strategies used,
innovations introduced and results achieved. We consider the sharing of these reports of great
relevance as a way to sensitize and motivate other teachers for this approach.

Keywords: multiculturalism; stage reports; teachers’ initial training

Introdução
A abordagem às questões da multiculturalidade surge, de um modo geral, quase sempre associa-
da a contextos sociais e educativos onde a presença de grupos com nacionalidades e ascendências
étnicas diversas se faz sentir. Nestes estudos, o foco da investigação aparece muitas vezes associado
a contextos escolares de segundo e terceiro ciclos do ensino básico o que, mesmo extrapolando,
pode indiciar que os níveis de ensino do jardim-de-infância, primeiro ciclo e ensino secundário não
apresentam problemas tão significativos a nível da relação entre pares, entre professor aluno e vice-
versa, e na relação escola-família-comunidade.
Contudo, a realidade não é esta, sobretudo no primeiro ciclo, a que se reportam os nossos pró-
prios estudos de investigação dos finais dos anos oitenta e da década de noventa do séc. XX, assim
como os que temos supervisionado, quer a nível de dissertações de mestrado em Ciências da Edu-
cação, quer nos Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada (PES). Na verdade, e relativamente
ao ensino secundário, os estudos também não são tão numerosos dado o carácter de ensino não
obrigatório, até 2012, e dado o forte carácter científico e teórico deste ciclo de estudos tendo em
vista a preparação dos alunos para os exames nacionais e para o prosseguimento de estudos. De sa-
lientar, igualmente, o carácter seletivo da anterior não obrigatoriedade do ensino secundário, o que
fazia com que o nono ano de escolaridade, ano terminal do ensino básico obrigatório, constituísse
também, mesmo que não assumidamente, o ano da seleção de alunos porque de: finalização de
estudos; entrada no mercado de trabalho; opção por cursos profissionalizantes; não continuidade
de estudos.
O modelo de formação inicial de professores do terceiro ciclo do ensino básico e do ensino
secundário, em Portugal, é supervisionado e da responsabilidade das universidades. Constituído
por dois anos de formação de segundo ciclo universitário, o primeiro ano é curricular e o segundo
de prática de ensino supervisionada numa escola, sob a orientação de um ou de dois professores
da respetiva escola ou escolas (dependendo da existência dessa disciplina ou disciplinas em que o
estudante se profissionaliza), docentes tutelares de turma, e finaliza com a elaboração individual e
a defesa pública de um Relatório, descritivo e reflexivo, do trabalho desenvolvido pelo(a) estagiá-
rio(a)/formando(a) em contexto da prática pedagógica e didática.
A escolha prévia de um tema serve de fio condutor às práticas pedagógico-didáticas desenvol-
vidas em sala de aula. O estudante é, ainda, acompanhado por um ou dois orientadores da institui-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 17

ção de ensino superior, mas que não se desloca(m) à(s) escola(s)os (pelo menos até à data desta
comunicação).
Este facto, sobretudo quando o orientador convidado pelo formando não trabalha com ele se-
não em gabinete, cria situações próprias, por vezes muito interessantes a nível de distanciamento,
mas também acarreta e/ou pode originar dificuldades no desenvolvimento do trabalho, e na aceita-
ção de propostas de trabalho por parte do (s) orientador(es) pedagógico(s) da(s) escola(s). Contudo,
também permite nas sessões individuais de trabalho com o estagiário/formando compreender
climas de escola, desmontar conflitos de natureza vária, antecipar estratégias de atuação e planificar
o ciclo de supervisão pedagógica de uma forma produtiva e sem interferências.

1. Atualidade e pertinência da temática da


multiculturalidade
Como noutras áreas, também a Educação é contagiada por uma abordagem de temas que se ar-
ticula com os interesses da sociedade, com os problemas por ela vividos, com as suas dificuldades,
as falhas e as expetativas. Daí a preocupação constante em associar escola e sociedade privilegiando,
por vezes, uma ou outra em função da importância que lhe é atribuída ou pela insuficiência de uma
ou de outra em responderem positivamente aos desafios dos respetivos tempos históricos.
Numa Europa do séc. XX terrivelmente marcada por duas grandes guerras mundiais, conflitos
bélicos internos e mudanças tecnológicas vertiginosas não é de estranhar que as questões culturais
assumissem um valor até então desconhecido e, inclusive, passassem a influenciar novas áreas como
foi o caso da Educação. Educar para o pluricultural, o multicultural, o intercultural, a diversidade,
são motes recorrentes de oposição a um monoculturalismo e a um etnocentrismo vigentes até bem
entrada a segunda metade do século XX, tendo como pano de fundo a preparação de indivíduos
mais capazes de viver em sociedades marcadas pela diferença e também mais cívicos (no sentido de
civilidade, de bem comum) nas suas atitudes, comportamentos e modos de estar.
A responsabilidade desta formação recaiu abertamente sobre a Escola, instituição considerada
a melhor preparada e mais capaz de a assumir.
E mesmo que as palavras e as temáticas se alterem ao sabor de modas e da interseção de vo-
cábulos oriundos de outras áreas científicas, a diversidade, a mundialização, a rapidez com que os
indivíduos, hoje, se deslocam e comunicam entre si obrigam a manter atual e pertinente a reflexão
sobre o que é e como ser cidadão no mundo atual. Trata-se, pois, de uma temática que não se pode
descurar, sobretudo quando, neste verão de 2015, todos os dias os meios de comunicação relatam
fugas, naufrágios, mortandades de homens, mulheres e crianças, vindos de outros continentes para
a Europa, em condições absolutamente inaceitáveis para um séc. XXI e para uma opinião pública
conhecedora, esclarecida e crítica.
A literatura científica portuguesa sobre as questões da multi/interculturalidade em contexto
escolar - como sejam e citando apenas alguns pioneiros Silva (1991, 2002), Villas-Boas (1996), Car-
doso (1996), Souta (1997), Stoer e Cortesão (1999), Vala (1999), Vieira (1999, 2000), Peres (2000),
Carneiro (2001), Leite (2002, 2003) - tem-se mostrado produtiva e inovadora quer a nível das
abordagens efetuadas, dos trabalhos empíricos desenvolvidos e das conclusões e recomendações
assinaladas. Autores de referência têm, inclusive, disseminado as suas práticas investigativas a nível
universitário desencadeando outras investigações, novos projetos, outros contributos científicos
junto dos seus alunos.
18 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

2. Os Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada


Os exemplos de Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada (PES) que apresentamos têm
como referência temática comum a abordagem a questões de cidadania e de multi/interculturali-
dade. A preocupação das suas autoras por estas questões está intimamente ligada com as vivências
sociais atuais e com a necessidade de preparar os alunos de terceiro ciclo e do ensino secundário
para uma atuação cívica como cidadãos que já o são.
Com efeito, ser cidadão aprende-se desde a mais tenra idade e é-se cidadão quando se protege a
casa comum, na expressão do Papa Francisco (2015, p. 13): «O urgente desafio de proteger a nossa
casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento
sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar».
Selecionámos quatro Relatórios que foram elaborados sob a nossa orientação, sobretudo no que
à temática diz respeito. Em todos eles se privilegia a componente multicultural e a cidadania no
ensino-aprendizagem de diferentes disciplinas - Português, Espanhol e Geografia -, em articulação
direta com os conteúdos programáticos das mesmas disciplinas, a nível do terceiro ciclo do ensino
básico e do ensino secundário.
A opção por esta escolha está relacionada com o facto de pretendermos demonstrar que a abor-
dagem destas temáticas, mesmo que não explicitamente indicada nos programas curriculares das
diferentes disciplinas, pode ser efetuada e articulada com os conteúdos programáticos dependendo
da iniciativa do professor e da sua vontade, sensibilidade e preparação para valorizar estas temáticas.
Na impossibilidade de relatarmos em pormenor o trabalho desenvolvido pelas autoras, salienta-
mos os aspetos que considerámos mais relevantes para a temática em análise neste artigo, remeten-
do para a leitura integral dos respetivos Relatórios. Importa sobretudo acentuar que os temas não
foram objeto de abordagens específicas, descontextualizadas dos conteúdos programáticos, mas
antes complementaram objetivos de ensino e de aprendizagem e constituíram atividades articuladas
e inseridas quer nas metas de aprendizagem quer nas metas curriculares.

2.1 - Relatório I - Língua e cidadania: dois conceitos em diálogo

O Relatório elaborado por Joana Gomes Rodrigues, intitulado Língua e cidadania: dois conceitos
em diálogo, centrou-se na questão da cidadania no ensino-aprendizagem do Português e do Latim.
Especificamente na disciplina de Português, no 3º ciclo, a formanda teve como objetivo «perceber
qual o entendimento por parte dos alunos do conceito de cidadão e, consequentemente, de cida-
dania» e como finalidade fazer com que «os alunos alargassem a sua visão acerca do conceito de
cidadão/cidadania». Todo o trabalho inicial foi conduzido no sentido de serem os próprios alunos
a elaborar uma ficha que lhes permitisse avaliar as diferentes etapas por que iam passando, ao lon-
go do ano letivo, relativamente ao seu entendimento do conceito. Como atividade inicial, a autora
utilizou o preenchimento por parte dos alunos de um cartão com a seguinte frase para completar:
“Para mim ser cidadão é…”.
Esta primeira atividade constituiu o ponto de partida para todo o trabalho do ano letivo na
disciplina, complementado com a organização conjunta das atividades a desenvolver em sala de
aula e com a negociação das regras de comportamento e de desempenho na mesma. Tomando
sempre como referência os textos selecionados para análise e estudo na disciplina de Português, a
formanda teve como denominador comum articulá-los com as questões da cidadania, apoiando o
seu trabalho e o dos alunos em fichas de registo individual (auto registo para os alunos) das atitudes
e dos comportamentos destes últimos, num processo contínuo, semanal e reflexivo. Esta opção de
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 19

continuidade permitiu-lhe, num momento posterior, comparar a evolução dos alunos em termos
de compreensão do que é cidadania e de atitudes de cidadania desenvolvidas pelos alunos.
Assim, replicando num momento posterior e quase final do ano letivo a mesma atividade inicial
aos alunos da turma - “Para mim ser cidadão é…” -, na análise de conteúdo efetuada às respostas,
Rodrigues (2012) verificou que os vinte e três alunos consideraram ter exercido a cidadania em con-
texto de sala de aula porque: cumpri deveres (n=15), respeitei professores (n=11), respeitei colegas (n=11),
estive ciente dos meus direitos (n=6), participei ativamente nas atividades em sala de aula (n=5), ajudei os colegas
(n=4), fui pontual (n=1), fui responsável (n=1), preparei os trabalhos a tempo (n=1), trabalhei em grupo (n=1)
e, ainda, por estar informado acerca do que nos rodeia (n=1), sentir segurança com a família (n=1), ter orgulho
no país (n=1), ter uma identificação (n=1), dar o exemplo (n=1).
Em síntese, da primeira para a segunda atividade, os alunos passaram de uma ideia teórica sobre
o conceito para um lado mais prático, sobressaindo a ideia de cumprir regras como a mais vezes
mencionada na segunda atividade. De salientar, ainda, que nesta segunda atividade os alunos in-
troduziram novos itens – tais como: propor formas de melhorar o país, valorizar os outros, pagar impostos,
descontar, trabalhar muito -, o que parece atestar o grau de consciência cívica adquirido, através do
aprender fazendo, desenvolvido com e pelos alunos.

2.2 – Relatório II - Utilização e criação de materiais didáticos para o


ensino-aprendizagem de saberes culturais

Do Relatório de Carina Estevão Freire, intitulado Utilização e criação de materiais didáticos para o
ensino-aprendizagem de saberes culturais, começamos por salientar as razões enunciadas pela autora para
a escolha da sua temática: «Importância e necessidade de formar futuros cidadãos ativos, numa
sociedade cada vez mais multicultural e plurilingue». Sublinha a autora (Freire, 2015) que «esta
perspetiva é defendida em documentos que apresentam orientações para o ensino-aprendizagem
de uma língua e da cultura nela veiculada» e que «nesses documentos, os conhecimentos culturais
e socioculturais surgem como base para fomentar uma consciência intercultural no aprendente e
desenvolver nele competências gerais como o “saber ser” e o “saber aprender”». Desenvolvendo as
suas atividades letivas no ensino-aprendizagem do Português e do Espanhol, a autora toma como
fio condutor do seu trabalho a planificação da Escola e da área disciplinar, que enriquece com o
recurso à elaboração pessoal de materiais e à definição de atividades de grande relevância e criativi-
dade e com enorme rigor e enriquecimento científicos.
A destacar, por exemplo, a atividade El Día de los Enamorados en el mundo hispano, desenvolvi-
da com os alunos na aula de Espanhol, para a qual Freire (2015) definiu os seguintes objetivos:
«Comparar la festividad entre la Península Ibérica y América latina; Conocer cómo se celebra esta
fiesta en algunos países hispanohablantes; Conocer el nombre de algunos países hispanohablantes;
Opinar sobre los hábitos y costumbres en esta fecha (símbolos, invitaciones, regalos, sentimientos,
etc.)» (idem, p.101). De entre os vários materiais produzidos pela docente salientamos uma ficha
sobre o modo como este dia é comemorado no mundo hispânico – Chile, Argentina, Costa Rica,
Colombia, Cuba, Ecuador, Perú, República Dominicana, Porto Rico, Venezuela. Para além da in-
formação teórica de enriquecimento (aqui entendido como conhecimento complementar) forne-
cida ressalta igualmente o conhecimento de outras formas de cultura, de outros modos de festejar
o mesmo acontecimento.
Outro exemplo a destacar foi a transcrição e análise da canção “300 KILOS” de Los Coyotes
(idem, p.109): Esto es una canción que va dedicada a todos los países que entran dentro del área de lo que se ha
dado en llamar la cultura latina. / Países como Perú, Guatemala, Honduras, Chile, ¡Chile! 300 kilos de pueblos
20 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

latinos, todos pueblos hermanos, todos suramericanos. / Recordamos a Cuba, Portugal, Brasil, El Salvador, Mé-
xico, México Distrito Federal, Nicaragua, ¡Nicaragua! 300 kilos de pueblos latinos, todos pueblos hermanos, todos
suramericanos. / También queremos recordar a Puerto Rico, Venezuela, Colombia, Ecuador, Quito, a todos los
centros latinos de Nueva York, al centro venezolano de Estocolmo, al centro gallego de Buenos Aires. / 300 kilos
de pueblos latinos, todos pueblos hermanos, todos suramericanos. Ou, ainda, a abordagem ao tema Tiempo de
vacaciones, com o objetivo de desenvolver o vocabulário sobre clima, atividades de ócio e meios de
transporte e de conhecer a cultura hispo-americana, e a Postales de Hispanoamérica.
De salientar, também, as múltiplas atividades desenvolvidas por Freire (ídem) no âmbito do
ensino-aprendizagem do Português como sejam a visita à exposição Fernando Pessoa em Espanha, na
Biblioteca Nacional de Portugal, no âmbito do evento Mostra Espanha 2013, com o intuito de com-
plementar os conteúdos estudados em sala de aula e de atingir o seguinte objetivo do Programa de
Português de 12.º ano do Ensino Secundário: desenvolver a transversalidade cultural e linguística.
Como a autora afirma, «Embora muitas vezes desconhecida pelo público português, a dimensão
ibérica do trabalho de Fernando Pessoa apresenta, também ela, uma importância significativa no
panorama literário (editorial, intelectual, epistolar, etc.)» (idem, p.76).

(Imagem da autora, p.77)


De destacar a sugestão final deixada pela autora no seu Relatório ao referir que «a transversalida-
de de saberes culturais, sustentada e aplicada nesta PES, pode ser sugerida em contexto de reuniões
de avaliação, em que os docentes envolvidos decidem construir uma prática de conhecimentos
partilhados» (idem, p. 62).

2.3 – Relatório III - A multi e interculturalidade no ensino da História e da


Geografia

Do Relatório elaborado por Mónica Gioconda dos Santos Rôla, intitulado A multi e interculturali-
dade no ensino da História e da Geografia, salientamos a temática Portugal, um país multicultural, desenvol-
vida com alunos de duas turmas do 10º ano de escolaridade na disciplina de Geografia, para a qual
Rôla (2015) definiu os objetivos seguintes:

• Promover competências e atitudes para valorizar a diversidade nas sociedades.


A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 21

• Desenvolver a capacidade de compreensão e de intervenção no relacionamento com outras cul-


turas e espaços.
• Aprofundar o conhecimento sobre os países em estudo, valorizando as suas especificidades.
• Estimular o diálogo, a comunicação e a compreensão intercultural.
• Fomentar o respeito pelos outros e a autoestima.
• Reconhecer a importância da integração/acolhimento de cidadãos estrangeiros.
• Desenvolver competências geográficas e competências de utilização das TIC.

Optando pela valorização do saber trabalhar em grupo, Rôla (idem) desenvolveu a temática
em grupos de trabalho de 3 ou 4 elementos, por forma a que cada grupo trabalhasse sobre cada
um dos países de proveniência dos alunos estrangeiros/imigrantes ou de ascendência estrangeira
existentes na (o) turma/Agrupamento, procurando integrar um aluno imigrante/estrangeiro ou de
ascendência estrangeira em cada um dos grupos. A todos os grupos a autora lançou os seguintes
questionamentos: Como lidar com esta nova e inquestionável realidade? Seremos capazes de gerir no dia-a-dia a
diversidade que nos envolve? Somos capazes de apreciar estas diferenças?
Este trabalho permitiu aos alunos estudarem vários países como, por exemplo, Angola, Ban-
gladesh, Brasil, Cabo Verde, Cuba, Guiné Bissau, Guiné, Índia, Nepal, Moçambique, São Tomé e
Príncipe, Ucrânia, aplicando em simultâneo conhecimentos já adquiridos na disciplina de Geogra-
fia, como se exemplifica no seguinte exemplo de atividade proposta por Rôla (2015):
«- Seleciona a informação e imagens mais relevantes de cada um dos itens do PowerPoint e co-
pia para a caixa de texto correspondente, ajustando a letra (a definir), tamanho (a definir), conforme
o exemplo.»

«- Copia o mapa da distribuição da população residente do país em estudo em Portugal e o


gráfico de colunas correspondente e cola-os na caixa de texto, ajustando os mesmos ao espaço
existente, conforme o exemplo.»
22 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

O trabalho desenvolvido por Rôla privilegiou sempre a articulação entre os conteúdos do pro-
grama da respetiva disciplina (História e Geografia) com a valorização da cultura de que os alunos
eram portadores ou por nascimento ou por ascendência. Em síntese, aprendeu-se também com o
conhecimento transmitido pelos próprios alunos.

2.4 – Relatório IV - Lusofonia: Língua portuguesa a muitas vozes

Finalmente, uma referência ao Relatório elaborado por Fernanda Manuela Campos de Sá Cou-
to Antunes e intitulado Lusofonia: Língua portuguesa a muitas vozes. Neste Relatório, Antunes (2012)
aborda com os seus alunos a língua portuguesa em várias vertentes, das origens à atualidade, como
que num crescendo do desenvolvimento da própria língua portuguesa na sua globalidade. Do
powerpoint de apresentação do seu Relatório, em prova pública, retirámos os cinco pontos que se
seguem e que permitem compreender não só o trabalho desenvolvido pela autora como também
o modo poético como o faz.

1 - «A génese do português» - A palavra é um retrato feito a sons (Teixeira de Pascoaes). Objetivos: a)


Indicar a importância do latim como origem primordial da língua portuguesa; b) Mostrar que
a língua portuguesa como realidade viva, evolui e viaja; c) Salientar a contribuição da cultura
clássica greco latina em especial na cultura ocidental; d) Indicar algumas obras clássicas que
influenciaram as artes e as letras produzidas em português.
2 - «Português – Língua de carácter global» - Língua portuguesa, encruzilhada de quantos a falam e a es-
crevem, ponto de encontro onde se plasmam culturas e civilizações (Carlos Reis). Objetivos: a) Sensibilizar
para a importância da língua portuguesa no mundo de hoje; b) Enquadrar o valor e a dimen-
são da comunidade lusófona, num vasto universo de falantes, detentores de uma língua oficial
comum; c) Mostrar que se trata de uma língua global, dispersa geograficamente e de carácter
pluricultural.
3 - «Português – Língua de diversidade» - Língua de muitas pátrias, dela se diz ser maleável e fraterna (Oné-
simo Teotónio de Almeida). Objetivos: a) Realçar a diversidade que caracteriza o universo da
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 23

língua falada em português; b) Comparar caraterísticas entre o português europeu, o português


brasileiro e o português africano; c) Reconhecer a própria diversidade do português falado em
Portugal.
4 - «Português – Língua de possibilidades interculturais» - Optando pelo caminho do encontro e da mes-
tiçagem dialógica entre culturas (João Maria André). Objetivos: a) Reconhecer o multiculturalismo
intrínseco na língua portuguesa; b) Consciencializar para o enriquecimento através do outro;
c) Promover a prática intercultural, através do respeito mútuo, da cooperação e da partilha de
saberes; d) Alargar “janelas”, numa perspetiva moderna de cidadania, através do instrumento
LÍNGUA, elo precioso de ligação entre os diferentes países, povos e comunidades que de algu-
ma forma utilizam o português nas suas vidas.
5 - «Produção literária em português» - Ler é uma forma de estar lá (José Saramago). Objetivos: a)
Motivar para a leitura de textos lusófonos; b) Conhecer autores e a sua criação literária escrita
em português; c) Perceber o seu destaque no âmbito da literatura do mundo; d) Trabalhar a
intertextualidade de textos de autores de língua portuguesa.

A apresentação em prova pública deste Relatório terminou com três citações que se reproduzem
pela sua pertinência, relevância e atualidade:

• Se a língua não mudasse, todos hoje estaríamos falando o latim (João Ubaldo Ribeiro).
• Não há uma língua portuguesa, há línguas em português (José Saramago).
• Mpurukuma, Língua, corpo

quase,
O que sou de sobrepostas
vozes! (Luís Carlos Patraquim).
Neste Relatório destacamos o encadeamento das temáticas abordadas numa articulação entre
estudo da língua, literatura nacional e lusófona, multiculturalismo e interculturalismo.

2.5 - Síntese

Como se verifica, em todos estes Relatórios a abordagem à diversidade cultural, à multicultu-


ralidade, surge sempre integrada nos conteúdos programáticos das disciplinas sem necessidade de
recurso a tempos letivos específicos ou a atividades extracurriculares direcionadas para o efeito.
Do mesmo modo, a formação cívica de cada aluno é contemplada e aprendida num «saber fazer»
de experiências de aquisição de conhecimentos e de atitudes e do desenvolvimento de capacidades
que constituem as competências que se pretende fazer adquirir nos respetivos ciclos de estudos.
Assim, o conceito de cidadania é ele também aprendido com os outros e através dos outros,
num processo de interculturalidade que se pretende produtor de novas formas de estar e de viver
em sociedade, em diálogo e em harmonia, numa educação para a paz.
Em síntese, mais que o domínio da teoria importa que cada docente seja criativo nas atividades
que propõe aos alunos, que saiba gerir com segurança e eficácia o currículo, que esteja atualizado(a)
em termos de informação, que tenha espírito reflexivo e crítico sobre essa mesma informação, que
saiba implicar os alunos nos temas em análise, que tenha vontade e disposição para se questionar
a si próprio(a).
24 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Considerações Finais
O posicionamento distanciado do(a) orientador(a) do Relatório, sobretudo quando não mantém
relações nem de trabalho nem de colaboração com qualquer docente cooperante/supervisor nas
escolas, não deixa de ser muito particular e, por vezes mesmo, profícuo.
Com efeito, acaba por deter um “poder” relevante nas decisões pedagógicas tomadas em sala de
aula que, segundo a opinião que defendemos, são fundamentais para a consecução dos objetivos a
atingir. Como costumamos dizer aos nossos estudantes da formação inicial de professores, pode-
mos ter uma planificação exemplar e ser exímios nos conhecimentos científicos teóricos a trans-
mitir e/ou a propor que os alunos apreendam, mas se não existir uma construção sólida da relação
pedagógica, com tudo o que ela implica, o plano de aula exemplarmente concebido e estruturado
pode tornar-se num fracasso.
No nosso caso pessoal, não sendo docente de didática de uma determinada disciplina mas
sim da unidade curricular de Educação, Currículo e Multiculturalismo, e portanto das Ciências da
Educação, o nosso papel junto dos estudantes que acompanhamos pautou-se, muitas vezes, por su-
gestões “provocatórias” de estratégias e de abordagens que considerámos adequadas e inovadoras
relativamente ao tema do respetivo Relatório da PES.
Como consequência, em algumas situações, verificou-se que o acompanhamento feito ao estu-
dante em situação de prática pedagógica acabou por se alargar ao próprio professor supervisor /
cooperante na escola. Ou seja, o professor cooperante também beneficiou da formação inicial do
“estagiário”, tendo-se tornado também ele formando mas em situação de formação contínua.
Privilegiando, sobretudo, as questões temáticas relativas à multi e à interculturalidade e à cidada-
nia, na temática dos Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada, cremos ter contribuído para
a constatação de que estas questões são transversais a qualquer disciplina do currículo escolar e
podem ser abordadas dentro dos conteúdos programáticos oficialmente definidos e de acordo com
as respetivas metas curriculares. O fundamental é, neste ano de prática numa escola, o estudante
possuir ferramentas pedagógico-didáticas consistentes e reflexivas, adquiridas no seu primeiro ano
de formação, que lhe permitam aplicar esses conhecimentos de um modo criterioso, reflexivo e
inovador.
Não se descarta também aqui o papel dos diferentes orientadores que, também eles, têm de
possuir esses mesmos conhecimentos pedagógico-didáticos arriscando-se, se não os detiverem, a
contribuir para a formação de professores que não se pautam pela qualidade que é exigida.
O facto de os estudantes terem optado por temáticas relacionadas com a multi/interculturali-
dade e com a cidadania parecem-nos refletir a sua preocupação com estas temáticas assim como a
sua preparação para ao integrá-las as articularem de modo correto com os conteúdos científicos da
respetiva disciplina.
Com efeito, as abordagens multi/interculturais não podem acontecer unicamente em contextos
educativos de diversidade de alunos. Elas têm de acontecer em todos os contextos. Talvez mesmo
a premência se situe nos contextos monoculturais para que os alunos compreendam que o mundo
é constituído não unicamente pelo seu mundo mas por muitos outros mundos ricos e válidos em
experiências de vida.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 25

Referências Bibliográficas
Relatórios da PES

Antunes, F. M. C. de S. C. (2012). Lusofonia: língua portuguesa a muitas vozes. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino
do Português no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da
Universidade Nova de Lisboa.
Freire, C. E. (2015). Utilização e criação de materiais didáticos para o ensino-aprendizagem de saberes culturais. Relatório da Prática de Ensino
Supervisionada em Ensino do Português e de Língua Estrangeira (Espanhol) no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino
Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Rodrigues, J. G. (2012). Língua e cidadania: dois conceitos em diálogo. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino de Portu-
guês e de Línguas Clássicas no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Rôla, M. G. dos S. (2015). A multi e interculturalidade no ensino da História e da Geografia. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada
em Ensino da História e da Geografia no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Outras obras

Cardoso, C. M. (1996). Educação multicultural: percursos para práticas reflexivas. Lisboa: Texto Editora.
Carneiro, R. (2001). Fundamentos da educação e da aprendizagem: 21 ensaios para o século 21. Vila Nova de Gaia: Fundação Manuel Leão.
Leite, C. (2003). Para uma escola curricularmente inteligente. Porto: Edições ASA.
Leite, C. M. F. (2002). O currículo e o multiculturalismo no sistema educativo português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian e Ministério
da Ciência e da Tecnologia.
Papa Francisco (2015). Louvado sejas. Carta Encíclica «Laudato si» sobre o cuidado da casa comum. Prior Velho: Paulinas Editora.
Peres, A. N. (2000). Educação Intercultural: utopia ou realidade? Porto: Profedições.
Silva, M. C. V. (1991). Contributos para uma análise de necessidades educativas de crianças pertencentes a minorias étnicas e desfavorecidas (dissertação
de mestrado não publicada). Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
Silva, M.C.V. (2002). «Discriminatio subtilis»: estudo de três classes multiculturais. Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação
da Universidade de Lisboa. (Tese de doutoramento parcialmente publicada em 2008 sob o título Diversidade cultural na
escola: encontros e desencontros, Lisboa: Colibri).
Stoer, S. & Cortesão, L. (1999). Levantando a pedra: da pedagogia inter/multicultural às políticas educativas numa época de transnacionalização.
Porto: Edições Afrontamento.
Souta, L. (1997). Multiculturalidade & educação. Porto: Profedições.
Vala, J. (Org.) (1999). Novos racismos: perspectivas comparativas. Oeiras: Celta Editora.
Vieira, R. (1999). Da multiculturalidade à educação intercultural: a antropologia da educação na formação de professores. Educação,
Sociedade & Culturas, 12, 123-162.
Vieira, R. (2000). Ser igual, ser diferente: encruzilhadas da identidade. 2ª ed., Porto: Profedições.
Villas-Boas, M. A. (1996). Dificuldades dos professores nos contactos com as famílias. In Atas do 1º Congresso das Licenciaturas
em Ciências da Educação: Profissões e espaços escolares. Porto: CIIE – UP.
26 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 27

AS TIC, AS PRÁTICAS DE ENSINO


SUPERVISIONADAS, A INVESTIGAÇÃO E A
INOVAÇÃO: OS BLOGUES EDUCATIVOS &
A SEGURANÇA NA INTERNET
Henrique Gil (hteixeiragil@ipcb.pt)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco & Centro de Administração e Políticas Públicas – Instituto Superior
de Ciências Sociais e Políticas – Universidade de Lisboa

Vera Caroço e Carina Félix


Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco

Resumo
Presentemente, em Portugal, estima-se que a utilização das TIC (Tecnologias da Informação e
da Comunicação), pelos designados nativos digitais, corresponde a cerca de 98,5%. Considerando
que os nativos digitais correspondem aos cidadãos que nasceram somente há 15 anos atrás, significa
que toda a atual população escolar vive e convive rodeada de dispositivos e de ferramentas digitais
no âmbito das suas rotinas diárias. Contudo, em termos gerais, não se tem verificado a mesma rea-
lidade no espaço educativo onde a presença de computadores e de uma ligação à Internet continua
a ser muito escassa e incipiente. As Práticas de Ensino Supervisionadas, no âmbito do Mestrado em
Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico, têm vindo a constituir uma «janela de
oportunidades» para a realização de investigações sobre a implementação das TIC no processo de
ensino aprendizagem. Apesar de todos os constrangimentos, tem sido possível promover-se uma
investigação que se pode considerar inovadora e exploratória pela inexistência de investigações an-
teriores similares. Para o efeito, é objetivo apresentarem-se os resultados de uma investigação que
envolveu a utilização de blogues, no sentido destas ferramentas digitais promoverem novos contex-
tos de aprendizagem e, ainda, com o objetivo de serem uma «ponte» que permitiu a aproximação
entre a escola e a família. Um outro exemplo de investigação a apresentar diz respeito à utilização
28 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

segura da Internet. Dos resultados obtidos foi possível verificar que crianças de 7/8 anos já fazem
uma utilização autónoma da internet mas, em vários casos, foi possível averiguar-se que os respe-
tivos pais não têm noção relativamente às utilizações que os seus educandos fazem no chamado
ciberespaço. Em termos globais, foi possível apurar-se que as crianças aderem muito facilmente à
utilização das tecnologias digitais na sala de aula, os alunos mostraram-se sempre muito envolvidos
e motivados. Para terminar, é importante referir que, apesar de todas as vantagens apuradas, quer
os alunos quer os pais, continuam a afirmar que a presença dos professores é fundamental e im-
prescindível no processo de ensino e de aprendizagem.

Palavras-Chave: TIC; Práticas de Ensino Supervisionadas; Blogues educativos; Segurança na in-


ternet; Inovação.

Abstract
At present, in Portugal, it is estimated that the use of ICT (Information and Communication
Technologies) by the digital natives called, corresponds to about 98.5%. Whereas digital natives
correspond to citizens who were born only 15 years ago, it means that all current school population
lives and lives surrounded by digital devices and tools as part of their daily routines. However, in
general terms, in the educational space where the presence of computers and an Internet connec-
tion is still very scarce and incipient. Supervised Teaching Practice (Master in Preschool and 1st
Cycle of Basic education), they have come to constitute a ‘window of opportunity’ in order to have
carried out investigations where it has privileged the use of ICT. Despite all the constraints, it has
been possible to promote up an investigation that can be considered innovative and exploratory
by the absence of previous similar investigations. To this end, it will be presented the results of an
investigation that involved the use of blogs that to provide new ways of teaching and learning, edu-
cational blogs have managed to be a ‘bridge’ that allowed the rapprochement between the school
and families. Another example of the present investigation relates to the safe use of the Internet.
The results showed that children 7/8 years already do a stand-alone use of the internet but in many
cases it was possible to ascertain that the respective parents have no idea about the use that their
students make the so-called cyberspace. Overall, it was possible to ascertain that children adhere
easily to the use of digital technologies in the classroom, students showed up always very involved
and motivated. Finally, it should be noted that despite all the advantages cleared either students or
parents, continue to claim that the presence of teachers is fundamental and indispensable in the
process of teaching and learning.

Keywords: ICT; Supervised Teaching Practice; Educational blogs; Safe internet; Innovation.

As TIC e o seu enquadramento social e educativo


Na atualidade, as TIC (Tecnologias da Informação e da Comunicação) são uma presença incon-
tornável em todos os setores sociais. Neste contexto, a «Escola» não se pode alhear desta realidade
onde cada vez mais as crianças fazem uma utilização diária e constante das TIC e dos dispositivos
digitais associados porque já fazem parte das suas vivências e das suas rotinas diárias – Nativos
Digitais. De acordo com dados recolhidos pela UMIC (2009), a utilização das TIC pelos nativos
digitais (indivíduos até aos 15 anos de idade) cifrava-se em 98,5%. No mesmo sentido, o estudo
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 29

posterior da UMIC (2010) veio corroborar esta tendência ao afirmar que entre 95% e 100% dos
estudantes usam, respetivamente, a Internet e o computador. Ainda de acordo esses dados reco-
lhidos pela UMIC (2010), 91% dos jovens entre os 10 e os 15 anos utilizam Internet, no entanto,
apenas 84% desses jovens fazem a sua utilização a partir das suas casas. Apesar deste valor ser mais
do dobro de 2005, que apresentava apenas um valor de 32%, é importante realçar que a Escola se
apresenta como um espaço que proporciona uma maior acessibilidade para uma utilização mais
generalizada das TIC por parte dos alunos. Contudo, é importante realçar que este valor não tem
uma relação direta com a utilização «formal» em contexto de sala de aula. Tal como se pode ler nos
dados da UMIC (2010), 77% dos jovens dos 10 aos 15 anos referem utilizar diariamente o com-
putador em diferentes atividades que são repartidas da seguinte forma: trabalhos escolares (93%),
audição de música e visionamento de filmes (84%), jogos (84%) e utilização de software educati-
vo (54%). Esta última atividade já faz uma ponte com a Escola mas parece ser mais da iniciativa
pessoal e não como resultado ou como consequência de um enquadramento educacional formal.
Pois, apenas 28% desses jovens afirmam que usam o computador na Escola para realizar trabalhos
e para comunicar com colegas. Apesar de ter havido um acréscimo substancial no acesso e na uti-
lização das TIC por parte dos alunos mais jovens, a real inclusão das TIC em contexto educativo
ainda não foi satisfatoriamente atingida. Neste sentido, de acordo com os dados recolhidos pela
European Schoolnet (2012), vieram demonstrar que Portugal tem feito grandes esforços para que
haja uma maior disponibilidade no acesso às TIC. Tal como se pode observar na Figura 1, Portugal
apresenta um rácio de 6 alunos por computador, muito próxima da média da União Europeia que
corresponde a um rácio de 5 alunos por computador.

Figura 1: Rácio de alunos por computador no seio da União Europeia no ano letivo de 2011-12.

Um outro estudo realizado pela OberCom em 2014, vem corroborar a tendência quase genera-
lizada da população mais jovem na utilização da Internet. Tal como é afirmado por Cardoso et al
(2014), apesar de ser evidente o efeito em “escada” que atualmente se verifica, alerta-se para o facto
de a médio/longo prazo esta tendência tender a ser eliminada pela renovação geracional que irá ter
lugar (Figura 2). No entanto, em sentido oposto, é bastante clara e evidente a elevada percentagem
da Internet pelas faixas mais jovens.
Tendo em consideração os dados relativos à realidade dos jovens portugueses torna-se impen-
sável não enquadrar a utilização das TIC em contexto educativo. Esta questão tem vindo a ser de-
batida há já alguns anos e parece existir uma certa consensualidade. Como refere Marquès (2008),
a dificuldade parece residir na forma e no desafio relacionado com uma utilização das TIC que
possam promover aprendizagens significativas ao invés de serem ferramentas centradas no ensino.
Ou seja, deve haver uma centralização das aprendizagens, tal como afirma Ponte (2000), tornando
os alunos como os verdadeiros protagonistas do processo educativo. É sob esta perspetiva que se
deve referir a designação proposta por Jonassen (2007) ao entender que as TIC devem ser enten-
30 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Figura 2: Utilização da Internet pela sociedade portuguesa por faixas etárias.

didas como ferramentas cognitivas no sentido dos alunos aprenderem com as tecnologias e não através das
tecnologias. Do mesmo modo, Costa (2007) é também de opinião que neste enquadramento, as TIC
ao serem assumidas e utilizadas como ferramentas cognitivas, é que poderão tornar possível que seja
equacionada e promovida uma aprendizagem significativa dos alunos. Para o efeito, torna-se impor-
tante criar condições para que os alunos possam promover aprendizagens ativas ao manipularem
diferentes materiais e os poderem integrar nessas novas experiências de aprendizagem, no seio de
uma aprendizagem que seja intencional ao articularem essas experiências com os objetivos e com
os conteúdos previamente adquiridos.
As TIC devem ser integradas como ferramentas que permitam a resolução de problemas reais
onde a autenticidade das aprendizagens sejam percionadas e intencionais. Neste particular, de
acordo com Prensky (2004), a utilização de dispositivos digitais portáteis (computadores, tablets
e smartphones) vêm permitir que facilmente as TIC estejam omnipresentes em todos os espaços
de ensino/aprendizagem e, como tal, mais facilmente poderão ser incluídas nos processos educa-
tivos: “when and where to use”. No presente contexto, como Wastiau et al (2013) vêm afirmar,
cada vez mais a tendência observada é a de “(…) move away from fixed installations of computers
in labs, classrooms or other locations towards mobile learning devices.” Uma constatação ainda
referenciada por Wastiau et al (2013), tendo em consideração os dados recolhidos no «Survey of
Schools: ICT in education», veio demonstrar que cerca de 95% das escolas inquiridas afirmam
ter banda larga e acesso wireless o que vem permitir alterar, de forma ‘drástica’, a forma como os
conhecimentos podem ser acedidos e veiculados. É agora neste contexto que Osório (2005) refere
que cada vez mais se diluem as fronteiras entre os espaços formais e os espaços não formais de
aprendizagem, naquilo a que o autor refere como as fronteiras tradicionais entre o «espaço-tempo
de produção» e o «espaço-tempo formativo». Contudo, tal como também é referido por Osório
(2005), é preciso que exista por parte dos alunos um conjunto de capacidades que lhes permitam
exercer a sua autoaprendizagem. Pois, no seio desta linha de argumentação, Law, Pelgrum e Plomp
(2008) são de opinião que não basta proporcionar o acesso às TIC e às ligações wireless mas a
necessidade de existir uma competência digital por parte dos alunos e por parte dos professores
que permita uma adequada utilização. Neste particular, importa clarificar qual o sentido de compe-
tência digital. Para o efeito, toma-se como referência a definição proposta pela Comissão Europeia
(2007): “Involves the confident and critical use of Information SocietyTechnology (IST) for work,
leisure and communication. It is underpinned by basic skills in ICT, i.e. the use of computers to
retrieve, store, produce, present and exchange information, and to communicate and participate in
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 31

collaborative networks via the Internet.” Torna-se óbvio que a utilização das TIC deve ser realizada
fomentando (mais) nos alunos e nos professores atitudes críticas e conscientes que, na opinião de
Cruz (2009), se pressupõe que deva haver a mobilização, a integração e a combinação de quatro ti-
pos de dimensões que envolvam: saberes instrumentais onde se concretiza o domínio do hardware;
saberes cognitivos que tenham uma relação direta com uma utilização da informação que inclui o
seu acesso, produção e posterior difusão; saberes atitudinais que incluam comportamentos sociais
de empatia e de respeito mútuo; saberes axiológicos e éticos no sentido de existir uma tomada de
consciência clara de que as TIC não são neutrais às quais devem estar subjacentes valores e critérios
éticos. Neste âmbito, onde a relação entre as TIC e a comunicação é tão estreita, Cachapuz et al
(2004) afirmam que essa utilização quer seja feita de forma presencial ou a distância, constitui uma
das competências fundamentais para saber comunicar adequadamente.
Em coerência com os argumentos e dados já apresentados, concorda-se com Patrocínio (2004)
ao afirmar que a inclusão transversal e natural das TIC no sistema educativo português é um im-
perativo e uma obrigação no atual contexto social. Tal como também já se verificou a utilização e
a apetência dos alunos para a utilização das TIC ser bastante notória e real. Nesta realidade, terão
que ser os professores a ter que tomar iniciativas que levem ao enquadramento e à utilização mais
sistemática das TIC em contexto educativo (espaços formais e/ou informais). Esta situação vem
representar um desafio às instituições de formação de professores no sentido de capacitarem os fu-
turos professores para lidarem com novos espaços, com espaços mais criativos e mais inovadores.

As Práticas de Ensino Supervisionadas e os respetivos


processos investigativos e inovadores através das TIC
No âmbito do Curso de Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino
Básico a inclusão de áreas e unidades curriculares de «Práticas de Ensino Supervisionadas», para
além de promoverem um espaço diretamente relacionado com a preparação profissional para o
exercício de funções de docência prevê que, ao mesmo tempo, os mestrandos praticantes adquiram
competências de investigação que possam desencadear espaços propiciadores à inovação.
Quando se aborda o conceito de inovação não há propriamente uma conceção que seja unâni-
me, dado que pode conter várias dimensões e argumentações. Uma dessas propostas é apresentada
por West e Richards (1999) que entendem a inovação como sendo uma prática deliberada e inten-
cional recaindo essa responsabilidade inovadora no professor. Nesta dimensão é o ‘professor-ino-
vador’ que toma a iniciativa ao propor novas estratégias e novas metodologias ou, de outro modo,
pode apresentar novas e diferentes formas na sequenciação e na forma de operacionalização. Esta é
uma dimensão que permite ir da ‘teoria’ para a prática’ e pode ser vivida na 1ª pessoa. Numa outra
dimensão, que é defendida por Renzulli (2003), encara a inovação como mudança a qual poderá ser
radical ou até disruptiva. Comparativamente com a conceção anterior, neste caso não há propria-
mente uma intenção deliberada ou um resultado esperado. Trata-se de uma dinâmica que é criada
e imprimida onde a previsibilidade pode chegar a ser inexistente pela capacidade de promover e
incluir diferentes atores e, consequentemente, diferentes e novas inter-relações. Nesta comunidade
inovadora a partilha é permanente porque todos ensinam a todos e todos aprendem com todos.
Numa terceira dimensão que aqui se apresenta, pode considerar-se a inovação como sendo institu-
cional e dirigida, tal como propõe Smits (2002). Esta é conceção «mais tradicional» que é imposta
numa perspetiva de ‘top-down’que surge em determinados contextos políticos e sociais mas que
retira toda a liberdade para realmente se poder ser inovador. É evidente que a primeira conceção
parece ser aquela que, sendo mais cordata, permite envolver o professor como principal decisor
32 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

numa perspetiva onde se integra uma metodologia do tipo exploratório e de investigação ação. É
neste contexto que a PES (Prática de Ensino Supervisionada) pode ser esse motor inovador. Trata-se
de um momento especial e único na formação de professores, a sua formação inicial. É evidente
que este professor em formação carece de experiência mas também não está preso a rotinas pelo
que lhe deve ser dada a hipótese de ser ele próprio, ainda que sob uma supervisão que se deseja
mas que não seja inibidora.
Enquadrando as TIC com os processos de inovação, partilha-se a opinião de Kamplis, Boconi e
Punie (2012) ao referirem a importância que estes recursos digitais podem vir a assumir pelo facto
de se criarem condições e contextos para uma utilização mais seletiva e mais criativa da informação.
Quer isto dizer que não se advoga uma utilização das TIC que sirva para replicar ou para adaptar
práticas mais tradicionais. Pelo contrário, como defende Loveless (2008), as TIC devem ser pro-
motoras e catalisadoras para a introdução de novas abordagens onde a interação entre professor e
aluno sejam uma realidade e onde as atividades colaborativas venham a prevalecer. Ou ainda como
referem Punie et al (2006) numa relação ‘peer-to-peer’ que inclui práticas mais flexíveis que poderão,
por sua vez, promover espaços para uma melhor adaptação a diferentes ritmos de aprendizagem e
que levarão a um maior envolvimento e motivação dos alunos. Para o efeito, Redecker et al (2009,
17) fazem uma referência positiva, neste contexto, para as ferramentes sociais digitais ao afirma-
rem: “(…) social media approaches can facilitate technological, pedagogical and organisational
innovation in teaching and learning, thus contributing to the modernisation of systems and insti-
tutions to meet the challenges of the 21st century.”
Para que se possa operar a inclusão das TIC em contexto educativo é necessário que os profes-
sores se sintam seguros e confortáveis na sua utilização. Por isso, há a convicção de que a PES deve
promover estes espaços no sentido dos futuros professores entenderem as TIC como ferramentas
pedagógicas que lhes permitem ir ao encontro das atuais necessidades e anseios dos alunos. De
acordo com os dados recolhidos por Wastiau et al (2013), apenas 20-25% dos alunos utilizam as
TIC em contexto de sala de aula por professores que se sentem digitalmente competentes e segu-
ros. Wastiau et al (2013, 19) referem ainda que de acordo com os dados recolhidos: “(…) confident
and supportive teachers are needed to use ICT infrastructure effectively and exploit its potential
and that they are able to make the best use of relatively poor ICT learning environments.”

