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EDUCAÇÃO INTEGRAL E

DIVERSIDADE CULTURAL

Autoria: Graciele Alice Carvalho Adriano

UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Ivan Tesck

Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz
Prof.ª Tathyane Lucas Simão
Prof. Ivan Tesck

Revisão de Conteúdo: Patrícia Cesário Pereira Offial


Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2017


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

370
A243e Adriano, Graciele Alice Carvalho
Educação integral e diversidade cultural / Graciele Alice Carvalho
Adriano. Indaial : UNIASSELVI, 2017.

150 p. : il.

ISBN 978-85-69910-65-7

1. Educação.
I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.
Graciele Alice Carvalho Adriano

Possui graduação em Pedagogia pela


Universidade Regional de Blumenau – FURB;
especializou-se em Psicopedagogia Institucional pela
Universidade Castelo Branco (RJ); Mídias em Educação pela
Universidade Federal do Rio Grande – FURG; Educação
Especial Inclusiva: Teoria e Prática pela UNIASSELVI e
Educação a Distância: Gestão e Tutoria pela UNIASSELVI.
Cursou Mestrado em Educação na Universidade Regional
de Blumenau – FURB, na Linha de Pesquisa: Processos de
Ensinar e Aprender. Atualmente atua como coordenadora
na rede estadual de educação de Santa Catarina e
docente no curso de graduação em licenciatura na
UNIASSELVI. Docente em cursos de formação
de professores, publicou artigos e participou de
eventos em educação.
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................7

CAPÍTULO 1
Educação Integral e Diversidade Cultural: a Escola na
Contemporaneidade ......................................................................9

CAPÍTULO 2
Multiculturalismo e Interculturalidade: a Diversidade
Étnico-racial no Contexto Educacional..................................39

CAPÍTULO 3
Diversidade, Alteridade e Questões de Gênero......................61

CAPÍTULO 4
A Relação da Diversidade Social com a Desigualdade
Econômica......................................................................................97

CAPÍTULO 5
Estudos Sobre a Diversidade no Contexto Escolar............127
APRESENTAÇÃO
A disciplina de Educação Integral e Diversidade Cultural apresenta como
objetivo auxiliar no entendimento de conceitos referentes à diversidade que
compõem o território nacional. Destacar temas referentes à diversidade cultural
que explicitem fundamentos para uma reflexão quanto às desigualdades sociais
presentes na contemporaneidade.

A disciplina se divide em cinco capítulos com elementos que relacionam as


diversidades com o trabalho pedagógico, numa perspectiva da Educação Integral.
Assim, no primeiro capítulo, você conhecerá alguns dados sobre a diversidade
cultural, como a formação conceitual ao longo do processo histórico e na garantia
de direitos, a definição de cultural atualmente concebida na sociedade e o seu
desenvolvimento nos processos escolares.

O segundo capítulo apresentará os conceitos quanto à multiculturalidade


e à interculturalidade, definindo cada termo e apresentando seus destaques na
educação contemporânea. Abordaremos, inclusive, sobre a explicação conceitual
quanto ao etnocentrismo, racismo e preconceito, para que você compreenda cada
definição e faça um comparativo com sua vivência social.

No terceiro capítulo, intencionamos discutir sobre as questões de diversidade


e gênero, contemplando o seu desenvolvimento conceitual ao longo do período
histórico. Nesse sentido, apontaremos as definições de sexualidade, orientação
sexual e teoria queer, bem como seu processo de construção social. Outro aspecto
relevante para ser discutido em relação à disciplina, diz respeito às conquistas
da mulher na contemporaneidade, a igualdade de gênero e a construção da
alteridade. Finalizaremos o capítulo com uma análise da presença das discussões
de gênero e diversidade nos espaços escolares.

No quarto capítulo, indicaremos os estudos sobre a relação entre a


diversidade social com a desigualdade econômica, trazendo pressupostos
conceituais que explicarão quanto à relação intrínseca entre ambos, juntamente
com os efeitos da globalização. Por fim, no quinto capítulo, conheceremos os
documentos legais que regem a organização curricular nacional, na direção de
estudarmos sobre a diversidade, organização do currículo e o multiculturalismo.

Desta forma, convido você a iniciar os estudos sobre um tema polêmico, que
necessita ter seus conceitos desmistificados para um amplo entendimento sobre o
assunto: as discussões que orientam os entendimentos sobre a diversidade cultural.

Bons estudos!

A autora.
C APÍTULO 1
Educação Integral e Diversidade
Cultura:aEscolanaContemporaneidade

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo, você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Compreender o conceito de diversidade cultural.

 Conhecer a definição de cultura.

 Analisar a relação da diversidade cultural nos fazeres educativos na escola.


Educação Integral e Diversidade Cultural

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

ContextualiZação
Neste primeiro capítulo da disciplina estudaremos assuntos referentes à
educação integral e à diversidade cultural nas relações que ocorrem na escola
contemporânea. Para compreendermos o contexto da discussão, abordaremos
conceitos quanto à relação entre a educação integral e a diversidade cultural.
Assim, destacamos as principais premissas sobre a educação integral, no intuito
de você, acadêmico, conseguir relembrar para mediar seus conhecimentos com o
tema que será estudado nesta disciplina: a diversidade cultural.

Apresentaremos, também, um breve contexto histórico sobre a formação do


conceito de cultura até os estudos contemporâneos sobre o tema. Observaremos
o processo de organização das discussões sobre a diversidade cultural e a
presença ativa da UNESCO, com destaque para a garantia de igualdade dos
direitos humanos.

Por fim, você entenderá a relação da diversidade cultural na educação escolar,


as premissas fundamentadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Documento
(BRASIL, 1997) que objetiva apontar as metas para garantir a qualidade de ensino
para o estudante conviver no mundo atual, atuando como cidadão participativo,
reflexivo e autônomo, conhecedor dos seus direitos e deveres.

Relação Entre A Educação Integral


E A Diversidade Cultural
Para compreendermos a relação que se estabelece entre a educação integral
e a diversidade cultural se faz necessário lembrar alguns aspectos que envolvem
as premissas da Educação Integral.

Desta forma, desde o início do século XX, no Brasil, há indícios de


concepções e intenções da efetiva aplicação de Educação Integral, considerando
a ampliação da jornada escolar baseada na reestruturação da organização nas
escolas do país. Educadores como Anísio Teixeira defendiam a implantação de
uma educação integral voltada para o atendimento dos estudantes com processos
de ensino e aprendizagem e para o ensino globalizado.

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Educação Integral e Diversidade Cultural

Notamos que nos últimos anos a implementação da Educação


Notamos que nos
últimos anos a Integral no ensino brasileiro se efetivou fundamentada nas legislações
implementação educacionais com perspectivas na inclusão social, gestão democrática
da Educação
Integral no ensino e integrada. São assuntos que atualmente estão presentes nas
brasileiro se efetivou discussões dos espaços escolares, com a intenção de melhorar a
fundamentada qualidade de ensino, elevar os índices dos resultados das avaliações
nas legislações
educacionais com nacionais e garantir a permanência e acesso escolar a todos: crianças,
perspectivas na jovens e adultos.
inclusão social,
gestão democrática e
integrada. O Programa Mais Educação no âmbito do Plano de
Desenvolvimento da Educação – PDE objetiva a elaboração de parcerias
Ainda, podemos intersetoriais e intergovernamentais. Entre os séculos XIX e XX inicia o
citar Estevão (2002, processo de globalização impulsionado pelo desenvolvimento de novas
p. 9), que aponta a tecnologias de informação e comunicação, juntamente com as relações
globalização como
“um fenômeno que estabeleceram uma interdependência política e econômica entre
complexo que as nações ocidentais (HELD; McGREW, 2001). Ainda, podemos citar
mobiliza um
conjunto de fatores Estevão (2002, p. 9), que aponta a globalização como "um fenômeno
multidirecionais de complexo que mobiliza um conjunto de fatores multidirecionais de
ordem econômica, ordem econômica, política e cultural".
política e cultural”.

Figura 1 – Aspectos da globalização

Fonte: Disponível em: <https://danilopastorelli.wordpress.com/2017/04/06/


gintemp-apresentacoes-e-material-de-apoio/>. Acesso em: jun. 2017.

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Nesse sentido, após o fenômeno globalização todos os indivíduos possuem


acesso às informações veiculadas nos meios de recursos tecnológicos e de
comunicação. Vale lembrar que a educação também foi incluída com a expansão
de um sistema educativo mundial.

Salientamos que as regras do desenvolvimento econômico global se


baseiam nas premissas de organizações políticas supranacionais, como o
Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Organização das Nações
Unidas, União Europeia, UNESCO e a OECD (Organisation for Cooperation
Economic Europea) ou Organização Europeia de Cooperação Econômica
– OECE. Portanto, essas organizações influenciam as concepções e fazeres
organizacionais de todos os setores que compreendem a estrutura nacional,
incluindo a Educação (BRASIL, 2009).

Por exemplo, o PISA que consiste no programa de avaliação comparada foi


desenvolvido e segue coordenado internacionalmente pela OCDE, identificando
os indicadores sobre a efetividade do trabalho nos sistemas educacionais. Revela
os índices avaliativos do desempenho dos estudantes, com a finalidade de
comparar e melhorar os métodos educativos no âmbito mundial.

Em virtude do que foi mencionado, indicamos que o Programa Mais


Educação objetiva ações para que se efetive a permanência na escola de
crianças, adolescentes e jovens. Outro aspecto a ser considerado diz respeito
à necessidade dos estados e municípios cumprirem com o compromisso de
aprimorar a qualidade da educação. (BRASIL, 2009).

Assim, após 2004 foi criada a Secretaria de Educação Continuada,


Alfabetização e Diversidade (SECAD), designado para resolver as iniquidades
que ocorrem na educação pública. Com ações voltadas para a universalização
do acesso, permanência e aos processos de ensino e aprendizagem na escola
pública, juntamente com a construção participativa de Educação Integral,
superando as desigualdades e garantindo o direito às diferenças (BRASIL, 2009).

No Brasil, a efetivação da construção da proposta de Educação No Brasil, a


efetivação da
Integral requer uma análise sobre as desigualdades sociais, destacando construção da
os problemas de distribuição de renda e nas situações de privação de proposta de
liberdade. Nesse sentido, o documento organizado para os estudos Educação Integral
requer uma
sobre a proposta da Educação Integral (BRASIL, 2009) aponta para análise sobre as
além da garantia de qualidade da educação, considerando também as desigualdades
sociais, destacando
diferenças segundo a etnia, consciência de gênero, orientação sexual, os problemas de
faixa etária e as origens geográficas. distribuição de renda
e nas situações de
privação de liberdade.

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Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 2 – Características gerais da educação integral

Fonte: Disponível em: <http://teiaufmg.com.br/especialistas-discutem-os-


desafios-do-professor-de-educacao-integral/>. Acesso em: jun. 2017.

Algumas categorias oriundas dos efeitos da globalização e


Educação Integral
consiste na oferta suas consequências, como as alterações no mundo do trabalho,
dos serviços públicos transformações técnicas e científicas, mudanças socioambientais
para um atendimento globais, acabam impondo desafios às políticas públicas para o
voltado à proteção
social, para além gerenciamento da nação. Nessas condições, lembramos que a
dos processos Educação Integral consiste na oferta dos serviços públicos para um
educacionais da
escola regular. atendimento voltado à proteção social, para além dos processos
educacionais da escola regular.

Com a promoção da Educação Integral os espaços escolares inferem


em outras demandas sociais dos indivíduos, como podemos citar o pleno
desenvolvimento social, saúde, esporte, inclusão digital e cultural. O tempo
ampliado de permanência dos estudantes permite um trabalho de qualidade com
a inserção de atividades educativas diferenciadas, contribuindo para sua formação
integral, ou seja, a proposta de Educação Integral apresenta uma reorganização
dos espaços, tempos e saberes, ampliando em quantidade (maior tempo) e
qualidade (multiplicidade de saberes) os processos de ensino e aprendizagem
oferecidos nas instituições escolares. Um trabalho educativo que envolva uma
rede coletiva de ações para organizar uma gestão democrática e participativa,
estabelecendo diálogos entre os estudantes, professores, gestores, comunidade
e outros parceiros (ARROYO, 2002).

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

O trabalho desenvolvido na perspectiva de Educação Integral suscita que os


profissionais da escola compartilhem suas responsabilidades com a educação.
Que efetivamente desenvolvam atividades compartilhadas, globalizadas,
objetivando a integração com os diversos saberes.

A LDB de 1996, no seu primeiro artigo, aponta considerações sobre a


educação, determina que "a educação abrange os processos formativos que se
desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições
de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil
e nas manifestações culturais" (BRASIL, 1996, s.p.).

Em consonância com o afirmado, segue o parecer das Diretrizes Curriculares


Nacionais de Educação Básica (BRASIL, 2013, p. 20-21), que destaca "[...] a
educação é um processo de socialização da cultura da vida, no qual se constroem,
se mantém e se transformam conhecimentos e saberes. Socializar a cultura inclui
garantir a presença dos sujeitos das aprendizagens na escola". Ainda indica que:

A educação destina-se a múltiplos sujeitos e tem como objetivo


a troca de saberes a socialização e o confronto do conhecimen-
to, segundo diferentes abordagens, exercidas por pessoas de
diferentes condições físicas, sensoriais, intelectuais e emocio-
nais, classes sociais, crenças, etnias, gêneros, origens, contex-
tos socioculturais, e da cidade, do campo e de aldeias. Por isso,
é preciso fazer da escola a instituição acolhedora, inclusiva, pois
essa é uma opção “transgressora”, porque rompe com a ilusão
da homogeneidade e provoca, quase sempre, uma espécie de
crise de identidade institucional (BRASIL, 2013, p. 25).

Podemos notar que a educação diz respeito à socialização cultural, como


um espaço de construção e transformação de saberes, que refletem as diversas
condições existenciais de cada indivíduo. Nessas condições, a escola se encontra
inserida numa comunidade que apresenta condições culturais,
De acordo com o
saberes, valores, ações e crenças conforme sua localidade regional. documento que
apresenta a proposta
De acordo com o documento que apresenta a proposta da da Educação Integral
(BRASIL, 2009), o
Educação Integral (BRASIL, 2009), o grande desafio da escola se grande desafio da
encontra em propiciar o diálogo com outras culturas. Incluímos à escola se encontra
em propiciar o diálogo
discussão a ideia de que: com outras culturas.

A escola desempenha um papel fundamental no processo de


construção e de difusão do conhecimento e está situada como lo-
cal do diálogo entre os diferentes saberes, as experiências comu-
nitárias e os saberes sistematizados historicamente pela socieda-
de em campos de conhecimento e, nessa posição, pode elaborar
novas abordagens e selecionar conteúdos (BRASIL, 2009, p. 33).

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Educação Integral e Diversidade Cultural

A escola representa Nesse contexto, a escola representa um espaço que permite


um espaço que as interações sociais e culturais de uma determinada comunidade,
permite as interações
sociais e culturais incluindo o acesso de conhecimento de outras culturas existentes. O
de uma determinada trabalho educativo no programa de Educação Integral permite tempos e
comunidade,
incluindo o acesso espaços para os profissionais organizarem suas práticas, favorecendo
de conhecimento a promoção e transformação dos conteúdos e consequentemente da
de outras culturas vida social.
existentes.

Figura 3 – Elementos integrantes da educação integral

Fonte: Disponível em: <http://olhonomaisedc.blogspot.com.br/>. Acesso em: jun. 2017.

Assim, a relação entre escola e comunidade necessita se pautar no diálogo


colaborativo, promovendo a construção de saberes, instituindo uma "comunidade
de aprendizagem". Um local que promova a superação dos preconceitos, na
desmistificação dos estereótipos que classificam os indivíduos segundo a classe,
raça/etnia, gênero, orientação sexual e outros (BRASIL, 2009).

Temas como a
diversidade cultural O programa de Educação Integral permite uma nova organização
são desenvolvidos escolar, com novos tempos, espaços e saberes. Temas como a
de forma integrada, diversidade cultural são desenvolvidos de forma integrada, globalizada,
globalizada,
presentes nas presentes nas discussões e estudos segundo a reorganização curricular
discussões e necessária para a demanda escolar.
estudos segundo
a reorganização
curricular necessária
para a demanda
escolar.

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Atividade de Estudos:

1) Após os estudos desta seção, analise e explique a relação


entre educação integral e a diversidade cultural.
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Processo HistÓrico do Conceito de


Cultura
Na atualidade, constatamos uma preocupação com os estudos sobre cultura,
mais precisamente em compreender as formas de organização dos grupos
sociais, suas formas de viver e suas perspectivas futuras. O contexto histórico
da humanidade revela tanto acordos como conflitos entre os diversos modos de
se organizar socialmente, na apropriação e transformação dos recursos naturais.

Conforme aponta Santos (2006), as diferentes culturas passaram por


transformações internas e externas, oriundas de conflitos e das relações com
outras culturas que transformaram sua forma de vida social. Nesse sentido, ao
longo dos nossos estudos sobre cultura, teremos em mente a complexidade
da diversidade dos agrupamentos sociais, as características de cada um e as
suas diferenças.

Figura 4 – Diversidade cultural mundial

Fonte: Disponível em: <http://www.folhadeirati.com.br/folha-na-escola/24-


de-outubro-dia-da-onu-1.1941740>. Acesso em: jun. 2017.

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Educação Integral e Diversidade Cultural

A autora Kersten (2014) instiga a importância de se refletir sobre a utilização


correta do termo cultura, podendo variar conforme o conceito atribuído. No seu
entendimento, qual seria o significado de cultura? Como você conceituaria cultura
com base nos seus conhecimentos?

Pois bem, devido aos inúmeros conceitos atribuídos à cultura, os antropólogos


alertam sobre alguns cuidados que devemos adotar para que não nos deixemos
levar pelo senso-comum. As impressões que algumas vezes carregamos
são oriundas das opiniões emitidas no convívio social, e para o senso-comum
muitas vezes a cultura infere sobre várias situações e qualidades relacionadas
à erudição. Como, por exemplo, as pessoas que apresentam conhecimentos
científicos, títulos acadêmicos ou ainda sobre a cultura empresarial presente nas
organizações atuais.

Kersten (2014) nos Porém, Kersten (2014) nos lembra que para os antropólogos o
lembra que para
os antropólogos conceito de cultura transcende as características atribuídas pelo senso-
o conceito de comum. No final do século XVIII, na Alemanha, o termo cultura começou
cultura transcende a ser discutido no sentido aceito pela Antropologia.
as características
atribuídas pelo senso-
comum. O conceito de cultura, ou Kultur, para os burgueses alemães
assinalava que "[...] as diferenças culturais eram essenciais na defesa
de sua unidade política. [...] a cultura identificaria e diferenciava um povo e
deveria ser compreendido no plural" (KERSTEN, 2014, p. 712). Em contrapartida
do pensamento idealizado pela expansão anglo-francesa que apontava as outras
sociedades como estágios a serem vencidos até alcançarem a sua própria forma
de organização social, a "civilização".

Desta forma, na Alemanha surgiu o Movimento Romântico com a concepção


de Kultur, segundo Elias (1990), não há uma tradução precisa para o termo,
porque trata-se de um conceito restrito à sociedade alemã. Porém, a ideia de
Kultur se aproxima do que denominamos de "folclore" e como a ideia se associa
à cultura, na língua portuguesa os estudiosos passaram a aceitar como cultura.

Para o movimento Para o movimento desenvolvido na Alemanha não existia a


desenvolvido na
Alemanha não concepção de povos incultos, a cultura era considerada como um
existia a concepção legado ancestral sendo transmitido por conceitos de acordo com
de povos incultos, as línguas e as condições de vida social. Assim, identificamos que o
a cultura era
considerada como conceito antropológico de cultura foi influenciado pelo pensamento
um legado ancestral nacionalista alemão que contrariava as ambições e vontades da Europa
sendo transmitido por
conceitos de acordo Ocidental.
com as línguas e as
condições de vida
social.

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Figura 5 – Constituição da cultura

Fonte: Disponível em: <https://www.emaze.com/@ATWFOTLI/


EL-RESPETOPOR:Laura>. Acesso em: jun. 2017.

A cultura seria
A cultura seria então uma premissa que demarcava a constituição então uma premissa
que demarcava a
de um povo e contradizia a ideia de civilização. Segundo Kersten constituição de um
(2014, p. 712-713): povo e contradizia a
ideia de civilização.

Nesse raciocínio, cultura, por oposição à natureza, consisti-


ria no caráter distintivo da espécie humana em relação aos
animais: a soma de saberes acumulados e transmitidos pela
humanidade considerada em sua totalidade, ao longo de sua
história, as diferentes formas de sustentabilidades das culturas
humanas. Englobaria, portanto, o conjunto integrado de co-
nhecimentos, crenças, sentimentos, regras e comportamentos
que balizariam as ações e atitudes dos indivíduos.

Desta forma, a concepção alemã induzia o conceito de cultura associado


à ideia de progresso, evolução, educação e razão, como condições inerentes a
humanidade. A partir dessa definição, a sociedade passou a ser entendida como
uma forma material e exterior de desenvolvimento, relacionada ao progresso da
vida interior e espiritual das pessoas. No final do século XIX, renomados etnólogos
e antropólogos pesquisavam sobre a reorganização conceitual de cultura.

A primeira definição de cultura foi elaborada pelo antropólogo inglês Edward


Tylor (1871-1917) com o conceito de que a cultura e sociedade consistem no
conjunto complexo de conhecimento, crenças, arte, moral, direito, costumes e
outras capacidades ou hábitos que as pessoas adquirem na sociedade. Desta
forma, a cultura passa a ser adquirida independente da hereditariedade biológica,

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Educação Integral e Diversidade Cultural

com a justificativa de que há uma maior diversidade de culturas em comparação


com as raças humanas. Por exemplo, duas culturas diferentes de uma mesma
raça podem apresentar diferenças consideráveis, em contrapartida a duas
culturas oriundas de grupos de raças diferentes.

No final do século XIX e início do XX, Émile Durkheim (1858-1917), nas


palavras de Kersten (2014, p. 715), define "[...] os fenômenos sociais como
objetos de investigação socioantropológica, e a partir de suas análises começa-se
a pensar que os fatos sociais seriam muito mais complexos do que se pretendia
até então". Assim, surge na Inglaterra o Funcionalismo com destaque para o
trabalho de campo e a observação participante. O pesquisador se desloca ao
campo de pesquisa para conviver com o objeto de investigação.

A etnografia Malinowiski (1884-1942) foi o precursor da etnografia incorporada


consiste no contato como método de investigação da antropologia na coleta de dados
intersubjetivo entre
o antropólogo e seu para pesquisas. A etnografia consiste no contato intersubjetivo entre o
objeto de estudo, antropólogo e seu objeto de estudo, um determinado grupo social de
um determinado
grupo social de forma forma analítica. Nesta perspectiva, se faz necessário o aprender os
analítica. conhecimentos sobre a cultura investigada.

A partir dessa concepção, surge a ideia de que as sociedades humanas se


constituem além de uma soma de indivíduos que a organizam. As sociedades
passam a ser entendidas como um sistema coerente e integrado, constituído por
relações sociais.

Figura 6 – Relações sociais entre as culturas

Fonte: Disponível em: <http://marcosmucheroni.pro.br/


blog/?p=10103#.WUMmW-mQzIU>. Acesso em: jun. 2017.

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

O antropólogo alemão naturalizado norte-americano, Franz Cult Boas (1858-


1942), elaborou a concepção antropológica denominada Relativismo Cultural,
baseado no princípio metodológico oposto ao do etnocentrismo. Para o estudioso
cada cultura se constitui de forma única e específica, representando uma totalidade
singular. Desta maneira, os estudiosos deveriam, além de descrever os fatos culturais,
compreendê-los em sua totalidade, unindo as partes ao conjunto integrado.

Cult Boas afirmava ainda que, cada cultura apresenta um estilo próprio
expresso por meio da língua, crenças, costumes, arte e no comportamento das
pessoas. Para ele as várias expressões culturais se encontram inter-relacionadas,
onde qualquer alteração que ocorra com uma afetará sistematicamente as restantes.

Atividade de Estudos:

1) Reflita sobre seus estudos quanto à definição de cultura e descreva


como foi sua construção conceitual ao longo da história social.
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DeFiniçãodeCulturanaContemporaneidade
Podemos notar que desde o século passado pesquisadores têm revelado
preocupações sobre a concepção dos estudos da cultura humana. Atualmente, os
estudos se intensificaram com o aumento do contato entre as nações e povos, um
dos efeitos da globalização.

Nesse sentido, há inquietações para a compreensão das sociedades


modernas e industriais em meio à diversidade cultural mundial, no momento que
cada grupo inicia as perdas de suas características próprias, no processo de
integração entre as culturas nas relações estabelecidas.

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Educação Integral e Diversidade Cultural

O conceito de cultura também assume um sistema simbólico


O conceito de cultura
também assume um que define mecanismos de controle, regras e instruções que acabam
sistema simbólico que ditando o tipo de comportamento das pessoas que fazem parte de uma
define mecanismos ou outra sociedade. Assim, a cultura passa a ser interpretada, inclusive,
de controle, regras
e instruções que como um código de símbolos partilhados, com relativas práticas
acabam ditando o tipo sociais, como o vestuário, alimentação, língua, crenças e outros hábitos
de comportamento
das pessoas que compartilhados entre as pessoas (KERSTEN, 2014).
fazem parte de uma
ou outra sociedade.
Figura 7 – Concepção de cultura

Fonte: Disponível em: <http://lauraartes.blogspot.com.br/2013/02/


diversidade-cultural.html/>. Acesso em: jun. 2017.

Nas sociedades industrializadas, as instituições dominantes sentem-se


responsáveis em prover as necessidades para o desenvolvimento da sociedade.
Desta forma, acabam desenvolvendo mecanismos eficazes de controle para que
produzam, consumam e se conformem com seus destinos. Este tipo de sociedade
requer mecanismos culturais capazes de transmitir mensagens com rapidez,
objetivando atingir o maior número de pessoas.

A intenção das sociedades industrializadas após a globalização indica um


processo de homogeneização das formas de viver socialmente e da visão de
mundo, nas diversas populações que compõem as sociedades, objetivando o
controle sobre todos.

A indústria da cultura contemporânea transparece nos meios de comunicação


uma ditadura dos princípios que as sociedades atuais devem adotar e internalizar.
Notamos alguns indícios das intencionalidades reveladas no estímulo da produção e
consumo de bens, principalmente nos períodos de expansão econômica dos países.
Em contrapartida, a aceitação das mensagens veiculadas acaba sendo prejudicada
pela realidade em que se encontram as pessoas na sociedade de acordo com sua
cultura, muitas vezes ignorando o apelo da indústria cultural (SANTOS, 2006).

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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Para Santos (2006, p. 44), "Cultura é uma dimensão do processo


A cultura faz parte do
social, da vida de uma sociedade. [...] uma construção histórica, seja meio de vida de uma
como concepção, seja como dimensão do processo social". Neste sociedade, revela
sentido, a definição de cultura não consiste apenas em um conjunto de todos os contextos da
realidade vivenciada
práticas e concepções como a arte ou a música para um determinado cotidianamente.
grupo social. A cultura faz parte do meio de vida de uma sociedade,
revela todos os contextos da realidade vivenciada cotidianamente.

A cultura não consiste em um fenômeno natural decorrente das leis da física


ou biologia, mas como um produto coletivo da vida social humana. Cada cultura
em particular apresenta um contexto histórico social, às vezes interligado pelos
fatos ocorridos. Podemos ainda afirmar, nas palavras de Santos (2006), que a
cultura seria ainda um território atual das lutas sociais por um destino de vida
melhor, pautadas no progresso social e liberdade, contra a exploração de uma
determinada parte da sociedade em favor de outra, e na superação da opressão
e das desigualdades.

