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Governo Federal
Secretaria de Assuntos Estratégicos
da Presidência da República
MINISTRO Welling ton Moreira Franco
Impressão
Várias matérias traçam painéis sobre as atividades do Ipea. Uma
Gráfica Art Printer reportagem de Cora Dias mostra a estrutura da instituição, suas dire-
torias, os trabalhos realizados e as inúmeras publicações e iniciativas
que se espalham pelo país. Outras duas matérias dão conta das diversas
parcerias estabelecidas pelo Instituto junto a instâncias de governo e da
sociedade e como se formaram os organismos de assessoria e pesquisa
AS OPINIÕES EMITIDAS NESTA PUBLICAÇÃO SÃO DE EXCLUSIVA E
DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DOS AUTORES, NÃO EXPRIMINDO, voltados para demandas do Estado ao longo do século XX. Além disso, três
NECESSARIAMENTE, O PONTO DE VISTA DO INSTITUTO DE PESQUISA
diretores do Ipea e seu presidente traçam metas para os próximos anos.
ECONÔMICA APLICADA (Ipea).
Artigos de Carlos Lessa, Dércio Garcia Munhoz, Candido Mendes e
É PERMITIDA A REPRODUÇÃO DA REVISTA,
Pedro Demo, conselheiros do Instituto, completam a edição, situando
DESDE QUE CITADA A FONTE.
o país diante das incertezas da crise mundial.
DESAFIOS (ISSN 1806-9363) É UMA PUBLICAÇÃO DO Ipea
PRODUZIDA PELA VIRTUAL PUBLICIDADE LTDA.
Boa Leitura!
Artigos
Pág. 82 O Brasil (ainda) precisa planejar
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Carlos Lessa
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ENTREVISTA
João Viana
SNI, entendeu o governo brasileiro que órgão do Poder Executivo, então, em agora na área de defesa para saber quais
que pese o Ipea estar vinculado à SAE, os desafios para que possamos ter o país
precisava reorganizar na administração
que queremos no futuro.
a apuração, o manejo e a reflexão sobre ela é diferente do Instituto. O Ipea é um
informações estratégicas e um planejamento órgão de pesquisa aplicada, que tem não
estratégico. Foi criada a SAE, com outro só demandas do governo, como também O Ipea é um órgão de pesquisa
nome na época. Tiveram vários titulares, perguntas a serem respondidas pelo seu aplicada, que tem não só
todos muito ilustres, o Eliezer Batista, o quadro técnico. Ele busca fazer pesquisas demandas do governo, como
Almirante Mário César Flores, o Ronaldo para servir à administração pública também perguntas a serem
Mota Sardenberg e o Luiz Gushiken. e que sustentem políticas públicas,
respondidas pelo seu quadro
Finalmente, no governo do presidente Lula, diferentemente da universidade que,
técnico. Ele busca fazer pesquisa
ele resolveu transformar a Secretaria em quando define um tema de pesquisa,
para servir à administração
Ministério. E vieram outros dois ilustres não há nenhum compromisso com a
aplicação na realidade. Ela tem sim valores
pública e que sustentem políticas
pensadores. O professor Mangabeira
Unger e o embaixador Samuel Pinheiro e medidas no plano teórico, com nível públicas, diferentemente da
Guimarães. A Secretaria tem uma história de abstração alto. A lógica de avaliação universidade que, quando define
antiga, mas o nível de institucionalização acadêmica é diferente da avaliação dos um tema de pesquisa, não há
ainda é muito precário. trabalhos do Ipea e da SAE. Um órgão do nenhum compromisso com a
Poder Executivo tem que produzir, tem aplicação na realidade.
Desenvolvimento - O senhor falou em dar mais que ter nos seus desafios o compromisso
institucionalidade à SAE. Como será feito isso? em apresentar um produto. O produto
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trabalhando. Um é no programa de O poder público, as lideranças políticas,
erradicação da miséria. A SAE, com o pensamento político brasileiro não
os técnicos que tem, vem participando fez uma opção clara. O próprio Favela-
junto ao Ministério do Desenvolvi- -Bairro, de alguma maneira, contorna o
mento Social na formulação do plano,
nos levantamentos e nas avaliações das anos problema. Para resolver, para remover,
tem de fazer o que Negrão de Lima fez,
políticas. Nós temos um programa para é a expectativa de vida em algumas Lacerda fazia, etc. Para fazer a melhoria
a primeira infância, de zero a três anos. áreas do Rio de Janeiro do bairro, nós temos que enfrentar um
Pretendemos, no máximo, até o começo grande desafio que é a regularização
do ano que vem, oferecer uma política fundiária na área urbana. Hoje é mais
estruturada e colocar à disposição dos grave que na área rural.
Estados, municípios e da própria União. em vilas operárias, conjuntos residenciais,
Vamos testar essa política na cidade do Rio grandes, pequenos, médios, programas Desenvolvimento - Qual é a dimensão do problema?
de Janeiro e na cidade de Niterói. Estamos de melhorias em áreas de favela, mas a Moreira Franco - Se você vai às áreas
iniciando um trabalho sobre favela, um questão central não está enfrentada ainda metropolitanas, sobretudo nas regiões
grande desafio que se tem. Há mais de pelo poder público no Brasil. A política é periféricas, essa questão imobiliária
um século se pensa em habitação popular, de remoção ou a política é de melhoria, de é um problema gravíssimo. Você tem
João Viana
lham, investem e melhoram suas casas,
e aquilo não tem dono. Quer dizer, se
houver qualquer problema, ele não
tem os instrumentos legais para ir ao
Poder Judiciário e arbitrar conflito
nenhum. Se a política é de melhoria,
e a experiência internacional mostra
que essa linha é melhor que a outra,
certamente vamos ter de enfrentar a
questão da legalização fundiária. Na
cidade do Rio de Janeiro, mais de 50%
das residências não são legais.
O produto da SAE é a
formulação de política, seja
social, seja na área econômica,
seja agora na área de defesa.
Essas são as três áreas nas
quais a SAE está organizada
para atuar, pensar e produzir
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Moreira Franco - Velha, já passou... O microeconomia e para os problemas
grande avanço que nós tivemos é que concretos, do que propriamente para
algumas questões tanto macroeconômicas as grandes questões. Os fundamentos
como macropolíticas, macroideológicas, macroeconômicos já estão dados, vamos
já foram superadas. Nós temos a questão resolver o problema da infraestrutura,
macroeconômica resolvida. A sociedade vamos resolver o problema do crédito, milhões
brasileira não quer inflação. A presi- vamos resolver o problema do sistema
de pessoas chegaram ao sistema de crédito
denta Dilma entendeu claramente esse bancário, que está sendo pressionado
sentimento, tanto que tem mantido uma por uma clientela nova de 49 milhões
posição muito atenta e muito rigorosa, de pessoas que chegaram e que têm
para evitar que a inflação volte. Diante operações financeiras com seus créditos.
desse quadro, eu creio que o Estado Outra coisa é a qualidade das políticas Desenvolvimento - Quais devem ser as prioridades
tem que ter presença, o Estado tem que públicas, tanto sociais quanto econômicas do Brasil para os investimentos, para o longo prazo, o
fazer e estimular a atividade econômica, etc. Isso é um grande desafio. Agora há desenvolvimento sustentável?
João Viana
O Conselho é um órgão
político da maior
importância. Ele é sobretudo
eficaz em momento de
crise, por reunir lideranças
de diversos setores da
sociedade: empresários,
trabalhadores, movimentos
sociais, intelectuais,
personalidades que
formam opinião
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problemas. Precisamos melhorar o ambiente no mesmo trabalho. Do jeito como as
institucional para o empreendimento. coisas são hoje, esse tempo que você está
Criar ou fechar uma empresa no Brasil no mesmo trabalho é visto ao contrário
é muito complicado. Isso desestimula de antes. A pessoa boa está numa rotação
você a se organizar, a exercitar sua capa-
cidade criativa. O mundo hoje mudou
que muda não só de trabalho, de empresa,
mas muda de cidade, de país. A mobilidade milhões
muito, valores como permanência em é muito grande. Você precisa mudar o de novos empregos foram criados
emprego hoje é uma coisa que tem bolor, ambiente. A segunda coisa que eu acho na última década
é bolorento. Antigamente você media a é que a poupança privada e pública no
eficácia de uma pessoa, sua referência e Brasil é muito baixa. Consequentemente,
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produzir gás no Golfo do México, trazer colocou mais recursos no município. O
pro Brasil, vender no Brasil e pagar todos bolo foi distribuído numa proporção menor
os custos de importação, do que produzir para os Estados e menor para a União.
no Brasil, por causa do preço da energia. Em plena democracia, com o Congresso
João Viana
repensado. Primeiro porque o Estado
não é dono de dinheiro, é um equívoco
o governador falar do “meu orçamento”,
do “meu dinheiro”, “eu estou perdendo”,
“o Estado está perdendo”. O dinheiro não É mais barato
é dele, você só perde o que é seu. O que é produzir gás no Golfo
de todos é de todos. Isso é de todos. Eis aí do México, trazer
uma questão federativa. É absolutamente pro Brasil, vender no
incompreensível que a energia você pague Brasil e pagar todos os
na origem e o petróleo você pague na
custos de importação,
boca, no consumidor, no destino. Por
do que produzir no
que ter dois critérios? Por que a energia
elétrica é uma sistemática e o petróleo é
Brasil, por causa do
outra? Além disso, o ganho que o pré-sal preço da energia
desenha é um ganho do País. E olha que
sou do estado do Rio de Janeiro e acho
que, no ambiente em que nós estamos
vivendo, o Rio fez bem em brigar como
brigou, pois essa é a regra do jogo.
João Paulo
dos Reis Velloso
Gilberto Costa – de Brasília
O encontro de
formações diversas
Sidney Murrieta
10%
tínhamos de preparar documentos para distribuição de renda no Brasil. O [Carlos]
o planejamento. Tínhamos dois valores: Langoni escreveu um livro contra o ponto
liberdade de criação e de pensamento. de vista do Fishlow. Na verdade, os dois
Assim, fizemos diagnósticos da economia estavam com razão. Porque tinha havido
achatamento de salários sim. O Langoni
foi o
brasileira. O levantamento da indústria foi
feito por Arthur Candal e dois assistentes tinha razão por causa da importância do
recém-formados, Pedro Malan e Regis capital humano. A última palavra coube
crescimento da indústria brasileira
Bonelli, todos de esquerda. Não havia medo ao Samuel Morley, também do grupo de
entre 1929 e 1932
de ideias. Outra diretriz era “nós temos Berkeley [autor de Poverty and Inequa-
que recrutar onde for possível”. Fizemos lity in Latin America]. Ele escreveu que
um convênio com a Universidade de o problema não era propriamente de
Berkeley [EUA]. Chegaram cinco ou seis educação. O Brasil fez sua industriali-
Desafios - O senhor se considera fiador da liberdade interna zação com os analfabetos que vinham do
economistas e ficaram no Ipea. O Albert
do Ipea em um momento em que não havia liberdade no país? Nordeste para o Rio e para São Paulo...
Fishlow veio para o Brasil dessa forma.