Utilização das TIC em contexto da Prática de Ensino


Supervisionada
Nesta secção vão apresentar-se, de forma resumida, os principais resultados de duas investiga-
ções que foram realizadas no decorrer da PES em duas escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico em
Agrupamentos pertencentes à cidade de Castelo Branco (Portugal). As investigações envolveram
a utilização de Blogues Educativos e a utilização segura da Internet É importante realçar que se
tratam, apenas de dois exemplos que permitem ilustrar a importância da PES como espaço de in-
tervenção e de investigação ao poder incluir as TIC.
No primeiro caso, a utilização dos Blogues Educativos, a preocupação foi a de transformar a
utilização de blogues Educativos como uma ‘ponte’ que pudesse aproximar os pais dos seus filhos,
no sentido de fomentar um conhecimento e uma partilha das suas aprendizagens. Neste sentido,
na opinião de Wastiau et al (2013, 16) esta opção reveste-se de grande importância e não está a
ser devidamente aproveitada: “(…) the findings reveal that most have been familiar with ICT at
school for a few years but still mainly use it to pepare their teaching. Only a few use it – but still to
a limited extent – to work with students during lessons, and less frequentely to communicate with
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 33

parents or divide students’ work between school and home in mew ways.” Ainda neste contexto,
Cruz (2009) vem reforçar a necessidade para se promoverem contextos de aprendizagem suporta-
dos por estruturas tecnológicas digitais em rede a fim de permitirem a construção de comunidades
de aprendentes onde venha a prevalecer a partilha e o intercâmbio de saberes.
No segundo caso, a preocupação centrou-se na utilização segura da Internet, em alertar os alu-
nos para as potencialidades da Internet mas de uma forma a que não os pudesse expor a eventuais
perigos. Tendo em conta o facto do público-alvo ser muito jovem ainda é fundamental a presença
e o apoio quase constante do professor de forma a que os alunos se sintam seguros e confiantes.
Neste particular, os dados recolhidos por Wastiau et al (2013, 19) permitem afirmar que: “(…)
when students are taught by teachers with great confidence in their own digital competence (ope-
rational and social media skills) and in their ability to use the Internet safely and responsibly.” Este
tipo de experiências e de comportamentos serão rentabilizados no futuro por estes alunos pelo
facto de terem sido expostos a estas experiências, num mundo digital, poderão virem a sentirem-
se mais autónomos e mais confiantes por terem vindo a adquirir competências nesta área. Neste
sentido, Wastiau et al (20013, 19), reportando-se aos dados recolhidos vêm também afirmar que:
“Such confidence applies to students’ operational ICT skills, social media skills, ability to use the
Internet responsibly, and, to a slightly lesser extent, to use the Internet safely.”

a) Blogues Educativos no 1º CEB

A investigação foi realizada envolvendo uma turma de alunos do 1º ano de 25 alunos com idades
compreendidas entre os 6 e os 7 anos de forma a que se pudesse responder à seguinte questão:
«Verificar qual o contributo dos blogues educativos como fator de aproximação entre a família e a
escola.» Após várias pesquisas na Internet foi criada uma listagem contendo vários blogues educa-
tivos os quais foram, numa fase posterior, seriados e selecionados por docentes do 1º CEB e por
especialistas na área das TIC. Em termos globais, os blogues tiveram em consideração os objetivos
e os conteúdos contidos no programa do 1º CEB e a sua adequação à faixa etária correspondente.
Por outro lado, foram verificados outros aspetos, entre os quais, a usabilidade, a acessibilidade e o
rigor técnico e científico. A metodologia utilizada na investigação assentou numa perspetiva quali-
tativa que incluiu um estudo de caso no seio de uma investigação ação. A recolha de dados restrin-
giu-se às 4 semanas de intervenção da investigadora onde teve um desempenho individual, onde se
destacou uma observação participante, a recolha de notas de campo e a aplicação de um inquérito
por questionário aos pais/encarregados de educação. Em termos gerais, as estratégias implemen-
tadas, tendo em consideração que os alunos envolvidos ainda possuíam um domínio incipiente de
leitura e escrita, implicaram um apoio ‘deliberado’ dos respetivos pais/encarregados de educação
nas atividades propostas. Desta forma, os pais/encarregados de educação foram ‘forçados’ a co-
laborar com os seus educandos na realização das diferentes tarefas que implicaram a utilização de
recursos contidos nos blogues educativos. Pode afirmar-se que, numa primeira fase, a adesão não
foi imediata por todos os participantes. Contudo, a ‘pressão’ dos alunos fez com que, com o decor-
rer do tempo, a utilização dos blogues já passasse a ser uma rotina diária. Em termos de conclusão,
tendo por base a recolha de dados realizada, os blogues mostraram ser um recurso que fomentou
a motivação dos alunos por ter proporcionado novos e diferentes contextos de aprendizagem. Os
pais/encarregados de educação também fizeram um balanço positivo porque entenderam que pu-
deram acompanhar mais os seus filhos nas aprendizagens que estavam a decorrer e porque também
sentiram que as aprendizagens eram realizadas de uma forma muito mais ‘natural’ por parte dos
seus filhos porque o suporte, agora digital, ia mais ao encontro dos seus interesses. Contudo, num
34 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

balanço final, foi possível concluir que houve uma unanimidade em encarar os blogues (suportes
digitais) como um complemento, continuando a ser enfatizado e priorizado o papel fundamental
do professor, mas agora com uma maior proximidade dos pais/encarregados de educação promo-
vida pelo ‘blogue’.

b) Utilização segura da Internet no 1º CEB

A investigação relacionada com a utilização segura da Internet foi levada a efeito numa turma
do 2º ano de escolaridade, constituída por 20 alunos com idades compreendidas entre os 7 e os 9
anos de idade. A metodologia foi de caráter qualitativo, com uma abordagem no âmbito da investi-
gação ação. Nas sessões de intervenção, a investigadora recolheu dados através da sua observação
participante, tendo ainda aplicado questionários aos alunos e aos respetivos pais com o objetivo de
comparar as opiniões que pudessem corroborar ou não o tipo de utilização efetuada na Internet.
Foram também realizadas entrevistas semiestruturadas junto de professores do 1º CEB do Agru-
pamento e a uma docente especialista (ERTE – Equipa de Recursos e Tecnologias Educativas do
Ministério da Educação) com o objetivo de se poder realizar uma melhor triangulação de dados.
Como seria de esperar, os alunos utilizavam a Internet com regularidade, sendo que 30% o fazia de
forma autónoma e sem que tivessem qualquer tipo de controlo… Contudo, os dados recolhidos
junto dos pais contradizem este dado ao afirmarem que exerciam um controlo nas atividades dos
seus filhos, o que pareceu não corresponder exatamente ao verificado no decorrer da investigação.
O que se verificou é que os alunos que possuíam computador em casa, com ligação à Internet,
estavam, na grande parte do tempo, entregues a si próprios, tendo manifestado possuírem contas
em redes sociais (Facebook) e terem ‘amigos virtuais’. Felizmente, o número de alunos ‘em risco’
era residual mas este facto não diminui a preocupação em inverter esta realidade. Dos restantes da-
dos recolhidos foi ainda possível verificar-se que, quer os professores quer os pais, não conheciam
ferramentas digitais que pudessem mitigar uma utilização insegura na Internet. Ou seja, a utilização
de filtros e de sítios/programas associados eram desconhecidos para ambos. Neste particular, a
investigadora teve a possibilidade de esclarecer dúvidas e de propor condutas que minorassem a
exposição daqueles alunos. No que diz respeito a questões que envolveram o processo de ensino/
aprendizagem, a utilização segura de sítios da Internet, previamente verificados pela investigadora,
veio a permitir que os alunos se sentissem motivados e envolvidos nas diferentes atividades pro-
postas. Em termos globais, pode concluir-se que a utilização deste recurso foi muito gratificante
para os alunos envolvidos. No entanto, tendo em consideração os aspetos comportamentais as-
sociados à utilização da Internet, a investigação veio demonstrar que ainda há muito a fazer para
que sejam adotados comportamentos seguros. Para o efeito, a investigação veio demonstrar que
se torna necessário promover mais sessões formativas e de esclarecimento para professores, pais e
alunos no que diz respeito a uma utilização segura da Internet.

Principais conclusões e considerações finais


Tendo em consideração os dados apresentados na secção inicial relativamente ao potencial e às
implicações das TIC no processo de ensino/aprendizagem e a relação direta com processos criati-
vos e inovadores, associados às atividades de investigação integradas nas PES e, tendo em conside-
ração que a população alvo corresponde a nativos digitais, não restam dúvidas que as TIC podem
e são, quando devidamente integradas e utilizadas em contexto educativo (espaços formais e/ou
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 35

não formais), ferramentas e recursos educativos capazes de proporcionarem novas e diferentes


abordagens que resultem em aprendizagens mais motivadoras, mais envolventes e, potencialmente,
mais significativas!
Houve a preocupação de serem apresentados resultados de inquéritos nacionais e internacionais
(União Europeia) no sentido de poderem ser o mais isentos possíveis e o que se verificou foi uma
concordância e congruência entre os mesmos. Para concluir, sem querer repetir argumentos ou
diretivas já mencionadas, importa refletir acerca das seguintes dimensões que emergem das conclu-
sões de Wastiau et al (2013):

• a importância dos responsáveis diretivos das escolas em assumirem as TIC como um recurso
fundamental a integrar nas práticas letivas tendo que acautelar um apoio técnico efetivo para os
docentes, funcionários e alunos;
• promover uma formação contínua de professores atualizada no âmbito das TIC;
• fomentar a utilização de dispositivos digitais móveis;
• integrar a utilização das TIC em espaços formais e em espaços não formais através de redes
wireless e de banda larga;
• pelo facto de alguns alunos terem referido que não dispõem de Internet nas suas casas, a Escola
surge como o local de eleição onde este acesso deve ser facilitado e estimulado;
• a importância cada vez maior e mais visível do poder e do impacto das redes sociais digitais!

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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 37

A TRAMA DA CRIAÇÃO DO JARDIM DE


INFÂNCIA JOÃO DE DEUS DE BRAGANÇA
EM 1915
Luís Castanheira ( luiscastanheira@ipb.pt)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Bragança

Resumo
O trabalho que aqui se apresenta pretende trazer para o espaço público educativo português,
elementos novos sobre o processo da criação de Jardins-escola João de Deus em Portugal, no-
meadamente a tentativa de criação e construção de um Jardim Escola João de Deus na cidade de
Bragança no ano de 1915. Com a implementação da 1ª republica em 1910, pretendia-se construir
uma nova sociedade e de um homem novo assente na educação a começar no jardim-de-infância.
A reforma da instrução primária em 1911 (Decreto-29/3/1911, in DG, Nº73) decretava a criação
de jardins-de-infância por todo o país. Inserido neste movimento, na cidade de Bragança, surgiu
a ideia de se criar o Ensino Infantil através Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João
de Deus e foi nesta base que se desenvolveu todo o procedimento inicial. A trama começa aqui
envolvendo figuras de destaque da cidade. O Jardim-Escola João de Deus e a Escola Infantil foram
criados como sendo a mesma instituição. Só mais tarde, em março de 1916, se diferenciaram como
entidades diferentes. Criou-se a Escola infantil pública inaugurada em 1917 tendo o Jardim-escola
servido apenas como pretexto. A História da Educação de Infância em Portugal não regista a exis-
tência de qualquer Jardim-Escola João de Deus na cidade de Bragança nem faz qualquer referência
sobre o assunto.
Indagamos a possibilidade da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ter
criado nesta data mais um Jardim-Escola no País, em Bragança, pois a ser verdade, seria digna de
registo a capacidade de alargamento e difusão que teve o projeto, quando sabemos, que era de ini-
ciativa particular e conhecedores da crise por que Bragança e o País passavam. Averiguei se de facto
38 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

se tratava do mesmo, ou se eram processos diferentes e se o poder central incentivava e apoiava a


construção de Escolas Infantis através da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de
Deus e se teria intenção em tomar como oficiais as Escolas Infantis criadas por esta Associação.

Palavras-chave: História da Educação; Jardim-de-infância João de Deus; Bragança; 1ª República.

Abstract
The work presented here aims to bring to the public Portuguese educational space new elements
about the process of creation of João de Deus kindergarten in Portugal, and in particular the at-
tempt of creating and building a kindergarten in the city of Bragança in the year 1915. With the im-
plementation of first Republic in 1910, it was intended to build a new society and a new man based
on education, starting in kindergarten. The reform of basic education in 1911 (Decree-29/3/1911,
in DG, paragraph 73) declared the creation of kindergartens throughout the country. Inserted in
this movement, in the city of Bragança, it was conceived the idea of creating the children’s Educa-
tion through Association of Mobile Schools and kindergartens Schools João de Deus and it was on
this basis that all the initial procedure developed. The plot starts here involving prominent figures
of the city. The private João de Deus Kindergarten and the official Kindergarten were created as
the same institution. Only later, in March 1916, they were differentiated as different entities. The
public kindergarten opened in 1917 having kindergarten served only as a pretext. The story of
the Childhood Education in Portugal does not mention João de Deus Kindergarten in the city of
Bragança or makes any reference on the subject.
Canvassed on the possibility of Association of Mobile Schools and kindergartens Schools, João
de Deus was created on this date as a kindergarten in the country, in Bragança, because to be true, it
would be worthy of record to analyze the capacity and the diffusion which took the project, when
we know, it was of private initiative and because of the crisis the country was going through. I have
ascertained if in fact it was the same, or if they were different processes and whether the central
Government encouraged and supported the construction of Kindergartens through the Associa-
tion of Mobile Schools and kindergartens Schools João de Deus and had intention in taking as
officers playschools created by this Association.
The research paradigm that underlies the study integrates a hermeneutical perspective, using
methodologies of qualitative analysis on multidimensional interpretation of the problems addres-
sed and on a document search heuristics.

Keywords: History of education; Kindergarten João de Deus; Bragança; 1st Republic.

Introdução
O objeto de investigação deste trabalho insere-se no seio da História da Educação de Infância,
através do estudo da tentativa de criação e abertura de um Jardim Escola João de Deus na cidade
de Bragança no ano de 1915. Trata-se de uma experiência em Educação de Infância influenciada
pelas ideias de modernidade pedagógica que se faziam sentir no País.
No ano de 1915 foi criada em Bragança uma Escola Infantil pública que começou a funcionar
em janeiro de 1917 e viria a funcionar até 1934 com 3 salas para crianças dos 3 aos 6 anos de idade
(Castanheira, 2006). Para compreendermos como foi o processo da criação desta Escola Infantil
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 39

de Bragança, temos de conhecer o processo de criação de um Jardim-Escola João de Deus na mes-


ma cidade e na mesma altura. O pensamento era criar o Ensino Infantil em Bragança, através do
Jardim-Escola João de Deus e foi nesta base que se desenvolveu todo o procedimento inicial. O
Jardim-Escola João de Deus e a Escola Infantil foram criados como sendo a mesma instituição. Só
mais tarde, em março de 1916, se diferenciaram como entidades diferentes.
O paradigma de investigação que sustenta o estudo integra-se numa perspetiva hermenêutica,
utilizando metodologias de análise qualitativa na interpretação multidimensional dos problemas
equacionados e numa heurística de procura de documentos.

O Jardim-Escola João de Deus de Bragança


Quem teve a iniciativa de trazer o Ensino Infantil para Bragança foi o Advogado e Deputado
Democrático no Congresso da República Dr. Artur Camacho Lopes Cardoso, que veio a ser no-
meado Presidente da Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Móveis e Jardins Escolas João
de Deus de Bragança. Este envolveu o Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal
do Concelho de Bragança – Carlos Alberto de Lima e Almeida, e o Diretor Escolar do Círculo de
Bragança – Augusto Ladeiro. Foram estas três individualidades da cidade que desencadearam todo
o processo.
O processo de criação do Jardim-Escola João de Deus foi iniciado: A Câmara de Bragança cedeu
o terreno e comprometeu-se a ajudar financeiramente a sua construção, além de prometer ajuda no
mobiliário e materiais; o projeto de construção do edifício foi realizado, mas a sua edificação nunca
chegou a concretizar-se apesar das diligências efetuadas, mas serviu de base ao processo que levou
à abertura, em 1917,da EIB. Esta foi criada em 6/11/1915, pensando-se que se tinha criado um
Jardim-Escola João de Deus. No entanto, o processo foi assente em toda a base legal de uma escola
oficial e tratado com o Ministério da Instrução Pública, como sendo, uma Escola Infantil oficial.
A História da Educação de Infância em Portugal não regista a existência de qualquer Jardim-Es-
cola João de Deus em Bragança neste período do nosso estudo, nem até aos dias de hoje. Sobre a
EIB apenas encontramos referência sobre a sua existência depois de 1926/27, (Gomes, 1977:82).
As investigações de Gomes, de Cardona (1997), e recentemente de Saraiva (2003) na sua tese de
Mestrado, Práticas Educativas nos Jardins-Escolas João de Deus, apenas se referem à criação de quatro
Jardins-Escolas João de Deus, como referimos anteriormente. Glória Saraiva refere-se à criação
no ano de 1927 de mais um Jardim-Escola João de Deus em Alhadas, no Concelho da Figueira da
Foz. Na região de Trás-os-Montes, segundo a mesma autora, apenas se construiu um, em Chaves,
no ano de 1948.
Indaguei a possibilidade da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ter
criado nesta data mais um Jardim-Escola no País, em Bragança, pois a ser verdade, seria digna de
registo a capacidade de alargamento e difusão que teve o projeto, quando sabemos, que era de ini-
ciativa particular e conhecedores da crise por que Bragança e o País passavam.
Durante a minha pesquisa, encontrei várias referências à intenção da criação de um Jardim-Es-
cola João Deus e de uma Escola Infantil. Fiquei na dúvida se as pessoas envolvidas no processo
de criação saberiam destrinçar que eram Instituições com o mesmo fim, mas de caráter diferente.
Procurei averiguar se de facto se tratava do mesmo, ou se eram processos diferentes e se o poder
central incentivava e apoiava a construção de Escolas Infantis através da Associação de Escolas
Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ou se teria intenção em tomar como oficiais as Escolas
Infantis criadas por esta Associação.
Naquele período, utilizava-se a expressão “Ensino Infantil” quando se referiam à Educação de
40 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Infância, e “Escola Infantil” ou “Jardim-Escola”, para se referirem ao Jardim-de-Infância, (Ar-


tº.21º. do Decreto-29/3/1911, in DG, Nº73).
Segundo o art. 52.º do Decreto-lei nº 2887, (DG, de 23/12/1916), as Câmaras Municipais e o
Governo podiam subsidiar as escolas de iniciativa particular, quando reconhecidamente úteis, des-
de que funcionassem em localidades onde não houvesse escolas oficiais do mesmo nível de ensino,
e em especial se destinassem ao Ensino Infantil. O Jardim-Escola João de Deus reunia todas estas
condições, bem como a cidade de Bragança, onde não havia nenhuma Escola Infantil. No entanto,
na altura em que se iniciou o processo da sua criação nesta cidade, esta legislação ainda não tinha
sido publicada. O processo iniciou-se em julho de 1915 e este Decreto foi publicado em dezembro
de 1916.
Na sessão da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Bragança (CECMB), de 22/7/1915
iniciou-se o processo para se criar em Bragança o Ensino Infantil. O Presidente deste órgão depois
de se pronunciar sobre as suas vantagens propôs a criação de um Jardim-Escola que se designaria
João de Deus, nos seguintes termos:

O Sr. Presidente que pôs em relevo as vantagens que para as crianças de Bragança
adviriam da criação de um Jardim-Escola onde elas, por meio de exercícios e jogos
próprios da sua idade, possam desenvolver-se fisicamente, condição essencial e indis-
pensável para o robustecimento da raça portuguesa. Que para tal fim carecíamos de
um edifício adequado e não podemos esperar tudo do poder central; necessário é pois,
que a iniciativa particular ou, na falta desta, a das Corporações Administrativas desse
também um impulso e prestasse a sua cooperação e, neste sentido, enviou para a mesa
a seguinte proposta: Sendo de reconhecida e indiscutível vantagem a criação de um Jar-
dim-Escola nesta cidade, mas atendendo a que este Município não está, infelizmente,
em condições de poder levar a efeito a construção do respectivo edifício, proponho
que a Câmara ofereça ao Exmº. Ministro da Instrução a quantia de 1.200$00 destinada
a auxiliar a mesma construção e o terreno preciso para aquele fim de modo que a esco-
la que será denominada João de Deus, comporte um número de crianças não inferior
a 50 (AHCMB, Lv.19, 1915:119f e v).

A Câmara deliberou sobre a criação da Ensino Infantil em Bragança no dia 28/8/1915, tomou
a responsabilidade pelo fornecimento de material e mobiliário e disponibilizou o edifício onde
funcionaria a escola provisoriamente enquanto não se construísse edifício próprio, para o efeito. A
escola era criada nos termos do Decreto nº134, de 15/9/1913, que atribuía competências às Câma-
ras Municipais para organizar os processos de criação, conversão ou supressão e transferência de
escolas de instrução primária, tornando-se necessário determinar as condições em que deviam ter
lugar. (AHCMB, Lv. 19, 1915:128f e v).
Nesta altura, ainda se pensava que a Escola Infantil a instalar era o Jardim-Escola João de Deus,
como se deduz da referência feita na Ata da sessão de 22 de julho, “escola que será denominada
João de Deus”.
O Inspetor Escolar fez, como lhe competia, as diligências com a Câmara e com o Ministério
para avançar com o processo. Na tentativa de resolver tudo da melhor forma possível, envia em 26
de agosto do mesmo ano ofício à Câmara a pedir a planta da casa onde ia ser instalada provisoria-
mente a Escola Infantil, (AHCMB, Lv. 19, 1915:130v).
O Inspetor Escolar Augusto Ladeiro tratou de organizar todo o processo de criação da escola
para enviar ao Ministério da Instrução. Alegando ordens superiores pediu à Câmara, uma declaração
dos compromissos que esta se obrigou a cumprir. O processo que o Inspetor estava a desenvolver
revelou-se ser para uma Escola Infantil oficial e não para um Jardim-Escola João de Deus. Estava a
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 41

ser criado pela Câmara e respeitava a legislação do Regulamento da Reforma da Instrução Primária
de 23/8/1911, ao referir-se explicitamente aos artigos 6º., 7º. 8º.,9º.,10º.,11º.,12º., e 13º., que são
precisamente aqueles respeitantes às condições das dependências da escola e respetivo equipamen-
to. Apareceu também um dado novo: as despesas com os professores e demais funcionários eram
pagas pela Câmara. No entanto, continuava evidente a referência à sessão de 22 de julho.

…em cumprimento de ordens superiores e a fim de dar andamento ao processo


da criação da Escola Infantil nesta cidade, que esta Câmara se digne declarar que se
responsabiliza por todos os encargos provenientes da criação da referida escola, casa,
mobília e material escolar, vencimentos dos professores e mais pessoal, etc, etc,; e que
relativamente à instalação provisória da escola, enquanto se não adquirir casa que satis-
faça todas as condições regulamentares, esta corporação se responsabiliza na - mesma
Ata - por uma preparação da proposta, bem como pela aquisição do respetivo mobi-
liário e utensílios escolares, tão completo quanto necessário para que tudo se aproxime
o mais possível das condições impostas pelos artigos 6º., 7º. 8º.,9º.,10º.,11º.,12º., e
13º., do Decreto regulamentar de 23 de Agosto de 1911. A Comissão deliberou res-
ponsabilizar-se por todos os encargos resultantes da criação da Escola Infantil nesta
cidade, tais como mobília e material escolar, e vencimentos de todo o pessoal; e quanto
à casa, enquanto não se construir um edifício próprio, para o qual esta corporação se
prontificou a contribuir com a quantia de 1.200$00, como consta na Acta da sessão
de 22 de Julho do ano corrente, se compromete também a fazer as necessárias obras
e adaptações na que esta Câmara possui para tal fim, bem como para adquirir o res-
pectivo mobiliário e utensílios escolares, em quantidade suficiente para o seu regular
funcionamento (AHCMB, Lv.19, 1915:145f e v).

O Presidente da CECMB, enviou ofício ao Inspetor Escolar com todos os dados pedidos,
(Correspondência expedida da CMB, 21/10/1915:fls.197). Mantinha os compromissos assumidos e
continuou a referir-se à deliberação tomada em 22 de julho, relativa à criação “Escola Infantil João
de Deus”.
Entretanto, o Presidente da CECMB, oficiou também ao Ministro da Instrução a pedir subsídio
para a construção do edifício nos seguintes termos:

…seja concedido um subsidio que baste para ocorrer às despesas com a construção
do edifício destinado à instalação de um Jardim-Escola nesta cidade que dele tanto
carece. Esta corporação está possuída do melhor desejo de impulsionar e desenvolver
a instrução popular e disto dá exuberantes provas oferecendo para tal fim a quantia
de 1.200$00, e lastima não poder por si só custear todas as despesas, mas é-lhe isso
vedado pelo estado do seu cofre (AHCMB, Lv. Correspondência expedida 1914-1935:197).

Encontrei uma referência ao Jardim-Escola na troca de correspondência entre o Presidente da


CECMB e a Associação de Escolas Móveis e Jardins Escolas João de Deus, informando esta ins-
tituição sobre o desenvolvimento do processo, das intenções e responsabilidades assumidas pela
Câmara em criar o Jardim-Escola João de Deus (AHCMB, Lv. Correspondência expedida, 1914-1935,
nº503, e nº506, de 1915). Esta correspondência tornou o processo mais claro para a CECMB,
porque ficou ciente de que se tratava de duas Instituições diferentes. O Presidente informou a
Associação que a Escola Infantil funcionaria em edifício adaptado enquanto não se construísse
o edifício novo do Jardim-Escola João de Deus, para o qual se transferiria, depois, o mobiliário e
material escolar existente.
42 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Em 18/11/1915 um Jornal local noticiou num artigo denominado “Escola Infantil ou Jardim-
-Escola” que, tinha sido criada uma Escola Infantil em Bragança no dia 6 de novembro, (Notícias
de Bragança, Ano IV, Nº 196, 18/11/1915:2). Não se tratava efetivamente do Jardim-Escola João
de Deus mas sim da EIB. Posteriormente iniciaram-se as obras de adaptação na casa onde veio a
funcionar (AHCMB, Lv. 19, 1915:194f).
Entretanto o processo de construção do edifício do Jardim-Escola João de Deus continuou.
Em dezembro de 1915, ficou acordado o local onde iria ser implantado. Seria no largo contíguo ao
Hospital Civil que fora recentemente construído (AHCMB, Lv. 19, 1915:184v).
Em março de 1916 instalou-se em Bragança a Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Mó-
veis e Jardins-Escolas João de Deus, formada pelas individualidades atrás referidas. O Jornal No-
ticias de Bragança (Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2) noticiava o assunto, fazendo referência num artigo
com título bem expressivo, “Jardim-Escola João de Deus”, à criação do Jardim-Escola e ao apoio
da Câmara para a sua construção.

Está definitivamente estabelecido a fundação nesta cidade de um Jardim-Escola


filiado àquela associação para educação de crianças de 4 a 7 anos. A Já se acha instalada
a Comissão Auxiliar da Associação nesta cidade. A Câmara Municipal deste concelho
oferece o terreno, um subsidio de 1.200$00 e a mobília e material escolar quando o
edifício estiver concluído, tomando a Associação a seu cargo todas as restantes despe-
sas de construção que estão calculadas em 7 contos aproximadamente, e bem assim o
custeio da escola.

O Inspetor Escolar Augusto Ladeiro referiu-se às intenções da criação deste Jardim-Escola,


diferenciando-o da Escola Infantil. Referiu explicitamente que o Jardim-Escola era de iniciativa
particular e pertencente à Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus, onde a
Câmara e o Estado não tinham interferência, ao contrário da escola oficial infantil.

Mercê da iniciativa particular, uma comissão auxiliar, por intermédio da benemérita


associação das escolas moveis e Jardins- Escola – João de Deus, com o generoso im-
pulso da Câmara, projecta a construção de um edifício e criação do Jardim-Escola João
de Deus que particular e independentemente da escola oficial infantil, com carácter
diferente desta, embora tendente ao mesmo fim, devera também funcionar naquele
edifício que será construído nesta cidade admitindo crianças dos 4 ate aos 9 anos de
idade.[…], Pertence à associação das escolas móveis João de Deus, onde não tem in-
terferência nem a Câmara nem o estado (Ladeiro, AHCMB, Lv. 20, 1917:156 f e v).

Ladeiro esclarecia que era frequente haver quem confundisse creche com asilo, mas o que era
mais grave era confundir Escola Infantil com Jardim-Escola João de Deus (Ibid. 152v).
A divisão do processo, surgiu, em nosso entender, quando a Câmara se apercebeu que não ti-
nha qualquer tipo de interferência na gestão do Jardim-Escola João de Deus por ser de iniciativa
particular.
A partir daqui, os processos seguiram caminhos diferentes. A EIB seguiu o percurso de prepa-
ração para a sua abertura que veio a acontecer em janeiro de 1917. O Jardim-Escola João de Deus
continuou com o objetivo claro de construir um edifício próprio. Acabamos por encontrar refe-
rência a duas Instituições de Educação de Infância em Bragança no período da primeira República.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 43

Projeto do Jardim-Escola João de Deus em Bragança


João de Deus Ramos sabia que não era fácil abrir uma escola numa altura de crise no País como
a que se vivia, muito mais espinhoso seria abrir um Jardim-Escola. Seria essencial a ajuda da ini-
ciativa particular e das Corporações Administrativas, além do Poder Central. Por isso, colocou na
Comissão Auxiliar as principais figuras da cidade.
A Associação procurou nomear para a Direção da Comissão Auxiliar, pessoas ilustres e com
poder, pertencentes à elite da cidade, conscientes que isto facilitaria o processo.

Já se acha instalada a Comissão Auxiliar da Associação nesta cidade, que é cons-


tituída pelos Exmos. Srs. Dr. Lopes Cardoso, Presidente, Dr. Henrique Paz Júnior,
secretário, Alberto Franco, tesoureiro, e vogais Olímpio Dias, engenheiro e Augusto
Ladeiro, Inspector Escolar e antigo pensionista do Estado para o estudo do método
Froebel, em que se tornou uma verdadeira competência. Esta comissão agregou os Srs.
Carlos Alberto Almeida, Presidente da Comissão executiva da Câmara e José António
Rodrigues de Paula, conceituado negociante (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias
de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2).

Surpreendido fiquei também, por saber que João de Deus Ramos teve participação direta no
projeto da criação deste Jardim-Escola.

Não menos digno de louvor e da nossa gratidão é o ilustre deputado João de Deus
Ramos, filho do emérito Educador João de Deus e que tanto se tem empenhado pela
vulgarização do seu método e que tem hoje um lugar de destaque na orientação da ins-
trução publica pela simpatia com que acolheu a iniciativa da criação do Jardim-Escola
de Bragança e pela boa vontade com que auxiliou a sua realização (“Jardim-Escola João
de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº212, 9/3/1916:2).

João de Deus Ramos poderia ter sido influenciado por alguém com contactos em Bragança
ou foi ele próprio que moveu influências para alargar o campo de ação da sua Associação. Essa
influência, em nosso entender, foi exercida por Artur Lopes Cardoso, deputado no Congresso
pelo Partido Democrático e muito ligado às causas da educação, que viria a ser o Presidente da
Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Moveis e Jardins-Escolas João de Deus de Bragança.
Lopes Cardoso chegou mesmo a deslocar-se a Coimbra para tratar diretamente com João de Deus
Ramos sobre aspetos do processo, como podemos constatar através da troca de correspondência
entre a CECMB e a Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus (AHCMB, Lv.
Correspondência expedida, 1914-1935, Nº. 503, 1915).
O Jardim-Escola reunia todas as condições para ser um sucesso. A Associação desempenhou,
entretanto, um papel importantíssimo de divulgação do Ensino Infantil. Nas primeiras páginas de
alguns jornais apareciam alusões à sua importância, prestando dessa forma um importante contri-
buto de divulgação. João de Deus Ramos deve ter dado instruções à Comissão da Associação para
a divulgação da importância e das vantagens da educação das crianças dos quatro aos sete anos de
idade, como ia fazendo pelo País. Começava a tomar-se consciência da importância de prestar o
máximo de esclarecimentos sobre esta nova forma de estar na educação e de estar na escola, pro-
curando assim divulgar e aumentar a rede de Jardins-Escolas João de Deus. Sobre o assunto um
periódico local noticiava:
44 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

A Escola Infantil ou Jardim-Escola, recebe as crianças de ambos os sexos dos 4 aos


7 anos de idade. É neste período de tempo que a criança recebe as primeiras impres-
sões da vida banhadas pelos primeiros lampejos da realidade. E essas primeiras im-
pressões ficam sempre, jamais são esquecidas. São a base do seu futuro carácter como
cidadão, a origem ou causa do seu destino como homem! È portanto o período mais
difícil da sua vida, o mais complexo da sua educação. Pestalozzi, o grande pedagogo
que impôs leis no seu tempo, dizia: confiai-me a educação das crianças dum povo que
eu farei a felicidade desse povo” (“Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de Bragança,
Ano V, Nº. 212, 9/3/1916).

Nas reuniões da CECMB também se discutiu a importância do Ensino Infantil, e a formação


do Homem Novo. O Presidente pôs em relevo as vantagens da criação de um Jardim-Escola, “as
crianças por meio de exercícios e jogos próprios da sua idade, podiam desenvolver-se fisicamente,
condição essencial e indispensável para o robustecimento da raça portuguesa”, (AHCMB, Lv. 19,
1915:119f),
A educação que as mães davam em casa não era suficiente para formar o Homem que os Repu-
blicanos ansiavam, uma vez que estas não se encontravam preparadas e a grande maioria nem ler
e escrever sabiam.

…A origem da nossa crise está no lar. E dizemos que está no lar, porque, sendo a
mãe a verdadeira educadora, a educadora por excelência, nas tenras idades, a lógica dos
factos, insofismável e fria na sua expressão, diz-nos muito claramente que a mulher
entre nós não está preparada para a nobre tarefa de esposa e mãe (“Jardim-Escola João
de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº 212, 9/3/1916:2).

A imprensa local desempenhou um importante papel de sensibilização da população sobre os


benefícios das crianças em frequentarem o Ensino Infantil, como preparação para a entrada na
Escola Primária e o combate ao analfabetismo,

A Escola Primária, recebendo crianças dos 7 aos 14 anos de idade, viciadas e com
um carácter verdadeiramente formado pelo influxo educativo do meio em que vive,
dificilmente pode corrigi-las em absoluto. É portanto à Escola Infantil, a esse jardim
da escola, termo este que tão bem simboliza a sua missão, que está confiada a nobre
tarefa, o sublime meio de chegar a fins aproveitáveis e úteis (Ibid.).

Na época, realçava-se o facto de Bragança ser a primeira cidade da província a ter Ensino In-
fantil.
Depois da Comissão da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus estar
instalada, efetuou as diligências necessárias para a abertura do Jardim-Escola. Em 22/3/1916, a
pedido desta entidade, a CECMB disponibilizou a verba prometida de ajuda para a edificação do
edifício. Em dezembro do mesmo ano, a Comissão ainda não tinha recebido a quantia destinada e
pedia à Câmara novamente para que lhe fosse entregue. Solicitou também mais apoio uma vez que
a crise do País e da cidade era grande e nesse ano os preços subiram 50%, tanto em materiais de
construção como em mão-de-obra. A Câmara concordou em ajudar no aumento do dispêndio da
obra e comprometeu-se também a custear as despesas com o mobiliário e o material escolar, tudo
orçamentado em oitocentos escudos (AHCMB. Lv. 20, 1916:109 f e v).
A população ficou na expectativa dos resultados, para obter melhores conclusões sobre a EIB.
A este propósito noticiava-se:
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 45

Bem merecem todos os encómios os promotores de tão importante melhoramento


para Bragança, e de esperar é que a Comissão Auxiliar empenhe todo o seu zelo para
que ele se torne em breve uma realidade” (“Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de
Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2).

Muitas pessoas da sociedade bragançana queriam estar ligadas a este feito de inovação para a
cidade.

Para evitar que, a propósito de tão útil melhoramento, os conhecidos intrigantes es-
tendam suas redes, que até agora tem recolhido sem peixe, aqui fica esclarecido que ele
se deve unicamente aos esforços da Comissão Auxiliar dos Jardins e Escolas Móveis
«João de Deus» nesta cidade” (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança,
Ano V, Nº.255:1).

O Arquiteto Raul Lino foi o autor do projecto do Jardim-Escola João de Deus de Bragança, à
semelhança do que acontecia no resto do País

Tivemos o ensejo de ver a planta elaborada pelo distinto arquitecto Raul Lino, que
é um verdadeiro primor, e assim a construção do edifício, além dos inestimáveis servi-
ços que vai prestar à infância brigantina, muito contribuirá a embelezar o local que lhe
for destinado e que parece estar já definitivamente escolhido (“Jardim-Escola João de
Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2).

Faço referência ao projeto do Jardim-Escola João de Deus de Coimbra em 1911 por pensar ser
a sua traça foi igual ao projetado para Bragança.

O projecto deste primeiro Jardim-Escola João de Deus resultou do trabalho con-


junto de João de Deus Ramos e Raul Lino. Da autoria do primeiro são as bases peda-
gógicas, as exigências funcionais e de programação e alguns conceitos de estética e in-
serção urbanística; Raul Lino pertence a concepção arquitectónica, o desenvolvimento
do projecto e o desenho do mobiliário. Desta experiência conjunta resultaram os edi-
fícios de outros Jardins – Escola como os da Figueira da Foz e Alcobaça (inaugurados
em 1914) e o da Av. Pedro Alvares Cabral em Lisboa (aberto em Junho de 1915) (Beja
et al., 1985: 86).

A Comissão Auxiliar da Associação depois de ter o Processo e Caderno de Encargos organi-


zado, procedeu à marcação da data de arrematação da obra, cuja base de licitação foi de 7490$00.
Depois de ir a concurso por três vezes, por falta de propostas, apenas foi adjudicada a obra de pe-
dreiro cuja base de licitação mínima foi de 2770$00, no dia 29/5/1917. Encontrei referências aos
anúncios da arrematação publicados no Jornal Notícias de Bragança (Ano VI- Nº.259, de 8/2/1917:3,
nº 269, de 19/4/1917:3 e nº 270, 26/4/1917:2).
O Inspetor Escolar do Círculo de Bragança Augusto Ladeiro era o vogal da Associação e res-
ponsável do processo da obra, e de toda a logística. No dia 2/5/1917 enviou um ofício à CECMB
(AHCMB, Lv. de correspondência, nº.1050, nº.6, fls.934), pedindo os 800$00 que a Câmara havia pro-
metido, tendo dado conhecimento da adjudicação da obra de pedreiro, e que esta, deveria começar
ainda no mesmo mês, como os serviços de terraplanagem e abertura dos caboucos, para constru-
ção de um muro e outros serviços indispensáveis (AHCMB, Lv. 20, 1917:187f). Realizada a arre-
matação das obras de pedreiro pretendia-se a seguir efetuar a arrematação da obra de carpinteiro
46 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

(Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº 271, 3/5/1917:2), que não chegou a
efetuar-se. Não encontrei qualquer registo ou documento que provasse que as obras de construção
do Jardim-Escola João de Deus tivessem sido iniciadas.
As diversas diligências efetuadas para o conseguir não foram suficientes para materializar a sua
construção e abertura.

Considerações finais
Em meu entender, várias poderão ter sido as causas da não abertura do Jardim-Escola João de
Deus em Bragança. Numa análise superficial, concluo que a causa mais provável, terá sido de or-
dem financeira devido à crise geral que se desenhava no País, que não possibilitou que o projeto de
João de Deus tivesse sido mais que um pequeno eco em Bragança. O facto de o Jardim-Escola ser
particular, acarretaria uma maior despesa para as famílias, o que também terá contribuído para o
seu insucesso. Terá sido também por este motivo que até 1927 não foi criado qualquer Jardim-Es-
cola João de Deus em Portugal, continuando a existir somente os quatro anteriormente referidos.
A Comissão da Associação de Escolas e Jardins-Escolas João de Deus de Bragança, talvez por
conselho de João de Deus Ramos, terá mandado parar a obra como teria feito noutros pontos do
País, devido precisamente à falta de apoio do Governo que não conseguiu cumprir os compromis-
sos por falta de verba e também que os apoios municipais não bastavam.
A intenção do Governo em subsidiar a construção de escolas de iniciativa particular, em espe-
cial as que se destinavam ao Ensino Infantil que foi regulada pelo Decreto nº 3551, (DG, Nº. 199,
de 15/11/1917), ainda não teve aplicação por falta de financiamento estatal, devido às inevitáveis
consequências da crise económica do País.
O facto de João de Barros ser o Secretário-geral do Ministério da Instrução Pública, em 1915
e adepto confesso dos Jardins-Escolas João de Deus, terá contribuído para a tentativa de tornar
oficiais os Jardins-Escolas João de Deus. O Governo terá perdido este interesse com a saída do
Ministério de João de Barros em 1916, afetando assim irremediavelmente a construção do Jardim-
-Escola em Bragança. Neste sentido, temos de perceber o enorme esforço feito por João de Deus
Ramos, bem como dos membros da CECMB e da Comissão da Instalação da Associação, na ten-
tativa de criação do Jardim-Escola em Bragança, devendo entender-se esta questão de uma forma
mais alargada, num contexto nacional, e ter-se em linha de conta a quase inexistência e criação de
Escolas Infantis em Portugal durante esse período.
Porém, a explicação mais plausível e aquela em que mais acredito parece-me que vai mais além
e que está diretamente relacionada com o objeto do nosso estudo que é a EIB, aliada às hipóteses
anteriores: Seria ambicioso demais para uma cidade pequena como Bragança promover a coexis-
tência das duas Instituições, uma particular e outra oficial. A particularidade de um dos vogais da
associação ser também o Inspetor Escolar de Bragança também poderá ter exercido alguma in-
fluência, uma vez que este, ao mesmo tempo, fazia diligências para se abrir a Escola Infantil oficial.
Conjeturo que se o Jardim-Escola se tivesse construído e aberto ao público, a Escola Infantil teria
deixado de existir em favor deste.
Ao mesmo tempo que se valorizava o Jardim-Escola, valorizava-se também a Escola Infantil que
estava a ser criada pela Câmara Municipal. Não posso deixar de concordar que o Jardim-Escola João
de Deus contribuiu de forma indireta para a criação da EIB., através da divulgação feita nos jornais
da importância e vantagens do Ensino Infantil, e do agitar das consciências das autoridades locais.
Todavia, este projeto não foi em vão pois teve um papel importantíssimo na divulgação da impor-
tância do Ensino Infantil em Bragança, e desencadeou o processo que levou à abertura da EIB, dan-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 47

do, assim, oportunidade às crianças Bragançanas de frequentarem esta nova e moderna escola. Fica
assim merecidamente com o seu lugar na História da Educação de Infância e esclarecida toda a trama!

Bibliografia e Fontes
Cardona, Maria João (1991). Para a História da Educação de Infância emPortugal: O discurso oficial 1834.1990). Porto: Porto Editora.
Carvalho, Isabel de Lemos (1996). A Educação Pré-escolar em Portugal.Lisboa: Ministério da Educação.
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Disssertação de Mestrado. Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa;
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Deusdado, Ferreira (1995). Educadores Portugueses. Porto: Lelo & Irmão Editores.
Dionisio, Sant`Anna (1945). Jardins de Infância. Lisboa: Seara Nova.
Estrela, Maria Teresa (2002). Investigar em Educação. Cruz Quebrada:Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Ferreira, Maria Manuela (2000). Salvar Corpos, Forjar a Razão. Contributo para uma análise crítica da criança e da infância como construção social
em Portugal 1880-1940). Lisboa Instituto de Inovação Educacional;
Gomes, J. Ferreira (197). A Educação Infantil em Portugal. Coimbra: Livraria Almedina.
Gomes, J. Ferreira (1977). Um projecto de «Escola Infantil» Elaborado por um pedagogo português nos fins do século XIX. Coimbra: Fa-
culdade de Letras, Imprensa de Coimbra Limitada.
Kuhlmann, Moysés (2002). Os intelectuais na História da Infância. São Paulo: Cortez Editora.
Sampaio, J. Salvado (1968). O Ensino Infantil em Portugal. Boletim Bibliográfico e Informativo N.º 8. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian Centro de Investigação Pedagógica.
Saraiva, Glória (2003). Práticas Educativas nos Jardins Escolas João de Deus: estudo exploratório 1940-1989. Tese de Mestrado. Universidade
do Minho.
Urçat, Liliane (1976). Uma escola Pré Primária. Lisboa: Livros Horizonte.

Fontes Impressas
Legislação:
Decreto – (DG Nº 25, 3/11/1910);
Decreto – (DG Nº 73, 29/3/1911);
Programa – (DG Nº 198, 25/8/1911);
Regulamento – (DG Nº 198, 25/8/1911);
Diário do Governo Nº 116 – 18/5/1912;
Decreto nº 134 – (DG Nº 216, 15/9/1913);
Lei 233 – (DG Nº 11, 7/7/1914);
Decreto nº 1843 – 20/8/1915;
Decreto nº 1843 – 30/8/1915;
Lei 410 – (DG Nº 181, 9/9/1915);
Lei 449 – 18/9/1915;
Decreto nº 1927 -2/10/1915;
Decreto nº 2858 – 29/11/1916;
Decreto nº 2213 – 10/12/1916;
Decreto nº 2387 – 12/5/1916;
Lei 489 – 18/9/1916;
Decreto nº 2887 – (DG Nº 255, 23/12/1916);
Decreto nº 2947 – (DG Nº 11, 20/1/1917);
Decreto nº 3551 – 15/11/1917;
Decreto nº 3756 – 16/1/1918;
Decreto nº 4594 – 13/7/1918;
Decreto nº 6137 – 29/8/1919

Jornais e revistas
A Madrugada (1920) – Biblioteca Pública Municipal do Porto (BPMP) -XI-3-21;
Concelho de Bragança – (1911)
Escola Transmontana – (1912)
Jornal de Bragança – (1911)
48 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Leste Transmontano – (1920)


Notícias de Bragança – (1912-1917)
Notícias do Nordeste – (1910-1911)
O Bragançano – (1919) – BPMP
O Legionário Transmontano – (1914-1917)
O Montanhês do Norte – (1912-1913)
O Transmontano – (1915-1917)
Pátria Nova – (1908-1915)
Saboreano – (1922)
Terras de Bragança – (1921)
O Transmontano – (1915-1917)

Fontes Manuscritas
Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Bragança (AHCMB):
Atas do Senado da Câmara Municipal de Bragança -Livro nº1 de 7-08-1913 a 30-11-1921);
Atas da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Bragança: Livros nº 19 a nº31
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 49

DISEÑO METODOLÓGICO PARA LA PROPUESTA


DE POLÍTICAS EDUCATIVAS IGUALITARIAS
CON ALLUMNADO DE PRIMER GRADO DE
SECUNDARIA EN EL ESTADO DE MICHOACÁN
Elva Morales Robles (more11_03@hotmail.com)
Universidad de Salamanca

Resumen
En este trabajo se presenta una estrategia metodológica mixta, con la finalidad de mostrar el
empleo que se hace respecto al método combinado y que ha permitido abordar la temática sobre
igualdad y educación sexual con alumnado de primer grado de secundaría en el Estado de Michoa-
cán. Así pues en este artículo se exponen los criterios empleados en cuanto a la metodología se-
guida, la muestra retomada, los instrumentos aplicados, los procedimientos, y la estrategia seguida
para elaborar el análisis e interpretación de la información. A partir de la combinación de análisis
cualitativo y cuantitativo se pretende tener una visión más amplia sobre la temática estudiada para
realizar propuestas de políticas educativas que se ajusten a la realidad del alumnado en cuestiones
de educación sexual y equidad de género.

Palabras clave: educación sexual, género, adolescencia, percepciones, políticas educativas.

Abstract
This paper presents a mixed methodological strategy, with the goal to show the use it made at
of employment the combined method and that has allowed the thematic deal with regarding sexual
50 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

education and gender equality by the students of first grade of secondary education in the State of
Michoacan. So in this article it provides a detailed explanation the criteria set forth in terms of the
methodology followed, the selected samples, the instruments applied, procedures, and the strategy
to develop the analysis and interpretation of information. As of the combination of qualitative
and quantitative analysis expected have a broader view of the subject studied with respect to for
educational policy proposals that conform to the reality of students in issues of sex education and
gender equity.

Keywords: sexual education, gender, adolescence, perceptions, educational policie

Introducción
En México los estudios sobre género en educación constituyen una línea de reciente creación,
ya que solo en la década de los noventa surgen los ejes transversales1 en educación, los cuales con-
templan la incorporación al sistema educativo de los derechos humanos, la perspectiva de género,
el desarrollo humano, el medio ambiente, la construcción de ciudadanía, y la no violencia, entre
otros (Delgado, 2003, p. 485).
Las reformas educativas establecidas con posterioridad tienen siempre en cuenta estos ejes tras-
versales. Así, entre los años 2007-2012, la Secretaria de Educación Pública de México (SEP) estab-
lece el Programa Sectorial, verdadero mapa rector de la política nacional de igualdad. Dentro este
Programa, la estrategia 3.5 del Eje Rector “Igualdad de Oportunidades” manifiesta el compromiso
de promover acciones para, mediante la transversalidad de la perspectiva de género, fomentar una
vida sin violencia ni discriminación y una auténtica cultura de la igualdad.
Estas estrategias políticas muestran el esfuerzo que a nivel institucional se está realizando con
la intención de mejorar las situaciones de desigualdad que aquejan a México. Sin embargo, tales
estrategias no han respondido eficazmente a los nuevos retos educativos, políticos y socioeconó-
micos. Para conseguir enfrentar estos desafíos resulta necesario, en primer lugar, identificar cuáles
son las percepciones, opiniones, valores, etc. que permiten que los y las adolescentes legitimen la
desigualdad entre hombres y mujeres, y, en segundo lugar, examinar en qué medida los libros de
texto promueven/dificultan la sexualidad responsable y la equidad de género. El abordaje de estas
dos cuestiones nos lleva a proponer en este artículo un diseño metodológico mixto2.
El articular la perspectiva de equidad de género con la educación es una de las condiciones nece-
sarias para lograr la justicia social y un instrumento real y cotidiano de democracia, como diversos
estudios demuestran (Delgado, 2003; González & Villaseñor, 2010; Guzmán, 1997; Tarabini &
Bonal, 2012; Valdés, 2013).
El presente artículo se organiza en cuatro apartados. En el primero se aclaran las definiciones
de las temáticas abordadas y se efectúa una breve descripción sobre la situación política y social del
Estado de Michoacán. El segundo apartado contiene información sobre la metodología empleada:
los objetivos, las hipótesis y el diseño metodológico. En el tercero se presenta el diseño sobre el
análisis y la interpretación de resultados, y en el último apartado se señalan las conclusiones más
relevantes de este artículo.