Figura 8 – Cultura Brasileira

Fonte: Disponível em: <http://slideplayer.com.br/slide/2957064/>. Acesso em: jun. 2017.

Com base nos estudos sobre cultura, como poderíamos definir a cultura
brasileira? No seu entendimento, como você explicaria o conceito de cultura
referindo ao contexto nacional brasileiro?

Quando se aborda a cultura brasileira há necessidade de ser considerar


algumas manifestações culturais. No passado eram aceitos valores referentes
às diferentes contribuições dos grupos que constituíram a sociedade brasileira,
como os europeus, indígenas e africanos. Porém, percebemos certa tendência
em minimizar as contribuições das populações de origem africana, enfatizados

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Educação Integral e Diversidade Cultural

pela elite social ao longo dos séculos. Em contrapartida, a herança indígena se


encontra presente em nossa cultura, aceita pelas elites dominantes acompanhando
a consolidação da independência do país do domínio colonial europeu, porém, tal
situação não garantiu a posse de terras para os povos indígenas (SANTOS, 2006).

Para Santos (2006), as definições sobre o conceito da cultura


Para Santos (2006), brasileira se voltam à valorização de modo diferente aos aspectos
as definições sobre culturais, em relação à interpretação subjetiva da sociedade. A ciência e
o conceito da cultura
brasileira se voltam a tecnologia fazem parte da cultura orientando o destino das sociedades
à valorização de atuais, por meio da veiculação de informações, interligando diferentes
modo diferente aos
aspectos culturais culturas. Como podemos notar, a cultura consiste no reflexo da nossa
realidade com suas diversas transformações, que ao mesmo tempo se
modifica e expressa, interferindo nas formas de vida da sociedade.

Atividade de Estudos:

1) Nesse momento sugerimos uma parada para análise quanto


ao conceito de cultura atualmente. Pense a respeito e disserte,
segundo seus entendimentos, quanto à definição de cultura na
sociedade contemporânea.
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A DesmistiFicação da Diversidade
Cultural: Garantia de Direitos
As discussões sobre a diversidade cultural foram acompanhadas pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO,
a partir do ano de 1967, com a inserção de um programa específico para a área
de políticas culturais.

24
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

A reunião contou com a realização de uma mesa redonda, em Mônaco,


no mês de dezembro, com o objetivo de realizar estudos históricos sobre as
grandes culturas do mundo, no incentivo à atividade artística, na defesa dos
direitos do autor e na promoção da preservação do patrimônio cultural. Assim,
podemos afirmar que a ação organizada pela UNESCO foi de suma importância e
desencadeou discussões sobre a cultura enquanto objeto de estudo das políticas
públicas no âmbito internacional.

Acadêmico, observe atentamente o contexto histórico das discussões que


permearam as premissas para os estudos sobre cultura e diversidade cultural. O
início do processo ocorreu em 1967 e segue até os dias atuais.

Quadro 1 – Percurso histórico dos estudos sobre cultura e diversidade cultural


• Em Veneza – primeira reunião intergovernamental, em âmbito
mundial, com o objetivo de discutir as políticas culturais, ampliação
do acesso à cultura e preservação da "alta cultura".
• A diversidade cultural era entendida como uma preservação da
cultura humanista universal.
Agosto de 1970
• Ocorreram ao longo da década de 1970 conferências regionais para
discussão sobre a abordagem da cultura no âmbito internacional:
europeia (Helsinki, 1972), asiática (Yogyakarta, 1973), africana
(Accra, 1975), latino-americana e caribenha (Bogotá, 1978) e do
mundo árabe (Bagdá, 1981).
• No México foi realizado a Mondiacult – Conferência Mundial sobre
Políticas Culturais, que organizou a declaração final dos trabalhos
produzidos nas conferências regionais realizadas na década de 1970.
• A Mondiacult sistematizou e definiu os temas que estruturaram a
agenda internacional da cultura nas décadas seguintes.
• A Declaração do México apresentou uma definição de cultura que
foi retomada nos documentos oficiais adotados pela UNESCO.
• No contexto da Declaração do México a concepção de cultura
passa a ser reformulada em relação ao documento anterior,
1982 aprovado na Conferência de Veneza.
• Aborda como concepção sociológica a cultura como um conjunto
de manifestações vinculadas às artes e criatividade humana.
• Na concepção antropológica a cultura incide como manifestações
culturais que sistematizam valores, tradições e crenças. Consistem
em formas de representação das diferentes identidades culturais
que fazem parte da complexa organização da raça humana.
• A Conferência do México inaugura um período de prestígio das
discussões na agenda das relações internacionais até o final da
década de 1990.

25
Educação Integral e Diversidade Cultural

• A Organização das Nações Unidas – ONU proclamou na


Assembleia Geral, a "Década Mundial para o Desenvolvimento
Cultural" do período de 1988 a 1997.
• O documento apresentou quatro objetivos:
1986
- Reconhecer a dimensão cultural do desenvolvimento.
- Afirmar e enriquecer as identidades culturais.
- Ampliar a participação na cultura.
- Promover a cooperação cultural internacional.
• A Assembleia Geral da ONU aprovou a criação da Comissão
Mundial sobre Cultura e Desenvolvimento.
• A Comissão contou com a participação do economista e intelectual
1991
brasileiro Celso Furtado.
• O trabalho da Comissão resultou na elaboração do relatório "Nossa
Diversidade Criadora", completado em 1995, publicado em 1996.
• Em Estocolmo aconteceu uma Conferência Mundial: Conferência
Intergovernamental sobre as Políticas Culturais para o
Desenvolvimento.
• Discutiram sobre a relação entre a cultura e desenvolvimento
em duplo sentido: o primeiro identificando os efeitos do
desenvolvimento sobre a cultura, principalmente no impacto
das políticas desenvolvimentistas nas práticas e identidades
culturais nacionais e internacionais. O segundo sentido seria os
1998 efeitos da cultura em relação ao desenvolvimento, buscando a
influência dos valores culturais no sucesso das estratégias para o
desenvolvimento.
• A partir desse ano as reuniões organizadas para a discussão sobre
a cultura transcende a Conferência do México com exclusividade
da UNESCO. Passam a ser assumidas por outros órgãos, como a
Assembleia Geral da ONU, Banco Mundial, Banco Interamericano
de Desenvolvimento e a Organização dos Estados Americanos –
OEA e outros.
• A Conferência Geral da UNESCO adota a Declaração Mundial
2001 sobre a Diversidade Cultural e seu plano de ação, prevendo o
desenvolvimento sobre o tema a nível internacional.
• A Conferência Geral da UNESCO aprova o mandato para o início
do processo de elaboração e negociação da Declaração Mundial
2003
sobre a Diversidade Cultural, transformada na Convenção sobre a
Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais.
• A Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das
Expressões Culturais foi adotada e entrará em vigor efetivamente
2005 em 2007, quando atingiu o número necessário de ratificações.
• A Convenção conta atualmente com 132 Estados Parte e uma
organização de integração regional a União Europeia.
• Publicação do relatório mundial da UNESCO com novas
perspectivas para as discussões sobre cultura.
• Surgem novos temas e questões nos debates internacionais como
2009
os direitos culturais e a economia criativa.
• Em março foi introduzido o tema dos direitos culturais como campo
específico de atuação dos órgãos humanos da ONU.

26
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

• Revitalização dos debates sobre a articulação entre a cultura e


desenvolvimento, na promoção e atualização dos Objetivos de
Desenvolvimento para o Milênio acordados em 2000.
• Preocupações quanto ao reconhecimento da cultura na sociedade e
desenvolvimento sustentável, para a elaboração e implementação
de políticas públicas que combatam às diferenças na criação,
Pós-2015 produção, circulação e acesso às práticas e expressões culturais
na sua diversidade, sob o risco de serem submetidos à produção
cultural na lógica do mercado.
• Necessidade do desempenho das redes intergovernamentais e
transacionais em aprovar a Convenção, para que os estudos sobre
a cultura possam se basear nas relações sociais, no respeito e
promoção da diversidade cultural.
Fonte: Adaptado de Lima (2014).

Para a UNESCO (2005), a diversidade cultural consiste na multiplicidade de


formas que as culturas de grupos e sociedades encontram para se expressar. Os
direitos culturais são reconhecidos como parte integrante dos direitos humanos,
que se constituem de maneira universal, indissociável e interdependente.

Figura 9 – Elementos que compõem a diversidade cultural

Fonte: Adaptado de UNESCO (2002).

27
Educação Integral e Diversidade Cultural

Podemos observar no organograma os elementos que envolvem a


constituição da diversidade cultural, sendo constituída pelo direito de criação e
difusão cultural, participação da vida cultural, respeito às identidades e à liberdade
das práticas culturais. A Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural da
UNESCO aborda ainda sobre 12 artigos que enfatizam sobre o preâmbulo da
Constituição da UNESCO que indica sobre:

[...] a ampla difusão da cultura e da educação da humanidade


para a justiça, a liberdade e a paz são indispensáveis para a
dignidade do homem e constituem um dever sagrado que to-
das as nações devem cumprir com um espírito de responsabi-
lidade e de ajuda mútua (UNESCO, 2002, s.p.).

Nesse sentido, constatamos que a UNESCO afirma seu compromisso com


a promulgação dos direitos humanos e da liberdade proclamada na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, a respeito ainda dos direitos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais.

Acadêmico, para saber mais sobre a Declaração Universal sobre


a Diversidade Cultural da UNESCO acesse o documento no endereço:
<http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf>.

Acesse e amplie seus conhecimentos sobre a garantia dos


diversos direitos sobre a Diversidade Cultural.

O Brasil assinou a favor da Declaração Universal sobre a Diversidade


Cultural da UNESCO, sendo signatário dos atos normativos, juntamente com a
participação na Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das
Expressões Culturais a partir de 2006.

28
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Figura 10 - Diversidade cultural no Brasil

Fonte: Disponível em: <https://socializandocmm.wordpress.com/2015/08/18/


brasil-e-diversidade-cultural/>. Acesso em: jun. 2017.

os direitos culturais
O país reconhece os direitos culturais contemplados no artigo 215 são reconhecidos
da Constituição Federal de 1988, "o Estado garantirá a todos o pleno como parte dos
direitos humanos,
exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, garantidos nos
e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações fundamentos da
culturais" (BRASIL, 2010, p. 139). Desta forma, podemos afirmar República Brasileira
e expressos
que os direitos culturais são reconhecidos como parte dos direitos no conceito de
humanos, garantidos nos fundamentos da República Brasileira e cidadania.
expressos no conceito de cidadania.

No Brasil, os assuntos pertinentes à Convenção sobre a Proteção e


Promoção da Diversidade das Expressões Culturais são abordados pelo Ministério
da Cultura em parceria com o Ministério das Relações Exteriores. O Ministério da
Cultura instituiu o Comissariado da Cultura Brasileira no Mundo designado para
os contextos da Convenção e das questões internacionais em relação à cultura,
organizando na pauta das políticas o conteúdo da Convenção da Diversidade.

A Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural foi criada em 2003,


como órgão especializado nos estudos sobre a Identidade e Diversidade Cultural.
De modo geral, responsável pelos processos de formulação das políticas públicas
na área cultural quanto à diversidade e intercâmbio cultural. A Secretaria da
Identidade e da Diversidade Cultural trabalha com situações e assuntos referentes
aos povos indígenas, povos ciganos, movimento LGBTQIAP+ e com os diversos
grupos das chamadas culturas populares (DUPIN, 2008).

29
Educação Integral e Diversidade Cultural

Acadêmico, para saber mais sobre o documento do relatório de


gestão da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural acesse
o endereço: <https://goo.gl/qpS728>.

Confira também o site do Ministério da Cultura e conheça os


documentos, portarias e outras informações! Acesse: <http://www.
cultura.gov.br/inicio>.

As questões sobre a A partir da Conferência Intergovernamental sobre as Políticas


relação entre cultura Culturais para o Desenvolvimento realizada em Estocolmo em 1998, as
e desenvolvimento
integraram outros questões sobre a relação entre cultura e desenvolvimento integraram
dois temas: a outros dois temas: a diversidade cultural e o diálogo intercultural.
diversidade cultural e
o diálogo intercultural. Segundo Lima (2014), as discussões sobre a diversidade cultural
remetem a um duplo sentido de entendimentos.

De um lado, levanta as questões entre a cultura e identidade abordados


desde a Conferência do México, com premissas relacionadas aos efeitos da
globalização. Outro ponto indica a diversidade cultural como reflexo de uma
crescente preocupação em proteger as produções nacionais das influências
produzidas pelas diferenças do comércio internacional, divulgada pelos meios de
comunicação e tecnologias da informação.

Em vista disso, podemos concluir a necessidade da participação atuante das


nações na Convenção da UNESCO para a Proteção e Promoção da Diversidade
das Expressões Culturais. Atuando na garantia, proteção e promoção dos
conteúdos culturais e das formas de expressão artísticas em nível internacional.

Atividade de Estudos:

1) Após os estudos desta seção, para melhor entendimento sobre


o assunto, reflita e disserte sobre a garantia de direitos quanto à
diversidade cultural expressa na legislação vigente.
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30
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

A Diversidade Cultural na Educação


Escolar
Na escola, por muitos anos, foi difundida a conturbada ideia de um Brasil
sem diferenças, formado, em princípio, pelas três raças: índio, branco e negro,
que acabaram se integrando e originando o brasileiro. Vale lembrar que essa
concepção veiculada nos livros didáticos influenciou na anulação das diferenças
culturais, subordinou uma cultura aos preceitos de outra, formulando uma
concepção de cultura única, ou seja, a falsa identidade nacional brasileira
(BRASIL, 1997).

O livro de Pluralidade Cultural, que compõe a coleção dos Parâmetros


Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1997), aponta a premissa defendida
no Brasil de uma "democracia racial". Um mito que apazigua as discriminações
praticadas na sociedade, segundo uma falsa aceitação que encobre a exclusão
vivenciada por alguns.

Além disso, o documento (BRASIL, 1997) também revela a atuação silenciosa


de algumas doutrinas pedagógicas que contribuíram para acentuar as atitudes
equivocadas dos professores. São teorias que defendiam a carência cultural como
meios de justificar o fracasso escolar e a falta de condições de alguns estudantes.
A ideia foi difundida a partir da década de 1970 e associava à queda da qualidade
de ensino ao acesso das camadas populares.

Para que possamos reverter essas concepções, ainda presentes em


algumas escolas, o livro de Pluralidade Cultural dos PCN (BRASIL, 1997) defende
a necessidade do reconhecimento e valorização das características das regiões,
etnias, escolas e comunidades.

Figura 11 – Diversidade cultural e a educação

Fonte: Disponível em: <http://calmonleonor.blogspot.com.br/2012/10/


diversidade-cultural-na-escola.html>. Acesso em: jun. 2017.

31
Educação Integral e Diversidade Cultural

O campo de estudos teóricos sobre a Pluralidade Cultural,


O campo de estudos que neste material preferimos apontar como Diversidade Cultural,
teóricos sobre a
Pluralidade Cultural, apresenta um caráter interdisciplinar baseando-se na fundamentação
apresenta um caráter ética, jurídica, internacional, histórica, geográfica, antropológica,
interdisciplinar.
linguística, sociológica, psicológica e sobre os estudos populacionais
são aspectos oriundos da ação dos movimentos sociais e organizações
comunitárias, que ao serem introduzidos nas escolas apresentam um caráter
pedagógico (BRASIL, 1997).

A constituição dos fundamentos e características que fazem parte dos


estudos sobre a Diversidade Cultural são elementos necessários para a
elaboração da proposta curricular nas escolas, preconizando um processo de
ensino e aprendizagem que considera a construção da cidadania.

Figura 12 – Fundamentos e características dos


estudos sobre a diversidade cultural

32
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Fonte: Adaptado de PCN – Caderno Pluralidade Cultural (BRASIL, 1997).

Desta forma, com base nos estudos apresentados pelos PCN –


Uma diversidade que
Caderno de Pluralidade Cultural (BRASIL, 1997), podemos constatar transcende a cultura,
que a educação necessita viabilizar o pleno desenvolvimento da que aponta também
cidadania, para a formação de uma sociedade democrática e que para as competências
singulares de cada
saiba conviver com sua diversidade. Uma diversidade que transcende pessoa.
a cultura, que aponta também para as competências singulares de
cada pessoa.

Perrenoud (2000, p. 16) atribui para competências o conceito


de “[...] capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para
enfrentar um tipo de situação”. O autor ainda remete a “uma teoria do
pensamento e da ação situados, mas também do trabalho, da prática
como ofício e condição”.

Acadêmico, para saber mais sobre o assunto consulte a obra


do autor!

PERRENOUD, P. Dez competências para ensinar. Porto


Alegre: Artmed, 2000.

33
Educação Integral e Diversidade Cultural

A sociedade atual em que a escola se encontra media encontros, interações


entre diversas culturas, atribuindo denominações como multiculturalismo e a
interculturalidade. Fleuri (2001, p. 142) enfatiza que:

A perspectiva intercultural reconhece e assume a mul-


tiplicidade de práticas culturais, que se encontram e se
confrontam na interação entre diferentes sujeitos. E isto
coloca um problema de conhecimento: como entender logi-
camente esta relação de unidade e pluralidade? Cada sujei-
to constrói sua identidade a partir de histórias e de contex-
tos culturais diferentes. A relação entre diferentes sujeitos
constitui um novo contexto intercultural.

O contexto intercultural se faz presente no meio social e vinculado ao


espaço escolar. Na atualidade, as sociedades se encontram numa organização
complexa, com uma multiplicidade de culturas. Portanto, a multiplicidade de
culturas presentes incita a necessidade que a escola contemple os estudos sobre
o etnocentrismo cultural.

Um dos pontos Um dos pontos principais a ser desenvolvido nas escolas seria
principais a ser
desenvolvido nas o entendimento sobre o conceito de diversidade na educação. Assim,
escolas seria o os professores, ao considerarem uma educação inclusiva passam a
entendimento valorizar e compreender a diversidade humana brasileira, a garantia
sobre o conceito
de diversidade na de igualdade dos direitos humanos, efetivando a premissa do acesso à
educação. escola para todos.

Atividade de Estudos:

1) Defina com seus entendimentos, após o estudo desta seção,


como seria o desenvolvimento do trabalho pedagógico nas
escolas referente às discussões quanto à diversidade cultural.
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Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

Algumas Considerações
Ao final dos nossos estudos sobre a diversidade cultural em relação
à Educação Integral podemos perceber a presença constante dos efeitos da
globalização no desenvolvimento social. São situações que refletem nos
entendimentos das pessoas em relação aos modos de sentir, viver e pensar
numa nova modalidade social, inventada por determinadas organizações
políticas supranacionais.

Desta forma, percebemos que a sociedade se encontra em profunda


mudança, alterando seus princípios e valores, conforme a necessidade e os
interesses de cada época. Constatamos, inclusive, a necessidade de intervenção
da UNESCO nos estudos quanto à diversidade cultural, garantindo como
legislação na forma de direito a todos.

Nos assuntos que permeiam os estudos da diversidade cultural nos espaços


escolares, identificamos concepções conturbadas, imprimindo sentidos falsos de
igualdade entre as raças: branco, negro e índio. Difundem a noção da integração
social entre as três raças na formação do povo brasileiro, veiculada nos livros
didáticos como uma verdade social. Na realidade, encontramos livros que denotam
uma falsa identidade nacional brasileira, fundamentada numa perspectiva de
"democracia racial", que exclui uns e ressalta os interesses de outros.

Para tanto, um dos importantes documentos nacionais que apresentam o tema


voltado para os espaços escolares consiste nos PCN – Caderno de Pluralidade
Cultural, que prevê como parte da educação o pleno desenvolvimento da cidadania.
Qual seria essa cidadania? Quais seriam os pressupostos que norteariam a ideia
de ser cidadão na sociedade contemporânea? São questionamentos que suscitam
reflexões sobre as práticas educativas desenvolvidas nas escolas, carregadas de
intencionalidades e compreensões, expressas nos discursos por professores e
outros profissionais da educação. Assim, percebemos a importância dos estudos
sobre o etnocentrismo cultural, a desmistificação de entendimentos equivocados
que foram construídos ao longo da história, segundo interesses de determinados
grupos dominantes.

35
Educação Integral e Diversidade Cultural

ReFerências
ARROYO, Miguel. Ofício de mestre: imagens e autoimagens. Petrópolis (RJ):
Vozes, 2002.

BARROS, J. M. (Org.). Diversidade cultural: da proteção à promoção. Belo


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BRASIL. Lei nº 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.


Brasília: 1996.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional


promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas
Emendas Constitucionais nº 1/92 a 64/2010, pelo Decreto nº 186/2008 e pelas
Emendas Constitucionais de Revisão nº 1 a 6/94. Brasília: Senado Federal,
Subsecretaria de Edições Técnicas, 2010.

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MEC, Secad, 2009.

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica/


Ministério da Educação. Secretária de Educação Básica. Diretoria de Currículos
e Educação Integral. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: pluralidade cultural. Secretaria da


Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.

ELIAS, Norbert. Sociogênese da diferença entre “Kultur” e “Zivilisation” no emprego


alemão. In: ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 1990, p. 23-50.

ESTEVÃO, Carlos V. Globalização, metáforas organizacionais e mudança


educacional. Cadernos do CRIAP. Porto: Asa Editoras II, S.A., 2002.

FLEURI, Reinaldo Matias. Intercultura: estudos emergentes. Ijuí: Ed. Unijuí, 2001.

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Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001.

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redes e conexões do ser sustentável. Curitiba: SENAR, 2014.
36
Capítulo 1 EDUCAÇÃO INTEGRAL E DIVERSIDADE CULTURAL:
A ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE

MIGUEZ, P.; BARROS, J. M.; KAUARK, G. (Orgs.). Dimensões e desafios


políticos para a diversidade cultural. Salvador: EDUFBA, 2014. In. LIMA, P.
A. A convenção da UNESCO sobre a diversidade cultural e a agenda
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UNESCO. Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, 2002.


Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf>.
Acesso em: jun. 2017.

37
Educação Integral e Diversidade Cultural

38
C APÍTULO 2
MulticulturalismoeInterculturalidade:
aDiversidadeÉtnico-RacialnoContexto
Educacional

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo, você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Conhecer as definições de multiculturalismo e interculturalismo.

 Reconhecer os conceitos de etnocentrismo, racismo e preconceito.

 Distinguir aspectos que relacionam o multiculturalismo com a educação.


Educação Integral e Diversidade Cultural

40
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

ContextualiZação
Prosseguimos nossos estudos sobre outros temas que compõem as
discussões sobre a diversidade cultural. Apresentaremos conceitos referentes ao
multiculturalismo e interculturalidade. Iniciamos nossos estudos com uma reflexão
inicial: será que há diferença entre os dois termos?

Pois bem, ao longo dos estudos você conhecerá suas características e


definições e perceberá certas semelhanças e algumas diferenças conceituais
entre o multiculturalismo e o interculturalismo.

Destacamos um espaço para discussão sobre a definição do multiculturalismo


e outro distinto para as perspectivas do interculturalismo. Dessa forma, você
conseguirá compreender e perceber o contexto teórico de cada termo.

Com o intuito de aprofundar seus estudos sobre a disciplina, abordaremos


conceitos quanto ao etnocentrismo, racismo e preconceito. Entendemos que
há necessidade de esclarecer os conceitos de palavras utilizadas no cotidiano,
muitas vezes em referência à diversidade cultural. Será que estão sendo utilizados
de forma correta? Por isso, entendemos como indispensável a necessidade do
entendimento sobre a forma conceitual correta, segundo os autores que estudam
sobre o assunto.

Por fim, apresentaremos a relação entre os estudos sobre o multiculturalismo


e interculturalidade com a educação contemporânea. Mais precisamente, como
na sala de aula o professor deverá pensar o processo de ensino e aprendizagem,
considerando os temas preconizados nos documentos que regem o currículo e as
práticas pedagógicas no país?

DeFinição de Multiculturalismo
Para entender a definição de multiculturalismo se faz necessário analisar o
contexto histórico de sua formação. Gonçalves e Silva (2006) afirmam que o termo
multiculturalismo se originou em países onde a diversidade cultural
constitui-se como um problema na construção da unidade nacional. O multiculturalismo
surge como um
princípio ético para
São países que possuem uma diversidade cultural, em que orientar a ação
alguns membros da sociedade de uma cultura acabaram se impondo daqueles grupos
dominados, a
como superiores aos demais, por meio de processos autoritários. garantir os direitos
Nesse sentido, o multiculturalismo surge como um princípio ético para de preservação de
orientar a ação daqueles grupos dominados, a garantir os direitos de suas características
culturais.
preservação de suas características culturais.

41
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 13 – Definição de Multiculturalismo

Fonte: Disponível em: <http://www.procurador-raulino.com.br/


opiniao/politica/politica14.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

O termo multiculturalismo advém das lutas contra o racismo organizadas


pelos negros norte-americanos para o reconhecimento da diversidade de culturas
existentes no país. Para Silva e Brandim (2008), a origem do multiculturalismo se
encontra no movimento teórico com suas práticas sociais. Surgiu na metade do
século XX, nos Estados Unidos, iniciado por professores doutores afro-americanos
universitários da área dos Estudos Sociais, que publicaram obras sobre as questões
sociais, políticas e culturais, despertando o interesse dos afrodescendentes.

Por essas razões, a partir da década de 1970 houve um significativo avanço


no movimento multiculturalista, quando o poder público passou a ser pressionado
para garantir a igualdade das oportunidades educacionais, integração e justiça
social a todos os diversos grupos culturais.

Nas décadas de 1980 e principalmente na de 1990, os estudos sobre


multiculturalismo se fortaleceram, na ampliação dos interesses sobre as diferentes
culturas nas discussões curriculares. No ano de 2001 o Brasil participou da
III Conferência Mundial contra o Racismo, promovida pela Organização das
Nações Unidas – ONU –, realizada em Durban, cidade sul-africana na província
de KwaZulu-Natal. Para participar do evento foram realizadas no Brasil várias
ações promovidas pelas Organizações Não Governamentais (ONGs) e diversos
outros grupos. O principal intuito consistiu em combater a discriminação racial
e intensificar as lutas pelo reconhecimento dos obstáculos socioeconômicos e
culturais que os afrodescendentes vivenciam no cotidiano social.

42
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Figura 14 – Multiculturalismo no Brasil

Fonte: Disponível em: <http://relatosdeaprendizagem.blogspot.com.br/2015/01/


por-uma-politica-da-diferenca.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

A partir de 2003, no Brasil, há uma organização político-institucional que


favoreceu a consolidação dos movimentos antirracistas, com a implementação da
Lei nº 10.639/03. A lei estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para
a inclusão no currículo oficial das redes de ensino a obrigatoriedade da temática
"História e Cultura Afro-Brasileira". No ano seguinte, a Resolução nº 1, de 17 de junho
de 2004, institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

Na época surgiram ainda a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade


Racial – SEPPIR – e a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial, como
documentos legais que normatizam as estratégias das políticas multiculturalistas
no país. Os Parâmetros Curriculares Nacionais lançados pelo
No Brasil as
Ministério da Educação e Cultura – MEC – em 1997, incluíram como discussões sobre a
um dos temas transversais a pluralidade cultural. questão multicultural
apresentam questões
antagônicas,
No Brasil as discussões sobre a questão multicultural apresentam relacionadas ao
questões antagônicas, relacionadas ao desrespeito e privação dos desrespeito e
privação dos direitos
direitos humanos dos grupos indígenas e afrodescendentes. A história humanos dos
de nosso país, segundo Moreira e Candau (2008), resguarda a grupos indígenas e
eliminação e escravidão de outras culturas, na negação e silêncio que a afrodescendentes.
nação sustentou com a premissa de uma cultura hegemônica.

