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LILIANE SANTANA
2010
LILIANE SANTANA
2010
Santana, Liliane.
Motivações funcionais da gradação entre construções encaixadas
nominais e verbais / Liliane Santana. - São José do Rio Preto : [s.n.],
2010.
261 f. : il. ; 30 cm.
CDU - 81’1
Aos professores Cláudia Nívea Roncarati de Souza (UFF), Flávia Bezerra de Menezes
Hirata-Vale (UFSCar), Vânia Cristina Casseb Galvão (UFG) e Sebastião Carlos Leite
Gonçalves (UNESP), membros da Banca Examinadora desta tese, pelas críticas e sugestões
que me permitiram aparar as arestas e aprimorar a forma e o conteúdo deste trabalho;
Aos professores Maria Helena Mira Mateus e Carlos A. M. Gouveia, por me acolherem no
seio da família iltequiana e pela atenção que me dispensaram durante a realização do estágio
no ILTEC. Meu carinho à Isabel, pela presteza com que me atendeu, ao José Pedro, por
salvar o meu computador, ao Sóstenes e à Marta, meus companheiros de sala, e,
especialmente, aos brazucas Roberto e Mário, pela conversa fiada e sempre muito animada;
Aos meus pais, Valter e Neuza, e à minha irmã, Ana Maria, espectadores atentos de minha
trajetória, por estarem sempre ao meu lado, desejando vivamente o meu sucesso;
Aos pequenos Amanda e Pedro, pelos momentos de pura bagunça, diversão e enorme
carinho, sem os quais, certamente, a labuta teria sido muitíssimo mais dura;
Aos meus amigos e companheiros de vida e de luta, João Paulo, Chá, Thi, Claytão, Vá,
Boizão, Fer, Ito, Lê, Carol, Fino, Beta, Melo e Leo, pela torcida constante e,
principalmente, pelo sonho conjunto;
À FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, pelo apoio financeiro,
sem o qual seria difícil a conclusão desta tese;
RESUMO
O principal objetivo desta tese é o estudo da variação escalar entre construções verbais e
nominais que figuram como complemento de orações hierarquicamente superiores, isto é,
orações completivas finitas plenamente desenvolvidas e orações completivas não-finitas com
um verbo infinitivo ou com uma nominalização como núcleo. Essas possibilidades de
variação fornecem um conjunto de construções alternativas, cuja seleção pode depender de
fatores funcionais, embora não exclusivamente. A variação entre construções mais nominais e
construções mais verbais e as consequências dela decorrentes são razões que justificam
plenamente uma investigação criteriosa das motivações semânticas que regem o
funcionamento das construções encaixadas completivas, mediante a atuação dos princípios
funcionais de iconicidade e economia (HAIMAN, 1983; CRISTOFARO, 2003) na relação
entre a semântica do predicado encaixador de complemento e a codificação morfossintática
do predicado encaixado. A principal proposição que conduz a investigação é a de que, para a
seleção dos diferentes tipos de complemento, existe uma relação de integração semântica
(GIVÓN, 1980, 1990) entre construções completivas e a categoria semântica do predicado
encaixador, de modo que a semântica do predicado encaixador é altamente relevante para
determinar a categoria morfossintática das predicações dependentes. A relação de gradação
entre maior ou menor grau de sentencialidade (LEHMANN, 1988), que se correlaciona ao
grau de nominalidade da construção dependente, está vinculada ao nível e à camada de
organização estrutural definidos pela Gramática Discursivo-Funcional (HENGEVELD;
MACKENZIE, 2008) nos seguintes termos: quanto mais baixa a camada de representação do
complemento tanto maior o grau de integração semântica entre o predicado da oração
encaixadora e o predicado da oração completiva.
ABSTRACT
The aim of this thesis is to investigate the scalar variation between verbal and nominal
constructions which function as complements of hierarchically higher clauses, i.e., finite
complement clauses which are fully developed, and non-finite complement clauses which are
headed by an infinitive verb or a nominalization. This range of variation provides a set of
alternative constructions whose selection may, though not exclusively, depend on functional
factors. The variation between more nominal and more verbal constructions and its
consequences fully justifies a rigorous investigation of the semantic motivations which
govern how embedded complement clauses actually function, by means of the functional
principles of iconicity and economy (HAIMAN, 1983; CRISTOFARO, 2003) on the
relationship between the semantics of the complement taking predicate and the
morphosyntactic encoding of the embedded predicate. The main tenet underlying this
investigation is that (i) sorting out different types of complement predicates requires a relation
of semantic integration (GIVÓN, 1980, 1990) between complement clause and the semantic
category of the complement taking predicate and (ii) such relation is, therefore, highly
relevant to determine the morphosyntactic encoding of the dependent predications. The
gradient relationship between balancing and deranking sentences, which is correlated to the
degree of nominality or sentenciality of the dependent construction (LEHMANN, 1988), is
associated with the structural organization of levels and layers defined by Functional
Discourse Grammar (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008) as follows: the lower the
representation level of the complement the higher the degree of semantic integration between
the complement taking predicate and the predicate of the embedded clause.
FIGURAS
Figura 3-1: GDF como parte de uma teoria de interação verbal ............................ 109
QUADROS
Quadro 5-1: Tipos de predicados encaixadores considerados para análise ............. 158
Quadro 6-2: Resultados obtidos em comparação às predições de Givón (1980) .... 242
GRÁFICOS
Tabela 5-1: Tipos de completivas segundo o tipo de predicado encaixador .......... 159
1: primeira pessoa
2: segunda pessoa
3: terceira pessoa
A: actor
ACC: acusativo
AUX: auxiliar
COND: condicional
CONJ: conjunção
DEF: definido
DIR: direção
FAM: familiar
FUT: futuro
IMPF: imperfectivo
INCH: incoativo
INV: inverso
LOG: logofórico
M: masculino
OBV: obviativo
PFV: perfectivo
PL: plural
POL: polido
PROX: proximativo
PTCP: particípio
SG: singular
TNS: tempo
U: undergoer
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 15
5.2 Descrição funcional dos tipos de completivas no corpus: aspectos gerais ............ 159
Esta pesquisa tem por objetivo investigar os tipos de orações completivas, distribuídas
numa hierarquia entre mais ou menos verbal/nominal, tendo como suporte dados reais de
plenamente nominais, há também construções que oscilam entre as mais verbais e as mais
nominais.
O estudo que proponho aqui tem como base a escala de variação entre construções
1
Neste trabalho, o termo completiva compreende as orações tradicionalmente denominadas orações substantivas
objetivas diretas e indiretas, que, por definição, são introduzidas por predicado encaixador de natureza verbal.
De acordo com Neves (2000), as orações substantivas são orações que equivalem a um sintagma nominal, isto é,
têm as características de um elemento nominal. As orações que interessam para este trabalho são as que
funcionam como argumento objeto da oração principal (cf. NEVES, 2000).
2
Por complementação, entende-se o processo que se instaura entre um tipo de predicado encaixador e a oração
dependente resultante.
3
Ao tratar do caráter +/– prototípico da nominalização, Camacho (2009) considera que “o membro prototípico
de uma categoria deve exibir todos os atributos que a representam e nenhum que represente outra categoria”.
Uma consequência disso é, segundo o autor, que um membro prototípico da classe dos nomes deve ser
maximamente distinto de um membro prototípico da classe dos verbos. As nominalizações têm um caráter
híbrido, a meio caminho entre a referência a uma entidade de primeira ordem, como os nomes comuns concretos,
e a referência a um estado de coisas, como entidades de ordem superior. Na escala gradativa verbo/nome, quanto
mais a construção encaixada se aproxima do polo do nome, mais o comportamento dela se aproxima ao de um
membro prototípico da classe dos nomes.
16
um verbo infinitivo ou com uma nominalização como núcleo. Essa escala de variação fornece
embora não seja uma possibilidade aberta a todos os tipos de predicados encaixadores. O
predicado encaixador volitivo querer, por exemplo, pode ter como complemento construções
mais verbais, como (1a), e construções mais nominais, como (1b-c); entretanto, para que uma
oração não-finita com infinitivo como núcleo ocorra com um predicado como querer, por
exemplo, como em (1b), é necessário que os participantes das orações matriz e subordinada
mais nominais e construções mais verbais e as consequências dela decorrentes. Meu interesse
recai, dessa forma, nas possíveis motivações que governam, por um lado, as formas de
e, por outro, na seleção obrigatória de uma única construção encaixada. Espero que o tipo de
exame aqui proposto permita realizar uma investigação criteriosa das motivações funcionais
encaixadas completivas.
mecanismo sintático em que uma oração é estruturada como argumento de um predicado. (cf.
GIVÓN, 1980; NOONAN, 1985; LANGACKER, 1991; DIK, 1997b). De acordo com um
(1991), a subordinação completiva será tratada aqui como um modo de construir uma relação
cognitiva entre dois estados de coisas.4 A um dos estados de coisas, o estado de coisas
dependente, falta um perfil autônomo, sendo, por isso, construído a partir da perspectiva do
constituinte. Para Faber e Usón (1999), as diferentes concepções teóricas acerca do tema são
determinadas pelo ponto de vista a respeito da relação que se estabelece entre o predicado
encaixador e a oração completiva. Este trabalho, que adota uma perspectiva funcionalista para
MACKENZIE, 2008), muito embora outros suportes de orientação funcionalista, tais como
Cristofaro (2003), Malchukov (2004) e Dixon (2006), também sirvam como base para as
modelo recente, e (iii) pragmática, que parte de uma concepção do modelo no que diz respeito
4
Estados de coisas são entidades de segunda ordem (cf. LYONS, 1977); ocorrem no mundo real ou podem ser
criados no mundo mental do emissor e do destinatário; localizam-se no tempo e no espaço; podem ter certa
duração; podem ser vistos, ouvidos ou percebidos de alguma forma (cf. DIK, 1997a; HENGEVELD;
MACKENZIE, 2008).
5
Cristofaro (2003) apresenta um estudo tipológico dos sistemas de subordinação, atribuindo os três tipos de
relação de subordinação – completivas, adverbiais e relativas – aos mesmos princípios funcionais. Ao tratar das
subordinadas completivas, a autora se restringe às tradicionalmente denominadas orações objetivas diretas.
Mesmo se restringindo somente a essas completivas, o critério funcional-cognitivo de Cristofaro (2003) é
suficiente para os propósitos deste trabalho.
18
verbal. Assim, este trabalho encontra justificativa, por um lado, na necessidade empírica em si
dirige este trabalho é a de que quanto mais baixa a camada de representação do complemento
à oração completiva. Givón (1980), por exemplo, considera que a natureza semântica do
predicado encaixador pode ser vista como um fator indicativo do grau de integração da oração
cuja classificação depende da camada em que estejam contidos. Numa perspectiva tipológica,
Cristofaro (2003) entende que as relações completivas são identificadas com base no
predicado que codifica o estado de coisas principal e sua configuração semântica estabelece
para predicações dependentes nucleadas em torno de uma construção nominal, de modo que a
gradação entre construções nominais com verbo finito e construções nominais com grau
Embora não haja necessariamente uma relação biunívoca entre a semântica e tipo de
completiva, pode-se também observar as orações completivas do ponto de vista do valor que
elas expressam e analisá-las segundo o tipo de categoria para, assim, averiguar se o seu
significado tem alguma influência sobre a forma que assumem. No âmbito da linguística
(1990), essa proposição aparece desenvolvida, já que, nesses estudos, as orações completivas
são tratadas como diferentes unidades semântico-funcionais. De qualquer modo, ainda que se
analise o tipo de entidade representado pela completiva, isso pode ser feito somente a partir
Assumo aqui que as estruturas sintáticas são o reflexo formal da disposição de certos
encaixador, bem como do tipo de entidade por ela representada – de primeira, de segunda, de
terceira ou de quarta ordem –, que está diretamente relacionado à gradação mais ou menos
verbal/nominal do complemento.6
6
Lyons (1977) apresenta uma tipologia de entidades (três formas) que aprimora a tradicional distinção entre
nomes concretos e abstratos. Nomes comuns, que têm um referente concreto, representam entidades de primeira
ordem, enquanto os que se referem a estados de coisas e proposições representam entidades de segunda e de
terceira ordem, respectivamente. A Gramática Funcional (DIK, 1997a) acrescenta a essa tipologia entidades de
quarta ordem, que se localizam no tempo e no espaço e podem ser avaliadas em termos de suas condições de
felicidade.
20
nominais, podem ocorrer, ainda, outros tipos de construções intermediárias, como, por
exemplo, as orações não-finitas com infinitivo. Diante disso, uma questão importante que se
quando o predicado encaixador fornece pelo menos duas alternativas possíveis. Outra questão
detrimento de outro. Há, além disso, situações em que o estado de coisas da oração
independente é dotado de suficiência formal e semântica para que a oração encaixada seja, por
caso específico, é igualmente relevante verificar a natureza das motivações que regem esse
(i) Quais são os mecanismos formais para assinalar as relações entre os diferentes tipos de
21
estado de coisas, por um lado, e a referência a tempo, modo e aspecto, por outro?
(iii) As restrições que houver à seleção de qualquer um dos tipos de mecanismo são sempre
determinadas pelo predicado da oração matriz? Se não for, é determinação puramente formal?
Dito de outro modo, qual seria a natureza dessa determinação, sintaticamente arbitrária ou
funcionalmente motivada?
(iv) Não havendo nenhuma restrição do tipo mencionado em (iii), que fator funcional
(vi) Os níveis de análise propostos pela GDF explicam adequadamente a restrição e a seleção
Para dar conta dessa proposta, conteúdo deste trabalho acha-se organizado em seis
capítulos, que se somam a esta introdução, com uma distribuição formal em três grandes
A Parte I compõe-se dos Capítulos 1, 2, e 3, que tratam do quadro teórico geral que
fornece subsídios para a escolha do enfoque teórico que norteia a análise desenvolvida neste
trabalho.
classificação semântica disponíveis na literatura linguística, tendo como base Givón (1980),
Noonan (1985), Cristofaro (2003) e Dixon (2006). Esse capítulo aborda, ainda, os tipos de
verbais, com base no tratamento que Noonan (1985), Koptjevskaja-Tamm (1993), Mackenzie
Mesmo com um suporte teórico diversificado, este trabalho tem a GDF como o
principal embasamento teórico, na medida em que é esse modelo que fornece os princípios
explanatórios para fatos que, em outras perspectivas teóricas (não formalizadas), aparecem
modo, o Capítulo 3 caracteriza, em linhas gerais, a GDF e trata das categorias semânticas que
teórico indispensável, já que, neste trabalho, faz-se uma associação entre os tipos de
representados.
23
encaixadores propostos por Dixon (2006). Relaciona as interpretações, obtidas por meio da
análise do objeto de estudo, aos postulados teóricos levantados nos capítulos anteriores e,
A Parte III trata das generalizações e implicações teóricas. Fazendo um elo com a
integração semântica.
