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Como é?

Noticiam os jornais que a polícia prendeu dois vadios e, de acordo com as leis e o código;
processou-os por vadiagem. Até ai a coisa não tem grande importância. Em toda a sociedade,
há de haver por força vadios. Uns, por doença nativa; outros, por vício.

Tem havido até vadios bem notáveis. Dante foi um pouco vagabundo; Camões, idem; Bocage
também; e muitos outros que figuram nos dicionários biográficos e têm estátua na praça
pública. Não vem, tudo isto ao caso; mas uma idéia puxa outra...

O que há de curioso no caso de polícia de que vos falei, é que os tais vadios logo se
prontificaram a prestar fiança de quinhentos-réis, cada um, para se defenderem soltos. Como
é isto? Vagabundos possuidores de tão importante quantia? Há muito homem morigerado e
trabalhador, por aí, que nunca viu tal dinheiro.

Deve haver engano, por força.

De resto, se não o há, sou de parecer que a tal lei está mal feita. O legislador nunca devia
admitir que vadios, homens que nada fazem, portanto, não ganham, pudessem dispor de
dinheiro, e dinheiro grosso, para se afiançarem. Ou eles o têm e obtiveram-no por meios e,
portanto, não são vadios; ou, tendo-o e não trabalhando, são coisas muito diferentes de
simples vadios.

Quem cabras não tem e cabritos vende...

Não sou, pois, bacharel, jurista, nem rábula e fico aqui.

Marginália, s.d.

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