1
Ruiz (2012, p. 52) refiere que en el año 1993 se incluyen unas directrices en el marco de una política educativa que tenga mayor alcance en el país
(Acuerdo Nacional para la Modernización de la Educación Básica, ANMEB).
2
Este tipo de metodologías tiene un reconocimiento creciente, puesto que han sido identificadas como elementos clave para mejorar la investigación
de las Ciencias Sociales, (Faber & Scheper, 2003; Gorard & Taylor, 2004).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 51

Contextualización Teórica
En esta investigación el género es considerado como una categoría de estudio que hace refe-
rencia a las construcciones socioculturales elaboradas alrededor de los sexos hombre y mujer, para
atribuirles ciertos rasgos, valores y patrones de comportamiento propios de cada género (femeni-
no/masculino). Estas construcciones socioculturales se traducen en la mayor parte de los países en
desventajas sociales para uno y otro sexo (Barberá, 2004; Blanco, 2006; Chávez, 2004; Checa, 2005;
Delgado, 2003; González & Villaseñor , 2010; Lamas, 1995; Szasz, 1998).
Por su parte, la perspectiva de género implica reconocer que un aspecto es la diferencia sexual, y
otro las atribuciones, ideas, representaciones y prescripciones sociales que se construyen tomando
como referencia la diferencia sexual (González & Villaseñor, 2010). Así, la perspectiva de género
se convierte en una herramienta social que permite identificar situaciones de inequidad, y, además,
proponer alternativas y soluciones para deconstruir y reconstruir los paradigmas teóricos existen-
tes.
La investigación realizada por Delgado (2003), que analiza una gran variedad de estudios exis-
tentes en México sobre género y educación, evidencia la necesidad de seguir contribuyendo a la
generación de estudios con perspectiva de género desde el ámbito académico. Los 257 estudios so-
bre género y educación realizados en el periodo 1992-2002, divididos por Delgado en seis campos3,
reflejan que existe una tendencia a que el sistema escolar reproduzca patrones de comportamiento
estereotipados, donde el género masculino recibe mayor valor que el femenino.
Delgado (2003) también revela en su estudio la escasez de investigaciones que analicen los libros
de texto y los discursos que tienen las y los adolescentes sobre esta temática a nivel de secundaria
y de bachillerato. En España se han encontrado diversos estudios sobre el análisis de los libros
de texto con perspectiva de género (Blanco, 2000, 2003; s/f; Espigado, 2004; Garreta & Careaga,
1987; Lomas, 2002; López-Navajas, 2012; Mínguez & Beas, 1995; Sánchez, 2012; Subirats, 1991).
En México solo se ha podido acceder a dos artículos en los que se hace referencia a este tipo de
estudios: SEP, 2001 de telesecundaria y Vázquez, 2001 a nivel pre-escolar.

Descripción breve de la situación política y económica del Estado

Michoacán de Ocampo es un Estado caracterizado por un tejido social en el que han existido y
existen tendencias muy contrapuestas: ha sido cuna de corrientes político-ideológicas reivindicati-
vas, y a su vez escenario de movimientos con tendencias conservadoras y religiosas (movimiento
cristero) debido a que la mayor parte de la población es católica (Nava, 1987; Pérez, 1995). Otro
aspecto que caracteriza a este Estado mexicano es la diversidad de culturas que lo conforman, con
presencia de grupos étnicos con costumbres e incluso lenguas diferentes (purhépecha, náhuatl,
otomí-mazahuas).
Todos estos componentes asociados a una política económica neoliberal y a las estrategias de
desarrollo que se han llevado a cabo, tanto en todo México como en Michoacán, están siendo de-
terminantes en los conflictos y problemáticas que se vienen arrastrando desde hace varias décadas,
recrudeciéndose en la actualidad con un nivel de violencia que ha puesto en tela de juicio la actua-
ción de las instituciones públicas, fracturando así nuestra democracia (Guerrero, 2014; Maldonado,
2012; Nava, 1987; Pereyra, 2012; Pérez, 1995)4.

3
Políticas públicas, sujetos, currículo, acceso y permanencia en los diferentes niveles del sistema educativo, nuevas tecnologías y otros campos.
4
Las problemáticas relacionadas con el narcotráfico se recrudecieron durante el periodo de transición política y las estrategias empleadas por el
gobierno federal fueron combatir al narcotráfico militarizando algunos Estados entre ellos Michoacán.
52 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Contextualización Metodológica

Pregunta de investigación, objetivos e hipótesis

La brecha de género entre hombres y mujeres en el Estado de Michoacán de Ocampo ha hecho


que el Gobierno —en particular la Secretaría de La Mujer y la Secretaria de Educación Pública—
ponga en marcha una serie de estrategias para intentar contrarrestar las relaciones de subordinación
y desigualdad.
Derivada de estas estrategias nace la presente investigación, que se centra en dos cuestiones de
investigación básicas: ¿Cuáles son las percepciones, creencias y valores que permiten que los y las
adolescentes legitimen la desigualdad entre hombres y mujeres? ¿Fomenta/obstaculiza la educa-
ción secundaria en el Estado de Michaocán la igualdad de oportunidades, derechos, recursos, etc.
entre hombres y mujeres a través de los libros de texto?
Con la finalidad de responder a estos dos fundamentales interrogantes establecemos los siguien-
tes objetivos generales y específicos.

Objetivos generales:

• Describir y analizar las percepciones que legitiman la desigualdad entre hombres y mujeres con
el alumnado de primer grado de secundaria.
• Analizar si los libros de texto de primer grado de secundaria promueven o no la educación se-
xual y la igualdad de género.

Objetivos específicos:

1. Describir y examinar las opiniones y conocimientos que tiene la población juvenil del Estado de
Michoacán sobre la condición y posición de las mujeres en la trama de las relaciones y jerarquías
de género.
2. Describir y analizar las diferencias que existen en el discurso sobre la sexualidad y la equidad de
género entre el alumnado que vive en zonas urbanas, rurales e indígenas.
3. Describir las diferencias entre hombres y mujeres respecto a la percepción sobre educación
sexual y equidad de género.
4. Describir y examinar los contenidos, el texto y las imágenes/ilustraciones de los libros de texto
de primer grado de secundaria, que entrega el estado de manera gratuita a los centros educativos.

Hipótesis

Con el fin de establecer algunas conjeturas o supuestos iniciales a las preguntas de investigación
se formulan las siguientes hipótesis:

• A mayor información/formación, menor legitimidad de la desigualdad basada en la diferencia


sexual entre hombres y mujeres.
• El alumnado de los centros educativos que se encuentran en zonas urbanas promueven prácti-
cas sociales más igualitarias.
• El sexo del alumnado determina la percepción sobre sexualidad y equidad de género.
• La información e imágenes que se promueven en los libros de texto de primer grado de se-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 53

cundaria favorecen/promueven que el alumnado sea crítico y reflexivo sobre las situaciones de
desigualdad por razón de sexo.

Diseño metodológico
Existe un reconocimiento creciente en la comunidad científica acerca de la necesidad de utilizar
métodos combinados en investigación, puesto que han sido identificados como elementos claves
para mejorar la investigación tanto en Ciencias Sociales como en Educación (Gorard & Taylor,
2004). Así mismo, y dado que los fenómenos sociales suelen ser multifacéticos, el uso de perspec-
tivas mixtas aquí adoptado es realmente apropiado para evitar fragmentaciones innecesarias (Faber
& Scheper, 2003; Sánchez, 2015). La combinación metodológica consiste, pues, en utilizar varios
tipos y fuentes de datos, lo que fortalece las conclusiones y a su vez nos permite plantear nuevas
líneas de investigación (Bericat, 1998).
En consecuencia con estas premisas, y teniendo en cuenta los objetivos generales y específicos
que se plantean en este estudio, se ha optado por un diseño que contempla un modelo mixto,
combinando así estrategias metodológicas cuantitativas y cualitativas, lo que nos permitirá obtener
una visión más amplia sobre la temática estudiada. Por ello se realiza en esta investigación una
combinación de datos derivados de las entrevistas realizadas a los grupos de discusión, de las auto-
descripciones breves y del análisis de los libros de textos.
La estrategia seguida en un primer momento es de corte cuantitativo, empleando para ello téc-
nicas de análisis de tipo descriptivo5, mediante las cuales se realiza una codificación de los datos
obtenidos —a través del programa informático ATLAS.ti y el programa estadístico SPSS versión
18 para Windows—. De este modo podremos explorar el contenido expresado acerca de cada uno
de los aspectos a investigar, (Gil, 1992, p. 203).
Posteriormente se emplearon estrategias de carácter cualitativo, con un diseño analítico-explica-
tivo, mediante la presentación de citas textuales que contienen las ideas claves del discurso-conteni-
do (Bardin, 1991; Gil, 1992; Mena & Murillo, 2006; Porta & Silva, 2003; Valles, 1999).
Los resultados obtenidos desde ambas perspectivas, cuantitativa y cualitativa, se integrarán para
obtener una visión más amplia sobre las percepciones del alumnado en lo que concierne a la equi-
dad de género y la educación sexual, así como en lo referido a la promoción que se realiza en los
libros de textos acerca de estos aspectos (Bericat, 1998; Hernández y otros, 2006; Sánchez, 2015)

Variables

En esta investigación se establecen algunas variables. Sin embargo cabe destacar que al emplear
un método deductivo/inductivo estás no pueden ser definidas en su totalidad, puesto que surgen
a partir de las categorías de análisis derivadas de la reducción de datos. Entendemos, pues, por va-
riables independientes aquellas que describen las características de la muestra (Hernández y otros,
2006). En este trabajo se plantean las siguientes:

• Sexo
• La zona territorial
• Libro de texto

5
Se emplea la técnica de análisis de contenido descrita por Bardin (1991)
54 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Las variables dependientes, como su nombre indica, son las que dependen de otras para ser
explicadas. Se tuvieron en cuenta variables dependientes que se plantean en las hipótesis.

• Percepciones sobre la sexualidad.


• Percepciones sobre la equidad de género.
• Información sobre personajes representativos

Muestra

En la recogida de información de grupos de discusión y de auto-descripciones breves, se orga-


nizaron diez grupos de 6 estudiantes cada uno, de los centros educativos de secundaria ubicados
en distintos municipios del Estado de Michoacán, en sus dos modalidades: técnicas y generales.
Participaron en total 60 adolescentes de primer grado de secundaria, 30 hombres y 30 mujeres. La
muestra correspondiente a los libros de texto es de 4.
Para la elección de la muestra de grupos de discusión y auto-descripciones breves se toman en
cuenta los criterios de homogeneidad-heterogeneidad, de accesibilidad, y de economía descritos
por Valles (1999).
La homogeneidad se traduce en la selección de personas de primer grado de secundaria de
centros educativos incorporados a la reforma educativa 2006. Por su parte, la heterogeneidad se
observa en varios sentidos: en primer lugar se seleccionan centros educativos de secundaria, en sus
dos modalidades, que se encuentran en contextos geográficos distintos (urbano, rural, indígena); en
segundo lugar, la composición de cada uno de los grupos de discusión se realiza por cuota de sexo,
3 hombres y 3 mujeres; por último, las personas son seleccionadas de distintos grupos de primer
grado de secundaria.
La elección de los centros educativos se llevo a cabo con el apoyo económico y la información
facilitados por la SEP seleccionando aquellos que ofrecían mejores condiciones de seguridad y
accesibilidad.
Respecto a los libros de textos, se solicitaron a la SEP los manuales que se entregan de manera
gratuita al alumnado de primer grado de educación secundaria en el Estado. La institución propor-
cionó un total de cuatro ejemplares: Ciencias 1, con énfasis en biología; Geografía de México y el
mundo; Español 1, y Matemáticas 1.

Instrumentos

Se emplearon tres instrumentos para la recolección de información: los grupos de discusión,


las auto-descripciones breves y el análisis de libros de texto. Con los grupos de discusión se recaba
información sobre la percepción, opinión, y actitudes que tienen las y los adolescentes en relación
a la sexualidad y la igualdad de género. La auto-descripción breve es un instrumento con el cual se
pretende que ellos y ellas expresen sentimientos y opiniones respecto a los cambios por los que es-
tán atravesando, así como sus aspiraciones. Finalmente, con los libros de texto se recaba, describe y
analiza información relacionada con la sexualidad y la equidad de género plasmada en las imágenes,
en el texto y en el contenido de los manuales que proporciona gratuitamente el Estado de Michoa-
cán al alumnado de primer grado de secundaria.
De los tres instrumentos de recogida de datos, dos fueron diseñados de la siguiente manera:
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 55

a) Los grupos de discusión:

A partir de varios autores (Flick, 2004; Gil, 1992; Kruger, 1991; Mena & Murillo, 2006; Valles,
1999) se tomaron las siguientes decisiones en lo referido al diseño de los grupos de discusión:

• Construcción de un guión previo. Las preguntas y/o temáticas incluidas en el guión pre-
vio elaborado para los grupos de discusión, pretenden identificar las percepciones y las
experiencias que tiene el alumnado de primer grado de secundaria sobre la sexualidad y la
equidad de género. El guión contempla así seis rubros en los que se abordan cuestiones
sobre la sexualidad y la equidad/desigualdad de género: 1) Conceptos, 2) Información, 3)
Experiencias, 4) Costumbres, 5) Precepción y 6) Promoción6.
• El tiempo de duración de cada sesión es de 40 a 90 minutos.
• Se optó por establecer grupos de seis participantes.

Flick (2004), citando a Lunt y Livingstone (1996), hace referencia a algunos de los beneficios
de trabajar con esta herramienta, los grupos de discusión. Por una parte, se genera un debate en el
cual se revelan significados y percepciones que las personas participantes tienen respecto al tema a
discutir. Por otra, la diversidad de opiniones en los grupos de discusión produce representaciones
o conocimientos sociales que pueden servir para dar fundamento a este estudio.

b) La auto-descripción breve:

Se trata de dos hojas, entregadas a los participantes y que deben ser rellenadas por estos antes de
iniciar los grupos de discusión, que contienen la siguiente instrucción: “en un máximo de dos cuar-
tillas haz una descripción sobre ti mismo/a, cómo eras en la infancia, cómo eres ahora (cambios
que observas, motivaciones, entretenimientos o diversiones, ilusiones, desilusiones, dificultades o
conflictos que atraviesa) y lo que deseas ser”.

Tabla 1. Resumen de la recolección de datos

Instrumento Técnica de análisis Muestra Tipo de información recabada


Grupos de discusión Análisis de contenido 30 alumnas Percepciones, creencias, opiniones en cuanto a la
30 alumnos sexualidad y la equidad de género

Auto-descripciones breve Análisis de contenido 30 alumnas Sentimientos, percepción de sí mismos/as.


30 alumnos

Libros de texto Análisis de imagen 4 libros de texto Promoción o no de la sexualidad y la equidad


Análisis de texto de género.
Análisis de contenido
Fuente: Adaptado de Álvarez (2015, p. 111)

Procedimientos

Para llevar a cabo la aplicación de los dos instrumentos diseñados primero se solicitó apoyo a la
SEP. En segundo lugar se programaron reuniones con los jefes de estudios de las distintas zonas
de los centros educativos de secundaria en el Estado. En tercer lugar los jefes de estudio indicaron
los centros educativos que tenían mejores condiciones en cuanto a accesibilidad y a seguridad y
6
El guión fue revisado y corregido por elementos de SEP y de la SMUJER, siendo concedida la aprobación del mismo para su posterior la aplicación
las dos secretarías.
56 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

finalmente se encargaron de los trámites tanto administrativos como financieros para facilitar la
recogida de datos.
Los prefectos/as7 tenían la tarea de llevar a los/as participantes al punto de encuentro (despa-
cho o gabinete cedido por las autoridades de la escuela secundaria). Antes de iniciar con la discu-
sión se explicó a los y las participantes la temática sobre la que iban a dialogar, se les preguntó si
quería participar, se les informó respecto a la grabación de la sesión y a la confidencialidad de los
datos proporcionados.

Diseño de Análisis e Interpretación de Resultados


La combinación de metodología cuantitativa y cualitativa nos permite realizar un análisis estadís-
tico descriptivo y análisis de contenido, para ello se realiza el procesamiento y el análisis sugerido
por Porta & Silva (2003), en el cual se plantean tres momentos:
En un primer momento se realiza un análisis descriptivo, a través del software ATLAS.ti, versión
7.5 para Windows y del programa estadístico SPSS versión 18 para Windows. Mediante estos dos pro-
gramas se numeran las características de la información obtenida en relación a la frecuencia de apa-
rición de las distintas categorías. Con el primer programa, el software ATLAS.ti versión 7.5 para
Windows, se analizan los datos recabados en los grupos de discusión y en las auto-descripciones
breves. Nueve de las diez entrevistas (un grupo de discusión se negó a ser grabado) fueron grabadas
en formato de audio y posteriormente transcritas. Las transcripciones se incorporaron al software
para realizar la reducción de los datos, que se llevó a cabo siguiendo un método deductivo/induc-
tivo, en donde dos categorías, sexualidad y género8, son establecidas previamente, mientras que el
resto de categorías se establecieron en base a la información obtenida (método inductivo). Con el
segundo programa, SPSS versión 18 para Windows, se analiza la información contenida en los li-
bros de texto (se codifica todo ser humano en texto e imagen bajo tres aspectos generales hombre,
mujer, genérico/plural).
En segundo lugar, se elabora un contraste entre los datos, midiendo el grado de asociación y
relación entre las variables (tablas de contingencia y coeficiente de correlación de Pearson y prueba
de chi-cuadrado).
Finalmente se realiza el análisis, la interpretación y la integración de los resultados, con el
objetivo de, primero, obtener una perspectiva más amplia tanto sobre las percepciones que
tiene el alumnado acerca de la temática abordada, y, además, comprobar si desde la sociedad
(a través de los libros de texto) se contribuye o no a reforzar la equidad entre los sexos y la
educación sexual.

7
Son docentes encargados de gestionar cada nivel académico.
8
En la categoría de análisis sobre sexualidad se hace referencia a las tres esferas de interacción inseparables del ser humano: la biológica (cuerpo),
la psicológica (sentimientos/emociones) y la social (contexto sociocultural). Si bien es cierto que cada persona tiene una manera de expresar/
ejercer su sexualidad, esta se rige por un contexto social determinado por condiciones culturales, políticas, ideológicas, económicas, religiosas
etc. que se regulan y reglamentan a través de prohibiciones y sanciones en la forma de vivir y expresar la sexualidad (Grajales, 2004; Monroy,
2002; Vance, 1989). En el caso de los y las adolescentes, la sexualidad cobra crucial importancia, pues la experiencia sexual adquiere una gran
significación vinculada a diversos aspectos como son las transformaciones físicas y hormonales que obran sobre el cuerpo, los deseos, las fan-
tasías, el erotismo, el placer, sin olvidar los condicionamientos sociales, culturales, religiosos, etc. que operan de manera decisiva en la iniciación,
asunción y expresión de la sexualidad (Checa, 2005).
En cuanto al género se analizan el conjunto de percepciones y patrones de comportamiento que el alumnado identifica como propias de lo
masculino y lo femenino —identidad y roles/estereotipos de género— y cómo estas influyen —afectan/benefician—. Se examinarán las posi-
ciones que toman los y las adolescentes con respecto a las situaciones de discriminación de género. Finalmente se considerará la información
que tienen sobre los derechos de igualdad que existen tanto a nivel nacional como estatal, y las consideraciones que ellos y ellas tienen respecto
a lo establecido por ley.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 57

Conclusiones
El diseño metodológico aquí propuesto constituye una herramienta útil para la elaboración de
políticas educativas con perspectiva de género, puesto que, además de recoger la información rela-
cionada con la construcción sociocultural que tienen las y los adolescentes respecto a la igualdad/
desigualdad y la educación sexual, examina la información que sobre estos aspectos se trasmite a
través de los libros de texto al alumnado de primer grado de secundaria.
Se considera pues, que el diseño metodológico adoptado en nuestra investigación se presenta
como idóneo para mejorar, mediante las propuestas de educativas que fomenten una sexualidad
plena, sin desigualdades por razón de sexo, la calidad de la enseñanza en pro de la igualdad y la
democracia.

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Vázquez Domínguez, N. (2001). El género y los estilos narrativos en las historias de los niños y
niñas preescolares. Archivos hispanoamericanos de sexología, 6, 153-168.
60 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 61

ENSINO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA


NÃO MATERNA: CRUZAMENTOS DE
TAREFAS COMUNICATIVAS EM DIDÁTICA
DA LÍNGUA E DA LITERATURA
Mª da Graça Sardinha (mgg@ubi.ptd)
Universidade da Beira Interior
João Machado (joao.machado@ipcb.pt)
Instituto Politécnico de Castelo Branco

Resumo
O ensino do Português como língua não materna deve assentar em princípios orientadores
subjacentes a tarefas comunicativas que, por sua vez, apresentam uma caraterização muito particular.
Enquadrando, nesta perspetiva, os estudos de Prabhu (1987), Pattison (1987) e Richards (2001),
propomo-nos apresentar a planificação da obra Robinson Crusoe, de Daniel Defoe, onde cruzamos a
didática da língua com a didática da literatura, no sentido de contribuirmos para o desenvolvimento
da competência dos falantes, quer em língua, quer em cultura.

Palavras-chave: língua não materna, didática, literatura, cultura

Abstract
The teaching of Portuguese as a second language must be based on guiding principles under-
lying the communicative tasks that, in turn, have a very particular characterization. Fitting, in this
62 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

perspective, the study Prabhu (1987), Pattison (1987) and Richards (2001), we propose to present
the planning of Robinson Crusoe work of Daniel Defoe, which crossed the teaching of the lan-
guage with the teaching of literature, in order to contribute to the development of competence of
the speakers, both in language either in culture.

Keywords: second language, teaching, literature, culture

Introdução
A importância da “competência comunicativa”, plasmada no QECR (Conselho da Europa, 2001:
34)1, presente no programa do ensino-aprendizagem de qualquer língua, abarca três componentes:
competência linguística (que remete para o conhecimento formal da língua – lexical, fonológico e
sintático – e concomitantemente organização cognitiva desse conhecimento, ou seja, armazenamento
e acesso); competência sociolinguística (que engloba condições culturais e sociais de uso dessa língua);
competência pragmática (relacionada com a capacidade de uso em situação dos recursos linguísticos).
O Quadro Comum de Referência considera ainda indispensável o conhecimento do mundo, que, por
sua vez, inclui o conhecimento sociocultural derivado da consciência intercultural.
Ora, em contexto de ensino-aprendizagem, as competências enumeradas exigem práticas transfor-
madas, exigindo igualmente ensino explícito2 assente em alguns modelos que permitam, não só a polis-
semia da palavra, mas também que se abram em questões sobre a sociedade: modelos conducentes
ao desenvolvimento da linguagem, assentes nos sistemas semióticos que promovam a literacia,
assentes em caminhos que promovam a tolerância e a diversidade.
Selecionamos para reflexão o modelo de Luke e Freebody, cit. Pereira (2009), que veicula prá-
ticas de participação textual, práticas de utilização textual, práticas de descodificação e práticas de
análise crítica do texto.
Assenta igualmente em alguns princípios que passamos a enumerar: histórias sobre si mesmo;
histórias de família; histórias da cultura; cultura é rede e tecelagem; interculturalidade como prática
corrente; textos considerados da literatura dita de margem ou fronteira; cultura de proximidade3.
Em suma, a competência comunicativa é hoje um conceito-chave no ensino-aprendizagem de
qualquer língua, cabendo aos mediadores de ensino o desenvolvimento das várias dimensões que
aquela engloba, sejam de caráter pragmático, linguístico ou discursivo. Porém, o processo de ensi-
no-aprendizagem implica um saber fazer da parte do professor, mas igualmente um querer da parte
do aluno, onde a motivação se torna fundamental.
Igualmente, é pertinente definir o perfil do aprendente de uma língua. Para o efeito, baseámo-
nos em Chamot (2008) e Cohen (2011). Dizem os autores que o bom aprendente de línguas adota
estratégias favoráveis à aprendizagem, procedendo à monotorização do seu desempenho, demons-
trando um motivo para aprender, uma atitude positiva face à nova língua e uma atitude positiva face
à cultura dessa língua.
Mais tarde, em 2013, Grenfell e Harris alertaram para um ensino capaz de levar o aprendente
a transpor a sua ação individual, passando os limites da dimensão cognitiva para uma dimensão
sociocultural. Neste âmbito, comunicar é fundamental.

1
O Quadro Europeu Comum de Referência para as línguas foi definido pelo Conselho da Europa com o objetivo de harmonizar o ensino aprendi-
zagem das línguas no espaço europeu. Este quadro define todos os tipos de utilizadores e as respetivas competências.
2
A título de exemplo, explicamos alguns procedimentos de ensino explícito:
- Explicar que vai ser realizado um determinado tipo de atividade
- Mostrar slides (ou outros materiais) por forma a ativar conhecimentos relacionados com a atividade
3
Tradução nossa
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 63

Assim, entendemos ensino comunicativo da seguinte forma: assenta em tarefas comunicativas


baseadas em práticas sociais de referência; recorre a abordagens que privilegiam tarefas comunica-
tivas; opõe-se ao estudo mecânico e repetitivo das estruturas de uma língua.
Nesta perspetiva, urge construir novos ambientes de aprendizagem, proporcionadores de co-
nhecimentos autónomos e criativos, onde cada aluno deverá ter a oportunidade de construir apren-
dizagens significativas, potenciando os conhecimentos de que já é portador.
Autores, como Maria García Armendáriz, Ana Martinez Mongay e Carolina Matellanes Marcos
(2003: 75) asseguram que:

La tarea permite la programación de la enseñanza-aprendizaje de la lengua en contexto escolar en


procesos de comunicación reales, con una intención y un contexto definidos, de forma que el alumno se
concentre prioritariamente en el significado de lo que está comunicando. (…) permite la integración signifi-
cativa de todos los componentes necesarios para la práctica comunicativa y el aprendizaje autónomo. Aquí
reside la potencialidad educativa de la tarea en el contexto escolar (…) ya que están expuestos a un uso
más global de la lengua. Este uso tiene una doble vertiente en la tarea: la del desarrollo de las capacidades
de los alumnos y de la adquisición de unas competencias que les permiten aprender el idioma.

O nosso estudo irradia da exploração do texto “Diário de Robinson”, de Jonathan Swift4, tendo
por base um conjunto de tarefas comunicativas que passamos a anunciar, baseando-nos em autores
que adiante citaremos.
Igualmente, teremos a preocupação de mostrar que, na aprendizagem da língua (do português
como língua não materna, neste caso), se observou uma evolução no que às perspetivas de ensino
aprendizagem baseadas em tarefas comunicativas diz respeito.
Para uma economia do tempo, não apresentaremos o desenvolvimento da planificação no seu
todo. Investimos apenas na classificação das tarefas comunicativas dos autores referenciados.

1. Objetivos
- Conhecer a cultura portuguesa
- Conhecer autores da literatura portuguesa
- Desenvolver a competência comunicativa
- Desenvolver a intercompreensão
- Adquirir vocabulário
- Desencadear emoções
- Compreender linguagens simbólicas
- Utilizar linguagens simbólicas

2. Motivação inicial
Projeção da capa do Diário de Anne Frank.
Questões acerca da autora e da obra.

4
In Língua Portuguesa, Olga Castro e Manuela Russo (coord.), Ed. Asa, 1995, pp.170-171
64 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Audição do poema “Santo e senha”5, de Miguel Torga, cantado por Frei Hermano da Câmara6.

Deixem passar quem vai na sua estrada.


Deixem passar
Quem vai cheio de noite e de luar.
Deixem passar e não lhe digam nada.

Deixem, que vai apenas


Beber água de Sonho a qualquer fonte;
Ou colher açucenas
A um jardim que ele lá sabe, ali defronte.

Vem da terra de todos, onde mora


E onde volta depois de amanhecer.
Deixem-no pois passar, agora
Que vai cheio de noite e solidão.

Que vai ser


Uma estrela no chão.
(Miguel Torga)

Apoiamo-nos em Pattinson (1987), convidando o aluno a fazer adivinhações, a partilhar expe-


riências pessoais e a usar a sua imaginação.
Projeção de algumas imagens relativas ao texto Diário de Robinson.
Procedemos, na ótica do autor supracitado, a matching activities, communication strategies, pictures and
picture stories, discussions and decisions.
Recorremos, igualmente, àquilo que é entendido como pré-leitura do texto (Yopp e Yopp, 2006),
visando um ambiente mais democrático, onde os aprendentes têm oportunidade de adivinhação
acerca do conteúdo da obra, ativando os seus esquemas mentais e os seus próprios conhecimen-
tos7. Estes procedimentos permitem respostas pessoais, pela correlação com a bagagem cultural
de que cada um é portador. Esta perspetiva permite fazer previsões, construir imagens mentais,
estabelecer ligações entre os conhecimentos do presente e do passado. Exemplos: pensar em ilhas
desertas, na fauna e flora, o que levar para sobreviver, etc..
Igualmente, pedir-se-á aos alunos que produzam um texto cujo tema é a liberdade8.

5
Extraído de Diário: Volumes I a VIII, de Miguel Torga. Lisboa: Dom Quixote, 1999, 920 pp.
6
Tavares (2007: 31) propõe este tipo de aulas na sequência do desenvolvimento dos seguintes parâmetros: influência positiva, criatividade, desen-
volvimento das emoções,…
A autora supracitada, recorrendo a Lozanov, refere que esta didática é uma abordagem holística para descobrir e mobilizar reservas complexas
no cérebro, sendo que não se limitam a o desenvolvimento da memória, fazendo também apelo à criatividade.
A sustentar esta didática, frequentemente questionada, sugere alguns pontos a ter em conta: diversidade de documentos e suportes, recurso à
multiplicidade de questões, apresentação dos diálogos com música de fundo, simulação de diálogos entre línguas e culturas diferentes, progres-
são dos conteúdos em espiral.
7
Yopp e Yopp, já referidas, na obra Literature Based Reading Activities (2006), referem a importância da pré-leitura de qualquer obra, antes de se
iniciar a leitura da mesma, como já afirmámos. Este tipo de atividade pode ser apelidado de Book Talk.
8
Tentamos inserir a planificação numa unidade didática, cujo tema integrador será a liberdade e que terá como elemento integrador o diário e sua
importância.
Pais (2013: 74) refere que, do ponto de vista técnico-didático, uma unidade didática se carateriza por:
“- Ser a base motivacional, preparando a atenção do aluno:
- Permitir a ativação do conhecimento prévio e a verificação dos pré-requisitos subjacentes a uma determinada aprendizagem;
- Estimular a comunicação multilateral;
- Desencadear a coerência temática e a coesão metodológica no interior dos percursos de ensino e aprendizagem e da própria Unidade.”
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 65

3. Leitura e exploração do texto


Após audição da leitura do texto, procede-se à exploração do mesmo.
Desconstruímos os conceitos encontrados em Prabhu (1987), Pattinson (1987) e em Richards
(2001), citados por Panzo (2013). Nos três autores, encontramos uma sequência que vai do desen-
volvimento do desempenho linguístico, ao desempenho cultural e finalmente para o sociocultural.
Sai-se, assim, de um ensino-aprendizagem cujo enfoque aposta apenas no trabalho individual de
crescimento cognitivo e linguístico, para um crescimento do foro sociocultural.
Do primeiro autor, desconstruímos conceitos, tais como, reasoning gap (que remete para a com-
preensão e produção oral ou escrita de textos) e opinion gap (que engloba o uso da informação real
articulada com preferências pessoais, sentimentos ou atitudes).
Em Pattinson (1987), servimo-nos das questions and answers; puzzles and problems; discussions and
decisions. Parece-nos poder afirmar que a preocupação com o desempenho mais individual ainda
continua em foco neste autor.
Quanto a Richards (2001)9, este privilegia trabalho de pares ou grupo, envolvendo produção
e partilha da informação, discussão, resolução de problemas em ambientes descontraídos, com a
preocupação de não encontrar apenas uma solução.

3.1 Questões10

- Alguém mantem um diário?


- Por que se mantem um diário?
- O que se escreve neste tipo de registo?
- Por que será que a este tipo de registo se dá o nome de diário?
- Durante quanto tempo manteve Robinson este registo?
- Através deste texto, temos acesso a todo o registo? Justifica por palavras tuas.
- Onde se encontrava Robinson na época em que escreveu este diário?
- Que aspetos são caraterísticos de todas as ilhas?
- Qual o tipo de embarcação em que Robinson chegou à ilha?
- Conheces outros tipos de barcos? Refere alguns.
- No rio Douro, navegam os “rabelos”; no rio Tejo, as “fragatas”… (o professor mostra ima-
gens destes e de outros barcos, levando os alunos à descoberta de outras embarcações de distintos
países).

Em seguida, o docente distribui uma ficha com informação em falta sobre a utilização de cada
barco das imagens que deve ser preenchida em trabalho de pares
- Documenta com o texto o que aconteceu às restantes pessoas do barco durante o naufrágio.
- Que sentimentos experimentou Robinson quando se viu sozinho? Retira do texto as expres-
sões que justifiquem a resposta.
- Por que razão se sentiu amedrontado e triste?
- A resposta a esta questão remete para a solidão tantas vezes sentida em ambientes vistos como hostis.

9
De Richards, extraímos referências, tais como, jigsawtasks; information-gap tasks; problem solvingtasks; opinion exchange tasks.
10
A título de exemplo, retomamos algumas questões e enquadramo-las nas respetivas classificações:
- Alguém mantem um diário? opinion gap
- Por que se mantem um diário? reasoning gap
- O que se escreve neste tipo de registo? reasoning gap
- Por que será que a este tipo de registo se dá o nome de diário? opinion gap
- Durante quanto tempo manteve Robinson este registo? problem solvingtasks
- Através deste texto, temos acesso a todo o registo? Justifica por palavras tuas. opinion gap
66 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

- Que sentimentos estão ligados ao facto de se estar longe de casa? E quando se está perto dos
amigos? E quando se está perto da pessoa amada?
- Ao cair da noite, Robinson decidiu dormir. Como foi esse sono? Justifica com o texto.
-…

Nesta fase da leitura e exploração do texto, cujo objetivo é fundamentalmente o de estimular


respostas pessoais, são ainda realizadas atividades, tais como:
Feelings Charts (mapa de emoções), de Yopp & Yopp
Graphic Organizers, de Yopp & Yopp
Estas atividades realizam-se simultaneamente com a exploração do texto, ajudando a analisar
personagens, a reconhecer e a despoletar sentimentos e a expandir o conhecimento do vocabulário.

4. Pós-leitura
Dando sequência ao programa de leitura fundamentado na literatura, procedeu-se à pós-leitura
do texto (Yopp e Yopp, 2006).
As atividades integradas na pós-leitura ajudam o aluno a monitorizar o essencial, a desenvolver
a capacidade de síntese, a apreender o sentido global do texto, a distinguir as diversas teias que o
compõem. Para o efeito, utilizam-se “textos em leque”, que, na opinião das autoras citadas, promo-
vem a leitura lúdica e recreativa relacionada com o texto em questão. Evidentemente, os textos em
leque têm entre eles um fio condutor.
No final, pede-se aos aprendentes que produzam um texto simulando um diário.

Considerações finais
Na proposta de ideias apresentadas, conducentes a uma proposta de planificação, torna-se evi-
dente a prevalência de estratégias de antecipação do texto em estudo, com a visualização de ima-
gens relativas à obra, com audição de poemas onde a intertextualidade pode ser trabalhada, com
preenchimento de mapas, esquemas/diagramas, da produção de texto/escrita criativa, do trabalho
de grupo, etc..
A nossa proposta assenta naquilo que é atualmente entendido como didáticas não-convencio-
nais, enquadradas no estudo da língua e da literatura, baseado em elementos integradores e integra-
dos numa espiral à volta do tema liberdade, tendo os diários como polo libertador.
Em todas as atividades, tentamos desenvolver múltiplas sensibilidades: a imaginação e a criati-
vidade dos aprendentes, o encadeamento de ideias, a partilha de experiências, a expressão escrita.
Concomitantemente, tivemos a preocupação de educar para a cidadania.
Quanto aos materiais, devem utilizar-se documentos autênticos, recorrendo, sempre que possí-
vel, ao uso de gravações e vídeos com comunicações reais, de falantes reais, em contextos reais de
comunicação.

Bibliografia
Chamot, Anna (2008). “Strategy instructions and good language learners”. In Carol Griffiths (ed.), Lessons from good language learners.
Cambridge: Cambridge University Press, pp. 266-281
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 67

Cohen, Andrew (2011). “Second language learners strategies”. In E. Hinkle (ed.), Research in second language teaching and learning
(vol. II, Cap. 41 – Parte V). Abingdon: Routledge, pp. 681-698)
García Armendáriz, Maria, Martinez Mongay, Ana e Matellanes Marcos, Carolina (2003). Español como segunda lengua (E/L2)
para alumnos inmigrantes. Propuesta curricular para la escolarización obrigatoria. Pamplona: Departamento de Educación
- Gobierno de Navarra. Disponível em www.http://pnte.cfnanavarra.es (acedido em 08.05.2015)
Grenfell, Michael e Harris, Vee (2013). “Making a difference in language learning: the role of sociocultural factors and of learner
strategy instruction”. In The Curriculum Journal, 24 (1), pp. 121-152
Pais, António (2013). “A unidade didática como instrumento e elemento integrador de desenvolvimento da competência leitora”. In
Fernando Azevedo e Mª da Graça Sardinha (coord.), Didática e Práticas – A língua e a educação literária. Lisboa: Lidel, pp.65-86
Panzo, João (2013). As representações dos professores sobre o Português língua segunda: linhas de atuação. Programa de formação contínua para
professores do ensino primário em Angola. Tese de doutoramento apresentada à Universidade da Beira Interior (não publicada)
Pattinson (1987). Developing communication skills. Cambridge: Cambridge University Press
Pereira, Íris (2009). “Literacia crítica: conceções teóricas e práticas pedagógicas nos níveis iniciais de escolaridade”. In Fernando
Azevedo e Mª da Graça Sardinha (coord.), Modelos e Práticas em Literacia. Lisboa: Lidel, pp.17-34
Tavares, Clara (2007). Didáctica do português língua não materna no ensino básico. Porto: Porto Editora
Yopp, Ruth e Yopp, Hallie (2006). Literature Based Reading Activities. Boston: Pearson

Outros documentos
Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – Aprendizagem, ensino, avaliação. Porto Edições ASA, 2001.
68 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 69

ESTADO DA ARTE NA INVESTIGAÇÃO


QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO: O CASO
DOS ESTUDOS SOBRE DIFICULDADES
ESPECÍFICAS DE APRENDIZAGEM
Mª Cruz Sánchez-Gómez (mcsago@usal.es)
Mª Vitoria Martín-Cilleros (viquimc@usal.es)
Universidad de Salamanca

Resumo
En el capítulo se pone de manifiesto que actualmente existe una amplia producción científica
de carácter cualitativo con perfil social. En la mayoría de las investigaciones predomina el uso de
investigación cualitativa como acercamiento metodológico preferente. En otras muchas, especial-
mente en las más recientes, abunda una metodología mixta (mixed method approach). Sólo en unos
pocos campos de conocimiento existe preferencia por la investigación cuantitativa. Además en el
documento se describe el proceso del método científico que debe llevarse a cabo en la investiga-
ción, haciendo hincapié en los estudios de carácter interpretativo. Se indica los elementos, criterios
de demarcación y situaciones epistemológicas que deben tenerse en cuenta en un campo de cono-
cimiento. Posteriormente se hace un recorrido sobre las tendencias en investigación educativa ha-
ciendo énfasis en los estudios cualitativos en el ámbito de las dificultades específicas de aprendizaje.

Palavras-chave: Dificuldades de aprendizagem específicas; investigação em educação; estudos


qualitativos; design de metodologia mista.
70 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
The chapter shows that there is now a broad scientific production with qualitative social profile. In
most investigations predominant use of qualitative research as a preferred methodological approach.
In many others, especially the most recent, abounds a mixed methodology (mixed method approach).
Only in a few fields of knowledge there is preference for quantitative research. Also in the document
the process of the scientific method to be carried out in the investigation, emphasizing interpretive
studies described. Elements, demarcation criteria and epistemological situations should be taken into
account in a field of knowledge is indicated. Later, a tour on trends in educational research with em-
phasis on qualitative studies in the field of specific learning difficulties.

Keywords: Learning disabilities; educational research; qualitative studies; mixed method approach.

Introducción
La investigación como proceso de construcción de conocimiento es considerarla como proceso
de producción del conocimiento científico. El hecho de que existan otras fuentes de conocimien-
to (la experiencia personal, la tradición, las autoridades) ( (Cardona, 2002) no permite calificarlas
como ciencia o equipararlas a la investigación, sin que de ello se derive un rango inferior o superior,
sino diferente, como lo son el conocimiento científico y el cotidiano o vulgar.
McMillan y Schumacher (2001: 9) definen la investigación, de manera sencilla y breve, como
un proceso sistemático de recolección y análisis lógico de la información y le asignan como carac-
terísticas básicas la objetividad, la precisión, la verificabilidad, la preferencia por las explicaciones
simples, la naturaleza empírica de los datos, el empleo del razonamiento lógico y el carácter condi-
cional de las conclusiones.
También Kerlinger (1985: 7) hace referencia a algunas de estas características cuando, al definir
la investigación científica, le asocia sistematicidad, control, carácter empírico y sentido crítico al
proceso de indagación de las relaciones existentes entre fenómenos.
La investigación, y el conocimiento obtenido a través de ella, se oponen a las opiniones, las
creencias, la introspección, la experiencia personal o las fuentes de autoridad.
Esta característica se relaciona con el carácter empírico al que hacían referencia McMillany
Schumacher (2001). La eliminación de lo personal se orienta exclusivamente a la evitación de in-
terferencias por parte del investigador en el proceso, si bien, como comentaremos más adelante, es
imposible desprenderse de los valores y hasta en los enfoques de investigación presuntamente más
asépticos prevalecen unos determinados valores personales, profesionales y sociales. Por otra parte,
lo personal incide directamente en fases de la investigación como la selección de los problemas a
investigar, la determinación de los fines y objetivos de la misma, la utilización de los resultados,
etc. De igual forma, también subyacen valores básicos al seleccionar métodos y, evidentemente, al
suscribir un enfoque o paradigma determinado.
Además, la investigación científica ha seguido, lo que se denomina el método científico. Este
proceso comienza con la identificación de un problema específico sobre el que se va a investigar. La
determinación del problema puede venir dada por varias necesidades: por la existencia de lagunas
en el conocimiento científico sobre la materia, como derivación de teorías enunciadas que precisan
de validación empírica, por la emergencia de situaciones nuevas o desconocidas hasta el momento,
como fruto de investigaciones precedentes que abren nuevas vías de indagación e incluso desde la
experiencia personal del investigador o investigadora.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 71

Los problemas de investigación han de ser planteados bajo criterios de relevancia, claridad,
operatividad, precisión y viabilidad. Estos criterios convierten al problema detectado en cuestión
investigable, puesto que lo definen en los términos requeridos por la actividad científica.
McMillan (1996, en Cardona, 2002) se refiere a seis criterios útiles para la valoración de proble-
mas de investigación:

• El problema planteado ha de tener la posibilidad de ser resuelto a través de la recogida y análisis


de datos.
• El problema debe ser relevante para la situación actual del conocimiento en el campo disciplinar
correspondiente.
• El problema debe indicar u orientar acerca del tipo de investigación que se va a realizar para su
resolución (experimental, descriptiva, correlacional, comparativa...).
• El problema debe hacer referencia, en su enunciado, a la población a la que se refiere y que va a
ser investigada.
• El enunciado del problema debe explicitar también las variables objeto de estudio, aunque no
necesariamente con un nivel de especificidad elevado en esta fase.
• El problema, por último, ha de ser planteado de forma clara, evitando la ambigüedad en su for-
mulación.

Ary, Jacobs y Razavieh (1982) aporta a lo anterior la necesidad de que el problema a investigar
se ajuste al investigador y la conveniencia de que la investigación del problema conduzca, a su vez,
a la detección de nuevos problemas. Cuando sucede esto, se dice que investigación ha sido fértil.
Es usual proceder, en la fase siguiente, a una primera revisión de la literatura existente sobre el
problema en cuestión y sobre otros aspectos más generales o relacionados directamente con él, de
forma que se obtenga una primera idea general sobre el tema y su estado actual.
Conocido el problema y el estado actual de la cuestión, se procede al planteamiento de la inves-
tigación que se va a realizar sobre él, especificando los objetivos que guiarán el proceso y que se
constituyen en fines o propósitos a alcanzar durante el mismo. Cardona (2002) distingue dos tipos
de objetivos:

a) Exploratorios o descriptivos, que son útiles para aproximarnos a problemas poco conocidos y
permiten identificar o describir atributos o características ignorados hasta el momento, cuantifi-
car la frecuencia de algún fenómeno o seleccionar áreas específicas o problemas de interés.
b) Analíticos, explicativos o predictivos, que se orientan al estudio de las relaciones entre posibles
causas y efectos. Este tipo de objetivos permite contrastar o verificar hipótesis, confirmar de-
terminadas relaciones entre variables, comparar la eficacia de dos o más acciones, comprender
factores subyacentes a los fenómenos estudiados e incluso prever y anticipar acontecimientos.

La especificación de objetivos se acompaña, si procede (en función de la naturaleza de la in-


vestigación y, particularmente, si los objetivos son de tipo analítico), del enunciado de una o varias
hipótesis de investigación.
En relación con las estrategias metodológicas, Buendía y Carmona (1984, en Buendía, 1992)
reducían a tres las posibilidades existentes: los métodos de observación, los métodos de encuesta y los métodos
de medición. Los primeros son más propios de la investigación cualitativa de corte naturalista y utiliza
preferentemente datos cualitativos, mientras que los últimos exigen de la cuantificación y son pro-
pios de la metodología experimental.
Evidentemente, la selección de métodos y técnicas específicas de recogida de datos se relaciona
con la naturaleza de la investigación, con los objetivos propuestos, con las hipótesis planteadas (en
72 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

su caso), con la cantidad de participantes, con la naturaleza del objeto y de los sujetos de la inves-
tigación, etc.
La selección de participantes (sean personas, instituciones, objetos, domicilios, clases...) se realiza
de forma distinta en función del tipo de investigación. La de tipo cuantitativo emplea normalmente
técnicas de muestreo. En la cualitativa, se prefiere hablar de técnicas de selección. Las primeras anteponen la
representatividad como cualidad esencial de los participantes en la investigación; es decir, su isomor-
fismo con el conjunto de la población de la que ha sido extraída. Por el contrario, en la investigación
cualitativa se antepone la significatividad de los participantes. Esta diferencia se asocia a una finalidad
básica de uno y otro tipo de investigación: así, mientras que la primera pretende la generalización
de los resultados y, por tanto, se preocupa de la búsqueda de lo común o lo compartido, la segunda
prefiere la caracterización de la singularidad, focalizando entonces lo específico.
En la selección de participantes en procesos de investigación cualitativa existen también diversas
técnicas, alguna de las cuales coinciden con otras empleadas en los estudios cuantitativos.
Al igual que sucede con la selección de técnicas de recogida de datos y de participantes, también
el análisis de datos, que constituye la fase posterior a la recogida, presenta especificidades en fun-
ción de la naturaleza de la investigación. El carácter numérico de los datos cuantitativos permite la
aplicación de técnicas estadísticas más o menos complejas, mientras que los datos cualitativos (con
los que también se han empleado algunas técnicas de cuantificación) son más apropiados para el
análisis de significados o de contenido.
El análisis precede a la ordenación de los resultados de la investigación y a la elaboración de las
conclusiones, que suelen organizarse en función de los objetivos e hipótesis definidas al inicio.
La finalización de las fases comentadas posibilita la redacción del informe de investigación y
la difusión de los resultados de la misma. Pero, además de la necesaria difusión de los hallazgos,
la investigación ha de servir para abrir nuevos caminos de indagación, poniendo al descubierto o
reformulando nuevos problemas que permiten reiniciar el proceso investigador. La investigación
alcanza así su plenitud a través de la fertilidad, una cualidad deseable en todos los procesos de
construcción del conocimiento

Elementos de un campo de conocimiento


Un campo de conocimiento no se compone únicamente de un conjunto de proposiciones ni
se sostiene únicamente en el campo de las “ideas”, sino que en él pueden distinguirse una serie de
elementos que lo componen:

a) Una sociedad y un contexto en el que cobra sentido la conversión de la realidad educativa. En nues-
tro caso, en objeto de consideración científica, en el que los investigadores y teóricos de este
campo de conocimiento hacen su actividad pertinente y adquieren una posición y un estatus.
b) Objetos de estudio y dominios de discurso, que implican la reconstrucción de los objetos reales en ob-
jetos de conocimientos, en cuya constitución tiene parte y cometido el observador y sus puntos
de vista. Los dominios de discurso y los objetos de estudio parten de interrogantes acerca de la
realidad, fundamentalmente en la forma de qué y cómo. La constitución de un objeto de estudio
no significa que sus límites sean precisos. Aunque los investigadores y teóricos de la educación
identifican el ámbito de significación del concepto, sus límites son siempre en algún modo
difusos. Desde la posición de cada observador adquieren relevancia elementos y caracteres di-
ferentes a partir de los cuales se construyen discursos coherentes, con más o menos puntos de
coincidencia. Las dificultades en la delimitación del objeto han sido especialmente importantes
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 73

en el ámbito de la educación. Como el campo de conocimiento es al mismo tiempo actividad y


producto de la actividad, en un momento dado la descripción del campo puede representarse
como la integración de las líneas de investigación de sus investigadores (Bunge, 1985).
c) Criterios, supuestos y concepciones generales, a partir de las cuales se delimita el campo de conocimiento.
Todo campo de conocimiento se plantea unos límites y señala el alcance de sus predicados: pre-
tende delimitar el ámbito de significación de conceptos relacionados con la educación y esto no en
general, para todo tiempo y lugar, sino dentro de espacios de significación determinados, por un
grupo humano, un espacio concreto y preferentemente en el momento de la observación.
d) Problemática característica o modo característico de formular problemas. A lo largo de la historia de la
investigación en Educación, los estudiosos se han planteado de manera prioritaria el cómo re-
solver los problemas educativos del día a día: cómo organizar un sistema educativo eficaz, cómo
perfeccionar el proceso de enseñanza-aprendizaje, cómo llevar a cabo reformas educativas de
envergadura, cómo llevar a buen término programas innovadores, cómo aumentar el sentido de
la responsabilidad y la motivación de los docentes, cómo fomentar la formación del profeso-
rado, cómo controlar los conflictos en el aula, etc. Todos estos problemas en conjunto han ido
determinando los objetivos de la Investigación Educativa. Hacia la década de 1960, la Investi-
gación Educativa comenzó a mostrar una inclinación hacia un planteamiento de los problemas
radicalmente diferente al mostrado anteriormente. La comprensión adquirió prioridad lógica y
cronológica sobre los esfuerzos prematuros para la elaboración de programas educativos. Para
poder ofrecer recomendaciones dignas de confianza para la mejora y la reforma de los sistemas
educativos, comenzó a pensarse en la necesidad de partir de un conocimiento en profundidad
de los principios de su funcionamiento, sin tener en cuenta inicialmente los fines para los que
podría utilizarse ulteriormente este conocimiento ( (Eaton, 1974).
e) Objetivos característicos de la actividad dominante, por qué y para qué se estudia ese campo. En el caso
de la Educación, aparecen dos categorías de objetivos: el primero, como en todo campo de
conocimiento, conseguir mediante el análisis científico, las posibles generalizaciones sobre los
fenómenos educativos objeto de estudio; y el segundo, tiene un carácter práxico, que global-
mente considerado, podría expresarse como el fomento y la profundización en la comprensión
de dichos fenómenos dentro del contexto donde se producen.
f) Metódica o conjunto de procedimientos para la actividad de desarrollo del campo de conocimientos. La Educa-
ción no tiene –y mucho menos puede definirse en términos de- un gran mecanismo metodoló-
gico propio tal como el que poseen otras disciplinas.