43
Educação Integral e Diversidade Cultural

A ideia de multiculturalismo na sociedade brasileira difere da idealizada pela


europeia e estadunidense. Revela uma concepção que enfatiza a "[...] descrição
e a compreensão da construção da configuração multicultural de cada contexto
específico" (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 20). Apresentamos as três abordagens
multiculturais, com suas características específicas, para que você amplie seus
conhecimentos sobre o tema:

Figura 15 – Abordagens do Multiculturalismo

Fonte: Adaptado de Moreira e Candau (2008).

Conforme indicado anteriormente, o multiculturalismo surgiu no anseio das


pressões dos movimentos sociais, podemos citar a atuação dos movimentos
feministas, negros, homossexuais, entre outros, que incidiram na revisão conceitual
no âmbito mundial. Silva (2002a, p. 85) indica ainda que "o multiculturalismo não
pode ser separado das relações de poder que anteriormente obrigaram essas
diferentes culturas raciais, étnicas e nacionais a viverem no mesmo espaço".

O multiculturalismo O multiculturalismo suscita a compreensão sobre a diversidade


suscita a
compreensão sobre a cultural, ou propriamente sobre o conceito de cultura. Apresentaremos
diversidade cultural, de forma sucinta as diversas compreensões sobre as perspectivas do
ou propriamente
sobre o conceito de multiculturalismo, segundo Silva (2002a):
cultura.

44
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Figura 16 – Perspectivas do Multiculturalismo

Fonte: Adaptado de Silva (2002a).

Os estudos sobre o multiculturalismo crítico pós-moderno (McLAREN, 1997)


buscam denunciar e superar os mecanismos que silenciam os grupos oprimidos,
ao incitar lutas por práticas que assentem para a emancipação, tolerância e justiça
social. O hibridismo ou a hibridização cultural sustenta a base da construção
das identidades culturais, no sentido de apontar a dialética entre as estratégias
opressivas globalizadoras e os processos de significação das diversas identidades
conflitantes (BHABHA, 1998). Expressam ainda, sobre a superação dos binômios
"global e local", "universal e multicultural" ou "homogênico e heterogênico",
buscando a dialética sobre as diversidades culturais, como princípio da ação para
trabalhar os conflitos de identidades vivenciados nas sociedades.

Atividade de Estudos:

1) Sugerimos que você defina o conceito de multiculturalismo com


seu entendimento, após os estudos sobre o assunto.
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________

45
Educação Integral e Diversidade Cultural

Perspectivas do Interculturalismo
As discussões sobre a diversidade cultural na América Latina surgiram na
década de 1980, ocultas até então, defendidas pela concepção do Estado-Nação,
ou seja, defendiam uma homogeneização aparente, que procurava excluir as
diferenças na sociedade.

O termo inicial usado de educação bicultural designava ações institucionais


que consideravam as diferenças culturais dos estudantes. A transição para a
concepção de interculturalidade nos anos de 1980 recebeu novas dimensões
político-pedagógicas, a qual tentou expressar uma coerência étnica dos grupos
sociais. Assim, influenciou no fortalecimento da identidade cultural e a divulgação
do conhecimento cultural de outros povos (SILVA, 2002a).

Segundo Fleuri (2003), a educação intercultural na América Latina apresenta


diversas denominações de acordo com cada país, podemos perceber em alguns
exemplos: etnoeducação na Colômbia; educação bilíngue na Bolívia; educação
intercultural bilíngue na Guatemala e Brasil.

Um dos processos desencadeadores para os estudos sobre o tema consiste


na globalização, que a partir da década de 1980 incitou algumas mudanças na
sociedade. Um dos motivos foi a expansão do contato intercultural, por meio das
tecnologias de comunicação e informação (BARBOSA; VELOSO, 2009).

Figura 17 – Interculturalismo

Fonte: Disponível em: <http://entrementes12c.blogspot.com.br/2013/03/


atitudes-face-diversidade-cultural.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

46
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

A proposta intercultural surge no abismo deixado pelo O interculturalismo


multiculturalismo, quando afirma apenas a situação de integração pontua sobre uma
sociedade em que as
entre duas culturas. O interculturalismo pontua sobre uma sociedade comunidades étnicas
em que as comunidades étnicas se reconhecem em suas diferenças, se reconhecem em
suas diferenças,
buscam alternativas para compreensão e valorização de seus buscam alternativas
preceitos culturais (ASTRAIN, 2003). para compreensão e
valorização de seus
preceitos culturais.
Segundo Godenzzi (2005), na Europa o termo interculturalidade
se relaciona aos imigrantes oriundos de países do terceiro mundo, decorrente
das formas de comunicação intercultural como nova aprendizagem entre os
diversos grupos culturais. Na América Latina diz respeito aos diversos povos e
comunidades que constituem cada nação com suas especificidades culturais.

A interculturalidade indica a comunicação e interação entre as A interculturalidade


indica a comunicação
diversas culturas, lutando por uma qualidade na interação das relações e interação entre
e não somente uma coexistência básica entre distintas culturas em um as diversas
culturas, lutando
mesmo espaço. Desta forma, o termo interculturalidade transcende por uma qualidade
a concepção multicultural, consiste no pensamento contemporâneo na interação das
sobre as diversidades culturais presentes na atualidade, ou melhor, relações e não
somente uma
na intencionalidade da interação entre as diversas culturas baseadas coexistência básica
no preceito da garantia e igualdade dos direitos humanos. Conforme entre distintas
culturas em um
sustenta Moreira e Candau (2008, p. 24-25): mesmo espaço.

Em geral, quando se promove o diálogo intercultural se assu-


me uma abordagem de orientação liberal e se focaliza, com
frequência, as interações entre diferentes grupos sociocul-
turais de um modo superficial, reduzido a visibilização de al-
gumas expressões culturais destes grupos, sem enfrentar a
temática das relações de poder que perpassam as relações
interculturais, nem as matrizes profundas, mentalidades, ima-
ginários, crenças, configuradoras de sua especificidade.

Esses autores nos apresentam algumas características quanto à


interculturalidade:

47
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 18 – Características da Interculturalidade

Fonte: Adaptado de Moreira e Candau (2008).


A hibridação como
um processo derivado
da interculturalidade, Para Canclini (2004), o termo hibridação refere-se à miscigenação
transcendendo intercultural gerada pelas integrações entre os Estados nacionais,
as fusões raciais,
para contemplar as populismos políticos e indústrias culturais. A hibridação como um
combinações entre os processo derivado da interculturalidade, transcendendo as fusões
diversos elementos e raciais, para contemplar as combinações entre os diversos elementos e
situações produzidas
pela indústria cultural. situações produzidas pela indústria cultural.

Segundo Moreira e Candau (2008), a perspectiva intercultural promove uma


educação voltada para o reconhecimento do "outro", no desenvolvimento do
diálogo entre as diferentes comunidades sociais e culturais. Nesse sentido, uma
educação intercultural baseada na negociação cultural, no enfrentamento dos
conflitos pelas lutas de poder entre os diversos grupos socioculturais, incitando a
construção de um projeto comum fundamentado na dialética.

Atividade de Estudos:

1) Analise e aponte as características que definem a


interculturalidade e sua relação com a hibridação, como um dos
fatos presentes na contemporaneidade.
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

48
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Etnocentrismo, Racismo e Preconceito


O etnocentrismo surgiu a partir do século XV, quando as sociedades
europeias no processo de expansão perceberam que existiam outras sociedades
que não seguiam seus preceitos. Desta forma podemos afirmar, segundo Telles
(1987), que a cultural europeia além de ser etnocêntrica, também denota ser
etnocidária. O etnocídio consiste no extermínio de modos de vida e pensamentos
diferentes daqueles que intencionam a dominação, sendo reconhecido como um
mal que precisa ser transformado.

O termo etnocentrismo apresenta origem na heterofobia, ou seja, o


outro passa a ser adjetivado de forma negligenciada e reconhecido como algo
que precisa ser destruído, como por exemplo: primitivo, selvagem, crianças
problemáticas, hippies, mulheres de vida fácil, entre outros. Além disso, apontamos
nos termos de Telles (1987) que o etnocentrismo aponta uma forma de como um
determinado grupo cultural constrói um conceito que o favorece, perante os outros
grupos considerados inferiores, com seus valores culturais ignorados.

Figura 19 – Característica do Etnocentrismo

Fonte: Disponível em: <http://artigosdehistoria.blogspot.com.


br/2012/03/etnocentrismo.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

A autora Telles (1987) ainda indica que o etnocentrismo não se fundamenta


somente do fato da preferência da própria cultura em detrimento das demais, mas
no preconceito acrítico favorecendo o seu próprio grupo, baseado numa visão
distorcida e preconceituosa dos demais.

49
Educação Integral e Diversidade Cultural

Reflita e pontue como o etnocentrismo se organiza atualmente, na sociedade


globalizada. Você consegue perceber situações no cotidiano atual que denotam o
etnocentrismo?

Pois bem, segundo Barreto, Araújo e Pereira (2009), o etnocentrismo


atualmente se revela na tendência de naturalizar as diferenças no interior de uma
mesma sociedade. A globalização intensificou o processo de desenvolvimento
do etnocentrismo por meio do amplo acesso à tecnologia de informação e
comunicação, com o processo migratório, reafirmando a concepção sobre o
racismo na sociedade.

De acordo com Munanga (2003, s.p.), "etimologicamente, o conceito de


raça veio do italiano razza, que por sua vez veio do latim ratio, que significa
sorte, categoria, espécie. Na história das ciências naturais, o conceito de raça
foi primeiramente usado na Zoologia e na Botânica para classificar as espécies
animais e vegetais".

O autor prossegue em um relato sobre o desenvolvimento do termo "raça"


conforme os entendimentos ao longo da história. Vamos conferir:

Quadro 2 – Desenvolvimento Histórico do Termo Raça


• No latim medieval o conceito designava descendência,
Idade Média linhagem, um grupo de pessoas que possuem características
físicas e um ancestral comum.
• O francês François Bernier apresenta um conceito moderno,
1684 classificando a diversidade humana em grupos fisicamente
contrastados, denominados de raças.
• O conceito de raça atua nas relações entre as classes sociais
na França, utilizado para diferenciar os francos, a nobreza
local, dos gauleses, população identificada como plebe.
Séculos XVI - XVII
• Até o final do século XVII o conceito de sociedade e dos "outros"
se baseava na Teologia e nas Escrituras. Para ser pertencente
à humanidade era preciso provar a descendência de Adão.
• Período balizado pela racionalidade, os filósofos iluministas
contestam o monopólio do conhecimento nas mãos da Igreja.
• Retornam aos questionamentos sobre quem eram os "outros".
• Indagam sobre o conceito de raça proveniente das ciências
naturais, que infere no surgimento da nova disciplina História
Século XVIII
Natural da Humanidade, transformada mais tarde em Biologia e
Antropologia Física.
• A cor da pele passou a caracterizar três tipos de raças: branca,
negra ou amarela. Definidas pela concentração da melanina
que define a cor da pele, dos olhos e do cabelo.

50
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

• Acrescenta ao critério da cor os aspectos morfológicos como a


forma do nariz, lábios, queixo, formato do crânio, ente outros.
• Os naturalistas até esse período classificaram a humanidade
além das características físicas, organizaram uma escala de
Século XIX valores entre as chamadas raças.
• Organizaram uma relação intrínseca entre o biológico e as
qualidades psicológicas, morais, intelectuais e culturais.
Atribuíram maior privilégio à raça "branca" em detrimento às
demais, consideradas inferiores.
• Surge a teoria pseudocientífica denominada raciologia, com
Início do século XX conteúdo doutrinário que justificava e legitimava os sistemas de
dominação racial.
• Conceito de raça como ideologia determinado pela estrutura
global da sociedade e as relações de poder que a governam.
• Os conceitos de negro, branco e mestiço variam conforme a
Atualmente localidade nacional, com significados diferentes que variam
conforme os entendimentos de cada país.
• O significado atribuído considera um sentido etnossemântico,
político-ideológico ao invés do biológico.
Fonte: Adaptado de Munanga (2003).

O conceito de racismo foi criado nos anos de 1920, e desde então recebeu
várias interpretações com significados diversos. Geralmente, conforme Munanga
(2003), o termo racismo apresenta um sentido a partir da raça, teoricamente uma
ideologia essencialista que divide a humanidade em grandes grupos denominados
de raças com contrastes diferenciados, ou seja, são as diversas características
físicas hereditárias que determinam as psicológicas, morais, intelectuais e
estéticas, esquematizadas numa escala de valores desiguais.

Figura 20 – Conceito de Racismo

Fonte: Disponível em: <http://marcelojusta.blogspot.com.br/2014/08/a-


crueldade-do-racismo.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

51
Educação Integral e Diversidade Cultural

Para Munanga Para Munanga (2003, s.p.), o racismo consiste na "[...] crença na
(2003, s.p.), o existência das raças naturalmente hierarquizadas pela relação intrínseca
racismo consiste
na “[...] crença entre o físico e o moral, o físico e o intelecto, o físico e o cultural". Nesse
na existência das sentido, o racista atribui um sentido sociológico ao conceito de raça,
raças naturalmente
hierarquizadas pela transcende as diferenças físicas e contempla exclusivamente os traços
relação intrínseca culturais, linguísticos, religiosos, entre outros. Em seguida, atribui um
entre o físico e o valor inferior aos grupos com características culturais diferentes do seu,
moral, o físico e o
intelecto, o físico e o como consequências das suas características físicas ou biológicas.
cultural”.
Atualmente, o sentido do racismo não se fundamenta mais
exclusivamente no conceito de raça com caráter biológico, que decretava as
diferenças entre os diversos grupos culturais. Assim, atualmente, os estudos
sobre o racismo identificam outros tipos de essencialização, como a histórico-
cultural, sustentada pelas representações do imaginário coletivo. Outrora, o
racismo clássico se baseava na noção de raças, o novo racismo se sustenta na
noção de etnia que passa a definir os grupos culturais (MUNANGA, 2003).

Conceito de etnia: Para compreendermos melhor o termo etnia,


Munanga (2003) o indica como um conceito sociocultural, histórico e noção de etnia qu
racismo clássico
cultural, sustenta
sobre o racismoe
diferenças entre s
exclusivamente n

relação
culturas.
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psicológico. Como um conjunto de indivíduos que historicamente ou


mitologicamente apresentam em comum um ancestral, língua, religião,
cosmovisão, cultura e habitam geograficamente no mesmo território.
Algumas etnias formam nações sozinhas, como as sociedades
indígenas brasileiras, africanas, asiáticas, australianas, entre outras.

Disponível em: <http://www.geledes.org.br/kabengele-munanga-


uma-abordagem-conceitual-das-nocoes-de-raca-racismo-identidade-
e-etnia/#gs.9HE9QLY>. Acesso em jun. de 2017.

Apesar de alguns
estudiosos Apesar de alguns estudiosos substituírem o conceito de raça
substituírem o por etnia e justificarem seus significados e práticas sociais, ainda
conceito de raça por no cotidiano a sociedade vela um racismo baseado na relação
etnia e justificarem
seus significados hierarquizada entre as diferentes culturas. O racismo atualmente
e práticas sociais, praticado não se fundamenta nos conceitos de raça biologicamente,
ainda no cotidiano a
sociedade vela um mas nos conceitos de etnia, da diferença cultural ou identidade cultural.
racismo baseado na Vale lembrar ainda, caro acadêmico, que os entendimentos sobre as
relação hierarquizada mesmas raças de ontem consistem na concepção de etnias atualmente
entre as diferentes
culturas. (MUNANGA, 2003).

52
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Barreto, Araújo e Pereira (2009, p. 192) contribuem na discussão quando


afirmam que uma das características do racismo seria sua construção como
doutrina, ou "[...] um tipo de conhecimento que se mantém por repetição,
ignorância e preconceito, mas que guarda pretensões de se apresentar como
conhecimento objetivo, supostamente sustentado na natureza das coisas". O
preconceito é qualquer atitude negativa em relação a uma pessoa ou grupo
social, que apresente uma ideia preconcebida de experiências passadas que
exteriorizam generalizações estereotipadas.

O termo racismo sobreviveu ao racialismo como uma teoria científica


fundamentada nas atitudes. Portanto, atua no sentido do etnocentrismo e
justifica os preconceitos, quando demarca atitudes que neutralizam as situações
de desigualdade social, nos tratamentos diferentes atribuídos aos indivíduos e
diversos grupos (BARRETO; ARAÚJO; PEREIRA, 2009).
O etnocentrismo
se constitui como
O etnocentrismo se constitui como um comportamento generalizado um comportamento
de reação às diferenças, com destaque para seu próprio modo de vida generalizado de
reação às diferenças,
em relação a dos "outros". O racismo, pelo contrário, indica uma forma com destaque para
das pessoas usarem as diferenças como um modo de dominação, da seu próprio modo de
vida em relação a dos
subordinação do "outro" as suas formas de viver culturalmente. “outros”.
culturalmente.
de dominação, da subordinação do "outro" as suas formas de viver
indica uma forma das pessoas usarem as diferenças como um modo
modo de vida em relação a dos "outros". O racismo, pelo contrário,
generalizado de reação às diferenças, com destaque para seu próprio
O etnocentrismo se constitui como um comportamento

diversos grupos (BARRETO; ARAÚJO; PEREIRA, 2009).


de desigualdade social, nos tratamentos diferentes atribuídos aos indivíduos e
justifica os preconceitos, quando demarca atitudes que neutralizam as situações
fundamentada
ue passa a definir nas os atitudes. Portanto, atua no 2003). sentido do etnocentrismo e
O termonaracismo
se baseava
grupos culturais (MUNANGA,
noção de sobreviveu
raças, o novo ao racialismo
racismo se como sustenta umana teoria científica
ada pelas representações do imaginário coletivo. Outrora, o
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essencialização, como a histórico-
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tualmente, o sentido objetivo, do
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Acesso em jun. de 2017.na natureza das coisas". O
ignorância
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se fundamenta mais

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Disponível
raças de ouontem
em: <http://www.geledes.org.br/kabengele-munanga-
"[...] um tipo
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conceito
"[...] de etnia,
crença raça
na

Atividade de Estudos:

1) Reflita sobre etnocentrismo, preconceito e raça e conceitue as


diferenças entre cada termo.
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

53
Educação Integral e Diversidade Cultural

Relação do Multiculturalismo e
Interculturalidade com a Educação
ContemporÂnea
O início das discussões sobre a perspectiva do multiculturalismo na
educação, de acordo com Gonçalves e Silva (2006), surgiu dos estudos de
professores doutores afro-americanos, da área dos Estudos Sociais: Gwedolyn
C. Baker, James Banks, Geneva Gay e Carl A. Grant. Os professores tiveram
influências dos Estudos Negros e dos Black Studies nas escolas, e passaram a
contribuir nas pesquisas e práticas pedagógicas sobre o tema.

Para os professores afro-americanos a inserção da educação multicultural


almejaria uma reformulação nas instituições de ensino. O objetivo seria possibilitar
oportunidades iguais de mesmo acesso para todos os estudantes, independente
de grupo social, étnico ou racial.

Inclusive, nos estudos de McLaren, a linguagem desempenharia grande


função na transformação dos sentidos de mundo. A língua representa a realidade,
que molda e altera o mundo, como um meio de construção das identidades sociais
e a manutenção das hegemonias culturais (GONÇALVES; SILVA, 2006).
sobre o assunto d
constituído em d
Candau (20

escolar dos estud


didático-pedagóg
estudos sobre a
De acordo

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dos estudantes d
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A pedagogia

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A educação
de forma
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Fontee

Figura 21 – Multiculturalismo e Educação

A diferença nos enriquece...


... O respeito nos une.
Fonte: Disponível em: <http://prodenizeartes.blogspot.com.br/p/
andancas-e-olhares.html>. Acesso em: 10 jun. 2017.

54
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Assim, a educação escolar empreende de forma política e A educação escolar


cultural por meio da linguagem as relações de poder e as formas de empreende de forma
política e cultural por
conhecimento impressos na sociedade. McLaren (2000) apresenta meio da linguagem
os pressupostos que norteiam e apresentam os processos de ensino as relações de
poder e as formas
baseados na pedagogia crítica, como premissas para desenvolver de conhecimento
uma formação crítica por meio da linguagem e experiência social. impressos na
sociedade.
Em primeiro lugar, o conceito de experiência
do estudante é validado como uma fonte primária de co-
nhecimento, e a subjetividade do estudante é vista como
um repositório de significados, construído em camadas
e muitas vezes contraditório. [...] Em segundo lugar, tal
pedagogia tenta oferecer aos estudantes os meios críti-
cos para negociar e traduzir criticamente suas próprias
experiências e formas de conhecimento subordinado. [...]
Em terceiro lugar, um discurso radical de pedagogia deve
incorporar uma teoria da leitura crítica viável que enfo-
que os interesses e pressupostos que informam a própria
geração do conhecimento. Isso é particularmente impor-
tante para o desenvolvimento de uma pedagogia, como
diria Paulo Freire, para ler tanto a palavra quanto o mundo
(McLAREN, 2000, p. 43).

A pedagogia da linguagem e experiência nortearia os processos de ensino e


o
do tema.
dois paradigmas que julgamos serem necessários aos estudos
005) apresenta o pensamento do professor James Banks,

dantes que provêm das camadas populares e dos grupos étnicos.


gicas. Seu objeto de estudo se concentra na questão do fracasso
as questões da multiculturalidade voltados para as premissas
com Candau (2005), o professor James Banks dedica seus

deológicas que imperam na vida social.


desenvolverem uma consciência cultural, baseada na percepção
entidos empreendidos no mundo, de forma crítica. Com o objetivo
os estudantes, no momento em que realizam a leitura da palavra,
a da linguagem e experiência nortearia os processos de ensino e

rítica
squisas
mporÂnea
Estudos

do
ocordo
(McLAREN, 2000, p. 43).
Paulo Freire, para ler tanto a palavra quanto o mundo
para o desenvolvimento de uma pedagogia, como diria
ção do conhecimento.
das hegemonias

lugar,
ormação dos
e formas
os estudos

poremeio

Banks,
mpressos
práticas
edagogiaNegros
s que norteiam
ulturalidade
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da linguagem
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educação
um meio
uma teoria da de
um discurso
sentidos

da linguagem

com Gonçalves
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e:
pedagógicas
crítica,e como
dos Black
e apresentam
tores afro-americanos,

Multiculturalismo
as relações
andancas-e-olhares.html>.
21
discussões
Isso é particularmente
culturais (GONÇALVES;
construção
leitura
radical
de mundo.
de conhecimento
de McLaren, a linguagem

e experiência

Gay e Carlos
na sociedade.
sobre o tema.
premissas

com
– Multiculturalismo
escolar
em: sobre
eAcesso
Silva
empreende
de poder
SILVA, 2006).
interesses e pressupostos que informam a própria gera-
ra o mundo,
rar como crítica das

social.
Studiespara
identidades
viável
de pedagogia
A língua representa
subordinado.

nas desenvolver
A. processos
daMcLaren
área
(2006),
em:
e Educação
a perspectiva
de
10ejun.
as
forma
deve
importante

que enfoque

escolas, e passaram a
Grant. Os de
dos (2000)
Estudos
professores
a Educação
surgiu
ensino
apresenta
sociais

tiveram
Sociais: Gwedolyn
formas
2017.
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ee
dosdeestudos de
multiculturalismo na
os
incorpo-
a realidade,
[...] Em terceiro
desempenharia
gociar e traduzir criticamente suas próprias experiências
tenta oferecer aos estudantes os meios críticos para ne-
étnico ouvezes
racial.contraditório. [...] Em segundo lugar, tal pedagogia
tório deacesso
uais de mesmo significados, construído
para todos em camadas
os estudantes,
e a subjetividade do estudante é vista como um reposi-
grande

e muitas
independente
formulação nas instituições de ensino. O objetivo seria possibilitar
te é validado como uma fonte primária de conhecimento,
ofessoresEmafro-americanos
primeiro lugar, ao conceito
inserção de daexperiência
educação multicultural
do estudan-
aprendizagem nos estudantes, no momento em que realizam a leitura da palavra,
imagem e dos sentidos empreendidos no mundo, de forma crítica. Com o objetivo
dos estudantes desenvolverem uma consciência cultural, baseada na percepção
das produções ideológicas que imperam na vida social.

De acordo com Candau (2005), o professor James Banks dedica seus


estudos sobre as questões da multiculturalidade voltados para as premissas
didático-pedagógicas. Seu objeto de estudo se concentra na questão do fracasso
escolar dos estudantes que provêm das camadas populares e dos grupos étnicos.

Candau (2005) apresenta o pensamento do professor James Banks,


constituído em dois paradigmas que julgamos serem necessários aos estudos
sobre o assunto do tema.

55
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 22 – Paradigmas quanto à relação entre Privação e Diferença Cultural

Fonte: Adaptado de Candau (2005).

Conforme sustenta Candau (2005), há alguns desafios que precisam


ser considerados, para que a efetiva promoção da educação intercultural,
na perspectiva crítica emancipatória, ocorra de fato nas escolas. Assim,
apresentamos algumas ações propostas por Candau (2005), as quais indicam
algumas possibilidades:

• desconstrução dos preconceitos e discriminações na sociedade brasileira;

• questionamentos do caráter monocultural e etnocentrismo;

• articulação das relações entre igualdade e diferença, como na garantia


dos direitos de todos;

• resgate dos processos de construção das identidades culturais;

• promoção de experiências interativas com os "outros" para conhecer


novos sentidos de mundo;

• reconstrução da dinâmica educacional considerando a educação in-


tercultural;

• favorecer os processos de empoderamento que cada pessoa possui,


para que sejam sujeitos de sua vida social;

56
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

• promoção de uma educação intercultural com práticas educativas e


sociais que reconheçam o "outro", considerando os diferentes grupos
sociais e culturais.

Moreira e Candau (2008) nos advertem sobre o "daltonismo Moreira e Candau


cultural" presente nos espaços escolares como uma forma de (2008) nos advertem
sobre o “daltonismo
favorecimento do caráter monocultural da cultura escolar, ou seja, "o cultural” presente nos
daltonismo cultural tende a não reconhecer as diferenças étnicas, de espaços escolares
como uma forma de
gênero, de diversas origens regionais e comunitárias ou a não colocá- favorecimento do
las em evidência na sala de aula por diferentes razões" (MOREIRA; caráter monocultural
CANDAU, 2008, p. 28). da cultura escolar.

Figura 11 – Práticas Pedagógicas e a Diversidade na Escola

Fonte: Disponível em: <http://criancaria.com.br/escola-


manha-ou-tarde/>. Acesso em: 10 jun. 2017.

Podemos salientar algumas razões que acabam influenciando os professores


a desconsiderarem a diversidade em sala de aula, evidenciadas por Moreira e
Candau (2008) como a dificuldade e falta de conhecimento para lidar com
essas questões e a naturalização e neutralidade das diferenças, a ponto de
considerar a multiculturalidade como algo cotidiano na prática educativa.
São situações que incidem no trabalho pedagógico e influenciam práticas
educativas que desconsideram a importância de discussão sobre as diversidades.

57
Educação Integral e Diversidade Cultural

A escola preconiza o processo de ensino e aprendizagem de conhecimentos


considerados universais, porém muitas vezes são determinados pela cultura
ocidental europeia, portadora do dote da universalidade. Em contrapartida, os
estudos multiculturais questionam sobre o universalismo dos conhecimentos,
implicam argumentações sobre o caráter histórico do processo de construção dos
conhecimentos escolares e a relação com os contextos sociais de cada época.