24
PARTE I:
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS – A
COMPLEMENTAÇÃO NA PERSPECTIVA
DISCURSIVO-FUNCIONAL
25
CAPÍTULO 1
compêndios, a seção 1.2 tem como ponto de partida apresentar os conceitos prescritos na
tradição gramatical – representada neste trabalho, sobretudo, pelos gramáticos Cunha e Cintra
complementação sentencial a partir do aparato formal gerativista, com base nos trabalhos de
Dillinger et al. (1996), que destacam fatores que condicionam a complementação verbal cujo
complemento se realiza sob a forma de uma sentença, e de Mioto e Kato (2002), que
Dillinger et al. (1996) – a relevância da escolha desses trabalhos está no caráter descritivo
Português Falado; a seção 1.4 mostra a complementação vista a partir de suportes teóricos de
e Hasan (1979), Givón (1980, 1993), Van Valin (1984), Lakoff (1984), Halliday (1985),
Matthiessen e Thompson (1988), Lehmann (1988), Hopper e Traugott (1993), Dik (1997b) e
Hengeveld e Mackenzie (2008).7 Essas três seções, além de tentarem construir um panorama
orientados pelos enfoques tradicional e funcionalista. Para finalizar este capítulo, na seção
1.5, exponho as razões que justificam a opção pelo aparato funcional, em cotejo com a
tratamentos semelhantes, seguem uma tendência mais formal, isto é, em sua descrição,
subordinada funciona como termo de outra oração. De um modo geral, pode-se dizer que a
uma função sintática da oração considerada principal, por isso esse encaixamento é
Nos termos de Cunha e Cintra (2008, p. 612), “as orações subordinadas funcionam
sempre como termos essenciais, integrantes ou acessórios de outra oração”. Para os autores, a
fato de ter o seu termo representado por uma oração. Seguindo esse raciocínio, Cunha e Cintra
7
Cabe lembrar que o foco é o complemento sentencial que funciona como objeto de uma oração
hierarquicamente superior. Embora seja importante avaliar em que medida os conceitos tratados nessas seções
sobre subordinação abrangem os diferentes tipos de construções, o interesse deste trabalho recai somente nas
completivas tradicionalmente tratadas como objeto direto e indireto, como salientado em nota anterior.
27
Com o verbo na forma finita, as orações subordinadas são encabeçadas pelo conector
que, que marca a subordinação oracional. Além do tipo introduzido por que, os autores
dependente cujo verbo se apresenta no infinitivo. Com isso, os autores distinguem, então, dois
Cegalla (2009) não foge à regra. A oração subordinada é vista como aquela que
completando-lhe o sentido. Da mesma forma que Cunha e Cintra (2008), o autor considera
gramáticas, como exemplo de termos simples, elas não são consideradas um tipo de
como uma unidade de caráter oracional, uma oração complexa, para, posteriormente, analisar
como oração subordinada o complexo unitário correspondente à função sintática exercida pelo
substantivo. A marca de que uma oração passa por um processo de subordinação, funcionando
como membro de outra oração, é a presença de que. Segundo o autor, a conjunção integrante
não tem a função de juntar duas orações, mas de “marcar o processo por que se transpôs uma
unidade de camada superior (uma oração independente) para funcionar numa camada inferior,
28
como membro de outra oração” (BECHARA, 2009, p. 464). Daí preferir o termo orações
orações que têm termos determinantes ou argumentais complexos, representáveis sob forma
autor ressalta que as orações reduzidas são também subordinadas e quase sempre podem ser
Tanto Bechara (2009) quanto Vilela (1999) e Said Ali (2001) tratam da relação entre
uma unidade correspondente a um estrato superior poder funcionar num estrato inferior: uma
oração passar a funcionar como membro de outra oração e isso é o que se chama
subordinação. Para subordinar uma oração, é necessário, primeiramente, marcar a relação, isto
é, indicar que uma estrutura oracional de verbo flexionado funciona como membro de uma
oração (e não como oração independente) e, posteriormente, indicar a função que essa
Tal como Bechara (2009), Azeredo (2000) também denomina de transpositor a marca
modo, um processo gramatical “pelo qual se formam sintagmas derivados de outras unidades,
Ainda sobre o subordinador que, Perini (1995) defende a idéia de que ele não faz
parte da oração subordinada. Esse elemento não teria função conhecida dentro da oração,
além do fato de que uma seqüência introduzida por que não poderia ocorrer sozinha.
Argumenta que, nos casos de oração desenvolvida, constrói-se o complemento verbal por
complemento: são frases dependentes que “ocupam os lugares vazios dos portadores de
classificando as orações de acordo com a forma verbal. Em Mateus et al. (2003), as autoras
estabelecem algumas distinções e propriedades das completivas finitas, que ocorrem com
flexionado ou não-flexionado.
Mateus et al. (2003) consideram que as completivas finitas são unidades (ou termos)
constituintes da oração matriz (frase superior) e confirmam isso por meio de testes de
Indicativo Subjuntivo
Indicam conhecimento, crença Verbos factivos
Predicados assertivos Predicados pseudo-assertivos
[+ epistêmico] [- epistêmico]
Completiva [- dependente] Completiva [+ dependente]
Maior valor de verdade Menor valor de verdade
Quadro 1-1: Caracterização do modo verbal da completiva (cf. Mateus et al., 2003, p. 609)
gostar, estão entre os verbos que selecionam completivas com relação de objeto direto. São
verbos que selecionam completivas tanto no modo indicativo quanto no subjuntivo (cf.
português europeu.
Com base nessas interpretações, Mateus et al. (2003) propõem que, nas línguas que
admitem sujeito nulo nas completivas não-finitas, evite-se o pronome sujeito nas completivas
semântico de Mateus et al. (2003) tem o objetivo claro de fornecer uma especificação para a
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expressão formal das completivas, seja em termos do modo, seja em termos de expressão de
argumentos.
subclasse dos verbos de controle de objeto, ou seja, àqueles que selecionam um sintagma
nominal objeto direto que funciona como sujeito da completiva finita (como, por exemplo, os
predicados aconselhar, convencer, convidar e forçar). Esse tipo de completiva pode ser
(esforçar-se e interessar-se).
canônicas, por não poderem ser substituídas por orações com gerúndio, construindo-se tanto
infinitivo ou finitos. Essas construções podem vir introduzidas por uma conjunção integrante
principal. De acordo com Neves (2002), como argumento do verbo, as orações completivas
podem exercer todas as funções argumentais ligadas a verbo exercidas por um sintagma
As orações completivas verbais (objetivas diretas e indiretas) são tratadas por Neves
elocução (como dizer, perguntar etc.), de atividade mental (como achar, acreditar, imaginar
etc.), avaliativos factivos (como adorar, gostar, lamentar etc.), volitivos (como desejar,
preferir, esperar etc.), factitivos (como mandar, deixar, fazer etc.) e de percepção (como ver,
a/de/com/em/para + que com verbo na forma finita, sendo o sujeito da matriz e da completiva
da oração matriz (cf. NEVES, 2002). As completivas indiretas aparecem exemplificadas pela
1981).
tem por objetivo elucidar a estrutura interna do predicado, atribuindo ao núcleo do predicado
8
Neves (2002, p. 348) faz menção às construções nominalizadas ao considerar que alguns verbos, como os de
atividade mental, assumem complementos não-oracionais, e, quando isso ocorre, “o sintagma nominal que o
compõe é representado por uma nominalização”.
33
projetada a partir das informações lexicais de seus elementos. As regras de estrutura frasal
entre léxico e sintaxe, é o léxico que determina a sintaxe. Um problema com essa abordagem
9
Cf. original: information concerning the class of subcategorization frames is in effect given twice in the
grammar: once – implicitly – in the lexicon, as a property of the class of lexical items in its totality; and once –
this time directly – by the rules of the categorial component.
10
Cf. original: The information about the class of subcategorization frames that is thus dually represented cannot
be eliminated from lexical entries. Therefore, we should attempt to eliminate it from the categorial component.
The projection principle in fact accomplishes this, in a quite sweeping way. Given the projection principle and
the general properties of X-bar theory, the categorial component for a particular grammar will be quite meager.
34
harmonia categorial, já que tanto o verbo quanto as outras categorias maiores teriam sujeito e
complementos.
O critério temático estipula quantos argumentos o item permite e que tipo de relação
se dá entre esse item e o outro realizado como seu argumento. Ao propor essa abordagem,
Chomsky (1986) postula uma relação sistemática entre categorias semânticas e categorias
sintáticas. Segundo o autor, “se um verbo (ou outro núcleo) s-seleciona uma categoria
semântica C, então ele c-seleciona uma categoria sintática que é a “realização estrutural
componente de estrutura frasal pela adoção da teoria X-barra e são eliminadas do léxico,
idiossincráticas de c-seleção.
Ouhalla (1991) propõe a eliminação da c-seleção dos elementos lexicais das classes
estipula que as informações temáticas especificadas lexicalmente têm que receber uma
manifestação na estrutura frasal que seja não-ambígua, isto é, para cada papel temático
seleção, portanto, não é diretamente importante na estrutura frasal. A s-seleção, por sua vez,
11
Cf. original: (…) if a verb (or other head) s-selects a semantic category C, then it c-selects a syntactic category
that is the “canonical structural realization” of C.
35
que são independentes das informações lexicais e semânticas. Segundo os autores, partir do
definida pela formulação dessa teoria, que prevê para a frase um sujeito, um verbo, um
et al. (1996) consideram certos fatores que condicionam a complementação verbal que
Um primeiro fator analisado pelos autores diz respeito ao tipo de verbo matriz. As
sentenças completivas são classificadas segundo sua finitude; assim, os autores tratam das
complementos; como se vê, essa relação é formal, não semântica, pois parte da ideia de que o
predicado abre lacunas a serem preenchidas por argumentos – termos simples ou complexos.
relação aos verbos de dois complementos, há uma tendência para que o complemento seja
uma oração finita com indicativo. As miniorações aparecem somente com verbos de um
assim, a facilidade com que esse tipo de complemento tende a ser escolhido. O subjuntivo é o
tipo menos favorecido, com apenas uma ocorrência para cada tipo de verbo analisado (de um
ou de dois complementos).
autores salientam que a posição tanto do sujeito quanto a do objeto segue o arranjo
autores observam também a relação entre a natureza semântica do verbo matriz e o tipo de
relação aos outros. Para os autores, os resultados obtidos deixam claro que a natureza
semântica do verbo desempenha um papel no tipo de complemento que ele seleciona, se não
por restringir-se a um único complemento, pelo menos por estabelecer condições restritivas
Mioto e Kato (2002) apresentam uma análise formal das orações subordinadas,
assim como o de Neves (1996), sobre as completivas de nomes. Nesse trabalho, os autores
orações adverbiais.
devem-se considerar dois aspectos: um aspecto interno, voltado para a estrutura da própria
externa. De acordo com Rizzi (1997 apud MIOTO; KATO, 2002), o sistema C deve expressar
dois tipos de informação, um voltado para o exterior e o outro voltado para o interior.
configurações sintáticas que são estabelecidas para os constituintes de uma língua de acordo
mesmo assim, elas parecem ser determinadas, em primeiro lugar, por traços sintáticos,
da perspectiva funcional.
coesão textual. Para os autores, conjunção é um tipo de relação coesiva que especifica o modo
como aquilo que vem depois é sistematicamente conectado com o que vem antes; frase
complexa, por sua vez, é a unidade gramatical acima da oração, equivalente à sentença. A
oração hipotática é definida como uma oração dependente da outra, mas que não está
estruturalmente integrada a ela como um constituinte. Enquanto a oração encaixada perde sua
identidade funcional como oração, a oração hipotática, ao contrário, não a perde, mantendo-se
como elemento da estrutura da oração complexa e, por isso, serve prontamente de alvo da
pressuposição a partir da outra oração complexa (HALLIDAY; HASAN, 1979). Essa é a base
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da distinção entre hipotaxe e encaixamento, que, segundo os autores, não fica clara com o uso
do termo embedding.
mecanismo pelo qual uma oração desempenha uma função na estrutura de uma outra oração.
Há, segundo o autor, duas dimensões na interpretação da frase complexa, uma formal e a
outra lógico-semântica:
(i) o sistema de interdependência, ou sistema tático, que é formado pela parataxe, que
constitui a relação entre dois elementos de igual estatuto (um iniciando e o outro
continuando), e pela hipotaxe, que constitui a relação entre elementos de diferentes estatutos,
orações.
autor estabelece três relações de ligação, conforme o grau de tensão sintática que resulta da
ao enfoque dicotômico, em que ser uma coisa não implica não ser outra. Expandindo esse
ponto de vista simplificador, a autora propõe uma classificação gradual das orações, o que
permitiria ser uma oração mais ou menos coordenada ou mais ou menos subordinada,
está a parataxe pura, em que as orações são justapostas sem conector explícito; no segundo
nível está a mixotaxe, em que as orações são coordenadas com a presença de conjunção
hipotaxe pura, as orações estão subordinadas tanto sintático quanto semanticamente devido à
perda da identidade sentencial plena de uma das orações. Nessa proposta de Lakoff (1984), a
Por acreditarem não ser suficiente apenas conhecer o grau de independência das orações, os
autores procuram detectar que função discursiva motiva a gramática da hipotaxe. A hipótese
lado, desse modo, a gramática da combinação da oração para explorar a organização retórica
do discurso. A descrição dessa estrutura é dada pelas relações retóricas entre as partes de um
gramatical das orações: ambas têm uma estrutura cujos elementos são interdependentes,
modo, a oração encaixada é um argumento que compõe uma predicação, enquanto as orações
abrangendo dois extremos prototípicos em cada um dos pólos do continuum, vai da parataxe
subordinado.
uma oração perde suas características para tornar-se um constituinte da oração principal. Num
extremo do continuum, em que figura a sentencialidade em grau máximo, não há uma relação
hierárquica entre duas orações que formam a sentença complexa (processo chamado de
parataxe); noutro extremo, em que figura a sentencialidade em grau mínimo, está a típica
sentencialidade nominalidade
Orações subordinadas, normalmente, não têm sua própria força ilocucionária, mas os
casos que têm, restritos, em geral, aos predicados performativos, vão-se tornando raros¸
verbais de tempo e aspecto. Como, segundo o autor, em várias línguas, a oração subordinada
finita aparece no subjuntivo, a restrição de modo está intimamente ligada à perda de força
limita-se o modo.
nome. Quanto mais a construção subordinada se aproxima do polo direito do continuum, mais
12
Lehmann (1988) baseia-se no inglês, cuja gramática codifica um dos argumentos como a forma genitivo (‘s) e
a outra mediante adposição; já a gramática do português usa sempre a adposição para codificar dois argumentos
igualmente presentes: a preocupação de Maria com a eleição.
42
(i) a expressão morfossintática de cada oração, como resultado dos graus de redução do
caráter sentencial:
- nominalização (dessentencialização)
Hopper e Traugott (1993) salientam, por seu lado, que não existem expressões
medida em que são unidades que se desenvolvem no âmbito de uma atividade linguística. Os
autores argumentam que, como todas as línguas têm mecanismos de ligação oracional, que
chamam de orações complexas, é possível postular uma tripartição das orações complexas,
apresentando uma caracterização de parataxe, hipotaxe e subordinação com base nos critérios
1993, p. 171):
(1-6)
Quadro 1-2: Tripartição de orações complexas (cf. HOPPER; TRAUGOTT, 1993, p. 170)
(1993), Lehmann (1988) e Halliday (1985) têm a vantagem de romper com a visão
semanticamente – da principal. Todos esses autores propõem uma classificação escalar que
subordinação, assim como não há para a coordenação ou para a hipotaxe. Há limites difusos
semântica do predicado complementado pela oração pode ser vista como um fator indicativo
do grau de integração da oração subordinada à oração matriz. Givón (1980) estabelece, desse
modo, uma relação relevante entre a estrutura semântica do predicado encaixador e a estrutura
função argumental das orações com função de satélite, estabelecendo um paralelo entre as
13
Esse assunto será tratado com mais detalhes no próximo capítulo.
