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por
Martinho Lutero
Daí sucede que essa autoridade que muitos entendem como afirmação,
deve ser compreendida de forma negativa, ou seja: Cristo não se julgou
igual a Deus, isso é, não quis ser igual, como acontece com aqueles que
o tomam para si, que dizem a Deus: "Se não deres (como diz
Bernardo) a mim a tua glória, eu mesmo dela me apossarei" A frase
"não julgou como usurpação o ser igual a Deus" não deve ser
entendida como afirmativa no sentido de que ele não julgou ser igual a
Deus; isto é: não teria julgado usurpação ser igual a Deus: porque esta
sentença não faz sentido adequado, pois fala de Cristo como pessoa
humana. O que o apóstolo quer é que cada cristão se torne servo do
outro, a exemplo de Cristo. E se alguém possui alguma sabedoria ou
justiça ou poder, através do que ele poderia superar os outros e gloriar-
se como se fosse deiforme, esse não deve tomar isto como seu, mas
atribuí-lo a Deus. De modo geral, deve despir-se dessas qualidades e
comportar-se como um daqueles que não as têm, para que cada um,
esquecido de si mesmo e despojado dos dons de Deus, aja com seu
próximo como se fosse sua própria a fraqueza, o pecado e a ignorância
do próximo; não se glorie, nem se ufane, nem desdenhe, nem triunfe
contra aquele, como se fosse seu Deus e igual a Deus; uma vez que se
deve deixar isso somente para Deus, semelhante soberba leva à
"usurpação". Assim, portanto, é compreendida a "forma de servo" e
se cumpre aquilo que o apóstolo escreve em Gálatas 5.13: "Sejam
servos uns dos outros, pelo amor." E em Romanos 12.4s e 1 Coríntios
12.12ss ele ensina, pela semelhança dos membros do corpo, como os
membros fortes, honestos e sãos não se ensoberbecem frente aos fracos,
desonestos e doentes, como se dominassem e fossem seus deuses. Ao
contrário, eles antes servem àqueles, esquecendo-se de sua honestidade,
saúde e força. Pois nenhum membro do corpo se serve a si mesmo nem
procura o que é seu, mas o que é do outro, e isso tanto mais, quanto
mais fraco, doente e desonesto for aquele. E para falar com as suas
palavras, são "solícitos os membros entre si, para que não haja divisão
no corpo". Com isso se torna claro agora como se deve agir com o
próximo em todas as coisas.
Assim ele fará com todos nós, sempre que nos inflarmos por causa da
(nossa) justiça, sabedoria ou força, e nos irritarmos contra injustos,
tolos e os mais fracos que nos: pois então (esta é a maior perversão) a
justiça opera contra a justiça, a sabedoria contra a sabedoria, a força
contra a força. Porque você é forte não para fazer os fracos ainda mais
fracos, pela opressão, mas para que os torne fortes, exaltando e
defendendo-os. E é sábio não para rir dos tolos e assim fazê-los ainda
mais tolos, mas para aceitar, como quer que aconteça em relação a
você mesmo, e para os ensinar. Assim você é justo, para que justifique e
desculpe o injusto, não para condená-lo apenas, falar mal dele, julgar e
castigá-lo. Pois este é o exemplo de Cristo para nós, conforme ele diz:
“O Filho do homem não veio para julgar o mundo, mas para que o
mundo seja salvo através dele” (João 3.17); e novamente em Lucas
9.55ss: “Não sabem de que espírito são? O Filho do homem não veio
para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las”. Mas a
natureza resiste violentamente, porque ela muito se deleita com a
vingança e a glória de sua justiça e com a vergonha da injustiça do seu
próximo. Por isso promove apenas sua própria causa e se alegra de
estar ela melhor que a do próximo, acossando, porém, a causa do
próximo e desejando que ela vá mal. Essa perversão é toda a injustiça,
contrária ao amor que não procura o que é seu, mas o que é do outro.
Portanto deve-se lamentar que a causa do próximo não esteja melhor
que a própria, e desejar que ela vá melhor que a própria, sem que a
alegria seja menor que sobre a própria causa: pois essa é a lei e os
profetas.
Respondo eu: “Aqui não se pode dar uma resposta simples: é preciso
fazer uma distinção entre as pessoas: ou são homens públicos ou
pessoas particulares”.
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