Atividade de Estudos:

1) Analise e aponte, com seus entendimentos, sobre a relação entre


o multiculturalismo e a interculturalidade na educação, incluindo
compreensões sobre a situação atual nas escolas.
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

Algumas Considerações
Nessa etapa de estudos percebemos que a clareza na definição quanto
à multiculturalidade e interculturalidade se integram nos estudos sobre as
relações étnico-raciais desenvolvidas no contexto educacional. Sobretudo,
podemos destacar que o início das discussões sobre os estudos da
interculturalidade iniciaram com a globalização, ou seja, a globalização incidiu
uma sucessão de acontecimentos que desencadeou mudanças na sociedade,
expandindo o contato intercultural, principalmente por meio das tecnologias de
comunicação e informação.

Percebemos também a complexidade das discussões que permeiam o


racismo e o preconceito, que mesmo assegurados em lei sobre o seu indevido
uso social, ainda são veiculados de forma implícita nos discursos de muitos.
Desta forma, reincidimos na necessidade dos estudos sobre o etnocentrismo,
a explicação e entendimentos sobre seu conceito, de forma a organizar um
pensamento contemporâneo da sociedade de forma integral, combatendo a
segregação humana.

58
Capítulo 2 MULTICULTURALISMOEINTERCULTURALIDADE:ADIVERSIDADEÉTNICO-RACIAL
NO CONTEXTO EDUCACIONAL

Nesse sentido, em meio às discussões sobre o etnocentrismo presente no


meio social, emergiram os estudos sobre a educação multicultural. Uma forma
de organizar o pensamento fundamentado nos direitos de igualdade a todos,
independentemente do grupo social, étnico ou racial.

Uma perspectiva de organização educacional que se estreita com os


interesses da Educação Integral, considerando a diversidade como algo
pertencente à sociedade, como algo presente no desenvolvimento das culturas
que se encontram em constante processo de transformação.

ReFerências
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e perspectivas de uma ética intercultural no marco da globalização cultural. In:
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59
Educação Integral e Diversidade Cultural

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60
C APÍTULO 3
Diversidade,Alteridade e Questões de
Gênero

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo, você terá os


seguintes objetivos de aprendizagem:

 Conhecer os conceitos de gênero e diversidade.

 Compreender os estudos sobre sexualidade, alteridade e questões de gênero.

 Entender a constituição da figura feminina na contemporaneidade.

 Refletir sobre as questões da diversidade na educação escolar.


Educação Integral e Diversidade Cultural

62
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

ContextualiZação
Neste capítulo, você aprofundará seus conhecimentos sobre os conceitos de
alteridade, gênero e diversidade. Serão apresentadas definições e o percurso histórico
dos estudos e discussões que permeiam as discussões sobre gênero e diversidade.

Outro tema relevante para o entendimento do assunto diz respeito à compreensão


teórica da teoria queer, às definições de sexualidade e orientação sexual. Com
destaque para os movimentos sociais que ocorreram em anos passados, o contexto
contemporâneo e as relações com as discussões sobre gênero.

Você conhecerá sobre o percurso histórico da posição social da mulher na


sociedade até os dias atuais, as lutas feministas e seus preceitos. Abordaremos
questões quanto à igualdade de gênero na sociedade e aos fatores que incidem
na proliferação das desigualdades sociais.

Apresentamos também o conceito de alteridade, com o intuito de instigar


uma reflexão quanto às práticas desenvolvidas no contexto escolar. Como você
percebe a relação entre as questões de gênero e as práticas desenvolvidas na
escola? Há discussões sobre o assunto?

Apontaremos alguns pressupostos que servirão de sinalizadores para


reflexão de como as práticas educativas, por meio da linguagem, inferem
como disseminadores das desigualdades no contexto escolar e social. Em
compensação, também destacaremos alguns pontos de convergência entre os
estudos de alteridade e educação.

AspectosHistÓricosSobreoEstudode
Gênero e Diversidade
Os estudos sobre as questões de gênero e diversidade na educação
brasileira são recentes, baseados na perspectiva de valorização da igualdade de
gênero e no respeito e reconhecimento cultural da diversidade sexual. O objetivo
atual pontua a transformação das práticas escolares, na busca de problematizar
as lógicas que reproduzem as concepções de desigualdade e opressão.

63
Educação Integral e Diversidade Cultural

O início dos estudos O início dos estudos eclodiu a partir da década de 1970, por
eclodiu a partir da meio dos movimentos feministas, que acabaram influenciando as
década de 1970, por
meio dos movimentos formas de pensar sobre o assunto nas escolas. Neste contexto, os
feministas, estudos incitaram reflexões sobre a condição da mulher na sociedade
que acabaram
influenciando as brasileira, principalmente voltados ao espaço escolar, entendido como
formas de pensar meio formador e reprodutor de desigualdades sociais, e facilitador das
sobre o assunto nas discussões sobre as práticas educativas não sexistas.
escolas.

No final dos anos 1980 as discussões sobre gênero e diversidade passaram


a ser amplamente discutidas nos espaços sociais, principalmente nas escolas
e universidades. Destacamos que nas universidades as discussões estavam
associadas a programas de pós-graduação, nos estudos e pesquisas relacionados
ao gênero e também na área dos estudos gays e lésbicos.

Figura 23 - Aspectos sobre os estudos de gênero e diversidade

Fonte: Disponível em: <http://portal.ifrn.edu.br/campus/natalcentral/noticias/i-seminario-em-


genero-educacao-e-diversidade-do-ifrn-acontece-em-dezembro>. Acesso em: jun. 2017.

Nessa fase, quando as discussões iniciaram nas escolas, geralmente


estavam associadas às disciplinas de Ciências e algumas vezes a de Educação
Moral e Cívica. Assim, por volta dos anos finais de 1980 e iniciais de 1990, surgiram
interesses nas discussões do assunto nas escolas decorrentes das mudanças
comportamentais percebidas na sociedade e o índice de pessoas contaminadas
com a Aids. Tais situações instigaram o Ministério da Educação e o Ministério da
Saúde a estimularem o desenvolvimento de projetos sobre a Educação Sexual
nas instituições de ensino (WEEKS, 1999).

64
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

O termo "gênero" surgiu na década de 1970 com um conceito O termo “gênero”


voltado a questões relacionadas ao caráter social das distinções surgiu na década
de 1970 com um
baseadas no sexo, ou seja, as diferenças sexuais na perspectiva social. conceito voltado
Desta forma, expressava uma rejeição à concepção biológica impressa a questões
relacionadas ao
nos conceitos de sexo ou diferença sexual, referindo-se exclusivamente caráter social das
à caracterização de macho e fêmea nas espécies. distinções baseadas
no sexo, ou seja, as
diferenças sexuais na
O termo gênero, conforme Louro (2003), apresenta uma definição perspectiva social.
voltada para uma dimensão complexa nos estudos sobre o ser humano,
suscita um estudo integrado, contrapondo a dissociação da caracterização que
define os sexos. Ademais, a intenção do termo ao se voltar para o aspecto social
não sugere a questão das diferenças de gênero quanto aos corpos biológicos,
mas prioriza a construção social e histórica sobre as características que os define.

Apresentamos as palavras de Connell (1995, p. 189) na discussão, O conceito de


gênero aponta
quando afirma que "no gênero, a prática social se dirige aos corpos". para o modo como
Sua citação lembra que o conceito de gênero aponta para o modo as características
sexuais são
como as características sexuais são entendidas e representadas na entendidas e
prática social e como constituem o seu processo histórico. representadas na
prática social e como
constituem o seu
As discussões transpassam as características biológicas e processo histórico.
atendem às sociais, porque no campo social são construídas e
reproduzidas as relações entre as pessoas, onde surge a interpretação de
desigualdade. Podemos afirmar, conforme Louro (2003, p. 22), que:

As justificativas para as desigualdades precisariam ser busca-


das não nas diferenças biológicas (se é que mesmo essas po-
dem ser compreendidas fora de sua constituição social), mas
sim nos arranjos sociais, na história, nas condições de acesso
aos recursos da sociedade, nas formas de representação.

Desta forma, segundo Louro (2003), o conceito de gênero com caráter


social feminino e masculino influencia as formas de pensar sobre o assunto,
considerando as particularidades das diversas sociedades e momentos históricos.
Apresenta o gênero como um processo que se constrói no percurso social vivido
historicamente pelos sujeitos, inseridos em grupos diversos de acordo com a
etnia, religiosidade, raça ou classe.

A conotação correta sobre o sentido de gênero abrange a noção de identidade


dos sujeitos, não como uma reprodução dos modos de agir e pensar femininos
ou masculinos. Vale lembrar que a reprodução de papéis remete a uma análise
reducionista das pessoas e das relações interpessoais, enfatizando, inclusive, as
hierarquias de gênero presentes ao longo da história na sociedade.

65
Educação Integral e Diversidade Cultural

O conceito de Assim, o conceito de identidade perpassa uma construção


identidade perpassa plural, múltipla, que se transforma cotidianamente, sendo até mesmo
uma construção
plural, múltipla, em algumas etapas da vida contraditória. A identidade é constituída
que se transforma como algo mutável de acordo com as experiências que as pessoas
cotidianamente,
sendo até mesmo em vivenciam socialmente. Louro (2003, p. 25) propõe que o:
algumas etapas da
vida contraditória. [...] gênero institui a identidade do sujeito (assim como a etnia,
a classe, ou a nacionalidade, por exemplo) pretende-se referir,
portanto, a algo que transcende o mero desempenho de papéis, a
ideia é perceber o gênero fazendo parte do sujeito, constituindo-o.
O sujeito é brasileiro, negro, homem etc. Nessa perspectiva, ad-
mite-se que as diferentes instituições e práticas sociais são cons-
tituídas pelos gêneros e são, também, constituintes dos gêneros.

Nesse sentido, a definição de identidade se interlaça a de gênero


A definição de
identidade se no momento que aponta para a constituição global das pessoas. Na
interlaça a de forma como as práticas cotidianas e as instituições contribuem na
gênero no momento formação dos sujeitos, influenciadas por forças oriundas da justiça,
que aponta para a
constituição global religiosidade, práticas educativas, governo, políticas públicas, relações
das pessoas. de classes, etnias e outros (LOURO, 2003).

Os estudos sobre gênero expressam uma conexão profunda com as


questões de classe e étnico-raciais, referenciando os diversos contextos e suas
especificidades sociais e culturais. Ademais, o indivíduo necessita ser considerado
como um ser singular, com um contexto histórico coletivo, considerando diversas
situações que perpassaram seu convívio social de forma geral.

A estudiosa historiadora norte-america Joan Scott se destaca nas discussões


sobre gênero, principalmente após o lançamento de um artigo, em 1986, que foi
traduzido e lançado no Brasil. Joan Scott trouxe contribuições aos estudos de
gênero influenciada por conceitos pós-estruturalistas, principalmente elaborados
por Michel Foucault e Jacques Derrida (LOURO, 2003).

Em seus estudos, Joan Scott (1986), citada por Louro (2003), corrobora com
a concepção de desconstrução do caráter permanente da oposição
A proposta de
desconstrução das binária presente na sociedade quanto ao masculino e feminino.
dicotomias sustenta Desta forma, as sociedades apresentam um pensamento dicotômico
a premissa que cada a respeito de gênero que necessita ser desconstruído, apontando o
polo; masculino ou
feminino, não se homem e mulher como seres opostos que se relacionam numa lógica
constitui unicamente, de dominação-submissão.
mas apresenta
características
de cada um, A proposta de desconstrução das dicotomias sustenta a premissa
evidenciando um que cada polo; masculino ou feminino, não se constitui unicamente, mas
caráter plural de
pensamento. apresenta características de cada um, evidenciando um caráter plural
de pensamento. A oposição passa a ser construída socialmente, sendo

66
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

que a desconstrução suscita a necessidade de se compreender historicamente a


polaridade masculino-feminino e os processos hierárquicos que estão implícitos
(LOURO, 2003).

Figura 24 – Desconstrução da dicotomia: masculino e feminino

Fonte: Disponível em: <http://acoisatoda.com/2016/06/27/voce-ja-conhece-os-


31-generos-reconhecidos-em-nova-iorque/>. Acesso em: 22 jun. 2017.

Apresentamos outro aspecto a ser compreendido nos estudos sobre gênero,


que diz respeito às questões de sexualidade intrínsecas no tema. Salientamos que
há distinções entre as duas questões: gênero e sexualidade, mais precisamente
entre as identidades de gênero e sexualidade. Recentemente os estudiosos
desenvolveram certas distinções entre os termos.

Figura 25 – Conceito de identidade de sexo e gênero

Fonte: Adaptado de Weeks (1993).

67
Educação Integral e Diversidade Cultural

As identidades sexuais e de gênero se inter-relacionam constantemente no


cotidiano social, por meio da linguagem e as práticas desenvolvidas nas relações
entre as pessoas. Assim, a identidade sexual consiste numa construção instável,
mutável, de acordo com o movimento oriundo das relações sociais que são
contraditórias e em constante reorganização (LOURO, 2003).

Figura 26 – Identidade sexual e de gênero

Fonte: Disponível em: <https://askoutline.wordpress.com/


category/trans/>. Acesso em: jun. 2017.

Segundo Louro (2003), no momento que afirmamos que a construção de


gênero ocorre na constituição histórica da sociedade, compreendemos como as
relações entre homens e mulheres, seus discursos e representações se encontram
_
da seguinte forma_
como objetos de _d
A orientação_
_
para
contexto social. _
a construção
também,
momentos
independente
influênciasde docerta
históric_
uma escolha pessoal,
contraditórias
constante
gênero
vivenciamosvariam das
transfo
soci
econ
ec
mutável,
em
apropriação
formas
Sexual e
permanente
deedeagir,
subje
acope
d
eleitos
compreendida
de “opção
de desejo
como
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como
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entre
relações
que
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contrapõe
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as sexual”,
objetos
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pessoas
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DeFiniçõ
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gênero
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A orientação
a construção
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Assim,
As oidentidad
osocial,
sexo nap
sexual”
Segundo
Estudiosos
Assim,termooAtiv
sexual
term
Lo
Foe

em permanente mudança. Desta forma, as identidades de gênero estão em


constante transformação, salientando que a concepção de desconstrução incide,
também, de certa forma, numa reconstrução de gênero.

Atividade de Estudos:

1) Reflita sobre os conceitos de identidade de gênero e sexo e


disserte apontando as diferenças e como você as percebe no
cotidiano social.
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

68
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

DeFinições de Sexualidade,
Orientação Sexual e Teoria QUEER
Estudiosos e cientistas sociais apresentam uma noção de sexualidade voltada
para a construção da percepção dos corpos, desejos, comportamentos e identidades
que as pessoas desenvolvem ao longo de sua existência, com influências da
apropriação subjetiva cultural, social e histórica. Nesse sentido, as concepções sobre
gênero variam conforme os aspectos culturais, de classe social e de acordo com os
momentos históricos. A cultura ocidental atribui as diferenças sexuais como princípios
para a construção da identidade de gênero (CEPESC, 2009).
A orientação sexual
A orientação sexual trata sobre o sexo das pessoas que são eleitos trata sobre o sexo
das pessoas que são
como objetos de desejo e afeto, a divisão da orientação sexual acontece eleitos como objetos
de diversas formas como algumas exemplificadas na figura 27: de desejo e afeto.,

Figura 27 – Orientação sexual

_______________________________________________
_______________________________________________
a:
_______________________________________________
desejo e afeto, a divisão da orientação sexual acontece
o_______________________________________________
sexual trata sobre o sexo das pessoas que são eleitos
_______________________________________________
o_______________________________________________
da identidade de gênero (CEPESC, 2009).
_______________________________________________
a
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A cultura
numa ocidental
reconstrução
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salientando
aspectos
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2009).
que a concepção
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2017.
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como
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constantemente
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a construção
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Fonte: Adaptado de CEPESC (2009, p. 124).

Assim, o termo
Assim, o termo "orientação sexual" contrapõe a noção de "opção “orientação sexual”
contrapõe a noção
sexual", compreendida como uma escolha pessoal, independente das de “opção sexual”,
influências do contexto social. As maneiras como expressamos nossas compreendida como
uma escolha pessoal,
formas de agir, pensar e sentir refletem sutilmente as experiências que independente das
vivenciamos socialmente (CEPESC, 2009). influências do
contexto social.

69
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 28 – Orientação sexual

Fonte: Disponível em: <http://www.livrariaflorence.com.br/blog/a-diferenca-entre-


sexo-identidade-de-genero-e-orientacao-sexual/>. Acesso em: jun. 2017.

Heilborn (2004) informa que a identidade sexual se expressa no contexto


histórico-cultural segundo a interpretação da concepção de sexualidade,
influenciando na composição da identidade nas pessoas. A invenção da
homossexualidade na metade do século XIX abre preceito para os discursos
médicos e os movimentos sociais.

A produção da homossexualidade, segundo Louro (2013), ao se transformar


numa questão social apropriada politicamente, abre visibilidade às discussões sobre
identidade sexual, contrapondo a heterossexualidade. A concepção de identidade
sexual acompanha as ideias organizadas de forma dicotômica, como já estudamos,
e assinala a crise das premissas sobre a identidade homossexual que surge da
teoria queer. Segundo Miskolci (2012, p. 21, grifo nosso), a teoria queer

70
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

“[...] em termos tanto políticos quanto teóricos, surgiu como


um impulso crítico em relação à ordem sexual contempo-
rânea, possivelmente associado à contracultura e às de-
mandas daqueles que, na década de 1960, eram chamados
de novos movimentos sociais”.

Os principais novos movimentos sociais se distinguiam em três organizações:


movimento pelos direitos civis da população negra no Sul dos Estados Unidos;
movimento feminista da chamada segunda onda; e o movimento homossexual.
Apresentam a denominação de movimento em decorrência de surgirem logo após
o conhecido movimento operário ou trabalhador, oferecendo à comunidade uma
demanda política que transcendia a redistribuição econômica (MISKOLCI, 2012).

Figura 29 – Movimento social

Fonte: Disponível em: <https://fatoseacontecimentos.


wordpress.com/>. Acesso em: jun. 2017.

Os movimentos à época afirmavam que o privado se constituía como algo


político e que a desigualdade se configurava além do econômico. Neste meio,
surgiram também aqueles que apontaram sobre o corpo, desejo e a sexualidade,
como formas de relações de poder.

71
Educação Integral e Diversidade Cultural

A luta feminista apontava a contracepção como controle relativo às


mulheres; aos negros, contra as práticas racistas; e dos homossexuais, contra
os dizeres dos médicos que o classificavam como perigo social e psiquiátrico,
em detrimentos dos padrões morais da época. A teoria queer surgiu em meio
a esses movimentos, em especial na luta por desvincular a sexualidade da
reprodução, enfatizando a importância do prazer e as possibilidades de relação
entre os pares (MISKOLCI, 2012).

Podemos assinalar, de acordo com Miskolci (2012), algumas diferenças entre


o movimento homossexual e os idealizadores da teoria queer:

Figura 30 – Diferenças entre o movimento homossexual e a teoria Queer

Fonte: Adaptado de Miskolci (2012).

72
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

A teoria queer, em 1993, torna-se perceptível em meio à Parada do Orgulho


Gay de São Francisco, um dos principais eventos nos Estados Unidos, que
passou a adotar o queer como tema, idealizado na bandeira "orgulho gay".

Figura 31 – Parada Gay em 1993

Fonte: Disponível em: <http://www.paraiba.com.br/2017/05/17/63319-


considerada-capital-gay-do-brasil-rio-vive-esvaziamento-de-politicas-
dedicadas-a-populacao-lgbt>. Acesso em: jun. 2017.

Podemos afirmar, conforme Miskolci (2012, p. 26), que:

O queer busca tornar visíveis as injustiças e violências impli-


cadas na disseminação e na demanda do cumprimento das
normas e das conversões culturais, violências e injustiças en-
volvidas tanto na criação dos "normais" quanto dos "anormais".
Quer alguém seja completamente ajustado e reconhecido so-
cialmente, quer seja alguém marcado, humilhado, as normas e
convenções operaram sobre os dois e ambos são capazes de
reconhecê-las.

Apresentamos um esquema organizado por Miskolci (2012) que aborda de


forma sucinta a vontade política do queer na luta pró-homossexualidade:

73
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 32 - Esquema sobre o ideal político Queer

Homossexual Queer
Regime de verdade Binário hetero-homo Normal-anormal
Defesa da Crítica aos regimes
Luta política
homossexualidade de normalização
Perspectiva Diversidade Diferença
Concepção de poder Repressora Disciplinar/Controle

Fonte: Miskolci (2012, p. 27).

Atividade de Estudos:

1) Pense sobre a definição da teoria queer e aponte suas


características e as diferenças que apresenta em relação ao
movimento homossexual.
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Um dos responsáveis pela mudança da concepção de poder foi o filósofo Michel


Foucault, principalmente após lançar sua obra "Vigiar e punir". O livro discursa sobre
a noção de poder como algo que se encontra em toda parte e opera incitando as
pessoas a agirem de acordo com os interesses hegemônicos. "Nessa perspectiva,
o poder deixa de ser algo facilmente associado a alguém ou a uma instituição, ao rei
ou à presidência, por exemplo, e passa a ser visto como uma situação estratégica em
uma dada sociedade em certa época" (MISKOLCI, 2012, p. 28).
A partir do final da
década de 1980,
os estudos sobre o Assim, a partir do final da década de 1980, os estudos sobre o
conceito de gênero conceito de gênero e o acesso aos escritos de Foucault sobre a analítica
e o acesso aos
escritos de Foucault do poder influenciaram os movimentos da época. As novas políticas que
sobre a analítica do discutem sobre gênero começam a modificar seus entendimentos sobre
poder influenciaram
os movimentos da a luta e apontam a cultura e suas normas como principais meios de
época. construção dos sujeitos (MISKOLCI, 2012).

74
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Figura 33 - Michel Foucault

Fonte: Disponível em: <http://brenorosostolato.blogspot.com.br/2015/04/


teoria-queer.html?view=timeslide>. Acesso em: jun. 2017.

A filósofa Judith Butler elaborou os preceitos da teoria queer com caráter


discursivo da sexualidade, com novas concepções quanto a sexo, sexualidade e
gênero. Expõem ainda que as normas que regulamentariam o sexo das pessoas
necessitaram da repetição e reiteração para se materializarem nos corpos, ou
melhor, no caráter performativo implícito no gênero, na influência da linguagem
como aspecto construtor dos corpos e sujeitos (LOURO, 2013).

Os estudos de Butler, segundo Salih (2012), consideram o processo de como


o indivíduo assume sua posição como sujeito, em detrimento da experiência
individual ou da concepção singular de indivíduo. Nessa perspectiva, as
identidades são construídas no interior da linguagem e discurso, analisando sob a
ótica da genealogia, seguindo os preceitos apresentados por Foucault.
A genealogia como
uma constituição
A genealogia "[...] não é a história dos eventos, mas a investigação das pessoas que
das condições de emergência [...] daquilo que é considerado como apontam o sexo e
gênero como efeitos
história: um momento de emergência não passa, em última análise, dos processos
de uma fabricação" (SALIH, 2012, p. 21). Em outras palavras, a vivenciados nas
genealogia como uma constituição das pessoas que apontam o sexo instituições, discursos
e práticas.
e gênero como efeitos dos processos vivenciados nas instituições,
discursos e práticas.

75
Educação Integral e Diversidade Cultural

Para Butler (apud SALIH, 2012), a crítica genealógica quanto ao ser "sujeito"
está de acordo com sua identidade generificada e sexuada, constituída de forma
performática, afirma ainda que as pessoas não nascem mulheres ou homens,
mas tornam-se, conforme as ações e o que fazem, acima do que são fisicamente.

Performática não no sentido de performance, em situações em que a pessoa


se identifica com algo, como um ator que exterioriza um personagem. Como "[...]
o gênero demonstra ser performativo – quer dizer, constituinte da identidade que
pretende ser, ou que simula ser. Nesse sentido, o gênero é sempre um fazer,
embora não um fazer por um sujeito que se possa dizer que preexista ao feito"
(SALIH, 2012, p. 90).

Conforme afirma Salih (2012), o gênero não acontece no momento quando


nascemos, mas consiste no processo de atos repetidos que se estruturam até
condensar algo que esteve presente o tempo todo. O gênero se desenvolve como
um processo de repetição constante de ações e práticas que ocorrem por meio da
linguagem.
As identidades
de gênero se
constroem por meio O gênero enquanto identidade performativa construída pelas
da linguagem, de expressões que supostamente são seus resultados. Como um ato que
forma performativa,
ou seja, nos fazeres expressa aquilo que nomeia: homem no sentido masculino e mulher
e relações que quanto ao feminino. As identidades de gênero se constroem por meio
estabelece com o
outro no meio social da linguagem, de forma performativa, ou seja, nos fazeres e relações
inserido. que estabelece com o outro no meio social inserido.

As ConQuistas da MulHer na
Contemporaneidade
Para compreendermos a posição da mulher na sociedade contemporânea,
precisamos relembrar de alguns fatos que ocorreram na história quanto às
discussões sobre gênero. Somente assim conseguiremos expor a importância
sobre os estudos da temática, bem como apresentar subsídios que nortearão
possíveis reflexões em relação à posição da mulher na sociedade.

Os materiais e documentos oficiais registram a figura do homem branco


como principal elemento, desconsiderando as mulheres. Os poucos registros
que apontam sobre a participação feminina no Período Colonial apontam para
as negras, índias e brancas prostitutas. Após a chegada da Corte de Portugal
surgem, em algumas documentações, a participação das mulheres como loucas,
prostitutas ou desajustadas. Ainda quando apareceram como heroínas estavam
associadas a um ato corajoso junto aos seus maridos, geralmente em situações
que acabaram morrendo para salvá-los.

76
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

No período de 1850 até a conquista do voto feminino, em 1934, Após o processo


há materiais escritos pelas mulheres em revistas e periódicos dirigidos de industrialização,
no início do século
para o público feminino. Após o processo de industrialização, no início XX, surgiram
do século XX, surgiram alguns movimentos femininos que ocorreram alguns movimentos
femininos que
simultaneamente, como as sufragistas, tecelãs e costureiras grevistas. As ocorreram
sufragistas lutavam pela conquista do voto e direito à cidadania, até então simultaneamente,
negada. As tecelãs e costureiras grevistas reivindicavam pela redução da como as sufragistas,
tecelãs e costureiras
jornada e melhores condições de trabalho (TELES, 1993). grevistas.

Figura 34 - Mulheres trabalhando no início da industrialização

Fonte: Disponível em: <http://anovademocracia.com.br/no-13/1006-


sorocabana-mulher-operaria>. Acesso em: jul. 2017.

Assim que as sufragistas conquistaram o direito ao voto acabaram se


desmobilizando, contudo, o movimento das mulheres trabalhadoras conseguiu a
redução da jornada de trabalho, igualando aos homens. Na época, as mulheres
trabalhavam em média 16 horas, enquanto que os homens trabalhavam de 10
a 12 horas. Outra conquista foi a proibição do trabalho noturno para mulheres e
menores, juntamente com a instituição de leis trabalhistas.

77
Educação Integral e Diversidade Cultural

Para saber mais sobre o movimento sufragista acesse: <http://


www.educacional.com.br/reportagens/eleicoes_mulheres-politica/
parte-03.asp>.

Confira os textos disponíveis que apresentam conceitos sobre o


assunto. Aprofunde seus conhecimentos!

Com o Estado Novo, período da ditadura de Vargas, ocorreram várias


prisões de opositores ao sistema opressor. As mulheres voltaram a lutar em
movimentos para o restabelecimento da democracia, com organizações femininas
que buscavam a defesa da paz, democracia e a garantia da vida. Algumas
mulheres tiveram destaque nas lutas populares e chegaram a perder suas vidas
no enfrentamento com as forças policiais da época (TELES, 1993).