Criterios de demarcación en los campos de conocimiento


Pudiera parecer que los campos de conocimiento se encuentran perfectamente delimitados y
sus límites se imponen por sí mismos. En ese criterio ingenuo se apoyan las críticas que reciben
quienes se atreven a transgredirlos “invadiendo” otros campos de actividad gremial como si de un
intruso sin legitimidad se tratara. Es fácil rastrear las dificultades para la constitución de un campo
autónomo para la Investigación en Educación dentro de las instituciones académicas; al analizarlas
se puede entrever, en muchas ocasiones, que se trata de cuestiones de sociología de la ciencia o de
relaciones entre gremiales próximos. La demarcación de campos de conocimiento tiene que ver
con varias categorías de criterios cualitativamente diferentes (Bunge, 1985).

a) Criterios de demarcación epistemológicos, que demarcan formas de pensamiento diferentes en la racio-


nalidad y en la comprensión de los fenómenos educativos.
74 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Los campos de conocimiento se demarcan ante todo por la forma de pensamiento. La forma de
pensamiento o manera de pensar hace referencia, ante todo, al método o procedimiento mediante
el cual se elaboran y se validan o corroboran los sistemas de proposiciones que se tejen dentro de
tal forma de proceder mental. El estudio de las formas de pensamiento, el análisis de los criterios
de actividad racional y de validación-corroboración proporciona contenido a un ámbito de pensa-
miento que se denomina epistemología; en concreto, este criterio alude a la valoración del status
epistemológico de un campo de conocimiento. Aunque los criterios que se definan puedan no ser
totalmente compartidos y los límites que se establezcan sean difusos, el producto de la aplicación
de criterios de demarcación epistemológicos produce la segregación de rango mayor en los produc-
tos de conocimiento: entre ciencia y no ciencia.
Esta distinción adquiere especial relevancia para la formación en disciplinas relacionadas con la
educación porque muestra la distinción entre un campo de conocimiento y una praxis social. No
es lo mismo investigar fenómenos educativos que elaborar una opinión sobre un hecho educativo
y cultura educativa. La opinión y la cultura son responsabilidades de ciudadanos comprometidos y
críticos, mientras que la investigación en educación se entiende como dedicación racional sometida
a las reglas del método científico.

b) Criterios de demarcación pragmática: aquellos que demarcan dentro de un campo de conocimiento


grandes cuerpos de problemas capaces de orientar especialización (subdisciplinas según el cri-
terio de tal), e incluso de constituir criterio para la organización de un programa de formación
en el que se implican especialistas y dentro de los cuales se formulan programas diferenciados
de investigación.

Situaciones epistemológicas generales en un campo de


conocimiento
El término paradigma ya fue empleado por Platón y Aristóteles para referirse, respectivamente a
modelo y ejemplo (Corbetta, 2003) y en la actualidad su uso está tan extendido que ha provocado
una diversificación de las acepciones, con el consiguiente riesgo de confusión. Así, los paradigmas
son, a veces, equiparados a teorías o formas de articulación interna de éstas, sistemas de ideas, cor-
rientes de pensamiento, escuelas, procedimientos, ejemplar de investigación, métodos, etc.
Desde la aparición de las revoluciones científicas de Khun (1962) se introduce como término
fundamental dentro de los análisis epistemológicos de los campos de conocimiento el concepto
de paradigma, y lo define “como realizaciones científicas, universalmente reconocidas, que durante cierto tiempo
proporcionan modelos de problemas y soluciones a una comunidad científica”.
Este concepto alude a los caracteres epistemológicos de un campo de conocimiento que com-
parte unidad en cuanto a supuestos generales, metodología de investigación, identificación de pro-
blemas ejemplares e identificación de soluciones a problemas específicos del campo.
La expresión paradigmática del campo suele contenerse en los denominados textos o tratados
generales del campo (manuales). El concepto de paradigma, muy discutido, se amplía y precisa con
la idea de Lakatos (1970) de programa de investigación. Cuando el programa de investigación es
compartido por la totalidad del campo, tanto Khun como Lakatos aluden a lo que se denomina
“ciencia normal”. Cuando el paradigma se revisa o se hace insostenible como consecuencia de la
investigación, se entra en el estadio denominado de ciencia revolucionaria o de cambio de paradig-
ma o de cambio de programa de investigación.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 75

Desde este punto de vista, podría estimarse que cuando en un campo de conocimiento no existe
un paradigma comúnmente aceptado o un programa de investigación propiamente dicho, la situa-
ción del campo es pre-paradigmática. Se denomina a esta situación pre-paradigmática revelándose
así la inexistencia de supuestos ontológicos compartidos, metodologías consensuadas y tradiciones
de lecturas concurrentes. Esta adquiere una importancia crucial desde el momento en que las teo-
rías científicas funcionan como instrumentos para el análisis, la interpretación, la comprensión y la
explicación de los fenómenos educativos complejos.
Además, Larry Laudan aporta, en su estudio sobre la evolución de la ciencia, el concepto de tra-
dición de investigación. Sus fundamentos básicos son dos: por un lado, evidención que los criterios
de cientificidad son variables y dependen de circunstancias históricas; y por otro, puso de mani-
fiesto que los científicos no trabajan de forma aislada, sino dentro de una determinada tradición de
investigación que puede integrar teorías y programas diversos.

El criterio de cientificidad preferente es, para Laudan, el


de utilidad al progreso.
Una aportación será tanto más científica cuanto mayor sea su utilidad para el progreso, al re-
solver una mayor cantidad de problemas. Será ese sentido de utilidad el que predomine cuando la
comunidad científica opte por una tradición de investigación, convirtiéndola en hegemónica.

Estado actual de la investigación cualitativa en el campo


de dificultades específicas de aprendizaje
Se ha experimentado un aumento de la producción científica en ciencias sociales y de la salud,
tanto en el número de artículos, como universidades que lo trabajan y áreas de conocimiento.
Observando la base de datos Scopus se aprecia no sólo lo comentado anteriormente sino tam-
bién el auge de los estudios cualitativos tanto en España como en Portugal. Ocupando lugares des-
tacados en cuanto a producciones de artículos científicos publicados durante el 2015 en esta base
de datos internacional como puede verse en la figura 1.
Con el fin de conocer la situación en el ámbito de las dificultades específicas de aprendizaje se
comenzó por delimitar el concepto. La primera dificultad que nos encontramos es la definición de
dificultad específica de aprendizaje, siendo la más aceptada la empleada por Kirl (1963) que nos lo
define como: “una alteración o retraso en el desarrollo en uno o más de los procesos del lenguaje,
habla, deletreo, escritura, o aritmética que se produce por una disfunción cerebral y/o trastorno
emocional o conductual, no por un retraso mental, depravación sensorial o factores culturales o
instruccionales”.
Se establecieron como criterios de selección aquellos artículos que estuvieran publicados en
inglés, entre 1994 y 2015, abarcando de ese modo los últimos 20 años de investigación. El criterio
para la selección de participantes debía ser niños con dificultades específicas de aprendizaje entre
los 0 y 12 años, siendo esta franja la coincidente con el periodo escolar. El tema de interés que se
debía abordar tendría que ser la intervención educativa.
Se excluirían aquellos artículos que fueran revisiones de la literatura o meta análisis así como
aquellos que abordaran otro tipo de necesidad educativa como autismo, síndrome de Down,
TDAH, etc...
76 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

De acuerdo a estos criterios se obtuvieron los resultados que pueden observarse en las siguien-
tes figuras (Fig 2,3 y 4):
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 77
78 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Conclusión
En la actualidad la tendencia en la investigación en Educación pasa por considerar la voz de las
personas implicadas. No basta quedarnos en el mundo de los tópicos cuantitativos sino que los
agentes educativos demandan investigar el mundo de los significados, es decir pasar de la idea del
cuánto existe de un fenómeno educativo a la idea del por qué existe ese fenómeno (Martín-Cilleros
& Sánchez-Gómez, 2016). La afirmación anterior se pone de manifiesto, en las producciones de la
base de datos de prestigio internacionales, como por ejemplo la europea SCOPUS, en la que de las
casi 50.000 producciones existentes entre 1990 y 2015 en ciencias sociales, casi 20.000 son estudios
cualitativos en diferentes formatos: artículos (86,20%), revisiones (6,19%), conferencias (3%);
seguidos de 8.500 estudios cuantitativos y más de 5.000 con modelos mixtos (Sánchez-Gómez,
2015a, 2015b y 2015c).
Si nos centramos en el ámbito específico abordado, las dificultades específicas del aprendizaje,
por países Estados Unidos lidera la producción en este ámbito, seguido de Reino Unido y Alema-
nia. Realizando un análisis de contenido de los artículos que cumplen los criterios de publicación
en inglés, entre 1994 y 2015 en intervención educativa para niños de 0 a 12 años, vemos que las
temáticas más representativas están ligadas a efectividad de los programas desarrollados y demanda
por el diseño de nuevas propuestas de mejora.

Referências bibliográficas
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Khun, T. (1962). The Structure of scientific revolutions. Chicago: Universidad de Chicago.
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y diseños mixtos. Campo Abierto: revista de eduación, 11-30.
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A. Acosta, Investigação Qualitativa: Inovação, Dilems e Desafios (págs. 41-74). Brasil: Ludomedia.
Sánchez-Gómez, M. (2015c). Presentación monográfico. Pedagogía social. Revista interuniversitaria,
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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 79

EU E OS OUTROS - UM ESTUDO DE CASO


SOBRE AS CONCEÇÕES DAS CRIANÇAS
ACERCA DA DIFERENÇA
Liliane Baltazar (lilib86@hotmail.com)
Cristina Pereira (cristina.pereira@ipcb.pt)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco

Resumo
A literatura infantil tem assumido um lugar de destaque na análise que diferentes autores têm
realizado sobre a sua relação com o desenvolvimento da criança. De acordo com diferentes es-
tudos, as histórias para crianças, para além de promoverem as competências linguísticas, são um
instrumento privilegiado para o desenvolvimento da imaginação, estimulam a capacidade crítica
acerca de temas sociais e pessoais e contribuem para a compreensão e a resolução de conflitos in-
terpessoais nas crianças. Nesse sentido e partindo do pressuposto de que livro infantil pode assumir
um papel importante na construção das conceções das crianças, escolhemo-lo como um dos ins-
trumentos privilegiados para a elaboração deste estudo. O estudo que apresentamos teve como ob-
jetivos: conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE)
relativamente à sua (com)vivência com a diferença e analisar o contributo das histórias infantis na
construção das conceções das crianças acerca da diferença, ou mais concretamente, das conceções
das crianças em relação à interação com a diferença, em contexto escolar. A intervenção junto das
crianças organizou-se em várias sessões, todas elas dirigidas para a análise e exploração de livros
infantis, previamente escolhidos segundo a temática em análise. A metodologia utilizada foi de cariz
qualitativo e organizou-se como um estudo de caso descritivo. Como instrumento de análise das
preferências interativas das crianças que integraram a amostra do estudo utilizamos o teste socio-
métrico. Foram realizadas atividades escritas, em que as crianças foram convidadas a escrever os
finais das histórias anteriormente lidas. Para aprofundar o conhecimento sobre as conceções que as
80 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

crianças da nossa amostra têm acerca da diferença, foram também realizadas entrevistas individuais
que se organizaram como uma análise às histórias anteriormente narradas. Os resultados permi-
tiram-nos constatar que as atividades desenvolvidas não potenciaram uma mudança nas escolhas
sobre as preferências interpessoais identificadas através do teste sociométrico, mas confirmou-se
que o livro é um potencial meio para (des)construir as conceções sobre a diversidade e a discrimi-
nação nas relações interpessoais.

Palavras-chave: literatura infantil; desenvolvimento social; aceitação da diferença nas interações


sociais; conceções.

Abstract
Children’s literature has assumed a prominent place in the analysis that different authors have
performed on their relationship with the child’s development. According to different studies, sto-
ries for children, in addition to promoting language skills, are a privileged instrument for the deve-
lopment of imagination, stimulate critical capacity about social and personal issues and contribute
to the understanding and resolving interpersonal conflict on children. It is with this thought and on
the assumption that children’s book can play an important role in the construction of conceptions
of children, that we choose them as one of the privileged instruments for the preparation of this
study. The study that we present have as main objectives: know the conceptions of children with
and without Special Educational Needs (SEN) regarding their experience with difference living
and analyze the contribution of children´s stories in the construction of children´s conceptions
about the difference, or more precisely the conceptions of children in relation to the interaction
with the difference in the school context. The intervention with children was organized in several
sessions, all geared towards the analysis and the exploration of children´s books, previously cho-
sen according to the theme in question. The methodology used was a qualitative nature and was
organized as a descriptive case study. As an analysis tool of interactive preferences of children who
participated the study sample we used the sociometric test. Were performed written activities, in
which children were asked to write the end of the stories previously read. To deepen the knowledge
about the conceptions that children in our sample have about the difference, were also conducted
individual interviews that were organized as an analysis of the stories narrated earlier.The results
allowed us to conclude that the activities developed not potentiate a change in the choices on inter-
personal preferences identified through the sociometric test, but it was confirmed that the book is
a potential means to (de)construct the conceptions of diversity and discrimination in interpersonal
relationships.

Keywords: children’s literature; social development; acceptance of difference in social interactions;


conceptions

Introdução
A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais na escola tem dominado muitos
dos debates e da pesquisa educacional nas últimas décadas, contudo, os estudos sobre essa proble-
mática têm-se centrado maioritariamente na análise das estratégias e práticas pedagógicas imple-
mentadas na escola e na sala de aula.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 81

A realização do presente estudo perspetiva a importância de analisar as relações entre as crian-


ças com e sem necessidades educativas especiais (NEE) em contexto escolar e as conceções destas
acerca do “viver com a diferença”, pela importância que essas conceções podem assumir nas inte-
rações que estabelecem entre si.
A escola tem um papel preponderante na transmissão de valores e conceções que valorizam a
importância da diversidade e do multiculturalismo. Na perspetiva de Fonseca (2000), educar para a
cidadania é também educar para o reconhecimento e o respeito pela diferença. Para as crianças com
e sem necessidades educativas especiais as competências sócio-morais desenvolvem-se e operacio-
nalizam-se através da troca de saberes e de experiências com os adultos significativos, nomeada-
mente pais e educadores, mas também nas interações com o seu grupo de pares. Nesses contextos
interativos, os valores morais e éticos são postos à prova e a criança revela o modo como pensa
em determinada situação e resolve-a de acordo com as suas conceções. Deste modo, a criança é
conduzida a resolver dilemas e a revelar se aceita o outro, mesmo quando este é diferente.
Tivemos como base da nossa pesquisa o pressuposto de que a construção de conceções e o
modo como a criança atua perante determinada realidade podem ser “modelados” através da lite-
ratura infantil.
Assumimos que o livro infantil não é apenas um suporte lúdico, organizando-se essencialmente
como um transmissor de informações, atitudes, conceções e fantasias, com implicações na análise
da realidade. Nesse sentido, pode ser um instrumento valioso na educação de seres humanos mais
completos e capazes de viver e interagir numa sociedade heterogénea.
De acordo com estes pressupostos, a pesquisa que descrevemos foi norteada pelos seguintes
objetivos:

1. Conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE) rela-
tivamente à sua (com)vivência com a diferença.
2. Analisar o contributo das histórias infantis na construção das conceções das crianças acerca da
diferença, ou mais concretamente, das conceções das crianças em relação à interacção com a
diferença, em contexto escolar.

Para o presente estudo foi utilizada uma amostra composta por seis crianças, três crianças ditas
normais e três crianças com necessidades educativas especiais, apresentando dificuldades de apren-
dizagem. Estas crianças, com idades compreendidas entre os nove e os dez anos, frequentavam o
3º ano de escolaridade de uma escola localizada numa vila da Beira Interior de Portugal. De acordo
com os objetivos da pesquisa, foi utilizado o teste sociométrico, numa primeira e última sessão, de
forma a aferir as escolhas e afinidades relacionais em diferentes contextos e atividades. Na segunda
fase de realização do estudo, desenvolvemos atividades que visaram a exploração dos livros infantis
“A Estrelinha Pálida” de Pedro Seromenho, “ Menina Gigante” de Jorge Marmelo e Maria Miguel
Marmelo e “O aquário” de João Pedro Mésseder. A seleção destas histórias teve em consideração
a sua adequação ao nível etário e características das crianças, bem como à temática transversal “ ex-
periências à volta da diferença”. Foram realizadas seis sessões em grupo onde procedemos à leitura
até determinada parte da história e, de seguida, cada criança foi convidada a escrever numa folha
o final que ela achava mais adequado para a história que tinha acabado de ouvir. Foram também
efectuadas quatro sessões individuais onde foram feitas entrevistas acerca das histórias. Todas as
sessões realizadas tiveram o propósito de analisar as intervenções e respostas dos alunos no que diz
respeito à aceitação da diferença do outro, de acordo com os objetivos do estudo.
82 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Enquadramento Concetual

1. O desenvolvimento sociomoral no contexto das


interações no grupo de pares
A relação entre os pares permite o desenvolvimento social e intelectual da criança (Schaffer,
2005), ao mesmo tempo que progressivamente adquirem “ (…) independência, autonomia o sen-
tido da reciprocidade, da solidariedade, da justiça (…)” (Rivier, 1983, p.73), características cruciais
para a sua vivência em grupo.
Segundo Carvalho (1999) o desenvolvimento infantil só pode ser analisado no contexto de uma
rede de interações:

1. as relações são o contexto primordial em que a criança ao mesmo tempo que socializa adquire
competências como a comunicação e a regulação das emoções;
2. a criança ao estar inserida num grupo adquire autonomia e segurança;
3. as relações vividas e observadas vão contribuir para a construção de relações futuras.

Por sua vez, Rivier (1983, p.73) defende que “a aprendizagem da vida em comum está longe de
se fazer sem os outros”, pois, ao longo do tempo, as crianças formam relações, cada vez mais fortes
e diversificadas, muito importantes para as suas vidas, nomeadamente se estas acontecerem com
crianças com a mesma idade (Schaffer, 2005).
A ideia de que apenas a presença dos pais, essencialmente da mãe, são importantes para o de-
senvolvimento psicológico, já não pode ser defendida, pois as crianças passam grande parte do seu
tempo junto dos seus pares. Assim a relação entre os pares tem grande influência nas formas de
conduta e pensamento. (Schaffer,2005, p.129).
A criança começa a desenvolver o seu processo de interacção com a família e depois gradual-
mente com os seus pares. Na escola ela tem oportunidade de conhecer outros papéis, uma vez
que, se cada criança tem uma “história”distinta, estas vão ter comportamentos também diferentes
(Papalia, Olds & Feldman, 2001).
Howew & Mercer (2007) consideram a sala de aula um meio importante para o desenvolvimen-
to socio-moral uma vez que, neste espaço a criança colabora com outras em diversas atividades,
contrapondo-se à visão tradicional que considera a conversa e a interação social perturbadoras e
irrelevantes no seu desenvolvimento. A aprendizagem em grupo está cada vez mais valorizada pois
esta permite às crianças trabalhar por objetivos comuns, explicar as suas ideias e expor os seus
pontos de vista até chegarem a um consenso.
Para Lawrence Kohlberg a moralidade centra-se essencialmente no sentido de justiça em de-
trimento do respeito pelas normas sociais e morais (Lourenço, 1998). Segundo a abordagem cog-
nitivo-desenvolvimentista, a moralidade desenvolve-se na criança quando ela cresce e começa a
interagir com os adultos e com os seus pares e a distinguir entre o bem e o mal, o justo e o injusto,
os direitos e os deveres, conseguindo, assim, demonstrar os seus pontos de vista perante um pro-
blema moral (Lourenço, 2002).
De acordo com esta abordagem a criança pode-se desenvolver não pelo sentido da culpa e de
outras emoções morais mas sim por comportamentos corretos nas suas atmosferas morais. Os
ambientes em que vive são importantes para se descentralizar da sociedade, de modo a colocar-se
nos pontos de vista do outro e assim desenvolver o seu raciocínio moral (Lourenço,1995;Power,
Higgins& Kohlberg, 1989, referido por Lourenço, 2002).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 83

Kohlberg (1984) assentou a construção do seu modelo nas respostas dos sujeitos a dilemas
morais por ele criados, defendendo que o desenvolvimento moral ocorre ao longo de 3 níveis, de
acordo com as características sintetizadas no quadro que a seguir apresentamos.

Tabela 1- Níveis e estádios de raciocínio moral segundo Kohlberg (1984) - Retirado integralmente de Lourenço (2002, p.76)

Nível Estádio Orientação Perspetiva sócio – moral

Pré - Convencional 1 Castigo e Obediência Egocêntrica


2 Troca de interesses Instrumental e de segunda pessoa

Convencional 3 Bom menino e aprovação social Racional e de terceira pessoa


4 Lei e ordem Legal e de um outro generalizado

Pós – Convencional 5 Maior bem do maior número Relativista e de um outro qualquer


6 Princípios éticos De um outro moral, racional e universal

Considerando o nível etário das crianças envolvidas no presente estudo, segue-se, de um modo
mais pormenorizado, a caracterização dos três primeiros estádios identificados por Kohlberg, refe-
rindo as suas características e o que os distingue.

Nível I: Moralidade pré – convencional (4 a 10 anos) – Neste nível as crianças atuam con-
soante o seu meio externo, agindo de forma a receber recompensas ou a evitar castigos (Papalia,
Olds & Feldman, 2007).

1º Estádio - orientação para a punição e a obediência. As crianças obedecem às regras para evitar cas-
tigos aceitando a vontade dos outros e das autoridades (Lourenço, 2002).
Neste estádio as crianças ignoram os motivos de uma ação e concentram-se na sua forma física
ou nas consequências que podem sofrer fisicamente (Papalia, Olds & Feldman, 2007) e por isso,
predominam nesta fase, “ideias de castigo automático, responsabilidade objetiva, sanções expiató-
rias e justiça imanente” (Lourenço, 2002, p.77).

2º Estádio - Interesses e trocas instrumentais. A criança aceita as regras por interesse pessoal (Papa-
lia, Olds & Feldman, 2007). Ela considera que uma ação é positiva se tiver de acordo com as suas
necessidades ou de outro semelhante a ela que atua por interesses e favores (Lourenço, 2002). Este
estádio rege-se por uma orientação moral pragmática, hedonista e egoísta (Lourenço, 2002).
Tal como o estádio 1 também este lembra a moralidade heterónoma de Piaget. Mas, no estádio
2 a criança pode conter dois pontos de vista, envolvendo “mais ações externas do que sentimentos
internos, e considerados em sucessão (farei mal a quem me fizer mal; e bem a quem me fizer bem),
não simultaneamente (não me vingo de quem me faz mal porque também não gosto que se vin-
guem de mim quando procedo de modo menos correcto)” (Lourenço, 2002, p.78).

Nível II: Moralidade Convencional (10 a 13 anos) – Os indivíduos preocupam-se em serem


corretos nos seus atos e em manter a ordem social (Papalia, Olds & Feldman, 2007), ou seja, assu-
mem-se como pertencentes a uma sociedade e por isso todos os seus atos têm em vista o ponto de
vista dos outros (Lourenço, 2002)

3º Estádio -Afeto e aprovação interpessoal. As crianças querem agradar e ajudar os outros, sabem
julgar intenções e desenvolvem as suas próprias ideias do que é uma boa pessoa. A criança coloca-
se na “pele” do outro fazendo de tudo para que resolva os problemas não de modo individualista
como acontecia no estádio anterior, mas sim de modo, a que todos se sintam bem ao que Kohlberg
84 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

chamou regra de ouro (Lourenço, 2002). Avaliam uma ação de acordo com o motivo que há por
de trás dela ou segundo a pessoa que a pratica e também levam em consideração as circunstâncias
(Papalia, Olds & Feldman, 2007).

2. A importância das histórias infantis no (des)


envolvimento das crianças
Vários investigadores têm destacado o papel da literatura infantil no desenvolvimento da criança
permitindo-lhe o acesso a diferentes realidades, sendo, ao mesmo tempo, um suporte na cons-
trução da sua identidade e no desenvolvimento socio-moral. Segundo Saraiva (2001, referido por
Rodrigues & Oliveira, 2009), a literatura infantil permite a auto compreensão, o estabelecimento de
relações interpessoais, a integração no meio social e a consciencialização de si e da realidade, além
de promover o desenvolvimento das competências sociocognitivas.
Bastos (1999) partilha também a opinião que os livros infantis permitem à criança o enriquecimen-
to da sua formação intelectual, da sensibilidade, da reflexão e da estruturação da imaginação.
Assim sendo, é necessário destacar a importância da literatura infantil, pois esta poderá permitir,
através de discussões dirigidas, o desenvolvimento da criança, nomeadamente o seu desenvolvi-
mento social e das competências de interação social (Rodrigues & Oliveira, 2009). Teglasi &
Rothman (2001 referido por Rodrigues & Oliveira, 2009) referem seis perguntas que podem ser
utilizadas na exploração dos livros com o objetivo de promover o desenvolvimento social: O que
está acontecer?; O que é que as personagens estão a pensar e a sentir?; Quais são as intenções e
metas das personagens?; Como as personagens executam e monitorizam o seu comportamento? e
Quais as lições aprendidas?
No que diz respeito às crianças com necessidades educativas especiais, os mesmos autores re-
ferem que as narrativas podem ser utilizadas como meio para ajudar a processar a informação, ba-
seando-se nas suas experiências prévias, como também em informações de situações atuais (Teglasi
& Rothman, 2001 citado por Rodrigues & Oliveira, 2009).
Reforçando as ideias anteriormente referidas, Bettelheim (2004, p.20) refere que uma história
infantil:

“Enquanto diverte a criança, esclarece sobre ci mesma, e favorece o desenvolvimento


da sua personalidade. Oferece significado em tantos níveis diferentes e enriquece a
existência da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça à multidão
e diversidade de contribuições que esses contos dão à vida da criança.”

Considerando esta citação podemos referir que o livro além de poder ser considerado um objeto
lúdico é, também, um meio de crescimento individual, uma vez que ajuda a criança a compreender
diversas situações que ocorrem ao seu redor com as quais precisa de aprender a lidar. Tal como
refere Margaret Mead (1968, citado por Coelho, 2008, p.215), “Chegamos ao ponto em que temos
de educar as pessoas naquilo em que ninguém sabia ontem, e prepará-las para aquilo que ninguém
sabe ainda, mas que terão que saber amanhã”.
Para Coelho (2008) a leitura de histórias influi em todos os aspetos da educação da criança: na
afetividade: desperta a sensibilidade e o amor à leitura; na compreensão: desenvolve o automatismo
da leitura rápida e a compreensão do texto; na inteligência: desenvolve a aprendizagem de termos
e conceitos e a aprendizagem intelectual.
Pires & Morgado (2010) referem outros contributos da literatura infantil que passam pela edu-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 85

cação/formação da criança enquanto tecnologia normalizadora, alfabetizadora e humanista; os


seus textos podem também promover o caráter ao nível intelectual do leitor além das capacidades
de empatia, formação política, estética e ética. Em relação à última, as temáticas podem ser várias
como a educação, a religião, a família. Além do ouvinte (criança), é também essencial procurar saber
a importância daquele que conta as histórias, o pedagogo.
Para Abramovich (1997, referido por Sales, 2011) o professor necessita de adotar alguns pro-
cedimentos enquanto lê para que a mensagem da história seja transmitida, como a modificação de
voz por exemplo (sussurrar quando o momento leva o personagem a falar baixinho, ou quando está
a pensar em alguma coisa extremamente importante para a condução do foco narrativo). Também
nos momentos de dúvida e de reflexão a entoação de voz deve acompanhar o movimento da histó-
ria, assim como é importante o uso das onomatopeias, os espantos, o susto, a expressão facial que
acompanha o relato; tudo deve ser feito para levar a criança ao encontro da magia que está expressa.

3. Procedimentos metodológicos
A presente investigação comporta um estudo descritivo que se organiza como um estudo de
caso em que a investigadora fez uso da observação participante. Este tipo de observação permitiu-
lhe estar diretamente envolvida no contexto e intervir junto do grupo alvo a ser observado (Carmo
& Ferreira, 2008), procedimento que foi considerado o mais adequado à análise do problema sub-
jacente ao estudo, bem como à prossecução dos seus objetivos. Como foi referido na introdução,
os objetivos que nortearam a nossa intervenção foram os seguintes:

• Conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE) rela-
tivamente à sua (com)vivência com a diferença.
• Analisar o contributo das histórias infantis na construção das conceções das crianças acerca da
diferença, ou mais concretamente, das conceções das crianças em relação à interacção com a
diferença, em contexto escolar.

Apesar de todas as sessões ficarem registadas em vídeo, a investigadora utilizou como auxiliar de
registo e organização de dados notas de campo onde anotou detalhadamente tudo o que ocorreu
nas sessões. Este registo foi feito em suporte informático, que segundo Carmo & Ferreira, (2008)
tem vantagens, pois, proporciona a recuperação fácil do texto construído, permite uma maior se-
gurança e organização do mesmo e por fim permite pesquisar de forma mais rápida a informação
anotada através do processador de texto.
Relativamente aos instrumentos utilizados, optou-se pelo teste sociométrico, numa primeira e
última sessão. Segundo Moreno (1962, citado por Knappe & Barbera, 1997, p.92) este instrumento
“serve para medir a importância da organização dos grupos sociais. Consiste expressamente em
pedir que alguém escolha, no grupo a que pertence, ou ao que poderia pertencer, os indivíduos que
gostaria de ter como companheiros”.
A intervenção que realizamos junto das crianças foi dividida em dez sessões em que a orga-
nização se centrou na exploração de um livro infantil e nos finais das histórias construídas pelas
crianças. Seis sessões foram realizadas em grupo e quatro foram individuais, mas todas elas tiveram
o propósito de analisar as intervenções e respostas dos alunos no que diz respeito à aceitação da
diferença do outro, para uma posterior análise e conclusão. Assim sendo, a partir dos finais dados
pelas crianças e das respostas às questões colocadas pela investigadora foi possível identificar a
conceção das mesmas perante a diferença e o envolvimento com esta.
86 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Os livros selecionados - A Estrelinha Pálida (Seromenho, 2011), A Menina Gigante (Marmelo &
Marmelo, 2003) e “O aquário” (Mésseder, 2010) - foram previamente analisados, pois todos eles
teriam de transmitir a mensagem “saber viver com a diferença”, para além de terem que cumprir o
critério de adequação ao nível etário e desenvolvimental das crianças da amostra.
Na quinta sessão os alunos leram os finais das histórias que inventaram. Posteriormente, a in-
vestigadora fez algumas perguntas acerca dos finais escritos para esclarecer algumas dúvidas e para
ajudar à interpretação dos mesmos, de forma também a perceber o porquê da escolha daquele final.
Seguidamente, cada um dos alunos disse qual foi, para ele, o final da história preferido, referindo o
porquê da sua eleição. Na sessão seguinte, os alunos, foram, novamente, sujeitos a um encontro in-
dividual com a investigadora. Esta colocou questões de modo a que o aluno se colocasse “na pele”
das personagens, para que ele referisse quais as atitudes que tomaria em determinadas situações
ocorridas na história.
As sessões realizadas permitiram promover, ainda que indiretamente, o desenvolvimento sócio
– moral. Durante as atividades propostas proporcionámos às crianças a oportunidade de descen-
tração social, uma vez que para concretizarem as tarefas sugeridas e responder às questões levantas
eram “obrigadas” a colocarem-se no ponto de vista do outro.

4. Amostra
A amostra integrou seis crianças, três crianças ditas normais e três crianças com necessidades
educativas especiais, apresentando dificuldades de aprendizagem. Todos os alunos frequentavam o
3º ano de escolaridade.
Esta amostra era constituída por três elementos do sexo masculino que vamos identificar com
nomes fictícios Daniel, Lucas, Rui e três crianças do sexo feminino, Margarida, Joana e Eva.
Houve necessidade de selecionar uma aluna (Joana) integrada numa turma diferente, pois não
existiam três crianças com NEE pertencentes à mesma turma. Contudo, evidenciamos que esta
criança tem apoio ao estudo com as outras duas crianças com NEE (Daniel e Eva).

5. Apresentação e Análise de Resultados


No que respeita aos resultados obtidos junto da nossa amostra nos dois momentos de aplicação
do teste sociométrico verificamos que os alunos sem NEE não tendem a selecionar os alunos com
NEE como parceiros para diferentes actividades. Pensamos que o processo de identificação está na
base da construção de relações de proximidade e de cumplicidade inerentes à partilha e à interação
social. Nesse sentido, a identificação de características diferenciadoras em crianças com NEE, pode
estar na base dos resultados encontrados que não indiciam alterações nas preferências seletivas das
crianças entre a primeira e a última sessão.
O fato de não estarem integrados na mesma turma também pode ter influenciado o menor
número de vezes que aluna Joana foi selecionada, pois se uma criança não conhece bem a outra
não tem tendência a escolhe-la para realizar uma atividade. Se não há uma ligação próxima que
permita o conhecimento da mesma, ao escolhê-la não sabe o que pode esperar dela e se lhe trará
boas influências.
Se o presente estudo permitiu evidenciar que as atividades de exploração dos livros selecionados
não contribuiu para a modificação das escolhas relacionais dos alunos, evidenciou, no entanto, a
sua importância para a análise das conceções que as crianças tinham acerca da diferença, a partir da
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 87

atividade escrita e das várias conversas, individuais e em grupo.


Destacamos o caso da aluna Margarida pelo facto de esta aluna revelar um bom desenvolvimen-
to cognitivo, evidenciado nas atividades realizadas durante o estudo e nas suas manifestações nas
sessões individuais e em grupo (Anexo A). Demonstrou ser uma criança capaz de lidar com um
outro ser diferente, interagir com ele e estimular a aceitação e integração do mesmo, principalmente
através do diálogo. Essas características terão contribuído para ser a criança mais escolhida como
parceiro nas diferentes atividades no teste sociométrico.
Pudemos também apurar através das observações realizadas, que esta aluna é querida pelos
colegas, mostrando em todas as sessões (coletivas e individuais) uma atitude compenetrada, meiga,
compreensiva e responsável.
Verificámos também que esta aluna demonstra um desenvolvimento moral correspondente à
sua idade mas acima da generalidade das outras crianças da amostra. A criança na exploração do
livro O aquário faz referência à importância de fazer bem ao “outro” pois se assim não for podem
existir castigos. Menciona ainda que “quando fazemos o mal recebemos o mal e quando fazemos
o bem recebemos o bem” (Anexo A).
Como podemos verificar, as respostas da aluna vão ao encontro das características que Kohl-
berg considerava serem próprias do Nível I – moralidade pré convencional, onde ocorrem dois
estádios (orientação para a punição e a obediência; interesses e trocas instrumentais), manifestando,
no entanto e em alguns momentos, comportamentos característicos do início do nível II Moralida-
de – Convencional, pois, como já foi referido, a aluna assume uma preocupação pelo outro e pelo
seu bem-estar.
Verificámos que a criança Eva, sendo uma das crianças com NEE, é a aluna que dá respostas
mais discriminatórias acerca da diferença, como foi no caso da terceira questão acerca da história
A Menina Gigante em que diz que se fosse colega desta personagem iria gozar com ela. Também
no caso da terceira questão da história O aquário, a aluna menciona que se fosse um dos peixinhos
azuis não deixava comer o peixinho vermelho porque este era egoísta pois só queria a comida para
ele. Destacamos que, contrariamente à Margarida, a Eva revela algumas dificuldades de integração
e relacionamento com os colegas de turma associados às suas dificuldades de aprendizagem.
Estes dois casos, merecedores de uma análise mais detalhada e profunda não contemplada no
presente estudo, permitem-nos reforçar a relevância da perspetiva socio-construtivista na com-
preensão da relação entre o desenvolvimento cognitivo e o desenvolvimento socio-moral.
Quando, na última entrevista individual, perguntámos as características que as personagens dos
livros abordados tinham em comum, todos os alunos focaram a discriminação que estas sentiam e
que por isso não tinham amigos.
Propondo que pensassem no que poderia acontecer se existisse um encontro entre as três perso-
nagens, os alunos Lucas, Joana, Eva e Daniel referiram que estes podiam juntar-se e serem amigos.
Podemos referir que para estes alunos as três personagens juntas podiam combater a discriminação,
formando um elo de amizade entre elas, transmitindo assim a mensagem “A união faz a força”.
A Margarida, mais uma vez, propõe o recurso ao diálogo e à comunicação, bem como o direito
da igualdade entre todos.
Para o Rui as personagens “podiam vencer” consciencializando os outros que todos possuem
defeitos, através de um póster.
Quando questionada a moral dos livros, as alunas Joana e Eva tiveram mais dificuldade em res-
ponder à questão pois não compreenderam o que se pretendia.
Os restantes alunos não tiveram dificuldade em responder, referindo que devemos ser amigos
de todos, independentemente das suas diferenças. Deste modo, concluímos que entenderam a
mensagem que as histórias utilizadas pretendiam transmitir.
Os alunos Rui, Lucas e Margarida, nas respostas dadas quanto à moralidade da história pro-
88 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

nunciam, respetivamente, a expressão “Devemos ser (…)”, “Devemos ser (…)”, “Devíamos per-
ceber(…)”, permitindo-nos aferir que para estes o dever incide sobre “direitos e deveres, justiça e
bem – estar dos outros” (Lourenço, 2002).
Um dos objetivos que vimos cumpridos neste trabalho foi a possibilidade que as atividades pro-
postas tiveram em promover a competência das crianças em se descentrarem do seu ponto de vista.
Todas elas tiveram a capacidade de “saírem de si” e colocarem-se no lugar do outro (discriminado
ou discriminatório).
Neste sentido, focamos a resposta da aluna Margarida no que diz respeito à moralidade das
histórias trabalhadas, em que a mesma exterioriza o que se pode sentir quando se é discriminado
“Aprendi que se nós formos desprezados não ficamos bem, ficamos com uma dor no coração”.

6. Considerações Finais
Concluindo o presente trabalho de projeto podemos referir que aceitar o desafio de analisar
o contributo da literatura infantil na formação de representações e conceções sobre o mundo e,
particularmente, sobre a diversidade e a diferença do ser humano, se organizou como uma tarefa
complexa mas potenciadora de estratégias e atividades importantes na promoção de interações en-
tre crianças com e sem necessidades educativas especiais. Como referem Leite & Rodrigues (2000),
a literatura infantil é um instrumento potencialmente enriquecedor porque “pode ajudar a resolver
dilemas emocionais, estimula o desenvolvimento do imaginário, de competências de literacia e de
reflexão crítica sobre questões sociais e pessoais entre outras” (p.25).
Na organização da pesquisa e de forma a tentar dar resposta aos objetivos delineados, foi fun-
damental conceber estratégias sócio – construtivistas, nomeadamente a criação de debates e a
oportunidade de promover aprendizagens em grupo, permitir o confronto das várias perspetivas
individuais, desafiar a construção de possíveis finais das histórias, promover a compreensão de
múltiplas possibilidades de analisar e vivenciar os conflitos individuais, bem como relacionar as
competências cognitivas com as competências relacionais e sociais.
Um dos objetivos que vimos cumpridos neste trabalho foi a possibilidade que as atividades pro-
postas tiveram em promover a competência das crianças em se descentrarem do seu ponto de vista.
Todas elas tiveram a capacidade de “saírem de si” e colocarem-se no lugar do outro (discriminado
ou discriminatório).
Através dos livros, além de podermos analisar as conceções das crianças no que diz respeito à di-
ferença, verificámos que através das atividades exploratórias dos mesmos permitimos “um recreio”
que lhe estimulou a imaginação (Chaves, 1949 citado por Pires s/d). As crianças, nomeadamente
as sem NEE, na escrita dos finais não se limitaram a dar um final à personagem, estas tiveram o
cuidado de ir mais além, dando vida a outras personagens humanas ou animais, criando outros
espaços e fantasiando situações criativas.
Aferimos que as crianças quando colocadas no lugar de uma personagem discriminada opta-
riam pelo isolamento, acatando a decisão de quem discrimina, ou então, iam para junto de outros
também discriminados pois seria mais fácil conviver e não eram julgados.
Neste sentido, a partir da análise da escrita das histórias e das entrevistas individuais podemos re-
ferir que apesar de algumas crianças terem demonstrado mais dificuldades concetuais que outras,
todas direcionam as personagens discriminadas para junto de outras também com limitações (Ane-
xo A).
Por último, é importante referir que o estudo descrito apresenta limitações inerentes às condi-
ções reais da sua operacionalização mas que evidenciam o seu carácter exploratório e descritivo.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 89

Uma das grandes limitações deste estudo encontra-se na sua reduzida amostra de seis alunos.
Assim sendo, as conclusões circunscrevem-se às crianças observadas. Por outro lado, tal como já
tinha sido referido, de entre as seis crianças que servem de amostra uma delas está inserida numa
turma diferente. Este fato pode ter introduzido algum enviesamento nos resultados, nomeadamen-
te os obtidos no teste sociométrico.
O número de livros explorados, associado ao tempo disponível para a implementação das ativi-
dades, também podem ser apontados como limitações do estudo, pois sabemos que a construção/
mudança de conceções, bem como o estabelecimento de relações interpessoais positivas são pro-
cessos complexos e associados a uma multiplicidade de variáveis pessoais e contextuais.
Para que a consciencialização perante a diferença seja promovida e para que todos se sintam
integrados num determinado meio não basta estarem juntos numa escola mas sim construir uma
escola para todos.

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90 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 91

Anexo A
92 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 93
94 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 95

LIGAÇÕES CRIANÇA/ESPAÇO EM
EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA PROMOVER
APRENDIZAGENS SIGNIFICATIVAS

Miguel Castro (miguelcastro@esep.pt)


Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre

Resumo
No artigo defende-se a importância de proporcionar experiências significativas para a apropria-
ção de conhecimentos, sendo a noção de “espaço” apreendida através de jogos e atividades que
envolvam a criança e o contexto espacial onde decorrem.
O ambiente onde a criança se move ganha significado pela forma positiva como ela se pode
relacionar com o espaço. Criando-se um contexto propício para a realização de experiências de
aprendizagem, “humaniza-se” o espaço, deixando este de ser apenas o suporte estrutural para a ati-
vidade e, passando a constituir-se como lugar com significado no universo fantástico das crianças.
Apresentam-se as experiências levadas a cabo em Jardins-de-infância da cidade de Portalegre,
onde através da preparação das crianças para o ambiente que iriam conhecer, e de atividades lú-
dicas muito concretas, que decorreram no local, observou-se ter sido facilitada a apropriação do
espaço, i. e., a Geografia, com base na empatia e na relação que as crianças estabeleceram com o
novo ambiente.
Concluímos que as condições de aprendizagem e disponibilidade das crianças para novos co-
nhecimentos, aumenta em espaços com significado para a criança e com os quais ela estabelece
uma relação afetiva.

Palavras-chave: Apropriação do espaço; Educação Pré-escolar; Atividades Lúdicas; Geografia


96 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
This Paper is about the importance of providing meaningful experiences for the children to
transmit them knowledge and the general notion of “space” and geography. This can occur throu-
gh games and activities involving the child in the spatial context where the activities happen.
The environment where the child moves becomes meaningful in a positive way, so that they
can relate with the space. Creating an enabling environment for the performance of learning ex-
periences “humanizes” the space, thus leading them to include it in a significant way in their own
fantastic universe.
We present experiments carried out in Portalegre’s kindergartens. Through groundwork about
the places they would visit, and recreational and very concrete activities, which took place on the
sites, the children were able to claim the space much more easily, based on the empathy they esta-
blished with the new places.
We conclude that the learning conditions and children’s availability to absorb knowledge increa-
ses in spaces with meaning and to which they have a friendly connection.

Keywords: Appropriation of space; Kindergarten; Playful activities; Geography.

I – Introdução
O suporte especial onde nos movemos está de tal forma presente nas nossas vidas que tendemos
a não o valorizar, nem a responsabilizar o contexto por aspetos ou fenómenos de comportamento
que atribuímos a outros fatores, de ordem social, económica, política ou cultural. A organização
do território, dos centros urbanos ou de fenómenos sociais localizados tendem a ser explicados
por diversas ciências, sendo que a Geografia nem sempre é realçada como área de conhecimento
fundamental em etapas precoces da educação.
A atenção ao espaço, à qualidade da organização, à sua construção social e vivência individual
ou coletiva estão diretamente ligadas à qualidade de vida de que usufruímos. Assim, a atenção aos
aspetos geográficos deve ser iniciada o mais cedo possível com o objetivo de formarmos cidadãos
ativos e interativos relativamente ao suporte espacial onde se inserem.
Para tal, teremos que proporcionar experiências e vivências significativas para que o espaço ad-
quira importância, simbolismo e pertença à formação identitária. O espaço é vivido, e é através da
sua vivência que este adquire significado, “reducing the world to a spaceless abstration…[has] very
lilited utiliy” (Hubbard et al; 2002, pp. 39)
A interiorização do espaço, a nível pessoal e coletivo, é adquirida a partir das experiências signifi-
cativas que nele vivenciamos. Positiva ou negativamente, as experiências que vivemos ficam ligadas
ao espaço onde ocorreram.
O conhecimento do espaço, da realidade geográfica, ficam sempre incompletos sem o contacto
físico, concreto. Conhecer uma cidade não passa, apenas, por realizar os passeios turísticos, visitar
os monumentos, ou participar em outras atrações. A luz, o cheiro, os sons e fundamentalmente as
experiências e as vivências, positivas ou negativas, que ocorrem a cada indivíduo num espaço espe-
cífico, são os verdadeiros responsáveis por esse conhecimento. Perante uma praça pública, cada um
de nós pode ter uma experiência sensorial e humana diferente, que nos liga aos espaço de forma
particular, o modo como cada um se sente, o que come, o espetáculo a que assiste, o assalto que
sofreu, os sons que registou… auxiliam a construir a memória do momento.
Para a criança, a Geografia e o espaço, sendo realidades concretas, afiguram-se como abstrações.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 97

Se o pai está em Paris e a mãe em Berlim, a criança sabe apenas que estão longe. As distâncias
absolutas são irrelevantes. O pai não está mais perto do que a mãe, nem o contrário. A distância é
completamente incompreensível; ou seja, uma realidade abstrata.
O espaço é uma noção complexa e o seu conhecimento só é possível se a criança o for conhe-
cendo e se for apercebendo da sua importância através de vivências e experiências integradoras,
que posteriormente vão tornando a noção de espaço inteligível.
Ela conhece o espaço pela atividade física que lhe permite compreender a função, a história, os
aspetos naturais e sociais presentes numa determinada área ou local. Embora concreta, a realidade
geográfica pode constituir-se como abstrata para a criança em idade pré-escolar, pela dimensão do
espaço e a incapacidade de entender uma realidade fora do seu “Eu”. No entanto, a experienciação
de algo significativo que nele ocorra, conduz a criança a estabelecer uma empatia com o local e a
conseguir entendê-lo.
Para tal, necessita de o vivenciar, de sentir alguma emoção que a leve a apropriar-se do espaço,
tal como se apropria e se integra no enredo de uma história e se identifica com as personagens.
Esta perspetiva está bem espelhada em vários trabalhos de Kieran Egan (1990, 1992, 1994) onde as
narrativas estruturadas de acordo com o estádio de desenvolvimento cognitivo das crianças são uti-
lizadas para transmitir conceitos de tempo histórico. O que permite esta perceção é a forma como
a criança se envolve e se identifica com os personagens e se integra na ação. Também Yi-Fu-Tuan
(1983). Essencialmente nos capítulos 3 e 10 do seu livro “Espaço e Lugar”, marca a necessidade de
vivências e experienciação pelos humanos em geral e também pelas crianças para adquirimos a no-
ção de espaço, e direta ou indiretamente da Geografia. Ao interiorizar o local onde uma experiência
significativa que lhe provocou emoções (positivas) ocorreu, a criança entende-o, compreende-o e
fica com maior conhecimento sobre o que nele decorre ou decorria.