44
(DIK, 1997b).
alguma entidade de primeira ordem, e o modelo de expressão prototípico para esse termo
referência a entidades de ordem superior, os termos podem ser representados por nomes
simples ou por termos complexos operando como restritores, que constituem construções
adicionais (satélites). Argumentos e satélites são inseridos em diferentes níveis das camadas
Cabe salientar que a noção de encaixamento de Dik (1997b) difere das noções
apresentadas até aqui. Para a G(D)F, encaixamento diz respeito à inserção de orações na
posição de argumentos ou de satélites. Uma oração pode ocorrer como constituinte de outra
oração depende da natureza semântica do predicado encaixador, que acaba por determinar o
nível a que cada termo se refere. O tratamento da subordinação a partir das camadas de
representação também é sustentado por Dik e Hengeveld (1991), Hengeveld (1990a, 1990b),
conjunto de orações e cada oração, por sua vez, consiste em uma (ou mais) palavra(s), ou em
um (ou mais) sintagma(s), ou, ainda, como exemplo de recursividade, em uma (ou mais)
oração(ões).
oração matriz no que diz respeito à expressão de operadores gramaticais, assim como o
normativa e descritiva, de um modo geral, pode-se notar que os estudiosos do tema não
detalham a estrutura das orações completivas. Com exceção da exposição em Mateus et al.
(2003) e em Neves (2002), que consistem numa gramática descritiva, a gramática tradicional
e alguns estudos descritivos, como os de Perini (1995) e de Vilela (1999), não demonstram,
por exemplo, que tipos de verbos podem selecionar construções finitas ou não-finitas como
complemento, ou que fatores semânticos podem motivar o uso de uma ou de outra estrutura
14
Em relação aos alçamentos, há casos em que um constituinte pertencente, semanticamente, a uma oração
subordinada aparece como um constituinte de uma oração hierarquicamente superior. Tal como acontece com o
alinhamento, os ‘gatilhos’ para essa deslocação podem ser de natureza interpessoal, representacional, ou
morfossintática (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).
46
economia, no caso, preferência pelas estruturas não-finitas. Tal fato gera a falsa impressão
sobre a realidade da língua de que maior ênfase é dada às formas finitas. Como bem aponta
Decat (1999), no que diz respeito à subordinação, o enfoque tradicional guia-se pela
dependência gramatical.
portanto, drasticamente ao postulado de que o nível formal, por si só, determina as relações de
que, em grande parte, explicam os fenômenos de alinhamento entre os níveis. Esse postulado
formalista e funcionalista.
47
tipicamente inatas. Nesse caso, as propriedades mais profundas do fenômeno linguístico não
podem ser depreendidas diretamente dos dados. Os enunciados de textos reais ou transcritos
de fala refletem (imperfeitamente) um sistema subjacente que é governado por regras que
predizem a forma que assume a unidade linguística idealizada. Para Hengeveld e Mackenzie
(2008), o formalismo radical representa uma manifestação extrema desse ponto de vista, já
O funcionalismo, por sua vez, é uma abordagem linguística que se baseia na crença de
européia são a Gramática Funcional de Dik (1997a, 1997b) – bem como sua arquitetura mais
1999, HALLIDAY, 2004). Há, ainda, nos Estados Unidos, outras duas abordagens no campo
1997, VAN VALIN, 2005), mais inclinada para o extremo formal do espectro
vem sendo chamada de abordagem com enfoque no uso (usage-based)), que tende para o
fato pode determinar a visão de como a língua pode ser modelada (BUTLER, 2008). O
sistema da língua como um todo e as estruturas formais que ele usa são, em grande parte,
motivados por fatores externos, tais como estruturas cognitivas e fatores sociais de grande
48
escala. Há, não obstante, considerável variação no grau em que os fatores explanatórios
Qualquer decisão sobre que concepção de gramática assumir equivale a uma tomada
de posição metodológica acerca do domínio da sintaxe e de suas relações com outros níveis de
entretanto, não implica critérios valorativos, principalmente como os que, até certo grau,
nortearam a polêmica movida entre adeptos das duas posições num passado recente (cf.
VOTRE; NARO, 1989; NASCIMENTO, 1990; DILLINGER, 1991), que provocou a noção
endossam ainda hoje. A adoção de uma posição teórica funcionalista tem a ver com a ideia de
Como as probabilidades são de natureza pragmática ou semântica, esse modo de ver, de saída,
está mais sujeito a um tratamento funcional. Uma análise desse tipo oferece um conjunto de
divisão entre funcional e formal pode também ser, até certo ponto, válida, mas há uma relação
um tanto mais complexa entre essas duas abordagens que, segundo Butler (2003), não deve
ser ignorada. Há uma escala que vai do modelo de Chomsky até as proposições funcionalistas
radicais, como as ‘gramáticas emergentes’ de Hopper (1987, 1992). Um modo mais realista
Chomsky, e, no outro extremo, as teorias radicalmente funcionais; entre esses dois extremos,
teorias que (i) podem compartilhar boa parte dos objetivos e hipóteses; (ii) encontram-se
(1-7) Escala das teorias: do extremo formal ao extremo funcional (cf. BUTLER, 2008, p. 149)
Como aponta Butler (2003), o termo funcional é frequentemente visto como oposto ao
termo formal. No entanto, a ambiguidade no uso do termo formal é uma das razões por que o
uso dos termos formal e funcional não pode ser considerado esclarecedor, principalmente
quando aplicados aos dois paradigmas alternativos. De acordo com Newmeyer (1998), o
termo formal pode referir-se tanto à forma ou estrutura gramatical em oposição ao significado
ou uso, quanto à utilização de um sistema notacional para expressar de modo preciso e exato
para afirmar que qualquer intenção de modelar um objeto requer formalização, traço
metodológico que não pode ser, assim, restrito às teorias formalistas, já que também os
A polêmica em torno dos termos formal e funcional oculta, portanto, o fato de que
acordo com a escala em (1-7). A diferença real não está na utilização de sistemas notacionais,
justamente nesse sentido preciso do termo formal que a diferença entre as gramáticas formais
e as funcionais deixa de ser uma questão relativa para ser uma questão absoluta.
são inteiramente adequados, já que incorporam dois diferentes tipos de oposição. A primeira
oposição consiste na perspectiva básica adotada pelas teorias linguísticas, mediante a qual a
instrumento de interação social. Teorias com cada uma dessas duas orientações podem ser
representação formal, enquanto, para outros enfoques, esse objetivo não tem relevância;
Essas oposições podem ser combinadas na forma como mostra a Figura 1-2:
Formalizada Não-formalizada
Autônoma A B
Funcional C D
Na Figura 1-2, há quatro diferentes tipos de teorias linguísticas que podem ser
exemplificado por enfoques como os defendidos por Halliday (1985), Givón (1990) e Hopper
(1987, 1992). O tipo B, não-formalizado e autônomo, apesar de ser logicamente possível, não
51
parece ter nenhum representante significativo; conforme afirma Camacho (2009), talvez nele
representado pela Teoria de Gramática Funcional (DIK, 1997a, 1997b) – bem como pela nova
Referência (FOLEY; VAN VALIN, 1984).15 Essas oposições estão em consonância com a
escala de teorias proposta por Butler (2008), tal como mostra (1-7).
pragmática. Croft (1995) reconhece quatro ‘tipos’ de funcionalistas, no que diz respeito à
(i) funcionalistas autônomos: aceitam o ponto de vista dos formalistas de que a sintaxe é
(iii) funcionalistas tipológicos: recusam a ideia de que a sintaxe seja autossuficiente e fazem
autossuficiente.16
15
Segundo Garcia Velasco (2003), um dos maiores êxitos da Teoria da Gramática Funcional é a capacidade de
integrar considerações funcionais e comunicativas na própria arquitetura do modelo sem renunciar a um alto
grau de formalização.
16
Para Butler (2003), as correntes (i) e (ii) não são fundamentalmente funcionais e não representam, portanto, o
que ele concebe como ‘funcionalismo’.
52
Bresnan (1970, 1979), tem uma concepção puramente sintática das relações de
termos de configurações sintáticas que são estabelecidas para os constituintes de uma língua
primeiro lugar, por traços sintáticos, cabendo à informação semântica dos constituintes apenas
complementação são de ordem semântica e que, a partir dos significados dos constituintes, os
semântica do predicado matriz. Como observado por Givón (1990), a semântica das relações
completivas pode ser geralmente expressa em relação à semântica do predicado que codifica o
estado de coisas principal e, uma vez que predicados constituem o mecanismo prototípico
usado para referir-se ao estado de coisas (cf. HOPPER; THOMPSON, 1984), é a semântica do
orações finitas e, quando muito, por orações não-finitas nas gramáticas. Essa situação conflita
com a posição que se adota aqui de incluir a nominalização no rol de construções não-finitas
que podem, similarmente aos verbos correspondentes, representar algumas categorias como
tratamento empírico envolve uma análise quantitativa e qualitativa dos dados, conforme os
Capítulos 5 e 6 apresentarão.
B
Brreevvee rreeccaappiittuullaaççããoo
questões relacionadas à sintaxe, de modo tal que a sintaxe, por si só, determina as relações de
geral do tratamento delegado ao fenômeno sob análise a partir de diferentes concepções tem
fato que abre caminho para o próximo capítulo demonstrar que o enfoque teórico
CAPÍTULO 2
linguagem são vistos, desse modo, não como constituintes de um sistema autônomo, que basta
morfossintático da gramática.
demonstrar que o enfoque teórico funcionalista abriga satisfatoriamente uma análise dos tipos
Para demonstrar que o enfoque teórico funcionalista dá conta do tipo de estudo aqui
1, ao longo da seção 1.4 (p. 37), mostrei como as noções de subordinação e encaixamento são
tratadas no âmbito dos trabalhos orientados pelo enfoque funcionalista. Neste trabalho, muito
intercambiavelmente para fazer referência à relação entre os tipos de construções que figuram
como complemento e os predicados que funcionam como matriz, adoto um critério funcional-
coaduna com os postulados de Givón (1980, 1984, 1989, 1990), Noonan (1985), Dik (1997b)
e Cristofaro (2003), que consideram serem semânticos os fatores determinantes das formas de
plano geral para este capítulo inclui tratar da relação entre predicado encaixador e oração
funcionalistas.
Para dar conta dessa proposta, este capítulo segue o seguinte roteiro: a seção 2.2 tem
predicado encaixador e predicado encaixado; em seguida, na seção 2.4, o foco recai sobre os
Mackenzie (1996), Dik (1997b), Cristofaro (2003) e Malchukov (2004) dão ao tema; a seção
2.5, finalmente, faz um balanço geral das perspectivas teóricas funcionalistas para a
subordinação. Nesse trabalho, a autora segue a mesma linha de Givón (1980, 1990), Noonan
funcionais.
verbais não-finitas, como infinitivos, gerúndios e particípios. Ocorre que as diferentes línguas
morfossintáticos têm uma aplicabilidade limitada na comparação transsistêmica, uma vez que
todas as línguas dispõem, por exemplo, de orações encaixadas ou formas verbais não-finitas
para expressar uma relação particular entre dois estados de coisas, o estudo tipológico não
pode basear-se em critérios morfossintáticos, porque isso significaria excluir todas as línguas
17
Cristofaro (2003) menciona que há línguas em que a oração dependente na relação de complementação não
atua como um argumento do predicado principal e não está encaixada. É o caso, segundo a autora, da língua
muna, que expressa relações de complementação por meio da justaposição de orações.
57
apenas por orações finitas e, quando muito, por orações não-finitas nas gramáticas, fato que é
construções não-finitas que podem representar algumas categorias como possíveis casos de
subordinação.
partir de Langacker (1991), a subordinação consiste num modo de construir uma relação
cognitiva entre dois estados de coisas, de um modo tal que a um deles, o estado de coisas
dependente, falta um perfil autônomo, sendo, por isso, construído a partir da perspectiva do
oracional, mas ao modo como os estados de coisas expressos por orações ligadas são
percebidos e conceitualizados e ao estatuto que têm no contexto discursivo, uma vez que esse
enfoque funcional estabelece uma nítida distinção entre o nível conceitual em sentido amplo
definir subordinação, mencionando que, ao construir a conexão entre dois estados de coisas,
(i) os dois estados de coisas podem ser construídos como perfeitamente simétricos de um
ponto de vista cognitivo, de modo tal que ambos têm um perfil autônomo, uma situação em
58
que ocorre com a coordenação perfeitamente simétrica em que nenhum perfil oracional
(ii) os dois estados de coisas são construídos como cognitivamente assimétricos, quando um
dos dois prescinde de um perfil autônomo e é construído com base na perspectiva do outro.
Por isso, Langacker (1991) diz que uma sentença como (2-2) designa o processo de
conhecimento, não o de ter partido ou deixado de partir. Nesse caso, o estado de coisas
subordinado perde o perfil autônomo, enquanto o estado de coisas principal impõe seu próprio
Langacker (1991), é paralela à distinção pragmática entre asserção e não-asserção, vista não
sob uma perspectiva lógico-semântica, mas sob uma perspectiva pragmática. A interpretação
pragmática refere-se não a condições de verdade, mas ao que o falante assume em relação ao
Ao enunciar, por exemplo, uma sentença como (2-3a), assume-se que a oração que
assertividade, já que Langacker prefere ater-se apenas ao postulado de uma relação cognitiva
59
assimétrica entre dois estados de coisas, tal que um impõe seu próprio perfil a toda a sentença,
O método para detectar como essa propriedade cognitiva de base pragmática define
uma oração dependente pode basear-se nos testes de assertividade disponíveis na literatura,
como o de que parte de uma sentença está aberta a polêmica por meio de uma negação
chamadas ‘questions-tags’:
(2-3)b. Não é verdade que Protógenes afirmou que a operação Satiagraha é legal.
(35 )c. É verdade que Protógenes afirmou que a operação Satiagraha é legal?
(35 )d. Protógenes afirmou que a operação Satiagraha é legal, não afirmou?