A partir de 1975, Segundo Teles (1993), a partir de 1975, com a instauração do


com a instauração Ano Internacional da Mulher, as brasileiras retornaram ao movimento
do Ano Internacional
da Mulher, as feminista, com atuação em grupos de estudos, jornadas e campanhas de
brasileiras retornaram mobilização. Na época, uniram-se aos movimentos democráticos, lutando
ao movimento pela anistia e liberdade política, por meio de jornais e outras publicações,
feminista, com
atuação em grupos como cadernos e revistas. Nos textos denunciavam o conservadorismo
de estudos, jornadas das leis, costumes e situações de violação de seus direitos que aconteciam
e campanhas de
mobilização. nos lares, locais de trabalho e na sociedade em geral.

Figura 35 – Selo do ano internacional da mulher

Fonte: Disponível em: <https://ensaiosdegenero.wordpress.com/2013/07/11/mulheres-


e-feminismo-no-brasil-um-resumo-da-ditadura-a-atualidade/>. Acesso em: jul. 2017.

78
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

No evento, as mulheres brasileiras lutaram ainda contra os preconceitos


quanto a homosexualidade e contra o racismo. Além disso, organizaram serviços
de atendimento na área da saúde, social e jurídica, centros de documentação,
comunicação e sindicatos. Apoiaram a criação dos primeiros núcleos de estudos
sobre a questão da mulher e as relações de gênero nas universidades. Incidiram
também na formulação de políticas públicas e atuaram em órgãos governamentais
para implantação de serviços públicos em relação ao atendimento quanto às
reivindicações das mulheres (TELES, 1993).

Em 1980, de acordo com Pitanguy e Miranda (2006), foi um período marcado


pela fase de transição democrática, com um resgate das liberdades civis e
políticas, sobretudo com a promugação da Constituição Federal de 1988. Dessa
maneira, o período contou com vários movimentos de mulheres que
Em 1990 ocorreu
conseguiram um espaço institucional no novo governo democrático, uma ampla
organizando a instituição do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e o produção normativa
nacional sobre a
reconhecimento da plena cidadania das mulheres. regulamentação e
promoção de direitos
Em 1990 ocorreu uma ampla produção normativa nacional sobre humanos e as
garantias individuais
a regulamentação e promoção de direitos humanos e as garantias e sociais, que
individuais e sociais, que contribuíram com o texto da Constituição contribuíram com o
texto da Constituição
de 1988. Ainda, as conferências internacionais das Nações Unidas de 1988.
fortaleceram a luta dos movimentos sociais, incluindo o movimento
das mulheres. Outra participação importante foi das organizações não
governamentais feministas que atuaram na articulação e mobilização Na década de 2000,
os movimentos
internacional e nacional, com o objetivo de efetivarem as políticas prosseguiram
públicas para o enfrentamento quanto às desigualdades de gênero, com suas lutas e
houve o avanço
sociais, regionais e étnico-raciais, que afetaram o exercício da legislativo, decorrente
cidadania pelas mulheres (PITANGUY; MIRANDA, 2006). do trabalho das
organizaçoes
feministas e
Na década de 2000, os movimentos prosseguiram com suas lutas movimentos
e houve o avanço legislativo, decorrente do trabalho das organizaçoes de mulheres,
principalmente
feministas e movimentos de mulheres, principalmente a partir da 1ª a partir da 1ª
Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres. Segundo Pitanguy Conferência Nacional
e Miranda (2006, p. 16): de Políticas para as
Mulheres.
[...] esses documentos se constituíram em parâmetro para
orientar políticas públicas com a transversalidade de gênero e de
raça/etnia.Também nessa década, os programas governamen-
tais de redução da pobreza tiverem impactos positivos sobre a
vida de grande parcela da população feminina.

79
Educação Integral e Diversidade Cultural

A atuação das mulheres brasileiras na década de 1990 e início dos anos de


2000 apresentou consideráveis conquistas nas esferas internacionais e nacionais,
suscitando a garantia de direitos humanos para as mulheres. Neste meio, a
violência doméstica deixou de ser tolerada e passou a ser considerada como uma
violação de direitos, segundo a Conferência Internacional de Direitos Humanos,
realizada em Viena no ano de 1993 (PITANGUY; MIRANDA, 2006).

Outros direitos, como a escolha quanto à reprodução, deslocaram-se do


eixo demográfico para os direitos reprodutivos, discussões que aconteceram
na Conferência Internacional de População e Desenvolvimento, no Cairo em
1994. Os direitos sexuais e os direitos das mulheres foram reafirmados na IV
Conferência Mundial das Mulheres em Beijing, no ano de 1995.

Atividade de Estudos:

1) Reflita sobre a condição social da mulher ao longo da história


e organize uma linha do tempo apontando as características de
cada época, faça um breve apanhado dos seus conhecimentos
sobre o assunto.
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Pitanguy e Miranda (2006) apontam que a Comissão de direitos Humanos


da ONU foi uma das principais responsáveis na fiscalização dos compromissos
afirmados internacionalmente na recomendação de padrões novos, investigação
das violações e prestação de apoio e serviços técnicos aos países necessitados. Em
2000, iniciou o processo de reestruturação das Nações Unidas com a participação da
coligação internacional de organizações de mulheres, que reuniu diversas
Em 2010, foi criada agências que discutiam questões relacionadas à mulher.
a ONU Mulheres,
com o objetivo de
“[...] unir, fortalecer e Desta forma, em 2010, foi criada a ONU Mulheres, com o objetivo
ampliar os esforços
mundiais em defesa de "[...] unir, fortalecer e ampliar os esforços mundiais em defesa dos
dos direitos humanos direitos humanos das mulheres" (BRASIL, 2016, s.p.). A ONU Mulheres
das mulheres” atua na garantia de igualdade dos direitos humanos e apresenta seis
(BRASIL, 2016, s.p.).
áreas de atuação.

80
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Figura 36 – Principais áreas de atuação da ONU mulheres

Fonte: Brasil (2016).

Em março de 2010 ocorreu o lançamento dos Princípios de


Empoderamento das Mulheres no Dia Internacional da Mulher Em março de 2010
no mês de março, organizado pela ONU Mulheres. Os princípios ocorreu o lançamento
dos Princípios de
enfatizam a promoção de igualdade de gênero e o empoderamento Empoderamento
das mulheres, com base nas práticas de negócios pesquisados das Mulheres no
Dia Internacional da
no mundo. Nesse sentido, os Princípios de Empoderamento das Mulher no mês de
Mulheres objetivam apontar as melhores práticas, segundo a março, organizado
dimensão de gênero da responsabilidade efetivada no Pacto Global pela ONU Mulheres.
da ONU, juntamente à função do meio empresarial no aspecto do
desenvolvimento sustentável.

81
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 37 – Princípios de empoderamento das mulheres

Fonte: Disponível em: <http://portuguese.weprinciples.org/


Site/PrincipleOverview/>. Acesso em: jul. 2017.

As feministas
usam o termo Em consonância com Batliwala (1994, p. 129), o termo
empoderamento para
definir o poder em empoderamento atribui o conceito à palavra poder segundo um "[...]
algumas vertentes, controle sobre recursos materiais, intelectuais e ideologia", ou seja,
como considerar: os um controle sobre os recursos disponíveis que estão sob controle
oprimidos ao invés
dos opressores; masculino patriarcal, o controle sobre as decisões e a igualdade de
utilizar o “poder direitos humanos.
para” ao contrário
de “poder sobre”; e
o poder no sentido As feministas usam o termo empoderamento para definir o poder
de substituir a
dominação por em algumas vertentes, como considerar: os oprimidos ao invés dos
competência. opressores; utilizar o "poder para" ao contrário de "poder sobre";

82
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

e o poder no sentido de substituir a dominação por competência. Portanto, as


discussões sobre o empoderamento abrangem os questionamentos sobre as
ideologias e relações de poder impressos na sociedade contemporânea.

O termo empoderamento se refere a uma gama de ativida-


des, da assertividade individual até a resistência, protesto e
mobilização coletiva, que questionam as bases das relações
de poder. No caso de indivíduos e grupos cujo acesso aos re-
cursos e poder são determinados por classe, casta, etnicidade
e gênero, o empoderamento começa quando eles não apenas
reconhecem as forças sistêmicas que os oprimem, como tam-
bém atuam no sentido de mudar as relações de poder existen-
tes. Portanto, o empoderamento é um processo dirigido para
a transformação da natureza e direção das forças sistêmicas
que marginalizam as mulheres e outros setores excluídos em
determinados contextos (BATLIWALA, 1994, p. 130).

Em resumo, podemos afirmar que as discussões sobre o empoderamento


abrangem os seguintes objetivos:

• Questionamento da ideologia patriarcal;

• Transformação das estruturas e instituições que apoiam a discriminação


de gênero e desigualdades sociais;

• Criação das condições, para as mulheres, de acesso e controle sobre os


recursos materiais e informacionais;

• Intenções que norteiam as lutas e discussões feministas sobre o empodera-


mento das mulheres e a garantia e igualdade de direitos humanos a todos.

Para saber mais sobre o movimento feminista acesse, no site do


MEC, o caderno “Olhares Feministas” e conheça mais sobre o assunto.

Acesse em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_


docman&view=download&alias=639-vol10feministas-pdf&category_
slug=documentos-pdf&Itemid=30192>.

Amplie seus conhecimentos e bons estudos!

83
Educação Integral e Diversidade Cultural

Igualdade de Gênero
Por muito tempo o Brasil sustentou os princípios discriminatórios
Por muito tempo do Código Civil de 1916. O documento privilegiava o sistema patriarcal
o Brasil sustentou em detrimento da figura feminina na sociedade, assegurando a
os princípios anulação do casamento caso a mulher não fosse virgem. A mulher
discriminatórios do
Código Civil de 1916. também ficava isenta de receber herança caso apresentasse um
comportamento desonesto, não legitimava os filhos nascidos fora
do casamento. Assim que casava, a mulher perdia sua capacidade civil, sendo
igualada aos menores de idade, necessitando da permissão de seu marido.

O Código Civil perdurou até o ano de 1962, quando foi revogado pelo
"estatuto da mulher casada" com a Lei nº 4.121/1962. O texto avançou no
sentido do tratamento paritário entre os cônjuges, mas ainda continuou afirmando
sobre as diferenças de gênero, como no caso das mulheres consideradas como
concubinas.

A partir do ano de A partir do ano de 1975, caracterizado como o Ano Internacional


1975, caracterizado da Mulher, iniciou o avanço de algumas conquistas em relação à
como o Ano
Internacional da cidadania para as mulheres brasileiras. O direito ao divórcio, no ano
Mulher, iniciou o de 1977, garantido pela Lei nº 6.515/77 e com a criação da Nova
avanço de algumas
conquistas em República, iniciou as conquistas práticas e jurídicas preconizadas na
relação à cidadania Constituição Federal de 1988 (PITANGUY; MIRANDA, 2006).
para as mulheres
brasileiras.
A Constituição Federal de 1988 simboliza um marco fun-
damental na instituição da cidadania e dos direitos huma-
nos das mulheres no Brasil. O texto constitucional inau-
gura os princípios democráticos e rompe com o regime
autoritário militar instalado em 1964. Pela primeira vez na
história constitucional brasileira consagra-se a igualda-
de entre homens e mulheres como um direito fundamental.
O princípio da igualdade entre os gêneros é endossado no âm-
bito da família, quando o texto estabelece que os direitos e
deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igual-
mente pelos homens e pelas mulheres (PITANGUY; MIRAN-
DA, 2006, p. 23).

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), garante os direitos


fundamentais como dignidade, liberdade, privacidade e igualdade de tratamento
perante a lei. Assim, as reformas legais estabelecidas após a Constituição de
1988 ocorreram no meio social onde pulsavam mecanismos institucionais estatais
para a promoção de igualdade de gênero.

84
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Em 1982, com a primeira eleição direta para governadores, foram criados os


conselhos estaduais de direitos da mulher nos Estados de São Paulo, Goiás, Rio
de Janeiro e Paraná. No ano de 1985, no início do primeiro governo civil, surgiu
o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher – CNDM, com sede no Ministério da
Justiça. O Conselho atuou na mobilização das organizações de mulheres durante
a organização da nova Constituição e negociação da garantia plena de igualdade
e direitos as mulheres (ALVES; CORREA, 2009).

Figura 38 – Igualdade de gênero

Fonte: Disponível em: <http://saludocupacionaljaimes.blogspot.com.


br/2016/05/no-la-desigualdad-de-genero.html>. Acesso em: jul. 2017.

A educação foi historicamente considerada como um privilégio reservado


aos homens. No final do século XX, diversas conferências mundiais voltaram
suas discussões para a garantia de igualdade do direito à educação para todos,
incluindo as mulheres. Deste modo, as diversas conferências estabeleceram
metas e objetivos que visavam à igualdade de gênero para as mulheres. Segundo
Alves e Correa (2009, p. 141):

Muitos estudos indicam que níveis mais elevados de escolari-


dade estão associados com o aumento da cidadania de ambos
os sexos e o empoderamento das mulheres, as quais com ní-
veis educacionais mais altos geralmente têm mais capacidade
de melhorar a própria qualidade de vida e a de suas famílias.

Segundo Alves e Correa (2009), alguns estudos indicam que o impacto da


educação aumenta de acordo com a situação igualitária entre as pessoas na
sociedade. Contrapondo a sociedades em que os homens possuem maiores
chances de acesso em relação às mulheres, nesses casos, a educação não será
transformadora, sendo limitada pelas condições de poder.

85
Educação Integral e Diversidade Cultural

No século XXI No século XXI aconteceram as maiores conquistas das mulheres


aconteceram as em relação ao acesso à educação, quando ultrapassaram os homens
maiores conquistas
das mulheres em no que diz respeito à alfabetização, anos de estudo e educação
relação ao acesso à média. No século XXI as mulheres se encontravam com níveis de
educação, quando
ultrapassaram educação superior aos dos homens, com uma diferença que persiste
os homens no nos dias atuais.
que diz respeito
à alfabetização,
anos de estudo e O Estado, por meio das políticas públicas, influencia a construção
educação média. da igualdade, na regulação das leis, mudanças culturais e condições
de vida das mulheres, na proposição de políticas que atuam nas
dimensões de gênero e raça. Nesse sentido, o Estado necessita reconhecer as
solicitações das mulheres e admitir a existência das desigualdades para assumir
um posicionamento com ações que consigam combater e reverter tal situação
(SOARES, 2004).

O movimento das
mulheres infere O movimento das mulheres infere sobre a necessidade da
sobre a necessidade construção de novas formas de relações entre homens e mulheres,
da construção de preconizando uma sociedade plural e democrática. Uma organização
novas formas de
relações entre social que contrapõe a subordinação e dependência das mulheres,
homens e mulheres, que sustente a igualdade, relações mais justas e democráticas com a
preconizando uma
sociedade plural e efetiva atuação e compromisso do Estado.
democrática.

Para você saber mais sobre o processo de desigualdade


presente na sociedade, acesse o Relatório sobre o desenvolvimento
mundial de 2012. Confira o documento e amplie seus conhecimentos!

Acesse a obra completa no endereço: <http://siteresources.


worldbank.org/INTWDR2012/Resources/7778105-1299699968583/7
786210-1315936231894/Overview-Portuguese.pdf>.

Segundo Soares (2004), as políticas públicas para assegurarem a garantia


de igualdade de direitos e condições sociais precisarão enfrentar, primeiramente,
as situações, ideologias e estruturas que constroem as desigualdades no
cotidiano. Necessitam lutar contra a falta de autonomia pessoal e econômica,
a desigualdade na divisão sexual do trabalho, na família, autonomia do corpo
e sexualidade, racismo, preconceitos e principalmente romper com o silêncio
invisível das mulheres. São eixos que necessitam ser especificados:

86
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Figura 39 – Eixos que contribuem com a desigualdade

Fonte: Adaptado de Soares (2004, p. 118).

Como podemos perceber, para o Estado conseguir atuar contra as


desigualdades, faz-se necessário discussão sobre a realidade cotidiana de
mulheres e homens. Somente após um diagnóstico preciso conseguirá construir
políticas que mobilizem esforços para a redistribuição justa dos recursos entre
todos. Para tanto, será preciso realizar uma reforma legal dos programas e
serviços ofertados, objetivando um acesso igualitário aos recursos da educação,
econômicos, culturais e de pesquisa.
87
Educação Integral e Diversidade Cultural

Para o Estado agir nos eixos que promovem a desigualdade, necessita


organizar políticas públicas que atuem diretamente nos seguintes âmbitos:

Figura 40 – Políticas públicas para combater a desigualdade

Fonte: Adaptado de Soares (2004, p. 119).

Soares (2004) lembra Soares (2004) lembra que nas discussões sobre o tema
que nas discussões surgem três termos que se complementam na relação intrínseca
sobre o tema surgem que estabelecem de forma conceitual: desigualdade, exclusão e
três termos que se
complementam na vulnerabilidade. A desigualdade de renda, oriunda da estrutura
relação intrínseca econômica baseada na pobreza, na carência de acesso e dos recursos.
que estabelecem
de forma conceitual: A exclusão como resultado da carência de acesso aos diversos
desigualdade, recursos, que influenciam nas desvantagens da pessoa em atuar no
exclusão e cotidiano. A vulnerabilidade que apresenta os processos sociais como
vulnerabilidade.
condutores de adversidades, gerando uma ausência de adaptação das
pessoas às novas situações.

As mulheres compreendem uma classe vulnerável a situações de pobreza,


decorrente da exclusão de determinados processos sociais, que geram uma
desigualdade presente na sociedade. A falta de autonomia econômica direciona as
mulheres para uma situação complexa, aumentando a probabilidade de fazerem
parte dos índices de pobreza, ao contrário das que se mantém em circunstâncias
familiares ou conjugais. Desta forma, um dos fatores primordiais para remediar
a situação seria o desenvolvimento de políticas que reforcem a autonomia
econômica das mulheres, rompendo o círculo da dependência e subordinação.

88
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Alteridade e Questões de Gênero: uma


Educação Para Todos
O processo de globalização da economia e meios de comunicação
influenciaram no aumento dos conflitos nas relações entre os diversos grupos
sociais, atingindo, inclusive, os espaços escolares. Assim, atualmente vivemos
tempos de uniformização de padrões culturais que interferem nas relações sociais,
evidenciando as diferenças nas pessoas.

Neste ínterim, as identidades se tornaram fluídicas, uma das consequências


da globalização, que ao mesmo tempo infere uma uniformização e a diferenciação
dos grupos culturais e indivíduos na conjuntura social. Desta forma, Pacheco
(2004, p. 5) infere que:

[...] nesse período povoado pelas tecnologias da informação


pela compreensão das distâncias [...] nesse contexto em que
caem por terra as fronteiras nacionais e no qual os produtos,
das mais diversas culturas, dos mais diversos países, invadem
sem pedir licença [...] a identidade cultural se configura – en-
quanto resultado desse contexto – muito menos fechada, muito
menos estável e estática e, principalmente, muito menos ‘na-
cional’ do que era na época moderna.

Assim, a alteridade surge como uma expressão do social, uma noção do


outro que ressalta como uma diferença no cotidiano social, quando se efetiva por
meio das dinâmicas nas relações sociais. Consequentemente, a diferença atua
como base da vida social e gera tensões e conflitos (VELHO; ALVITO, 1996).

Figura 41 – Conceito de alteridade

Fonte: Disponível em: <https://www.dicio.com.br/alteridade/>. Acesso em: jul. 2017.

89
Educação Integral e Diversidade Cultural

Apresentamos os dizeres de Laplantine (2000, p. 21), que contribuem na


discussão sobre o assunto:

A experiência da alteridade (e a elaboração dessa experiência)


leva-nos a ver aquilo que nem teríamos conseguido imaginar,
dada a nossa dificuldade em fixar nossa atenção no que nos
é habitual, familiar, cotidiano, e que consideramos ‘evidente’.
Aos poucos, notamos que o menor dos nossos comportamen-
tos (gestos, mímicas, posturas, reações afetivas) não tem real-
mente nada de ‘natural’. Começamos, então, a nos surpreen-
der com aquilo que diz respeito a nós mesmos, a nos espiar.
O conhecimento (antropológico) da nossa cultura passa inevi-
tavelmente pelo conhecimento das outras culturas; e devemos
especialmente reconhecer que somos uma cultura possível
entre tantas outras, mas não a única.

Desta forma, o reconhecimento e a aceitação das diferenças concretizadas


na experiência da identificação cultural das diversidades consiste no fenômeno
que estimula a alteridade acontecer nas ações e valores das pessoas e grupos
sociais. Ademais, a importância das relações com o outro gera a construção da
própria consciência do eu.

De acordo com Silva (2002), a diferenciação consiste no principal responsável


por construir e produzir a alteridade, quando definimos quem é o outro e o
identificamos, o assinalamos. Quando dividimos, separamos, classificamos,
normatizamos, a diferenciação assume um caráter de hierarquização, ou seja,
uma determinada identidade passa a ser instituída como norma, uma forma
privilegiada de identidade acima das demais, de forma positiva em detrimento das
outras diferentes, consideradas como negativas.

A consciência de nação cultural hierarquizada requer a aplicação de


alguns dispositivos que precisam ser incorporados para representar a nação e
efetivamente produzir significados à sociedade. Bauman (2005, p. 199) infere
que os Estados-nação “[...] não se lançaram à tarefa no escuro, seu esforço tinha
o poderoso apoio da imposição legal da língua oficial, de currículos escolares e
de um sistema legal unificado”. Em vista disso, podemos citar a língua, raça e o
contexto histórico como formas homogeneizadoras para formação das identidades
e consciência nacional, gerando uma sensação de pertencimento nacional.

90
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

Figura 42 – Alteridade subjetivada

Fonte: Disponível em: <http://poetamasnemtanto.blogspot.com.


br/2016/01/alteridade.html>. Acesso em: jul. 2017.

Na contemporaneidade, as novas formas de identidade e Na


contemporaneidade,
alteridade são produzidas em paralelo no cotidiano social. A relação as novas formas de
entre identificação e exclusão apresentam peculiaridades que advêm identidade e alteridade
são produzidas em
do contexto social, econômico, espacial e temporal do mundo pós- paralelo no cotidiano
moderno. social.

A alteridade é a ação de se colocar no lugar do outro nas relações


interpessoais que ocorrem na sociedade. A prática da alteridade ocorre nos
relacionamentos entre as pessoas e os diversos grupos culturais, religiosos,
científicos, étnicos e outros, enfim, na relação que estabelece com os outros.

Assim, como resultados da materialização de novos outros – eles – e


diferentes formas de controles e de colocar em seus devidos lugares, surgem novas
formas de representação. A relação entre identidade e diferença e a dependência
entre ambas gera os novos diferentes, para normalizar as novas identidades que
surgiram no contexto social atual. As pessoas reconhecem a sua essência a partir
do momento que se relacionam com o outro, por meio da alteridade compreendem,
principalmente, as ações dos outros em seus diversos contextos.

A educação, baseada na perspectiva da alteridade, concebe A educação, baseada


na perspectiva da
o processo construído pelas relações que se estabelecem entre os alteridade, concebe o
diferentes. Assim, as relações interativas que acontecem geram a processo construído
pelas relações que se
aprendizagem de conceitos, informações, compreensão dos diversos estabelecem entre os
contextos e entendimentos sobre seus significados. diferentes.

91
Educação Integral e Diversidade Cultural

Atividade de Estudos:

1) Reflita e disserte sobre o conceito de alteridade e faça uma


relação com o seu cotidiano. Aponte exemplos em que você
encontra a alteridade constituída nas ações sociais.
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Fleuri (2006, p. 32) discorre sobre como a prática educativa do professor


pode favorecer a discussão sobre alteridade:

[...] particular atenção às relações e aos contextos que vão se


criando, de modo a contribuir para a explicitação e elabora-
ção dos sentidos [...] que os sujeitos em relação constroem e
reconstroem. Nesses contextos, o currículo e a programação
didática, mais do que um caráter lógico, terão uma função eco-
lógica, ou seja, sua tarefa não será meramente a de configurar
um referencial teórico para o repasse hierárquico e progressi-
vo de informação, mas prever e preparar recursos capazes de
ativar a elaboração e circulação de informações entre sujeitos,
de modo que se auto-organizem em relação de reciprocidade
entre si e com o próprio ambiente.

De modo geral, o desenvolvimento de ações pedagógicas que apresentam


a noção de alteridade permeia uma pluralidade de possibilidades e desafios.
Principalmente, na necessidade do reconhecimento do outro como parte
integrante de si, para além do mundo teórico, que seja reconhecido nas situações
e eventos cotidianos como valor social e educativo.

Para compreendermos melhor o lugar da escola, ou seja, o espaço escolar


como um dos locais frequentados por todos e assegurado por lei (LDB/96),
Foucault (1987, p. 153) afirma que:

92
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

A disciplina "fabrica" indivíduos: ela é a técnica específica de


um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como ob-
jetos e como instrumentos de seu exercício. Não é um poder
triunfante [...]; é um poder modesto, desconfiado, que funciona
a modo de uma economia calculada, mas permanente. Hu-
mildes modalidades, procedimentos menores, se os compa-
rarmos aos rituais majestosos da soberania ou aos grandes
aparelhos de Estado.

O processo de fabricação dos sujeitos inferido nas instituições escolares


ocorre de forma sutil, em meio as práticas cotidianas que envolvem os integrantes
da comunidade escolar, em especial os estudantes. Uma das tarefas eminentes
quando se discute alteridade, diz respeito a instigar a desconfiança das
concepções naturalizadas no contexto escolar (LOURO, 2003).

Para Louro (2003), os currículos, normas e procedimentos de ensino, as


teorias, linguagens, materiais didáticos, processos de avaliação, enquanto
produtores de significados, das diferenças de gênero, sexualidade, etnia e
classe. Desse modo, há necessidade de se questionar sobre como os sentidos
e o processo de ensino e aprendizagem ocorre nas escolas. Qual caráter ou
significado constrói por meio dos afazeres pedagógicos no cotidiano escolar?
Que tipo de subjetividade acaba construindo ou reproduzindo?

A linguagem, como indica Louro (2003), seria o principal provedor A linguagem, como
de divulgação subjetiva do sexismo, racismo e etnocentrismo. Uma indica Louro (2003),
seria o principal
alternativa apontada revela o uso dos questionamentos como forma provedor de
propulsora de implosão das ideias enrijecidas sobre as relações que divulgação subjetiva
do sexismo, racismo e
inferem a desigualdade nos espaços educativos. etnocentrismo.

A problematização num contexto amplo, que infira sobre as múltiplas e


complexas combinações de gênero, sexualidade, classe, raça e etnia, provocando
os estudantes a repensarem sua presença e a do outro no contexto social. Nessa
forma de conceber a educação, há necessidade de se questionar as relações
de poder que compartilhamos e assentimos, por meio da linguagem, transpassar
aquilo que consideramos natural. Em suma, a linguagem expressa relações,
poderes, lugares, mas também institui e produz as diferenças vivenciadas no
contexto social e educacional.

Louro (2003) afirma ainda que a linguagem institui e aponta os lugares de


cada um por meio das diferenças adjetivadas atribuídas às pessoas. No uso
dos diminutivos, verbos, associações e analogias realizadas entre determinadas
qualidades e comportamentos, gênero, raças, etnias, classes, sexualidade e
outros, atravessa as práticas educativas, estabelece sentidos e significados que
serão incorporados e exteriorizados nas ações cotidianas.

93
Educação Integral e Diversidade Cultural

Algumas Considerações
Com o término dos estudos desse capítulo percebemos que as discussões
sobre as questões de gênero e diversidade na sociedade brasileira não se
encerram por enquanto. Consistem em temas atuais, de fundamental relevância
nos debates e embates que ocorrem nos espaços escolares. Imprimem um sentido
de se analisar os entendimentos dos professores e outros profissionais quanto ao
assunto, expressos nos discursos escolares. E você, o que pensa a respeito?
Qual seu entendimento em relação às discussões de gênero e diversidade? Qual
sentido tem seu discurso?