O que apresentamos é o relato de uma experiência de integração de aspetos cognitivos e mo-


tores através da atividade de exploração do espaço. Envolveu-se a criança, no sentido de tornar
concreto o aparentemente ou realmente abstrato, indo ao encontro do imaginário infantil, e apre-
sentando conceitos passíveis de serem interiorizados pelas crianças quando realizadas atividades
em contextos significativos e com uma componente lúdica. Esta abordagem consubstanciou as
Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, bem como as Metas Curriculares definidas
pela Tutela, que se mostrou eficaz e com uma avaliação positiva e evidente sucesso

II – Contextualização Teórica
Como atrás referimos, defendemos que o espaço, principalmente, quando estamos a trabalhar
com classes etárias baixas se conhece pela sua experienciação e vivência. Yi-Fu Tuan (1980; 1983)
em Topofilia, mas essencialmente em Espaço e Lugar advoga que o conhecimento do espaço é
pessoal e advém da vivência de experiências que ocorrem nos locais e em contextos culturais es-
pecíficos que influenciam a forma como conhecemos e nos apropriamos das geografias que nos
envolvem. Os geógrafos ligados às correntes culturalistas não olham o espaço como uma constru-
ção social que provém da forma como se organiza a sociedade e como esta o constrói e produz.
Não são as relações de produção ou a estrutura da sociedade que nos dão a conhecer o espaço mas
sim o que vamos apreendendo do nosso ambiente próximo pela experiência individual, embora de
alguma forma filtrada pelo contexto cultural a que pertencemos.
A população infantil ainda não possui a capacidade reflexiva para conhecer o espaço senão pela
experimentação e contacto físico com o mesmo. Em idade pré-escolar a criança é essencialmente
98 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

concreta. As teorias do desenvolvimento cognitivo que informam a educação privilegiam os as-


petos lógico-dedutivos, capacidade de compreensão dos fenómenos e manipulação de conceitos
concretos e abstratos. Piaget (1968) enfatiza a capacidade lógico-matemática e a capacidade de abs-
tração estabelecendo, ainda que com flexibilidade, grupos etários para compreender e manipular
conceitos, mais abstratos ou mais concretos. Segundo este autor, apenas a partir dos sete anos de
idade a criança começa a conseguir manipular conceitos mais abstratos.
Não pondo em causa Piaget, Kieran Egan (1992) advoga que a criança, desde cedo, consegue
manipular conceitos abstratos e interpretar a realidade, se esta lhe for introduzida de acordo com
a sua “cosmologia e cosmogonia mítica“. Por exemplo, o bem e o mal ou o amor e o ódio, sendo
conceitos altamente abstratos, não são impedimento para que a criança os manipule ou os com-
preenda.
Nos “Estádios da Compreensão Histórica” (1990) e principalmente no “Desenvolvimento Edu-
cacional” (1992), Egan define quatro estádios do desenvolvimento cognitivo: o Mítico (4/5 anos
aos 9/10), o Romântico (8/9 anos aos 14/15); o Filosófico (14/15 anos aos 19/20) e por último o
Irónico. O primeiro corresponde à etapa pré-escolar e é aquele que nos interessa nesta experiência
que concretizámos.
Para que a criança esteja desperta e com capacidade de integrar conhecimentos no seu universo
teremos que abordá-la dentro das características do seu estádio cognitivo (o Mítico), que, segundo
Egan, possui quatro caraterísticas fundamentais. A primeira caraterística do pensamento “mítico” é
a sua necessidade de segurança intelectual; se apresentarmos a realidade de forma mítica esta estará
ao alcance da compreensão infantil. O Mito fornece “explicações exaustivas do porquê de as coisas
serem como são, e fixando o significado dos acontecimentos através da sua relação com modelos
sagrados” (Egan, 1992, p.23).
A falta de sentido da diversidade espácio-temporal e da causalidade lógica dentro do contexto
espacial - “o facto de as crianças não possuírem o sentido da diversidade das coisas pode ser expli-
cado simplesmente como falta de experiência e de conhecimento da mudança e da causalidade à
escala histórica e num determinado espaço geográfico. (…) A terceira marca do pensamento infan-
til “é a falta de um sentido do mundo como algo de autónomo e objetivo. (…) O mundo da criança
está cheio de entidades que adquirem significado através das coisas que a criança conhece melhor:
o amor, o ódio, a alegria, o medo, o bem, o mal. (idem, p. 24). A última caraterística, por ventura
a que melhor explica o pensamento infantil na sua interpretação da realidade, é a articulação do
real a partir de oposições binárias bem vincadas – “as crianças começam a dar sentido às coisas em
termos binários” (idem, p. 25).
É a partir destes dois quadros teóricos que estruturamos a nossa experiência de introduzir
conceitos geográficos, espaciais, e igualmente históricos. Por um lado, as atividades devem propor-
cionar um conhecimento e apropriação do espaço pela sua vivência e experimentação; por outro,
as atividades deverão também estar estruturadas de acordo com as caraterísticas do estádio de de-
senvolvimento cognitivo das crianças, o Mítico, segundo Kieran Egan.

III - Contextualização metodológica


No âmbito da unidade curricular de História e Geografia para a Infância, abordámos com os
alunos a forma de introduzir conceitos geográficos. Concluímos que as atividades lúdicas que esti-
mulem o desenvolvimento integral, motor e cognitivo, seriam a forma mais eficaz de conseguir o
objetivo principal desta etapa do processo educativo – o desenvolvimento harmonioso da criança.
O conhecimento e apropriação do espaço pela criança só são atingidos através da vivência de
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 99

experiências significativas que ocorram no local. Se esse local for um contexto de aprendizagem
tornado explícito, conseguimos que a criança o entenda e o interiorize, bem como as aprendizagens
que nele decorram deixem uma marca que permita a associação do conceito ao espaço e vice-versa.
A abordagem deste projeto foi realizada numa perspetiva de investigação-ação. Este tipo de pers-
petiva pedagógica permite uma flexibilidade no processo de investigação que se vai adaptando ao
decorrer das experiências e permite ajustar o rumo de acordo com as crianças, individual e coletiva-
mente. A investigação-ação “é uma intervenção em pequena escala no funcionamento do mundo real
e um exame próximo dos efeitos de tal intervenção” (Máximo-Esteves; 2008, p. 19). O mesmo autor
na página seguinte (citando J. Mckerman, 1998) chama a atenção para a flexibilidade desta postura
face à intervenção em contexto, geral e particularmente, em educação pré-escolar: “ (…) investigação-
-ação é um processo reflexivo que carateriza uma investigação numa determinada área problemática
cuja prática se deseja aperfeiçoar ou aumentar a sua compreensão pessoal (…) é uma investigação
científica sistemática e auto-reflexiva levada a cabo por práticas para melhorar a prática.”
Não se pretendia realizar uma investigação extensiva, mas apenas realizar uma experiência en-
carada como um Caso de Estudo. Pensámos que esta metodologia seria a mais adequada para
conseguir testar o nosso objetivo principal: verificar se existe uma maior facilidade de apreensão de
conceitos e conteúdos, pela criança, quando apresentados através de jogos que integrem capacida-
des cognitivas e motoras, num contexto espacial significativo.
Embora os resultados não pudessem ser extrapolados, as conclusões permitem apontar cami-
nhos e pistas de reflexão e intervenção em contexto de jardim-de-infância. Também o aperfeiçoa-
mento de práticas específicas relativas à introdução de conceitos geográficos em educação pré-es-
colar poderiam ser enriquecidos e refletidos.
“A investigação qualitativa é uma forma de estudo da sociedade que se centra no modo como
as pessoas interpretam e dão sentido às suas experiências e ao mundo em que elas vivem (Vilela,
2009, p.105).
Com dois pares pedagógicos (conjunto de duas alunas em estágio), em duas salas de jardins-
de-infância de Portalegre, com 21 e 19 crianças respetivamente, prepararam-se dois jogos com
conceitos de História, Geografia, coordenação motora e atividade física. A comparação e validação
dos resultados foram efetuadas com outros dois grupos de controlo, constituídos por dois pares
pedagógicos colocados em outro jardim-de-infância, introduzindo os mesmos conceitos de forma
mais tradicional.
Os conceitos estavam relacionados com a vida quotidiana no tempo do Império Romano e
na Idade Média. Estes temas são tratados com frequência em Portalegre, devido ao património
regional muito rico em vestígios destas épocas, em concreto a cidade Romana da Ammaia e a vila
de Marvão, com um castelo medieval com potencialidades educativas inesgotáveis. Neste castelo,
encenou-se um torneio medieval; na Ammaia, a partir de algumas caraterísticas do próprio espaço,
realizou-se um jogo que simulava o apagar de um incêndio numa cidade romana.

IV - Apresentação, análise e discussão dos resultados


Este projeto pretendeu proporcionar às crianças atividades que as ligassem ao espaço e, conco-
mitantemente, facilitassem a aquisição de conceitos de História e de Geografia (a organização do
espaço e as suas funcionalidades) de forma lúdica, e facultando vivências e experiências significa-
tivas in loco. Para que tal acontecesse, em equipa com as alunas em Prática Pedagógica envolvidas
juntamente com as educadoras responsáveis pelas salas da educação pré-escolar, elaboramos os
planos de ação e as estratégias pedagógicas a utilizar desde o início até ao final, num período de
100 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

aproximadamente um mês, onde se tentaria, através do feedback das crianças, da observação da


Educadora (que já trabalhava com o grupo desde o ano letivo transato), e dos trabalhos e jogos rea-
lizados posteriormente na sala de atividades perceber até que ponto a estratégia tinha tido sucesso.
A avaliação baseou-se essencialmente em dados qualitativos. Teve-se em conta a resposta dada
pelas crianças quando questionadas sobre os temas em causa, feitas a partir da leitura de histórias
que se situavam nas épocas históricas em causa, na facilidade e rapidez na resolução de atividades
alusivas aos conceitos apresentados, como ordenar e/ou agrupar cartões representativos de tarefas
realizadas nos tempos históricos em causa, ou pequenas dramatizações, avaliando desta forma a
eficácia dos resultados da experiência.
Previamente, prepararam-se as crianças para os temas. Através de histórias, lendas locais, livros
com ilustrações e pequenos excertos de vídeos, sobre as realidades que iriam visitar, incutiu-se o
espírito de aventura que as personagens das histórias e dos filmes viviam nessas épocas. Os fortes
e corajosos cavaleiros, que se preparavam para as liças e outros jogos de guerra, foram vistos em
filmes da Disney - Robin Hood e A Espada era a Lei - e as aventuras de Astérix e Obélix. Esta pre-
paração criou ambiente e expectativa nas crianças, relativamente à visita de estudo aos locais onde,
no seu imaginário infantil, tinham ocorrido cenas semelhantes às apresentadas na sala de atividades.
A par deste trabalho, as alunas construíram alguns adereços baratos e seguros para a manipula-
ção infantil - roupas e utensílios, cavalos de pau, espadas de plástico e escudos de cartão.
O grupo de 40 crianças, com idades compreendidas entre os 4 e 6 anos, acompanhadas por
quatro alunas, duas educadoras e duas auxiliares de educação, visitou a cidade da Ammaia, depois
de ter realizado uma visita às ruínas, executou o jogo: “Apagar o fogo no tempo dos Romanos”.
A excitação das crianças começou logo no vestir dos adereços. Os capacetes de cartão e os fatos
feitos com sacos de plástico de grandes dimensões, cintados com uma corda, levaram as crianças
a assumir os seus papéis de romanos e outras personagens marcantes que tinham ‘conhecido’ nos
filmes apresentados na sala do Jardim de Infância.
Separadas em duas filas, a primeira criança de cada grupo estava perto de uma levada de água
e a última ao lado de um balde. Todas mantinham o posto (desde a água até ao balde) e cada uma
tinha um copo de plástico na mão. O objetivo final era encher o balde e despejá-lo num determi-
nado ponto nas ruínas da cidade, onde ‘ardia’ um suposto fogo. A primeira criança enchia o copo e
recebia do colega mais próximo um já vazio. O copo teria que se manter cheio, passando por todas
elas, até à última que o despejava no balde. Finda esta tarefa em equipa tinham que transportar o
balde para apagar o ’fogo’.
No castelo de Marvão, a atividade consistiu na simulação de um torneio. Num dos espaços mais
amplos do exterior do castelo dividiram-se as crianças em vários grupos. De espada e escudo, duas
crianças posicionavam-se em dois extremos de um terreno marcado. No centro desse espaço, uma
outra criança ficava em pé, com argolas penduradas nos braços abertos. O objetivo era retirar as
argolas com a espada de plástico, indo a correr de uma extremidade à outra. O primeiro que con-
seguisse retirar todas as argolas do seu lado, ganhava e passava-se a vez a outro grupo de crianças.
Para além de desenvolver a coordenação motora, estes jogos fomentam o espírito de equipa,
entreajuda e organização do grupo, bem como o cumprimento de regras, como requisitos impres-
cindíveis para atingir um objetivo/bem comum.
Pela sua vivência, o espaço é apropriado e interiorizado, proporcionando o desenvolvimento
de aspetos pedagógicos importantes que se enquadram na forma de estar e pensar da criança.
A aprendizagem depende de múltiplos fatores, objetivos e subjetivos. Fatores físicos e espaciais
como conforto, qualidade dos materiais pedagógicos, acesso a tecnologias, etc…são fundamentais
para o processo educativo. Porém, existem fatores intangíveis sem os quais não se consegue atingir
objetivos pedagógicos definidos - afetos, bem-estar consigo mesmo e com o outro, mas também e
essencialmente, a relação com o espaço.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 101

Se a criança cria empatia com o espaço onde se encontra fica mais predisposta a aprender e,
fundamentalmente, a falhar nas suas tentativas de aprendizagem, sem se sentir fracassada ou ficar
“envergonhada” consigo mesma, de tal forma que não se sinta “à vontade” para experienciar e
vivenciar, quer com os seus pares, quer com adultos. Proporcionando experiências facilitadoras do
acesso ao conhecimento e apropriação do espaço e possibilitando a maior proximidade com o mes-
mo, constroem-se quadros facilitadores de aprendizagens e introduzem-se conceitos da Geografia
- a observação do ambiente, as funções espaciais e as características físicas e humanas do espaço.
Os jogos e atividades ajudam na criação de um espírito de equipa, entreajuda, bem como o cumpri-
mento de regras, como requisitos. Desenvolve-se, concomitantemente, a interdependência, o sentido
de grupo, a responsabilidade e a valorização da autoestima, oferecendo à criança oportunidade de
ativar um conjunto de competências sociais para a descoberta e aprendizagem. O objetivo final deste
projeto foi apetrechar as crianças de dados da História e Geografia, relacionados com os locais.
Os resultados desta experiência (por ser única e limitada no seu significado experiencial) não
podem ser linearmente extrapoladas para outras realidades e contextos. Apontam, no entanto,
caminhos possíveis e permitem reflexões para algumas transformações das práticas pedagógicas
no jardim-de-infância, onde a importância do espaço e da Geografia possa passar a ocupar maior
relevo na formação das crianças.
Os resultados do projeto foram, quanto a nós, muito positivos e encorajadores relativamente à
abordagem que levámos a cabo. No entanto, em contexto de educação pré-escolar é sempre difícil
quantificá-los e medir com objetividade. Para além deste aspeto, a metodologia de investigação-ação
tende a valorizar o qualitativo e muitas vezes intangível, mais do que valores normativos, na prática de
educação pré-escolar, a utilização de instrumentos com vista ao alcance de resultados quantificáveis e
objetivamente mensuráveis é algo que ainda suscita muitas questões, além das dúvidas que lemos de
diferentes escolas de pensamento didático que se debruçam sobre esta classe etária.
A avaliação dos resultados foi, desta forma, qualitativa e construída a partir das opiniões das
crianças registadas e sistematizadas. Foram foco de atenção dos registos, os conhecimentos so-
bre as épocas, através de pequenos questionários posteriores e realizados (na sala de atividades)
a partir de narrativas que abordavam os temas considerados. Foram também analisados trabalhos
de desenho, e resolução de pequenos problemas de ordenação e agrupamento de cartões, bem
como “role-plays”. Para além destes dados, a opinião e observação da Educadora, partilhada com
as observações das alunas foi um fator de avaliação dos resultados. A comparação com os grupos
de controlo permitiu uma validação empírica dos resultados e a sua comparação com as respostas
e opiniões dos outros meninos. O desempenho das crianças implicadas evidenciou que o projeto
proporcionou não só a aprendizagem e interiorização de conceitos básicos com facilidade e eficaz-
mente, como desenvolveram competências sociais interpares e com os adultos.
Resultados positivos? Sem dúvida, mas o empenho das crianças foi Indicador mais saliente. As
crianças ‘transportaram-se’ para as épocas, vivendo o espaço e a vida há muito ocorrida naquelas
ruínas.

V- Considerações finais
Nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar, o espaço, e portanto a Geografia,
apresentam-se como temas acessórios. A Geografia não se individualiza, fica subalternizada ou
complementar ao “grande grupo” temático representado pelas Ciências Naturais, ou como “mu-
leta” da História. O exíguo espaço de destaque que lhe resta é para estabelecer alguns conceitos
como campo/cidade ou os meios de transporte; mesmo assim, estes conceitos são sempre subor-
102 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

dinados às perspetivas diacrónicas ficando a Geografia com um nível de sensibilização e explicação


mínimo e quase irrelevante.
Uma das mais eficazes ferramentas para interpretar e compreender as diferentes paisagens e os
fenómenos que nela ocorrem é a Geografia. Estamos constantemente a lidar com problemas es-
paciais, desde os nossos espaços quotidianos (em casa, no trabalho), a espaços mais amplos como
as cidades ou países e regiões. A compreensão geográfica dos fenómenos torna a nossa atitude
mais interventiva; incentivá-la, desde a mais tenra idade deverá ser um dos objetivos essenciais dos
educadores, na formação das crianças próativas e curiosas. Recorrer aos recursos locais, para que
progressivamente se possam preparar os alunos para realidades mais vastas, parece evidente e ade-
quado, principalmente quando estamos a lidar com grupos etários baixos.
George Benko (1999, p. 145) refere: “Pensar global para agir de forma local”. A ideia é exata-
mente permitir às nossas crianças a preparação necessária, para que de uma forma prática lidem
com a realidade. Através de intervenções didático-pedagógicas que possibilitem aos futuros profis-
sionais da educação utilizar os recursos locais para passar uma mensagem de vivência global através
também da educação espacial deve ser um dos objetivos da formação, quer dos Educadores de
Infância, quer dos alunos que pretendem seguir este caminho.
Educadores tentam vencer os obstáculos e dificuldades burocráticas e económicas que se lhes
deparam na sua prática pedagógica, levando as crianças ao encontro das paisagens e locais com
interesse pedagógico, que sejam símbolos regionais, locais ou nacionais e, portanto, identitários.
Muitas vezes, a visita de estudo não está estruturada e planeada de forma a proporcionar experiên-
cias e vivências significativas para as crianças. O que se pretende com a introdução da Geografia
em educação pré-escolar é que seja significativa e divertida para as crianças.
A principal dimensão presente no projeto foi a ligação ao regional e ao local, enfatizando a visão
geográfica. A Geografia é propícia à compreensão de processos diversificados e complexos; estu-
dando o espaço tem necessidade de perceber todas as dimensões que ai se expressam; à instituição
escolar cabe potencializar recursos mesmo aqueles que, sendo exteriores, podem e devem ser utili-
zados nos processos de ensino/aprendizagem.
As experiências que vivemos num determinado local vão fazer parte da nossa história pessoal. Es-
tabelecemos relações de afetividade ou repulsa com um espaço onde ocorreram vivências. Viajamos,
conhecemos lugares, pessoas, hábitos, costumes, cheiros e ambientes; aqueles que nos ficam impressos
correspondem aos espaços onde algo significativo nos surpreendeu, ou qualquer pequeno ou grande
facto lhes deu sentido. Criamos empatia com os locais - pertencem-nos, e nós pertencemos-lhes.
As sensações levam-nos a gostar dos lugares e, por extensão, da Geografia. A introdução a esta
ciência precocemente através de experiências e práticas pedagógicas que conduzam ao gosto pela
observação da paisagem e da sua explicação, imprime na memória vivências espaciais e o gosto pelo
suporte espacial, isto é, pela Geografia. Se as crianças compreenderem a paisagem, a funcionalidade
dos espaços e as razões que levam (ou levaram) à organização de uma determinada forma, terão
mais probabilidades de o compreender e de se ligar a ele. Serão, sem dúvida, crianças mais capazes
de lidar com a realidade e a novidade; aspeto essencial para a sobrevivência num mundo a onde a
inovação e o ritmo da mudança (também, a espacial) se faz a uma velocidade que desafia todos os
padrões até hoje conhecidos.
Este projeto teve como principal objetivo que as crianças entendessem uma realidade por uma
concretização do real. Os jogos nos espaços históricos permitem à criança captar o abstrato, lidan-
do com o concreto. Permitem-lhe perceber a importância do suporte físico para as atividades hu-
manas. Através destas vivências marcantes, as crianças ligam-se afetivamente aos espaços, humani-
zam-nos, compreendem-nos e apropriam-se deles, transformando-os em lugares com significado e
entendendo conceitos e conteúdos essenciais para a sua educação. Cremos, pois, que conseguimos
concretizar o nosso objtetivo fulcral.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 103

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104 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 105

MOTIVAÇÕES NA ORIGEM DO
ABANDONO ESCOLAR – ESTUDO DE
CASO COM JOVENS SINALIZADOS NA
CPCJ DE CASTELO BRANCO
Ana Raquel Lourenço (raquel-m-l@hotmail.com)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco

Resumo
Em Portugal o ensino obrigatório e gratuito é, simultaneamente, direito e dever das crianças e
jovens em idade escolar. Num país em que a escola vive entre a dicotomia da promessa de mobi-
lidade social e democratização, e a massificação e um crescente número de funções/solicitações
à instituição escolar, o absentismo/abandono escolar apresenta valores alarmantes que importa
perceber.
Considerado situação de perigo o absentismo/abandono escolar deve ser sinalizado e alvo de
intervenção das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.
O objetivo do estudo foi perceber as motivações que estão na origem do absentismo/abandono
escolar dos jovens acompanhados na CPCJ de Castelo Branco. Para tal foi utilizada uma amostra
de nove jovens e dos respetivos cuidadores acompanhados na CPCJ de Castelo Branco.
Foi possível concluir que as razões na génese do absentismo/abandono escolar se prendem
não apenas com características dos jovens mas, sobretudo, com as suas características familiares/
contextuais e com a capacidade ou incapacidade da instituição escolar em responder a um público
cada vez mais diversificado, em necessidades e aspirações.

Palavras-chave: Abandono Escolar; Comissões de Proteção de Crianças e Jovens; Crianças e Jo-


vens; Cuidadores; Intervenção Social
106 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
In Portugal the compulsory and free education is both a right and duty of children and young
people of school age. In a country where school lives the dichotomy between both the promise of
social mobility and democratization, and the massification and a growing number of functions /
requests to a school, dropout presents alarming values that matter realize.
Considered dangerous situation school dropout should be flagged and targeted intervention of
Commissions for the Protection of Children and Youth.
The project purpose was to understand the motivations underlying school dropout among the
students followed by the CPCJ of Castelo Branco. For this we used a sample of nine young people
and their carers, followed by the CPCJ of Castelo Branco.
It was concluded that the reasons on the genesis of dropout relate not only with the characteris-
tics of young people, but especially with their family and contextual characteristics, and the ability
or inability of school to respond to a constantly growing more diverse public in both needs and
aspirations.

Keywords: School Dropout; Comissões de Proteção de Crianças e Jovens; Children and Young
People; Caregivers; Social Intervention.

Introdução
Ainda que muito já se tenha feito no sentido de combater o Abandono Escolar (AE), este fenó-
meno continua a marcar gravemente o sistema de ensino português. Na sua origem parece estar a
dificuldade de alguns alunos em atribuir um sentido/finalidade à escola e ao trabalho escolar. Esta
dificuldade é, segundo autores com Rumberger (2001), motivada pelas características individuais
dos alunos, das suas famílias e da escola.
Presentemente as sinalizações por abandono (AE) ou absentismo escolar (AEG) representam
um grande número de processos acompanhados nas CPCJ. Tratam-se efetivamente de situações
que colocam em perigo a educação, formação e pleno desenvolvimento das crianças e jovens, em
última análise, por condicionarem as hipóteses futuras e possibilidades de sucesso destes jovens
quando adultos a nível pessoal, social e profissional.
Neste sentido, importa conhecer melhor as motivações dos alunos para deixar a escola e, tam-
bém, os seus contextos familiares e socioculturais, de forma a planear intervenções mais adaptati-
vas e eficazes no contexto da CPCJ.
O presente estudo centra-se na análise do discurso (através da realização de entrevistas semies-
truturadas e da sua análise de conteúdo) dos jovens sinalizados na CPCJ de Castelo Branco (CPCJ-
CB) por AE/AEG e, também, na entrevista a um dos seus cuidadores (pai, mãe ou representante
legal). Tem como objetivos: conhecer as razões que levam os jovens alunos do ensino obrigatório
sinalizados na CPCJ-CB ao AE/AEG; conhecer o contexto familiar, socioeconómico e cultural
dos jovens alunos em AE/AEG; conhecer a conceção dos alunos em AE/AEG sobre a educação
e a escola; conhecer a posição da escola face à situação de AE/AEG através do discurso dos alunos
em situação de AE/AEG.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 107

Contextualização Teórica
Sobre o AE importa saber que se trata efetivamente do abandono das atividades escolares sem que o
aluno tenha completado o percurso escolar obrigatório (…) e/ou atingido a idade legal (…) para o fazer. Benaven-
te et al (1994) citada por Melo (2008, p. 11)
Verdadeiramente, implica uma rutura com a escola por parte de alunos que desistem de usufruir
do seu direito à escola e educação, consequência de um processo de afastamento da instituição
escolar alimentado pelas dificuldades de entendimento e articulação entre uma cultura escolar es-
pecífica e a realidade dos contextos familiares e socioculturais dos alunos.
Em Portugal o AE revela-se em números alarmantes, que alertam para a necessidade de uma
mais ampla compreensão e intervenção nesta problemática. O problema do abandono é universal. Muito
vincado no nosso país como todos sabemos. Grave porque o nosso país tem desfrutado de condições invejáveis para
minorar a sua expressão e os seus efeitos (fundos comunitários para educação, formação e fins sociais, por exemplo),
o que revela ineficiência. Mais grave ainda porque é um problema que, mesmo ressalvando que não há determinismos
em educação, pode comprometer o desenvolvimento das pessoas, das comunidades e do país. (Canavarro, 2007, p.
69)
Benavente et al, (1999), citada por Melo (2008, p.16) defende que esta problemática ocorre repeti-
damente, no quadro de assimetrias e desigualdades sociais de uma instituição escolar cujos conteúdos e práticas não se
adequam à diversidade de quem hoje as frequenta. Tal facto, reforça o argumento de uma escola reprodu-
tora de desigualdades sociais, incapaz de se oferecer de forma homogénea a todos os que a ela têm
direito. Uma escola incapaz de promover igualitariamente as oportunidades e a mobilidade social
proporcionando situações de exclusão escolar (e exclusão social) e que sintomaticamente acabam,
quando não devidamente intervencionadas, em situações de AE.
Students drop out of school, schools discharge students. (Riehl, 1999 citado por Rrumberger, 2001, pp. 16-17)

Causas e Consequências
Para um melhor entendimento do AE importa refletir sobre as causas que estão na sua origem.
Yet identifying the causes of dropping out is extremely difficult to do because, like other forms of educational achie-
vement (e.g., test scores), it is influenced by an array of proximal and distal factors related to both the individual
student and to the family, school, and community settings in which the student lives. (Rumberger, 2001, p. 9)
Analisadas as principais abordagens teóricas acerca do AE, é possível perceber que autores
como Benavente (1994), citada por Dias (2010); Mata (2000), citado por Vicêncio et al (2004); ou
ainda, L.W. Barber, M.C. McClellan (1987), citados por Dias (2010), identificam para este fenó-
meno causas sobretudo de ordem: pessoal (características pessoais do aluno – cognitivas, sociais,
emocionais, problemas disciplinares, etc.); familiar (contexto socioeconómico e cultural da família,
cultura/história escolar da mesma, estilos parentais, vida familiar disfuncional, etc.); e de ordem
escolar (dificuldades de integração, inadaptação das famílias e alunos à linguagem especifica da
instituição escolar e vice versa, etc.)
A maioria dos autores parece concordar que são sobretudo os alunos com dificuldades de in-
tegração na escola e com contextos familiares e socioculturais caracterizados por vários tipos de
adversidades estruturais, a abandonar precocemente a escola.
Sobre o AE importa, ainda, ter em mente que não se trata apenas de um problema da escola e de
indivíduos em particular, mas também, de um problema social com consequências para o desenvol-
vimento do país (tratar-se-ão de indivíduos civicamente menos participativos, assim como, menos
qualificados/preparados para um mundo crescentemente mais competitivo).
108 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Muitos dos estudos disponíveis têm documentado que o AE tem sobretudo consequências
ao nível do futuro e do campo de possibilidades dos indivíduos que, por falta de escolarização,
se encontra francamente diminuído. Estas contrariedades no futuro prendem-se com uma
maior dificuldade de acesso ao mundo do trabalho, acesso a empregos pouco qualificados e
precários, geralmente mal remunerados, tornando-se estes indivíduos pessoal e socialmente
mais vulneráveis.
Numa comunicação da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu sobre o combate ao AE
(Comissão Europeia, 2011, pp. 3-4) é dado relevo às consequências deste fenómeno. Estas conse-
quências são concebidas a nível individual indo ao encontro do já referido (menor participação social,
maior risco de desemprego, desvantagem educativa dos descendentes, etc.), mas também, como
consequências a nível económico e da sociedade em geral sendo referidos efeitos a longo prazo no desenvolvimento
da sociedade e no crescimento económico, devido a uma menor participação dos cidadãos nos processos
democráticos e a um comprometimento da inovação e do crescimento que dependem de uma força
de trabalho qualificada.
Por outro lado, o fracasso na experiência de escolarização constitui uma memória de frustração
que pode vir a influenciar as gerações que se seguirem, na medida em que a má experiência dos pais
pode significar um menor envolvimento na escolarização dos filhos.

Contextualização Metodológica
Como foi referido na introdução, os objetivos que nortearam o estudo foram os seguintes:
conhecer as razões que levam os jovens alunos do ensino obrigatório sinalizados na CPCJ-CB
ao AE/AEG; conhecer o contexto familiar, socioeconómico e cultural dos jovens alunos em
AE/AEG; conhecer a conceção dos alunos em AE/AEG sobre a educação e a escola; conhecer
a posição da escola face à situação de AE/AEG através do discurso dos alunos em situação de
AE/AEG.
De acordo com estes objetivos utiliza-se uma metodologia qualitativa, sendo caraterizado como
um Estudo de Caso na medida em que analisa apenas os casos de AE/AEG sinalizados na CPCJ-CB.
Para a recolha de dados foi utilizada a entrevista semi-estruturada, realizada a uma amostra
intencional composta por nove jovens sinalizados com idades entre os 14 e os 17 anos e nove cui-
dadores correspondentes a cada jovem (ver tabela 1).
Para as entrevistas foi construído um guião de entrevista semidiretiva organizado em sete blocos
temáticos (relacionados com os objetivos e as questões de investigação do estudo), referindo obje-
tivos específicos para cada bloco, assim como, propostas de questões e tópicos a abordar e/ou ter
em atenção aquando da entrevista.
Depois de integralmente transcritas, as entrevistas foram trabalhadas através de análise de
conteúdo. Para a análise das entrevistas foram definidas categorias (mistas) e indicadores organi-
zados numa tabela, estabelecidos a priori partindo do guião e da revisão bibliográfica do estudo
e a posteriori depois de lidas todas as entrevistas individuais. Desta primeira tabela (Tabela para
Análise de Conteúdo) com categorias, questões, subcategorias e indicadores (citados do discurso
dos entrevistados) derivou uma segunda tabela (Tabela para Análise de Frequência) com cate-
gorias, subcategorias, indicadores (estabelecidos a posteriori – depois de lidas as entrevistas) e a
frequência com que tais indicadores se verificam no discurso dos entrevistados (exemplo: x em
9 ou x/9).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 109

Tabela 1: Constituição da Amostra utilizada.

Constituição da Amostra Utilizada


Entrevista Idade Género Ano Escolar Ensino Cuidador Entrevistado
M F Regular Outro

E1 15 X 8.º X Mãe
E2 16 X 2.º CEF1 Mãe
E3 14 X 8.º X Mãe
E4 17 X 10.º X Pai
E5 17 X 1.º CP2 Mãe
E6 16 X 7.º X Mãe
E7 16 X 1.º CP Madrasta
E8 14 X 7.º X Mãe
E9 16 X 11.º X Mãe

Apresentação, análise e discussão dos resultados


Tendo analisado as entrevistas a jovens e cuidadores, importa referir os seguintes aspetos.
As entrevistas aos jovens e cuidadores que compõem a amostra do estudo foram iniciadas com o
questionamento acerca da pertinência do mesmo. Todos os entrevistados revelam interesse em par-
ticipar, considerando o estudo interessante, ainda que, não atribuam importância aos seus objetivos.
Acerca da conceção de escola e escolarização os jovens referem sobretudo um espaço para o de-
senvolvimento das aprendizagens e a convivência com colegas, tendendo a encarar a escola como
um dever, um trabalho a cumprir. Os cuidadores identificam a escola como algo importante, valori-
zando sobretudo as aprendizagens e também o contacto social. Também os cuidadores entendem
a frequência da escola como uma obrigação. Jovens e cuidadores estabelecem uma forte ligação
entre o sentido da escola e o futuro, sobretudo com um valor instrumentalizado da escolarização
como forma de garantir um futuro promissor a nível profissional, afirmando todos que o trabalho
e esforço nas atividades escolares é fundamental.
Acerca da importância atribuída pelos cuidadores à escola/escolarização, todos os jovens afir-
mam que os cuidadores consideram a frequência da escola fundamental para o seu futuro. Mais
uma vez, refletindo uma lógica de dever a cumprir e não de genuína ligação com a escolarização.
Assim, pode verificar-se alguma discrepância entre atitudes e comportamentos sendo que, os jo-
vens dizem percecionar a escola como importante assim como dizem ser essa a opinião dos seus
cuidadores, mas revelam comportamentos (faltas) contraditórios a esta importância.
Sobre a reação dos cuidadores perante os elevados números de faltas e resultados escolares,
tanto jovens como cuidadores referem essencialmente a atitude atenta dos cuidadores, as reações
negativas perante a descoberta do absentismo e as punições que se seguiram. Referindo alguns cui-
dadores a ineficácia destas atitudes na medida em que os jovens continuaram a faltar.
Acerca do papel preventivo e corretivo da escola foi destacada, a figura essencial do Diretor de
Turma no contacto com alunos e cuidadores e o confronto com a sinalização à CPCJ. Os cuidado-
res referiram, maioritariamente, conversas rápidas em tom de alerta, e a transmissão (pela escola)
da situação aos encarregados de educação e à CPCJ.
Com os jovens e cuidadores entrevistados foi ainda explorado o futuro, no sentido de aferir
acerca das suas expectativas e ambições. Sobre conceções, perspetivas e objetivos de futuro foi
dado espaço, sobretudo, à opção pelo ingresso no mercado de trabalho ou pela continuação do

1
CEF –Curso de Educação e Formação
2
CP –Curso Profissional
110 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

percurso formativo/académico. A maioria dos jovens referem uma clara preferência pelo trabalho
em detrimento da escola, ainda que refiram a importância de concluírem os estudos obrigatórios
antes de se dedicarem a uma profissão.
De salientar a dificuldade de alguns jovens em perspetivarem o seu futuro, assim como, as suas
ambições e expectativas irrealistas, tendo em conta o seu percurso escolar. É de realçar que neste
ponto da entrevista, como noutros, foi necessário colocar questões mais diretas orientando o dis-
curso dos entrevistados no sentido de ser possível obter alguns dados que se pretendiam analisar
e que não estavam a ser naturalmente integrados nas respostas dos jovens e cuidadores. Tal, deve
ter-se em conta quando verificadas respostas ‘politicamente corretas’ e mais de encontro ao so-
cialmente desejado, mas que soam contraditórias quando tendo presente que se tratam de jovens
e cuidadores acompanhados na sequência de situações de AE/AEG. Os jovens com mais dificul-
dade em perspetivar o futuro, centram o seu discurso (à semelhança das suas atitudes) no ‘agora’.
Na rápida/imediata satisfação dos seus impulsos, normalmente, sem ponderar as consequências
ou efeitos a médio e longo prazo. Sobre o papel da escola e a sua importância tendo em conta o
seu futuro profissional, são unânimes em considerar a escola importante e até determinante. Tais
respostas são, em tudo, contraditórias com a atitude desinteressada e desmotivada que assumem
perante a escola e a frequência da mesma.
A maioria dos cuidadores assume que os jovens se encontram dentro dos limites da escolaridade
obrigatória e que têm, por isso, de estudar pelo menos até à conclusão do 12.º ano ou até atingi-
rem a maioridade. Assumem considerar como possível a mudança dos jovens para vias de ensino
mais adaptadas/condizentes com as suas aspirações e capacidades, ainda que alguns dos jovens já
tenham feito essa mudança e continuem a faltar às aulas.
Durante as entrevistas, foi também abordada a experiência escolar dos cuidadores, no sentido de
perceber como esta podia influenciar a relação dos jovens com a escola. Apenas dois dos cuidado-
res entrevistados têm habilitações académicas acima do 12.º, tratando-se de um curso profissional
e de uma licenciatura, mas todos frequentaram a escola. A maioria relaciona a sua experiência de
AE com dificuldades económicas e com um crescente interesse pelo trabalho em detrimento da
frequência escolar. Tendo em conta estas suas experiências escolares atribuem alguma importância
à escola e ao trabalho escolar, mais uma vez, relacionando sobretudo com as aprendizagens esco-
lares e sociais e com o futuro profissional.
Questionados sobre a possibilidade de os jovens terem começado a faltar às aulas para ingressa-
rem no mercado de trabalho, os cuidadores e jovens foram unânimes na resposta negativa.
Sendo o principal objetivo da presente investigação aferir sobre as motivações na origem do
AE/AEG dos alunos sinalizados, os sujeitos da amostra foram naturalmente inquiridos acerca das
razões que os levaram a faltar às aulas. Jovens e cuidadores referiram sobretudo desmotivação e de-
sinteresse perante a escola e o trabalho escolar, assim como dificuldades de integração e a influência
de colegas e amigos. Tais resultados vão ao encontro do aferido na revisão de literatura do estudo
em que a desmotivação é apontada como uma das principais razões para o AE/AEG, ainda que
motivada por variáveis do contexto do aluno. Os cuidadores referiram, ainda, a influência dos pa-
res, inadaptação aos docentes, e problemas familiares (como a perda de familiares próximos) numa
atitude de desculpabilização/desresponsabilização dos jovens. Um dos cuidadores refere, ainda,
características da personalidade da jovem que considera determinantes.
Junto dos jovens e cuidadores foi ainda aferida a possibilidade da influência de terceiros (pares,
familiares, etc.) na decisão destes de começarem a faltar a aulas. A maioria negou a possibilidade de
influências. Os que admitiram esta possibilidade referiram colegas e amigos e nunca familiares ou
outros. Importa, no entanto, alertar para algumas incoerências no discurso dos jovens entrevista-
dos mas, também, para a efetiva influência dos pares (colegas e amigos) na motivação/decisão dos
jovens aquando de faltar. De realçar que são estes pares que muitas vezes acompanham os jovens
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 111

durante o tempo em que estão a faltar. Tendo em conta a possibilidade de influência de cuidadores
os jovens não identificam os cuidadores como possíveis influências para o AE/AEG. No entanto,
merece ser considerado que possivelmente a influência dos cuidadores não passa por uma ação
direta de oposição à escola, mas antes de algumas lacunas na orientação/supervisão do percurso
educativo dos jovens (insuficiente ou inadequada), revelando desinteresse pelo trabalho escolar
dos filhos, fraco envolvimento/participação na vida escolar e fracas expectativas relativamente ao
sucesso escolar destes.
Questionados sobre a possibilidade de, enquanto cuidadores, terem influenciado os jovens na
questão do AE/AEG, a grande maioria negou ter sido uma influência.
Questionados acerca da sua proximidade com algum docente em especial com quem se sen-
tissem mais à vontade para desabafar e colocar questões, a maioria dos jovens identificou a figura
do Diretor de Turma, ainda que fossem também referidos outros docentes. Foram também os
Diretores de Turma os identificados quando questionados acerca de quem os esclareceu acerca do
AE. Tais resultados revelam, mais uma vez, algum cuidado e preocupação dos estabelecimentos
de ensino em informarem os alunos sobre o AE/AEG e sobre as possíveis consequências de um
número excessivo de faltas. É possível, no entanto, aferir que este diálogo se centra muito num
carácter meramente informativo, tarefa geralmente assumida pelo Diretor de Turma. É dado rele-
vo, sobretudo, a consequências como a retenção no ano escolar e a sinalização à CPCJ, não sendo
exploradas junto dos jovens alunos (e/ou encarregados de educação) as razões para o AE/AEG e
as consequências que este poderá ter a médio e longo prazo.
Também os cuidadores foram questionados acerca da sua proximidade com algum docente em
particular, assim como, a proximidade do jovem com algum docente específico. Novamente, foi
maioritariamente referida a figura do Diretor de Turma, elemento central na experiência escolar
do aluno e no estabelecimento de relação entre a escola e a família. Ainda assim, quando colocada
a ênfase na relação entre os alunos e os docentes são referidos pelos cuidadores relações de pro-
ximidade entre os alunos e outros docentes que não apenas o Diretor de Turma. Os cuidadores
identificam também os Diretores de Turma como os principais intervenientes na altura de infor-
mar e consciencializar jovens e cuidadores acerca do AE. Aqui deve ser realçada a discrepância
relativa ao diálogo da escola com jovens e com cuidadores. Deve, por isso, refletir-se sobre o que
poderá estar na origem deste distanciamento verificado entre escola e cuidadores, considerando as
possíveis pistas dadas pela revisão de literatura que passam pela dificuldade de comunicação entre
escola e família; pela existência de ‘códigos linguísticos’ muito diferentes que dificultam o diálogo
entre ambos os sistemas; crenças disfuncionais das famílias acerca do funcionamento, importância
e utilidade da escola; assim como, a dificuldade da instituição escolar em flexibilizar regras e proce-
dimentos para se aproximar dos cuidadores/famílias dos jovens alunos.
Sobre a relação dos alunos sinalizados com os seus pares (colegas e amigos) foi ainda explorada
a influência destes no comportamento e desempenho académico dos jovens e a existência de pares
próximos do aluno também em situação de AE/AEG. A maioria dos jovens demonstrou alguma
dificuldade em assumir que se importam/interessam pela opinião que os seus pares têm acerca de
si e do seu desempenho académico. Também não é abertamente que assumem que moldam o seu
comportamento (sobretudo em contexto escolar) em função desta opinião dos seus pares. A maio-
ria dos cuidadores, no entanto, consideram existir esta influência. Foi colocada também a questão
acerca da convivência estreita dos jovens com pares também em situação de AE/AEG. Ainda que
poucos não tivessem essa informação, a maioria dos cuidadores respondeu afirmativamente. Aos
cuidadores foi, também, questionado se primam por conhecer os pares próximos dos jovens. A
grande maioria respondeu que sim.
No final da entrevista foi dado espaço a todos os jovens e cuidadores para comentar as questões
abordadas e acrescentarem o que desejassem à entrevista. Apenas um dos jovens se revelou inte-
112 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

ressado em se pronunciar tendo, sobretudo, refletido sobre a intervenção da CPCJ que considera
excessiva e desnecessária em situações como a sua, sinalizadas por AE/AEG. Das respostas obti-
das junto dos cuidadores, importa destacar o contributo de uma cuidadora que refere a necessidade
de uma relação de maior proximidade entre os docentes e os alunos e, também, entre docentes e
cuidadores. Defende a existência de um trabalho conjunto no sentido de procurar soluções adap-
tadas ao aluno. Outros cuidadores defendem, igualmente, a necessidade de mais acompanhamento
na escola no sentido de motivar os alunos e de também na CPCJ existir um esforço para os levar a
perceber a importância da escolarização no seu futuro. É, também, referida a importância de traba-
lhar esta problemática no sentido de a perceber e lhe saber dar uma resposta adequada.

Conclusões
Apresentada a investigação acerca das motivações na origem do AE/AEG realizada com jovens
acompanhados na CPCJ-CB, assim como, a revisão de literatura, importa ressalvar algumas conclu-
sões e recomendações.
Partindo dos resultados da investigação realizada e colocando-a em diálogo com a revisão de
literatura analisada é possível obter algumas respostas às questões de investigação previamente
delineadas, ainda que, levantando novas e urgentes interrogações. São respostas que se podem
resumir no seguinte: existe efetivamente uma grande falta de motivação e apego à escola por parte
dos alunos em situação de AE/AEG; verifica-se uma conceção desadequada das famílias acerca da
influência do envolvimento parental na relação dos jovens com a escola e as aprendizagens, assim
como, grande dificuldade de resposta adaptativa das famílias e escolas perante crenças disfuncio-
nais sobre o valor da escola/escolaridade. Tratam-se, efetivamente, de famílias com uma fraca li-
gação à instituição escolar, com uma visível dificuldade em atribuir um sentido à escolarização que
ultrapasse o instrumentalizado valor para o futuro profissional. Instituição escolar esta, que se pode
concluir ser pouco aberta e capaz de dialogar com alunos e famílias, não adaptando a sua linguagem
e centrando-se numa atitude paliativa e centrada sobretudo nas consequências (sobretudo legais/
formais) quando confrontada com o fenómeno do AE/AEG.
Ao mesmo tempo é possível concluir que os jovens entrevistados revelam grande dificuldade
em perspetivar o seu futuro e, sobretudo, de o fazer de forma realista e consciente do significado
da sua situação escolar.
Deve, no entanto, atentar-se sobre alguns aspetos do presente trabalho a reconsiderar em fu-
turas investigações de objetivos semelhantes. É de ser ressalvado que as entrevistas com jovens e
cuidadores foram realizadas no espaço físico da CPCJ por um entrevistador (investigador) reco-
nhecido pelos entrevistados como técnico da instituição. Tal pode, em alguns momentos, ter con-
dicionado o discurso dos jovens e dos cuidadores, preocupados e atentos às funções da CPCJ e ao
facto de por esta instituição serem acompanhados.
Ao mesmo tempo deve sublinhar-se sobre o fato de a investigação se basear apenas no discurso/
perceção dos entrevistados sobre a sua situação, sendo analisados sobretudo aspetos relacionados
com as motivações para o AE/AEG, sobre relação e posição dos cuidadores e do estabelecimento
de ensino, assim como, possíveis influências na base das motivações identificadas.
Assim, é possível ter em conta que os resultados da investigação poderiam beneficiar se consi-
derados na análise aspetos relacionados com caraterísticas pessoais/individuais dos jovens alunos
como os referidos por Miguel, Rijo e Lima (2012) numa investigação centrada na relevância de
variáveis psicológicas e comportamentais dos alunos para o risco de insucesso e consequentemente
de AE/AEG. São eles: o autoconceito escolar; a autoeficácia escolar; a autorregulação comporta-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 113

mental; o valor da tarefa; a ansiedade de desempenho; a ausência de rotinas de estudo; a atribuição


de sucesso e insucesso e; as relações interpessoais e integração social.
Finalmente é, sobretudo, possível concluir da extrema necessidade de continuar a investigar a
problemática do AE sempre com o objetivo de intervir de forma mais adequada (na escola e nas
CPCJ) nos casos existentes e na prevenção da ocorrência deste fenómeno. Importa, questionar
de forma crítica e assertiva os casos diagnosticados de forma a entender claramente a origem do
desapego destes jovens alunos à escola e aprendizagens, as suas características e contextos de vida.
Devem, ainda, ser tidas em conta as especificidades que levam ao fracasso das intervenções com
estes jovens, intervindo de forma informada e consciente sobre a dimensão deste fenómeno.