Segundo Cristofaro (2003), o principal ponto que merece ser enfatizado é o de que
testes de assertividade são operacionais para qualquer língua, porque não se referem a tipos
partes da sentença. Como eles checam que parte da sentença está sujeita a polêmica, eles são
independentes dos traços estruturais e, por conseguinte, o postulado da assimetria acaba tendo
aplicável com igual valor à análise intrassistêmica, que se pretende fazer aqui.
falado no Brasil; não se insere, desse modo, no rol de trabalhos tipológicos sobre
(2004) e Dixon (2006). Entretanto, constitui uma tentativa de, numa análise intrassistêmica,
dar uma explicação semântica plausível para a complementação e, mediante o modo como se
subordinação completiva a partir de uma perspectiva tipológica como essa pode fornecer um
quadro mais abrangente, que permita verificar como enquadrar os resultados obtidos nesta
pesquisa em relação a outras pesquisas de caráter tipológico. Além disso, permite assumir
As relações completivas podem ser identificadas com base no predicado que codifica o
estado de coisas principal. A semântica do estado de coisas principal estabelece que tipo de
especificação completiva ele requer, de modo que as bases da ligação entre um predicado
Givón (1980) considera que a natureza semântica do predicado da matriz pode ser
vista como um fator indicativo do grau de integração da oração completiva à oração principal.
manipulação deliberado por parte do agente do estado de coisas principal (como é o caso, por
contíguos.
não são contíguos temporal e espacialmente. O modo como o grau de integração semântica se
oração complexa.
as relações entre predicado encaixador e predicado encaixado se dão no polo esquerdo, mais
20
Cf. o original: No clause is totally independent of its immediate clausal context in connected coherent
discourse. Consequently, if a conjoined clause is part of a coherent discourse, some strands – semantic or
pragmatic – must connect it to its immediate clausal environment. And such strands of connectivity
(‘coherence’) tend to come with concomitant grammatical dependencies. The close parallel between semantic-
pragmatic (‘functional’) and grammatical (‘formal’) inter-clausal dependencies reflects the same iconic
tendencies we noted in the grammar of verbal complements: Iconicity of event-integration and clause-
integration: “the more semantically or pragmatically connected two events/states are in the discourse, the more
grammatically integrated will the two clauses be”.
21
Cf. o original: Syntagmatic economy is the tendency to reduce the length or complexity of any utterance, so
that the most frequent expressions tend to be reduced phonetically and information that is redundant and/or
recoverable from the context tends to be omitted.
63
implicabilidade. Cada uma dessas camadas se bifurca em categorias mais fracas e mais fortes:
atitude epistêmica fraca, atitude epistêmica forte, atitude emotiva fraca, forte tentativa e
“quanto maior o grau de proximidade de significado entre duas entidades tanto maior o grau
matriz pertencer ao nível mais alto da escala de integração de eventos, mais facilmente ele
será colexicalizado.
nominalização pode ser visto como adaptações na estrutura gramatical da oração finita.
Quando a oração verbal é ajustada para uma frase nominal prototípica via nominalização,
torna-se uma oração não-finita ou uma oração menos finita.23 Givón (1993) alega que, na
conversão de uma oração finita para não-finita, o verbo antigo se torna o núcleo da oração
22
Cf. o original: The closer two linguistic entities are in meaning, the more they will exhibit temporal proximity
at the code level.
23
Dik (1997b) considera que, no nome deverbal, os constituintes do predicado input (operadores, predicado,
argumentos e satélites) devem ajustar-se ao termo nominal prototípico, adotando novos tipos de constituintes
(operadores de termo – determinante e quantificador –, sintagma de possuidor, adjetivo, nome).
65
marca um menor grau de integração entre as orações. Quanto mais baixo o ponto em que
estiver o verbo da principal na escala de integração de eventos tanto maior será a tendência de
escala de integração, quando duas orações estão sob um mesmo contorno de entoação.
Embora não trate especificamente da relação entre tipo de predicado encaixador e tipo
renumerada abaixo por conveniência, parece refletir, de certa forma, a hierarquia de Givón
(1980).
sentencialidade nominalidade
O que é interessante é que, tal como na hierarquia de Givón (1980), quanto mais a
dela se aproxima ao de um membro prototípico da classe dos nomes.24 Nesse sentido, pode-
considera para descrever a semântica dos vários tipos de relações. A autora defende a
24
Como parece claro na escala de dessentencialização, além da perda de propriedades sentenciais no verbo, a
nominalidade progressiva dota a construção encaixada de propriedades distribucionais do nome, como a
possibilidade de combinar-se com adposições e afixos de caso.
66
componente básico da integração semântica é o grau em que as fronteiras entre esses estados
estados de coisas estarem ligados mas do grau em que se dá ligação”.25 A interligação resulta
de uma variedade de fatores, como, por exemplo, do fato de dois estados de coisas serem
parte de um mesmo esquema de estado de coisas global. Se dois estados de coisas estão
de coisas. Para ele, predicados que envolvem preferência (tais como querer e ordenar)
predicados que não envolvem preferência estão relacionados a um baixo grau de integração
ocorra não significa, necessariamente, que provocará algum efeito na ocorrência do estado de
coisas.26
25
Cf. o original: Semantic integration basically pertains to whether and how much two SoAs are interconnected.
26
Ao que parece, as considerações de Givón (1990) dizem respeito à preferência ou ao desejo do falante quanto
à ocorrência do estado de coisas codificado na oração subordinada e não em relação à ocorrência em si do estado
de coisas, tal como contesta Cristofaro (2003).
67
estrutura da oração. Com base no modelo da Teoria de Gramática Funcional standard (Dik,
1997a, 1997b; Hengeveld, 1989, 1990), Cristofaro considera que a configuração de uma
oração que representa um ato de fala contém quatro camadas de análise, e cada uma está
Cristofaro (2003) acha problemático o modo como a Gramática Funcional (Dik, 1997a,
1997b) trata esses predicados: são considerados operadores que modificam a estrutura interna
do estado de coisas a que eles se referem, atuando, assim, na primeira camada (predicados e
termos, na versão standard do modelo). Predicados modais e volitivos definem o valor modal
do estado de coisas a que eles se referem, enquanto os predicados fasais definem o valor
Cristofaro (2003) considera, por seu lado, que os predicados fasais agem como
operadores aspectuais, mas deles diferem, no sentido de que sua referência não é puramente
interna ao estado de coisas relevante. A mesma observação vale para os predicados modais e
volitivos. Operadores modais, tais como o modo verbal, definem o valor modal do estado de
volitivos, por sua vez, relatam a ocorrência do estado de coisas como um todo à situação em
que essa ocorrência é necessária, possível ou desejada. Consequentemente, sua referência não
27
A classificação de predicados encaixadores de complementos mencionada por Cristofaro (2003) é tomada de
Noonan (1985).
68
é puramente interna ao estado de coisas relevante, na medida em que ela estabelece uma
conexão entre dois estados de coisas distintos: o estado de coisas ao qual a condição modal se
Alguns traços semânticos dos estados de coisas ligados são predeterminados pela
estados de coisas ligados diz respeito à referência a tempo, aspecto ou modo e aos
predicados de manipulação, por sua vez, requerem que o estado de coisas dependente seja
ao estado de coisas principal e os posteriores a ele (GIVÓN, 1973). No que diz respeito aos
predicados modais e volitivos, Cristofaro (2003) considera que a referência de tempo e o valor
complementação.
dependente, ainda que de modo diferente. Com predicados modais e volitivos, por exemplo, o
ordenar, requerem que o estado de coisas dependente não seja realizado no mesmo ponto
manipulação descrita pelo predicado. Por isso, o estado de coisa dependente é conhecido
complemento nunca é apresentado nem com verdadeiro nem como falso; como consequência,
mesmo acontece com os predicados de enunciação. Desse modo, na medida em que eles
envolvem a relação entre dois estados de coisas distintos, Cristofaro (2003) postula que esses
predicados pertencem ao nível da predicação e não ao do predicado, tal como defende a GF.
Cristofaro (2003), com predicados fasais, manipulativos e modais. Na visão da autora, outros
coisas dependente.
dependente numa relação de subordinação podem ter vários graus de interconexão, no que diz
participantes (GIVÓN, 1980, 1990; NOONAN, 1985; CRISTOFARO, 2003). Com base nesse
parâmetro, Cristofaro (2003) propõe uma relação entre predicados encaixadores e integração
Fasais > Modais > Manipulativos (‘fazer’) > de Conhecimento, de Atitude proposicional e de
Manipulativos (‘ordenar’), Volitivos e de Enunciação
Percepção
A relação entre os três parâmetros sugeridos por Cristofaro, os quais, de certo modo,
coadunam com os graus de integração sugeridos por Givón (1980, 1990), pode ser assim
lado, e a de participantes, por outro. Como se vê, esses parâmetros de integração são cruciais
consciente do falante.
seleção de determinado tipo de oração subordinada completiva, abordo, a seguir, alguns tipos
mencionado, Givón (1980) considera que a natureza semântica do predicado encaixador pode
ser vista como um fator indicativo do grau de integração da oração subordinada à oração
71
matriz. Dik e Hengeveld (1991) e Hengeveld (1998) fazem referência ao fato de que, no caso
classificação depende da camada em que estão contidos. Entende Cristofaro (2003) que as
relações completivas se identificam com base no predicado que codifica o estado de coisas
Dixon (2006) considera que a discussão sobre complementação é mais eficaz se se reconhece
sentenças encaixadas recebem seu enquadramento semântico do predicado matriz em que elas
formato que assumem as orações encaixadas. Braga (2008) postula que a correlação entre a
que as orações completivas desse tipo sejam tratadas como diferentes unidades semântico-
funcionais. Em consequência, propõe que o estudo das propriedades semânticas das orações
completivas tem pouca validade se for feito exclusivamente com base no significado do
predicado encaixador.
72
como faço neste trabalho e se faz em outros que tratam do fenômeno em questão, não pode
(2-4) e (2-5):
Nos termos da GDF – que será tratada no próximo capítulo, a oração Alfredo se casou,
diferente em (2-4) e (2-5). Como resultado de um construto mental, designado por saber, a
sua verdade. A completiva em (2-5), por sua vez, caracteriza-se pela função precípua de
possível a partir da verificação do predicado que toma essa sentença como complemento. Isso
Ainda que se faça uma leitura a partir do significado do complemento, como, por
proposicional não ocorrem com predicados que descrevem um estado de coisas’, de qualquer
1980, 1995; NOONAN, 1985; CRISTOFARO, 2003; DIXON, 2006; EGAN, 2008;
Dik e Hengeveld (1991) e Hengeveld (1989, 1996), reafirmo que, para os propósitos deste
Isso porque trabalhos desse tipo são funcionalmente dirigidos, ou seja, para dar conta das
diferentes construções gramaticais nas diferentes línguas, apelam para alguns domínios
de investigação, optei por uma classificação que considerasse os aspectos particulares dos
29
Cf. o original: In Hengeveld (1988, 1989, 1990b), Dik (1989), Bolkestein (1990) it is argued, in line with Foley
and Van Valin (1985) and Lehmann (1988) (i) that each layer (including all layers of lower complexity it contains)
may be turned into the complement of a matrix predicate, (ii) that the particular layer chosen is dependent upon the
class of matrix predicates involved, and (iii) that differences between complement types can be accounted for in
terms of the differences between the layers underlying them.
74
na amostra.30
A seção anterior mostrou que, em sua classificação, Givón (1980) estabelece uma
implicabilidade. Cada uma dessas camadas se bifurca em categorias mais fracas e mais fortes
(ii) atitude epistêmica forte (know, think, believe, guess, learn, discover, doubt)
(iv) atitude emotiva forte (like, hope, fear, expect, love, hate, want)
(v) forte tentativa (plan, intend, try, order, insist, demand, ask, allow, permit, tell, let)
(vi) implicativos (begin, finish, succeed, fail, avoid, make, have, force, prevent)
Givón (1980) não inclui, por exemplo, predicados teoricamente relevantes para o tipo de
fenômeno aqui investigado, como os de percepção, ver e ouvir. Considerando, portanto, outra
utilizada por Cristofaro (2003). Segundo o autor, todas as línguas têm o mesmo conjunto de
30
No Capítulo 4, trata-se especificamente do universo de investigação e procedimentos metodológicos. Nesta
seção, pretende-se somente enfatizar a importância do predicado encaixador na determinação da forma do
complemento e, com base nisso, apresentar algumas classificações de predicados disponíveis na literatura sobre
o assunto e optar por uma.
75
predicado que envolvem diferentes tipos de relações entre o estado de coisas principal e o
dependente31:
por Noonan (1985) e Cristofaro (2003), tem maior abrangência com o acréscimo, por
exemplo, de predicados encaixadores modais e perceptivos, mas Cristofaro (2003) não inclui
alguns tipos de predicados que envolvem atitude emotiva forte, como gostar, por exemplo, ou
de forte tentativa, como tentar, que, como os de percepção, podem ter influência significativa
31
Os cinco primeiros tipos de predicados encaixadores estão no nível da predicação, segundo Cristofaro (2003),
enquanto os três últimos estão no nível da proposição.
76
(ii) predicados de conhecimento (de aquisição, como learn, e de perda, como forget)
Dik (1997b), que, por seu lado, deve ter assumido a de Noonan (1985) como sua fonte
principal. Comparando-as, entretanto, com a de Givón (1980), percebe-se que Dik acrescenta
os predicados de percepção física e mental àquela, mas, similarmente, não leva em conta
alguns tipos de predicados, como gostar e tentar, que se acham alistadas por Givón. Nesse
do tipo B têm os mesmos complementos que os do tipo A, mas admitem, além deles, um
(i) de atenção (attention) (see, hear, notice, smell, show, recognize, discover, find)
78
(iii) de experiência psicológica (liking) (like, love, prefer, regret, fear, enjoy)
(iv) de enunciação (speaking) (say, inform, tell (one sense), report, describe, refer to,
Além dos primários, todas as línguas têm um conjunto de predicados que, segundo o
autor, convém chamar de ‘conceitos secundários’, uma vez que esse tipo sempre requer estar
ligado a um outro verbo por não poder ser utilizado isoladamente. Os tipos Secundários A
identificam predicados cujo conceito secundário está associado ao verbo com o qual se
(v) modais
(vi) de início (beginning-type): predicados como begin, start, continue, stop, cease, finish
(viii) want, wish (for), hope (for), intend, plan (for) e pretend
Os predicados Secundários C, por sua vez, identificam-se como classe pelo fato de
32
Por sua natureza, os predicados encaixadores Secundários B e C, foram denominados, no quadro, predicados
de Expectativa/Volitivos e Manipulativos/Causativos, respectivamente.
79
Cristofaro (2003; cf. NOONAN, 1985), bem como na Tipologia de Ligação proposta por
Givón (1980). O problema é que é necessário contar com uma proposta com o maior grau
encontrados nos dados reais. Optei, portanto, não por uma única proposta, mas por uma
classificação compósita, que favorecesse o grau máximo de exaustividade, mas que tivesse
Embora tenha optado pela classificação de Dixon (2006), algumas ressalvas devem ser
feitas em relação ao arranjo final de tipos de predicados encaixadores utilizados na análise (cf.
Quadro 2-7). Essas ressalvas dizem respeito (i) à classificação dos encaixadores mandar e
pedir; (ii) aos tipos de predicados encaixadores que, na classificação de Dixon (2006), fazem
classificação de Dixon (2006), no entanto, esses predicados são tratados como predicados de
enunciação. A opção do autor talvez se justifique pelo fato de esse tipo de predicado requerer
que uma oração encaixada ocupe o espaço de um ato de fala em situações de discurso direto.
informação, expressam que X faz alguma coisa para levar Y a realizar um evento (cf. DIK,
mas não veiculam a idéia de que o ato manipulativo ocorre por meio de um ato de fala.