Questões que norteiam reflexões sobre nosso entendimento são expressas


nas falas, ações e atitudes que deixamos transparecer no cotidiano. Desta forma,
os estudos sobre gênero e diversidade incluem também os aspectos que inferem
sobre a figura da mulher na contemporaneidade. Qual seria o papel da mulher na
sociedade atual? Conseguiu a garantia plena dos direitos e deveres preconizados
na Constituição Federal de 1988? Ou ainda, em muitos espaços se mantém de
forma submissa e alheia em relação a decisões sociais?

São muitos questionamentos que inferem análises, que tumultuam formas


tradicionais de pensamento e suscitam por transformações condizentes à
sociedade contemporânea. Nesse sentido, os estudos quanto à alteridade auxiliam
no processo de entendimento sobre a formação conceitual de diversidade,
dos movimentos sociais e as questões de identidade social. Compreensões
necessárias à formação de profissionais que estarão atuando nos processos
de ensino e aprendizagem, no desenvolvimento de cidadãos, na construção de
conceitos e significados sobre a representação científica e social.

ReFerências
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panorama preliminar, 15 anos depois do Cairo. In: Seminário Brasil, 15 anos
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BAUMAN, Z. Identidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

94
Capítulo 3 DIVERSIDADE, ALTERIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO

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Educação Integral e Diversidade Cultural

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96
C APÍTULO 4
A Relação da Diversidade Social com a
Desigualdade Econômica

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo, você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Distinguir as características que determinam a desigualdade econômica e social.

 Compreender a influência das desigualdades na conjuntura educacional.

 Entender sobre as desigualdades presentes na sociedade e sua influência nos


processos educacionais.
Educação Integral e Diversidade Cultural

98
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

ContextualiZação
Você estudará nesse capítulo sobre as relações que existem entre a
diversidade social e a desigualdade econômica, e ao longo de seus estudos
verificará a presença constante de termos como globalização e capitalismo.
Assim, apresentaremos um breve contexto histórico para situar os elementos que
acentuaram a desigualdade econômica.

Para conseguirmos nos aprofundar nos estudos sobre a diversidade social,


precisamos conhecer sobre um termo que surge associado, a pobreza. Você sabia
que o significado do conceito de pobreza sofreu alterações ao longo dos anos?
Pois bem, traremos um breve texto que elucida sobre os diversos conceitos até a
contemporaneidade, para compreendermos as intencionalidades da construção
atual do pensamento sobre a pobreza.

Evidenciamos, também, concepções que apontam quanto à formação da


desigualdade social, objetivando a compreensão de sua sistemática e a quem
serve o modelo econômico e social contemporâneo. Em se tratando do modelo
econômico atual, enfatizamos um texto que explicará a sua relação com a
produção das desigualdades, estudos revelam uma intrínseca vantagem em sua
manutenção social.

Concluímos o capítulo abordando sobre as influências da desigualdade na


educação brasileira e sua relação com a inserção da Educação Integral. Uma
educação que privilegia tempos e espaços diferenciados de se pensar e fazer
uma escola, no intuito de uma educação emancipadora que garanta o prescrito
em lei, quanto ao acesso, igualdade e permanência da educação para todos.

Contexto HistÓrico da Desigualdade


Econômica
A ascensão do neoliberalismo a partir dos anos de 1980 repercutiu em
prejuízo para os menos privilegiados em relação à distribuição de renda. Uma
quinta parte da população mundial mais rica passou a receber 50 vezes mais
que a quinta parte mais pobre. Desta forma, a distribuição de renda desigual
assinala que 1% dos mais ricos detêm a metade dos bens em âmbito mundial
(MOSQUEIRA; FAHIMI, 2014).

99
Educação Integral e Diversidade Cultural

Nesse sentido, a acentuada desigualdade atinge as perspectivas de


crescimento econômico, gera o aumento das crises e enfraquece as tentativas de
diminuir a pobreza no país. Mas como tudo isso começou? Quais foram as causas
que geraram o aumento de desigualdade da distribuição da renda mundial?
Faremos um breve percurso histórico sobre algumas premissas que geraram as
desigualdades, identificadas na sociedade contemporânea.
Ao longo dos tempos,
a humanidade sofreu Ao longo dos tempos, a humanidade sofreu transformações
transformações nas nas formas de conceber e organizar os meios de produção, na
formas de conceber
e organizar os meios sua comercialização e perspectivas de subsistência. Assim, dois
de produção, na movimentos históricos desencadearam uma sucessão de fatos que
sua comercialização
e perspectivas de contribu para o desenvolvimento da proliferação das desigualdades
subsistência. econômicas.

Figura 43 – Movimentos históricos desencadeadores das desigualdades

Fonte: Adaptado de Dowbor (1994).

Dowbor (1994) Desse modo, Dowbor (1994) aponta que a partir do século XVI
aponta que a partir os dois movimentos responsáveis pelas desigualdades e a atual
do século XVI os concepção de pobreza foram: o Capitalismo e a Revolução Industrial. O
dois movimentos
responsáveis pelas capitalismo, entendido como uma forma de governo e mercantilização,
desigualdades e a surgiu entre os séculos XIII e XIV, com o aparecimento da burguesia.
atual concepção
de pobreza foram: Apresentamos uma organização sintetizada da evolução do
o Capitalismo e a capitalismo ao longo dos séculos, até os primórdios da globalização,
Revolução Industrial. com a finalidade de auxiliar no entendimento do assunto.

100
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Figura 44 – Processo de evolução do capitalismo

Etapas da evolução capitalista


Seculo XVI XVII XVIII XIX 1850 XX 1914/18
Capitalismo comercial Capitalismo Industrial
Feudalismo Carbulifera Petrolifera
textil quimica
naval elétrica
motores
Mercantilismo
• Expansão maritima Primeira revolução Segunda Revolução 1º Guerra
• Acumulação primitiva industrial Industrial Mundial
de capitais Reino Unido Fraca Eua EUA
Alemanha Alemanha
Japão
Canadá
Russia
Colonialismo LIBERALISMO
Partilha da America Imperialismo
• 1885 Congresso de Berlim • Rev . Russa
Partlha da África

1914/18 1929 1939 - 45 1950 1960 1979 1980 2000


Capitalismo Financeiro Globalização

2º Guerra
Mundial
Imperialismo Descolonização Terceira Revolução Industrial
monopolios e ologopolios Subdesenvolvimento EUA / Japão
NIC s periodo tecníco e cientifico
(trutes e carteis)
conglomerados

Liberalismo Kenysianismo Neoliberalismo


Intervenção do estado na ecônomia Thatcher (Reino Unido)
Formação (Welfare state) Reagan {EUA}
Globalização da econômia
Crise de 29: quebra da bolsa de NY Colapso do Socialismo
Fim da URSS

Fonte: Disponível em: <http://geoconceicao.blogspot.com.br/2010/05/


evolucao-do-capitalismo.html>. Acesso em: 10 jul. 2017.

Naquela época, a nova classe que se erguia, os burgueses, almejava o


lucro por meio das relações comerciais, sendo donos das riquezas e dos meios
de produção. Após alguns séculos, o capitalismo se estrutura como uma forma
de governo, baseado na produção, relações comerciais e lucratividade (HUNT;
LAUTZENHEISER, 2013).

101
Educação Integral e Diversidade Cultural

Hunt e Lautzenheiser (2013) lembram ainda que a atual proposta capitalista-


liberal defende o Estado mínimo, ou seja, a redução da intervenção do Estado
nas relações mercantis e econômicas, favorecendo o aumento das desigualdades
sociais. Assim, o livre mercado desencadeou a concorrência e a competitividade,
atingindo os pequenos produtores e reforçando a venda de mão de obra. Outra
característica consiste no individualismo, preconizado pela valorização dos
interesses pessoais em detrimento da coletividade, também favorecendo o
aumento das desigualdades sociais.
O período de
transição entre o Dowbor (1994) cita o outro movimento responsável pelo
Capitalismo e a agravamento das desigualdades econômicas, a Revolução Industrial
Revolução Industrial
desencadeou e o impacto nas relações de trabalho e urbanização. O período de
profundas transição entre o Capitalismo e a Revolução Industrial desencadeou
mudanças sociais profundas mudanças sociais que resultaram em desigualdades.
que resultaram em
desigualdades.

Para um melhor entendimento sobre a Revolução Industrial,


deixamos a dica do filme “Tempos Modernos”, lançado no ano de
1936. O ator Charles Chaplin interpreta um operário, o Carlitos,
que vivencia a rotina de trabalho da sociedade industrial. De forma
satirizada, o filme representa os efeitos da industrialização e do
capitalismo na vida de muitos empregados da época.

O filme deixa alguns questionamentos que remetem a reflexões


sobre os efeitos do capitalismo na vida das pessoas! Confira!

A Revolução Industrial iniciou no processo de consolidação do Capitalismo


como uma forma de governo, principalmente nos países ocidentais. Sobretudo,
ocasionando consequências devastadoras no âmbito social, como a precarização
das condições de vida, intelectuais e do trabalho, que facilitaram a exploração
de classe. Tal situação intensificou o surgimento dos operários e uma situação
peculiar entre as relações de capital. Com baixos salários, necessidade de
qualificação profissional perante a demanda do trabalho, favoreceu o aumento
das riquezas para os donos do capital, condicionando a todos numa forma do
vínculo social individualizado (GIANNOTTI, 2007).

102
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

O novo mundo que surgia, oriundo do Capitalismo e da Revolução O novo mundo que
Industrial, desencadeou a migração das pessoas em busca de surgia, oriundo do
Capitalismo e da
empregos, forçando-as a abandonar as terras e o trabalho artesanal. Revolução Industrial,
A demanda resultou na perda da identidade cultural e social e no desencadeou
aumento da população urbana. a migração das
pessoas em busca de
empregos, forçando-
A modificação da estrutura social gerou um diferencial entre o as a abandonar as
número das oportunidades de emprego e a quantidade de pessoas terras e o trabalho
artesanal.
que procuravam empregos, resultando na marginalização, pobreza e
subemprego. As pessoas, em sua maioria, acostumadas com os afazeres rurais,
desconheciam as habilidades técnicas exigidas pela produção industrial, o que
favoreceu a exploração e a oferta de baixos salários aos operários.

A união de Capitalismo e Revolução Industrial fez com que o trabalhador


perdesse a noção de fraternidade, do conceito da coletividade existente
naquela época na convivência rural. Desta forma, a ascensão das recompensas
econômicas influenciou o comportamento das pessoas, gerando uma
preocupação com o desenvolvimento do sustento individual acima das relações
sociais e o descaso sobre a pauperização social (GIANNOTTI, 2007).

O desequilíbrio social, econômico, agrário, educacional e produtivo O desequilíbrio


originou o surgimento de um novo ator social: o pobre. Sobretudo, a social, econômico,
pobreza no conceito atual, como uma forma associada a características agrário, educacional
e produtivo originou
individuais de promiscuidade, vadiagem, incompetência, preguiça, o surgimento de um
criminalidade e vagabundagem. novo ator social: o
pobre.
Para Harvey (2005), tais atributos foram provocados como
necessidade da manutenção do sistema econômico vigente. Assim como a
intenção de desempregados na sociedade para manter os salários baixos das
pessoas empregadas, como uma justificativa para manutenção de um grupo de
reserva do trabalho, segundo a definição teórica de Marx.

Atividade de Estudos:

1) Pense sobre os fatores que originam as desigualdades e


descreva sua relação com o Capitalismo e a Revolução Industrial,
dois movimentos que se interligam com a discussão.
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103
Educação Integral e Diversidade Cultural

Conceito de PobreZa
O conceito de O conceito de pobreza sofreu alterações conforme o percurso
pobreza sofreu
alterações conforme histórico dos entendimentos sobre as representações sociais, ou seja,
o percurso a figura do pobre sempre esteve presente na sociedade humana. Na
histórico dos antiguidade teocêntrica, o pobre era considerado um estado definitivo
entendimentos sobre
as representações da vontade divina. Aceitável socialmente, acabou desencadeando
sociais, ou seja, uma série de ações religiosas voltadas para a caridade (REZENDE
a figura do pobre
sempre esteve FILHO, 2009).
presente na
sociedade humana. Nesse período, a Igreja mantinha o pobre na condição de pobreza
por meio da doação de donativos financeiros, sistematizando um
assistencialismo e comodismo social. Para a sociedade da época, enfrentar
a pobreza significava ir contra a vontade de Deus, ou melhor, da organização
religiosa. O pobre era interpretado como uma situação naturalizada que
complementava a existência da Igreja, em que um dos principais trabalhos era
a caridade aos pobres, repassando os donativos dos ricos aos desafortunados
(FELTRAN, 2005). Nas palavras de Castel (1998, p. 64-65):

[...] estabelece-se um comércio entre o rico e o pobre, com


vantagens para as duas partes: o primeiro ganha sua salvação
graças a sua ação caridosa, mas o segundo é igualmente sal-
vo, desde que aceite sua condição. [...] o pobre pode, não obs-
tante, ser instrumentalizado enquanto meio privilegiado para
que o rico pratique a suprema virtude cristã, a caridade.

Desta forma, a Igreja, ratificando seus interesses, estabeleceu uma relação


em que ambos os atores sociais, rico e pobre, cumpririam seus papéis na
sociedade. Enquanto o rico partilhava da riqueza, o pobre recebia as caridades e
a Igreja era a mediadora dessa relação.

Figura 45 – Interpretação da pobreza

Fonte: Disponível em: <https://clubedamafalda.wordpress.com/


tag/desigualdade-social/>. Acesso em: 10 jul. 2017.

104
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Com o passar dos séculos, os denominados ricos se tornaram


Com o passar
donos do capital e não interessava mais a divisão de suas riquezas dos séculos, os
com os pobres, muito menos permitir a interferência da Igreja na denominados
administração de seus bens. A partir dos séculos XVI e XVII inicia o ricos se tornaram
donos do capital
rompimento da Monarquia e da burguesia com a Igreja, com a criação e não interessava
de Estados independentes da religiosidade (REZENDE FILHO, 2009). mais a divisão de
suas riquezas com
os pobres, muito
Nessa nova fase, o Estado passou a se relacionar com o pobre, menos permitir a
rompendo com a função caridosa e instituindo políticas públicas interferência da Igreja
na administração de
governamentais com objetivo de assistencialismo social. Ademais, seus bens.
como responsável pela organização social, ressignifica o pobre em
novo papel social, assegurando uma assistência que promova sua emancipação
na sua região. A partir desse momento, o pobre deixa de ser uma pessoa
predefinida divinamente para viver no estado de pobreza, para ser um cidadão
com a garantia de direitos.

Segundo Blass (2006), o Decreto de Moulin, na França, em 1556,


regulamentou a reintegração dos pobres na sociedade. Outra lei assistencialista
e de política voltada para o bem-estar social foi a Lei dos Pobres, conhecida
como Estatuto de 1601. Essa lei regulamentava a assistência para três grupos
sociais: válidos, inválidos e as crianças. Os inválidos e as crianças recebiam
uma verba financeira, aos que não conseguiam dispor de sua sobrevivência por
apresentarem limitações físicas, psicológicas ou cognitivas, as províncias tinham
a obrigação de oferecer trabalho.
A Lei dos Pobres
passou a ser
A Lei dos Pobres passou a ser questionada com o advento do questionada
com o advento
crescimento populacional urbano, sendo que na sua promulgação não do crescimento
havia tantos pobres na região e as províncias conseguiam cumprir a lei. populacional urbano,
Como resultado desse evento, as províncias não suportaram os efeitos da sendo que na
sua promulgação
industrialização, como o aumento do número de pobres na nova formação não havia tantos
social e econômica de ordem produtiva que surgia. pobres na região
e as províncias
conseguiam cumprir
Assim, de acordo com Williams (2007), com o surgimento do a lei.
Capitalismo e da Revolução Industrial o pobre passou a ser um sujeito
que destoava da sociedade produtiva, desprovido então da outrora Nas palavras de
legitimação social, passando a ser desmoralizado culturalmente. Williams (2007),
o pobre na
contemporaneidade
Atualmente, o pobre configura um ser ausente de virtudes passa a ser
individuais, promíscuo, vadio, incompetente, preguiçoso, indicando entendido como um
estranho perigoso
criminalidade e vagabundagem. Nas palavras de Williams (2007), o e indesejável,
pobre na contemporaneidade passa a ser entendido como um estranho considerado um
perigoso e indesejável, considerado um representante da pobreza no representante da
pobreza no olhar das
olhar das classes dominantes. classes dominantes.

105
Educação Integral e Diversidade Cultural

Segundo Telles (1993), o termo pobre provém do latim pauper, que significa
a ligação com elementos agrícolas, como as terras e gados, sem capacidade
produtiva adequada. Ao longo dos tempos e da consequente industrialização e
urbanização, o termo passou a assumir outro conceito, voltado para a condição
humana, representando o empobrecimento dos trabalhadores, desigualdades
sociais, privação material e inexistência de políticas públicas. Assume um caráter
de ausência de direitos quanto à cidadania e representação social.

Há necessidade
de se resgatar a Para Castel (1998), o conceito de pobreza deve transcender a
definição de pobreza, premissa financeira, assumindo um caráter sociológico e antropológico.
personificando o
pobre como um Há necessidade de se resgatar a definição de pobreza, personificando
sujeito que faz o pobre como um sujeito que faz parte e interage na sociedade.
parte e interage na
sociedade.
Lavinas (2003, p. 29) contribui na discussão e aponta que "[...]
ser pobre é ter, portanto, sua humanidade ameaçada, seja pela não satisfação de
necessidades básicas (fisiológicas e outras), seja pela incapacidade de mobilizar
esforços e meios em prol da satisfação de tais necessidades". Aponta a pobreza
como um processo de desumanização da pessoa que se encontra no estado de
pobreza, que perde automaticamente o direito de cidadania plena.

Atividade de Estudos:

1) Para melhor organizar seu entendimento sobre o assunto


estudado, sugerimos que disserte sobre a construção do conceito
de pobreza ao longo do período histórico da sociedade até os
dias atuais.
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106
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Para você refletir mais sobre o assunto, deixamos uma dica de um


episódio da série Chaves, intitulada “Isto merece um prêmio”. Assista e
observe a conversa entre os quatro personagens sobre a fome, a vida
das crianças de rua e dos menos favorecidos socialmente.

A série aborda vários eventos que discorrem sobre o tema,


destacando o personagem Chaves como o menos favorecido
perante os demais. Confira o episódio indicado acessando <https://
www.youtube.com/watch?v=eAmX-xeyPPU>.

OrganiZação da Desigualdade Social


O significado do conceito de desigualdade social apresenta O significado
do conceito de
diferentes formas sociais e diversas maneiras de se conceber a desigualdade social
produção dos valores sociais. Segundo Marx e Engels (2000), a apresenta diferentes
formas sociais e
desigualdade social seria um processo que desencadeia situações de diversas maneiras
diferenciação social, atreladas a questões econômicas que reduzem de se conceber a
elementos associados à condição humana. produção dos valores
sociais.

O teórico Karl Marx (1818-1883) explicitou questionamentos sobre as


relações de poder nas obras que escreveu, relacionando a desigualdade social
e a limitação do poder quanto à carência da propriedade privada dos meios
de produção. Portanto, tal situação desencadeou processos de distinção,
vulnerabilidade e exclusão social em nível individual como coletivo na sociedade,
bem como reafirmando as diferenças entre as classes.

Weber (1991), outro teórico de destaque nas discussões sobre o tema,


afirmava que as desigualdades sociais consistiam na manifestação de três
diferentes dimensões da estratificação social, amparadas conforme a organização
do poder na sociedade.

107
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 46 – Organização do poder na sociedade

Fonte: Adaptado de Weber (1991).

Podemos afirmar, nas palavras de Santos (2010, p. 3), que a diversidade


social seria "uma condição de acesso desproporcional aos recursos, materiais
ou simbólicos, fruto das divisões sociais". Enquanto os acontecimentos históricos
e revolucionários ocorriam nas sociedades em âmbito mundial, notava-se o
consequente aumento da desigualdade social.

Netto e Braz (2007) apontam sobre a questão da permanência


Netto e Braz das condições sociais que inferem na reprodução das desigualdades
(2007) apontam
sobre a questão da sociais e, consequentemente, a pobreza. Afirmam que um dos
permanência das pressupostos se encontra na produção dos bens, não na forma
condições sociais
que inferem na como são distribuídos, ou seja, nas relações que ocorrem entre os
reprodução das trabalhadores e capitalistas, na compra e venda da força de trabalho
desigualdades que reflete as desigualdades sociais. Aquele que detém a propriedade
sociais e,
consequentemente, a dos meios de produção e o outro que vende sua força de trabalho por
pobreza. um salário que corresponderá a sua subsistência social. De acordo
com Lessa (1999, p. 30):

[...] o capital é uma forma de propriedade privada que não pode


deixar de se expandir. Diferente da propriedade feudal, ou da
propriedade de escravos, que poderia permanecer por séculos
sem alterações significativas, o capital é uma forma de riqueza
que apenas pode existir se servir para fazer negócios cada vez
mais lucrativos.

108
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Dessa forma, a ideia de igualdade e liberdade entre os trabalhadores e donos


do capital é utopia e fundamenta a reprodução das classes sociais. Apresentam
uma base desigual e sua eliminação não se pauta na concepção de redistribuição
de riquezas ou na solidariedade, muitas vezes difundida no meio social. Nesse
sentido, o poder da burguesia se efetiva na oposição das necessidades humanas
e individuais, ou melhor, as necessidades humanas passam a ser apontadas
pelos proprietários privados que decidem sobre a divisão dos meios de produção
(LESSA, 1999).

Segundo Pimentel (2012), a divisão dos meios de produção entre os


donos do capital e os seus produtores simbolizou um marco na reprodução do
capital, enfatizando a condição imposta aos indivíduos que vendem sua força de
trabalho por uma renda monetária. Em vista disso, o capitalismo se fundamenta
na relação conturbada entre as classes: burguesia e proletariado. A riqueza de
uma classe, os donos do capital, se faz por meio da exploração de outra classe,
a dos trabalhadores.

Ao longo do processo histórico do capitalismo na sociedade, podemos


observar, no conceito de Netto e Braz (2007), que as sociedades pré-capitalistas
sustentaram uma desigualdade social pautada na inexistência dos meios de
produção das riquezas para todos, sendo que os indivíduos se encontram
submissos em relação à dominação da natureza e dos fenômenos naturais, na
condição precária de extração dos seus recursos. Na sociedade capitalista, as
relações se modificam, apontando para uma desigualdade social fundamentada
nas relações de exploração entre o capital e a força de trabalho.
A sociedade
A sociedade organizada segundo a reprodução do capital organizada segundo
impede a eliminação das desigualdades sociais, visto que se baseia a reprodução do
capital impede a
na acumulação do capital por uns em detrimento da exploração do eliminação das
trabalho de outros. Assim, enfatizamos que a situação da desigualdade desigualdades
sociais, visto que
social se fundamenta no processo de produção do capital, excluindo a se baseia na
hipótese da má distribuição das riquezas. acumulação do
capital por uns
em detrimento
da exploração do
trabalho de outros.

109
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 47 – Desigualdade social e o capitalismo

Fonte: Disponível em: <http://geoconceicao.blogspot.com.br/2012/04/


desigualdade-social.html>. Acesso em: 10 jul. 2017.

A desigualdade A desigualdade social originada pelo capitalismo traduz o


social originada pelo
capitalismo traduz o desenvolvimento de como a reprodução do capital está intrinsecamente
desenvolvimento de associada às condições de reprodução do capital. Um dos efeitos
como a reprodução dessa situação percebível no âmbito social diz respeito à consequente
do capital está
intrinsecamente pobreza, intensificada pela conjuntura de crise vivenciada na
associada às contemporaneidade.
condições de
reprodução do
capital. Assim, as condições de reprodução do capital prosseguem
e manipulam as necessidades humanas, criando uma lógica de
expansão e acumulação, que repercute nas questões sociais. No Brasil, segundo
Mercadante (2003), as desigualdades sociais podem ser interpretadas a partir de
três principais situações, que se encontram diretamente associadas.

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Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Figura 48 – Situações que inferem sobre a desigualdade social no Brasil

Fonte: Mercadante (2003, p. 39).

O autor Kliksberg
O autor Kliksberg (2000) infere sobre a existência de algumas (2000) infere sobre
"falácias" criadas para amenizar os efeitos das desigualdades sociais a existência de
vivenciadas, e ainda promovem esperança para sua erradicação. algumas “falácias”
criadas para
Afirma ainda sobre a necessidade da superação de tais pressupostos, amenizar os efeitos
que alimentam falsas esperanças sobre uma nova ética ou uma das desigualdades
sociais vivenciadas,
democracia mundial. Organizamos um quadro para que você consiga e ainda promovem
perceber e distinguir as dez falácias apresentadas, que discorrem esperança para sua
justificando as desigualdades sociais. erradicação.

111
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 49 – Falácias sobre as desigualdades sociais

Fonte: Adaptado de Kliksberg (2003).

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Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Para que tais falácias sejam extintas, há necessidade de uma nova matriz
conceitual do desenvolvimento a médio e a longo prazos, com o propósito de
romper o hábito da fatalidade do atraso ou crise, mas objetivar uma visão ampla
do desenvolvimento no contexto necessita de uma efetiva política que combata a
exclusão social, por meio de revisões na matriz dos planos externo e
Giddens (2001)
interno em nível nacional. aponta sobre o
imperativo de uma
nova interpretação
Para tanto, Giddens (2001) aponta sobre o imperativo de uma da globalização,
nova interpretação da globalização, em que todos se beneficiariam em que todos
com uma nova administração baseada na ética de um novo direito se beneficiariam
com uma nova
mundial, ou seja, de as lideranças mundiais encontrarem formas de administração
desenvolvimento, que proporcionem a todos os mesmos direitos e o baseada na ética
de um novo direito
atendimento as suas necessidades básicas, o que seria um grande mundial.
desafio na história da sociedade.

Atividade de Estudos:

1) Faça uma análise sobre a desigualdade social no Brasil, disserte


sobre as principais situações que produziram seu surgimento e
faça um contraponto com as falácias que as justificam.
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Modelo EconômicoAtuale suaRelação


com a Produção das Desigualdades
A ascensão do capitalismo traduziu a globalização como um processo
econômico, social e cultural, mais precisamente no conjunto de transformações
sociais que incluem as inovações tecnológicas (CAMPOS; CANAVAZES,
2007). Segundo Santos (2011), há duas formas de pensamento que auxiliam
na compreensão sobre a inserção da globalização: uma aponta para a falácia
do determinismo, com a globalização como um processo que ocorre de forma

113
Educação Integral e Diversidade Cultural

espontânea, automática e irreversível, avançando com uma lógica própria que


se sobrepõe a qualquer intervenção externa. Outra forma de pensamento que
cita é sobre o desaparecimento da separação Norte/Sul, sendo que o Norte
produzia produtos manufaturados e o Sul abastecia com matéria-prima, para uma
concepção pautada numa economia global.

Você já pensou na situação mundial em que nos encontramos após a


globalização? Aceitamos de forma positiva as afirmações sobre as facilidades
quanto à comunicação, acesso a vários produtos, possibilidades de viajar e fazer
intercâmbios, para citar alguns. Contudo, reflita sobre quais seriam as outras
situações favoráveis que não envolvessem o incentivo ao consumo? Para a
necessidade de se ter o que todos possuem para conseguir viver de forma melhor
e eficiente, será que precisamos realmente disso tudo, para conseguirmos viver
bem? Pense a respeito e confira alguns dados que apresentaremos sobre a
relação entre a globalização e as desigualdades sociais!