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114 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 115

NOVOS MODELOS ESTÉTICOS NA


EDUCAÇÃO MUSICAL DA CRIANÇA
Susana Maia Porto (s.porto@esep.pt)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre

Resumo
De modo a facilitar a inclusão da música erudita contemporânea na educação musical da criança,
a presente investigação-ação teve como objetivo a procura de hodiernas abordagens metodológicas
na formação inicial de futuros agentes da educação - professores do ensino básico, educadores de
infância, educadores artísticos e animadores socioculturais. Pretendeu-se, numa 1.ª fase do estudo,
investigar sobre a perceção musical da criança e dos futuros professores/educadores e animadores
socioculturais face à música erudita dos séculos XX e XXI. Na 2.ª e 3.ª fases da investigação-ação
procurou-se desenvolver estratégias e métodos educacionais em sessões letivas de diversas unida-
des curriculares dos cursos em análise, que culminaram com a criação de performances/projetos
musicais - 2.ª fase do estudo - e em workshops, liderados pelos futuros professores/educadores,
dirigidos a crianças da Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico, de acordo com
premissas da contemporaneidade - 3.ª fase do estudo. De entre as conclusões da investigação des-
tacam-se: a clara aceitação da criança perante a referida tipologia musical; a urgente introdução de
um tipo de ensino instigador, reflexivo – pensar e agir sobre o som – e, consequentemente, criati-
vo; a mais-valia de um trabalho performativo e transversal às expressões artísticas na construção e
criação musical e na compreensão de novos modelos estéticos.

Palavras-chave: educação musical da criança; música erudita contemporânea; formação inicial de


professores/educadores e animadores socioculturais; investigação-ação; ensino musical criativo.
116 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
In order to facilitate the inclusion of contemporary classical music in child’s music education,
this action research aimed to develop today's methodological approaches in the initial training of
future agents of education - primary school teachers, early childhood educators, arts educators and
sociocultural animators. It was intended, in a 1st phase of the study, research on musical percep-
tion of the child, of the future teacher/educator and sociocultural animator face to classical music
of 20th and 21st centuries. In the 2nd and 3rd phases of action research was aimed to develop
strategies and educational methods in teaching sessions of various curricular units of the courses
under review, which culminated in the creation of performances/musical projects - 2nd phase
of the study - and workshops, led by future teachers/educators, aimed at children of pre-school
education and primary school, according to assumptions of contemporaneity - 3rd phase of the
study. Among the study's findings it stands out: the child clearly accepts and understands contem-
porary classical music; the music education today must embrace a kind of investigative teaching,
reflective - think and act on the sound – and consequently, creative; the transdisciplinarity and the
performative work encourage musical construction/creation as well the understanding of new
aesthetic models.

Keywords: child's musical education; contemporary classical music; initial training of teachers/
educators and sociocultural animators; action research; creative musical teaching.

Introdução
A importância da inclusão da música erudita contemporânea na educação musical da criança
tem vindo a ser discutida desde a década de sessenta do século XX. Podemos encontrar vários
investigadores, em distintos países, que trabalharam a educação musical explorando as premissas
da música contemporânea, assinalam-se como exemplos: Barbara Thompson, Brian Dennis, John
Paynter e Samuel Miller em Inglaterra; Marian Demand nos Estados Unidos; Murray Schafer no
Canadá; Claire Renard, Angélique Fulin, François Delaland em França; Bernadete Zagonel no
Brasil; Lucía Frega e Hemsy de Gainza na Argentina; Luisa Muñoz Cortés, Salomé Diaz, Enrique
Muñoz Rubio, Martínez Aguilera e Gómez Valcárcel em Espanha.
Não obstante, apesar da defesa de pedagogos e investigadores relativamente à inclusão de novas
abordagens de ensino da música, muito ainda há por investigar de modo a facilitar a introdução da
música erudita contemporânea na educação musical da criança, em particular no ensino generalista.
De facto, a complexa estrutura musical que dificulta o trabalho de análise, a inerente dissonância,
a estranheza face às sonoridades que não são familiares e a sua difícil acessibilidade, são fatores
determinantes para a não aceitação da referida tipologia musical por parte de muitos adultos e, con-
sequentemente, por parte de docentes, educadores de infância e animadores socioculturais. Dalla
Bella, Peretz, Rousseau e Gosselin (2001) reforçam essa dificuldade afirmando que o reportório
do século XX é inapropriado para a educação musical da criança. Contrariando esta última teoria,
a presente investigação pretende demonstrar que a música erudita contemporânea, de acordo com
alguns dos seus princípios de produção/perceção sonora e criatividade, pode ser implementada
no ensino da música para crianças e por educadores/professores generalistas e animadores socio-
culturais, de forma lúdica e eficaz. Deste modo, recorrendo a uma investigação-ação (modelo de
Kemmis), procurou-se dar resposta à questão “Como incluir a música erudita contemporânea no
ensino generalista?” investigando, para o efeito, abordagens metodológicas na formação inicial de
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 117

futuros agentes da educação – professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico, Educadores de Infância,
Educadores Artísticos e Animadores Socioculturais.

A Música Erudita Contemporânea e o Ensino da Música


São escassos os estudos sobre música erudita contemporânea e a educação musical da criança,
particularmente no que concerne ao ensino generalista da música. Contudo, podemos destacar
algumas investigações que tiveram o seu início nos anos sessenta do século XX e, por conseguinte,
deram origem a outras investigações um pouco mais recentes.
Em “Twentieth Century Music for Elementary School Children” (1962), Barbara Thompson
defendeu a inclusão da música erudita contemporânea na educação musical e apresentou algumas
sugestões para o trabalho com crianças em idade escolar. Também na década de sessenta, foram
elaborados projetos de investigação com aplicação prática e direta na educação musical, como por
exemplo Contemporary Music Project (Mark, 1996), que teve por objetivo integrar compositores de
música erudita contemporânea em escolas públicas dos Estados Unidos da América e nos seus
programas, em jeito de residência artística. Através do projeto foi notória a falta de preparação
para lidar com a música contemporânea por parte dos professores do ensino generalista e, conse-
quentemente, por parte dos seus alunos. Apesar disso, tanto os professores como os alunos que
participaram no projeto mostraram-se recetivos às novas tendências estéticas e, observado pelos
professores, o crescimento musical revelou-se bastante positivo nas crianças que tiveram contacto
com essa tipologia musical.
“Aesthetics and Twentieth-Century Music in Music Education”, de Marian Demand (1972), é
considerado também um estudo pioneiro sobre orientações estéticas contemporâneas e as suas
implicações na educação musical. A investigação concluiu que os professores devem ter alguma
familiaridade com a música erudita contemporânea, no que respeita ao conhecimento de obras
musicais e à sua significação estética. Objetivando-se o encontro de estratégias de aprendizagem
face à tipologia musical em análise, a autora enfatizou a necessidade de novos estudos sobre o tema.
Outros investigadores, como Murray Schafer (1998), John Paynter (2000) e François Delalande
(2001) - este último trabalhou com crianças de creche - pretenderam na sua prática letiva estimular
a criatividade nos seus alunos, através da exploração e da ação sobre o som. Todos eles defendem
os sons do meio ambiente como objetos sonoros integrantes de uma composição musical, os gra-
fismos não convencionais e a construção musical por meio do jogo. Valorizam, por conseguinte,
um ensino criativo cujas situações de aprendizagem possam partir de propostas, ideias musicais
e situações sonoras produzidas pelos alunos. Sintetizando, são pedagogos/investigadores que re-
correram a estratégias de experimentação de vanguarda, aquilo a que comummente se designa por
experimentação criativa.
Comprovando a eficácia da tipologia musical para o desenvolvimento musical da criança, outras
investigações (apesar de em número reduzido) se seguiram, até aos nossos dias, sobre a música
erudita contemporânea e o ensino da música, indicando recursos didáticos e estratégias a aplicar
na prática letiva. Dado o valor didático de recursos utilizados em pedagogias baseadas na música
contemporânea, Daniel Mateos Moreno (2007) decidiu investigar sobre o grau de familiaridade
que os futuros professores de música têm em relação a essa tipologia musical. Segundo o autor, os
resultados da investigação foram desanimadores, demonstrando as dimensões reais do problema,
isto é, se assumimos o valor da música contemporânea para a educação musical da criança, tam-
bém devemos preparar os futuros agentes da ação educativa, uma vez que é impossível ensinar ou
manusear aquilo que se desconhece (Mateos Moreno, 2007). De facto, enquanto professores de
118 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

música teremos que refletir profundamente sobre este problema e encontrar soluções que facilitem
a inclusão da música erudita contemporânea e das suas premissas na formação inicial de professores,
não só de professores especialistas mas também de professores generalistas, de forma a possibilitar
o contacto das crianças com recursos e ferramentas que essa tipologia musical nos pode oferecer e
que são extremamente importantes para o desenvolvimento musical da criança, nomeadamente o de-
senvolvimento da criatividade (Dennis, 1970; Meyer-Denkmann, 1977; Paynter, 2000; Schafer, 1998).

Metodologia e Participantes
A metodologia utilizada foi investigação-ação, metodologia que permite melhorar práticas, de-
senvolver estratégias/métodos educacionais e proceder a mudanças de comportamento - atitudes
e valores (Cohen e Manion, 1994).
Tendo como objeto de estudo os cursos do 1.º Ciclo de Estudos: Educação Básica (EB), Anima-
ção Sociocultural (ASC) e Educação Artística (EA) - cursos que contemplam a educação cultural/
artística e a educação/formação da criança, entre outros -, a amostra contou, no total, com 136
estudantes da Escola Superior de Educação de Portalegre e 343 crianças de várias instituições de
ensino da Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Na 1.ª fase da investigação-ação
contribuíram para o estudo 62 alunos - 41 formandos do curso de EB e 21 formandos do curso de
ASC -, através da resposta a um inquérito. Também, foram alvo de estudo 110 crianças (6 grupos
de crianças), entre os 3 e os 11 anos de idade, que participaram em atividades de reflexão musical. A
amostra, relativamente ao número de formandos, resultou de amostragem estratificada de acordo
com os cursos vocacionados para a educação e para a animação. Por conseguinte, o estudo incidiu
sobre 18% da população, num universo de 340 alunos - população dos cursos em que a unidade
curricular de Expressão e Educação Musical consta do plano de estudos -, sendo o número de
inquiridos (41 formandos de EB e 21 formandos de ASC) um número representativo da percenta-
gem total de alunos por cursos, sendo a proporção próxima dos 66% (EB) e 34% (ASC)1.
A 2.ª fase da investigação-ação contou com a participação de 64 estudantes de EB, entre os quais
20 participantes da 1.ª fase, 13 estudantes de ASC e 17 estudantes de EA, que elaboraram projetos
artísticos, em sala de aula, conforme princípios da música erudita contemporânea e de acordo com
os conhecimentos adquiridos nas várias sessões letivas. O número de formandos participantes
resultou do número de alunos inscritos nas unidades curriculares direcionadas para a criação/pro-
dução artística (laboratórios e oficinas).
Os formandos que participaram na 3.ª fase da investigação são parte integrante do grupo de
formandos da 2.ª fase - 17 estudantes de EB e 5 estudantes de EA, amostra representativa. Os
mesmos lideraram atividades musicais com crianças - 159 crianças do 1.º Ciclo EB e 74 crianças
da Educação Pré-Escolar -, desenvolvendo ideias e experiências vivenciadas em sala de aula na 2.ª
fase da investigação.
Sintetizando, de modo faseado - de acordo com os ciclos de estudo de uma investigação-ação
- o estudo empírico contou com: uma fase exploratória - 1.ª fase - sobre a perceção musical das
crianças e dos futuros professores/educadores e animadores socioculturais perante a música eru-
dita contemporânea (onde reside efetivamente o problema? O que deve ser feito para solucionar o
problema?); uma fase de desenvolvimento de abordagens facilitadoras da inclusão da tipologia em
análise na formação inicial dos futuros agentes da ação educativa, auxiliada por grupos de discussão
com os formandos - 2.ª fase -, que resultou da análise e reflexão da fase precedente; e uma última
fase - 3.ª fase - que pretendeu "validar" a fase anterior, na medida em que os estudantes repercuti-
1
Informação relativa ao ano letivo de 2007-2008 (período em que decorreu a 1.ª fase da investigação-ação).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 119

ram o conhecimento e a experiência adquiridos na 2.ª fase para a prática pedagógica, liderando ati-
vidades, que se aproximaram das premissas da contemporaneidade musical, dirigidas a crianças em
idade pré-escolar e escolar. Não obstante os métodos e estratégias diferenciadas, cada fase/ciclo do
estudo desenvolveu-se de forma contínua e resumiu-se a uma sequência: planificação, ação, obser-
vação (avaliação) e reflexão (teorização). Ou seja, este conjunto de procedimentos em movimento
circular, inerente a um ciclo, deu início a um novo ciclo/fase que, por sua vez, desencadeou novas
espirais de experiências de ação reflexiva, como referido em Coutinho et al. (2009).

1.ª Fase da Investigação-Ação


Partindo da hipótese, fundamentada pela contextualização teórica acima descrita, que a música
erudita contemporânea é essencial para o desenvolvimento da audição e da criatividade da criança,
questionou-se: que perceção têm as crianças e os futuros professores/educadores e animadores
socioculturais da música erudita contemporânea?
Para obtenção dos resultados foram aplicados inquéritos aos futuros professores do ensino bá-
sico, educadores de infância e animadores socioculturais - 41 estudantes do curso de EB e 21 for-
mandos do curso de ASC – e observadas atividades de reflexão musical com 6 grupos de crianças
(distribuídos por cinco escolas EB1/JI).
No que concerne às atividades de reflexão musical, objetivou-se recolher dados, através da au-
dição e do diálogo com as crianças, sobre vários exemplos/excertos musicais, de compositores e
estilos composicionais de música erudita contemporânea (Quadro 1).

Quadro 1- Atividades de reflexão musical referentes à 1.ª fase da investigação-ação

Grupo Idade Excertos Auditivos

Grupo A 3-4 - Suite da Ópera Três Vinténs, Kurt Weill.


(21 crianças) (80% 3) - Children’s Corner, Debussy.
- Solo Pictórico, Carlos Barreto.
- Suite Cítica op. 20, Sergei Prokofiev.
Grupo B 3-4 - Pacific 231 e Rugby, Honegger.
(20 crianças) - Concerto Campestre, Francis Poulenc.
- Children’s Corner, Debussy.
- Solo Pictórico, Carlos Barreto.
- Suite Cítica op. 20, Sergei Prokofiev.
Grupo C 4-6 - Serenata op. 31, Benjamim Britten.
(19 crianças) - Sonatas Piano Preparado, John Cage.
- Concerto Grosso, Vaughan Williams.
- Morte e Nascimento de uma Flor, Paulo Rodrigues.
- Sinfonia Câmara n.º 2 op.38, Schönberg.
Grupo D 6-7 - Serenata op. 31, Britten.
(18 crianças) - Morte e Nascimento de uma Flor, Paulo Rodrigues.
Grupo E 7-9 - Suite da Ópera Três Vinténs, Kurt Weill.
(21 crianças) - Pacific 231 e Rugby, Honegger.
- Concerto Campestre, Francis Poulenc.
Grupo F 10-11 - Sonatas Piano Preparado, John Cage.
(11 crianças) - Concerto Grosso, Vaughan Williams.
- Sinfonia Câmara n.º 2 op.38, Schönberg.
- Atmosphères, György Ligeti.
- Variations. Aldous Huxley in Memoriam, Igor Stravinsky.
- Contrappunto dialettico alla mente, Luigi Nono.
- Cinco Peças Orquestra op. 10, Webern.
- Amen para uma Ausência e ...In Somno Pacis (One for Nothing), Capdeville.
- Notations, Pierre Boulez.
120 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

A 1.ª fase do estudo concluiu uma clara aceitação, assim como um certo entendimento, da
música erudita contemporânea por parte da criança. No que diz respeito à perceção estética e à
intrínseca relação simbólica, entendeu-se que a compreensão que a criança manifesta sobre uma
determinada obra formula-se por si só através de uma escuta ativa e das referências fantasiosas
inerentes ao seu próprio mundo. A título de exemplo, no Noturno de Benjamin Britten, as cordas
surgem, em determinados momentos, com movimentos melódicos ondulantes, semelhantes ao
movimento das ondas do mar, ao que as crianças associaram ao Pirata das Caraíbas, ao Capitão Gan-
cho, à guerra/luta de piratas e aos canhões dos barcos do Capitão Gancho. Também numa das Sonatas
e Interlúdios para Piano Preparado de John Cage, “Sonata V”, foi associado o ritmo irregular a uma
dança descoordenada e ao discurso de um gago.
Para as crianças mais velhas não só a abordagem expressionista referencialista2 (Reimer, 1989) é
importante, mas, também, a perceção ligada à educação formal e analítica da obra. De facto, as
referências “programáticas” e expressivas podem ser pertinentes para o entendimento das obras
musicais (como constatado na análise das atividades de reflexão musical com as crianças), no en-
tanto, enfatiza-se a necessidade de encontrar processos metodológicos e abordagens curriculares,
na formação do 1.º Ciclo de Estudos de professores e animadores, que possibilitem uma análise
mais precisa em termos de construção musical e aplicável não só ao desenvolvimento da criança
mas também à formação globalizante e não específica dos formandos.
Também, a importância que os estudantes dos cursos em análise atribuem à inserção não só
da música erudita como de novas sonoridades na educação da criança (Quadro 2) aliada à falta de
conhecimento expressa nos inquéritos, conduzem a uma concreta necessidade de introduzir nos
programas das unidades curriculares dos referidos cursos conteúdos e metodologias que permitam
um trabalho em aula sobre distintas tipologias musicais, nomeadamente, e neste caso concreto, a
música erudita contemporânea.

Quadro 2- Importância atribuída à inclusão da música erudita e de novas sonoridades que fujam à noção de belo na educação da
criança, total de inquiridos (Frequência, Moda e Média)

Muito Importante Importante Pouco Importante Sem Importância Sem Opinião

A) 40 22 0 0 0
B) 31 31 0 0 0
C) 8 44 9 0 1
D) 31 31 0 0 0
E) 24 33 2 1 2
Moda 31 31 0 0 0
Média 26,8 32,2 2,2 0,2 0,6

(A) A expressão/educação musical no desenvolvimento global da criança; (B) A utilização de distintos tipos de música na educação
musical da criança; (C) A música erudita no desenvolvimento auditivo da criança; (D) O trabalho tímbrico e de exploração sonora
na educação musical da criança; (E) A inclusão, na educação musical da criança, de novas sonoridades que possam fugir à noção
de belo.

Acredita-se, fundamentado pelos resultados obtidos nos inquéritos aos futuros professores/
educadores e animadores socioculturais e pelos diálogos reflexivos com as crianças, que a música
do século XX, que muitos adultos rejeitam por falta de entendimento estético ou simplesmente
por ser uma sonoridade estranha - precisamente porque não lhes é familiar -, ao ser incluída nos
programas curriculares de futuros professores e futuros animadores, não só irá incrementar a cul-
tura musical dos formandos, assim como, possibilitar a sua transmissão às crianças de forma lúdica,
criativa e eficaz. Uma vez que a criança não tem ideias pré-concebidas e culturalmente formadas

2
Os expressionistas referencialistas defendem que a expressão inerente à obra depende de um entendimento do conteúdo referencial da música.2
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 121

pelo contexto integrado de uma sociedade influenciada pelos media, facilmente aceita o tipo de
sonoridade que para muitos adultos é entendido como exótico e consequentemente “perigoso”.

2.ª Fase da Investigação-Ação


De acordo com as conclusões da 1.ª fase da investigação-ação e partindo da hipótese que os
estudantes dos cursos de EB, EA e ASC – cursos cujo perfil formativo integra a educação artística/
cultural e a educação/formação da criança - são capazes de abraçar a estética musical contemporâ-
nea, questionou-se: que abordagens metodológicas podem ser levadas a cabo na formação inicial
de professores/educadores e animadores, que facilitem a inclusão da música erudita contemporâ-
nea na educação musical da criança, de modo eficaz e criativo?
Objetivando-se encontrar resposta à questão que inicia um novo ciclo de estudo, procedeu-se à
implementação de vários projetos (Quadro 3) em unidades curriculares que contemplam oficinas e
laboratórios, a um workshop e a grupos de discussão.

Quadro 3 - Projetos musicais desenvolvidos na 2.ª fase da investigação-ação

Designação do Projeto Ano Letivo Curso Unidade Curricular N.º de Alunos


(semestre)
Produção Artística e Criatividade: 2008-2009 EB Laboratório de Produção 20
Performance Musical A (1.º Semestre) Artística e Criatividade
Performance Musical B
Performance Musical C
Da Tradição à Inovação: 2008-2009 ASC Oficina Etnográfica 13
Experimentação e Recriação Musical A (1.º Semestre) da Tradição à Inovação
Experimentação e Recriação Musical B
O Impressionismo e a Recriação: 2009-2010 EA Oficina de Projeto Musical 4
Construção Musical Impressionista (1.º Semestre)
O Gesto, o Som e o Espaço: 2009-2010 EB Oficina das Expressões 14
Oficina Transdisciplinar A (2.º Semestre)
Oficina Transdisciplinar B
Oficina Transdisciplinar C
Bilinguismo Musical em Laboratório: 2010-2011 EA Laboratório de Produção 4
Mito - Performance Interdisciplinar (1.º Semestre) Transdisciplinar II
Workshop: 2010-2011EB EA ------------------- 6
Experimentação Musical (1.º Semestre)
Felix - April Maze 2011-12 EA Oficina de Projeto Musical 5
(1.º Semestre)
Aleatoriedade, Som e Cor 2011-12 EA Laboratório de Produção 5
(2.º Semestre) Transdisciplinar I
A Composição Sonora e o Jogo Infantil 2011-12 EB Oficina das Expressões 27
(2.º Semestre)
Séquence 2011-12 EA Laboratório de Produção Transdisciplinar I 5
(2.º Semestre)
Multimédia e Contemporaneidade 2012-13 EA Oficina de Projeto Musical 7
(1.º Semestre)
A Voz e a Construção Musical 2012-13 EA Laboratório de Produção Transdisciplinar II 3
(1.º Semestre)
122 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Pretendeu-se, efetivamente, nesta fase do estudo, encontrar estratégias de ensino/aprendizagem


face à música erudita contemporânea através de um trabalho em aula com os futuros educadores/
professores generalistas de modo a facilitar a aquisição de conhecimento sobre a tipologia em estu-
do, assim como a sua aplicação prática em atividades de criação e de improvisação musical. Indo ao
encontro de modelos estéticos musicais contemporâneos, desenvolveram-se abordagens metodo-
lógicas na formação do 1.º Ciclo de Estudos de educadores, professores e animadores, atendendo
ao desenvolvimento da criança e à formação globalizante e não específica dos formandos.
Todos os projetos foram precedidos por sessões expositivas sobre compositores e obras de mú-
sica erudita contemporânea e de sessões reflexivas acerca da construção musical dessas obras e os
seus princípios estéticos. A construção musical que resultou do trabalho criativo elaborado pelos
alunos, sob orientação da docente das unidades curriculares, conseguiu abraçar várias premissas
da música contemporânea. Por exemplo, nos projetos Produção Artística e Criatividade, Da Tradição à
Inovação e Impressionismo e Recriação foram trabalhadas as correntes musicais do século XX (antes e
pós-guerra), na medida em que os alunos se inspiraram em uma ou mais correntes para a compo-
sição musical. Isto é, o objetivo primordial foi o entendimento das tendências estéticas, a perceção
de características fundamentais de cada corrente e o estímulo/gosto pela criação contemporânea.
Vamos encontrar, por exemplo: sonoridades próximas das impressões sensoriais do movimento
impressionista quando surge a produção sonora provocada pela fricção das unhas no xilofone ou a
agitação de areia num recipiente, ou mesmo a abusiva ressonância no piano através do uso do pedal
de sustentação; sussurros, risos, gritos, sons vocais produzidos por respirações lentas, canto falado
e fonemas livres sem qualquer tipo de obstrução, tudo isto na tentativa de levar ao extremo as po-
tencialidades da voz, própria do expressionismo; a inclusão do ruído inerente ao futurismo; estruturas
cíclicas e repetitivas próprias do minimalismo; entre outras sonoridades não convencionais que resul-
taram da utilização de objetos sonoros como cartas de jogo, paus do jogo do mikado e brincadeiras
sonoras com a água. A atonalidade também foi um dos elementos a ser trabalhado nos projetos
nomeadamente em Bilinguismo Musical em Laboratório e A Voz e a Construção Musical, assim como a
manipulação do som por meios informáticos. Também a manipulação dos sons do meio ambiente
foi uma constante nos projetos Séquence, Multimédia e Contemporaneidade e Felix – April Maze, este
último que resultou na sonorização do filme com o mesmo nome, de 1930. A construção musical
através do jogo e da composição automatizada foi também uma das premissas da contemporanei-
dade musical trabalhada pelos formandos, desta vez em Aleatoriedade, Som e Cor e Composição Sonora e
Jogo Musical. Ainda, em todos os projetos pretendeu-se valorizar o som, o objeto sonoro, o silêncio,
o movimento sonoro, o espaço, a improvisação e a representação gráfica não convencional. No
quadro que se segue (Quadro 4) estão registadas analogias entre partituras de obras contemporâ-
neas e as partituras elaboradas pelos estudantes:

Quadro 4 - Analogias visuais entre partituras de obras contemporâneas e as partituras elaboradas na 2.ª fase da investigação-ação

Bussoti, XIV Piano Piece for David Tudor 4 Séquence


A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 123

Cardew, Treatise Séquence

Cage, New River Watercolor Series II O Medo, O Drama e a Verdade do Artista

Cage, Fontana Mix Felix - April Maze

Concluiu-se que a performance artística e transversal às expressões é a melhor abordagem para


a construção musical contemporânea, uma vez que o som resulta de um gesto, de um movimento,
de uma imagem visual ou de uma cor. Consequentemente, também o som é gerador de outros
movimentos, traços, palavras e imagens visuais (Esquema 1).

Esquema 1 – Elementos basilares da construção/criação musical


124 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Dado que se trata de uma tipologia musical com um enorme leque de possibilidades no que con-
cerne à exploração e criação sonora, a música contemporânea permitiu aos futuros educadores/pro-
fessores e animadores socioculturais construir musicalmente de modo eficaz e criativo, sem a necessi-
dade de recorrer a tecnicismos ou especificidades próprias de um tipo de ensino tradicional da música.

3.ª Fase da Investigação-Ação


A 3.ª e última fase da investigação-ação, surgindo na sequência da 2.ª fase do estudo, desenca-
deou a questão: de que forma a música erudita contemporânea pode desenvolver a criatividade das
crianças e conduzir a uma prática ligada à construção/improvisação musical, com maior confiança,
por parte dos futuros educadores e professores generalistas? Partiu-se, portanto, da hipótese que a
música erudita contemporânea desenvolve a criatividade da criança e que os futuros educadores/
professores do ensino generalista são capazes de planificar/implementar atividades de criação ba-
seadas na estética contemporânea.
Deste modo, elaboraram-se workshops em cinco escolas EB1/JI onde os alunos dos cursos
em análise trabalharam determinadas premissas da contemporaneidade musical com crianças da
Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico (Quadro 5):

Quadro 5 – Projetos/workshops musicais da 3.ª fase da investigação-ação

Designação do Projeto/Atividade Formandos ESEP Nível de Ensino

A Construção Sonora e a Imagem Visual Alunos do curso de Educação Artística 1.º CEB - 3.º e 4.º Anos

Criação livre - Atividade para Crianças Alunos do curso de Educação Básica 1.º CEB - 4.º Ano

As Onomatopeias e o Universo Infantil Aluna do curso de Mestrado em Educação Pré-Escolar Pré-Escolar

Brincar com o Som Alunos do curso de Educação Básica Pré-Escolar


1.º CEB - 2.º e 3.º Anos

Em todos os projetos implementados, nesta fase do estudo, existiu a pretensão de trabalhar


premissas da música erudita contemporânea por meio da exploração/experimentação sonora e da
procura/descoberta do novo – novas sonoridades - onde a fusão das várias linguagens artísticas foi
uma constante. Por exemplo, à semelhança do projeto Felix – April Maze da 2.ª fase da investigação,
as crianças foram convidadas a sonorizar um outro filme mudo de 1925, Felix – Follows The Swallows,
utilizando a voz de variadíssimas formas - utilizando sons onomatopaicos, fricativas, sussurros, as-
sobios -, para além de folhas de jornal. Não obstante alguma improvisação, foi proposto às crianças
seguirem as indicações dos formandos que lideraram a atividade com o propósito de aproveitar a
massa sonora (coro vocal) das 128 crianças participantes neste projeto. Para além da imagem como
elemento inspirador e como resultado da criação musical – através de partituras não convencionais
-, também o movimento e a comunicação foram cruciais para estas novas abordagens de ensino.
Assim, mais uma vez, foi possível observar dados favoráveis à introdução da música erudita
contemporânea na educação musical da criança e, no caso da presente investigação, no ensino ge-
neralista. As conclusões desta última fase indicam que: os formandos estão aptos a trabalhar com
as crianças atendendo às premissas da contemporaneidade musical; é possível estimular, por parte
das crianças uma atitude formalista (Reimer, 1989), ou seja, uma atitude reflexiva sobre os elementos
per se de uma obra musical; o interesse, a aceitabilidade e a seriedade acerca da notação contempo-
rânea faz-se sentir em qualquer faixa etária. Reforça-se, ainda, a teoria de que as crianças aceitam
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 125

claramente obras musicais que envolvem sonoridades diferentes e divertem-se com a própria ex-
ploração sonora.

Considerações Finais
Como podemos educar uma criança auditivamente se lhe oferecemos apenas a melodia bonita
e tonal? Não estaremos a limitar culturalmente a sua aprendizagem e o seu vocabulário musical?
A presente investigação pretendeu, fundamentalmente, alterar práticas educativas, contribuin-
do, deste modo, para um ensino criativo da música e, consequentemente, para a organização e
construção dos programas curriculares de futuros professores de educação básica, educadores de
infância, educadores artísticos e animadores socioculturais. Concluiu-se que a inclusão da música
erudita contemporânea e das suas premissas de abstração, experimentação/exploração e procura
do novo - novas sonoridades e novas formas compositivas -, na educação musical da criança, pode
resultar num processo de ensino-aprendizagem fundamentado na criatividade e na valorização do
pensamento/reflexão, por meio de distintas abordagens, exequível ao desenvolvimento da criança
e ajustável ao ensino generalista.
Os futuros professores/educadores e animadores socioculturais, assim como as crianças da Edu-
cação Pré-escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico conseguiram construir musicalmente de forma
criativa e inovadora e fora dos parâmetros tradicionais a que estão habituados a trabalhar, agarrando
diferentes aspetos inerentes à composição contemporânea. Encontramos, deste modo, palavras-cha-
ve ao longo do decurso da investigação, particularmente na 2.ª e 3.ª fase como: criatividade, imagina-
ção, exploração, reflexão, seleção, espontaneidade, naturalidade e procura. As mesmas palavras-chave
são, indubitavelmente, cruciais para o desenvolvimento da expressão/educação musical em todas as
suas vertentes - criativa, interpretativa e reflexiva. Acredita-se, por conseguinte, que o papel do pro-
fessor/educador e animador sociocultural, no que concerne à educação musical da criança, prende-se
com a competência para proporcionar distintas abordagens, equilibrando a sua prática entre várias
linguagens artístico-musicais, garantindo, assim, uma verdadeira educação estética.

Bibliografia
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volume I, n.º 2.
126 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 127

PARCERIAS EUROPEIAS DE INOVAÇÃO


EM EDUCAÇÃO
Margarida Morgado (marg.morgado@ipcb.p)
Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco

Resumo
Um dos desafios da pós-modernidade é o trabalho em rede para uma educação do futuro com
um desenvolvimento sustentável, assente na articulação do conhecimento do passado com os de-
safios do futuro. O financiamento europeu tem promovido a constituição de parcerias estratégicas
em educação que interligam organizações de diversos tipos, tamanhos, vocação e áreas de especia-
lização aos seus contextos específicos mas também ao contexto europeu. O seu objetivo é divulgar
experiências educativas de qualidade a partir de recursos gratuitos e aplicar a inovação a um número
de contextos cada vez mais alargados. Emergem destas parcerias estratégicas financiadas pela EU
novas perspetivas sobre a educação que podem ajudar a definir rumos para o século XXI, tendo
por base o multilinguismo, a equidade e a inclusão, bem como o desenvolvimento de competências
básicas transversais, o robustecimento dos apoios educativos, a literacia digital e a inovação na área
do combate à discriminação. O artigo (originalmente apresentado sob a forma de poster) apresenta
um conjunto de projetos desenvolvidos pelo IPCB, terminados e em curso, no quadro destas par-
cerias estratégicas, salientando a sua mais-valia para a definição de rumos da educação do século
XXI. A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF; a educação plurilingue promovida
pelo projeto ALPHAEU no jardim-de-infância; a formação de atores sociais para prevenir o aban-
dono escolar e a constituição de comunidades europeias de prática do projeto SSN; a promoção
da leitura entre jovens que a rejeitam no projeto BOYS’ READING; a promoção de competências
narrativas básicas na era do digital em AQUA NARRABILIS; e a promoção da cidadania ativa e
participativa no projeto WE ARE EUROPE.

Palavras-chave: Parcerias estratégicas em educação; educação intercultural; educação para a cida-


dania multicultural; educação social; educação para o século XXI.
128 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Abstract
The post-modern era is often characterized as challenging due to its requirements of networking
and sustainable development and its connections between past knowledge and experience with the
demands of the future. European funding has been consistently promoting strategic partnerships
in education that connect several types of organizations (different in size, expertise, aims) to local
and European contexts. Their aim is to disseminate and explore quality educational approaches
through free open-source resources and to apply dissemination to ever wider contexts. New pers-
pectives on education for the 21st century emerge from these EU-funded strategic partnerships
which highlight multilingualism, equity and inclusion, basic transversal competence development,
quality educational support, digital literacy and innovative anti-discriminatory approaches. The pre-
sent paper (presented as a poster at the conference) shows projects that were (and are still being)
developed at IPCB within these strategic partnerships for education and highlights how they en-
gage with the 21st challenges for education, namely through: the intercultural education proposed
through EUMOF; plurilingual education in pre-primary in the ALPHAEU project; the education
and training of social actors in education to prevent early school dropout and the constitution of
European communities of practice through the SSN project; promoting reading among reluctant
boy readers in BOYS’ READING; the development of transversal narrative competences in the
digital era in AQUA NARRABILIS; and the promotion of active and participatory citizenship in
the WE ARE EUROPE project.

Keywords: Strategic partnerships in education; intercultural education; multicultural citizenship


education; social education; education for the 21st century.

Introdução
Um dos desafios da pós-modernidade é o trabalho em rede para uma educação do futuro com
um desenvolvimento sustentável, assente na articulação do conhecimento do passado com os de-
safios do futuro (Castells, 2005; Cardoso, 2005). O financiamento europeu (programa LLP e Eras-
mus+, por exemplo) tem promovido a constituição de parcerias estratégicas em educação que
interligam organizações de diversos tipos, tamanhos, vocação e áreas de especialização aos seus
contextos específicos mas também ao contexto europeu (ação-chave 2 (KA2) de Cooperação para
a inovação e o intercâmbio de boas práticas, em particular Parcerias estratégicas nos domínios da
educação, formação e juventude (CE, 2014)). O seu objetivo é divulgar experiências educativas de
qualidade a partir de recursos gratuitos e aplicar a inovação a um número de contextos cada vez
mais alargados. Emergem destas parcerias estratégicas financiadas pela UE novas perspetivas sobre
a educação e a gestão do conhecimento, que podem ajudar a definir rumos para o século XXI,
tendo por base o multilinguismo, a equidade e a inclusão, bem como o desenvolvimento de compe-
tências básicas transversais, o robustecimento dos apoios educativos, a literacia digital e a inovação
na área do combate à discriminação.
A experiência de ligação à rede europeia, nestes termos, tem ajudado as instituições a posicio-
narem as suas práticas e investigação aplicada (no caso do ensino superior politécnico) em relação
ao conhecimento, a temas e perspetivas que, de outro modo, teriam dificuldade em interligar com
as suas práticas estabelecidas, uma vez que o financiamento e o espaço atribuídos à investigação é
escasso. Conseguem, deste modo, uma mais eficaz gestão do conhecimento a partir de interações
que combinam, recombinam e reformulam o que é importante investigar (Glasser, 1998/9). Perry
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 129

Glasser (1997) define a organização que aprende como aquela que inova e que é capaz de responder
às mudanças do que a rodeia
O presente artigo configura e sistematiza os aportes para as áreas acima referidas de um conjun-
to de projetos europeus desenvolvidos na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de
Castelo Branco no quadro de três eixos de investigação aplicada, a saber: Educação para uma Cidada-
nia Multicultural Crítica (Europeia e Global), no sentido de exploração de identidades e identificações
culturais e competências interculturais e plurilingues, curiosidade pelas outras culturas, línguas,
patrimónios materiais e imateriais e participação social ativa, responsável e sustentável.
O segundo eixo concerne o desenvolvimento de Competências de Vida Ativa num Mundo Globali-
zado Inclusivo. Os projetos desenvolvidos nesta área têm por objetivos aprender a viver e a partilhar
informação na era da globalização, o desenvolvimento de novas relações de aprendizagem com os
ambientes e as culturas digitais, a definição e operacionalização de competências interculturais e
aprendizagem precoce de línguas estrangeiras, bem como a promoção do plurilinguismo e domínio
das línguas da globalização para uma comunicação eficaz, para além de uma ação inclusiva em prol
da justiça social e da aceitação e reconhecimento da diferença.
O terceiro eixo é de Ligação Reticular do Ensino Superior aos Territórios Envolventes, que se carateriza
pela eficácia e a sustentabilidade da intervenção na ligação entre teoria, práticas académicas e inter-
venção social, pela criação de comunidades de prática e de aprendizagem, por estudos sobre rea-
lidades sociais e educativas contemporâneas incluindo a mobilidade, pela prevenção do abandono
escolar, do bullying e da exclusão devido à multiculturalidade e pertença a minorias étnicas.
No presente artigo faremos uma pequena descrição desse conjunto de projetos europeus em
função destes 3 eixos, procurando enquadrá-los criticamente com a investigação aplicada nas áreas
científicas em que se desenrolam. Todos os projetos configuram parcerias estratégias com outras
escolas e instituições de ensino superior europeu e desenvolveram recursos e materiais pedagógi-
cos de livre acesso, publicados em linha; incluem estratégias e iniciativas de motivação dos alunos;
promovem e disponibilizam materiais de leitura; de desenvolvimento de competências narrativas
e interculturais; Disponibilizam materiais e recursos para pais, professores, jovens e dirigentes de
escola no âmbito da prevenção do abandono escolar, bem como estratégias lúdicas de ensino-
-aprendizagem; materiais e recursos educativos atualizados e práticos; recursos e materiais digitais
e em papel, integrados em cursos de formação inicial e em serviço de professores, bibliotecários e
outros formadores (presenciais e mistos com formação a distância), guias de orientação para for-
madores, pais, educadores e professores; disponibilizam igualmente bases de dados com recursos
sobre prevenção do abandono escolar; desenvolvimento de competências narrativas no contexto
educativo; estratégias de promoção da cidadania europeia.
Na descrição que se segue, evidencia-se em cada projeto desenvolvido e em desenvolvimento,
os modos da sua ligação aos três eixos definidos. O objetivo é não apenas divulgar estes projetos,
fazendo o convite à sua utilização por professores e investigadores, mas igualmente situá-los no
quadro da investigação aplicada a desenvolver pelo ensino superior politécnico.

A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF


EUMOF (European Mobility Folktales) é uma Parceria Multilateral Come-
nius, financiada pela UE para o biénio 2010-2012, cujos produtos estão dis-
poníveis em linha no endereço http://www.eumof.unic.ac.cy/. Os objetivos
do projeto EUMOF são reforçar o sentido de cidadania democrática entre os
professores e alunos europeus, tendo por base uma atitude e um valor de res-
130 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

peito pelos povos, línguas e culturas europeias pela promoção, no espaço educativo, de uma nova
consciência sobre a importância da diversidade cultural e linguística da Europa, bem como o com-
bate ao racismo, preconceitos e atitudes xenófobas, temas muito atuais na Europa “fortaleza” que
defende ferozmente as suas fronteiras e que agora se encontra em crise para encontrar resposta aos
refugiados que nela procuram abrigo. De um modo geral, a abordagem do projeto ao tema da mul-
ticulturalidade e interculturalidade configura entendimentos recentes, como os de Kymlicka (2004,
p.19), de um projeto de cidadania multicultural assente nas múltiplas e heterogéneas afiliações
identitárias de grupos de pessoas num determinado espaço/tempo, bem como de Banks (2009)
quando define a evolução da noção de educação multicultural para a de educação para a cidadania
multicultural.
Um dos principais produtos EUMOF é uma coletânea de contos tradicionais sobre mobilidade
dos países europeus envolvidos no projeto, acompanhado de um Guia do Professor EUMOF, um
conjunto de Atividades Pedagógicas e Educativas (organizadas em três grandes áreas: Cultura, Diferença
e Língua, cada uma com um conjunto de objetivos educativos que são abordados em cada atividade
pedagógica) e de módulos de Formação de Formadores EUMOF.
A linearidade de construção destes materiais, - que radicam na seleção de um conjunto de con-
tos tradicionais ou lendas, curtos (cuja narração oral não ultrapassa os 10 minutos) sobre o tema
da mobilidade, de viagens para outras terras, onde se encontram pessoas diferentes das que co-
nhecemos ou se representam locais, povos, culturas e tradições – não obriga os utilizadores a esta
lógica de utilização, dado o ambiente multimédia e as diversas perspetivas de acesso aos materiais
disponibilizadas. As viagens, as aventuras, as experiências de imigração voluntária ou forçada, as
fugas da guerra, configuradas nas histórias da coletânea EUMOF são uma excelente oportunidade
para os educadores explorarem com os alunos, a partir dos contos, experiências de deslocação
forçada daqueles que deixam de ter de comer nas zonas rurais em que vivem e que são levados até
às cidades ou a tentar a sorte noutras paragens ou dos que se encontram às portas da Europa e são
rejeitados: “Era uma vez um pobre camponês sem sorte que decidiu abandonar a sua terra” (de “O
Camponês Pobre e São Pedro”, um conto grego).
Na configuração da escolha dos contos a partir da ideia da mobilidade e da viagem, do encon-
tro e confronto com outras ideias, culturas, tradições e costumes reconhecemos uma ênfase na
representação intercultural, de negociação entre culturas, e de construção de um ‘multiculturalismo
cosmopolita’ na definição de Kymlicka (1995, p. xiii): um multiculturalismo construído a partir do
conhecimento de culturas mundiais influentes com vista à obtenção de melhores condições de
trabalho num mundo globalizado. Contudo, pela reunião em coletânea de contos de diversas tradi-
ções culturais e linguísticas encontramos uma outra preocupação, multicultural já que encontramos
exemplos dos muitos usos pedagógicos dados aos contos em contextos culturais, espacial e nacio-
nalmente diferentes (Morgado, 2012, p.38). Nos produtos EUMOF lidamos também com entendi-
mentos diversos do que é um conto, um valor ou uma estratégia de promoção da interculturalidade.
Neste sentido, estaremos mais próximos do conceito de cosmopolitismo cultural definido por
Appiah (2006), de recetividade de cada indivíduo, a seu modo, a outras culturas, de reconhecimento
e aceitação da sua diferença e da de outros na sua multiplicidade e heterogeneidade, num esforço
de encontro a meio caminho entre o relativismo e o universalismo num processo de identificação
cultural profundamente individualizado e híbrido (Morgado e Pires, 2010, pp.63-64).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 131

A educação plurilingue promovida pelo projeto


ALPHAEU no jardim-de-infância
As perspetivas multiculturais e pós-coloniais do projeto EUMOF (desenvolvi-
do em 2013 e 2014), legíveis enquanto projetos de comprometimento social e polí-
tico com a transformação da sociedade, dão lugar no projeto ALPHAEU (http://
alphaeu.org/) a ideias de cidadania democrática à escala global (Joppke e Morawska,
2003), que sublinham a integração de pessoas na sua diversidade por intermédio de
medidas de maior assimilação cultural, dentro do respeito pela multiculturalidade.
Uma das bases desta multiculturalidade é o plurilinguismo cultivado desde a mais tenra idade, um
conceito defendido pela OCDE desde o início do milénio (OECD, 2000) e trabalhado pela EU em
documentos estratégicos (EU, 2011).
Desenvolvido com base num levantamento de práticas de abordagem precoce às línguas estran-
geiras dos países do consórcio e, naturalmente também, de Portugal (Cruz, Ferraz, et al, s/d; Gil,
s/d; Granada, C. e Infante, M. J., 1999; Nobre, s/d; Oliveira, s/d; Oliveira, Lopes et al, 2005; Pellier,
2011, Silva, 2007) e de boas práticas internacionais (Enever e Moon 2009; Mourão, 2001; Mourão
e Gamboa, 2009; Reilly and Ward, 1997), ALPHAEU construiu um conjunto de alfabetos digitais
interativos, em seis línguas europeias, de sensibilização às línguas estrangeiras (português, italiano,
romeno, alemão, grego e inglês) no jardim-de-infância. Esta sensibilização tem por finalidade e
objetivos promover a abertura a diferentes culturas/línguas e desenvolver desde tenra idade a com-
petência intercultural, como a curiosidade pela língua e cultura do ‘outro’, comparar e contrastar
culturas, línguas, palavras e sons para encontrar o que é comum e mesmo treinar a capacidade me-
talinguística de reflexão sobre como se pensa numa determinada língua/cultura.
O projeto ALPHAEU é inovador em muitos aspetos: pelo acesso a tecnologias mediadas por
computador (o que não é frequente neste escalão etário) que preconiza: os alfabetos são digitais e
interativos; pela perspetiva multilingue e pela oferta de recursos em línguas europeias minoritárias;
pela disponibilização de dois alfabetos: o romano e o grego; pela ligação que permite entre som,
imagem e grafema; pela perspetiva comparada que configura: comparar fonemas e grafemas entre
línguas promove a interatividade cultural, estimula a curiosidade e encoraja as crianças a procurar
semelhanças e diferenças entre línguas e culturas, colocando-as, desse modo, no caminho certo
para formular teorias genéricas sobre o funcionamento das línguas.
Para além dos alfabetos digitais, o projeto ALPHAEU disponibiliza um conjunto de atividades
pedagógicas, um curso de formação mista (presencial e a distância) para educadores com os obje-
tivos de objetivos de formação seguintes:

1. Conhecer e manusear os materiais pedagógicos do projeto AlphaEU;


2. Participar em projeto multinacional financiado pela EU na área da educação;
3. Conhecer estratégias pedagógicas de multilinguismo e adequá-las a atividades de jardins-de-in-
fância locais;
4. Implementar os materiais AlphaEU em jardim-de-infância;
5. Divulgar os materiais e os planos da sua utilização ao ambiente educativo.

Estes objetivos são conjugados com objetivos de implementação em contextos de jardim-de-in-


fância para monitorizar e refletir sobre os materiais do projeto AlphaEU (alfabetos, atividades, manual
para adultos), sugerir melhorias dos materiais do projeto AlphaEU (alfabetos, atividades, manual para
adultos), acompanhar as atividades dos pais e identificar as melhores práticas. AlphaEU apresenta
ainda e estudos de caso baseados em experiências concretas levadas a cabo em jardins-de-infância
132 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

pelos educadores que receberam formação, nos países europeus da parceria. Neste sentido, o proje-
to responde a recém-reformulados princípios-chave de educação pré-escolar enunciados (European
Commission, 2014), de respeito pelos interesses e pela diversidade cultural das crianças, de pedagogias
centradas nos seus interesses e no seu desenvolvimento cognitivo, social, emocional e físico integrado.