Reis Velloso - Eu sempre fui franco atirador, Quando saiu o I PND, o primeiro artigo
Ao mesmo tempo, nós íamos caçando os
nunca me filiei a correntes nem dentro contra era de dois economistas do Ipea,
brasileiros e mandando para o exterior
da economia, e nem na área política. Pedro Malan e Regis Bonelli. Eu não dei
para fazer pós-graduação e voltar para
Nós não tínhamos medo de ideias. resposta, poderia parecer que eu estava
trabalhar no Ipea.
Tudo que se desejava funcionou, isso o querendo prevalecer da minha condição.
Desafios - O que os estrangeiros achavam de interessante [Roberto] Campos segurou e depois eu
no Brasil, a ponto de deixarem seus países? também garanti. O pensamento era o Desafios - O fato de estar sob um regime fechado favo-
Reis Velloso - Eles ficavam algum tempo seguinte: nós só tínhamos que prestar recia o planejamento? Se o momento fosse de normalidade
aqui porque sabiam que virariam brasi- contas ao presidente da República. O democrática, o Ipea seria o mesmo?
lianistas, como foi o caso do Fishlow. Ele Ipea foi transformado em fundação e Reis Velloso - Acho que sim, porque o
acabou de publicar um livro sobre o país. tinha carreira própria. Eu me lembro que [Roberto] Campos era um liberal. Ele já
Havia um interesse pelo Brasil e o Ipea era o chefe de gabinete militar do governo tinha trabalhado no governo Juscelino
o lugar onde eles podiam fazer pesquisa Geisel [general Hugo Abreu] veio falar com o Lucas Lopes [equipe que elaborou
e escrever, na ideia de trabalhar para o comigo, pois havia ciumeiras e reclama- o Plano de Metas], fez um plano de esta-
planejamento. Naqueles diagnósticos ções na área militar. O motivo era que bilização que JK jogou na lata do lixo...
setoriais todos atuaram, cada um na sua o Ipea tinha carreira própria, aprovada Ele teve a ideia e eu executei no meu
especialidade. Eles davam expediente no por portaria do presidente da República. estilo. Para saber do Planejamento sob o
Ipea, aprendiam a língua e ensinavam Eu respondi ao general, “se o senhor Roberto Campos leia a síntese do Paeg.
jovens economistas brasileiros a fazer quiser o senhor fala com o presidente Não tem coisa mais liberal. Foi escrita
pesquisa. da República. Mas tem o seguinte: ou o pelo Og Leme, que fez pós-graduação na
Ipea mantém a carreira própria ou eu não Universidade de Chicago, onde tinha um
Desafios - Que importância teve a existência do Ipea para sou mais ministro”. Todos os economistas pessoal monetarista. A minha universidade,
a formação do campo acadêmico de Economia no Brasil? do MDB trabalhavam no Ipea. Por quê? de Yale, estava de outro lado. Para mim,
Ariano Suassuna
O arauto dos
compadecidos
1947
Ariano viveu até os 15 anos na fazenda
Acahuan, de propriedade de sua família, Desafios do Desenvolvimento - O senhor diz que globalização
no sertão. Ainda adolescente, foi morar no é um novo tipo de colonialismo. Outros países têm políticas mais
Recife (PE), onde se formou em direito. direcionadas para proteção da cultura nacional, como França, outras
A carreira literária começou cedo, em nações europeias e Estados Unidos. No Brasil, falta política pública
1947, com o lançamento de sua primeira foi o ano para defender a cultura nacional face à globalização?
peça, Uma mulher vestida de sol. Oito anos Ariano Suassuna - Olha, está melhor que
de sua primeira peça, Uma mulher vestida de
depois seria encenado o espetáculo que lhe sol, oito anos antes de Auto da Compadecida quando eu era jovem. Hoje, ainda há uma
deu projeção nacional, Auto da compadecida. certa preocupação. Com a criação do
Professor de estética na Universidade Ministério da Cultura, ele tem exercido
Federal de Pernambuco entre 1956 e 1994, um certo papel nesse caminho. Eu destaco
Ariano Suassuna construiu uma sólida Em seu discurso de posse na Academia no Ministério da Cultura um dado que me
carreira literária, materializada em 19 peças Brasileira de Letras, proferido em agosto de parece muito positivo, o estabelecimento
Sidney Murrieta
dos chamados Pontos de Cultura, que Michael Jackson e Madonna é feita hoje. Desse ponto de vista, é um
serviram muito para a interiorização da e Lady Gaga, têm mais mal terrível, porque é uma tentativa de
cultura. Antigamente, pensava-se em cultura uniformização das culturas, niveladas pelo
sucesso que Euclides
como uma espécie de perfumaria, quer gosto médio, que é uma das coisas piores
dizer, algo que permanecia nas capitais.
da Cunha, Cervantes,
que pode acontecer à cultura. Vou falar de
As poucas iniciativas do poder público, no Dante ou Nero. E levando um artista verdadeiro, como Villa-Lobos.
sentido de fomentar e defender a cultura pro campo da música, têm Você está para me apresentar um artista
eram tomadas mais no litoral. Isso vem mais sucesso que Mozart. de fora que tenha a importância de Villa-
de um historiador baiano do século XVI, Agora, a música de -Lobos. Eu tenho grande admiração por
frei Vicente do Salvador, que dizia que Mozart foi um êxito e vai ser dois músicos franceses, Débussy e Erik
os portugueses chegaram aqui e ficaram Satie, que representam para a França o que
assim daqui a três séculos,
como caranguejos, arranhando a costa. Villa-Lobos representou e representa para
quando ninguém mais vai
nós. Você tem de fazer diferença entre um
saber quem foi Lady Gaga
Desafios do Desenvolvimento - O Brasil hoje é um artista desse e um que atinge o sucesso,
país com projeção maior no mundo. Do ponto de vista da que é outra distinção fundamental para se
cultura, não há benefício na globalização? isso que chamam de globalização e a entender o que há comigo. Eu faço uma
Ariano Suassuna - Para conversar comigo, universalidade da cultura. Veja bem, falo distinção entre sucesso e êxito. Eu não
você precisa fazer uma distinção entre da globalização nos termos em que ela acredito que nenhum artista verdadeiro
procure o sucesso. O sucesso é efêmero escrevendo a peça Auto da Compadecida, sentido literário, e não religioso. São João
por natureza. Outro dia, eu estava falando muita gente me perguntava se era uma e o profeta Ezequiel são, para mim, os
da época em que Michael Jackson ainda peça regionalista. Eu dizia que era, porque maiores autores da Bíblia, aqueles com
era vivo. Eu dizia que Michael Jackson não tinha nem como explicar na época. os quais eu mais simpatizo. São grandes
e Madonna, e hoje eu diria Lady Gaga, Mas eu sabia desde logo que haveria uma poetas e grandes escritores. Repare em
têm mais sucesso que Euclides da Cunha, distinção fundamental. Porque eu não São João, que coisa linda: “E viu-se um
Cervantes, Dante ou Nero. E levando sou um escritor naturalista. Existe no grande sinal do céu. Uma mulher vestida
pro campo da música, têm mais sucesso de sol e a lua estava sob seus pés, e uma
que Mozart. Agora, a música de Mozart coroa de doze estrelas sobre sua cabeça”.
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foi um êxito e vai ser assim daqui a três Jamais um naturalista escreveria isso. E o
séculos, quando ninguém mais vai saber fundamento poético da minha primeira
quem foi Lady Gaga. Mozart continuará peça são esses versos de São João. Então,
sendo um dos músicos mais importantes eu sabia que não era regionalista, mas
que já existiu. Quando eu falo contra a entre o regionalismo e o modernismo,
globalização, é essa globalização de Lady peças eu me ligo mais ao regionalismo.
Gaga, e não o valor universal de Mozart.
de teatro, cinco livros de prosa, além de
Desenvolvimento - Mas, como Tolstói dizia: “Se queres
vários volumes de poesia, compõem sua obra
Desenvolvimento - Apesar de o movimento regionalista ser universal, pinta a tua aldeia”...
de literatura ser anterior ao século XX, ele ganhou força no Suassuna - Isso aí já é outra coisa,
século XX, meio que como resposta ao movimento modernista. você está discutindo a oposição local e
O movimento modernista, essa coisa de tentar deglutir o que escrevo uma dose de fantástico e de universal. Na minha opinião, não existe
que vem de fora, estaria mais como uma aceitação da poético que vem da literatura de cordel obra que seja universal, obra importante.
globalização ou uma universalização? e de outros tipos de escritos pelos quais Todas as obras que eu conheço, e das
Suassuna - Naquele tempo não se cuidava eu tenho muita admiração. Eu gosto quais eu gosto, de início são locais,
muito de globalização porque não existia muito do Apocalipse de São João, eu nem regionais, nem nacionais. Dom
ainda. Mas eu não me considero um regio- o considero uma obra prima literária. Quixote é um livro que só poderia ter
nalista e, se você olhar bem, há distinções Eu acho a Bíblia, como um conjunto, sido escrito na Espanha, em Castela
fundamentais. Eu considero regionalismo a epopeia mais importante que já foi e na Mancha. Quer dizer, Cervantes
um neonaturalismo. Quando eu estava escrita. Superior à Odisseia, à Ilíada, no é um autor que só poderia surgir na
em todos os lugares eu tenho dito isso, “E você precisa levar em conta que o de Cervantes, você sabe o nome de Lope
porque para mim a juventude brasileira homem que anda a cavalo é o mesmo de Vega, Calderón de La Barca e Góngora.
está ansiosa para ouvir falar do Brasil. Ela que anda de moto”. E quantas centenas de escritores não têm
corre aos montes, a grande maioria das hoje? Já desapareceram, e o Dom Quixote
pessoas que vão me ouvir é constituída Desenvolvimento - Mudou a ferramenta, não mudou vai ficar. E a obrigação de Cervantes era
por jovens. o homem... recriar, na literatura, a Espanha de sempre,
Suassuna - É claro. O ser humano é o o espanhol de sempre, pelo espanhol de
Desenvolvimento - Isso nos leva à próxima pergunta, mesmo, em todos os lugares e em todas suas circunstâncias. Então, se Cervantes
exatamente sobre essas influências de infância. Sua as épocas. Os problemas do ser humano escrevesse hoje, o Dom Quixote teria a
infância foi bastante marcada pelo circo, pelo mamulengo, são os mesmos: fome, injustiça, ciúme, mesma grandeza.
pela criança que brinca no campo, na terra. A criança de amor, paixão, morte, que é o principal
hoje é muito levada pelas novas tecnologias, brinca mais problema de todos e o mais democrático, Desenvolvimento - O que o senhor disse agora é uma
dentro de casa, em contato remoto com outras crianças. que atinge todo o mundo. Esses problemas, resposta àqueles que atacam a defesa que o senhor faz da
Haveria uma forma de as novas tecnologias recuperarem enquanto existir o ser humano, eles vão cultura brasileira, afirmando que é a defesa de uma cultura
esse passado? valer. Já que eu falei no Dom Quixote, estática e fossilizada...