Justamente por esse comportamento híbrido, predicados como pedir e mandar se posicionam
postulo que a função inicial desses predicados limítrofes é a de manipulação. Como se verá
33
Na classificação de Dik (1997b), predicados como mandar, ordenar e pedir, que são denominados predicados
diretivos, têm a mesma definição dos predicados de manipulação. A diferença está na possibilidade de haver a
intervenção de um ato de fala, como ocorre com os predicados diretivos, ou não, como ocorre com os predicados
de manipulação.
34
Em muitos casos, os verbos dizer e falar, verbos prototípicos de enunciação, também podem ter uma carga
‘manipulativa’, como em eu disse/falei que você tem que sair imediatamente!, funcionando como uma ordem,
equivalente a eu mandei/ordenei/pedi que você saísse imediatamente!.
81
está no fato de muitos predicados de natureza semântica diferente estarem sob um mesmo
rótulo, como ocorre com a classe de predicados de pensamento, que engloba predicados como
saber, lembrar, esquecer achar, pensar e acreditar. Desse modo, optei por estabelecer uma
divisão mais refinada na classe de predicados de pensamento nos seguintes termos: (a)
de predicados encaixadores de atenção. Dixon (2006) não faz distinção entre predicados que
designam percepção mental e os que designam percepção visual. Como são complementos
que têm comportamento diferenciado, como mostram os exemplos (2-8) e (2-9), requerendo
Uma última ressalva diz respeito à consideração dos modais como um tipo de
além de orações não-finitas, fato que pode justificar a presença desse tipo de verbo na
82
Noonan (1985) considera, inclusive, que os modais são excelentes candidatos à união
poder e dever, é determinado tanto pela correferencialidade entre os participantes quanto pela
pode ser expressa por operadores modais como poder e dever, respectivamente. O domínio da
modalidade pode ser distinto tendo em vista a perspectiva para qual é orientada. (2-10), por
completiva, “sem que o falante tenha responsabilidade por esse julgamento” (HENGEVELD;
MACKENZIE, 2008, p. 174);35 tem-se, nos termos da GDF, uma modalidade epistêmica
(2-10) Inf.: com certeza se ela estudar mais ela pode ter um conhecimento maior sobre tudo...
(IBORUNA – AC 024: 416)
O uso de saber em (2-11), por sua vez, diz respeito à relação entre o participante e a
realização potencial do estado de coisas; por isso, trata-se aqui de uma modalidade orientada
para o participante.
(2-11) ...e:: ele foi pra minha sala... né com nove anos já sem saber ler sem saber escrever e ele na
verdade é muito engraçado porque ele faz caras e bocas faz caretas (IBORUNA – AC 088:
092)
Construções nominalizadas não ocorrem com modais, ou, no mínimo, não são
aceitáveis nesse contexto. O outro extremo também não ocorre sob o risco de tornar a
sentença agramatical, isto é, os modais tomarem uma oração finita como complemento.
35
Cf. o original: [...] without the Speaker taking responsibility for these judgments.
83
(2-12)a. Os pais de Ana disseram que ela deve se casar com Leo.
*b. Os pais de Ana disseram que ela deve o casamento com Leo.
*c. Os pais de Ana disseram que ela deve que (ela) se case com Leo.
únicos que restringem, em português, qualquer tipo de ‘complemento’ que não seja uma
oração não-finita com infinitivo impessoal. Seria possível pensar, desse modo, que o
predicado determina o tipo de complemento e que, tal como sustentam Noonan (1985) e
predicados é um indício seguro de que, ao menos no português, eles atuam como verdadeiros
auxiliares. São, assim, predicados que não ‘encaixam’ orações, como fazem os predicados
Hengeveld e Mackenzie (2008) tratam os verbos modais como uma classe de palavra
36
No Capítulo 5, na seção 5.3.7 (p. 200), que trata dos predicados fasais, o caráter de auxiliaridade dos modais é
retomado.
84
O Quadro 2-6 permite fazer distinção entre classe de palavras lexicais, tal como os
possível afirmar que, no português, os modais não atuam como verdadeiros predicados, por
formarem perífrases modais que codificam um único estado de coisas. Em virtude desse
de Atitude proposicional Especifica a atitude de uma pessoa em relação ao fato Leo acha que Alfredo não
possível designado pelo complemento; expressa uma voltará.
(Thinking) atitude em relação à verdade manifestada no
complemento (NOONAN, 1985; DIK, 1997b; Ana acredita que Leo não faltará.
CRISTOFARO, 2003).
de Conhecimento Designa (o processo de) aquisição, posse, perda do fato Pedro sabe que Ana voltará.
designado pelo complemento oracional (DIK, 1997b;
(Thinking/Attention) CRISTOFARO, 2003). Ana notou que Leo chegou.
de Percepção física Indica uma percepção imediata; o predicado encaixador Pedro viu seu dedo sangrar.
nomeia o modo sensorial pelo qual um sujeito percebe o
(Attention) evento codificado no complemento (DIK, 1997; Ana ouviu Leo bater na porta.
NOONAN, 1985).
de Manipulação Indica que X faz alguma coisa (compelindo, autorizando, Pedro mandou Leo sair.
impedindo) para que Y realize o estado de coisas descrito
(Secondary C) no complemento oracional (DIK, 1997b; GONÇALVES Pedro pediu que Leo saísse.
et al., 2008).
de Volição Descreve o desejo do participante da oração matriz de Ana quer morar em Cuba.
que o evento no complemento oracional se realize ou
(Secondary B) deixe de se realizar (NOONAN, 1985; CRISTOFARO, Leo deseja que Ana consiga
2003). morar em Cuba.
Fasais Indica a fase de desenvolvimento de uma ação, estado Alfredo parou de fumar.
(começo, continuação e fim) descrito no complemento
(Beginning-type) oracional (NOONAN, 1985, CRISTOFARO, 2003). Leo começou a construção de
sua casa.
de Experiência psicológica Expressa uma avaliação subjetivo-emocional do falante Ana odeia que mexam em suas
em relação ao conteúdo expresso pelo complemento coisas.
(Liking) oracional (NEVES, 2002; GONÇALVES et al., 2008).
Leo gosta de dormir cedo.
de Tentativa Indica que o participante do estado de coisas principal Leo tentou se casar com Ana.
emprega meios para realizar/ conseguir que o estado de
(Trying-type) coisas descrito no complemento oracional ocorra.
37
Apesar de haver adotado, em maior parte, a proposta de classificação de Dixon (2006), as definições
semânticas dos predicados encaixadores são de outros autores (NOONAN, 1985; DIK, 1997b; NEVES, 2002;
CRISTOFARO, 2003; GONÇALVES et al., 2008), já que Dixon se resume à classificação, não vendo relevância
em defini-las.
85
encaixadores, a seção a seguir volta-se para os tipos de completivas, distribuídas numa escala
Desverbalização, de Croft (1991), nos dados discutidos por Comrie (1976) e Koptjevskaja-
distinção entre nomes e verbos (cf. HOPPER; THOMPSON, 1984; LANGACKER, 1987a,
1987b, 1991; e CROFT, 1991). Esses modelos também procuram discutir por que razão
motivo pelo qual formas verbais que codificam eventos dependentes perdem suas
Langacker (1987a, 1987b, 1991) faz a distinção entre verbos e nomes em termos
cognitivos. Nomes designam coisas, enquanto verbos designam processos. Croft (1991)
distingue verbos e nomes em termos das características semânticas de bases lexicais e das
posição na estrutura oracional. Bases lexicais podem designar objetos, que são apropriados
para a função pragmática de referência, ou ações, que são apropriadas para a função
complementação envolvem o uso de palavras que denotam ação para designar referência.
diferentes línguas no que diz respeito à percepção das categorias gramaticais. Em termos
As classes de nomes e verbos têm correlatos semânticos muito próximos das entidades
percebidas no mundo real. Para nomes, a entidade é algo como 'coisa' ou 'objeto' (ou
prototipicamente entidades de ação ou evento; eles são usados para simbolizar a percepção
Verbos dispõem de propriedades que os caracterizam, como tempo, aspecto, modo (TAM) e
pode ser vista como a perda de propriedades típicas das formas verbais. Nomes podem ser
caracterizados por sua função na oração, usualmente indicada por meio da marcação de caso
em verbos e a codificação do argumento do verbo como possuidor podem ser vistos como a
constructions) devem ser entendidas como aquelas em que o predicado, tanto da oração
verbais, isto é, a sua forma verbal assinala seu status de subordinado em relação à outra
(KOPTJEVSKAJA-TAMM, 1993).
38
Segundo Noonan (1985), diversos fatores podem afetar a semântica potencial de um determinado tipo de
complemento, dentre eles o status gramatical do predicado encaixado – verbo, nome ou adjetivo. Noonan afirma
que predicados-complementos são, na grande maioria dos casos, codificados como verbos (como, por exemplo,
as orações finitas e os complementos infinitivos), caracterizando-se, assim, como um tipo de complementação
não-marcada. Há línguas em que essa é a única possibilidade de codificar o predicado. Sendo a forma verbal o
tipo não-marcado, os tipos marcados ficam, então, a cargo das predicações nominalizadas (como
nominalizações) e adjetivais (particípios), observando-se que essas duas formas, na maioria das vezes, coexistem
em sistemas de complemento com predicados codificados como verbos.
39
As estratégias de equivalência (balancing) e rebaixamento (deranking) aparecem, originalmente, em Stassen
(1985).
88
possível contar com sistemas linguísticos que não apenas dispõem dos dois tipos de
complementos, como também de uma escala em que os tipos constituem dois extremos. Os
complementos em português podem ocorrer como uma completiva finita ou como uma oração
fornece uma taxionomia com validade transsistêmica para as construções encaixadas, que
Construções Encaixadas
Finita Não-finita
“construção nominalizada”, tal como ocorre com as construções sem propriedades nominais
com infinitivo e com particípio como núcleo. Segundo Camacho (2009, p. 116), embora o
encaixada, “há outro traço relevante, compartilhado por todos os tipos de construções
dispõem”.40 Dik (1997b), no entanto, atribui esse traço somente a construções infinitivas e
encaixadas que têm propriedades nominais. Camacho (2009) defende, então, a ideia de que a
A primeira distinção que Noonan (1985) faz em relação aos tipos de complemento é
complemento do tipo sentencial é aquele que, sem seu complementizador, tem a mesma
tem a mesma relação sintática com seu sujeito e seus outros argumentos que tem a oração
principal: ele permanece sintática e morfologicamente como verbo, mas não exclui a
40
Predicações abertas e fechadas se diferem no que diz respeito à natureza especificada ou não especificada da
estrutura argumental. Uma predicação aberta é aquela em que todas as posições, com exceção da ocupada pelo
próprio termo, são preenchidas por estruturas de termo; ela funciona como um restritor dos valores possíveis que
o termo pode ter (cf. DIK, 1997a).
41
Essa distinção feita por Noonan (1985) não corresponde à oposição entre orações equivalentes e rebaixadas
(justamente porque complementos sentenciais podem ser tanto equivalentes quanto rebaixados), mas coincide
com a distinção entre orações finitas e não-finitas.
90
forma do
complemento-
a mesma da oração sentença idêntica à
Indicativo verbo a mesma da oração principal principal oração principal
declarativa
forma da sentença-
tipicamente complemento que
Subjuntivo verbo a mesma da oração principal
reduzida42 difere da oração
principal declarativa
interpretada como
o predicado pode concordar a mesma do asserção separada;
Paratático verbo com o sujeito, mas não Indicativo não toma
forma constituinte com ele complementizador
o predicado não pode formar reduzida; não pode mesma relação com
Infinitivo verbo constituinte com o sujeito ter a concordância o objeto que tem o
sujeito – verbo43 tipo Indicativo
reduzida; pode estrutura interna de
tomar categorias SN; gradação
Nominalização nome relação associativa entre nominais, tais como frequente entre
sujeito e predicado caso e número nominalizações e
infinitivos
reduzida; pode sintaticamente, pode
tomar flexões obedecer os
Particípio adjetivo/advérbio o sujeito é o núcleo; o resto adjetivais quando princípios que
da predicação é modificado concordando com o governam os
sujeito adjetivos
mecanismos que assinalam seu estatuto de construção subordinada (como, por exemplo, um
referência temporal determinada, ocorrendo com predicados que expressam comando, pedido,
42
Ao tratar do subjuntivo como tendo categoria flexional reduzida, Noonan (1985) faz referência a línguas como
o russo, em que, em relação ao indicativo, o subjuntivo tende a ter menos possibilidades de flexão, e o grego
clássico, em que o subjuntivo perde distinções de tempo e marca somente distinções aspectuais.
43
Para o português, isso parece não se aplicar, já que dispõe de infinitivo pessoal, isto é, flexionado, e de
infinitivo impessoal.
91
nomes verbais, particípios ou gerúndios e podem ser caracterizados pela adição de algum
aspecto do que os verbos finitos (tipicamente, predicado que aparece no infinitivo é marcado
somente para as distinções aspectuais), não podem se constituir como verbo principal de uma
oração independente e não apresentam concordância com os termos com que ocorrem (exceto,
no português, com o infinitivo pessoal); são, entretanto, uma forma verbal, pois não apresenta
nominal. Esse tipo de complemento varia consideravelmente quanto às categorias verbais que
ele pode preservar, oscilando entre os complementos nominalizados que podem expressar
Segundo Noonan (1985), no paradigma verbal, é mais provável que a forma de uma
nominalização seja mais idiossincrática do que as construções no infinitivo, que têm uma
formas verbais não-finitas são formas verbais dependentes por excelência, justamente porque
esse tipo de construção não pode nunca atuar como predicado de orações independentes. O
fato de a oração não-finita ser a forma verbal dependente por excelência não significa,
entretanto, que toda forma verbal dependente seja necessariamente uma oração não-finita. Há,
44
Embora as construções infinitivas e participiais sejam consideradas construções não-finitas (cf. NOONAN,
1985; KOPTJEVSKAJA-TAMM, 1993; DIK, 1997b), interessam, neste trabalho, somente as orações não-finitas
com infinitivo.
92
dependente, respectivamente.
finitas – e, talvez, com algum outro tipo de oração nominal – por significados e funções.45 O
inglês e o russo, por exemplo, têm construções nominais de ação capazes de expressar
eventos, fatos e proposições, se as duas últimas categorias são normalmente denotadas por
suficiente para determinar o seu tipo sintático. Muitas línguas têm vários tipos de nominais de
vezes, esses nominais de ação permitem o mesmo tipo de nominalização; noutras vezes,
Lehmann (1988), Dik (1985; 1997b), Croft (1991), Kopjevskaja-Tamm (1993), Cristofaro
45
Os nominais de ação são o que Koptjevskaja-Tamm (1993) chama de nominalização lexical, que se difere de
nominalização oracional. Segundo a autora, em nominais de ação, o processo de nominalização envolve o
núcleo, provocando uma alteração do seu estatuto categorial em comparação às orações independentes.
Nominalizações oracionais, por sua vez, são aquelas cujo traço característico é a ausência de evidência em favor
de se analisar o núcleo desse tipo de construção como um nome lexical; isto é, o verbo em uma oração desse tipo
geralmente não tem características nominais, mas tem, muitas vezes, características verbais, como pessoa e
número, embora possa faltar marcação aspectual e temporal (cf. KOPTJEVSKAJA-TAMM, 1993).