A formação de atores sociais para prevenir o abandono


escolar e a constituição de comunidades europeias de
prática do projeto SSN
O projeto SCHOOL SAFETY NET (SSN), disponível no portal eletrónico http://
schoolsafetynet.pixel-online.org, é um projeto financiado pela União Europeia para
2013 e 2014 e promovido por um conjunto de países europeus (Itália, Portugal, Es-
panha, Bélgica, Roménia, Grécia e Turquia) sobre a prevenção do abandono escolar
precoce a partir de 4 núcleos: deteção de alunos em risco de abandono, integração de
alunos imigrantes, acompanhamento de alunos com dificuldades de aprendizagem e
prevenção de episódios de violência e de bullying. O projeto SSN visa responder à necessidade dos
sistemas educativos europeus de lidarem com questões de abandono escolar precoce, atuando ao
nível da sua prevenção, disponibilizando para o efeito um conjunto de recursos, organizados numa
base de dados, que pode ser usado por escolas, instituições de formação e investigação e também
por professores, diretores, alunos, pais e encarregados de educação, decisores políticos e trabalha-
dores sociais no setor educativo. Aborda um tema-chave da educação contemporânea de encontrar
respostas para crianças e jovens de grupos em risco ou desfavorecidos. O projeto identifica proble-
mas e oferece soluções integradas e conjugadas entre todos os parceiros educativos para responder
a situações de saúde precária, mobilidade forçada, pobreza e exclusão.
O portal, com a base de dados – disponível em http://schoolsafetynet.pixel-online.org/info/
index.php – (que colige histórias de sucesso no âmbito da prevenção do abandono escolar preco-
ce, recursos científicos e materiais pedagógicos, experiências de professores, linhas de orientação,
construção de cenários, estudos de caso, módulos de formação) foi intensamente usado pela rede
de instituições da ESE de Castelo Branco e de Portalegre e por outras comunidades nacional no
âmbito de um protocolo de formação de agentes sociais e comunitários com o Alto Comissariado
para as Migrações (ACIDI, agora ACM). A usabilidade do portal reflete uma boa organização dos
recursos, aprazibilidade dos mesmos, fácil acesso à informação, estrutura e organização claras e
clareza na ligação entre os recursos, bem como qualidade dos materiais e recursos disponibilizados
em português e noutras línguas.
As linhas de orientação consistem em 10 passos ou medidas a adotar com o objetivo de ajudar
cada grupo alvo a compreender melhor cada uma das 4 áreas temáticas, interligando os recursos da
base de dados do projeto SSN com recursos de outros portais web, nomeadamente: Portal School In-
clusion (http://schoolinclusion.pixel-online.org/) para a área temática “Identificação de alunos em
risco”; Portal Routes (http://routes.pixel-online.org/index.php) para a área temática “Integração de
alunos imigrantes”; Portal EMBED (http://www.embeddyslexia.eu/) para a área temática “Alu-
nos com dificuldades de aprendizagem”; Portal I Am Not Scared (http://iamnotscared.pixel-online.
org/) para a área temática “Prevenção de bullying escolar”.
São 20 conjuntos de linhas de orientação, 5 por cada área temática, específicas para cada grupo
alvo: diretores, professores, pais ou encarregados de educação, alunos e decisores políticos, com
referências aos recursos do portal SSN e de outros portais
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 133

O projeto SSN é essencialmente um projeto de disseminação de recursos e de partilha deles de


uma perspetiva de comparabilidade europeia, bem como de uma exploração cruzada e mutuamente
fertilizada entre os atores: alunos, pais (ou encarregados de educação), professores, diretores de
escola e decisores políticos. Conceptualmente, o projeto assenta numa abordagem ‘bottom-up’, das
práticas e experiências recolhidas no terreno (em escolas e entre os atores já mencionados) para a
reflexão e disseminação das melhores práticas, e visa integrar, num todo, várias causas identificadas
do abandono escolar precoce e trata-las de forma transnacional, nomeadamente: deteção atempada
de alunos em risco de abandono; integração de alunos imigrantes; apoio às dificuldades de aprendi-
zagem dos alunos; e apoio aos alunos que são vítimas de violência e de bullying na escola.
As linhas de orientação são complementadas com a recolha de experiências, em cada uma das
áreas do projeto, de 10 professores, em cada país, e a sua participação num fórum transnacional
para comentar e comparar essas experiências. O portal disponibiliza 165 experiências de professo-
res e comentários.
As histórias compiladas e as experiências narradas por professores dão origem à criação de
cenários, criados pelas equipas de parceiros do projeto, debatidos transnacionalmente e poste-
riormente apresentados como estudos de caso, a resolver de forma cooperativa por consórcios
de escolas pela apresentação de estratégias a implementar. Nesta fase cada parceiro conduziu uma
sessão de debate do cenário em linha e com professores de países parceiros de forma a chegar a
uma estratégia consensual do cenário proposto baseada no material disponibilizado no portal SSN.
A base de dados SSN constitui um repositório de boas práticas, com diversos mecanismos de
exploração das mesmas por professores, como é o caso dos fóruns constituídos para recolha dos
seus testemunhos e para criação de estratégias para responder aos cenários propostos.
No entanto, importa ao projeto SSN que todos os atores educativos possam utilizar os recursos
disponibilizados de forma customizada, de modo a experimentar trabalhar com eles a partir dos seus
contextos de atuação específicos, no sentido de os integrar eficazmente nas suas práticas de atuação.
A existência de plataformas dinamizadoras de projetos, como a do projeto “School Safety Net”,
permite à investigação e à ação educativa uma maior estruturação e uma base tecnológica de dis-
seminação do processo de investigação e da experiência acumulada nas escolas a todas as partes
interessadas e à comunidade em geral, que neste caso é europeia. A extensão da plataforma infor-
mática à escala europeia constitui também uma oportunidade para demonstrar no plano internacio-
nal conhecimento e capacidade científica no domínio da prevenção do abandono escolar precoce.

A promoção da leitura entre jovens que a rejeitam no


projeto BOYS’ READING
O projeto BOYS READING parte de surpreendentes dados que come-
çam a emergir: Em 1/5 dos países da UE, os rapazes de quinze anos possuem
baixas competências de leitura (OECD 2011; 2012) e a maioria dos leitores
renitentes e não–leitores e eventualmente também a maioria dos alunos que
acabam por abandonar a escola são rapazes. Junte-se a estes dados o facto de
ler ser uma das competências básicas do século XXI com impacto sobre a
aprendizagem e desenvolvimento intelectual individuais. A Comissão Europeia (2012) salienta que
quanto mais desenvolvida a literacia, maior a inovação, a prosperidade e a coesão sociais, bem como
o bem-estar, a participação social e a empregabilidade dos cidadãos.
Resultados do PISA 2000, 2003 e 2006 para os 15 anos e do PIRLS (Progress in International
Reading Literacy Study) para os alunos com 10 anos: em todos os países as raparigas atingem níveis
134 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

mais altos nos testes de leitura do que os rapazes (Lynn & Mikk, 2009). As raparigas adquirem
competências verbais e gramaticais complexas e competências de leitura acima dos rapazes e estes
apoiam-se mais na comunicação não-verbal e incluem menor variedade discursiva ou de expressões
que utilizam, comenta Gurian (2010, p.25-6). Os rapazes revelam atitudes negativas em relação à
leitura (atividade obrigatória, autoridade dos professores, política educativa), comenta Senn (2012,
p.215). Os estilos de aprendizagem e as preferências dos rapazes são diferentes dos que são promo-
vidos na escola (Senn, 2012, p.216). Os livros da escola são olhados como ‘livros de meninas’ pelos
rapazes, que preferem não se envolver na análise das personagens ou das relações entre elas (Bolzt,
2007). Nas suas relações informais surge a ideia que a leitura não se liga ao papel de um homem na
sociedade (Forsthuber, Horvath & Motiejunaite, 2010, p.26). Os rapazes, mais do que as raparigas,
criam fronteiras de género em torno da leitura e gostam de escolher livros ‘masculinos’.
Com base neste conjunto de dados reunidos pela parceria, recorrendo a uma pesquisa para identificar
tendências atuais de investigação e iniciativas ligadas ao tema do projeto em cada um dos países par-
ceiros, incluindo o envolvimento direto de professores, pais, bibliotecários e rapazes, o projeto procura
integrar a leitura nas rotinas dos rapazes com idades compreendidas entre os 11 e os 15 anos. Para o con-
seguir, é preciso que os rapazes adolescentes possam selecionar quais os livros que mais apelam às suas
necessidades e interesses, que exista diálogo com eles e que todos os agentes educativos (incluindo pais
e membros da comunidade) se envolvam com esse objetivo. Todos eles são o público-alvo do projeto,
embora exista um enfoque no pessoal educativo e na possibilidade que este tem de criar experiências de
sala de aula, capazes de responder aos interesses, necessidades e estilos de aprendizagem dos rapazes e
de envolver tanto raparigas como rapazes em práticas de leitura e de escrita.
Os objetivos do projeto são: Aumentar a motivação e o interesse dos rapazes pela leitura e pela
escrita de modo a diminuir o fosso existente entre rapazes e raparigas; Abrir as escolas a materiais de
leitura mais apelativos, incluindo recursos digitais, para satisfazer as preferências individuais de leitura
e escrita dos rapazes; Facilitar o contacto com modelos masculinos envolvidos na literacia; e promo-
ver iniciativas que tornem a leitura e o desenvolvimento linguístico divertido e apelativo para rapazes.
Todos estes objetivos encontram sugestões concretas num Guia de Recursos Pedagógicos, que apre-
senta orientações e ideias sobre como os professores podem estimular o interesse pela leitura e sobre
como integrar textos para rapazes nos currículos escolares. Os dados recolhidos permitem sintetizar
que as preferências de leitura de rapazes incluem as seguintes categorias: ficção científica, romance
gráfico, humor, fantasia e mistério, ligação entre livro e filme ou série televisiva e livros sobre des-
porto. Dão especial atenção aos seguintes aspetos: capa, desenhos, livros digitais e letras de tamanho
grande. O Guia apresenta sugestões de leitura e Sugestões de integração das novas tecnologias, como,
por exemplo, Conversas sobre livros num sítio eletrónico ou blog; Trailers de livros; Página de Facebook
para certos livros/personagens; Promoção da leitura de e-books selecionados; Vídeos de recensão de
livros; Representações visuais sobre as melhores cenas/partes de livros; Realizar filmes sobre o enre-
do de livros; Usar o twitter com citações de livros; Usar o correio eletrónico para trocar comentários.

A promoção de competências narrativas básicas na era do


digital em AQUA NARRABILIS
Mais latas e fundamentais no desenvolvimento da literacia es-
tão as competências narrativas básicas que são o objeto do projeto
AQUA NARRABILIS. As competências narrativas e a capacidade
de descrever coisas e acontecimentos, bem como de contra uma his-
tória, são essenciais para o desenvolvimento da escrita e da leitura,
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 135

da aprendizagem de uma segunda língua ou de uma língua estrangeira, para o desenvolvimento de


uma cidadania participativa democrática no modo como se aprende a ser ouvido. Estas são tam-
bém competências cruciais para uma efetiva comunicação em qualquer área do saber.
O projeto AQUA NARRABILIS, a partir de um tema central como é o da Água, explora me-
todologias de desenvolvimento das competências acima descritas por intermédio de métodos con-
vencionais de contra histórias (a partir de livros), de leituras em voz alta de livros, de apresentações
visuais de álbuns de imagens, de teatros japoneses Kamishibai, de dramatizações, fantoches, teatros
de sombras e outros métodos essencialmente performativos. Estas metodologias são coligidas e
ilustradas com exemplos práticos, materiais exemplificativos, propostas didáticas e recursos peda-
gógicos de acesso livre em diversas línguas europeias para utilização em escolas e bibliotecas com
crianças do pré-escolar ao 2º ciclo.

A promoção da cidadania ativa e participativa no projeto


WE ARE EUROPE.
O projeto WE ARE EUROPE (Conhece-te a ti próprio e aceita a diferença dos outros), de ca-
ráter interdisciplinar e destinado a alunos da faixa etária dos 10 aos 14 anos, visa a criação e desen-
volvimento de módulos de ensino-aprendizagem inovadores, interdisciplinares e respeitadores de
valores e práticas das comunidades envolvidas e assume como eixo enquadrador os princípios-cha-
ve definidos pela Comissão Europeia (2014) para uma Educação Básica de qualidade. Assumindo
uma perspetiva centrada na criança, nos seus interesses e nos seus modos preferidos de aprender,
organiza-se a aprendizagem, em torno de temas específicos interculturais, tais como o de ‘a minha
terra’ em termos de identidade nacional, regional e local, tradições musicais, moda, culinária, des-
porto, a educação do futuro e as competências para o futuro, com vista à troca de informação com
crianças dos países parceiros. A ideia é suscitar o interesse dos alunos pela Europa em geral e pelos
países europeus envolvidos no projeto, mais especificamente, bem como despertar ou aprofundar
o seu interesse pela Europa e pela União Europeia enquanto espaço inclusivo de aprendizagem ao
longo da vida e de trabalho, ao mesmo tempo que se configuram as crianças como participantes
ativos nas sociedades, na aprendizagem e na definição dos cuidados de que necessitam. As crian-
ças não são apenas recipientes de educação, mas merecem ter um papel ativo na definição da sua
aprendizagem (European Commision, 2014, p. 7). Este objetivo é concretizado em temas, recursos
e atividades transdisciplinares concebidos a partir de interesses identificados junto das crianças para
complementarem os currículos escolares, testados em escolas (educação formal) e em bibliotecas
(educação informal). Estas atividades visam igualmente ajudar os alunos envolvidos no desenvol-
vimento das suas personalidades, na identificação das suas competências e no aperfeiçoamento das
suas capacidades sociais para um mundo multicultural e globalizado.
A estrutura do projeto pretende oferecer a professores, bibliotecários e estudantes a oportuni-
dade de se familiarizarem com novos métodos e percursos educativos e profissionais e com condi-
ções de trabalho emergentes na Europa unificada e no mundo globalizado. Metodologicamente, o
projeto promove o envolvimento localizado de alunos e professores de acordo com os contextos
em que mais sentido faz desenvolverem as atividades de ensino/aprendizagem, isto é, terão opor-
tunidade de escolher temas, atividades e recursos que considerem mais motivadores, entre os que
lhe são propostos, de encontrar estratégias para dar voz às crianças enquanto co-criadores de co-
nhecimento em interação com outras crianças e com adultos (p.7). O projeto encoraja o trabalho
em equipa e o ensino/aprendizagem em diferentes fóruns e visa expandir as competências dos
alunos para usar os media.
136 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Conclusões
A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF; a educação plurilingue promovida pelo
projeto ALPHAEU no contexto de jardim-de-infância; a formação de atores sociais para prevenir o
abandono escolar a partir da identificação das causas mais óbvias do mal-estar escolar e a constituição
de comunidades europeias de prática do projeto SCHOOL SAFETY NET; a promoção da leitura
entre jovens que a rejeitam e a capacitação de professores para lidarem com essa atitude de rejeição,
no projeto BOYS’ READING; a promoção de competências narrativas básicas na era do digital,
com ênfase em modos performativos de leitura a introduzir desde as mais tenras idades, no projeto
AQUA NARRABILIS; e a promoção da cidadania ativa e participativa de crianças colocadas no cen-
tro do processo educativo, presente no projeto WE ARE EUROPE; todas estas formas de aplicar o
conhecimento e a investigação, que resultam de parcerias estratégicas, fazem justiça e acompanham
dinâmicas de adequação da educação e da escola às pressões globalizantes da era digital e da economia
mundial e a práticas situadas localmente, que coexistem em tensão. O que procurámos demonstrar
foi como os conceitos teóricos de ‘educação multicultural e intercultural’, de ‘educação plurilingue’,
de ‘abandono escolar precoce’, de ‘cidadania ativa multicultural e participativa’, bem como de ‘com-
petências básicas’ para a educação do século XXI encontram expressão aplicada diversa - e negociada
estrategicamente entre parceiros europeus, neste tipo de projetos – da que é teorizada na investigação
fundamental, transformando-se em práticas educativas específicas em contextos diversificados. Nes-
tes projetos de investigação aplicada o elemento humano é realçado pelo modo como se registam,
de forma comparativa ou paralela, os processos de interação de alunos e formadores com os recur-
sos e materiais desenvolvidos pelas parcerias. Eles contribuem igualmente para uma boa gestão da
informação disponível sobre cada assunto/tema pela forma como a disponibilizam gratuitamente e
de acesso livre online e documentam a história de constituição do acervo. Mais importante ainda do
que estes aspetos, é o facto de os projetos potenciaram a passagem do conhecimento à ação, uma vez
que, ao implementarem e avaliarem criticamente a implementação de recursos e materiais, os projetos
asseguram que existe sentido e relevância para cada organização em particular e que aquilo que even-
tualmente alterou as suas práticas pode influenciar outros ou foi influenciado por outros atores den-
tro da parceria. As parcerias estratégicas em educação não representarão cabalmente uma mudança
organizacional dos sistemas educativos ou das filosofias educativas de cada um, mas constituem sem
dúvida um passo certo nesse sentido.

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138 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Agradecimentos
Todos estes projetos foram
financiados pela Comissão Euro-
peia através dos programas Life-
long Learning e Erasmus+. Esta publicação reflete apenas as opiniões da autora e a comissão não
pode ser responsabilizada por qualquer uso que possa ser feita das informações nela contidas.
As parcerias europeias desenvolvem produtos que são resultado do esforço coletivo, pelo que
muitas das ideias que aqui se apresentam, embora da responsabilidade exclusiva da autora, serão
indiretamente daqueles com quem colaborámos.
Lista de autores EUMOF: Panayiotis Angelides, Petros Panaou, Margarida Morgado, Maria da
Natividade Pires, Lilia Ratcheva-Stratieva, Malgorzata Kolodziejczyk, Costas Katsonis, Evangelos
Kapetis, Kostas Magos, Magdalena Nösslböck, Wolfang Moser.
Lista de autores ALPHAEU: Charalambos Vrasidas, Petros Panaou, Valentina Tomba, Frances-
ca Granieri, Sarah Land, Emma Land, Margarida Morgado, Maria José Infante, Yolanda Frangou,
Martha Vasiliadou, Katerina Theodosiadou, Raymond Laverty; Adriana Lazar Oprea.
Lista de autores SSN:Christine Cloes, Julien Keutgen, Spiros Sirmakessis, Giuseppe Italiano,
Domingos Santos, Margarida Morgado, Mihaela Cornelia, Rosario del Rey, Murat Demirbaş, Mus-
tafa Bayrakcı.
Lista de autores BOYS’ READING: Christiana Aravi, Helen Bonanou, Panos Papoutsis, Yian-
nis Kotsanis, Petra Kampf, Georg Muellner, Ivana Batarelo Kokić, Jadranka Nemeth-Jajić, Andreja
Bubić, Tonća Jukić, Vesna Kostović-Vranješ, Ivanka Buzov, Snježana Dimzov, Anita Mandarić-
Vukušić, Maria da Natividade Pires, Margarida Morgado, Manuela Abrantes, Karolina Tomczyk,
Jaroslaw Pluciennik, Michal Woblewski, Ionel Didea, Georgeta Chirselan, Adina Elena Dumitru,
Charalambos Vrasidas.
Lista de autores AQUA NARRABILIS: Wolfang Moser, Verena Gangl, Malgorzata Kolodzie-
jczyk, Margarida Morgado, Maria da Natividade Pires, Teresa Gonçalves, António Pais, Elisabeth
Zehetmeier, reinhart Ehgartner, Panayiotis Angelides, Radka Kalcheva, Emilia Milkova.
Lista de autores WE ARE EUROPE: Lilia Ratcheva-Stratieva, Katharina Reindl, Karin Veit,
Malgorzata Kolodziejczyk, Margarida Morgado, Gertrudes Amaro, Ana Cravo, Mare Muursepp,
Liisa Karlsson, Branwen Bingle.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 139

PRÁTICAS DE ESCRITA NA AULA DE


ESPANHOL LÍNGUA ESTRANGEIRA:
AS COMPETÊNCIAS COMUNICATIVA E
SOCIOLINGUÍSTICA
André Costa (andrecosta@ipcb.pt)
Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico de Castelo Branco
Maria da Graça Sardinha (mggds@ubi.pt)
Paulo Osório (pjtrso@ubi.pt)
Universidade da Beira Interior

Resumo
A competência de comunicação, elemento chave elencado pelo Quadro Europeu Comum de
Referência para as Línguas: Aprendizagem, Ensino, Avaliação, cumpre um papel preponderante
nas aulas de espanhol língua estrangeira, seja em termos de expressão ou compreensão, oral ou es-
crita. Ao falarmos em competência de comunicação, devemos também centrar-nos na competência
sociolinguística, isto é, da ativação de um conjunto de conhecimentos que facilita o uso da língua,
por veicular eficácia e adequação aos atos comunicativos em que o usuário interage. Referimo-nos,
então, a questões geográficas, económicas, sociológicas, históricas e religiosas, enfim, culturais que
englobam crenças, tradições e atuações, elencadas pela componente sociocultural, e que caracteri-
zam de forma indelével os utilizadores de determinada língua.
Nesta comunicação, procura-se analisar de que forma a competência sociolinguística concorre
para a constituição da competência comunicativa no que concerne à ativação de competências
de escrita que cumpram esse objetivo. Este estudo visa, assim, analisar que modelos e práticas de
ensino-aprendizagem são utilizados no ensino do espanhol para a consecução de um texto escrito
adequado à situação de comunicação contando, para tal, com o recurso a entrevistas de professores
de espanhol língua estrangeira que, com a sua opinião, nos darão luz sobre a problemática propos-
140 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

ta, esclarecendo-nos sobre a importância que o texto escrito possui, hoje em dia, nas aulas de es-
panhol língua estrangeira e qual o papel que, no seio dessa competência, desempenha a adequação
à situação de comunicação.

Palavras-chave: Escrita; língua estrangeira;; competência comunicativa; competência sociolinguís-


tica.

Abstract
Communicative competence key part listed by the Common European Framework of Referen-
ce for Languages: Learning, Teaching, Assessment, plays a leading role in Spanish lessons foreign
language, both in terms of expression or understanding, oral or written. When we talk about com-
munication competence, we must also focus on the sociolinguistic competence, ie the activation of
a body of knowledge that facilitates the use of language, for vehicular effectiveness and suitability
to communicative acts in which the user interacts. We refer then to geographical, economic, socio-
logical, historical and religious, in short, that include cultural beliefs, traditions and performances,
listed by social and cultural components, and featuring indelibly specific language of the users.
In this communication, we try to analyze how the sociolinguistic competence contributes to the
creation of communicative competence with respect to the activation of writing skills that meet
this objective. This study therefore aims to analyze which models and teaching-learning practices
are used in teaching Spanish to the achievement of a written text appropriate to the situation of
communication counting, to this end, with the use of Spanish foreign language teacher interviews
with your opinion, give us light on the problematic proposal, explaining us about the importance
of the written text has, today, in the classes of Spanish foreign language and what role, within that
jurisdiction, plays the adequacy the communication situation.

Keywords: Writing; foreign language; communicative competence; sociolinguistic competence.

Introdução
A escrita encontra-se presente, em termos sociais, na grande maioria das nossas necessidades
linguísticas. O primado da internet e a sua importância crescente na vida não apenas dos jovens,
como também na dos adultos, faz com que na atualidade se olhe de uma outra forma para a escrita
e para as implicações das aplicações práticas que dela se fazem (Barbeiro, 2003; Carvalho, 1999;
Cassany, 2005). Estes autores defendem a necessidade de uma adequada aprendizagem da escrita
que, sendo ativada em língua materna, poderá mais facilmente ser desenvolvida aquando da apren-
dizagem de uma língua estrangeira (Cassany, 2005).
A situação que se tem vivido em termos de docência de língua estrangeira desde 2001, com a
implementação do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECRL), faz com
que os professores possam, com cada vez maior facilidade e proficiência, compaginar as expecta-
tivas dos alunos com uma crescente autonomia, que é expectável de parte a parte; para além disso,
denota-se, ainda, um possível aumento da aplicação da criatividade ao processo de ensino-apren-
dizagem da língua, assim como uma maior flexibilidade do curriculum, algo que permite a melho-
ria generalizada das condições de aprendizagem, valorizando o essencial da atividade docente: o
alcançar dos objetivos propostos para cada um dos níveis de proficiência definidos pelo QECRL
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 141

e a consequente obtenção do conjunto enunciado de competências linguísticas, sociolinguísticas e


pragmáticas, assim como de capacidades comunicativas e socioculturais.
Deverá, então, a atividade docente centrar-se na preparação e aplicação de atividades facilita-
doras da sua consecução levando os alunos de língua estrangeira a desenvolver, de uma forma
holística, todas as competências orais e escritas necessárias a um adequado uso da língua-alvo em
contexto real.

Contextualização teórica
No que diz respeito à produção do texto escrito e mesmo ao nível da expressão oral, a aprendi-
zagem de uma língua estrangeira requer dinâmicas socioculturais que exigem, concomitantemente,
o desenvolvimento da competência sociocultural não apenas de quem aprende esse idioma, como
também de quem o ensina, porquanto a volatilidade deste tipo de conhecimento impõe que o mes-
mo seja atualizado, adaptado e modernizado, fruto do devir da(s) sociedade(s).
Para a consecução desse objetivo contribuem quatro sub-competências que conformam essa
mesma competência comunicativa, de acordo com Canale & Swain (1980), a saber, a competência
gramatical que implica o domínio do código linguístico da língua alvo; a competência sociolinguística que
pressupõe a adequação da mensagem ao contexto da sua produção e/ou receção; a competência
discursiva presidida pela coerência e coesão e, por fim, a competência estratégica que antevê potenciais
obstáculos comunicativos.
Contudo, todo e qualquer estudo sobre o ensino/aprendizagem de idiomas deverá pressupor
o QECRL (2001) que nos oferece uma base comum que possibilita e potencia a elaboração de
diferentes programas na área das línguas. No referido texto, a competência comunicativa surge
enunciada como uma aptidão que resulta grandemente de três elementos constituintes, os saberes
linguísticos, sociolinguísticos e os pragmáticos (op.cit.:34).
Considerando que o QECRL coloca a ênfase em determinados parâmetros socioculturais, pare-
ce-nos, com Van Ek (1984), que deverá postular-se a existência de uma competência sociocultural
que possa regular as produções linguísticas, adaptando-as aos contextos nos quais são produzidas,
ao invés de que haja uma preocupação exclusiva com os conhecimentos linguísticos aí aplicados,
até porque a competência comunicativa é composta por várias camadas, como refere Niño (2008).
Estamos, portanto, perante uma visão holística da competência comunicativa, também partilhada
por Romeú (2005), que a define como uma configuração psicológica integradora de capacidades
que lhe permitem interagir em diferentes ambientes socioculturais, perseguindo diferentes fins e
objetivos, incluindo na competência de comunicação quer a componente cognitiva, quer a compo-
nente sociocultural, abarcando, assim, os saberes culturais, conhecimentos, valores, necessidades,
emoções e motivações, num processo constante de retroalimentação, como refere, aliás, Bardovi-
-Harling (2001).
Parece-nos, na prática, que um desvio no que concerne à competência linguística refletirá apenas
um desconhecimento gramatical; contudo, os equívocos socioculturais poderão originar a um com-
prometimento ou embaraço por parte dos interlocutores. Este possível entrave na comunicação
pode ser facilmente justificado pelo facto de ter, permanentemente, como ponto de partida uma
visão enraizada na sua própria cultura pelo que o filtro aplicado a todas as situações de comunica-
ção será o do ponto de partida e nunca o do ponto de chegada, ao estar sempre mais próximo da
língua materna do que da língua alvo.
Contudo, Cook (2003) coloca algumas reticências, associadas à componente sociocultural, em
virtude da ausência desta dos manuais escolares que acabam por centrar-se quase exclusivamente
142 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

na língua, ou seja, nas competências puramente linguísticas, acrescentando, ainda, Bardovi-Harling


(2001) que os diálogos presentes em muitos dos manuais são pouco reais, algo que acaba por pro-
vocar desmotivação e frustração.
Dever-se-á, então, garantir a integração da componente sociocultural na componente comunica-
tiva, facultando ao aluno as ferramentas necessárias para uma comunicação plena com os falantes
nativos. Pressupõe-se, então, uma adequação do processo de ensino-aprendizagem aos padrões da
língua estrangeira, sejam eles contextuais ou culturais, para além de uma abordagem direcionada
para aspetos culturais que não apenas a história, o sistema político, mas primordialmente as crenças,
as suposições e as opiniões que conformam o pensamento dos falantes da língua-alvo, para que o
próprio aluno consiga (man)ter a consciência dos contextos culturais que envolvem os processos
comunicativos, evitando um potencial choque cultural.
Assim, e como defende o QECRL (2001:150), “O conhecimento, a consciência e a compreen-
são da relação (semelhanças e diferenças distintivas) entre “o mundo de onde se vem” e “o mun-
do da comunidade-alvo” produzem uma tomada de consciência intercultural.” que contribui para
relativizar as situações comunicativas em ambas as línguas; contudo, não raras vezes esta mesma
competência sociocultural acaba por ser confundida por professores e alunos com alguns “este-
reótipos nacionais” (idem, ibidem) ao invés de se optar por uma abordagem que inclua o tratamento
de elementos que conformem comunicação não-verbal, como o caso dos gestos, da proximidade
entre indivíduos ou dos hábitos e costumes ou de elementos diferenciadores dos atos de fala típicos
da língua-alvo1.

Contextualização Metodológica
Optámos, neste estudo, por uma abordagem direta ao corpo docente, por forma a evidenciar não
os resultados finais apresentados pelos alunos mas antes refletir sobre a forma como os professores
encaram o ensino da escrita e a forma como ponderam os resultados dos alunos. A estratégia de in-
vestigação seguida neste trabalho é de tipo intensiva-qualitativa. Este tipo de estratégia de investigação
caracteriza-se pela intensidade da abordagem ligada à multiplicidade de facetas a estudar (Greenwood,
1965). Trata-se de analisar em profundidade as dimensões que caracterizam este singular processo de
ensino-aprendizagem da escrita, associado ao ensino do espanhol como língua estrangeira.
Esta orientação metodológica procura contrariar os tradicionais métodos positivistas, opondo
à generalização pela quantidade e pela uniformização, a generalização pela qualidade e pela exem-
plaridade (Estanque, 2000:104). As qualidades explicitadas a partir de uma perspetiva disciplinar,
conferem representatividade ao caso. Esta representatividade não decorre da estatística, à qual ela é
muitas vezes reduzida nas ciências, mas de uma representatividade que se pode qualificar de teórica
(Hamel, 1997:99-100).
O tipo de entrevista privilegiado foi a semi-diretiva, cujo guião-base se encontra em anexo. A
ambiguidade é menor, na medida em que o esquema da entrevista estrutura o indivíduo e, con-
sequentemente, impõe-lhe um quadro de referência. Para delimitação do número de entrevistas
utiliza-se o critério de ‘exaustão’ ou ‘saturação’ segundo o qual o investigador efetua entrevistas
em número suficiente para permitir certa reincidência das informações, garantindo um máximo de
diversificação e abrangência (Minayo, 1999), tendo, o nosso estudo, ficado limitado a onze entre-
vistas.
1
Para mais informação sobre este tema e uma consulta mais aprofundada sobre as variáveis que podem interferir nos aspetos comunicacionais, veja-
se o QECRL (2001:148-149) onde se elencam diferentes aspetos distintivos que conformam potenciais especificidades culturais, dentro de sete
áreas-chave, a saber: 1. Vida quotidiana, 2. Condições de vida, 3. Relações interpessoais, 4. Valores, crenças e atitudes, 5. Linguagem corporal,
6. Convenções sociais e, 7. Comportamentos rituais.
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 143

Apresentação, análise e discussão dos resultados

a. Prevalência de uma competência

A maioria dos entrevistados começava por garantir o equilíbrio oferecido ao conjunto de com-
petências apesar de que, a posteriori, dois professores acabavam por descrever uma aposta um pouco
mais forte numa das quatro destrezas. Este equilíbrio encontra sustentação no facto de que “o que
se pretende é que eles saibam um conjunto de conhecimentos que lhes permitam usar a língua em
várias circunstâncias”, como refere O_cb.
É também esta a opinião veiculada por Amor (2003), defendendo a autora que a escrita é tão
relevante como as outras competências associadas ao ensino-aprendizagem de uma língua, o que
pressupõe o recurso a um ensino levado a cabo de forma faseada e equilibrada, comparativamente
às restantes destrezas, posição também preconizada pelos diferentes programas do Ministério da
Educação (Fernández S., 2002).
A única opinião díspar, relativamente aos restantes entrevistados foi a do professor L_cb que
privilegia a expressão, seja “à expressão escrita e à expressão oral” porque “a compreensão é muito
mais fácil para alunos portugueses”.

b. Proporcionalidade dos resultados evidenciados pelos alunos nas


diferentes componentes

Os objetivos por detrás desta segunda categoria passam por evidenciar se os resultados que
os alunos alcançam sofrem divergências relativamente à oralidade e à escrita, mas também tentar
perceber se é possível identificar uma relação direta entre o investimento feito em sala de aula e os
resultados que os alunos alcançam.
Conclui-se, como refere A_cb, que os alunos são “melhores na escrita do que na oralidade por-
que não têm segurança”, até porque, e como expõe o professor A_lx, “o facto de ser tão parecido
com o português, leva-os a cometer demasiados erros e isso na oralidade reflete-se ainda mais” até
porque “na escrita conseguem contornar um pouco essa questão”, em virtude da maior reflexivida-
de inerente à atividade e à gestão que os alunos podem fazer do tempo disponível para a atividade,
como defende, aliás, Sim-Sim (1998) que aponta para a metacognição que, por refletir o “controlo
dos processos e produtos cognitivos”, como a definiu Flavell (1976), implica e pressupõe essa mes-
ma reflexividade como algo inerente ao processo de escrita.

c. Reação dos alunos perante exercícios de expressão escrita e de


expressão oral

Procura-se, aqui, confirmar se o ponto de vista dos docentes é, de alguma forma, coincidente
com as reações que os alunos demonstram, quando confrontados com as diferentes atividades de
expressão oral e escrita.
Uma reação positiva à expressão oral colhe unanimidade na medida em que “apesar de tudo,
eles encaram uma atividade de expressão oral como algo mais motivador”, como nos indica o
professor A_lx. É certo que alguns dos entrevistados asseguram que “eles acabam por gostar mais
da oralidade quando sentem segurança”, refere A_cb. Há ainda uma outra linha de argumentação,
partilhada por três professores, que remete para a necessidade de “procurar assuntos que a eles lhes
interessem”, como refere L_cb, porque “o que eles vão usar é mais a oralidade do que a escrita”,
144 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

pelo que “lhe reconhece mais utilidade”, no entender de O_cb, aludindo assim às bases da meto-
dologia de ensino por tarefas, como defende Nunan (2002) apontando para a necessidade de que
os alunos se impliquem na compreensão, manipulação, produção e interação em L2, aproximando
as práticas pedagógicas de ações da vida quotidiana.

d. Objetivos predominantes à consecução de uma produção escrita

Optou-se, aqui, por direcionar a entrevista para o campo da expressão escrita e para a forma como
professores e alunos agem relativamente a práticas de escrita. Após uma análise aos dados extraídos
das entrevistas, verificou-se que raramente se perspetiva apenas a consecução de um único objetivo,
algo a que não é estranha, naturalmente, a própria natureza do texto escrito que permite a avaliação
de diferentes parâmetros, como refere, aliás, o professor R_prt “a maior parte das vezes estão todas
em jogo, agora dependerá sempre dos objetivos do professor” pois, como defende Bronckart (1995),
devemos entender a textualização como um conjunto de ferramentas que acaba por poder levar à
constituição de um saber linguístico e não apenas úteis à consecussão desse mesmo texto.

e. Competências predominantes à consecução de uma produção escrita

Procurava-se aferir do destaque dado à componente sociocultural, considerando que a socio-


linguística, apesar de abarcar aspetos bastante diversificados e, amiúde, avançados do estudo de
uma língua, inclui também referências à adequação de um texto à situação de comunicação, pela
importância que deve à atenção aos registos e usos da língua-alvo, de acordo com QECRL (2001).
Contudo, no decorrer da entrevista, sempre que se pedia algum exemplo, algum caso concreto,
não raras vezes os entrevistados fugiam ao tema, como os casos dos docentes O_cb e R_prt, de-
rivando para a descrição dos seus métodos de trabalho em termos de avaliação de textos escritos;
outros casos houve em que foram recebidas apenas respostas curtas, sem qualquer desenvolvimen-
to por parte dos entrevistados pese embora a insistência; houve ainda indecisões na resposta e até
uma justificação com base nos critérios emanados pela escola ou pelo ministério; estas ocorrências
parecem ficar a dever-se à falta de análise das produções escritas em função das competências que
os alunos podem, ou não, alcançar, mas antes dos objetivos que se planificaram para a atividade,
como tinha já ficado exposto na questão anterior.

f. Receção, por parte do aluno-escrevente, das correções dos textos


produzidos

A natureza desta questão poderá entender-se sob duas perspetivas díspares e que, na sua subs-
tância, nos levam por dois caminhos de análise diferentes; para além dos alunos receberem as
correções dos seus textos, poderemos ver também quais as competências que foram avaliadas,
cotejando essa informação com as respostas que se obtiveram na questão anterior.
Nesse sentido, levantaram-se as expressões, dos entrevistados, associadas às estratégias de reme-
diação e que, apesar dos objetivos que se espera que os alunos alcancem e das competências que se
espera que sejam avaliadas, acabam por passar maioritariamente por aspetos lexicais e/ou gramati-
cais e não tanto por questões de sociolinguística – ao invés do aludido na questão anterior – apesar
da importância e relevância de que esta competência se reveste na expressão escrita, tal como de-
fendido por Canale & Swain (1980) e Ançã (1999), que refere que “a perspetiva a considerar aqui,
assentando em critérios sociolinguísticos, define língua como sendo um conjunto de subsistemas e
variantes linguísticas com certas especificidades” (1999:1).
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 145

g. Preponderância da adequação de um texto escrito à situação de


comunicação, por oposição aos restantes critérios de textualidade

Visa-se, aqui, confrontar todos os critérios de textualidade, tal como foram enunciados por
Beaugrande & Dressler (1981), Beaugrande (1997) e Simon (2008) de forma a tentar perceber qual
a relevância da adequação à situação de comunicação, no entender dos entrevistados, na forma final
em que é apresentada uma produção escrita.
Assim, a maioria dos professores entrevistados consideram, num primeiro momento, que “o
texto deve ser sempre enquadrado a nível contextual” porquanto se “o texto é escrito mas que não
é significativo naquele contexto discursivo, é meio caminho andado, senão mais, para haver desmo-
tivação”, como refere o professor R_cb, apoiado por Fernández-Ulloa (2005). O professor S_prt
acaba por oferecer uma explicação para esta potencial desmotivação, no sentido em que “se o texto
não for adequado, nesse sentido, todo o enunciado não tem, digamos, não é que não tenha valor,
mas o objetivo comunicativo não é cumprido” e quando um texto acaba por não cumprir o seu
desígnio, acrescenta L_cb, “se falha a adequação, falha toda a carta, falha toda a estrutura, falha toda
a expressão escrita”, na medida em que importa, como refere Halliday (1973) perceber quais os
princípios que forçam a variação linguística em contexto, para que se possam, com maior acuidade,
entender os fatores situacionais que levam ao recurso a determinadas escolhas linguísticas.
Parece-nos, ainda, de todo o interesse centrar-nos num aspeto identificado na entrevista com o
professor O_cb quem, no âmbito desta questão, acabou por referir-se a um parâmetro de avalia-
ção com alguma relevância e que foi associado à adequação à situação de comunicação, “um dos
parâmetros que nós temos dentro das avaliações escritas é fuga ao tema”; afigurar-se-nos de suma
importância destrinçar estes dois caminhos porquanto a fuga ao tema, digamos, a falta de adequa-
ção ao tema pedido não tem necessariamente que estar dependente de uma possível – ou potencial
– falta de adequação do texto à situação de comunicação. Num outro patamar, prolongando a con-
fusão entre adequação e adequação à situação de comunicação, o professor A_cb explana sobre o
facto dos textos apresentados pelos seus alunos se adequarem à realidade económico-social, como
se isso significasse o cumprimento da adequação à situação de comunicação, desvio que o professor
foi mantendo apesar da insistência.

h. Acuidade da proximidade entre Portugal e Espanha no que se refere à


aquisição de competências socioculturais

Tentámos perceber, junto dos entrevistados, qual o seu ponto de vista sobre a proximidade
cultural existente entre ambos os países e se a mesma funcionaria como um desafio ou como um
entrave para uma mais capaz apropriação de princípios como “o conhecimento, a consciência e a
compreensão da relação (semelhanças e diferenças distintivas) entre “o mundo de onde se vem”
e “o mundo da comunidade-alvo” [e que] produzem uma tomada de consciência intercultural.”
QECRL (2001:150).
Das opiniões manifestadas pelos entrevistados, a larga maioria expressou a convicção de que a
proximidade cultural entre Portugal e Espanha funciona, em termos de aquisição da competência
sociocultural, como um desafio; o professor R_cb, apesar de considerar que “a partilha de elemen-
tos a nível cultural verifica-se, em muitos aspetos, mas noutros distancia-se completamente”, ana-
lisa os ganhos provenientes de “uma aprendizagem informal [que] tem aspetos que a formal não
consegue ter”, elencando assim as vantagens que advêm dos intercâmbios entre alunos de ambos
os países, na medida em que “isso acaba por ser um motivo de curiosidade, de estudo, de interesse,
de questionar quem os acompanha”.
146 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Desse contacto poderemos extrair benefícios, seja em termos linguísticos, como refere o pro-
fessor R_cb, tal como defende também Santos Gargalho (1993) pois quanto maior for a distância
linguística, maiores serão as dificuldades de aprendizagem e as interferências da língua materna no
processo de aquisição, enquanto que, por outro lado, sendo menor a distância linguística, mais fácil
será para o aprendente o processo de aquisição do novo sistema linguístico, seja, ainda, em termos
socioculturais “é uma forma de esbater alguns aspetos culturais e entrelaçar outros”, conclui o pro-
fessor R_cb, apoiando-se no parecer de Fernández (2004) que defende a indissociabilidade entre
língua e cultura, porquanto a língua, além de ser veículo de cultura de um país, serve para expressar
toda a sua realidade.

i. Papel do contexto na relevância da adequação do texto à situação de


comunicação

O objetivo passa por procurar tipologias textuais onde essa adequação se torne mais evidente e
atividades ou percursos pedagógicos que possam fazer sobressair a necessidade de uma completa
e aturada adequação de um texto ao contexto comunicacional, no sentido em que sabemos, com
Niño (2008), que apenas um trabalho sistemático, explícito e intencional permitirá que a competên-
cia comunicativa seja assegurada, em termos da sua aplicação prática à expressão escrita.
Apesar das propostas evidenciadas e apresentadas pelos docentes entrevistados, pudemos tam-
bém descortinar algumas advertências, especialmente no que concerne à falta de materiais espe-
cíficos que permitam a professores e alunos trabalhar a competência sociolinguística enquanto
elemento fulcral na adequação à situação de comunicação. Num outro prisma, ainda dentro da
análise a potenciais problemas que concorrem para uma potencial falta de adequação à situação
de comunicação dos textos produzidos pelos alunos, encontramos a opinião do professor O_cb
que aponta o facto dos alunos não terem “uma visão tão alargada que façam essa diferenciação [do
destinatário do texto], isto é, ao escreverem o seu texto, muitos dos alunos não reconhecem o des-
tinatário do texto como um elemento cuja pertinência interfira na qualidade do texto apresentado,
pois “o conhecimento do outro é uma coisa que vai ser preciso ainda trabalhar, vai ser despertada e
vai ter de ser trabalhada” ao longo do tempo, opinião semelhante à de Barbeiro (2003) que aponta
no sentido de que as dificuldades encontradas pelos alunos, nas suas produções escritas decorrem
grandemente do facto de os alunos não encontrarem outros destinatários senão o professor, nem
outros contextos senão a escola, factos que acabam por limitar as atividade de escrita a um contexto
concreto e único.
Por outro lado, o professor V_elv começa por apontar no mesmo sentido mas confessa obter
resultados mais generosos. Neste caso, o professor V_elv, que passara por escolas maioritariamente
em zonas fronteiriças e, portanto, com um contacto linguístico-cultural dos alunos com Espanha
substancialmente mais privilegiado, refere que “normalmente no início há alguma dificuldade, mas
depois” os alunos adaptam o seu texto e adotam estratégias comunicativas ajustadas a cada uma das
realidades com as quais são confrontados.

Considerações Finais
Considerando que o atual mundo em que vivemos, eminentemente tecnológico e vocaciona-
do para a prevalência da comunicação mas, isso sim, uma comunicação digital, curta, concisa e
escrava da velocidade vertiginosa com que os dias transcorrem, as atividades de expressão escrita
que decorrem em ambiente escolar funcionam para os alunos como se de um castigo se tratasse,
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 147

porquanto não lhes encontram nenhum tipo de utilidade prática nem de aplicação clara e objetiva.
Considerando, também, que a escrita mais recorrente para os nossos alunos depende, hoje em
dia, do uso de plataformas digitais cuja extensão é mais do que limitada, estripando os textos ne-
las produzidos de qualquer noção de coerência, coesão e gramaticalidade, e cuja competência de
comunicação é, mais do que nunca, apenas entendida por pequenas minorias, por estreitos grupos
que, temporária e, por vezes, transitoriamente, compartem aquele mesmo código.
Considerando, ainda, que uma produção escrita deve perspetivar, como um todo e de forma
holística, todas as competências que para ele concorrem e que pressupõem uma aplicação de co-
nhecimentos de índole bastante diversa, como refere, aliás, o QECRL ao elencar que um texto
deve “possuir os conhecimentos e as capacidades descritas noutro local para, por um lado, iden-
tificar, compreender e interpretar o texto e, por outro lado, organizá-lo, formulá-lo e produzi-lo”
(2001:137), de uma forma clara, correta, organizada, coerente e coesa e, claro está, de um modo que
os interlocutores envolvidos considerem e reconheçam como adequado.
Parece-nos, assim, que os escreventes têm vindo, ao longo do tempo, a desinteressar-se das ati-
vidades de escrita por considerá-las obsoletas, individuais e fechadas num mundo escolar com um
decrescente critério de aplicabilidade à realidade dos alunos e à cosmovisão que os mesmos têm
da realidade. Esta circunstância decorre do facto das atividades de expressão escrita se basearem,
com bastante frequência, na consecução de objetivos gramaticais. Apesar da presença da vertente
comunicacional, ainda é possível perceber que muitos dos textos pedidos aos alunos possuem um
escasso carácter comunicativo e adentram-se por caminhos que não os que os alunos necessitam
para o seu quotidiano, fator que, por si só, acaba por conduzir a uma crescente – e não raras vezes
irreversível – desmotivação dos alunos para com a escrita.
Esta falta de motivação pode, indubitavelmente, ser responsável pelos fracos resultados dos alu-
nos, como pudemos verificar pelas reações dos alunos às atividades de expressão escrita. Contudo,
levantaram-se outras questões que se revestem de grande importância associadas à pouca efetivida-
de e prevalência da expressão escrita e dos modelos de ensino aprendizagem relacionados, como a
latente ausência de objetivos de índole comunicativa, quando comparadas as respostas dadas pelos
entrevistados relativamente à importância dos objetivos lexicais e gramaticais com que os mesmos
revestem as atividades de expressão escrita, transformando a produção textual numa amálgama de
conteúdos lexicais e gramaticais que funcionarão mais como um repositório cumulativo de frases e
onde se vislumbra apenas uma relação meramente circunstancial como refere (Lima, 2006), do que
como um texto. Assim, por forma a inverter o status quo identificado, dever-se-á apontar para o
aprofundamento, em ambiente-aula, da aposta e do desenvolvimento de textos associados à criação
de diálogos, reclamações, respostas a anúncios de trabalho, escrita de cartas de apresentação e res-
petivo CV, criação de blogs ou ao envio de correios eletrónicos, simulando sempre situações reais
de imersão cultural, propensas à aplicação da competência sociocultural.

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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 149

Anexo I – Entrevista semi-diretiva a docentes de


espanhol língua estrangeira - guião
Considerando o trabalho de investigação que nos propomos realizar, no âmbito do doutora-
mento em letras na Universidade da Beira Interior, como já tínhamos referido, é necessário re-
colher alguns dados sobre a produção de texto escrito na aula de Espanhol Língua Estrangeira,
nomeadamente ao nível dos modelos e práticas a que os professores recorrem e na adequação dos
mesmos à situação de comunicação.
Nesse sentido, elaborámos algumas questões que, do nosso ponto de vista, contribuirão de for-
ma objetiva para a recolha de informação sobre o assunto em estudo.
Irá, então, proceder-se à gravação da presente entrevista com o único intuito de registar todos
os dados nela constantes.

Valorização do texto escrito


1. Crê que podemos indicar a prevalência de uma competência que se sobreponha às restantes
considerando a expressão oral e escrita ou a compreensão oral e escrita?
2. Relativamente aos resultados que os alunos de E-LE alcançam, considera que são propor-
cionais relativamente às componentes oral e escrita?
3. Como reagem os alunos de E-LE quando confrontados com a expressão escrita? E com a
expressão oral?

Competências valorizadas
1. Que objetivos presidem, com maior frequência, à planificação de uma atividade de produ-
ção escrita?
2. Exclusivamente no que diz respeito à expressão escrita, quais as competências (gramatical,
discursiva ou sociolinguística) que mais são alvo de análise?
3. De que forma o aluno-escrevente recebe feedback do texto produzido?