Suassuna - Essa é uma mudança inevitável. hoje não é mais o tempo de Cervantes. Suassuna - Eu escrevo sobre a fase que eu
Nunca houve um tempo que se congelasse. Acontece que, quem escreve somente conheci. Minha obra está praticamente
Outro dia um jornalista escreveu um com os elementos de seu tempo, nas completa, estou agora escrevendo meu
artigo e disse: “Ariano Suassuna precisa suas circunstâncias, que são acidentais, último livro. Então, ainda não aparece
levar em conta que o homem que andava está desgraçado, liquidado, fadado a ser moto, mas aparece uma bicicleta. E podia
a cavalo hoje anda de moto”. Aí eu disse: esquecido e deixado de lado. Do tempo aparecer uma moto. Se ela for boa, ela
Eu acho que a
cultura é a ponta
de lança do desenvolvimento.
A gente tem que colocar
um sonho na frente.
Porque se você for contar
somente com a razão e com
a ciência, você fica quieto
num canto e isso pode
te levar para um bom caminho
ou para os piores cantos
do mundo
Sidney Murrieta
sou sertanejo. Mas eu acho que, sem zona baixa. Euclides descreve: Canudos muito: ele é um integrante privilegiado e
querer, ele foi até injusto com o Brasil era uma tapera situada dentro de uma diferenciado, mas é um integrante dessas
das cidades. Inclusive ele não percebeu furna, era cercada por um cinturão de pessoas que atacam o chamado terceiro
que, em Canudos, havia uma parcela do serras. No lugar dessa serra que circunda mundo. Ele não é um bruxo, que ficou
Brasil real recrutada pelo Brasil oficial a cidade, havia um chamado morro trancado lá, encastelado, e mandou os
para tirar dos seus irmãos. Existe uma da favela, porque tinha muita favela outros morrerem. Mas ele procurou alçar-se
coisa certa, uma coisa do símbolo, que nele. Então, quando acabou a guerra, acima de si mesmo e, apesar de seus erros
para mim, como escritor, me toca muito. os soldados e oficiais voltaram para as e de tudo que ele fez, a morte bela sagra a
Eu não sei se você sabe, mas pra mim cidades, para o Rio inclusive. E, quando inteira. Então, como ele morreu belamente,
sempre chamou atenção, que eu não voltaram, os oficiais ficaram nas casas depois de adulto eu notei que lá estava ele
sei por que se chamam os aglomerados de baixo, como sempre. E os soldados assaltando Canudos também. Eu, quando
urbanos das grandes cidades brasileiras subiram para o morro, que começou a ser menino, peguei os fragmentos de uma
Diante de uma plateia de 300 pessoas, Suassuna contou de sua preocupação com a invasão cultural estrangeira:
“Quando eu era jovem, os brasileiros tinham complexo de inferioridade. Hoje estou notando uma mudança”.
“eu gosto de contar história e na minha vida não acontece nada. O que é que eu vou fazer, se eu não inventar?
eu minto. Todo escritor mente. O auto da Compadecida é uma mentira enorme. na literatura, a gente faz esse acordo”
300
pessoas
entre servidores e colaboradores, além de
representantes do governo e da sociedade
compareceram à exposição de Suassuna
na plateia havia servidores e colaboradores da casa, além de representantes de vários órgãos Aos 84 anos, Suassuna disse que a morte
do governo e da sociedade não está nas suas previsões. “Mas eu não
sei se a morte aceita minha teoria. Eu digo
estou notando uma mudança. Mas quando pelo povo brasileiro. Os próprios brasileiros sempre que toda morte é uma coisa de
eu era jovem, e olha que faz muito tempo, tinham complexo de inferioridade.” Ao final, suicídio. A pessoa começa a se conformar
havia um desprezo generalizado pelo Brasil e o romancista brincou: “Olhe, se algum de e ela vem e dá o bote. Mas, se a gente não
se conformar, a morte cansa. A morte no prometeu defender a cultura brasileira novo reposicionamento do nosso país”. O
sertão da Paraíba é personalizada, ela se até o fim. presidente indicou que o Brasil vive um
chama Caetana”, contou. momento singular de enfrentamento de
O dramaturgo, que escreveu clássicos mazelas, de heranças seculares como a
como O Auto da Compadecida, Uma mulher PlanO avançaDO O presidente do Instituto, fome e a desigualdade. Ao mesmo tempo,
vestida de Sol e Romance d’A Pedra do Reino, Marcio Pochmann, participou da abertura é um país que dá passos mais largos, tendo
confessa que mente para criar suas obras. do evento e destacou o Ipea como a maior condições de liderar outro projeto de
“Eu gosto de contar história e na minha instituição pública de produção de conheci- desenvolvimento para o mundo.
vida não acontece nada. O que é que eu vou mento sobre o desenvolvimento brasileiro. “O planejamento estratégico do Instituto,
fazer, se eu não inventar? Eu minto. Todo “É a única voltada para o Estado brasileiro, o concurso do Ipea, que permitiu a criação
escritor mente. O Auto da Compadecida é porque o Ipea não é apenas uma instituição de duas novas diretorias (Diretoria de
uma mentira enorme. Na literatura, a gente que assessora, que produz conhecimento para Estudos e Relações Econômicas e Políticas
faz esse acordo”. o poder Executivo, tal como foi criada em Internacionais e Diretoria de Estudos e
Suassuna é o criador do Movimento 1964; mas também está conectada ao poder Políticas do Estado, das Instituições e da
Armorial, voltado ao desenvolvimento e Legislativo e Judiciário”, afirmou. Democracia, e o fortalecimento institucional
ao conhecimento das formas de expressão Pochmann recordou que, nestas quase nos colocaram em um plano mais avançado,
populares tradicionais brasileiras. A cinco décadas, o Instituto tem se iden- em um esforço imprescindível de repensar
iniciativa, que teve início na década de 70, tificado com as trajetórias do Brasil. o Brasil em uma perspectiva não unidis-
busca ir contra o ritmo industrial imposto “Nós todos temos feito um esforço muito ciplinar”, constatou. Pochmann apontou
pela cultura de consumo. “O Movimento grande nesse período recente para tornar que a unidisciplinaridade talvez seja uma
pretende realizar uma arte brasileira o Ipea uma instituição de pesquisa, de das grandes vulnerabilidades da produção
erudita, a partir das raízes populares da acompanhamento de políticas públicas, do conhecimento. “O especialista é cada
nossa cultura”, explica o fundador, que do planejamento brasileiro à altura do vez mais alguém que sabe muitas coisas de
marcio Pochmann,
presidente do Ipea
O Instituto que
pesquisa e planeja o
futuro do país
Cora Dias – de Brasília
Como funciona, o que produz, como produz e quem trabalha na principal instituição de pesquisa
brasileira e uma das mais importantes do mundo. Com um leque de atividades cada vez mais amplo,
o órgão começa a instalar escritórios em várias regiões do país e a se internacionalizar. Aos 47
anos, o Ipea tem diante de si novos desafios: o de assessorar o Estado e a sociedade brasileira na
construção da quinta economia global nos próximos anos.
A vinculação do
Instituto à Secretaria rgãos Específicos e Singulares Entidade Vinculada
e Assuntos Estratégicos
da Presidência da República
deu início a um amplo Subsecretaria de Ações Estratégicas
processo de revitalização
institucional. Essa qualificação
Subsecretaria de Desenvolvimento Sustentável Conselho de Desenvolvimento
busca potencializar Econômico e Social – CDES
suas capacidades, sua
missão e coloca diante
dele novos desafios e Estrutura organizacional do Ipea
estratégias de ação
DISET
Sua importância cresceu nos últimos Diretoria de Estudos e
Políticas Setoriais de
anos, com a redefinição do papel do Estado Inovação, Regulação e
DIDES Infraestrutura DIRUR
como agente decisivo do desenvolvi- Diretoria de Diretoria de Estudos
Desenvolvimento e Políticas Regionais,
mento. Juntamente com várias iniciativas Institucional Urbanas e Ambientais
oficiais – da qual o Programa de Acele-
ração do Crescimento (PAC) é uma das
DIEST PRESIDÊNCIA
mais importantes – o Ipea tem crescido Diretoria de DISOC
Estudos e Políticas Diretoria de
e diversificado seu leque de atuação. A do Estado, das Estudos e
perspectiva de o Brasil tornar-se a quinta Instituições e da Políticas Sociais
Democracia
economia do mundo nos próximos anos DINTE
cria a necessidade de um organismo mais Diretoria de Estudos DIMAC
e Relações Econômicas Diretoria de
atuante, mais sofisticado e cada vez mais e Políticas Estudos e Políticas
Internacionais Macroeconômicas
plural, democrático e atento às demandas
da sociedade.
Antônio Delfim Neto João Paulo dos Reis Velloso Rubens Ricupero
7. Sustentabilidade Ambiental
O Ipea mantém atualmente 1.176 instituiu de forma inédita o Plano de servidores. Após autorização do Ministério
cargos efetivos em seu quadro de servi- Carreira e Cargos do instituto. do Planejamento, o quantitativo de vagas
dores, dos quais 714 estão ocupados. No mesmo ano, o Instituto realizou o autorizado para o processo seletivo teve
Para regularizar esse corpo funcional, a maior concurso público de sua história. ampliação de 50%. As provas resultaram
Lei 11.890, de 24 de dezembro de 2008, Foram convocados, em primeira chamada, 80 no ingresso de 117 concursados altamente
1176
Total do órgão 714
* Cargos em extinção
Sidney Murrieta
cargos
efetivos fazem parte do quadro
de servidores do Ipea
Muito além da
Esplanada
ipea reforça parcerias com universidades, órgãos públicos e entidades, amplia leque de pesquisa
aplicada e consolida posição de articulação na rede de planejamento de todo o país
repertório de problemas sob investigação, região. A reversão do quadro é compromisso pelas políticas públicas. Estamos trabalhando
trouxe elementos para a criação de novas governamental. com pesquisa aplicada no sentido de que o
políticas públicas e aproximou o órgão da Em sua opinião, as diversas cooperações que venha a ser feito ajudará a resolver um
sociedade. dão um “radar” ao Ipea, que consegue mapear problema concreto, fornecendo um parâmetro
“Não fazemos mais um debate para trabalhos em andamento e identificar especialistas para a decisão”.
cinquenta pessoas na sala”, avalia Luciana em diversas áreas de conhecimento. “Podemos Conforme a chefe da Assessoria Técnica,
Acioly da Silva, chefe da Assessoria Técnica olhar se já há uma discussão importante, nos as diversas parcerias são o “pulo do gato”, pois
da Presidência do Ipea, ao dizer que cada apropriar dela e chamarmos as pessoas”, diz ele. trazem informações ainda não trabalhadas,
vez mais os assuntos de pesquisa despertam Um mapeamento sobre as pesquisas aproxima pesquisadores do Instituto e das
interesse social muito além da Esplanada nas ciências humanas de todo o país será universidades de questões urgentes e soma
dos Ministérios. desenhado na II Conferência de Desen- inteligências, “mobilizado conhecimento
Para Aristides Monteiro Neto, da Asses- volvimento, a Code 2011, que acontece em para decisões políticas”.
soria de Planejamento e Articulação Insti- Brasília, entre 23 e 25 de novembro. Para Aristides Monteiro concorda com a
tucional, as parcerias trouxeram “ganhos realizar a conferência, o Ipea mobilizou 11 avaliação. “Eu vi muito descasamento entre
11
“ainda não disseram exatamente à academia Além de não ter preconceito quanto ao
onde quer que ela deposite mais energia”. conhecimento, o Ipea não assume posição
O técnico não defende que os governos em disputas políticas e econômicas. Capital
interfiram nas iniciativas dos pesquisadores. e trabalho são parceiros do Instituto. É
“Não é preciso ofuscar as ofertas individuais,
mas é necessário nuclear algumas coisas”,
associações o caso, por exemplo, do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudo Socio-
esclarece. Para ele, as fundações de amparo à e sociedades de pesquisa foram mobilizadas econômicos (Dieese), que já firmou com
pesquisa já entenderam isso. “O governador
pelo ipea para a realização da Code 2011 o Ipea termo de cooperação para estudos
reclama que a Universidade não dá resposta sobre inclusão no mercado de trabalho; e
para a política pública”, é uma frase que diz também é o caso da Federação das Indús-
já ter ouvido de representantes de mais de em torno da ideia do desenvolvimento”. O trias do Estado de São Paulo (Fiesp), com
uma das 25 fundações com as quais o Ipea interesse comum facilita a comunicação, pois quem o órgão pesquisa a cadeia produtiva
mantém convênio. “a linguagem é a mesma”, em suas palavras. da indústria da defesa.