Figura 50 – Reflexão sobre a situação mundial

De acordo
com Campos e
Canavazes (2007), Fonte: Disponível em:<http://geoconceicao.blogspot.com.br/2012/09/a-
a globalização globalizacao-mundializacao-do.html>. Acesso em: 10 jul. 2017.
apresenta
características
que produzem De acordo com Campos e Canavazes (2007), a globalização
o crescimento
do comércio apresenta características que produzem o crescimento do
internacional de comércio internacional de bens, produtos e serviços, ou seja, a
bens, produtos e
serviços, ou seja, a transnacionalização das grandes empresas. Tal situação influencia
transnacionalização diretamente sobre a livre circulação de capitais, como a privatização da
das grandes
economia e redução da atuação do governo e dos Estados-nação.
empresas.

114
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Implica também na queda das barreiras comerciais e regulação dos


comércios internacionais, que seguem as regras da Organização Mundial do
Comércio. Favorece o trânsito de pessoas e bens entre os países e a consequente
facilidade de comunicação entre as pessoas, no uso de instrumentos tecnológicos
como a internet (CAMPOS; CANAVAZES, 2007).

Ademais, tais características implicam diretamente sobre os resultados que


inferem na promoção das desigualdades entre os países no mundo globalizado.
Atinge perspectivas: econômicas, políticas e social/cultural, que influenciam na
forma de viver e perceber a sociedade nas pessoas.

Estudaremos sobre cada característica para entendermos melhor sua


relação com a globalização!

Perspectiva econômica: a partir da globalização da economia e o poder


sobre o capital, os centros que atuam no planeta, compostos por corporações
transnacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial,
Organização Mundial do Comércio (OMC) e os Estados-nação, que se encontram
em situação superior aos demais, passaram a atuar nas decisões mundiais.
São grupos que atuam na movimentação de tecnologias, recursos financeiros e
técnicos, pessoas, instrumentos, influenciando as decisões sobre a organização
da economia nas nações (CASTELLS, 2010).
Santos (2011) nos
lembra que no
Santos (2011) nos lembra que no mundo globalizado os mundo globalizado
capitalistas ou donos do capital consistem em grupos de grandes os capitalistas ou
empresas e companhias que decidem sobre o mercado de bens e donos do capital
consistem em grupos
serviços. Em conjunto com o mercado financeiro global, asseguram a de grandes empresas
reprodução e a estabilidade das desigualdades que causam, segundo e companhias que
decidem sobre o
a concentração de poder econômico e financeiro que dispõem. mercado de bens e
serviços.
O autor ainda aponta que as novas desigualdades sociais não são
decorrentes da falta de recursos humanos ou materiais, mas do desemprego e
do extermínio de subsistências, da minimização dos custos salariais. Assim, não
se trata de apoiar o isolamento dos países como se organizavam no passado,
mas de propor uma alternativa para deixarem de ser reféns das organizações
transnacionais, principalmente porque o objetivo dessas corporações não se
respalda em atributos como o saber, contexto e realidade local, segundo as
diversas sociedades existentes no âmbito mundial.

Perspectiva política: a supremacia da globalização indica sobre as


deliberações dos Estados nacionais, que sofreram alterações para seguirem a nova
política econômica favorável ao mercado, de acordo com o sistema atual mundial.

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Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 51 – Contextos que atuam no mundo globalizado

Fonte: Adaptado de Santos (2011).

Santos (2011) indica três contextos que estão presentes e atuam no mundo
globalizado. O primeiro consiste nos Estados Predominantes, que incidiram na
redução da liberdade política e na soberania dos Estados marginalizados. O segundo
constitui o aumento de Alianças Políticas entre os Estados, como na formação de
blocos econômicos como a União Europeia, NAFTA e o Mercosul. O
O conjunto de terceiro seria o incentivo à Privatização do Poder, na realização de
ações oriundas
da globalização algumas determinações econômicas, sociais e políticas, outrora realizadas
influencia a pelos Estados-nação.
reestruturação do
Estado, refletindo
nas privatizações Nesse sentido, o conjunto de ações oriundas da globalização
de organizações influencia a reestruturação do Estado, refletindo nas privatizações de
públicas e no
consequente organizações públicas e no consequente enfraquecimento da relação
enfraquecimento entre o Estado e a sociedade. Com a presença do neoliberalismo e da
da relação entre globalização, o Estado-nação surge com um novo propósito. Objetiva
o Estado e a
sociedade. sanar os problemas de crescimento e das diferenças de estruturas,
com interesses na proteção da economia, enfatizando a competição e
as privatizações (BRESSER-PEREIRA, 1996).

116
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Contudo, as organizações transnacionais atuam na defesa e promoção


de programas que ampliam o controle do mercado global em relação à vida
econômica dos países em desenvolvimento. Nesse sentido, enfatizam uma
globalização econômica em detrimento da redução dos poderes dos Estados
(CASTELLS, 2010).
O processo de
Perspectiva social/cultural: reflexo da variedade cultural e globalização social
e cultural atua na
das transformações sociais que ocorreram nas diversas culturas uniformização da
pelo mundo. O processo de globalização social e cultural atua na cultura em âmbito
uniformização da cultura em âmbito mundial, ao mesmo tempo que mundial, ao mesmo
tempo que retrata a
retrata a diversidade cultural (CAMPOS; CANAVAZES, 2007). diversidade cultural.

Segundo Castells (2010), a globalização pode ser entendida como resultado


das tendências históricas impessoais, recorrentes de processos de dominação
e exploração que influenciaram as forças políticas, econômicas e sociais a
usufruírem de vantagens sobre os diversos grupos sociais. Assim, a ideia de
progresso ocasionado pela globalização apresenta a integração de diferentes
culturas em viagens, comércio e disseminação do conhecimento.
A desigualdade
O que se tem de realidade incide no aumento da desigualdade na presente nas regras
globais, com a
distribuição de renda entre os países, com a predominância do privilégio incapacidade das
de uns em detrimento de outros, gerando as desigualdades sociais. políticas de Estado,
consistem nos
A desigualdade presente nas regras globais, com a incapacidade das principais desafios
políticas de Estado, consistem nos principais desafios que precisam que precisam ser
ser enfrentados pela globalização. enfrentados pela
globalização.

Nesse contexto, as práticas sociais e culturais transnacionais se relacionam


com as relações desiguais de identidades e culturas, impulsionadas pelo
mercado do capital. Desta forma, entende-se como globalização o processo
de normatização da cultura ocidental ou americanizada, fundamentada no
pressuposto de igualar os fenômenos culturais a mercadorias (SANTOS, 2011).

A presença das desigualdades sociais inclui diversos aspectos referentes


às oportunidades econômicas, políticas e sociais, sobretudo na manutenção e
detenção das riquezas. Necessita-se repensar a globalização e rever a noção de
desenvolvimento, uma vez que só tem sentido social se beneficia a todos.

117
Educação Integral e Diversidade Cultural

Atividade de Estudos:

1) Analise sobre os efeitos da globalização em relação à promoção


das desigualdades e escreva brevemente, com seu entendimento,
sobre as influências nas perspectivas econômicas, políticas e
social/cultural.
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Para saber mais sobre a relação entre o modelo econômico


capitalista e o desenvolvimento das desigualdades sociais, assista
ao vídeo “Ilha das flores”, disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=bVjhNaX57iA>.

Um filme com uma média de 13 minutos de duração, gravado


em 1989, na Ilha das Flores, na cidade de Porto Alegre, destinado a
ser depósito de lixo. A história conta a trajetória de um tomate, desde
sua colheita até o descarte que chega ao lixão da ilha. No local,
crianças disputam o alimento que fora desprezado para o consumo
dos porcos da região.

Assista e reflita sobre as condições de desigualdades sociais


geradas pelo sistema capitalista, com a ausência de interesse
das políticas públicas para remediarem a situação de miséria da
população brasileira.

118
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

InFluênciasdaDesigualdadenaEducação
Brasileira e a Educação Integral
As desigualdades sociais expressas na deficiente distribuição de renda, bem
como das oportunidades econômicas, políticas e sociais, suscitam a construção
de uma proposta de Educação Integral. Para tanto, primeiramente há necessidade
de se acentuar os estudos e discussões sobre a qualidade da educação em
termos do valor das diferenças, os efeitos da globalização, alterações no mercado
de trabalho, transformações técnico-científicas e socioambientais globais. São
eventos que impõem às políticas públicas e às educacionais novas formas de (re)
agir e conceber a situação contemporânea (BRASIL, 2009).

Desta forma, as situações de vulnerabilidade e risco social podem contribuir


para o baixo rendimento escolar, defasagem idade/série e nas consequentes
reprovações e evasões escolares. Incidem, sobretudo, na necessidade de se
priorizar a construção de soluções políticas e pedagógicas para erradicar as
desigualdades sociais e promover a inclusão educacional para todos. Assim,
ressaltamos o preconizado em lei pela Constituição Federal de 1988 (BRASIL,
2010, p. 136) quanto à educação, no artigo 205, que aponta sobre “A educação,
direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com
a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

A garantia em lei quanto a garantia de direitos, na prática A garantia em lei


inferem nas desigualdades, em situações que externalizam diferentes quanto a garantia
de direitos, na
possibilidades de acesso e qualidade na permanência das crianças e prática inferem nas
jovens nas escolas. No Brasil houve uma expansão desigual da oferta desigualdades,
de vagas no ensino público em relação à garantia de qualidade da em situações
que externalizam
educação. Nesse sentido, percebemos problemas nos espaços físicos, diferentes
turmas com números de alunos excedentes, falta de compromisso das possibilidades de
acesso e qualidade
políticas públicas no acompanhamento da realidade escolar, incluindo na permanência das
também a disseminação de uma variedade de tendências pedagógicas crianças e jovens nas
que seguem de forma desordenada o preparo teórico-metodológico na escolas.
formação inicial e continuada docente (BRASIL, 2009).

A discussão sustenta a premissa de que não basta a garantia do acesso


à escola para todos, mas na permanência que presuma um ambiente com
processos de ensino voltados à aprendizagem escolar. O direito que preconiza
a educação de qualidade para todos precisa também estar aliado à garantia dos
demais direitos humanos e sociais, principalmente a democracia, e na garantia de

119
Educação Integral e Diversidade Cultural

uma escola pública universal. Como apresenta o artigo 5º da Constituição Federal


de 1988, quanto aos direitos e deveres individuais e coletivos, “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à segurança e à propriedade” (BRASIL, 2010, p. 15).

A organização da Com base nos preceitos que afirmam sobre a garantia e o acesso à
escola precisa educação, e a igualdade de direitos a todos, as demandas sociais inferem
ser repensada
e reestruturada dados quanto aos processos escolares que enfatizam a perspectiva de
numa condição uma atenção e Educação Integral. A organização da escola precisa ser
que favoreça a repensada e reestruturada numa condição que favoreça a ampliação
ampliação da jornada
escolar, objetivando da jornada escolar, objetivando a qualidade de ensino pautada nas
a qualidade de dimensões de maior tempo e espaço para o aprendizado escolar.
ensino pautada nas
dimensões de maior Dessa maneira, a ampliação da permanência do estudante necessita de
tempo e espaço uma reflexão para ressignificar os tempos e espaços da escola, para
para o aprendizado que atendam aos desafios impostos pela sociedade contemporânea,
escolar.
buscando a igualdade de oportunidades para todos.

Figura 52 – Refletindo sobre os tempos escolares

Fonte: Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/2848/ensino-em-tempo-


integral-por-um-brasil-com-mais-educacao-de-verdade>. Acesso em: 10 jul. 2017.

Contribuindo para a discussão, Giroux (1997, p. 38) lembra que “[...] deve-se
fazer uma tentativa de analisar as escolas como locais que, embora reproduzam
basicamente a sociedade dominante, também contêm a possibilidade de educar
os estudantes para torná-los cidadãos críticos e ativos (e não simplesmente
trabalhadores)”.

120
Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Com base nessa afirmação, podemos refletir sobre os seguintes


questionamentos: Que tipo de escola queremos ter? Que cidadão estamos
formando em nossas escolas?

Pois bem, Soares (2001) aponta sobre a necessidade do desenvolvimento


da atividade intelectual e das técnicas de produção voltadas aos interesses das
classes dominantes. Assim, tais premissas influenciaram a divisão social do
trabalho e a compreensão da educação como um cenário para a manutenção
da desigualdade social, visto que os conhecimentos científicos e tecnológicos
passaram a ter valor no sistema produtivo.
Giroux (1997) infere
Nesse sentido, Giroux (1997) infere sobre a escola como um sobre a escola
espaço de reprodução das relações sociais hegemônicas, que precisa como um espaço
de reprodução das
ser repensado e (re)avalidado sobre sua verdadeira função social. relações sociais
Com base em nossos estudos, analisamos sobre a seguinte pergunta: hegemônicas,
que precisa ser
Qual seria a função social da escola na contemporaneidade? repensado e (re)
avalidado sobre sua
Atualmente a escola apresenta como responsabilidade gerenciar verdadeira função
social.
os processos de ensino e aprendizagem, promover o acesso e
permanência a todos, com elementos e situações que favoreçam o aprender do
saber sistematizado. Segundo os autores Libâneo, Oliveira e Toschi (2005, p. 117):

[...] devemos inferir, portanto, que a educação de qualidade é


aquela mediante a qual a escola promove, para todos, o domí-
nio dos conhecimentos e o desenvolvimento de capacidades
cognitivas e afetivas indispensáveis ao atendimento de neces-
sidades individuais e sociais dos alunos.

Os processos
Nesse sentido, notamos que a escola se constitui numa instituição de ensino e
social que busca aprimorar as potencialidades físicas, cognitivas e aprendizagem
afetivas dos estudantes. Os processos de ensino e aprendizagem enfatizam a
construção
enfatizam a construção conceitual por meio dos conteúdos, conceitual por meio
conhecimentos, aprimorando as habilidades, atitudes e valores, de dos conteúdos,
conhecimentos,
maneira contextualizada e participativa. aprimorando as
habilidades, atitudes
A desigualdade social e a organização do sistema educacional e valores, de maneira
contextualizada e
apresentam suas estruturas vinculadas aos processos produtivos, ou participativa.
seja, a sociedade capitalista. A afirmação procede fundamentada nos
preceitos da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2010), quando associa a
educação à qualificação para o trabalho, também expressa na LDB/96 (1996, s.
p.) no artigo 2º dos princípios e fins da educação nacional.

121
Educação Integral e Diversidade Cultural

Para Freire (1997), a educação se bifurca em dois caminhos distintos: voltada


ao processo de emancipação humana, ou na domesticação e manutenção de
uma sociedade passiva. O autor infere ainda sobre a educação como uma forma
de desvelar aos sujeitos a realidade imposta, bem como nas oportunidades dos
professores em organizarem suas metodologias para um ensino voltado à maioria
popular. Na desmistificação das questões que contribuem para a manutenção das
desigualdades, como a lógica dominante que mantém passivamente a submissão
da sociedade aos valores consumistas, ocultos no discurso que aponta sobre a
democracia da escola cidadã.

A Educação Integral Em virtude do que foi mencionado, a Educação Integral implica


implica numa oferta numa oferta dos serviços públicos que indicam uma proteção social,
dos serviços públicos
que indicam uma com políticas integradas que considerem a educação, desenvolvimento
proteção social, com social, saúde, esporte, inclusão digital e cultura, ancorados numa
políticas integradas
que considerem perspectiva de educação emancipadora, que desvele os preceitos
a educação, políticos de uma sociedade mantida sobre os interesses de uma classe
desenvolvimento dominante. Sobretudo, que assegure realmente os direitos garantidos
social, saúde,
esporte, inclusão em lei nacional quanto à igualdade de permanência e qualidade de
digital e cultura. educação a todos, desnaturalizando as desigualdades sociais.

Atividade de Estudos:

1) Reflita e escreva um breve texto sobre a relação entre as


desigualdades sociais no Brasil e o trabalho pedagógico
desenvolvido nas escolas que propõe uma Educação Integral.
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Capítulo 4 ARELAÇÃODADIVERSIDADESOCIALCOMADESIGUALDADEECONÔMICA

Deixamos a dica de um site com diversas informações e textos


sobre a Educação Integral. O Centro de Referência de Educação
Integral possui como parceiros institucionais a UNESCO e UNDIME.

Acesse: <http://educacaointegral.org.br/>. Confira os vários


materiais que discursam sobre o tema e amplie seus conhecimentos
sobre o assunto!

Algumas Considerações
Os estudos desse capítulo apontaram para definições conceituais que
caracterizaram sobre o tema da desigualdade social e sua relação com a economia,
política e sociedade, desde o início do capitalismo e da globalização. Dessa forma,
podemos observar a influência dos novos modos de se conceber a sociedade como
produtora de bens, interferindo nas formas de pensar e agir das pessoas.

Outro aspecto que podemos apontar diz respeito à percepção da pobreza


atual, principalmente nas opiniões que emitimos e que revelam premissas de
intencionalidades de uma classe dominante.

No cotidiano de nossas vidas, não percebemos a influência das organizações


transnacionais, ditando sobre os programas que ampliam e controlam o mercado
global e atingem a vida econômica da sociedade em geral.

Muitas vezes acreditamos ser uma falácia quanto à necessidade de estarmos


atentos aos intuitos camuflados nas políticas apresentadas na atualidade. Políticas
que preconizam vontades e interesses de uma rede dominante, interessada em
manter a organização social baseada nas desigualdades.

Surge então uma questão: existe uma sociedade em que não há


desigualdades? Como seria a organização de uma sociedade em que todos
teriam a garantia de igualdade de direitos e condições de acesso? Talvez seja
o momento de se repensar sobre a forma como a globalização foi adotada e (re)
organizar os preceitos que a sustentam.

123
Educação Integral e Diversidade Cultural

A Educação Integral parte da análise sobre as condições de desigualdade


quanto ao acesso e qualidade de permanência das crianças e jovens na escola.
Também na territorialização das políticas sociais que propiciem o diálogo entre o
Estado e as comunidades locais, para uma efetiva garantia de educação para todos.

Em suma, uma Educação Integral que incite discursos sobre a organização


das desigualdades sociais na contemporaneidade, bem como na relação que
estabelece com as desigualdades econômicas. Pensando e construindo práticas
educativas que permitam reflexões que desmistificam algumas falácias, que
acabam preconizando a globalização e os efeitos do capitalismo como únicas
formas de desenvolvimento econômico.

ReFerências
BLASS, L. M. da S. (Org). Ato de trabalhar: imagens e representações. São
Paulo: Annablume, 2006.

BRASIL. Educação integral: texto referência para o debate nacional. Brasília:


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BRESSER-PEREIRA, L. C. Da administração pública burocrática à gerencial.


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BUSS, P. M. Globalização, pobreza e saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v. 12, n.


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126
C APÍTULO 5
Estudos Sobre a Diversidade no
Contexto Escolar

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Compreender os estudos da diversidade cultural na organização curricular


educacional.

 Conhecer as premissas das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação


Básica quanto às relações étnico-raciais.

 Perceber a escola como local de estudos sobre a diversidade.

 Analisar a constituição curricular educacional em relação aos estudos sobre a


diversidade brasileira.
Educação Integral e Diversidade Cultural

128
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

ContextualiZação
No último capítulo privilegiamos os estudos sobre a diversidade presentes no
contexto escolar, mais precisamente os preconizados nas Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica (BRASIL, 2013). O documento infere sobre as
diretrizes que estabelecem a base nacional comum, responsável pela organização,
articulação, desenvolvimento e avaliação das propostas pedagógicas das redes
de ensino no contexto nacional.

Apresentaremos a organização do currículo na perspectiva do


multiculturalismo, contemplando um breve contexto conceitual sobre currículo e a
definição de multiculturalismo. Adiante, seguimos com os pressupostos referentes
às Diretrizes Curriculares Nacionais quanto à educação escolar indígena, como
uma organização escolar diferenciada preconizada e garantida em lei.

Do mesmo modo, destacamos as Diretrizes Curriculares Nacionais e os


pressupostos das relações étnico-raciais no contexto educacional. Abordaremos
sobre a concepção de igualdade de direitos a todos e a relevância cultural dos
que convivem em sociedade.

Finalizamos com conceitos sobre a escola como local de promoção de uma


educação em direitos humanos para a diversidade. Destacamos aspectos quanto
à garantia de direitos preconizados na Constituição Federal de 1988 e no Plano
Nacional de Educação em Direitos Humanos – PNEDH. O documento ressalta
aspectos quanto ao desenvolvimento de práticas educativas que considerem a
divulgação e garantia de direitos para todos.

OrganiZação do CurrÍculo e o
Multiculturalismo
O termo currículo surgiu em 1633 nos registros da Universidade de Glasgow,
referindo-se a um curso que era ofertado aos estudantes. O curso apresentava
características que indicavam a organização da experiência escolar das pessoas,
aspecto presente nos sentidos atribuídos ao currículo.

129
Educação Integral e Diversidade Cultural

O conceito de Segundo Macedo e Lopes (2011), o conceito de currículo sofreu


currículo sofreu alterações ao longo do período histórico social e dos estudos sobre
alterações ao
longo do período o assunto, assumindo várias formas de interpretação segundo as
histórico social e construções teóricas. Assim, nos anos de 1920, o currículo indicava um
dos estudos sobre o
assunto, assumindo plano formal de atividades, experiências de ensino e aprendizagem,
várias formas preocupação com a administração e práticas em sala de aula. Mais
de interpretação tarde, a partir dos anos de 1971, os estudos consideraram a relação
segundo as
construções teóricas. entre a seleção e organização do conhecimento escolar com os
interesses de determinados grupos que os organizam.

Para Macedo e Lopes (2011, p. 29), "[...] o currículo não forma apenas os
alunos, mas o próprio conhecimento, a partir do momento em que seleciona de
forma interessada aquilo que é objeto da escolarização". Dessa forma, o currículo
passa a ser interpretado como criadores ou reprodutores de uma hegemonia
ideológica de determinados grupos sociais.

Os primeiros estudos pós-estruturais do currículo ocorreram nos anos de


1990 no Brasil, apontando sobre a influência da linguagem na constituição social,
ou seja, ao representar o mundo, a linguagem ou o discurso o constrói, cria as
situações, os elementos que constituem a sociedade (MACEDO; LOPES, 2011).

O poder se encontra na forma de compreensão do mundo por meio do


discurso, ou na sua produção, os discursos pedagógicos e curriculares como
formas de poder, que criam sentidos hegemônicos. Podemos citar Macedo e
Lopes (2011, p. 41) quando inferem que:

[...] o currículo é, ele mesmo, uma prática discursiva. Isso signi-


fica que ele é uma prática de poder, mas também uma prática
de significação, de atribuição de sentidos. Ele constrói a reali-
dade, nos governa, constrange nosso comportamento, projeta
O currículo como nossa identidade, tudo isso produzindo sentidos.
um documento que
evidencia de forma O currículo como um documento que evidencia de forma subjetiva
subjetiva a produção
de sentidos das a produção de sentidos das relações de poder, ficando implícitas as
relações de poder, intencionalidades daqueles que o organizaram. Consistem em formas
ficando implícitas as
intencionalidades de reproduzir verdades sobre o currículo, mas de forma subjetiva,
daqueles que o velada nas entrelinhas, contendo as intenções que preconizam os seus
organizaram. fazeres na escola.

As discussões contemporâneas sobre currículo contemplam a diversidade


nos seus sentidos sociais, históricos, culturais e políticos. Desta forma, Gomes
(2008) infere sobre a diversidade como uma situação cultural, enquanto
construção histórica, cultural e social das diferenças.

130
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Diferenças que "são construídas pelos sujeitos sociais ao longo do processo


histórico e cultural, nos processos de adaptação do homem e da mulher ao
meio social e no contexto das relações de poder" (GOMES, 2008, p. 17). A
compreensão das diferenças que suscita uma análise das práticas pedagógicas
que são desenvolvidas nas escolas atualmente, em relação às discussões e
entendimentos sobre a diversidade.

Gomes (2008) levanta alguns questionamentos que merecem reflexões em


relação às práticas educativas desenvolvidas nas escolas:

Que indagações o trato pedagógico da diversidade traz para


o currículo? [...] Como podemos lidar pedagogicamente com
a diversidade? [...] Será que existe sensibilidade para a diver-
sidade na educação infantil, especial, na EJA, no ensino fun-
damental, médio e profissional? [...] Qual é o lugar ocupado
pela diversidade? Ela figura como tema que transversaliza o
currículo? Faz parte do núcleo comum? Ou encontra espaço
somente na parte diversificada? (GOMES, 2008, p. 17).

As respostas dos questionamentos revelam as compreensões


Inserir o tema da
sobre a concepção de educação, currículo e escola. Assim, inserir o diversidade nas
tema da diversidade nas práticas educativas requer a adoção de uma práticas educativas
condição pedagógica que questione os sentidos quanto às diferenças, requer a adoção
de uma condição
respeito à multiplicidade de identidades, às diversas representações e pedagógica que
valores tanto sobre o "eu" quanto em relação ao "outro" (GOMES, 2008). questione os
sentidos quanto às
Nesse sentido, surge a necessidade de se questionar e discutir diferenças, respeito
à multiplicidade de
sobre a presença da diversidade nos espaços escolares, mesmo identidades.
porque, nas estruturas sociais encontramos resistências quanto à
aceitação das diferenças. Para Moreira e Candau (2008), tal situação representa
a urgência de se desmistificar os preconceitos que ainda perduram na sociedade,
por meio de práticas pedagógicas baseadas em um currículo multicultural.

Figura 53 – Multiculturalismo

Fonte: Disponível em: <https://www.buscandomais.com.br/


multiculturalismo>. Acesso em: 20 jul. 2017.

131
Educação Integral e Diversidade Cultural

O currículo escolar Segundo Moreira e Silva (2000), as discussões sobre currículo na


como um território perspectiva multicultural nas escolas surgiram da relação de sentidos
onde se travam
relações de poder, entre cultura e poder, com início nas teorias críticas e pós-críticas. Em
definham identidades outras palavras, compreendem o currículo escolar como um território
e reprimem
subjetividades onde se travam relações de poder, definham identidades e reprimem
perante as vontades subjetividades perante as vontades de uma classe dominante.
de uma classe
dominante.
Silva (2005, p. 17) lembra que “as teorias críticas e pós-críticas de
currículo estão preocupadas com as conexões entre saber, identidade
e poder". Traz para o centro das discussões aspectos como as questões culturais,
de sexualidade, entre outras, negligenciadas pelo currículo tradicional.

Nesse contexto emergem os estudos multiculturais como uma crítica ao


currículo estruturado de forma unilateral, hegemônico, linear e homogeneizador
presente no cotidiano escolar, representado de forma universal e inquestionável.
Uma organização curricular emancipatória que se baseia nas lutas e
reivindicações, partindo da premissa de que "o currículo estabelece diferenças,
constrói hierarquias, produz identidades" (SILVA, 2001, p. 12). De modo geral,
favorece a manutenção dos mecanismos de controle ocultos nas estratégias
didáticas e metodologias expressas no ambiente escolar, situações carregadas de
intencionalidades subjetivadas nos fazeres educativos.

No Brasil o multiculturalismo aparece preconizado nos Parâmetros


Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), no volume 10, intitulado como "Pluralidade
cultural e orientação sexual", organizado pelo Ministério da Educação – MEC.
O documento enfatiza sobre a necessidade do conhecimento e valorização das
características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que integram o
território nacional, as desigualdades sociais e econômicas e a crítica quanto às
relações discriminatórias existentes na sociedade brasileira (BRASIL, 1997).

O multiculturalismo Podemos afirmar, segundo Silva (2005, p. 86), que "o


revela uma noção multiculturalismo representa um importante instrumento de luta
de identidade política", quando divulga os discursos que se encontram escondidos,
descentralizada,
múltipla, como um subjetivados na história da construção do conhecimento, concepções e
constante processo conquistas sociais. O multiculturalismo revela uma noção de identidade
de construção e
reconstrução. descentralizada, múltipla, como um constante processo de construção
e reconstrução. Aceita como forma de conhecimento não somente
o pensamento racional científico, mas também as crenças, lendas, mitos, as
diversas formas de expressão popular, que interpretam os fenômenos naturais de
acordo com as diversas culturas.