93
indica que verbos e nomes tendem a perder algumas das propriedades morfossintáticas
nominais, como caso, determinação, modificação etc., e é por isso que o termo
posição de objeto (sintagma nominal), ela retém a estrutura de uma sentença e raramente
aspecto e voz, mas não podem assumir outras propriedades tipicamente verbais, como tempo
forma sentencial. O caso (2-12c) combina, por seu lado, traços nominais e verbais: é capaz de
gramaticais de verbo.
na escala, são codificados por classes lexicais mais ou menos universais, como verbo e nome
respectivamente, o estatuto categorial das classes intermediárias difere muito de uma língua
para outra. Os exemplos do inglês servem apenas para ilustrar as construções encaixadas
possíveis e, por isso, não podem ser tomados como universais, principalmente em função da
diversidade tipológica das línguas. Assim, a gramática do português, por exemplo, não
encaixada. Nesse aspecto, difere da gramática do inglês, que, como se vê em (2-12b), licencia
a forma não-finita mesmo com identidade entre objeto da matriz e sujeito manifesto como
A partir da categoria mista das nominalizações, Malchukov (2004) afirma que, com
base em hierarquias de categorias verbal e nominal, podem ser feitas predições significativas
em relação aos processos que envolvem esse tipo de construção. Considerando-se essas
hierarquias, o autor sugere que as categorias mais externas (camadas) são mais prontamente
afetadas pelas operações transcategoriais do que as camadas mais internas. Isso significa que
categorial. Essa generalização tem uma motivação funcional: operadores externos refletem a
função sintática e/ou pragmática de um item lexical muito mais do que operadores internos.
coisas quando se transforma realmente num substantivo de primeira ordem, como detectável
construções ruírem. As categorias mais externas e respectivas camadas são mais prontamente
afetadas pelas operações transcategoriais do que as mais internas. Desse modo, a valência é,
na visão do autor, a camada semanticamente mais próxima do lexema verbal e, portanto, mais
envolve a perda de todas as categorias verbais, incluindo a valência. Com base nos processos
restrição na integração das duas hierarquias categoriais (nome e verbo), Malchukov propõe o
[[[[[N]CL]NUM]POS]DET]CAS
< ------------------------------------ [[[[[[V]VAL]ASP]TEMP]MOD]CONC]FI
nominalização < ---------------------------------------------
desverbalização
(Adaptado de MALCHUKOV, 2004, p .66)
0 são construções plenamente verbais: a oração matriz tem como complemento uma oração
46
Camacho (2009) serve-se dessa resistência da propriedade valencial das nominalizações para encaixá-las num
ponto intermediário entre os membros prototípicos de nomes e de verbos.
47
No polo da nominalização, a forma adquire progressivamente caso (CAS), determinação (DET), posse (POS),
número (NUM), classificador (CL); no polo da desverbalização, a forma perde progressivamente força
ilocucionária (FI), concordância (CONC), modo (MOD), tempo (TEMP), aspecto (ASP) e valência (VAL).
96
finita (como em John saw that Peter signed the cheque); nas nominalizações de grau 1,
Peter signing the cheque); nas nominalizações de grau 2, a construção encaixada é marcada por
preposições, que são indicadoras características de termos nominais (como em John approved
of Peter signing the cheque); nas nominalizações de grau 3, tem-se a presença opcional do
requerida de operadores de termos, isto é, artigos, demonstrativos etc. (como em John deplored
Peter’s signing of the cheque); as nominalizações de grau 4, por fim, caracterizam-se pelo alto
Toda nominalização se caracteriza por dispor de ajustes que a tornam mais ou menos
nominal, de modo que é possível obter-se uma escala de construções encaixadas que podem
variar entre o polo das mais verbais para o polo das mais nominais. Para caracterizar a escala
gradativa de construções verbais e nominais, Mackenzie (1996) fornece construções nas quais
há um ‘deslizamento’ nominal que leva uma expressão completamente verbal para uma
construção completamente nominal, por meio de três tipos de gerúndio com um caráter
( 1 )e. I regretted John’s refusal of the offer (Adaptado de Mackenzie, 1996, p. 330)
tempo e aspecto, enquanto em (2-14b-c) somente a oposição de tempo entre passado (having
ausentes em (2-14a); (2-14b) pode ser associado com uma preposição; (2-14c) aceita um
demonstrativo (that refusing the offer of John’s); (2-14d) admite artigo definido (the refusing
nominal. Há, assim, uma clara evidência de transição gradual entre construções
Mackenzie (2006) pode ter uma atuação muito relevante, na tipologia linguística, na forma de
(2-15) nominalidade (> operadores) > possuidor/dependente > marcas de função > desverbalização
Assim, línguas que dispõem dos tipos sentenciais de grau n também dispõem dos tipos
de grau n – 1. Em sua amostra, Mackenzie (1996) constatou que todas as línguas têm, ao
gerúndio do inglês seja o infinitivo, de modo tal que os casos em (2-14) poderiam ter
gradativa de estatuto oracional, isto é, o verbo da oração finita ‘perde’ as marcas que a
(2-17) Oração finita > oração não-finita com infinitivo > nominalização
Ressalta-se, por fim, que quanto mais encaixada é uma construção, mais gramatical é o
48
É necessário observar que o uso do subjuntivo, em (2-16a), formalmente ausente da morfossintaxe do inglês,
fornece ao português um grau ainda maior de dependência oracional do que ao inglês.
99
formal. A alta integração da oração subordinada com a oração principal correlaciona-se com a
nominal.
É necessário abrir um parêntese para iniciar uma reflexão sobre a teoria adotada e
outras teorias. O capítulo anterior delimitou a análise dos tipos de completivas a partir de um
enfoque funcionalista, excluindo o enfoque tradicional e o aparato formal. Mais uma vez, é
preciso delimitar um pouco mais o enfoque teórico que sustentará a descrição dos dados
significa, entretanto, abrir mão das perspectivas para a complementação aqui apresentadas.
Ao contrário, as noções apresentadas por Givón (1980, 1993), Cristofaro (2003), Noonan
(1985), Lehmann (1988) e por todos os outros autores visitados ao longo deste capítulo
representam questões cruciais para a investigação proposta neste trabalho e servem como base
É sabido que esta tese prevê o processo de integração semântica (cf. GIVÓN, 1980,
1993; Cristofaro, 2003) como determinante para seleção/restrição dos tipos de completivas,
tanto que trata da relação da sintaxe com a semântica. Entretanto, o tratamento fornecido pela
observadas por Givón e outros linguistas. Desse modo, é esse o principal modelo teórico que
os subsistemas semântico e pragmático; para tanto, enfoca não só as regras que governam a
representacional, mas também as que governam os padrões de interação verbal nos quais
essas expressões são usadas, ou melhor, a linguagem de um ponto de vista interpessoal. Para a
análise aqui proposta, é extremamente relevante um modelo teórico que conceba a gramática
Breve recapitulação
de orientação funcionalista. O objetivo aqui foi o de tratar das relações que se estabelecem
(2003), segundo a qual a subordinação constitui um modo de construir uma relação cognitiva
entre dois estados de coisas, de um modo tal que a um deles falta um perfil autônomo, sendo,
por isso, construído a partir da perspectiva do outro estado de coisas. A relação estabelecida
entre predicado encaixador e oração completiva foi tratada a partir da noção de integração
49
A opção pelo aparato teórico da GDF não se trata de um ecletismo barato, tampouco de seleção avaliativa
negativa. Givón (1980, 1990) formaliza pouco suas colocações, assim como Cristorafo (2003), que tem uma
visão mais cognitivista, mesmo porque essa não é a proposta dos autores. Por isso, afirmo que, no tratamento da
complementação com vistas à explicação para a seleção/restrição de complementos, as propostas pouco
formalizadas de Givón e de Cristofaro abrigam-se perfeitamente na proposta formalizada da GDF.
101
semântica, introduzida originalmente por Givón (1980, 1993) e considerada, por Cristofaro
(2003), um dos parâmetros por meio dos quais se pode descrever a semântica da
nominalidade das completivas, com base no tratamento que Noonan (1985), Koptjevskaja-
Tamm (1993), Mackenzie (1996), Dik (1997b), Cristofaro (2003) e Malchukov dão ao tema.
MACKENZIE, 2008), a ser discutida no próximo capítulo. Obviamente, essa delimitação não
outros enfoques.
102
CAPÍTULO 3
A GRAMÁTICA DISCURSIVO-FUNCIONAL
1997b). Esse novo modelo não se restringe às orações, tal como nessa versão standard, mas
abrange tanto as unidades maiores quanto as menores do que as orações, buscando descrevê-
las a partir da aplicação de quatro níveis de análise, que dão conta das motivações
capítulo anterior, constitui a base teórica principal sobre a qual se fundamenta este trabalho.
Por uma questão de espaço e pertinência, não pretendo aqui sintetizar todos os princípios do
modelo; almejo simplesmente explicitar as bases gerais sobre os quais essa teoria linguística
disso, a seção 3.2 descreve a GDF, enfatizando os princípios que a regem, suas características
como um modelo de interação verbal e seu modo de organização. A seção 3.3 focaliza os
para a análise de qualquer língua. Dado que a arquitetura da GDF é dotada de níveis
tratamento que a GDF dispensa à subordinação, salientando o modo como esse modelo
A GDF faz parte do leque de teorias linguísticas que se baseiam na crença de que as
língua. Como parte de uma ampla teoria de interação verbal, situa-se no campo das teorias
(p. 49), a GDF ocupa uma posição intermediária entre abordagens radicalmente funcionalistas
e radicalmente formalistas. Segundo Hengeveld (2004b), a GF, bem como sua nova versão, é
A GDF é, então, um modelo das intenções e conceituações codificadas, uma vez que
da gramática. Isso significa dizer que essa teoria não é um modelo da produção linguística: é
uma teoria sobre a gramática das línguas que procura fazer uso de evidências psicolinguísticas
visto como um conhecedor das unidades e dos modos como essas unidades podem se
um sistema notacional sofisticado. Assume, entretanto, que o conhecimento que o falante tem
interpessoal e emerge como resultado de processos históricos: formas que serviram aos
Como parte de uma teoria de interação verbal, a GDF caracteriza-se por (i) sua
organização top-down, (ii) tomar o ato discursivo como unidade básica de análise, (iii) incluir
representações das propriedades semânticas e pragmáticas dos atos discursivos, (iv) ligar,
Na proposta da GDF, a gramática está disposta em níveis, que, por sua vez, estão
gramática é tanto mais efetivo quanto mais sua organização se assemelhar ao processamento
tem a ver com as regras que determinam quais representações semânticas e pragmáticas
subjacentes são válidas, e a de Codificação, que tem a ver com as regras que convertem essas
língua em análise. A operação de Codificação, por sua vez, envolve tanto a seleção de moldes
oração (clause), tal como preconizava o modelo standard da Teoria da Gramática Funcional.
complexa. Como bem aponta Camacho (2006), ainda que, frequentemente, a abordagem dos
fenômenos gramaticais lance mão de explicações de base discursiva, tendo em vista que a
linguagem é um instrumento de interação social, a sintaxe em si, e não o discurso, parece ser
o objeto principal da GF, visto que a unidade máxima de análise está confinada ao estudo de
Nos casos em que a explicação reduz as regras aos mecanismos formais, a GF dá conta
seus postulados mais caros. Dik (1997a, p. 5) acredita que “o correlato psicológico de uma
de Hymes (1972): sua habilidade de estabelecer a interação social por meio da linguagem”.50
Não obstante, Hymes (1979, p. 306) lança mão da seguinte crítica a Dik: “Seria justo dizer
que Dik entende ser preferível que a GF seja um modo de analisar a gramática como meio de
comunicação, mas deixa a análise dos fins da comunicação, e a ligação entre meios e fins,
Desde o começo dos anos 90, uma parte significativa da pesquisa desenvolvida dentro
gramática. Segundo Hengeveld (2004a), houve duas razões para essa expansão: em primeiro
lugar, há muitos fenômenos linguísticos que somente podem ser explicados em termos de
unidades maiores que a sentença individual: partículas discursivas, cadeias anafóricas, formas
verbais narrativas etc.; em segundo lugar, há muitas expressões linguísticas que são menores
dentro do discurso. Isso, portanto, requereria uma concepção de enunciados como atos
Como já mencionado, as operações distinguidas pela GDF dão conta de dois níveis de
análise linguística para a Formulação e de dois níveis para a Codificação. Em outras palavras,
a GDF postula a necessidade de uma gramática organizada em quatro níveis, cada qual
50
Cf. o original: The psychological correlate of a natural language is the NLU’s “communicative competence” in
the sense of Hymes (1972): his hability to carry on social interaction by means of language.
51
Cf. o original: It might be fair to say that Dik understands FG to be preferable as a way of analyzing grammar
as communicative means, but leaves the analysis of communicative ends, and the linkage between means and
ends, to others, or for another time.
52
Os atos discursivos tanto podem se articular entre si, levando à constituição de estruturas discursivas maiores,
como os moves, quanto podem se manifestar como orações ou fragmentos oracionais gramaticais, sintagmas ou
palavras (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).
107
Uma das razões para postular um sistema modular com quatro níveis de representação
(cf. HENGEVELD, 2005), não apenas a entidades referenciais, como em (3-1), mas também a
atos de fala, como em (3-2), à forma de sintagmas nominais, como em (3-3), e à própria
Todos os níveis têm uma natureza puramente linguística no sentido estrito de que
descrevem a linguagem com base nas funções que ela permite exercer, mas somente na
medida em que essas funções são codificadas na gramática das línguas particulares; nesses
termos, a GDF é o componente gramatical de uma teoria mais abrangente da interação verbal.
língua quanto às suas funções e significados, mas somente as funções e significados que são
mais alta para a mais baixa: expressão linguística, oração, sintagmas e palavras. O Nível
da elocução. Isso significa que, nesse nível, a expressão linguística é analisada quanto às
atos discursivos.53 Os atos discursivos, por sua vez, contêm uma ilocução que especifica a
número variável de subatos atributivo e referencial), que contém a totalidade do que o falante
linguística são descritas em termos de categoria semântica que elas designam. Essas
categorias são de diferentes tipos, tais como conteúdo proposicional, episódios, estado de
Conceitual, que contêm elementos essenciais do contexto com o qual os três módulos
são níveis separados dentro do componente Gramatical em vez de serem parte apenas do
Output da gramática, como era previsto no modelo standard (DIK, 1997a). No Output do
funciona como input para a operação de articulação, que, no caso mais comum de expressão,
53
O move (lance) constitui uma unidade autônoma de discurso com o efeito perlocucionário de provocar uma
reação. Ele descreve um segmento inteiro com as várias camadas inferiores que, por seu lado, contêm
componentes desse segmento, uma hierarquia que representa a sequência das ações linguísticas.