Presidenta Dilma rousseff durante a cerimônia de abertura do diálogo de alto nível brasil China em Ciência, tecnologia e inovação em Pequim, em abril de 2011
problematizando coisas”, explica ela. “Não nacionais, o Ipea mantém trabalhos com convênios e acordos de cooperação (nacionais
ou internacionais) não envolvem transferência
de recursos. Um levantamento sobre os
projetos em andamento em outubro de 2010
Divulgação
10%
demandando”
A estratégia do
planejamento nacional
Cora Dias – de Brasília
Stock
Divulgação
para o desenvolvimento do
Brasil é assunto em pauta nos
“O momento é de retomada do
dias atuais. Os brasileiros já
papel do Estado como indutor
se habituaram, por exemplo, aos planos
de governo que duram, em média, quatro
do desenvolvimento”
anos. Sabe-se que um plano é responsa-
Pérsio marco Antônio Davison,
bilidade da administração que se inicia, e Técnico de Planejamento e Pesquisa
o seguinte será concebido pela equipe de
um futuro presidente da República. Afinal,
resultados de eleições são imprevisíveis,
e também são cheias de idas e voltas as
alianças partidárias que permitirão a futura
escolha de candidatos.
FerrAmentA essenCiAl Para José Celso projeto Perspectivas de Desenvolvimento
No entanto, certas atividades de impor-
Cardoso Jr. e Pérsio Marco Antônio Davison, Brasileiro expressa o objetivo do Ipea
tância para o país exigem sequências de
técnico de Planejamento e Pesquisa do de servir como plataforma de sistema-
ações que continuem ao longo de várias
Ipea, o poder público vive uma fase em tização e reflexão acerca dos entraves
administrações. Grandes obras, em virtude de
que o planejamento é ferramenta essencial e oportunidades do desenvolvimento
sua escala e complexidade, requerem longo
para a atividade econômica. “O momento nacional (ver box abaixo). Contudo, para
período de maturação e atividade, desde a
é de retomada do papel do Estado como entender melhor o momento em que o
implantação até o início das operações. A
indutor do desenvolvimento”, explica País se encontra, é preciso realizar uma
própria confecção de projetos, sem falar
Pérsio. Atualmente o Instituto discute uma recuperação histórica sobre o papel do
das licitações em todas as fases, demanda
requalificação dos conceitos de desenvol- planejamento em diferentes contextos
meses de preparação, avaliações e decisões
vimento e de planejamento público. O políticos e econômicos.
preliminares.
No caso da energia elétrica, por exemplo,
antes mesmo da eleição presidencial de 2010
já se preparava a implantação de projetos
de geração, transmissão e distribuição Dimensões do planejamento para o Ipea
relativos aos anos seguintes. A natureza
de certos investimentos obriga alguns Este é o conjunto de ações e iniciativas sistemantizadas no projeto Perspectivas do
segmentos do governo e do setor privado Desenvolvimento Brasileiro. São quatro grandes dimensões:
■ Estudos e pesquisas aplicadas em torno de eixos estratégicos para o
a se comprometerem com horizontes mais
desenvolvimento nacional;
amplos que um ou mais períodos admi- ■ Assessoramento governamental, acompanhamento e avaliação de
nistrativos. Sabe-se que grandes desafios políticas públicas;
ambientais de nossos tempos, de caráter ■ Treinamento e capacitação;
global, precisam ser enfrentados mirando-se ■ Oficinas, entrevistas, seminários e debates.
as próximas décadas.
1938
na passagem da primeira para a segunda
metade do século XX. IX – elaborar e executar planos
nacionais e regionais de ordenação
do território e de desenvolvimento
econômico e social (...).
é o ano ■ Art. 174. Como agente normativo e
regulador da atividade econômica,
em que foi criado o Departamento
o Estado exercerá, na forma da lei,
Administrativo de Serviço Público, o Dasp
as funções de fiscalização, incentivo
e planejamento, sendo este deter-
minante para o setor público e
A estruturação das instituições – isto é, indicativo para o setor privado.
estruturação das instâncias, das organizações, ■ § 1º – A lei estabelecerá as dire-
dos instrumentos e dos procedimentos – trizes e bases do planejamento
necessárias à administração e à gestão pública do desenvolvimento nacional
cotidiana do Estado foi realizada especialmente equilibrado, o qual incorporará e
após 1930. Isso ocorreu através das iniciativas compatibilizará os planos nacionais
deflagradas tanto por Getúlio Vargas, com e regionais de desenvolvimento.”
o Departamento Administrativo de Serviço
Planos de estabilização monetária: Plano Cruzado (1986), Plano espaço que deveria ser regido pelo mercado,
Planejamento burocrático, de curto prazo, focalizado, conjuntural considerado como o único mecanismo
Bresser (1987), Plano Verão (1988), Plano Maílson (1989),
e vertical, em meio a uma profunda instabilidade econômica
Plano Collor (1990) e Plano Real (1994) capaz de gerar autorregulação e equilíbrio
PPAs: PPA 1991-1995, 1996-1999, 2000-2003, 2004-2007 Planejamento burocrático, de médio prazo, amplo e de transição quase naturais, ou seja, não mediados pelo
e 2008-2011 vertical-horizontal que consideram uma ação artificial do
Fonte: Elaboração dos autores. Estado. “O período de redemocratização
foi marcado pelo conceito de Estado
Quadro 2: Periodização para o estudo conjunto do planejamento governamental e da gestão pública no Brasil (1889-2010)
Industrialização restringida;
1933-1955: Era Getúlio Planejamento não sistêmico.
Dominância nacional- produção de bens de consumo Montagem do sistema Patrimonial burocrática
Vargas – nacional- Exceções: primeiras estatais e
desenvolvimentista não duráveis e dependência corporativista. – Dasp (1938)
desenvolvimentismo Plano Salte
financeiro-tecnológica
1964
1962 Celso Furtado torna-se o primeiro ministro do Planejamento do Brasil
1962 João Goulart lança o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social
1964 João Goulart cria a Associação Nacional de Programação Econômica e Social (Anpes)
é o ano 1964
1964
Castelo Branco lança o Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg)
Criação do Ipea
de criação do Instituto de Pesquisa 1967 Formulação do primeiro planejamento de longo prazo no Brasil, o Plano Decenal
Econômica Aplicada
1968 Arthur da Costa e Silva lança o Programa Estratégico de Desenvolvimento
1970 Emílio Garrastazu Médici lança o Programa de Metas e Bases para a Ação de Governo
1972, 1974 e 1979 PNDs I, II e III
Entretanto, constatou-se que os projetos 1975-1976 Planos regionais brasileiros
de industrialização haviam sido insufi-
1990 Fernando Collor de Mello cria a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE/PR)
cientes para garantir processos socialmente
1988 A Constituição Federal (Art. 165) torna obrigatório o planejamento plurianual
includentes, capazes de eliminar a pobreza
1991-2011 PPAs
estrutural e combater as desigualdades. De
acordo com José Celso, foi-se buscando – 2007 e 2010 Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) I e II
teórica e politicamente – diferenciações Luiz Inácio Lula da Silva cria o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (NAE/PR) e
2004
Projeto Brasil 3 Tempos
entre crescimento e desenvolvimento
2008 Lula restabelece a SAE/PR
e, ao mesmo tempo, a incorporação de
qualificativos que pudessem dar conta das 2010 Projeto Brasil 2022
ausências ou lacunas para o conceito. No
Brasil, um exemplo claro desse movimento
foi a inclusão do “S” na sigla do Banco Quanto aos qualificativos que agora pelo mundo, está posta para as nações a
Nacional de Desenvolvimento Econômico adjetivam a palavra desenvolvimento, é questão dos espaços possíveis e adequados
(BNDE), fundado em 1952, que passou preciso ter clareza da dinâmica do conceito. de soberania (econômica, política, militar,
então a se chamar Banco Nacional de Em primeiro lugar, num contexto de cres- cultural etc.) em suas respectivas inserções
Desenvolvimento Econômico e Social cente internacionalização dos fluxos de e relações externas. Em segundo, fala-se
(BNDES) a partir de 1982. bens, serviços, pessoas, símbolos e ideias também dos aspectos microeconômicos do
Pesquisa aplicada
antes do Ipea
Gilberto Maringoni – de São Paulo
A
ntes do surgimento do Ipea, a partir da Revolução de 1930 e tornou-se hegemônico em uma república oligárquica,
em 1967, já existia no Brasil a premente no auge do período nacional- com dinâmica agroexportadora.
ideia da criação de centros de -desenvolvimentista (1955-64). Entre as últimas décadas do século XIX
pesquisa aplicada, destinados a Antes disso, embora houvessem incentivos e as primeiras do século seguinte, o Brasil
subsidiar o Estado com dados, informações estatais localizados, o planejamento econô- tornou-se o maior exportador mundial de
e reflexões para a formulação de políticas mico não se colocava como algo necessário. café. A produção nacional determinava
públicas. A necessidade começou a se esboçar O liberalismo econômico era francamente os preços internacionais. A economia do
Dreamstime
“A civilização ocidental
se desenvolveu invariavelmente
fora da zona tropical.
Os países que dispuseram
de carvão de boa qualidade
e de petróleo fácil
encontraram nesses
atributos físicos preciosos
elementos de prosperidade.