132
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

A organização e decisão da inclusão e exclusão de saberes intensifica a


concepção de currículo como um instrumento de controle e dominação. Lembramos
que a construção do currículo como um documento que estrutura os saberes da
escola reafirma e negligencia atitudes, valores e conhecimentos contrários às
intenções da classe hegemônica. Nesse sentido, a escola é tida como espaço de
aprendizados, que organiza os tempos e espaços por meio dos planejamentos
e práticas educativas que subjetivam sentidos. O currículo como uma forma de
representar as decisões e intenções de ensino, procedimentos e métodos isentos
de neutralidade, que encerram a manutenção das relações sociais.

As intenções se encontram subjetivadas principalmente na As intenções


se encontram
escolha dos conteúdos e práticas educativas. Desta forma, o professor subjetivadas
age como coadjuvante, como aquele que vivenciará e representará as principalmente
na escolha dos
intenções do currículo, enquanto mediador principal do processo de conteúdos e práticas
ensino e aprendizagem dos diversos saberes. educativas.

Assim, sua atuação torna-se crucial na elaboração curricular como condição


voltada para a construção de atitudes de compreensão, aceitação e respeito à
diversidade social. Santomé (1998, p. 130) afirma que:

Um projeto curricular emancipador destinado aos membros de


uma sociedade democrática e progressista, além de especifi-
car os princípios de procedimento que permitem compreender
a natureza construtiva do conhecimento e sugerir processos
de ensino e aprendizagem em consonância com os mesmos,
também deve necessariamente propor metas educacionais e
blocos de conteúdos culturais que possam contribuir da melhor
maneira possível com uma socialização crítica dos indivíduos.

Em outras palavras, uma organização curricular que contemple os conteúdos


numa perspectiva crítica, que preconize o entendimento sobre a compreensão do
conhecimento em densa construção, com práticas educativas que contemplem
o movimento da construção dos sentidos subjetivados nos conhecimentos,
instigando um pensamento democrático, crítico e emancipador.

Arroyo (2004) infere sobre a necessidade de se repensar a rigidez temporal e


espacial imposta na organização escolar, ainda presente na contemporaneidade.
Afirma ser imprescindível a reorganização dos tempos e espaços para que a
diversidade seja respeitada, na garantia de acesso e permanência de todos como
direito à educação. De modo geral, que as escolas organizem seus currículos
baseados no respeito às múltiplas diversidades, incluindo os diversos tempos de
aprendizados dos estudantes.

133
Educação Integral e Diversidade Cultural

Atividade de Estudos:

1) Após os estudos sobre a multiculturalidade, analise e disserte,


com seu entendimento, sobre a caracterização do currículo
multicultural.
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DiretriZesCurricularesNacionaisparaa
Educação Escolar IndÍgena
Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (BRASIL,
2013), nas últimas décadas as comunidades indígenas construíram projetos
de educação escolar diferenciados dos vivenciados no período colonial. As
experiências educacionais atribuem novos significados, afirmando identidades e
sentidos de pertencimento étnico.

Nesse sentido, asseguram a escolarização em suas línguas nativas,


processos próprios de aprendizagem, formação de professores em suas
comunidades e produção de materiais didáticos específicos. Enfim, todo o
processo educacional se baseia na valorização dos saberes e práticas tradicionais
assumidas de acordo com a comunidade indígena (BRASIL, 2013).
Nos espaços
indígenas a escola
consiste no local Nos espaços indígenas a escola consiste no local privilegiado de
privilegiado de disseminação e controle da reelaboração cultural nas diversas terras
disseminação
e controle da indígenas, garantindo a continuidade sócio-histórica dos modos de ser,
reelaboração cultural viver, pensar e produzir significados. Assim, a escola possui o atributo
nas diversas terras
indígenas, garantindo de contribuir na melhoria das condições de vida para as comunidades
a continuidade indígenas, vislumbrando a sustentabilidade com uma cidadania
sócio-histórica dos diferenciada aos estudantes indígenas (BRASIL, 2013).
modos de ser, viver,
pensar e produzir
significados.

134
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Figura 54 – Escola indígena

Fonte: Disponível em: <http://www.plataformadoletramento.org.


br/alfabetizacao-indigena/>. Acesso em: 20 jul. 2017.

O documento (BRASIL, 2013) também revela que o direito à A luta do movimento


diferença cultural tem sido motivo das lutas do movimento indígena, indígena incidiu na
redefinição conceitual
desde a década de 1970, seguindo articulado a outros movimentos e pragmática das
da sociedade civil, que viabiliza a democratização do país. Dessa relações que ocorrem
entre o Estado e os
maneira, a luta do movimento indígena incidiu na redefinição povos indígenas,
conceitual e pragmática das relações que ocorrem entre o Estado e fundamentadas na
os povos indígenas, fundamentadas na Constituição Federal de 1988. Constituição Federal
de 1988.
A lei estabelece sobre o reconhecimento, manutenção e proteção da
sociodiversidade indígena garantida nas políticas públicas.

Na educação as diretrizes foram organizadas e orientam as práticas


pedagógicas e curriculares voltadas para uma nova estrutura da educação
escolar, que passou a ser concebida como Educação Escolar Indígena
diferenciada, intercultural, bilíngue ou multilíngue. A escola indígena pode ser
criada em solicitação ao atendimento ou iniciativa da comunidade interessada,
necessitando apresentar alguns elementos básicos para sua organização,
estrutura e funcionamento (BRASIL, 2013).

135
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 55 – Condições para a criação da escola indígena

Fonte: Adaptado de Brasil (2013, p. 357).

Educação Escolar Dessa forma, podemos observar que a Educação Escolar


Indígena deverá Indígena deverá se orientar no preconizado pelas Diretrizes
se orientar no
preconizado Curriculares Nacionais, em consonância com as diretrizes condizentes
pelas Diretrizes a cada etapa e modalidade de oferta da Educação Básica, instituídas e
Curriculares garantidas em nível nacional e local.
Nacionais.

136
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

O direito a uma educação escolar diferenciada e voltada aos interesses e


necessidades das comunidades indígenas se encontra assegurado pelo Decreto
nº 6.861/2009, que define sobre a organização da Educação Escolar Indígena
nos territórios etnoeducacionais. O documento assinala sobre a garantia de
organização da Educação Escolar Indígena segundo a participação dos povos
indígenas, segundo sua territorialidade, respeitando suas necessidades e
especificidades (BRASIL, 2013).

Os territórios etnoeducacionais são entendidos pelo Ministério da Educação,


segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2013, p. 359), como:

[...] independentemente da divisão político-administrativa do


país, as terras indígenas, mesmo que descontínuas, ocupadas
por povos indígenas que mantêm relações intersocietárias ca-
racterizadas por raízes sociais e históricas, relações políticas
e econômicas, filiações linguísticas, valores e práticas culturais
compartilhados.

O decreto infere sobre a garantia de normas específicas e diretrizes


curriculares voltadas para as escolas indígenas, que podem apresentar atividades
escolares com calendários diferenciados, independentes do ano civil, desde que
a organização curricular respeite as atividades econômicas, sociais, culturais e
religiosas de cada comunidade.
Os sistemas de
Os sistemas de ensino deverão assegurar uma estrutura ensino deverão
adequada às escolas indígenas, de acordo com as necessidades assegurar uma
estrutura adequada
dos estudantes e as especificidades pedagógicas diferenciadas. às escolas indígenas,
Nestes termos, há inclusão de laboratórios, bibliotecas, espaços de acordo com as
necessidades dos
para o desenvolvimento de atividades esportivas e artístico-culturais, estudantes e as
com materiais que garantam uma oferta de educação com qualidade especificidades
sociocultural (BRASIL, 2013). pedagógicas
diferenciadas.

Assim, o sistema nacional de ensino se encontra organizado em modalidades


de ensino que perpassam desde a Educação Infantil até o Ensino Superior,
incluindo a pós-graduação. Nas comunidades indígenas há outros percursos de
formação que garantem o desenvolvimento de papéis especializados, inexistentes
nas etapas do sistema nacional. Para garantir o direito à diferença da organização
dos sistemas de ensino das comunidades indígenas se faz necessário o seu
efetivo reconhecimento em nível nacional (BRASIL, 2013).

137
Educação Integral e Diversidade Cultural

Atividade de Estudos:

1) Reflita sobre o preconizado nas Diretrizes Curriculares Nacionais


quanto à educação indígena e descreva a organização escolar
indígena.
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Para saber mais sobre o letramento, multilinguismo e


a organização das escolas indígenas, acesse: <http://www.
plataformadoletramento.org.br/alfabetizacao-indigena/>.

Confira este site que dispõe de várias informações interessantes


para você ampliar seus conhecimentos sobre o assunto!

DiretriZes Curriculares Nacionais da


Educação Básicae as Relações Étnico-
Raciais
As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (BRASIL, 2013)
preconizam sobre a organização da educação básica com as relações étnico-
raciais, apontando sobre o currículo e os processos desenvolvidos na escola. Desta
forma, apresentaremos o texto que evidencia o preconizado no documento sobre
as formas de pensar e conceber as relações étnico-raciais nos espaços escolares.

138
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

As políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas, As políticas


necessitam viabilizar condições físicas, materiais, intelectuais e públicas de Estado,
institucionais e
afetivas que favoreçam os processos de ensino e aprendizagem, pedagógicas,
ressignificando a identidade, cultura e história dos negros brasileiros. necessitam viabilizar
condições físicas,
Necessita também de uma nova educação que interprete as relações materiais, intelectuais
entre brancos e negros, apontada como relações étnico-raciais. e afetivas que
favoreçam os
processos de ensino
O termo raça, usado com frequência nas relações sociais e aprendizagem,
brasileiras, impera geralmente em características físicas como a cor de ressignificando a
identidade, cultura e
pele, tipo de cabelo, influenciando o destino e lugar social das pessoas história dos negros
na sociedade. O Movimento Negro atribuiu um novo significado ao brasileiros.
termo raça, passando a um sentido político como valorização do
legado deixado pelos africanos.

Assim como o termo raça, o conceito de étnico que constitui a expressão


étnico-racial, indica as tensas relações em decorrência das diferenças da cor
de pele e traços fisiológicos oriundos da descendência africana, que difere das
origens indígena, europeia e asiática. Vale lembrar que no Brasil convivem de
maneira tensa o padrão estético negro e africano com o branco europeu, e apesar
de quase metade da população ser de negros, ainda persistem desigualdades e
estereótipos racistas. Podemos notar uma excessiva valorização da descendência
europeia em detrimento da africana, indígena e asiática.

Figura 56 – Diversidade étnico-racial

Fonte: Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/1545/diversidade-


etnico-racial-por-um-ensino-de-varias-cores>. Acesso em: 20 jul. 2017.

139
Educação Integral e Diversidade Cultural

Na intenção de educar os sentidos das relações étnico-raciais no Brasil,


surge a necessidade de se pensar em novas aprendizagens em relação
aos pressupostos que inferem entre os brancos e negros, como as trocas
de conhecimentos, em busca de uma sociedade justa e igual para todos. O
documento enfatiza que:

A escola tem papel preponderante para eliminação das discri-


minações e para emancipação dos grupos discriminados, ao
proporcionar acesso aos conhecimentos científicos, a registros
culturais diferenciados, à conquista de racionalidade que rege
as relações sociais e raciais, a conhecimentos avançados, in-
dispensáveis para consolidação e concerto das nações como
espaços democráticos e igualitários (BRASIL, 2013, p. 481).
Para que os
professores Para que os professores consigam superar as práticas
consigam superar
as práticas discriminadoras e a mentalidade racista, necessitam transcender o
discriminadoras etnocentrismo europeu reconhecido como uma verdade social. Na
e a mentalidade quebra desse paradigma, conseguirão reestruturar novos pensamentos
racista, necessitam
transcender o voltados para a realidade social, em virtude das relações étnico-raciais
etnocentrismo e sociais presentes no cotidiano. Somente assim conseguirão colocar
europeu reconhecido
como uma verdade em prática discursos e formas de pensar que consideram todos como
social. sujeitos de direitos iguais perante a sociedade (BRASIL, 2013).

Um dos pontos interessantes a se lembrar, quando discutimos sobre a


descendência africana, diz respeito a que o ser negro no Brasil não se limita
às características físicas, mas de uma escolha política pessoal, como o sujeito
se identifica quanto a sua cor, ou seja, algumas pessoas com os traços físicos
europeus, caso tenham a mãe ou pai negro, se autodeclaram negros, outros com
traços físicos africanos afirmam serem brancos (BRASIL, 2013).

Um dos motivos que poderia justificar essa forma de interpretação estaria


pautado nas influências da ideologia de branqueamento que as pessoas negras
sofreram, produzindo pensamentos preconceituosos quanto a sua origem
africana. Nesse sentido, podemos afirmar sobre os aspectos negativos impressos
pelo racismo, na subjetividade dos negros e nas daqueles que os discriminam,
intensificando formas erradas de interpretação social.

A escola, como Outro equívoco que o documento (BRASIL, 2013) aponta se


instituição social
responsável encontra em julgar que as discussões sobre a questão racial dizem
por assegurar e respeito ao Movimento Negro e estudiosos da área, excluindo a
disseminar o direito escola como local prioritário de debates sobre o tema. A escola, como
à educação para
todos, necessita de instituição social responsável por assegurar e disseminar o direito à
uma posição política educação para todos, necessita de uma posição política contrária às
contrária às formas
de discriminação. formas de discriminação.

140
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Na Constituição Federal de 1988, o artigo 5º, inciso XLII, afirma que "a
prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos de lei" (BRASIL, 2010, p. 17). Portanto, a lei se aplica a
todos na sociedade brasileira, incluindo os que atuam nas escolas, nos discursos
que inferem aos estudantes.

Assim, o trabalho pedagógico que combata o racismo e as discriminações,


segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2013), permite organizar
os processos de ensino e aprendizagem considerando:

• Entre os negros – oferecer conhecimentos e segurança para que desen-


volvam o orgulho de sua origem africana;

• Para os brancos – permitir que identifiquem as influências, contribuições


e participação da cultura africana, no decorrer da história que constituiu
a sociedade atual.

Desta forma, podemos perceber essas influências nos costumes e hábitos da


cultura africana impressas no cotidiano, como a alimentação, vocabulário, formas
de agir, em nosso país. As práticas educativas realizadas pelo professor precisam
levar em conta o acesso a todos, dos conhecimentos básicos fundamentais para
o desenvolvimento de uma Educação Integral na sociedade, para que exerçam
socialmente novas relações étnico-raciais.

Os sistemas
Os sistemas de ensino e os professores deverão assumir como de ensino e os
base filosófica e pedagógica os princípios que apontam sobre a professores deverão
consciência política e histórica da diversidade. São pressupostos que assumir como
base filosófica e
deverão nortear os fazeres desenvolvidos nas escolas, objetivando pedagógica os
práticas que garantam os direitos preconizados na Constituição Federal princípios que
apontam sobre a
de 1988 (BRASIL, 2010), no artigo 5º, quanto à liberdade, igualdade e consciência política
inviolabilidade de direitos a todos. e histórica da
diversidade.

141
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 57 - Consciência política e histórica da diversidade

Fonte: Adaptado de Brasil (2013, p. 484).


Para o
desenvolvimento
de um trabalho Para o desenvolvimento de um trabalho comprometido com a
comprometido
com a garantia dos garantia dos direitos, acesso e permanência de todos na escola, bem
direitos, acesso e como de discursos não discriminatórios e racistas, há necessidade
permanência de
todos na escola, bem de professores qualificados. Somente dessa forma os profissionais
como de discursos ligados ao desenvolvimento da educação serão capazes de mediar
não discriminatórios positivamente as relações humanas que ocorrem em sala de aula,
e racistas, há
necessidade ou melhor, priorizando os sentidos de pertencimento étnico-racial, no
de professores respeito e conscientização de atitudes e palavras preconceituosas.
qualificados.

142
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Atividade de Estudos:

1) Analise sobre os conceitos apontados nas Diretrizes Curriculares


Nacionais quanto às relações étnico-raciais e escreva como seria
a ação do professor em sala de aula, referente à diversidade
étnico-racial.
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Uma excelente dica de filme seria “Histórias Cruzadas”. Um


filme que retrata sobre as relações étnico-raciais na sociedade
estadunidense. No filme há uma protagonista à frente de seu tempo
que revela para a sociedade os fatos ocultos de uma alta sociedade
branca e dominante.

O filme mescla descontração, lutas, tristezas, alegrias, família,


fé, amores e paixões! Belíssimo e vale a pena assistir! Confira e
prepare a pipoca!

AEscolacomo LocalPromotorade uma


Educação em Direitos Humanos para a
Diversidade
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
(BRASIL, 2013), a concepção de Direitos Humanos aborda um conjunto de direitos
que são reconhecidos internacionalmente, contemplam os direitos civis, políticos,
sociais, econômicos, culturais e ambientais. Referem-se à garantia de igualdade e
defesa da dignidade humana, considerando a diversidade existente na sociedade.

143
Educação Integral e Diversidade Cultural

Os Direitos Os Direitos Humanos inferem uma linguagem internacional que


Humanos inferem atua com os estados democráticos de direito e as políticas dos direitos
uma linguagem
internacional que humanos em relação a preconizar e trabalhar sua universalização.
atua com os estados Enfatiza também os princípios da contemporaneidade expressos
democráticos de
direito e as políticas na solidariedade, singularidade, coletividade, igualdade e liberdade
dos direitos humanos (BRASIL, 2013).
em relação a
preconizar e trabalhar
sua universalização. Os Direitos Humanos preconizam lutas contra as desigualdades
de acesso aos bens, discriminações, diversidades socioculturais,
de identidade, gênero, etnia, raça, orientação sexual, deficiências, e em geral
as opressões decorrentes do controle do poder pela classe dominante. A
sistematização das lutas e conquistas normativas ocorreu nos movimentos
contrários ao Antigo Regime, prosseguiu ao longo do período histórico até
alcançar a universalização dos Direitos Humanos.

Na contemporaneidade, a globalização trouxe novos embates para a


garantia, defesa e promoção dos Direitos Humanos. As violações de direitos
expressas nas reações de grupos e países em desigualdade e pobreza, em meio
ao contexto capitalista, indicam uma política emancipatória dos Direitos Humanos,
nesse sentido, a necessidade de se universalizar os direitos básicos de forma
internacional, garantindo uma Educação em Direitos Humanos (BRASIL, 2013).

A partir de 2003, a Educação em Direitos Humanos no Brasil recebeu como


apoio a implantação do Plano Nacional – PNEDH –, revisto em 2006, que aponta
sobre questões referentes ao Programa Nacional de Direitos Humanos e cita os
principais aspectos dos documentos internacionais de Direitos Humanos.

O PNEDH O PNEDH consiste na política educacional do Estado que atuará


consiste na política
educacional do nas cinco áreas: educação básica, educação superior, educação não
Estado que atuará formal, mídia e formação de profissionais. O documento apresenta
nas cinco áreas: como valores a tolerância, o respeito, a solidariedade, a fraternidade,
educação básica,
educação superior, justiça social, inclusão, pluralidade e sustentabilidade.
educação não formal,
mídia e formação de
profissionais. Dessa maneia, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais
(BRASIL, 2013), o PNDEH define a Educação em Direitos Humanos
como um processo sistemático para a formação dos sujeitos em direitos,
articulando algumas dimensões.

144
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Figura 58 – Dimensões de atuação do PNDEH

Fonte: Adaptado de Brasil (2013, p. 499).

Nas últimas décadas houve um maior incentivo à construção da Educação em


Direitos Humanos no país, com o objetivo de proteção e promoção de direitos às
crianças e adolescentes; educação das relações étnico-raciais; educação escolar
quilombola, indígena, ambiental, do campo, para jovens e adultos em condição
de privação de liberdade nos estabelecimentos penais. Inclui ainda as
temáticas de identidade de gênero e orientação sexual na educação, A Educação em
Direitos Humanos
inclusão educacional das pessoas com deficiência e a implementação com base nas
dos direitos humanos nos sistemas de ensino nacional (BRASIL, 2013). diversidades e
garantia do acesso
a todos considera,
A Educação em Direitos Humanos com base nas diversidades de modo transversal,
e garantia do acesso a todos considera, de modo transversal, questões como a
organização dos
questões como a organização dos currículos, relações cotidianas, currículos, relações
práticas pedagógicas e gestão. Portanto, apresenta como principal cotidianas, práticas
intencionalidade o desenvolvimento da formação ética, crítica e política. pedagógicas e
gestão.

145
Educação Integral e Diversidade Cultural

Figura 59 – Intencionalidades de formação da Educação em Direitos Humanos

Fonte: Adaptado de Brasil (2013).

A Educação em
Direitos Humanos
fundamenta-se em As intencionalidades são possíveis somente por meio do diálogo
alguns princípios, e aproximações entre os diferentes sujeitos, na promoção de uma
como a dignidade educação que objetiva a mudança e a transformação social. A
humana, igualdade
de direitos, Educação em Direitos Humanos fundamenta-se em alguns princípios,
reconhecimento como a dignidade humana, igualdade de direitos, reconhecimento e
e valorização das
diferenças e das valorização das diferenças e das diversidades, laicidade do Estado,
diversidades, democracia na educação, transversalidade, vivência e globalidade e
laicidade do sustentabilidade socioambiental.
Estado, democracia
na educação,
transversalidade, Estudaremos cada princípio para compreendermos seus conceitos
vivência e
globalidade e quando associados à Educação em Direitos Humanos.
sustentabilidade
socioambiental.

146
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Quadro 3 – Princípios da Educação em Direitos Humanos

Relacionada à concepção de existência


Dignidade humana
humana baseada em direitos.
Respeito à dignidade humana em qualquer tempo
Igualdade de direitos
e lugar, nas relações entre os sujeitos sociais.
Reconhecimento Enfrentamento dos preconceitos e das
e valorização das discriminações, garantindo que as diferenças
diferenças e diversidade não se transformem em desigualdades.
Liberdade de crença garantida pela Declaração
Laicidade do Estado Universal dos Direitos Humanos de 1948, e pela
Constituição Federal Brasileira de 1988.
Direitos Humanos e Democracia se encontram na mesma
Democracia na base – liberdade, igualdade e solidariedade. Expressam
educação o reconhecimento e promoção dos direitos civis,
políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais.
Os Direitos Humanos caracterizam a condição
Transversalidade,
de transversalidade e devem ser trabalhados
vivência e globalidade
por meio do diálogo interdisciplinar.
A Educação em Direitos Humanos precisa estimular
Sustentabilidade
o respeito ao espaço público como um bem
socioambiental
coletivo e de uso democrático para todos.

Fonte: Adaptado de Brasil (2013).

Tanto a Educação Básica como o Ensino Superior apresentam como


responsabilidades educar os indivíduos numa perspectiva em Direitos Humanos,
mesmo não sendo os únicos formadores sociais, contudo consistem em instituições
com a responsabilidade de promover e legitimar os princípios que norteiam as
relações sociais, éticas e políticas, incluindo a formação dos sujeitos (BRASIL, 2013).

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2013), a Educação em


Direitos Humanos objetiva "[...] que a pessoa e/ou grupo social se reconheça como
sujeito de direitos, assim como seja capaz de exercê-los e promovê-los ao mesmo
tempo em que reconheça e respeite os direitos do outro" (BRASIL, 2013, p. 523).
Desta forma, busca desenvolver uma sensibilidade ética nas relações interpessoais,
em que os sujeitos sejam capazes de perceber o outro como condição humana.

As instituições de ensino compreendem espaços e tempos As instituições de


promotores das diversas relações que se estabelecem entre os que as ensino compreendem
espaços e tempos
frequentam. Assim sendo, compreende diversos processos educativos promotores das
que podem ser citados, como as ações e vivências que ocorrem nos diversas relações
espaços; as relações que se estabelecem em seu entorno, condições que se estabelecem
entre os que as
socioafetivas e materiais, além da organização de infraestrutura para frequentam.
que as propostas culturais educativas ocorram (BRASIL, 2013).

147
Educação Integral e Diversidade Cultural

São processos São processos que precisam ser evidenciados para que a
que precisam ser promoção dos Direitos Humanos aconteça de forma a respeitar as
evidenciados para
que a promoção dos diferenças e garantir práticas democráticas e inclusivas. Sobretudo,
Direitos Humanos isentas de preconceitos, discriminações, violências, assédios, abusos
aconteça de forma
a respeitar as e outras formas de violação à dignidade humana. Quanto à gestão,
diferenças e garantir precisa se pautar em relações que desenvolvam os processos
práticas democráticas democráticos, participativos e transparentes.
e inclusivas.

Os espaços educativos consistem em locais onde há uma


diversidade, que muitas vezes desenvolve conflitos. Assim, surge a necessidade de
se trabalhar de forma crítica, e por meio do diálogo, as diferentes visões de mundo,
sustentados por ideais éticos, no enfrentamento das injustiças e das desigualdades
(BRASIL, 2013).

Nesses termos, o conflito nas instituições educativas se organiza de forma


pedagógica, mediada pela ação docente para que os estudantes sejam capazes
de lidar com as divergências de forma autônoma, pacífica e solidária. São conflitos
mediados pelo diálogo que objetiva a vivência do empoderamento na participação
ativa, fundamentada nos valores da solidariedade, justiça e igualdade de direitos.

Atividade de Estudos:

1) Analise sobre os preceitos referentes ao Plano Nacional de


Educação em Direitos Humanos e escreva sobre suas principais
características educacionais.
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148
Capítulo 5 ESTUDOS SOBRE A DIVERSIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

Algumas Considerações
Concluímos nossos estudos quanto à diversidade no contexto escolar
destacando conceitos e referências preconizadas na legislação educacional,
representada por meio das Diretrizes Curriculares Nacionais. O documento
aponta para a organização curricular e toda estrutura que envolve os fazeres na
escola, suscitando a reflexão sobre as práticas educativas. Será que no cotidiano
escolar, após a leitura desse capítulo, as práticas desenvolvidas estão de acordo
com as Diretrizes Curriculares Nacionais? Houve uma ampla divulgação textual
do documento nas escolas? Um momento de parada para estudos?

São questionamentos que incitam uma profunda análise sobre como caminha
o percurso histórico, temporal e espacial, da organização curricular das escolas
em relação aos documentos legais preconizados em nível nacional. Nesse
sentido, podemos pensar sobre as discussões quanto à diversidade no meio
escolar, como ou acaso ocorrem, de qual maneira, sob qual condição e preceitos.

Os estudos sobre a diversidade apontam elementos subjetivos, que


precisam ser compreendidos para, depois de assimilados, comporem
os discursos dos sujeitos no cotidiano. Dessa forma, como educadores,
necessitamos reorganizar nossos discursos, repensar sobre nossas crenças e
valores, sobretudo conhecer o que está preconizado na legislação nacional e
assumir uma postura de cidadão emancipador.

O desenvolvimento da Educação Integral aborda pressupostos que norteiam


as discussões sobre diversidade em suas múltiplas instâncias, abarcando
reflexões sobre a constituição social e cultural existente na sociedade. A escola,
com novos tempos e espaços, necessita repensar as questões pertinentes
ao currículo, reelaborando-o de acordo com o preconizado na ordem nacional,
segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais.

Somente dessa forma as instituições educacionais estarão garantindo de


fato uma educação igualitária e o verdadeiro acesso a todos, incluindo situações
que incitem a garantia e permanência na escola. As Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica inferem sobre os diversos aspectos necessários
para a construção de uma escola emancipadora, sustentada na perspectiva da
Educação Integral e igualitária a todos.

149
Educação Integral e Diversidade Cultural

ReFerências
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