Adequação à situação de comunicação


1. Qual lhe parece ser a relevância, para um texto escrito, da adequação do mesmo à situação
de comunicação, por contraste com os restantes critérios de textualidade, como coerência, coesão,
intencionalidade, aceitabilidade, informatividade e intertextualidade?
2. Considera alguma da proximidade cultural existente entre Portugal e Espanha como um
desafio ou entrave à aquisição efetiva da competência sociocultural?
3. Em que contexto lhe poderá parecer mais relevante o cumprimento da adequação de um
texto à situação de comunicação?
150 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 151

SUPERVISÃO PROMOTORA DE MUDANÇA


E INOVAÇÃO NA AVALIAÇÃO DO
DESEMPENHO DOCENTE - ESTUDO DE
CASO
Graça Figueiredo Monteiro (monteiro.graca@gmail.com)

Agrupamento de Escolas de S. Gonçalo – Torres Vedras

Resumo
A investigação que se apresenta teve como principal intenção, conhecer a opinião dos docentes
sobre o papel da supervisão na promoção da mudança e da inovação na avaliação do desempenho
docente, para que a avaliação passe a ser um impulso para o necessário desenvolvimento profis-
sional. Resultou deste propósito um desenho metodológico que conforma um estudo exploratório
e descritivo sobre o que estes profissionais afirmam sobre esta temática. Os objetivos do estudo
foram: - identificar os aspetos positivos e negativos apontados pelos docentes (avaliados e avalia-
dores) relativamente ao atual sistema de avaliação do desempenho; - identificar quais os princípios
e as características da supervisão que os docentes consideram que podem promover a mudança e a
inovação na avaliação do desempenho; - analisar se um sistema de avaliação do desempenho assen-
te na supervisão tem implicações no desenvolvimento profissional dos docentes. As fontes de evi-
dência incluíram um questionário e seis entrevistas. Os resultados finais desta pesquisa permitem
concluir que para os docentes a avaliação do desempenho docente é inevitável e necessária. Pos-
suem uma visão clara do perfil que o supervisor/avaliador deve ter. Apontam como características
fundamentais desse perfil: a experiência profissional e a competência comunicativa, a capacidade
para implementar procedimentos de supervisão, a flexibilidade, a capacidade de relacionamento
interpessoal, ter conhecimentos para orientar e reorientar as práticas, ser dotado da capacidade para
incentivar a mudança e a inovação, ter conhecimentos científicos, pedagógicos e conhecimento da
152 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

cultura organizacional da escola, ter compreensão e formação especializada para o exercício do


cargo. Consideram que a avaliação do desempenho docente que atualmente encaram como sendo
essencialmente burocrática e que não introduz nenhuma mudança nas práticas docentes, através da
supervisão poderá passar a desenvolver-se numa perspetiva formativa que, eventualmente, possa
vir a ser transformadora da ação de educadores e de professores. Neste sentido, preconizam uma
supervisão clínica, reflexiva e dialógica e sugerem como práticas supervisoras a implementar o
diálogo/ação consistente com o desenvolvimento de estratégias relacionadas com os contextos, di-
nâmicas de trabalho colaborativo entre pares e entre supervisor/avaliador e supervisado/avaliado.

Palavras-chave: avaliação; desempenho docente; inovação; mudança; supervisão.

Abstract
The focus of this research was to obtain the perspectives of teachers on the role of supervision
in promoting change and innovation in teacher performance assessment, so that the assessment
becomes an impetus for the necessary professional development.
A methodological approach that shapes an exploratory and descriptive study was designed to
obtain professional thinking about this subject. The objectives of the study were: to identify the
positive and negative aspects pointed out by teachers (evaluated and evaluators) for the current
performance evaluation system; to identify the principles and characteristics of supervision that
teachers consider that can promote change and innovation in performance evaluation; to consider
whether a performance evaluation system based on supervision has implications for the professio-
nal development of teachers. The sources of evidence included a questionnaire and six interviews.
From the final data of this research we can conclude that for teachers the teacher performance
assessment is inevitable and necessary. Teachers have a clear perspective of the profile that the
supervisor / evaluator should have. They pointed out how fundamental characteristics of this role
are: the professional experience and communication skills, the ability to implement supervisory
procedures, flexibility, interpersonal skills, have knowledge to guide and reorient practices, be en-
dowed with the ability to encourage change and innovation, have scientific knowledge, pedagogical
knowledge and the school organizational culture, have understanding and specialized training for
the post of the year. They consider that the teacher performance assessment that is currently seen
in a bureaucratic perspective, has no significant effects on teaching practices so supervision needs
to develop a training perspective. In this sense, a clinical, reflective and dialogic supervision is poin-
ted out, practices to implement dialogue and supervision practices between peers, supervisors/
evaluators and supervisees/evaluated should be implemented according to contexts.

Keywords: evaluation; teacher performance; innovation; change; supervision.

Introdução
O estudo refere-se à supervisão promotora de mudança e inovação na avaliação do desempenho
docente (ADD).
Abordamos esta temática porque as questões da ADD e da valorização do desenvolvimento
profissional, aliadas a uma abordagem reflexiva e a um feedback do trabalho docente, têm estado,
efetivamente, na agenda política nacional e internacional, porquanto se reconhece a sua pertinência
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 153

para a qualidade do ensino e para a melhoria do sucesso dos alunos.


Santomé (2006) afirma que a avaliação de desempenho traz benefícios para avaliados e avalia-
dores: colaboradores, gestores (diretores, gerentes, chefes, coordenadores, supervisores, líderes) e
organizações. Todavia as decisões sobre a educação não são meramente técnicas e neutras e por
isso é necessário interrogar o que fazemos, ainda que isso implique colocar em questão as nossas
crenças e práticas.
Um professor que reflete sobre a sua ação pode resistir criticamente a um sistema de avaliação
do desempenho a que inevitavelmente está sujeito, mas que não tem que o penalizar, porque é
apontado como único responsável dos novos problemas que introduziram nas escolas novos pú-
blicos e novas desigualdades.
Como refere Cosme (2009: 17), não é possível investir numa reflexão credível acerca da pro-
fissão docente dissociada da Escola e, sobretudo, do modelo de educação escolar. Na realidade,
os professores são considerados agentes fulcrais e decisivos no processo de mutação (Canário,
2007), mas nem sempre com uma visão positiva do seu trabalho, porque se ignora, muitas vezes
que, como alertam Tardif e Lessard (2009: 10), a carga de trabalho dos professores é mais pesada
do que antes e, sobretudo, mais absorvente, mais exclusivista e mais exigente, enquanto os meios
e os financiamentos encolhem. Expande-se, assim, o campo de responsabilidades docentes, com
a consequente intensificação do seu trabalho (por vezes à custa da sua dedicação à sala de aula).
É imprescindível que na ADD se considerem os condicionalismos da profissão docente, uns
inerentes à própria instituição educativa e outros que provêm do seu exterior e que, ao constituírem
o contexto em que as práticas docentes se realizam, têm que ser tidos em conta na influência que,
por certo, vão ter nessas mesmas práticas (Morgado, 2005: 48).

Supervisão promotora de mudança e inovação na


avaliação do desempenho docente
Perante a constatação da inevitabilidade da avaliação do desempenho docente reconhecida por
docentes e investigadores especialistas (Hargreaves, 2003; Torrecilla, 2006; Flores, 2010; Gil, 2009;
Afonso, 2009; Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, OCDE,
2009; De Ketele, 2010; Inspeção Geral de Educação e Ciência, IGEC, 2012), esta pesquisa assenta
no nosso interesse em perceber como é que a supervisão pode ajudar a transformar o processo
avaliativo no sentido do desenvolvimento profissional dos docentes, para que possam passar a dar
respostas inovadoras aos problemas sociais cada vez mais complexos que se enfrentam diariamente
na escola.
Os sistemas educativos não têm acompanhado as modificações rápidas da sociedade. A sua
transformação tem sido lenta, pois, na generalidade mantém-se um sistema escolar tradicional
preparado para um mundo estático e que continua imutável na sua estrutura organizacional (agru-
pamentos de alunos por turmas, currículos definidos centralmente, distribuição desequilibrada do
tempo para professores e alunos).
É, hoje, exigido ao docente que mude a sua postura profissional, aperfeiçoe as suas práticas,
reflita em grupo, no sentido de criar dinâmicas pedagógicas diversificadas e diferenciadas que en-
volvam os alunos e as famílias na vida da escola, evitando as desistências e o abandono escolar,
penalizadoras para a organização escolar, num tempo em que os alunos escasseiam e os processos
de precariedade, de rutura social, económica, cultural e simbólica, afetaram os grupos populacio-
nais, cada vez mais diferenciados e mais alargados e que ao originarem um empobrecimento dos
cidadãos, confrontam, também, a escola e os seus profissionais com as suas próprias limitações e
154 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

paradoxos (Caetano, 1998; Conselho Nacional de Educação, CNE, 2012; IGEC, 2012; Preâmbulo
do Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro).
Pensamos que estando a supervisão presente nas múltiplas interacções sociais com os colegas, pais e di-
rectores; nas normas e os valores partilhados ou contestados (…) nas decisões e nas medidas políticas que constituem
o sistema político e estrutural de acordo com o qual as escolas têm de actuar (Kelchtermans, 2009: 76), será um
instrumento que fomentará nos docentes a vontade de mudar e de inovar, para que sejam ultrapas-
sadas as suas limitações e paradoxos e contribuirá para o seu sucesso e da sua escola.
Numa altura em que já está contemplado na legislação geral, que abrange todos os trabalhadores
portugueses, que a avaliação do desempenho é o primeiro critério a considerar para manutenção
do emprego e a literatura sustenta a inevitabilidade da avaliação do desempenho (Hargreaves, 2003;
Torrecilla 2006; Flores, 2010; Gil, 2009; Afonso, 2009; OCDE, 2009; De Ketele, 2010; IGEC,
2012) motiva-nos a vontade que a nossa investigação contribua para que os docentes reflitam e
consciencializem em que medida a supervisão pode favorecer o desenvolvimento profissional, ao
constituir-se como instrumento de mudança e inovação na AAD.
Move-nos, ainda, o desejo que a reflexividade crítica que a nossa investigação irá promover so-
bre que modelo (s) de avaliação do desempenho propõem os docentes, possa realmente introduzir
inovação, desenvolvimento e reconhecimento profissionais, atenuar algumas das desconfianças e
do desconforto que têm condicionado o processo avaliativo e, em simultâneo possa contribuir
para que estes professores determinem que não querem que as suas escolas sejam medíocres e as
transformem em exemplos de boas práticas.
Não podemos esquecer que a competência e a dedicação do corpo docente são a condição sine qua non de um
ensino de qualidade e que sem professores motivados e participativos, cujas atitudes estejam enquadradas nos proces-
sos de mudança e de inovação educativa, não pode haver uma qualidade substantiva do ensino e das aprendizagens
dos alunos. (Pacheco, 1994: n. p).
Nesta investigação quisemos conceder aos docentes um tempo e um espaço para que estes
profissionais consolidem o conhecimento que têm sobre o sistema de ADD atualmente em vigor;
encontrem respostas para que esse sistema avaliativo não seja um fator inibidor do desenvolvi-
mento pessoal e profissional; manifestem algumas inquietações que enquadram a problemática da
avaliação do seu desempenho (propostas por diversos investigadores, como Simões, 2002; Santos,
2004; Flores, 2010; Hadji, 2010): o que é avaliação do desempenho? Avalia-se o quê? O que se deve
avaliar? Como se avalia? Como se deve avaliar? Quem deve avaliar? Para que serve a avaliação?
Que efeitos resultam ou podem resultar de um sistema de avaliação docente?
Quisemos também, proporcionar oportunidade de reflexão sobre os princípios e estratégias
da supervisão que quando implementadas na ADD, podem contribuir para que o processo não
seja para o profissionalismo docente o elemento gerador de conflito, ambiguidade e ambivalência (Estrela,
2010:15).

Opções metodológicas
A nossa pesquisa enquadra-se num estudo de caso, de natureza qualitativa e descritiva. É um
estudo de caso, porque tem uma forte validade interna e uma fraca validade externa, o que impede
a generalização.
Neste estudo de caso a nossa finalidade é recolher o que de essencial e característico os docentes
têm a salientar sobre o que pode a supervisão mudar e inovar relativamente ao atual sistema de
ADD.
Colocamos três questões de investigação:
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 155

1.ª Q) O que destacam os docentes (educadores de infância e professores) como positivo e nega-
tivo no atual sistema de avaliação do desempenho dos docentes da educação pré-escolar e dos
ensinos básico e secundário?
2.ª Q) Os professores consideram que este sistema de avaliação do desempenho docente promove
o desenvolvimento profissional?
3.ª Q) Quais as práticas de supervisão que os docentes consideram que podem introduzir mudança
e inovação no processo de avaliação do desempenho?

Definimos os objetivos do estudo: - identificar os aspetos positivos e negativos apontados pelos


docentes (avaliados e avaliadores) relativamente ao atual sistema de ADD; - analisar a importância
e as implicações do sistema de ADD no desenvolvimento profissional; - identificar as práticas de
supervisão que os docentes consideram que podem promover a mudança e a inovação na AD.
Selecionamos o objeto da investigação: um Agrupamento de Escolas do concelho de Castelo
Branco onde, no ano letivo 2013/2014, exerciam funções 198 docentes de todos os níveis e ciclos
de ensino, desde a educação pré-escolar ao secundário, educação especial, cursos tecnológicos e
profissionais.
Elegemos como fontes de informação o inquérito realizado através de questionário e de entre-
vista com a finalidade de validar, conferir fiabilidade e credibilidade ao nosso estudo, pois, Lessar-
d-Hébert, Goyette e Boutin (2008: 25-26), referem que é sabido que é frequentemente útil, senão mesmo
necessário, recorrer a diferentes técnicas numa mesma investigação.
Caracterizamos a amostra conforme mostram as tabelas 1 e 2. Na tabela 1, encontram-se ins-
critos os dados relativos aos seis docentes entrevistados. Na tabela 2, inserem-se as informações
referentes aos sessenta sujeitos inquiridos por questionário.

Tabela 1 – Caracterização dos sujeitos entrevistados

N.º de Entrevistados Grupo de Cargos desempenhados Observação Código


(condição fase à profissão recrutamento de aulas
e ao processo de avaliação) e departamento Observou Foi
observado
1 Docente avaliado, do ensino 410 - filosofia Coordenador do ensino secundário Não Não S1
secundário, com 51 anos, do grupo disciplinar de filosofia
com 26 anos de serviço e diretor de turma
1 Docente avaliado, do 3.º 500 - matemática Diretor de turma do Não Sim S2
ciclo e secundário, com 42 3º ciclo e secundário
anos, com 21 anos de serviço do grupo disciplinar
1 Docente avaliado, 510 - físico-química Coordenador dos diretores de Não Não S3
do 3º ciclo e secundário, turma do ensino profissional
com 49 anos de idade, e diretor de turma do 3º ciclo
com 20 anos de serviço e secundário do grupo disciplinar
1 Docente avaliado, do 2º 910 - educação Nenhum Não Sim S4
ciclo do ensino básico, com especial
52 anos, com 30 anos de serviço
1 Docente avaliado, educador 100 - educação pré- Avaliador externo Sim Não S5
de infância, com 55 anos, -escolar
com 36 anos de serviço
1 Docente avaliado do 3º 300 - português Avaliador externo. Coordenador Sim Não S6
ciclo e secundário, 54 anos, do departamento de línguas do 3º
com 31 anos de serviço ciclo e secundário do grupo
disciplinar de português
156 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

Tabela 2 - Caracterização da amostra dos sujeitos inquiridos por questionário

Questões Opções Nº sujeitos %


Idade Menos de 30 0 0%
30 a 40 3 5%
41 a 50 29 48%
Mais de 50 28 47%

Género Masculino 14 23%


Feminino 46 77%

Habilitações Académicas Bacharelato 1 2%


Licenciatura 42 70%
Mestrado 17 28%
Doutoramento 0 0%

Situação Profissional (2013/2014) Contratado 3 5%


QZP 9 15%
QE 48 80%

Tempo de serviço 1 a 10 4 7%
em 31 de Agosto de 2013 11 a 20 13 22%
21 a 30 34 57%
Mais de 30 9 15%

Grupo de recrutamento Educação Pré-Escolar 16 27%


1º Ciclo 9 15%
Educação Especial 11 18%
Línguas 7 12%
Matemática e Ciências 9 15%
Ciências S. e Humanas 2 3%
Expressões 6 10%

Cargo (s) que desempenha Nenhum 29 48%


Coordenador de Departamento 10 17%
Diretor de Turma 5 8%
Coordenador dos Diretores de Turma 2 3%
Membro da Direção da Escola 3 5%
Membro do Conselho Geral 1 2%
Supervisor de estágio 1 2%
Outro. Qual? 9 15%

Condição, no ano letivo Docente supervisor/avaliador: Sim 9 15%


2013/2014, relativamente Não 51 85%
ao processo de avaliação Fui avaliador interno: Sim 9 15%
do desempenho Não 51 85%
Fui supervisor/avaliador externo: Sim 0 0%
Não 60 100%
Docente avaliado: Sim 34 57%
Não 26 43%
Fui avaliado sem observação de aulas: Sim 29 48%
Não 31 52%
Fui avaliado com observação de aulas: Sim 2 3%
Não 58 97%

Circunstâncias em que Imposição legislação


ocorreu a observação (docentes nos 2º e 4º
de aulas escalões da carreira): Sim 4 7%
Não 56 93%
Por opção: Sim 6 10%
Não 54 90%
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 157

Na fase de tratamento dos dados, considerando sempre os objetivos da investigação, efetuamos


a categorização das informações organizando-as em dezassete categorias e em cinquenta e cinco
unidades de contexto que procuramos que traduzissem o mais fielmente possível os dados obti-
dos no âmbito dos cinco domínios que definimos: Domínio A) caracterização do atual sistema
de ADD; Domínio B) perfil do avaliador/supervisor; Domínio C) observação de aulas; Domínio
D) caracterização das propostas pessoais dos docentes sobre o papel e o contributo do avaliador/
supervisor para o desenvolvimento profissional e a melhoria da prática educativa; Domínio E)
práticas de supervisão mais valorizadas pelos docentes como promotoras de mudança e a inovação
na ADD.

Apresentação, análise e discussão dos resultados


A análise reflexiva dos resultados realizou-se à luz das questões de investigação.
Quanto à questão 1: o que destacam os docentes como positivo e negativo no atual sistema de
avaliação do desempenho dos docentes da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário?
Podemos referir que na caracterização do atual sistema de avaliação, os docentes: centraram
mais as suas apreciações nos fatores relativos ao contexto do que nos fatores relativos ao professor,
aos alunos e ao próprio sistema educativo/sistema de ADD. Foram referenciados pelos docentes
os fatores de contexto referidos por Vieira e Moreira (2011: 13-14) cultura institucional: hierarquização
de papéis, regulamentação excessiva, burocratização do trabalho do professor, prestação de contas.
Os aspetos considerados positivos foram: a necessidade e a inevitabilidade da ADD (60%);
a importância da avaliação no percurso profissional (43%); a implementação da ADD não per-
turbou, por se ter estabelecido uma boa comunicação entre os intervenientes e os instrumentos de
avaliação terem sido construídos em equipa (95%); o processo avaliativo quando reflexivo promove
a pesquisa e o conhecimento, a informação e a troca de experiências (72%).
Foram identificados como aspetos negativos: o sistema de ADD é burocrático/ administrativo
e não tem implicado alterações significativas nas práticas docentes, uma vez que 75% dos inqui-
ridos consideram que se assiste à produção de um elevado número de documentos considerados
necessários para efetivar o sistema de avaliação que se enquadra na imagem burocrática da escola
que Costa (2003) intitula de obsessão pelos documentos escritos. Esta constatação é reafirmada por
diversos investigadores, designadamente Barroso (2005); Simão (2007); Conselho Científico para a
Avaliação de Professores (2008); Formosinho e Machado (2009); Tardif e Lessard (2009); OCDE
(2009); Apple (2010). Todavia contraria o disposto no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 41/2012, de
21 de fevereiro, onde se encontra preconiza uma ADD assente na simplicidade, na desburocratização
dos processos e na sua utilidade, tendo em vista a revitalização cultural das escolas e uma maior responsabilidade
profissional.
Verificamos que 57% dos docentes apontaram, ainda, como aspeto negativo o fato de se senti-
rem pouco envolvidos e esclarecidos sobre o processo e os procedimentos da ADD.
Existem alguns constrangimentos face à temática da avaliação do desempenho docente, expres-
sos em duas evidências: a grande dificuldade que tivemos em conseguir que os docentes se pronun-
ciassem sobre o tema, apesar de afirmarem que essa é uma discussão importante; o grande número
de respostas assinaladas no inquérito por questionário com o valor 0 da escala de Likert, equiva-
lente à expressão “não concordo, nem discordo”. Quanto a estas evidências os docentes (57%)
afirmam que o fato de se “discutir a implementação da avaliação docente não irá alterar nada” e
que se sentem “pouco envolvidos e esclarecidos sobre o processo e os procedimentos da ADD”.
Em relação à Questão 2 – Os professores consideram que este sistema de avaliação do desem-
158 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

penho docente promove o desenvolvimento profissional?


A concordância não foi muito considerável (42%).
Este fato indicia que, para a maioria dos docentes, ainda não é muito evidente que a ADD, tal
como tem vindo a ser concretizada, contribua efetivamente para o desenvolvimento profissional.
As respostas mais expressivas (64%) defendem que a formação especializada dos supervisores/
avaliadores permite fomentar o desenvolvimento profissional.
Foram 68% os sujeitos que concordaram que o processo de avaliação implica procedimentos de
supervisão com vista ao desenvolvimento profissional, à mudança e à inovação na prática docente.
Este posicionamento dos inquiridos pode indicar que os docentes acreditam que mediante as pro-
postas de mudança que apresentaram e que com a implementação das práticas supervisoras suge-
ridas o processo avaliativo pode efetivamente passar a promover o desenvolvimento profissional.
Relativamente à Questão 3 – Quais as práticas de supervisão que os docentes consideram que
podem introduzir mudança e inovação no processo de avaliação do desempenho docente?
As práticas de supervisão propostas pelos docentes encontram eco na literatura que consulta-
mos e referenciamos: - disponibilidade de avaliadores externos para todos os docentes sujeitos a
avaliação (Duke e Stiggins, (1990); Estrela, (2010); Nisa, (2013); Pacheco, (2009); - instituir uma
prática reflexiva como meio de procura de soluções (Alarcão, (1996); Nóvoa, (1995); Schön, (1995);
- valorizar a formação do docente e o trabalho realizado (Alarcão e Tavares, (2007); Alarcão e Rol-
dão, (2008); CNE, (2012); Estrela, (2010); Formosinho e Machado, (2010); Ruivo, (2009); Santos,
(2004); - cooperação entre os agentes envolvidos, trabalho colaborativo, partilha de conhecimen-
tos, experiências e saberes, planificação de atividades e definição de estratégias em conjunto com
o docente que se encontra em avaliação (Alarcão, (1996); Alarcão e Tavares, (2007); Apple, (2010);
Barroso, (2005); Clímaco, (2005); Flores, (2010); Formosinho, (2002); Gonçalves, (2006); Lima,
(2002); Roldão, (2007); Ruivo, (2009); Santos, (2004); - fomento da autoavaliação e da regulação
do processo avaliativo (Alarcão e Tavares, (2007); Bolivar, (2003); Clímaco, (2005); Correia, (2002);
Formosinho, (2002); Martins, Candeias; Costa Martins, I.; Candeias, I. e Costa, N., (2010); Nóvoa,
(1995); Santomé, (2006).

Considerações finais
O desenvolvimento desta pesquisa permitiu concluir que os inquiridos consideram a avaliação
do desempenho inevitável e necessária. Identificam os aspetos positivos e negativos do atual siste-
ma avaliativo. Classificam o processo avaliativo como burocrático, sem alterações significativas nas
práticas docentes. Concordam que a rotina, os interesses de vária ordem e o comodismo ocupam
as práticas educativas, impedindo o desenvolvimento profissional. A maioria dos sujeitos, 52%, não
concorda com a observação de aulas realizada pelos colegas, por entenderem que não são detento-
res dos requisitos que devem constituir o perfil do supervisor/avaliador. Têm uma perspetiva clara
sobre o perfil do supervisor/avaliador e apontam como características desse perfil: - experiência
profissional e competência comunicativa; capacidade para implementar procedimentos de super-
visão (95%); - capacidade de relacionamento interpessoal e flexibilidade (94%); - conhecimentos
para orientar e reorientar as práticas (93%); - ser dotado da capacidade para incentivar a mudança
e a inovação; conhecimentos científicos e pedagógicos; conhecimento da cultura organizacional
da escola (92%); - compreensão (90%); - formação especializada para o exercício do cargo (88%).
Propõem como alterações e medidas que devem ser implementadas para tornar o processo ava-
liativo mais formativo: - existir um maior cuidado na seleção dos pares que efetuam a observação
de aulas; - implementar uma supervisão clínica, reflexiva e dialógica que possa fomentar o desen-
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 159

volvimento profissional.
Apontam como fatores inibidores da implementação de práticas supervisoras: - falta de dispo-
nibilidade, de motivação e de interesse dos docentes (73%); falta de articulação nos horários (70%).
Podemos concluir que os docentes reconhecem que: precisam de mudar e inovar, incluindo os
profissionais mais experientes; o processo de avaliação implica procedimentos de supervisão, com
vista ao desenvolvimento profissional, à mudança e à inovação na prática docente; uma cultura
avaliativa da escola no que respeita ao desempenho docente implementada com o envolvimento
de todos os agentes educativos e baseada na prática de supervisão reflexiva, contribuirá para o de-
senvolvimento profissional, para a mudança e inovação que poderão elevar a qualidade e para que
avaliar signifique ser sujeito e não sujeitar-se (Alves e Machado, 2010: 8).

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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 161

(TOOLS OF MIND) FERRAMENTAS DA


MENTE: PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PRÉ-
ESCOLAR, DE INSPIRAÇÃO EM VYGOTSKY
Ana Paula Couceiro Figueira (apcouceiro@fpce.uc.pt)
Faculdade de Psicologia e de Ciências de Educação da Universidade de Coimbra

Resumo
Pretende divulgar-se um programa de intervenção, potenciador da autorregulação, de inspiração
Vygotskiana – Tools of Mind, americano (Bodrova & Leong, 2001), do Metropolitan State College,
Denver, USA, mas já em projeto a adaptação portuguesa, com base na obra dos fundamentos fer-
ramentas da mente (Figueira, Cró & Lopes, 2014).
O Tools of the Mind é um programa para crianças em idade pré-escolar, que fornece bases sólidas
para o sucesso escolar, através da promoção da aprendizagem intencional e da autorregulação. As
evidências revelam que o Programa tem um impacto significativo na autorregulação das crianças
em idade pré-escolar, sugerindo, ainda, ganhos ao nível da execução de tarefas de leitura e escrita
precoces e de matemática.
A estrutura do programa baseia-se em Vygotsky, segundo o qual os seres humanos podem ser
observados em termos dos seus desempenhos reais e potenciais (avaliação da zona proximal de
desenvolvimento), havendo a possibilidade de estimular e alargar as suas capacidades e competên-
cias, recorrendo a ferramentas/estratégias de suporte (Scaffolding, os andaimes da aprendizagem).
Estas ferramentas funcionam como auxiliares da mente e do corpo, e podem ser ensinadas através
de um conjunto de atividades, as atividades principais. Nesta perspetiva, as crianças são fortemente
controladas pelo ambiente até aprenderem a usar as suas ferramentas mentais; uma vez ensinadas,
tornam-se capazes e responsáveis pela sua própria aprendizagem, podendo intencionalmente e
objetivamente transformar o seu comportamento e os seus estados físicos, sociais e emocionais.
A atividade principal é aquela que deve ocupar grande parte do tempo do indivíduo em contexto
escolar, não excedendo os limites da criança.
162 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

O Tools of Mind foi premiado, pela UNESCO, em 2001, como o primeiro programa educativo
americano para a primeira infância.

Palavras chave: idade pré-escolar; intervenção; estratégias/ferramentas; cognição.

Abstract
Wants to present an intervention program, enhancing the self-regulation, of the Vygotsky ins-
piration - Tools of Mind, American (Bodrova & Leong, 2001), from Metropolitan State College,
Denver, USA, but already project process of adapting Portuguese, from the book ferramentas da
mente (Figueira, Cró & Lopes, 2014).
The Tools of the Mind is a program for children in preschool, which provides a solid founda-
tion for school success through the promotion of intentional learning and self-regulation. The evi-
dence shows that the program has a significant impact on self-regulation of children of preschool
age, suggesting also gains in implementation of reading and early writing and math tasks.
The program structure is based on Vygotsky, according to which humans can be observed in
terms of their actual performance and potential (evaluation of zone of proximal development),
with the possibility to stimulate and extend their abilities and skills, using the tools/support strate-
gies (Scaffolding). These tools are auxiliary to the mind and body, and can be taught through a set
of activities- main activities. In this perspective, children are strongly controlled by the environ-
ment until they learn to use their mental tools; once taught, become capable and responsible for
their own learning and can intentionally and objectively transform their behavior and their physical
states, social and emotional.
The main activity is one that must occupy much of the individual’s time in schools, not excee-
ding the child’s limits.
The Tools of Mind was awarded by UNESCO in 2001 as the first American educational pro-
gram for early childhood.

Keywords: pre-school age; intervention; strategies/tools; cognition.

Introdução
O título, ferramentas da mente, reflete o objetivo, sensibilizando os educadores/professores
para o desenvolvimento e a aprendizagem de recursos mentais nas crianças. “As ferramentas men-
tais são ideias que aprendemos dos e com os outros, transmitidas e modificadas por cada um de
nós” (Vygotsky, 1978, p.65). Vygotsky, e os seus seguidores, proporcionam-nos fundamentos po-
derosos que são, posteriormente, operacionalizados e materializados num programa, por Bodrova
e Leong. (data?)
A obra que serve de base ao programa, com os seus materiais, atividades e tarefas, está orga-
nizada em espiral, em termos de encadeamento e grau de complexidade, em que os conteúdos se
articulam progressivamente. Na secção I (capítulos de 1 a 3), introduzem-se as principais ideias de
Vygotsky, comparando-as com outras perspetivas, familiares aos educadores de crianças pequenas
e aos estudantes de Psicologia. O capítulo 2 contém uma secção, em que é descrita a abordagem
de Vygotsky para a educação especial. A secção II do livro (capítulos 4, 5, 6 e 7) revisita os pontos
referidos na primeira secção, tentado ensaiar aplicações aos processos de ensino/aprendizagem. A
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 163

secção II descreve estratégias gerais de abordagem do ensino/aprendizagem e táticas específicas


que podem ser utilizadas neste processo. A secção III (capítulos 8 a 14) é, talvez, a mais detalhada,
proporcionando exemplos de aplicações específicas. Esta obra cobre os aspetos específicos do
desenvolvimento das crianças de várias idades, desde bebés a crianças do primeiro ciclo do ensino
básico. Existem capítulos diferentes para especificar a natureza da aprendizagem e ensino que as
diferentes idades desenvolvimentais requerem ou apresentam. Os exemplos de práticas de sala de
aula ou de atividades, baseadas em Vygotsky, são desenvolvidas e apresentadas em três capítulos
separados, de acordo com as idades das crianças. O livro termina com um capítulo especial sobre
avaliação dinâmica, uma estratégia com o carimbo de Vygotsky.
Os exemplos de atividades desta obra são o resultado de 15 anos de colaboração dos autores
originais com infantários, jardins de infância, e professores dos primeiro e segundo ciclos de todos
os Estados Unidos. Igualmente, com base em programas e projetos, desde o Head Start às escolas
públicas de educação pré-escolar, programas de educação pré-K apoiados pelo Estado, escolas pri-
vadas, serviços de cuidados da infância, bem como programas federais de apoio à leitura. A grande
maioria dos programas é dirigida a crianças em risco. As salas de aula ou atividades também são
de vários tipos, desde grupos tradicionais a grupos de várias idades (combinando crianças de 3 e 4
anos de idade, mas também jardins de infância, primeiro e segundo ciclos), de diversas filosofias e
filiações. Por exemplo, em algumas salas são utilizadas dinâmicas tradicionais de ensino da leitura
e em outras a abordagem global da linguagem. Algumas das salas de aula proporcionam educação
bilingue.
Um dos aspetos a realçar, do trabalho direto com os educadores, é o seu feedback, relativo ao
grau de satisfação com o funcionamento das propostas sob esta orientação, em todos os ambientes
de sala de aula descritos. “Vygotsky ajuda-nos, fornecendo mais alternativas para a nossa ação”
(Bodrova & Leong, 2001, p. 23). “Este autor ajuda a vermo-nos, enquanto parceiros das crian-
ças na grande jornada da aprendizagem, mais do que como supervisor ou apoiante” (Bodrova &
Leong, 2001, p. 57). O trabalho com os educadores/professores, nas diversas salas de aula, tem-se
demonstrado estimulante, reforçador e emocionante.
O livro está recheado de exemplos, tentando representar todas as faixas etárias, funcionando
mesmo como um diário fundamentado.

1. Arquitetura da obra
Temos, na Secção I, A abordagem de Vygotsky: a teoria histórico-cultural do desenvolvimento,
com o Capítulo 1, Introdução à abordagem Vygotskiana, o Capítulo 2, Aquisição de ferramentas
mentais e funções mentais superiores, e o Capítulo 3, A perspetiva de Vygotsky e outras teorias do
desenvolvimento e da aprendizagem.
Na Secção II, Estratégias de desenvolvimento e de aprendizagem, temos o Capítulo 4, A zona
de desenvolvimento proximal, o Capítulo 5, Tática: utilização de mediadores, o Capítulo 6, Tática:
utilização da linguagem, e o Capítulo 7, Tática: utilização de atividades partilhadas.
A Secção III, Aplicação da abordagem Vygotskiana ao desenvolvimento e à aprendizagem, na
primeira infância, apresenta o Capítulo 8, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplish-
ments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), o Capítulo
9, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), o Capí-
tulo 10, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal
(Leading Activity): crianças em idade de jardim de infância, o Capítulo 11, Suportes às Realizações
Desenvolvimentais: crianças em idade de jardim de infância, o Capítulo 12, Realizações Desenvol-
164 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI

vimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças em idade


das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), o Capítulo 13, Suportes às Realizações De-
senvolvimentais: crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), e o Capí-
tulo 14, Avaliação Dinâmica: aplicação da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP).
A obra termina com o Epílogo, um Glossário e as Referências bibliográficas.

1.1 Estrutura mais específica

Na Secção I, A abordagem de Vygotsky: a teoria histórico-cultural do desenvolvimento, no


Capítulo 1, Introdução à perspetiva de Vygotsky, aborda-se e concetualiza-se ferramentas mentais,
apresentando-se argumentos sobre o porque é que as ferramentas da mente são importantes. Re-
senha-se a história da abordagem de Vygotsky, a vida de Vygotsky, os seus contemporâneos e os
Pós-Vygotskianos: discípulos e seguidores russos. Ainda, equaciona-se a investigação e aplicação da
teoria de Vygotsky no Ocidente, desenvolve-se os princípios da Psicologia e Educação, na perspe-
tiva de Vygotsky, ou seja, aborda-se a construção do conhecimento, a importância do contexto so-
cial, a relação entre aprendizagem e desenvolvimento e o papel da linguagem no desenvolvimento.
Existe, sempre, para cada capítulo, a indicação de leituras adicionais.
No Capítulo 2, Aquisição de ferramentas mentais e funções mentais superiores, aborda-se o
objetivo das ferramentas, o conceito de amplificação das capacidades mentais, o domínio com-
portamental, a aquisição da independência, a aquisição do nível mais elevado de desenvolvimento.
Igualmente, desenvolve-se o processo linguagem, enquanto ferramenta universal, o conceito de
funções mentais superiores, as caraterísticas das funções mentais inferiores e as caraterísticas das
funções mentais superiores, o desenvolvimento das funções mentais superiores, tendo por base as
funções mentais inferiores. É, ainda, enfatizada a influência do contexto cultural, o processo de
transição das funções partilhadas para as individuais, as diferenças individuais no desenvolvimen-
to das funções mentais, operacionalizando-se as funções mentais inferiores e as funções mentais
superiores. Aborda-se, ainda, a compensação dos deficit no desenvolvimento das funções mentais
superiores e inferiores: A abordagem de Vygotsky na Educação Especial, realçando-se a natureza
social e cultural das incapacidades (deficiências), a mediação como forma de remediação, ou seja, a
aplicação da teoria de Vygotsky à educação especial.
O Capítulo 3, A perspetiva de Vygotsky e outras teorias do desenvolvimento e da aprendizagem,
contempla a perspetiva construtivista Piagetiana, analisando-se as semelhanças e as diferenças, as
teorias comportamentalistas, referindo-se as semelhanças e as diferenças, a teoria do processamen-
to da informação, semelhanças e diferenças e, igualmente, a perspetiva de Montessori, bem como
as semelhanças e diferenças, não se deixando de registar as críticas à abordagem Vygotskiana.
Na Secção II, Estratégias de desenvolvimento e de aprendizagem, no Capítulo 4, intitulado A
zona de desenvolvimento proximal, define-se, o que é marca de Vygotsky, a zona de desenvolvi-
mento proximal (ZDP), abordando-se o desempenho independente/autónomo e o desempenho
com ajudas, a dinâmica da zona de desenvolvimento proximal, a utilização da ZDP na análise do
desenvolvimento, as implicações para o ensino e para a aprendizagem, o desempenho com ajudas,
a avaliação das capacidades da criança (children’s abilities), concetualizando-se as práticas desenvolvi-
mentais adequadas, a instrumentalidade da ZDP na promoção do desenvolvimento, a amplificação
(amplification), o desempenho ou realização (performance) e competência (competence) e os andaimes
(scaffolding). Ainda, realça-se a ideia de zona de desenvolvimento proximal enquanto zona em cons-
trução, as caraterísticas das situações estruturantes e a dinâmica dos andaimes na ZDP.
No Capítulo 5, desenvolve-se a estratégia utilização de mediadores, enfatizando-se o mediador
A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 165

como ferramenta mental, ou seja, a função dos mediadores, a trajetória desenvolvimental dos me-
diadores, a mediação de comportamentos sociais e emocionais e a mediação externa da cognição.
Desenvolvem-se os processos perceção, atenção, memória e pensamento e operacionaliza-se a uti-
lização de mediadores na sala de aula, os mediadores como andaimes ou ajudas, referindo-se o que
os mediadores não são, dando-se exemplos da utilização de mediadores externos na sala de aula,
aventando-se orientações para a utilização de mediadores externos.
Quanto ao Capítulo 6, Tática: utilização da linguagem, analisa-se a linguagem como ferramenta
cultural, as funções do discurso, focando-se a trajetória desenvolvimental do discurso e a emergên-
cia do discurso e do pensamento, concetualizando-se o discurso privado (private speech), o discurso
interno (inner speech) e o pensamento verbal. Ainda, aborda-se o desenvolvimento do significado, o
desenvolvimento do discurso escrito, o como a escrita promove o pensamento, a utilização da lin-
guagem na sala de aula, enfatizando-se a necessidade de apoiar o desenvolvimento do discurso pri-
vado, de apoiar o desenvolvimento do significado e o apoiar o desenvolvimento do discurso escrito.
O Capítulo 7, Tática: utilização de atividades partilhadas, desenvolve a interação nas atividades
partilhadas, o como as atividades partilhadas promovem a aprendizagem, operacionalizando-se ati-
vidades partilhadas, regulação por outros (other-regulation) e autorregulação (self-regulation). Salienta-
se a importância da regulação externa/por outros, a utilização da regulação externa para promoção
da autorregulação, a função do professor/educador na atividade partilhada, o professor/educador
enquanto parceiro, o professor/educador enquanto organizador/planificador e a função dos pares
na atividade partilhada.
Por seu turno, a Secção III, Aplicação da perspetiva Vygotskiana ao desenvolvimento e à apren-
dizagem, na primeira infância, no Capítulo 8, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Ac-
complishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers),
define-se o conceito de realização desenvolvimental, realçando-se a situação social de desenvolvi-
mento, o papel do contexto ou situação social no desenvolvimento da criança. Define-se atividade
e analisa-se como as crianças começam a envolver-se na atividade principal, focando as realizações
desenvolvimentais dos recém-nascidos, a vinculação, as ações sensório-motoras orientadas para o
objeto, as interações emocionais com os cuidadores enquanto atividade principal dos recém-nasci-
dos, a importância das interações ou trocas emocionais, as primeiras iniciativas da criança, as inte-
rações com os objetos, as primeiras palavras e ações e as realizações desenvolvimentais dos bebés.
Ainda, carateriza-se o pensamento sensório-motor, a emergência do autoconceito, analisando-se a
atividade principal dos bebés: atividade orientada para o objeto e o papel da mediação do adulto
na atividade orientada para o objeto, a atividade instrumental, o papel da linguagem na atividade
orientada para o objeto, a reestruturação da perceção através da atividade orientada para o objeto
e a substituição simbólica.
No Capítulo 9, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças dos 0 aos 3 anos (infants e
toddlers), salienta-se o como auxiliar as crianças, do nascimento aos 6 meses, enfatizando-se o su-
porte (scaffolding) à comunicação emocional, o suporte (scaffolding) às primeiras iniciativas da criança.
Igualmente, como auxiliar as crianças, dos 6 aos 12 meses de idade, enfatizando-se o suporte (sca-
ffolding) nas interações com os objetos, o suporte (scaffolding) das primeiras ações. Ainda, como au-
xiliar as crianças, dos 12 aos 24 meses de idade, enfatizando-se o suporte (scaffolding) nas atividades
orientadas para os objetos, o suporte da atividade instrumental, o como auxiliar o desenvolvimento
de conceitos sensório-motores, como incentivar a aquisição de padrões sensoriais, como apoiar
as substituições simbólicas. Por fim, existe referência a como auxiliar as crianças, dos 24 aos 36
meses de idade: transição do infantário para o jardim de infância, ao como apoiar a emergência do
autoconceito dos bebés, ao como apoiar o surgimento das brincadeiras de faz-de-conta e ao como
apoiar o início da autorregulação.
No Capítulo 10, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade
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Principal (Leading Activity): crianças em idade de jardim de infância, desenvolve-se as realizações


desenvolvimentais, a função simbólica, relatando-se o início da ação no plano mental interno, ca-
raterizando a imaginação, a integração das emoções e pensamento, o desenvolvimento da autor-
regulação, o jogo do faz-de-conta enquanto atividade principal. Aborda-se as conceções de jogo/
brincar em Psicologia e em Educação, realçando-se o brincar na abordagem Vygotskyana, o como
o brincar/o jogo influencia o desenvolvimento, equacionando-se a criação da zona de desenvolvi-
mento proximal. É, ainda, focado como facilitar a separação entre pensamento e ação e objetos,
como facilitar o desenvolvimento da autorregulação, o impacto na motivação da criança e o como
se pode facilitar a descentração cognitiva. Descreve-se a trajetória desenvolvimental do jogar, o
jogo nas crianças pequenas, o jogo nas crianças em idade de jardim de infância, as atividades que
não jogos, no jardim de infância, os jogos com regras, as atividades produtivas, as atividades pré
académicas, as atividades motoras e a preparação escolar.
No Capítulo 11, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade de jardim de
infância, salienta-se a necessidade de apoiar o jogo de faz-de-conta enquanto atividade principal,
apresentando-se as caraterísticas do jogo maduro (mature), equacionam-se os níveis do brincar en-
contrados nas salas do jardim de infância. Ainda, aventam-se formas de enriquecimento do brin-
car/jogo e como apoiar outras atividades em salas do jardim de infância. Definem-se os jogos com
regras, as atividades produtivas, os comportamentos pré académicos, as atividades motoras e o
suporte à preparação escolar.
O Capítulo 12, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Prin-
cipal (Leading Activity): crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico),
analisa a escolarização formal e o desenvolvimento, na educação básica, as realizações desenvolvi-
mentais, da criança na escola do 1º ciclo do ensino básico. Aborda-se o início do raciocínio teórico/
abstrato (theoretical), a emergência das funções mentais superiores, a motivação para aprender, a
atividade de aprendizagem enquanto atividade principal, definindo-se atividade de aprendizagem,
tarefa de aprendizagem, ações de aprendizagem, ação de controlo ou feedback, autorreflexão e a
atividade de aprendizagem, na educação básica.
No Capítulo 13, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade das aprendi-
zagens básicas (1º ciclo do ensino básico), enfatiza-se o apoiar os elementos críticos da atividade
de aprendizagem, a utilização de modelos para auxiliar as crianças a compreender as ações gene-
ralizadas, as formas de auxiliar as crianças a compreender o objetivo da aprendizagem a partir da
atividade, o como auxiliar as crianças a compreender o conceito de normas e a aprender como as
utilizar enquanto orientadoras da aprendizagem e o como auxiliar a criar formas de promover a
reflexão. Caracteriza-se a formação passo-a-passo, como forma de apoio ao desenvolvimento e à
aprendizagem, enfatizando-se a importância da base de orientação da ação e a necessidade de ação
materializada. Ainda, concetualiza-se a automatização das ações mentais, fazendo-se a distinção en-
tre erros naturais e erros evitáveis. Neste capítulo, descreve-se, ainda, a escrita apoiada – a aplicação
da educação passo-a-passo à escrita, aventando-se formas de auxiliar as crianças do ensino básico
que não alcançaram realizações desenvolvimentais das idades de jardim de infância. Apontam-se
alguns princípios como: a criança que pratica deve ganhar, o jogo deve ser autocorrigido, o jogo
deve mudar à medida que mudam as capacidades da criança.
Por último, o Capítulo 14, Avaliação Dinâmica: aplicação da Zona de Desenvolvimento Proxi-
mal (ZDP), é totalmente dedicado a um constructo que é marca da perspetiva Vygotskiana, a avalia-
ção dinâmica, equacionando-se a avaliação tradicional v/s avaliação dinâmica, concetualizando-as
e caracterizando-as. Desenvolve-se, ainda, as aplicações pós-Vygotskianas da avaliação dinâmica,
exemplificando-se a avaliação dinâmica na sala de aula, enfatizando-se a avaliação dinâmica enquan-
to uma ferramenta para o ensino/instrução.
A obra termina com um Glossário bastante clarificador de toda a perspetiva de Vygotsky.
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Considerações finais
O Tools of Mind pretende ser um manual didático, um orientador, fundamentado, de sugestões,
ilustrativo, para educadores, professores, psicólogos, pais, educadores, em geral, sobre a educação
de infância, à luz de uma grande referência, Vygotsky. É a base de fundamentação de um programa
estruturado de educação de infância com vasta implementação e avaliação. Sem expressão em Por-
tugal, o programa Tools of Mind é, tanto quanto o High Scope Curriculum, de inspiração Piagetiana,
dos programas para a educação de infância mais implementados mundialmente.
Ao nível dos jardins de infância da rede pública em Portugal, as orientações epistemológicas
assentam numa linha claramente piagetiana, pese embora a autonomia dos educadores quanto à
sua implementação. Ou seja, são orientações, não prescrições, normativos ou currículo formal,
estruturado. Gaspar (1991) revela que os educadores optam, fundamentalmente, na sua ação, por
uma perspetiva eclética, sem uma designação ou categorização específica. Todavia, ao nível pri-
vado, é possível encontrar no contexto português orientações pedagógicas, desenvolvimentais ou
curriculares várias, desde João de Deus, Montessori, Froebel, Freinet, etc (Fenprof, sd). De facto,
as Orientações Curriculares não invalidam a existência de diferentes modelos curriculares exis-
tentes na tradição pedagógica portuguesa. Não seguindo textualmente o curriculum High Scope,
ou a Criança em Ação, tradução portuguesa, da fundação Calouste Gulbenkian (Hohmann, Ba-
nett, & Weikart, 1995), as Orientações Curriculares para a educação de infância, do Ministério da
Educação (ME, sd), plasmam claramente esta inspiração. A orientação Vygotsiana, ou o currículo
Tools of Mind (Ferramentas da Mente), seu representante, não será pensada enquanto alternativa,
oposta, mas sugerida como complementar. Pode contribuir para repensar a questão da organização
dos grupos, homogéneos/heterogéneos, em termos de desenvolvimento, pela sua conceção de
crescimento enquanto circunstanciado pelos conflitos socio-cognitivos, e do seu corolário Zona
de Desenvolvimento potencial. Ainda, contribuir para repensar uma atitude educacional mais re-
flexiva e promotora de ação por parte de todos os participantes das atividades educativas, sendo
o desenvolvimento das funções executivas, como a planificação, a reflexão, o pensamento flexível,
a avaliação, de todos a sua mais-valia. O programa, ou curriculum, fundamentado sob esta visão,
orienta os educadores, permitindo-lhe uma maior disponibilidade na ação direta com as crianças.

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