Não há como negar que o
“Fila do pão”, escultura do artista plástico George segal (1924-2000) representando desempregados em busca de
alimentos durante a Grande depressão, em Washington desenvolvimento econômico
A intervenção do Estado se tornou
é primordialmente função
do clima, dos recursos da
1929
imperiosa após a quebra de 1929. A partir
daí, ficou claro que a reativação econômica Natureza e do relevo do solo”
não se daria pelas mãos da iniciativa
privada. Somente o poder público poderia eugenio Gudin,
economista e ex-ministro da Fazenda durante o
dar conta de duas tarefas gigantescas:
atacar as raízes da crise e alterar a base foi o ano governo de Café Filho
produtiva nacional. em que a reativação econômica mostrou-se
possível somente através do poder público O primeiro foi o Instituto Nacional de
Estatística, criado em 1934. Quatro anos
novo PAPel do estAdo Até 1930, a indústria depois, receberia a denominação de Instituto
brasileira estava centrada na produção de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
bens de consumo leves, especialmente nos Havia pelo menos duas limitações obje- Seria responsável por coletar, sistematizar
setores de siderurgia e tecelagem. A produção, tivas para a realização de um planejamento e cadastrar dados e estatísticas de várias
localizada em sua maior parte no centro-sul, efetivo. A primeira delas residia na carência áreas – economia, demografia, sociedade
possibilitou a formação de uma diminuta de dados e estatísticas confiáveis sobre o etc. – nas três esferas de governo. Além
classe operária, composta em sua maioria País. Uma segunda questão dizia respeito à disso, logo assumiu a tarefa de realizar os
por imigrantes europeus. falta de pessoal técnico especializado para recenseamentos do país. Nos anos 1930-40
Em meio a diversos embates políticos, realizar a tarefa. O primeiro curso regular de tornou-se o principal órgão de assessoria
um novo papel foi definido para o Estado Economia começaria a funcionar no Brasil do governo federal.
Arquivo/Agência Estado/AE
dos anos 1940, o órgão ficou responsável
pela elaboração da proposta orçamentária
federal a ser enviada pelo Executivo ao
Congresso Nacional.
A partir de 1945, com o fim do governo
Vargas, o Dasp perdeu várias de suas funções.
Passou a funcionar mais como assessoria
do governo. O Dasp foi extinto em 1986.
Em seu lugar foi criada a atual Secretaria
de Administração Pública da Presidência
da República (Sedap).
Além desses, uma série de comissões
estatais de coordenação e assessoramento
foi criada na época. As principais foram
o Conselho Federal do Comércio Exterior
(CFCEX), de 1934, a Coordenação de
Mobilização Econômica (CME), de 1942, o
eugenio Gudin (1886-1986), Ministro da Fazenda, em 1955. o engenheiro e economista carioca se notabilizou como
Conselho Nacional de Política Industrial e uma das mais proeminentes vozes da ortodoxia econômica no país
investimentos públicos e permitir o retorno No Brasil, as concepções forte intervenção estatal para vencer as
do crescimento e do desenvolvimento. planejadoras enfrentaram barreiras ao desenvolvimento.
As teorias de Keynes foram a base do As duas correntes de opinião travaram
pesada oposição dos setores
conjunto de intervenções estatais praticadas um embate teórico pioneiro entre 1944 e
a partir de 1933 pelo presidente Franklin
liberais. Estes últimos eram 1945. Foi protagonizado por duas figuras de
Roosevelt (1882-1945), com o objetivo partidários da supremacia proa da vida brasileira, o industrial paulista
de combater a crise nos Estados Unidos. da agricultura como polo Roberto Simonsen e o economista liberal
Estas ficariam conhecidas como New Deal dinâmico da economia. carioca Eugenio Gudin. A controvérsia se
e subverteriam as bases do ultraliberalismo Argumentavam que as leis deu no âmbito da Comissão de Desenvol-
até então praticado. Tanto as formulações de de mercado resolveriam vimento Econômico do governo Getúlio
Keynes – divulgadas inicialmente no Brasil Vargas (1930-1945), com a troca de longos
os gargalos da sociedade
por Eugenio Gudin, em 1943 – quanto o documentos, fundamentando cada ponto de
New Deal e a dinâmica soviética tiveram
brasileira, como o atraso e
vista. A Comissão era mais um dos vários
enorme impacto em todo o mundo. O debate a pobreza da população. O órgãos ditos técnicos criados pelo governo
econômico mundial focou-se cada vez mais setor industrialista, por sua para assessorar a condução política em
no papel do Estado. vez, advogava uma política várias áreas.
de planejamento econômico A íntegra desse embate teórico foi objeto
com forte intervenção estatal de dois livros lançados pelo Ipea em 2010.
PlAno e MercAdo No Brasil, as concepções São eles Desenvolvimento: o Debate Pioneiro
para vencer as barreiras ao
planejadoras enfrentaram pesada oposição de 1944-1945 e A Controvérsia do Planeja-
desenvolvimento
dos setores liberais. Estes últimos eram mento na Economia Brasileira (publicado
partidários da supremacia da agricultura originalmente em 1977), ambos disponíveis
como polo dinâmico da economia. Argu- o atraso e a pobreza da população. O setor em www.ipea.gov.br.
mentavam que as leis de mercado resolveriam industrialista, por sua vez, advogava uma Simonsen defendia o planejamento estatal
os gargalos da sociedade brasileira, como política de planejamento econômico com na alocação de recursos e incentivos para a
no Brasil, a economia cafeeira foi o motor da economia durante mais de um século. ela tinha a característica de irrigar todo o sistema produtivo com um formidável poder
multiplicador, impulsionando o mercado de trabalho, a malha de transportes, as finanças, o comércio, a distribuição, a armazenagem e o sistema portuário
novas formulações e novos matizes, por Comissão Econômica para a América Latina proposta para os impasses continentais
conta das mudanças na economia nacional (Cepal), órgão criado pela ONU, com sede era a industrialização, através de um
e internacional. em Santiago, Chile. Seus principais dirigentes processo de substituição de importações.
Os industrialistas venceram a batalha. foram os economistas Raul Prebisch (1901- O paradigma ficaria conhecido como
O Estado brasileiro, em meio a muitos 1986), da Argentina, e Celso Furtado (1920- o nacional-desenvolvimentismo.
embates, atuou durante décadas como 2004), do Brasil. A Cepal, assinala Ricardo As ideias centrais da Cepal diziam
centro articulador do desenvolvimento. Bielschowsky, era “um órgão de pesquisa e respeito à percepção das relações centro-
Em menos de meio século – entre 1930 assessoramento de governos”. -periferia, no sistema capitalista, e a um
50
termos de trocas entre produtos agrícolas preciosos elementos de prosperidade”, ele
e industriais no comércio internacional. afirmava que “não há como negar que o
Por conta do crescente valor agregado aos desenvolvimento econômico é primor-
manufaturados, haveria uma assimetria dialmente função do clima, dos recursos
básica no comércio mundial, que relegaria
a periferia a uma eterna posição secundária anos da natureza e do relevo do solo”.
O período nacional-desenvolvimentista
na economia internacional. Os preços dos entre as décadas de 1930 e 1980 separam (1945-64) não foi uniforme e suas caracterís-
manufaturados seriam estruturalmente o País de ser uma imensa fazenda agrícola ticas intrínsecas conheceram várias nuanças.
crescentes em relação aos bens primários. para tornar-se a sétima maior economia Obteve-se, através dessas orientações, um
Tais barreiras somente seriam superadas modelo de modernização acelerado, que não
com forte intervenção estatal, na falta de tocava nas estruturas arcaicas de concentração
uma burguesia nacional capaz de cumprir da terra, da renda e da propriedade.
as tarefas do desenvolvimento. mente o nacional-desenvolvimentismo Este padrão assentava-se em três agentes
Para Prebisch e Furtado, o subdesenvolvi- e a Cepal. Em artigo publicado em 1952, básicos: o Estado indutor, o capital estran-
mento não seria uma etapa do desenvolvimento, ele desmentia a existência de possíveis geiro e o capital privado nacional, como
mas um estágio do capitalismo maduro, cons- relações desiguais de troca e debitava os sócio menor. O capital estrangeiro entrou
truído na divisão internacional do trabalho, problemas dos países subdesenvolvidos de forma crescente à medida que o Estado
só superável através do planejamento. aos infortúnios da natureza. Depois de brasileiro lhe oferecia condições cada vez
afirmar que “a civilização ocidental se mais vantajosas de investimento e de retorno.
desenvolveu invariavelmente fora da zona O nacional desenvolvimentismo eviden-
A dIscordâncIA lIBerAl O economista tropical” e que “os países que dispuseram ciou a carência de um núcleo formulador
liberal Eugênio Gudin atacou pesada- de carvão de boa qualidade e de petróleo de políticas de forma mais sistemática. A
Arquivo/Agência Estado/AE
Brasília, dias antes da inauguração. A construção da nova capital seria um dos símbolos do modelo
desenvolvimentista que pautou a economia brasileira durante a maior parte do período 1930-80
os dois governos de Getúlio vargas (1930-45 e 1951-54) foram marcados pela decisiva
correntes de pensamento foi interrompido
ação do estado na industrialização do país de forma brutal”.
SAEPR
“O Ipea é o
grande centro
para se pensar
o Brasil”
Presidente do Instituto fala da história do órgão, dos desafios colocados pelo atual cenário internacional,
das necessidades imediatas e dos planos de expansão diante do novo papel do Brasil no mundo
Desafios do Desenvolvimento - O que é o Ipea? visionário e executor, juntamente com externa entre 1981 e 1983 altera a agenda
Pochmann - O Ipea é uma identidade do [João Paulo dos] Reis Velloso, constroem nacional para questões conjunturais de
Brasil. Não é possível pensar o Ipea de o Ipea com inegável êxito no planejamento curto prazo. Exemplos são o pagamento
forma isolada, sem identificá-lo com as do Estado e das políticas públicas durante da dívida externa, o enfrentamento da
circunstâncias nacionais. O Instituto surge o regime militar [1964-85]. A transição inflação, a desorganização das contas
no quadro da modernização conservadora democrática abre a perspectiva para um públicas e a competitividade, entre outras.
realizada a partir do golpe de 1964, que novo Ipea, contemporâneo dos desafios Isso leva o tema do planejamento e do
internaliza um programa de estabilização colocados no final do século XX. desenvolvimento a um segundo nível de
monetária constituído fora do Brasil. Era o importância. A partir daí, a instituição
Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg), Desenvolvimento - De lá para cá, a trajetória do Ipea Ipea sofre desta circunstância e perde
realizado entre 1964 e 1967. Ele tinha como foi complexa, não? a capacidade de contribuir com uma
substrato a constituição de uma instituição Pochmann - Sim. A dissolução da maioria visão de longo prazo. Somente no início
tecnocrática para sua condução. Roberto política comprometida com o desenvolvi- do século XXI, com a reorganização de
Campos [então ministro do Planejamento], mento nacional a partir da crise da dívida uma nova maioria política comprometida
Sidney Murrieta
Diset: pesquisando
inovação e aumento
de produtividade
e competitividade
A
Diset realiza estudos e avalia- ções pertinentes; a avaliação de questões processos de inovação tecnológica e de
ções de políticas públicas relacionadas ao desenvolvimento produ- reestruturação produtiva e da defesa da
voltadas para o conhecimento tivo e o suporte técnico à formulação de concorrência e regulação dos setores de
das restrições e oportunidades políticas e programas de governo, no infraestrutura; e, ainda, a participação
econômicas ao desenvolvimento brasileiro âmbito das temáticas do comércio exte- em estudos sobre políticas fundiárias,
sob a ótica da produção. Suas atividades rior e da inserção da economia brasileira de reforma agrária e de estímulos à
englobam a sistematização das informa- nos fluxos globais de investimentos, dos agricultura familiar.