109
Figura 3-1: GDF como parte de uma teoria de interação verbal (adaptado de
HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 6)
esse componente que representa o material ideacional e interativo pressuposto para cada peça
do discurso em análise e para os vários moves e atos discursivos que ele contém. O
componente Conceitual não inclui todos os aspectos da cognição que são relevantes à análise
particular que é relevante para a forma dos enunciados subsequentes. Esse componente
contém a informação de longo termo sobre a interação em curso, que é relevante para as
distinções requeridas pela língua em uso e que influencia na formulação e codificação dessa
Figura 3-2: Arquitetura geral da GDF (adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 13)
111
Cada um dos níveis de representação que integram o componente Gramatical tem uma
estrutura independente, como nas próprias camadas. Em cada nível, a expressão linguística é
analisada em termos de distinções relevantes para o nível em questão. O que eles têm em
comum é o fato de terem uma organização em camada hierarquicamente ordenada. Nos níveis
exemplo, move, atos discursivos etc., no Nível Interpessoal, e conteúdo proposicional, estados
de coisas etc., no Nível Representacional); essa variável é restringida por um núcleo (h)
(possivelmente complexo) que a toma como seu argumento e pode, além disso, ser restringida
por um modificador (σ) que toma a variável como seu argumento. Cada núcleo (h [de head])
pode ser modificado por um ou mais modificadores (σ) e cada variável pode ser especificada
112
por um ou mais operadores (π); as unidades de cada nível podem apresentar uma função (Φ),
No Nível Interpessoal, um move pode ser modificado por elementos do léxico que
ainda o considero capaz, mas duvido que ele consiga’). O modificador de ato discursivo, por
sua vez, permite ao falante fazer comentários, indicando as propriedades estilísticas do ato
(como ‘brevemente’), o estatuto do ato dentro do move (como ‘além disso’) e atos enfáticos,
que expressam raiva, irritação etc. (como em ‘vamos embora, caramba’). O modificador de
ilocução age sobre o predicado ilocucionário, lexical ou abstrato, e não sobre o ato discursivo
restritiva do núcleo; o falante indica uma face de si próprio ou do ouvinte que é relevante para
fim, podem ser enfáticos, indicando que se enfatiza conteúdo do enunciado (como em ‘eu
realmente não gosto de você’), podem também indicar a atitude subjetiva do falante em
relação ao que está sendo comunicado (como ‘(in)felizmente’, ‘com sorte’) e servem para
indicar que o falante está transmitindo um conteúdo comunicado expresso ou implicitado por
com relação ao episódio precedente (como, por exemplo, ‘depois de’, ‘antes de’); locação
113
absoluta de tempo (como o ano passado, a semana passada, ontem etc.) é propriedade de
referem-se a: tempo relativo de ocorrência (como em ‘Ana foi embora antes do jantar’), lugar
componente Conceitual, mas o conjunto disponível de frames não oferece lugar para eles
como argumentos.54 Uma propriedade lexical pode ser modificada por outra propriedade
lexical, resultando propriedades complexas. As unidades que designam indivíduo podem ser
qualificadas por modificadores, lexical ou complexo, exceto aqueles com o núcleo ausente.
tratamento das completivas. O Nível Representacional trata dos aspectos semânticos de uma
unidade linguística e é nele que se apresentam as categorias semânticas básicas que são
se ao modo como a língua se relaciona com o mundo extralinguístico que ela descreve. O
54
Propriedades configuracionais constituem um inventário de esquemas de predicação relevantes para as línguas
e representam uma regra crucial na construção de representações semânticas. A propriedade configuracional é
composicional por natureza e contém uma combinação de categorias semânticas sem relação hierárquica entre si.
Essas categorias semânticas de tipos variados podem incluir indivíduos (x), consistindo em objetos concretos que
podem ser localizados no espaço e no tempo, e categorias lexicais (f), que não têm uma existência independente
e podem ser somente avaliadas em termos de sua aplicabilidade a outros tipos de entidades. Outras categorias
semânticas, relevantes para a gramática das línguas individuais, que podem participar da constituição de uma
Propriedade Configuracional são lugar (l), tempo (t), modo (m), razão (r) e quantidade (q) (cf. HENGEVELD;
MACKENZIE, 2008).
114
verbo insistir em (3-6a), por exemplo, usado performativamente, tem a função de identificar
particular do tempo. Isso se torna evidente pela aplicação da negação Isso não é verdade que
afeta somente Ana está doente, como mostra (3-6a'), e não o ato performativo em si (*3-6a’’).
negação Isso não é verdade pode valer tanto para Ana está doente quanto para Pedro insistiu:
O problema que (3-6a) levanta para a semântica não se aplica somente a expressões
lexicais de ilocução, tal como o performativo ali contido, mas também à força ilocucionária,
pode ser usada como teste para diagnosticar o status interpessoal ou representacional de uma
elocução.
O termo ‘semântica’ pode também se restringir aos significados das unidades lexicais
do modo como são usadas na comunicação. No Nível Interpessoal, trata-se do uso que se faz
dessas unidades em termos de atos discursivos e subatos que especificam a função das
unidades linguísticas. É possível demonstrar a relevância dessa distinção com base na noção
A GDF considera que há duas maneiras para considerar um leão como uma expressão
referencial: (i) o falante se refere a um animal da classe dos leões pelo uso dessa expressão,
116
um animal da classe dos leões, numa visão representacional, semântica, isto é, designativa. O
exemplo em (3-12) representa um uso muito mais atributivo do que referencial para a
expressão um leão; isso mostra que nem sempre uma expressão que designa um leão é usada
necessariamente para se referir a um leão. A expressão em (3-13), por sua vez, tem um uso
referencial.
diferença entre as unidades desse nível pode ser feita em termos da categoria ontológica
denotada. Na medida em que categorias ontológicas estão refletidas no sistema da língua, elas
têm o estatuto de categoria semântica e cada uma tem sua própria variável na representação
semânticas, a GDF toma por base a classificação postulada por Lyons (1977), que distingue
Indivíduo x cadeira
Propriedade f cor
Com base no Quadro 3-1, inicialmente, para os propósitos deste trabalho, os tipos de
proposicional, estados de coisas e propriedade. Por sua natureza, indivíduos não funcionam
primeira ordem: trata-se de uma entidade concreta, tangível, que pode ser localizada no
factuais, quando eles representam conhecimentos ou crenças racionais acerca do mundo real,
Em função de sua natureza, uma característica dos conteúdos proposicionais é que eles podem
inferência).
Estados de coisas, que incluem eventos e estados, são entidades de segunda ordem e
se caracterizam por serem localizáveis no tempo e serem avaliáveis em termos de seu estatuto
real. O traço temporal é o que distingue estados de coisas de indivíduos, entidades de primeira
espaço, tal como o são as entidades de primeira, de segunda e de terceira ordem. Propriedades
não têm existência independente e só podem ser avaliadas em termos de sua aplicabilidade a
Além dessas quatro categorias semânticas, A GDF considera que muitas línguas são
episódios que constituem, por sua vez, conjuntos de estados de coisas; como tais, são
Indivíduo x cadeira
Propriedade f cor
Episódio ep incidente
estado de coisas com um núcleo complexo (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 139):
(3-14) (π e1: [(f1: [(f2) (x1)Φ (l1)Φ (t1)Φ ...] (f1)) (e1)Φ]: [σ (e1)Φ])
A representação em (3-14) mostra que o estado de coisas (e) é caracterizado por uma
combinação de unidades semânticas, que não estão em uma relação hierárquica entre si,
incluindo propriedade (f2), indivíduo (x), lugar (l), tempo (t) etc. A possibilidade de
No formalismo da GDF, o símbolo π é usado para operadores; σ, por sua vez, representa um
55
Hengeveld e Mackenzie (2008) utilizam dois critérios para identificar as categorias semânticas: (i) a existência
de classes lexicais e (ii) modelos de nominalizações. Com base no segundo critério, depreendem outras
categorias semânticas que podem não ser relevantes para todas as línguas, a saber: lugar (l), tempo (t), modo (m),
razão (r) e quantidade (q). As categorias semânticas distinguidas pela GDF somente são relevantes se, na língua
observada, há fenômenos gramaticais sensíveis a elas.
119
se pela presença de uma função semântica). A estrutura pode ser assim generalizada (cf.
representado em (3-16b):
(3-17)b. (ei: [(fi: [(fj: ir (fj)) (xi: [(fk: homem (fk)) (xi)Φ])Φ (li: [(fl: supermercado (fl)) (li)Φ])Φ]
(fi)) (ei)Φ])
(3-17)b. (ei: [(fi: [(fj: querer (fj)) (xi: [(fk: homem (fk)) (xi)Φ])Φ (ej: [(fl: [(fm: sair (fm)) (xj:
[(fn: mulher (fn)) (xj)Φ])Φ (li: [(fo: hospital (fo)) (li)Φ])Φ] (fl)) (ej)Φ])Φ (fi)) (ei)Φ])
Em (3-17b), o esquema de predicação (fi) do estado de coisas (ei) contém uma posição
estrutural (slot) para a propriedade (fj), o indivíduo (xi) e para um segundo estado de coisas
(ej). Esse estado de coisas, por sua vez, contém um esquema de predicação (fl) que contém
posições estruturais (slots) para a propriedade (fm), o indivíduo (xj) e o lugar (li).
(3-18)b. (pi: [(fi: [(fj: saber (fj)) (xi: [(fk: homem (fk)) (xi)Φ])Φ (ej: [(fl: [(fm: sair (fm)) (xj:
[(fn: mulher (fn)) (xj)Φ])Φ (li: [(fo: hospital (fo)) (li)Φ])Φ] (fl)) (ej)Φ])Φ (fi)) (ei)Φ])
contém uma posição estrutural (slot) para a propriedade (fj), o indivíduo (xi) e para o estado
de coisas (ej). Esse estado de coisas, por sua vez, contém um esquema de predicação (fl) que
contém posições estruturais (slots) para a propriedade (fm), o indivíduo (xj) e o lugar (li).
Estados de coisas entram como a camada mais alta de organização e podem formar
conjuntos tematicamente coerentes, os episódios, que, por sua vez, podem constituir a
encaixamento, no Nível Morfossintático, não pode ser tratado senão como um caso específico
particular de cada língua e é apenas nesse nível que surgem as diferenças entre os sistemas
121
pertinente para tratar da relação que se estabelece entre o predicado encaixador e o tipo de
predicado encaixado. Isso equivale a dizer que o alinhamento com o Nível Morfossintático é
Representacional.
reconhecidas e formalizadas como funções sintáticas no Nível Morfossintático, mas não são
assumidas como universais. As funções sintáticas são relevantes nos casos em que as
propriedades formais das unidades linguísticas não podem reduzir-se a categorias pragmáticas
distinções semânticas e pragmáticas. Nos casos em que não existe essa neutralização, assume-
funções pragmática (tópico, foco etc.) de subatos, ou em termos de sua referência (definitude,
especificidade etc.).
pessoalidade etc.).
não é motivado pelos níveis Interpessoal e Representacional alinha a GDF com as teorias
funcionais não-radicais.
muitas vezes, as línguas podem exibir mistura de alinhamentos. Existem, por exemplo,
línguas cujo alinhamento está sujeito tanto a fatores de referencialidade (fatores interpessoais)
concordância verbal está sujeita a fatores representacionais, enquanto a elipse nas orações
(‘achém’), que não dispõe da categoria de sujeito (cf. DURIE, 1985 apud HENGEVELD;
MACKENZIE, 2008). Nessa língua, podem-se atribuir três funções semânticas aos
argumentos dos predicados: Actor (A), Undergoer (U) e Recipient (R).56 Actor e Undergoer
animados ocorrem como sintagmas nominais ou como pronomes clíticos ao verbo, formas em
que podem ainda ocorrer simultaneamente. Os pronomes cuja função semântica é Actor são
proclítico lôn; em (3-20), a função semântica Undergoer induz ao uso do enclítico geuh, e, em
1 centro=1.A=ir
‘I am going/ walking.’
56
Actor (Ator) e Undergoer (Paciente) se referem, respectivamente, a argumentos de um estado de coisas
dinâmicos com uma participação mais ativa e mais passiva. Como nem todos os estados de coisas são dinâmicos,
a GDF faz distinção entre o dinâmico e o não-dinâmico, cuja principal característica é a ausência de um Actor.
Locative (Locativo) tem a função de indicar o lugar de ocorrência do estado de coisas, seja ele dinâmico seja
não-dinâmico. Nos estados de coisas dinâmicos, papéis locativos abrangem uma gama de distinções espaciais, a
saber: ablativo (indicando a origem do movimento), perlativo (indicando o caminho do movimento), alativo
(indicando o ponto final de circulação, e abrangendo outras distinções, como destinatário (Recipient),
beneficiário, meta) (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 194-204).
124
3.POL AUX=1.A=disparar=3.POL.U
‘I shot him.’
Pode-se marcar a função semântica Actor com a preposição lê, como se vê em (3-22),
verbo não dispõe de clítico. Como já mencionado, nessa língua, não existem formas clíticas
pessoalidade. A língua dos aborígenes do Canadá, plains cree, exibe esse tipo de alinhamento
(3-23) Ni-wîcih-â-nân-ak
1-ajudar-DIR-1.PL.3.PL
(3-24) Ni-wîcih-iko-nân-ak
1-ajudar-INV-1.PL.3.PL
‘They help us.’
‘Eles nos ajudam.’
(Adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 321)
usados para a expressão do plural da primeira pessoa (o circunfixo ni ... nân) e da terceira
pessoa (o sufixo –ak), independentemente das funções semânticas dos participantes (Actor e
pessoalidade, segundo a qual a segunda pessoa domina a primeira pessoa, e ambas dominam a
terceira. Se a pessoa dotada de posição superior na hierarquia tiver a função semântica Actor,
o verbo exibirá a chamada marcação direta (DIR), como em (3-23). Se a pessoa dotada de
posição inferior na hierarquia tiver a função semântica de Actor, o verbo exibirá a marcação
sempre domina a terceira pessoa obviativa. O resultado disso é que a interpretação das
funções semântica dos participantes pode ser revertida por meio do sistema direto-inverso ou
Lançando mão desses fatos, neste trabalho, postulo que a noção de alinhamento
que compõem a estrutura de orações simples, podem aparecer também na forma de orações
Lehmann (1988), entende que as orações subordinadas podem classificar-se de acordo com a
camada mais alta que as contém. O tratamento da subordinação a partir das camadas de
127
representação também é sustentado por Dik e Hengeveld (1991), Hengeveld (1990a, 1990b),
modelo, mas, como se mostrará a seguir, outras unidades de análise são inseridas.
Nas diferentes línguas, as orações subordinadas podem divergir entre si no que tange
(3-29), a encaixadas com propriedades nominais, como em (3-30). O quéchua e o turco, por
inglês em (3-31), a completiva, por si só, é idêntica à oração matriz, não há nenhum
MACKENZIE, 2008).
Noonan (1985) entende por complementizador uma palavra, partícula, ou afixo com a
57
Exemplo retirado de Noonan (1985, p. 45). De acordo com Noonan, o uso de complementizador com alguns
tipos de complementos é, algumas vezes, opcional ou contextualmente determinado. A construção em (3-31)
também seria possível, segundo o autor, com o complementizador (Perry knows that Hugh is vulnerable).