A
Dinte é a mais nova diretoria do Brasília – Coordenação de Estudos em definidos cinco grandes desafios e sete eixos
Ipea. Sua criação está estreita- Relações Econômicas Internacionais temáticos. No bojo desse processo de plane-
mente vinculada à nova inserção (Corin), Coordenação de Estudos em jamento nasceu a Dinte. Acompanhamos
do Brasil no cenário mundial. Instituições e Governança Internacional e analisamos os fluxos de comércio e de
O coordenador geral da Diretoria, Marcos (Cogin), Coordenação de Intercâmbio capitais internacionais, a lógica de operação
Antonio Macedo Cintra, fala sobre as ativi- e Cooperação Internacional (Coint) – e das corporações transnacionais, o sistema
dades do setor na entrevista a seguir. uma no Rio de Janeiro – Coordenação financeiro e monetário internacional, as
de Estudos em Comércio Exterior e instituições multilaterais (Organização
Desenvolvimento - Como se organiza a Dinte? Política Comercial (Cecex). A equipe da Mundial do Comércio, Organização
Cintra - Ela está organizada em uma Dinte está composta por vinte técnicos Mundial de Propriedade Intelectual,
coordenação-geral (Coordenação-Geral em Brasília e cinco no Rio de Janeiro. Organização das Nações Unidas, Fundo
de Pesquisa em Relações Econômicas Contamos ainda com o apoio de oito Monetário Internacional, Banco Mundial,
e Políticas Internacionais – Cgint), bolsistas presenciais, três estagiários, um G20 comercial, G20 financeiro), a integração
três coordenações de pesquisas e uma estatístico, três assistentes administrativos regional, a cooperação brasileira para o
coordenação que realiza e acompanha e uma analista de sistemas. desenvolvimento internacional, a segurança
os acordos de cooperação e intercâmbio energética e territorial, a política de defesa
com órgãos e entidades públicas ou Desenvolvimento - Quais seus objetivos? nacional e segurança internacional, além
privadas internacionais de planejamento Cintra - A partir da elaboração do planeja- da reconfiguração da geoeconomia e da
e pesquisa. Três coordenações ficam em mento estratégico do Ipea em 2008, foram geopolítica global.
João Viana
Diretoria de Estudos e Políticas do Estado,
das Instituições e da Democracia
À
Diest compete realizar e promover, Desenvolvimento - Quais os objetivos da Diest? Desenvolvimento - Como funciona a Diretoria?
de forma integrada às demais dire- Gomide - A Diest é uma das mais novas Gomide - Desde a sua criação, a Diest vem
torias e em conformidade com o diretorias do Ipea. Ela foi formalmente trabalhando na realização e difusão de
planejamento estratégico, estudos criada em março de 2010. Seu objetivo estudos e pesquisas que visam compre-
e pesquisas aplicadas em temas relacionados é realizar estudos e pesquisas ligadas à ender a dimensão político-institucional
ao fortalecimento do Estado, das Instituições estrutura, organização e funcionamento do desenvolvimento. O atual Plano de
e da Democracia, primordialmente voltados à do Estado brasileiro e de seus arranjos Trabalho da Diretoria está organizado
modernização e à melhoria da gestão pública. institucionais, bem como às relações em três linhas: Estado e Desenvolvimento,
O diretor, Alexandre de Ávila Gomide, entre o Estado e a sociedade, no que Democracia e Participação Social e Justiça
concedeu entrevista à Desafios do Desenvolvimento se refere às políticas para o desenvolvi- e Segurança Pública. Também está na
para contar melhor sobre os projetos da Diest. mento do País. Diest a coordenação-técnica do grupo de
A
expressão “plano” esteve, assep- atuação discriminatória. Houve um presidente assim, o historicismo francês justificou a
ticamente, livre de qualquer chileno, Barros Lugo, que afirmou ser “muito França de Napoleão e seu esforço de amplifi-
viés ideológico, até que, após fácil” seu cargo, pois os problemas ou eram cação colonial. O Japão fez uma “reciclagem”,
a Revolução Comunista Sovié- auto-solucionáveis, ou não tinham solução preservando o xintoísmo e atribuindo ao
tica, foi utilizada como horizonte e guia e ele não tinha com o que se preocupar - e imperador – aceito como divino – o poder
político-econômico do Estado nacional. passou à história como nome de saboroso absoluto, implantador da Revolução Meiji.
Ali teve início a formulação do I Plano sanduíche local. A Rússia czarista aboliu a servidão e
Quinquenal Soviético e foi instalada uma fomentou, pelo Estado, a instalação de
equipe encarregada de planificar a trajetória núcleos industriais; o poder absoluto foi
A partir de 1980,
futura da União Soviética. A partir desse acionado em nome da preservação nacional
momento, as expressões “plano” e “planifi-
o Brasil mergulha russa. Entretanto, todos esses países,
cação” passaram a ser identificadas como o na mediocridade uma vez industrializados, abandonaram,
modo pelo qual o Estado socialista poderia macroeconômica. Há ideologicamente, seus discursos pró-
dispensar as regras do jogo capitalista e um repúdio ao sonho da -industrialização como projeto nacional e
atuar de forma organizada para a evolução industrialização nacional e passaram a defender, ideologicamente, os
da nova sociedade. princípios da economia liberal. Chutaram,
incorporamos o neologismo
Em sentido amplo, propor fazer um pragmaticamente, o andaime teórico
“globalização”, como versão
plano nacional e instalar um processo de anterior e, como potências, expandiram
planificação marcavam uma posição de
atualizada do neoliberalismo, cosmicamente suas ambições geopolíticas.
esquerda, e o debate ideológico passou a agora sob hegemonia A I Guerra Mundial desmoralizou o
repudiar essas expressões como sínteses ideológica do epicentro sonho da belle époque e deslocou o epicentro
de uma prática hostil ao capitalismo, que dos EUA industrial da Inglaterra para os EUA, que se
buscavam a transformação e o desenvol- converteram em campeões do livre-mercado.
vimento econômico de uma nova ordem A evolução da II Revolução Industrial, iniciada
social e política. Como é sabido, as industrializações antes da I Guerra Mundial, foi pontilhada
As imperfeições microeconômicas da nacionais que se sucederam à Revolução de desajustes monetários-fiscais que, como
economia de mercado já haviam sido mapeadas Industrial no século XIX haviam recusado tremores sísmicos, antecederam o terremoto
pela análise neoclássica. As visões teóricas de o corpo de princípios da economia liberal e macroeconômico da Grande Crise de 1929 e
um monopólio bilateral entre as relações do praticado reformas institucionais, operado mergulharam as potências nas preliminares
capital patronal e o trabalho assalariado já instrumentos discriminatórios, realizado de um segundo conflito mundial.
insinuavam ajustes institucionais em direção subsídios e investimentos e ampliado, prag- Do ponto de vista latinoamericano, o
ao que se denominou economia social de maticamente, o âmbito e a profundidade das sonho de uma economia industrializada
mercado. O receituário político-econômico políticas públicas. Cometeram heresias e tinha ficado circunscrito a escassos pensa-
da economia política clássica liberal inglesa praticaram pecados mortais para o liberalismo dores. Entretanto, a filosofia alemã hegeliana
e as derivações da teoria do equilíbrio geral de mercado. Contestaram, teoricamente, a e a economia nacional de List haviam
neoclássico haviam feito evoluir da ideia de capacidade da livre-economia de mercado de se instalado no espaço universitário. No
Estado gendarme, guardião de contratos e conduzi-los ao desenvolvimento industrial Brasil, houve a Escola de Recife; no Chile,
do livre jogo de mercado e decantado como e de fortalecimento geopolítico. Assim fez com dois ou três anos de diferença, foi
paradigma liberal à figura do Estado mínimo, a teoria da nacional economia sustentando impresso o livro de List. Após a I Guerra
com os mais reduzidos instrumentos de o projeto industrializante nacional alemão; Mundial, o romeno Manoilesco formulou a
7%
da sociologia como o ápice da engenharia ideológica do epicentro dos EUA. O Brasil
racional humana; teve enorme passagem passou a não discutir projeto nacional e
pela América Latina, no final do século afirmou que, se integrando à economia
XIX e décadas iniciais do século XX. O mundial, chegaria, à la Pangloss, ao melhor
sucesso do desenvolvimento decimonô- dos mundos possíveis.
nico da economia norteamericana já havia ao ano A vitória norteamericana na Guerra Fria,
gerado o discurso bolivariano, convocando com a queda do Muro de Berlin, marca a
foi o crescimento do PIB brasileiro entre o
a Iberoamérica a reproduzir a experiência período da defesa varguista da economia do hegemonia e a superimposição político-
das treze repúblicas. café até o projeto Brasil-potência -econômica do Consenso de Washington.
No Brasil, abandonamos a discussão de
desenvolvimento alternativo apoiado no
A II Guerra Mundial mercado interno e nos propusemos a ser
abriu caminho, O Brasil – que, com Getúlio Vargas, “celeiro do mundo” (apesar da fome dos
na América Latina, havia sido keynesiano antes de Keynes, brasileiros) e fornecedores de matérias primas
para a ideia de planificação que havia desenhado o sonho da indus- para as potências industrializadas e para a
nacional como modo trialização desde matrizes positivistas até China em industrialização. No entanto, a
a literatura infantil de Monteiro Lobato foi crise mundial iniciada em 2008 promete
de operar a política econômica,
quem apoiou, diplomaticamente, Prebish e vicissitudes que recolocarão o debate sobre
segundo uma trajetória de
a Cepal. A frustração com a não-inclusão o futuro brasileiro. Necessariamente, será a
crescimento e com vistas à do país no Plano Marshall leva o Brasil, nos ideia de planejar a reativação de um projeto
transformação estrutural da anos 1950, a praticar, pragmaticamente, nacional brasileiro. O Estado terá de ser
economia nacional do país infrações frontais ao neoliberalismo, ao reformado e reequipado com instrumentos
latinoamericano adotar, explicitamente, o Plano de Metas e de ação discriminatória, muitos dos quais
consagrar a industrialização e a urbanização abriu mão em nome da “integração compe-
como núcleos estratégicos de um projeto titiva” à globalização e de uma privatização
Entretanto, foi a II Guerra Mundial que nacional desenvolvimentista. desnacionalizante do sistema produtivo.
abriu caminho, na América Latina, para a Da defesa varguista da economia do
ideia de planificação nacional como modo café no “terremoto” de 1929, até o projeto
de operar a política econômica, segundo de Brasil-potência, o país fez crescer o PIB
uma trajetória de crescimento e com vistas em torno de 7% ao ano.
à transformação estrutural da economia Com a crise da dívida externa e a insta-
nacional do país latinoamericano. Com lação do Estado de Direito da Constituição Carlos Lessa é professor emérito de economia brasileira e ex-reitor da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento
temor da patrulha ideológica, a Cepal virou de 1988, houve um mergulho na hiperin- Econômico e Social (BNDES). É membro do Conselho de Orientação do Ipea.
O
conceito de planejamento e sua Envolve a tarefa de alocabilidade de recursos novo, de par com o carreamento da iniciativa
vigência são a marca intrínseca e prioridades objetivamente definidas e privada para complementá-lo. Desenhava-se
do advento da racionalidade da geradoras intrínsecas da mudança. Tal o imperativo da inversão na infraestrutura,
ação pública e da organização implica, ao mesmo tempo, a garantia da sua a permitir o suporte da atividade produtiva
contemporânea do Estado como agente da sustentabilidade, no reenvio permanente do país na produção de energia, no avanço
mudança coletiva. Remete, por aí mesmo, destas interações, sob pena de regressões dos sistemas de transporte e comunicação
ao imperativo da modernidade, em que do processo, senão, inclusive, a própria e do reforço do parque industrial.
a realização do “bem comum” passa a se inversão dos seus rumos. O governo Quadros, não obstante o
referir ao processo social do nosso tempo. confronto político com seu antecessor,
E, dentro dele, à capacidade das nações manteve as alocações prioritárias no orça-
É com o governo
para maximizar as condições de vida de mento para a mudança, abrindo-se ao
Lula que o planejamento
suas populações. planejamento, a partir de seus imperativos
Em países como o Brasil a percepção
volta à tona, dentro regionais, tal como propôs, então, Celso
vem de par com a consciência do desen- do empenho global Furtado para a Sudene. A ideia ganharia a
volvimento e a réplica ao velho status quo, de ampliação maciça dimensão nacional sobre o próprio Celso,
todo subordinado à situação colonial e ao do nosso mercado interno, já como ministro dessa pasta, nos governos
regime de exploração-limite, em bem da com a crescente eliminação Goulart. A nova década, entretanto, retor-
prosperidade inteiramente extrínseca ao da marginalidade, o reforço naria à dominância externa da economia
território. Não é outro o “fato social total”, de que se liberara o governo Juscelino no
do intervencionismo do Estado
marcado pela maciça concentração da pós-guerra, do peso do mercado interno,
riqueza, redução da mobilidade e completa
e a primeira política efetiva, em nossos termos de troca.
expropriação do poder decisório da coleti- direta, de redistribuição de O governo militar, significativamente,
vidade. O status quo confrontava todo um renda, com vistas à expansão beneficiou-se de uma configuração autô-
progressismo e sua ideologia, apoiada na do poder de compra interno e noma dos atores de um estado de desen-
crença de um curso histórico que sempre ao fortalecimento dos setores volvimento, no destaque que o estamento
implicasse a melhoria coletiva. O desen- intermediários da nossa armado logrou, frente ao status quo da
volvimento é, exatamente, a réplica a este sociedade civil e sua dependência inter-
mobilidade social
“fato social total”, marcado pelo advento nacional. Despontaria uma tecnocracia,
da funcionalidade do regime e expresso assentada no planejamento estratégico na
pela política da mudança, na garantia da O despontar do imperativo da racionali- inspiração de Golbery do Couto e Silva,
desconcentração da renda, no advento dade na ação do Estado, entre nós, foi o da a pressupor a neutralidade de uma ação
generalizado da mobilidade coletiva e, consciência do desenvolvimento. Afirmou- racional de princípio, desprovida da agenda
sobretudo, da eliminação da marginalidade -se pela ação pública, a partir do aparelho de interesses em que todo o status quo se
extrema de segmentos inteiros da popu- público, contra a mantença generalizada do alinha numa democracia. O ministério
lação, de par com o advento da autodecisão status quo, e neste arranque da inércia, em de planejamento se emancipa dentro
democrática na sua vida política. termos de bem-estar e justiça coletiva. Surge, da máquina pública, no empenho dos
O planejamento, historicamente, pois, no governo Kubitschek, a partir do “Plano de ministros Delfim Neto, Roberto Campos
é indissociável deste intrínseco interven- Metas” e na ação conjunta de Lucas Lopes e e Mário Henrique Simonsen.
cionismo do Estado na sociedade para Roberto de Campos, na definição dos pontos O governo dos generais, retomando a
além da simples gestão da ordem pública. de ataque para este intervencionismo ex prioridade do mercado interno na desti-
A
peça-chave da escola e mesmo Há uma confusao A Tabela 1, no entanto, poderia sugerir que
da universidade é a “aula”. nacional entre aula e aumentar aula não faz sentido, pelo menos por
Em especial, seus professores duas razões: i) na série histórica, a tendência
aprendizagem. Quando se
creem que o estudante aprende de queda do desempenho escolar é marcante,
escutando aula, e nisto são seguidos pelos
valoriza a escola de tempo bastando comparar o ponto inicial (1995) com
pais. Em greves, suspendem-se as aulas, integral, e quase automático o final (2009): com exceção da 4ª série em
postulando que é a perda mais fatal. A nova que se aponte como vantagem matemática, todos os outros casos mostram
LDB (1996/2010) de 1996, aumentou os maior um tempo maior de resultados inferiores aos de 1995; ii) em 1999
dias letivos para duzentos anuais: “A carga aula. Em Singapura, o lema e ocorreu a maior queda no desempenho, de
horária mínima anual será de oitocentas teach less, learn more: a escola modo espetacular: em língua portuguesa ficou
horas, distribuídas por um mínimo de entre 15 e 17 pontos; em matemática foi menor,
é lugar de aprendizagem, do
duzentos dias de efetivo trabalho escolar, mas também significativa. Os duzentos dias
excluído o tempo reservado aos exames
professor e do estudante.
de aula entraram em vigor em 1997, mas não
finais, quando houver” (Art. 24-I). Fala-se Aula pode acontecer desde aconteceu nada de perceptível naturalmente,
de “efetivo trabalho escolar”, que é logo que sirva para aprimorar surgindo impacto danoso em 1999.
entendido como aula, tanto assim que cursos a qualidade da Podemos apontar muitas razões para tal
e semanas pedagógicas não são aceitos, aprendizagem queda, entre elas que a entrada de novos
ainda que no Art. 67-V conste como parte alunos (em geral mais pobres) teria compro-
da valorização docente: “período reservado metido o desempenho. Creio que seja razão
a estudos, planejamento e avaliação, incluído Aumentamos o ensino fundamental para pertinente, mas não a ponto de induzir um
na carta de trabalho”. nove anos, em grande parte para dar mais tombo dessas proporções. Minha hipótese
Num livro publicado em 1997 sobre a aula. Quando se valoriza a escola de tempo é que o aumento de aula implicou estragos
Nova LDB (Demo, 1997) – na 23ª edição em integral, é quase automático que se aponte notáveis no desempenho, primeiro, porque,
2011 – coloquei como subtítulo “Ranços e como vantagem maior um tempo maior nesta série histórica, não se notou jamais
avanços”, porque, ao lado de novos horizontes, de aula. Agora o MEC reaparece com a qualquer efeito positivo do aumento de aula,
persistiram muitas velharias, entre elas a proposta de aumentar, de novo, o ano letivo e, segundo, porque, sendo aula em geral um
confusão nacional de aula com aprendizagem. para 220 dias. procedimento de marcante mediocridade
4 série EF
a 190,6 0.2 -9.8 -4.7 0.8 5.3 11.1 10.8(204.3)
3 série EM
a 281,9 6.8 -8.4 -3.6 2.0 -7.4 1.6 1.8(274.7)
Fonte: Inep:Saeb/Ideb. EF = Ensino Fundamental. EM = Ensino Médio. LP - Língua portuguesa; M - Matemática. Média adequada para a 4ª série: 200 pontos; para a 8ª série: 300 pontos; para a 3ª série do ensino médio: 350 pontos.
escolar, seu aumento acarreta uma piora sistema privado tendencialmente não pratica tomada. À revelia dos dados, não percebemos
no desempenho. É difícil de engolir, mas os promoção automática, já tem um “sistema de que o sistema vigente de ensino caducou.
dados “insinuam” algo nesta direção. De modo ensino” ao estilo de testes estandardizados e Em Singapura (Darling-Hammond, 2010),
geral, esta tabela sugere que, se mantivermos aprecia ostensivamente aula, a estagnação o lema é teach less, learn more: a escola é
na escola a mesma aula, não há salvação: o verificada no ensino médio sugere que aula lugar de aprendizagem, do professor e do
tom de queda ou de difícil recuperação é sobra, enquanto aprendizagem não comparece. estudante. Aula pode acontecer – embora
notável. Como qualquer “evidência empírica” como expediente apenas supletivo – desde
é naturalmente reducionista e ambígua, não O aumento de que sirva para aprimorar a qualidade
podemos forçar os dados, razão pela qual da aprendizagem. Precisamos de outro
aula implicou estragos
não afirmo categoricamente que o aumento sistema escolar.
notáveis no desempenho,
de aula atrapalha o desempenho escolar.
Estou sugerindo uma hipótese de trabalho,
primeiro, porque, nesta
aliás muito instigante e que tem algum apoio série histórica, não se notou
empírico, em especial na queda momentosa jamais qualquer efeito Referências
em língua portuguesa. positivo do aumento de aula, AU, W. Unequal by Design – High-stakes
Na Tabela 2, vemos dados do Ideb para três e, segundo, porque, sendo testing and the standardization of inequality.
pontos no tempo e que poderiam ser inter- London, Routledge, 2009.
aula em geral um
pretados nessa mesma direção. Observando DARLING-HAMMOND, L. The Flat World
procedimento de marcante
o desempenho privado, no ensino médio and Education – How America’s commitment
constata-se uma estagnação flagrante, sem
mediocridade escolar, to equity will determine our future. London,
falar que, em 2009, houve uma queda no nível seu aumento acarreta uma Teachers College Press, 2010.
estadual público. No sistema público, as cifras piora no desempenho. DEMO, P. A Nova LDB – Ranços e avanços.
se movimentam, ainda que lentamente, mas É difícil de engolir, mas Campinas, Papirus, 1997.
pesam sobre elas inúmeras suspeitas. Elas vão os dados “insinuam” algo LDB. 1996/2010. http://bd.camara.gov.br/
desde a facilitação crescente dos testes, a pressão bd/bitstream/handle/bdcamara/2762/
nesta direção
sobre a escola para ensinar, no ano do teste, ldb_5ed.pdf.
só para o teste (existe uma grita internacional
contra isso) (Au, 2009) e mesmo o acober- Não há objeção ao aumento do tempo
Pedro Demo é professor titular aposentado e professor emérito da Universidade de
tamento da promoção automática. Como o de aprendizagem. Mas não é esta a direção Brasília (UnB) e membro do Conselho de Orientação do Ipea.
A
s economias europeias passaram, justamente economias endividadas, como os preços tenham crescido mais. Não há
nas últimas décadas e desde a todas, e também as mais frágeis – Grécia, possibilidade – num sistema de moeda única
criação do Mercado Comum Itália, Portugal e Espanha, as chamadas – de compensação dos diferenciais de preços
Europeu, com o Tratado de PIGS. Todas, à exceção da Espanha, com a através do realinhamento do câmbio, como
Roma de 1961, por diferentes momentos e dívida do setor público superando 100,0% normalmente se procuraria fazer.
diferentes experiências, indo do mais fundo do PIB, em 2010. Seria cínico, por outro lado – e mesmo
das preocupações a auges de euforia. O Os problemas que põem em risco a sobre- fantasioso – dizer, como o fazem agora os
pessimismo surgiu, por exemplo, quando vivência do Euro têm como origem, no caso países ricos da Europa, o Banco Central
da crise do dólar de 1971-73, que esfacelou dos PIGS, paradoxalmente, a própria moeda Europeu (BCB) e os ávidos banqueiros, em
o sistema de paridades cambiais fixas de única. Ela surgiu como instrumento para relação aos parceiros PIGS, que o problema
Bretton Woods, ou com a crise finan- reforçar a integração econômica e ampliar se resolve simplesmente levando-se o país à
ceira de 1992, logo após o lançamento da o seu aspecto político. recessão – com mais juros, mais impostos,
futura União Monetária. E as esperanças menos gastos públicos, no melhor estilo dos
se renovaram por ocasião do Ato Único clássicos enlatados do FMI. Assim, com
As agruras que afligem
Europeu de 1986, que alargavam as bases maior desemprego, recuariam os salários e
da integração europeia, ou quando, com a União Europeia não são os preços internos, invertendo-se a posição
o Tratado de Maastricht de 1991, surgia a conjunturais ou episódicas. de moeda valorizada, mesmo negando
União Europeia, incorporando uma visão Diferentemente, existem todos os postulados da União Europeia.
política mais profunda e abrindo caminho questões estruturais, A realidade é que há diferenças cres-
para a moeda única. amenizadas em períodos centes nas taxas de inflação dentro da
Agora novamente a Europa, depois de se Zona do Euro, em desfavor das economias
de prosperidade, mas
alargar na direção das fronteiras da Rússia de menor porte. Em relação a 1998 – base
que vêm se agravando
e de festejar talvez precocemente um boom de comparação pós-Euro – e até 2010, os
imobiliário, reencontra um campo de incer-
desde que a crise do subprime preços (Deflator Implícito do Produto)
tezas, mal completada a primeira década da se alastrou na economia cresceram 10,9% na Alemanha e 22% na
nova União Econômica e Monetária, que mundial, ficando a salvo França, os carros-chefe da União Europeia.
deu vida ao Banco Central Europeu e ao talvez apenas a notável Os percentuais foram bem mais elevados
esperado Euro. máquina chinesa nos países que enfrentam dificuldades no
As agruras que afligem a União Europeia financiamento da dívida pública: 31,5%
não são conjunturais ou episódicas. Dife- na Itália, 35,6% em Portugal, 42,4% na
rentemente, existem questões estruturais, A questão fundamental é que um sistema Grécia e 45,9% na Espanha. O que, de fato,
amenizadas em períodos de prosperidade, de moeda única representa, de fato, o mesmo tem o mesmo sentido de uma valorização
mas que vêm se agravando desde que a que um sistema de paridades cambiais fixas implícita de suas moedas frente aos demais
crise do subprime se alastrou na economia – rigidamente fixas, no caso. E taxas fixas só parceiros da zona, e ainda mais intensa em
mundial, ficando a salvo talvez apenas a podem subsistir com: (a) inflação zero em relação a moedas que ao longo do tempo
notável máquina chinesa. todas as economias da área, ou (b) taxas de se desvalorizavam frente ao Euro, como o
Na análise das dificuldades que para- inflação iguais nos diferentes países. Pois caso do Dólar americano.
lisam as economias europeias – e com qualquer situação diferente tem o sentido Não surpreende, portanto, que aqueles
maior rigor os países da Zona do Euro – de uma valorização (ou desvalorização) países com preços mais instáveis venham
percebe-se que no centro do furacão estão da moeda do país – ou dos países – onde acumulando elevados déficits externos,
única representa o mesmo eurOpeiA Os problemas mais recentes, ligados empurrando-as para a moratória. Como
aos riscos de inadimplência dos PIGS – que fizeram FMI, bancos e governo americano
que um sistema de paridades
já chamusca as finanças da Grécia, estão em relação ao Brasil e outros devedores nos
cambiais fixas. E taxas fixas
mais para uma ópera-bufa. Os governos de anos 1980.
só podem subsistir com praticamente toda a OCDE aumentaram a
inflação zero em todas as dívida pública num total próximo de US$
Descartando a hipótese
economias da área, ou com 10 trilhões apenas no triênio 2008-2010,
mais plausível de que
taxas de inlação iguais nos porque tiveram de lançar fortunas em suporte
os seus bancos, evitando um caótico efeito
a maior inflação decorre
diferentes países. Qualquer
dominó. As economias mais fracas da zona de questões estruturais, as
situação diferente tem o
do Euro, agora no cadafalso – e que vinham economias mais fracas ficam
sentido de uma valorização (ou
sob pressão contínua de
desvalorização) da
restrições ditadas pelo Banco
moeda do país
10
Central Europeu, que travam
os países sob o pressuposto
de que são excessos de gastos
especialmente no caso de Grécia e Portugal, governamentais que provocam
nos quais o somatório de saldos negativos trilhões desequilíbrios e comprometem
em Contas Correntes no triênio 2008-2010
É o aumento da dívida pública dos países as metas de inflação fixadas
foi equivalente a algo como um terço do
da OCDE entre 2008 e 2010, motivado pelo para a Zona do Euro
PIB (BIRD, www.databank.worldbank). E socorro dos governos aos bancos
pior é que, descartando a hipótese mais
plausível de que a maior inflação decorre A solução, e ainda é tempo, é reduzir
de questões estruturais, as economias parte da dívida. Os bancos terão de assumir
reduzindo o peso relativo da dívida pública
perdas, trabalhar com taxas de juros fixas
mais fracas ficam sob pressão continua
ano a ano – fizeram o mesmo, abandonando civilizadas e alongar os prazos para o paga-
de restrições ditadas pelo Banco Central
o caminho do controle das finanças para mento do remanescente das dívidas. Estas
Europeu, que travam os países sob o salvar os bancos. Nada diferente da ação estão representadas por títulos comprados
pressuposto de que são excessos de gastos dos governos dos Estados Unidos, Reino ou garantidos pelo BCB e os Fundos de
governamentais que provocam desequilí- Unido, Japão, França ou Alemanha. Todos Financiamento em gestação. O resto é
brios e comprometem as metas de inflação se complicando porque a crise econômica ilusão. Inclusive quanto à possibilidade
fixadas para a Zona do Euro. fez recuar o PIB. Sofrem ainda, no caso dos de se manter sob o falso guarda-chuva do
É a maldição da Síndrome do Euro – um PIGS, com a alta dos juros, provocando, Euro países que a moeda única agride e
regime cambial arcaico que se supunha com o duplo efeito, deterioração dos indi- inviabiliza como exportadores e produtores
varrido, antes pelo esquema de Bretton cadores Divida/PIB no pós-2008. para o próprio mercado.
Woods, e posteriormente, a partir de 1979, A estratégia atual escolhida pelos líderes
pelos sábios critérios de paridades reajustáveis da União Europeia é perigosa. Além de não Dércio Garcia munhoz, economista, professor titular do Departamento de
Economia da UnB até 1996. Ex-presidente do Conselho Federal de Economia e do
do Sistema Monetário Europeu. contribuir para a superação do impasse, Conselho Nacional da Previdência Social. É membro do Conselho Orientador do Ipea.
Ouvidoria do Ipea:
valorizando a cidadania e o processo
de democratização da sociedade
A
Ouvidoria do Ipea foi instituída um mandato e regras rígidas em caso de seu à presidência do Instituto, conferindo-lhe
em 2004, com o intuito de propi- afastamento, o qual somente poderá ocorrer maior estabilidade. Assim, em 29 de março
ciar ao cidadão um instrumento mediante decisão da diretoria, respaldada por de 2010 foi assinado o Decreto no 7.142, que
de defesa de seus direitos, por termo de justificação aprovado, após exame inclui a Ouvidoria no estatuto da instituição.
meio de um canal direto de comunicação e deliberação majoritária por uma comissão No que se refere aos resultados, ao longo
com o núcleo gestor. Dessa forma, procura especial. Esta será composta de um diretor de do período de 2004 a 2010, a Ouvidoria do
também aumentar o controle social das unidade técnica indicado pelo presidente, que Ipea recebeu 1.803 manifestações. Registrou-
atividades desenvolvidas pelo Instituto, a a presidirá, um servidor de cada diretoria eleito -se que a maior procura da Ouvidoria pelos
fim de subsidiar o processo de avaliação de pela totalidade dos servidores, um diretor e um usuários são as informações institucionais
desempenho e o cumprimento da sua missão. conselheiro, ambos indicados pelo Conselho relacionadas à atividade de pesquisa, tais
Nesse diapasão, a Ouvidoria busca integrar Deliberativo da Associação de Funcionários do como metodologias utilizadas em estudos,
e responsabilizar suas unidades de gestão ante Ipea (Afipea). Este arranjo normativo assegura bancos de dados, publicações, entre outras,
seus públicos-alvo, estimulando-as na busca plena autonomia às atividades do ouvidor. representando 57% das manifestações. Críticas
permanente de eficiência, eficácia e efetividade Nessa linha, é garantido o sigilo quanto e reclamações aparecem em segundo lugar,
de seus produtos e serviços, transformando-se, à autoria da manifestação quando expressa- com 21%, com maior incidência nos anos
assim, em ferramenta de melhoria de gestão. mente solicitado ou quando tal providência se de 2008 e 2009.
Para atingir sua missão a Ouvidoria do Ipea fizer necessária. É assegurado ao ouvidor, no O grau de resolubilidade da Ouvidoria
tem como principais competências receber, exercício de sua função, autonomia e indepen- do Ipea é elevado, o que se evidencia pela
apurar e dar encaminhamento a pedidos de dência de ação, sendo-lhe franqueado acesso pesquisa de satisfação do usuário dos seus
Katharine Vincent
ParticiPantes de um Projeto de microcrédito – a proprietária desta tenda no mercado de Harare, capital do Zimbábue, é vista com
os membros de um projeto de microcrédito. o grupo foi criado no âmbito de um programa que visa reduzir a vulnerabilidade da população
economicamente ativa do país através de incentivos de vários tipos. eles recebem formação sobre como configurar e gerenciar um
empreendimento e contribuem semanalmente com um fundo coletivo que redistribui o montante arrecadado em parcelas fixas para cada
um. estes jovens empreendedores relatam ser agora possível alugar um espaço maior para a tenda e se integrarem economicamente às
suas comunidade.
Como você vê o desenvolvimento? Como cear as imagens frequentes que mostram suas histórias, e compartilharam sonhos e
retratar uma face humana do desenvolvi- desolação e desespero. Uma galeria de desafios. Nós agradecemos as instituições
mento? Como os programas e iniciativas fotos será permanentemente localizada parceiras e membros do Comitê de Seleção por
do desenvolvimento melhoram a vida das no escritório do IPC e será aberta para suas contribuições para a campanha. Todos
pessoas? A Campanha Mundial de Foto- visitação pública. Uma série de exposições vocês tornaram a campanha uma realidade
grafia Humanizando o Desenvolvimento fotográficas também será organizada em e nos ajudaram a destacar e promover o
busca mostrar e promover exemplos de diversas cidades ao redor do mundo. desenvolvimento através de novas lentes.
pessoas vencendo a luta contra a pobreza, Nós temos o prazer de anunciar as 50 fotos Parabéns aos participantes.
Ian Terney
a marginalização e a exclusão social. selecionadas pela campanha. Gostaríamos
Chamando-se a atenção para os sucessos de agradecer aos participantes de mais de
obtidos, a campanha pretende contrabalan- 100 países que nos enviaram suas fotos e