128
novo significado, como ocorre, por exemplo, com os complementizadores que/se e que/si, do
primeira posição na oração subordinada, que, por sua vez, preserva a mesma ordem com que
exemplifica (3-34), e do holandês, que pode ter os constituintes da oração subordinada (3-
35b) dispostos em uma ordem diferente daquela que ocorre na oração matriz (3-35a):
(3-35)b. dat ik gisteren het boek aan het meisje heb gegeven
(19) CONJ I.NOMT yesterday DEF book to DEF girl have.PRS.1.SG give.PTCP
subordinadas, mais especificamente, de completivas, basta dizer, por enquanto, que a seleção
matrizes, cabe mencionar a terceira propriedade, que diz respeito aos argumentos da
subordinadas. Uma questão importante que se coloca, assim, é de que forma se dá a seleção
entre esses diferentes modelos. Como apresentado na seção anterior, na proposta da GDF, a
gramática está disposta em níveis, que dão conta de motivações pragmáticas e de motivações
GDF, as construções subordinadas podem classificar-se de acordo com as camadas dos Níveis
partida, como mostra o quadro 3-3. Nessa classificação, os autores assumem que o predicado
encaixado pode ser desde um move, no Nível Interpessoal, até uma propriedade, no Nível
significado. De qualquer modo, tudo depende das propriedades de designação, isto é, das
características semânticas do predicado encaixador, e são elas que determinam o que vem
encaixado.58
58
As propriedades compreendidas na designação são basicamente as funções semânticas dos argumentos.
Entretanto, Dik (1997a) postula, com outros linguistas, uma tipologia semântica de predicados que, por direito,
são mecanismos de representação semântica, ou designação.
131
(a) M-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
introduzem moves, como em (3-37).59 Esses complementos podem ser modificados por
modificadores que atuam na camada de moves, como, por exemplo, ‘para resumir’, ‘para
(3-37) Embora seja difícil fazer generalizações sobre um público tão diverso, é fácil concluir [que,
em suma, essas ações levaram a uma perda líquida da cobertura vegetal em relação às
condições pré-colonização, bem como a uma mudança substancial no tipo da atual
vegetação. Ao mesmo tempo, a consciência pública concernente à importância da vegetação
urbana certamente tem aumentado nos últimos dez anos, embora seja uma questão aberta
quanto daquela conscientização traduziu-se em mudança de comportamento em comparação
com as áreas urbanas plantadas em Quito.]60
(b) A-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
introduzem atos discursivos, como em (3-38). Atos discursivos podem ser modificados por
elementos lexicais variados, que incidem sobre suas propriedades estilísticas, como
brevemente, ou sobre seu estatuto dentro do move, como a expressão além disso.
(3-38) Desnecessário dizer que, além disso, aspectos como quantidade e foco no cliente devem
ser sempre lembrados.61
(c) C-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
a totalidade do que o falante evoca em sua comunicação com o ouvinte. Pode ser modificado
por material lexical relacionado à ênfase, como realmente, ou por modificadores que
59
Vale lembrar que move é a unidade máxima do Nível Interpessoal e propriedades, juntamente com entidades,
as unidades do Nível Representacional.
60
Exemplo retirado de Hengeveld e Mackenzie (2008, p.364). Cf o original: While it is difficult to make
generalizations about such a diverse public, it is easy to conclude [that, in sum these actions have led to a net loss
of vegetative cover relative to pre-settlement conditions, as well as a substantial change in the type of vegetation
present. At the same time, public consciousness regarding the importance of urban vegetation has certainly risen
in the last ten years, although how much of that awareness has translated into changed behavior vis a vis urban
plants in Quito is an open question.]
61
Exemplo retirado de Hengeveld e Mackenzie (2008, p.364). Cf o original: It goes without saying that (in
addition) issues such as quality and a customer-oriented approach will be kept in mind.
132
exemplo, (in)felizmente e os reportativos, segundo, de acordo com, que indicam que o falante
(3-39) Marta disse que (realmente) não acredita em vitória no primeiro turno das eleições.
A GDF considera que existe nos moves, atos discursivos e conteúdos comunicativos
em (3-37), por exemplo, encontra-se a informação crucial que o autor quer comunicar aos
Cristofaro (2003), é perfeitamente aplicável: It is easy to conclude that these actions have led
to a net loss, haven't they? It goes without saying that issues such as quality will be kept in
encaixada:
tipos de complementos:
(d) p-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
introduzem uma proposição, como em (3-40). Os modificadores que atuam nessa camada ou
presumivelmente, supostamente).
133
(e) ep-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
por meio de modificadores e operadores que servem a sua localização no tempo, como, por
exemplo, depois.
(3-41) E sucedeu que, pela meia noite, (depois de acordar) o homem estremeceu e se voltou; e
eis que uma mulher jazia a seus pés (Adaptado de BRAGA, 2008, p. 23)
(f) e-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
(g) f-complemento: são orações que funcionam como complemento de predicados que
Segundo Hengeveld e Mackenzie (2008), essa abordagem não somente considera que
Numa perspectiva translinguística, uma generalização que se pode fazer é que, quanto
mais baixo o nível em que uma oração subordinada se baseia, maior é a probabilidade de ela
ser do tipo dessentencializado (‘deranked’ [STASSEN, 1985]), isto é, não exibir marcas
marcador declarativo não pode ser expresso nela e seu estatuto de subordinada é marcado por
que nominalizações, já que tempo e aspecto podem ser expressos nela, algo impossível de ser
expresso em nominalizações.
B
Brreevvee rreeccaappiittuullaaççããoo
Considerada o arcabouço teórico principal para a investigação aqui proposta, este capítulo
62
Um tipo dessentencializado de construção completiva é aquele em que não há manifestação de propriedades
oracionais típicas, como núcleo verbal, força ilocucionária, complementizador e flexão modo-temporal
(LEHMANN, 1988).
135
Com este capítulo, encerra-se a parte destinada à definição dos aspectos diversos do
completiva. Os aspectos teóricos e empíricos serão retomados no Capítulo 6, que trata das
PARTE II:
ANÁLISE DA COMPLEMENTAÇÃO NO
PORTUGUÊS FALADO
137
CAPÍTULO 4
capítulo é feita com base num corpus de língua falada, na seção 4.2, apresentam-se algumas
do fato de que, como demonstrado ao longo deste trabalho, a perspectiva de pesquisa adotada
a perspectiva de como a língua pode ser modelada. Como se sabe, um dos pontos em que a
falante-ouvinte.
138
comunicação faz com que ela leve em conta a evidência que sobressai da linguagem em uso
que os corpora tornam disponível (BUTLER, 2004). Isso parece verdadeiro por princípio. No
entanto, se se considera a escala proposta por Butler (2008), que coloca os formalistas num
extremo e o funcionalismo da Costa Oeste Americana no outro, observa-se que nem toda a
autênticas. Como parte de uma ampla teoria de interação verbal, a GDF ocupa uma posição
linguística, somente porque a evidência que sobressai dos corpora ainda precisa ser
BUTLER, 2004, p. 148), para quem (i) deve-se estar aberto a padrões quantitativamente
observáveis na língua e (ii) a língua reserva uma riqueza de padrões significativos. Parece não
de corpora e ter, de antemão, hipóteses prévias que apontem os caminhos possíveis de serem
funcional como se tudo nele fosse novo e observar, no corpus, como esse domínio funcional
aparece codificado; alternativamente, com base num arcabouço teórico, é possível levantar
algumas categorias analíticas e, a partir do corpus, observar se as hipóteses que estão por trás
63
Cf. Capítulo 1, seção 1.5, p. 49.
139
estão previstas, e o corpus é o lugar em que elas devem manifestar-se, como uma forma de
A análise apresentada neste trabalho parte de um corpus de língua falada. Sobre isso, é
interessante a distinção que Butler (2004) faz entre dois diferentes enfoques para o uso de
dos dados como um todo, e as descrições abrangem as evidências do corpus. Desse modo, o
enfoque baseado em corpus, porque, aqui, a análise de uma amostra tem o intuito de fornecer
perspectiva teórica e, a partir do corpus, observa-se se podem ser validadas as hipóteses que
corpora para a explicação dos fenômenos sob investigação, pode-se pensar que todas as
ocorrências possíveis sobrevêm do corpus, daí ser subjetivo demais testar as possibilidades
com a intuição. Deve haver alguma razão para a sociolinguística laboviana e a teoria
Labov (1972) considera que o que as pessoas pensam sobre a forma da linguagem, isto
como realmente falam. Fornece, então, exemplos decisivos sobre quantificação para criticar o
estrutura da língua. Se, por um lado, Labov critica o apego dos gerativistas às intuições,
alegando que ir aos dados reais dá um grau muito maior de certeza da adequação da relação
entre teoria e dados, por outro, o problema com esse método é o de não encontrar uma
Um problema natural com que se depara quem trabalha com dados reais de fala em
escolha pelo falante, seja como construções únicas, sugerindo imposição ao falante. O
procedimento metodológico mais eficaz, para superar esse tipo de limitação próprio de dados
baseados na intuição. Assim, embora o material de análise seja constituído por ocorrências
levantadas nos inquéritos, conforme será apresentado na próxima seção, a análise qualitativa
dos dados vale-se do conhecimento intuitivo para completar o continuum com as outras
análise dos dados, substituído por construções retiradas da internet, para preservar ao máximo
a máxima funcionalista de lidar com dados reais; fica para a intuição propriamente dita apenas
64
Para os propósitos deste trabalho, quantitativamente, o que a frequência tem a dizer é sobre as preferências do
falante no uso. Constitui, assim, uma ferramenta para a discussão sobre o fenômeno estudado, e, embora possa
não ser algo determinante, não deve ser descartada. As gramáticas fornecem os mecanismos de codificação mais
econômicos para as funções do discurso que os falantes necessitam executar mais frequentemente, ou, mais
sucintamente, as gramáticas codificam melhor o que os falantes fazem mais (DU BOIS, 1985).
141
Dados Iboruna, que registra uma variedade do português brasileiro ainda pouco explorado: o
português falado numa parte da região noroeste do interior paulista, nucleada em torno da
cidade de São José do Rio Preto.65 Além desse traço, devem-se considerar também os
seguintes aspectos:
(i) controla variáveis estratificadas como sexo, escolaridade, faixa etária e nível sócio-
(ii) dispõe de um conjunto de dados mais recentes, com entrevistas realizadas em 2004;
(iii) apresenta cinco tipos diferentes de textos: narrativa de experiência pessoal, narrativa
(iv) o aproveitamento deste corpus alinha este trabalho com um dos objetivos do Grupo de
que serão analisadas de acordo com os critérios estabelecidos no item 4.4. Do IBORUNA,
foram selecionados 43 inquéritos, com dois diferentes tipos de amostra: uma amostra do censo
65
Para maiores detalhes sobre o Banco de Dados Iboruna, consultar Gonçalves e Tenani (2008), que tratam dos
procedimentos metodológicos que nortearam os trabalhos de transcrição das amostras de fala do Projeto ALIP
(Amostra Lingüística do Interior Paulista). Esse projeto, idealizado pelo Grupo de Pesquisa em Gramática
Funcional da UNESP de São José do Rio Preto e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo – FAPESP (Proc. 03/08058-6) de 2004 a 2007, permitiu a constituição de um banco de dados com
amostras do português falado na região noroeste do Estado de São Paulo, delimitada pela cidade de São José do
Rio Preto e mais seis cidades fronteiriças a ela (cf. GONÇALVES; TENANI, 2008).
142
linguístico da região de São José do Rio Preto (AC), com o controle rigoroso de variáveis
07 inquéritos.66
Para a seleção das ocorrências que constituem o material de análise deste trabalho,
considerei (i) construções encaixadas completivas finitas, ou seja, orações completivas cujo
verbo está em uma de suas formas desenvolvidas (a) no indicativo ou (b) no subjuntivo, e é
introduzida por que ou se; (ii) construções encaixadas não-finitas, caso em que a oração
completiva tem como núcleo ou (c) um infinitivo pessoal, ou (d) um infinitivo impessoal, ou
(e) uma nominalização (que consiste numa construção que se aproxima das características de
orações completivas segundo uma hierarquia com cinco distinções, que mostra o grau de
indicativo < subjuntivo < inf. pessoal < inf. impessoal < nominalização
particípio (cf. NOONAN, 1985; KOPTJEVSKAJA-TAMM, 1993; DIK, 1997b), ele não foi
considerado na amostra analisada. O que difere uma construção como eu vi Maria cantar de
66
A amostra do censo linguístico diz respeito aos inquéritos 004, 008, 012, 016, 020, 024, 031, 035, 039, 043,
047, 051, 062, 067, 071, 076, 080, 084, 088, 092, 096, 100, 104, 108, 112, 116, 120, 124, 128, 132, 134, 141,
145, 149, 152; a amostra de interação dialógica corresponde aos inquéritos 001, 002, 004, 005, 006, 007, 008.
143
marcador de aspecto, usado para exprimir uma circunstância, construções com gerúndio não
Cabe explicar que, no que diz respeito às orações completivas finitas selecionadas para
a análise, a amostragem desse tipo de construção abrangeu as orações introduzidas por que e
interrogativa polar indireta e tem forma idêntica à conjunção que introduz oração adverbial
condicional. Além disso, diferentemente dos complementos com que, o valor de verdade dos
iniciados por se, ligada à expressão da modalidade irrealis que neles se encontra, permite
introduzidos por que como o fenômeno a ser estudado, entretanto, salvas as diferenças entre
partícula se como partícula introdutora de complemento, como, por exemplo, verbos como
perguntar, indagar etc. Por essas razões, muito embora o complementizador que seja tratado
em alguns estudos como o exemplar mais característico da categoria, optei por incluir as
trabalho comparativo inclui os predicados que contêm a estrutura transitiva típica constituída
predicado input, isto é, visibilizado pela preposição, como em a preocupação de Maria com a
inflação.
exemplo, visto que esses complementos (orações não-finitas com infinitivo e com
nominalização) não podem ser considerados como um tipo de construção encaixada por
funcionar como uma lexia composta, já que o falante não seleciona o verbo e o complemento
separadamente.
encontradas no corpus.
levantamento quantitativo, com especial relevância para frequências percentuais que indicam
correlação entre fatores de análise sob o prisma das construções encaixadas e a natureza
idealizado pela sociolinguística quantitativa, para a análise de fenômenos variáveis, que foram
mais relevantes.
145
aqui são abertos, ou seja, não conduzem as hipóteses a serem comprovadas ou rejeitadas na
interpretação dos dados. Para a verificação do fenômeno sob estudo, parti de um arcabouço
predicado encaixador. Essas hipóteses podem se confirmar ou não, dependendo dos resultados
obtidos a partir da análise da amostra. Esse é o papel que as hipóteses aqui apresentadas
Hipótese 1
de gradação entre construções nominais com verbo finito e construções nominais com grau
(i) exame das formas de cada oração dependente, aqui restritas aos seguintes tipos: (a) oração
introduzida por complementizador, isto é, forma conjuncional com verbo finito, (b) orações
com redução de finitude, que se identificam nas construções não-finitas que têm um infinitivo
como predicado nuclear e (c) construções não-finitas com uma nominalização como
predicado nuclear, forma que identifica o grau máximo de dessentencialização, nos termos de
Lehmann (1988). Como é natural haver uma inconsistência entre o sistema gramatical
146
relação à natureza semântica da matriz. É necessário verificar, para cada ocorrência ou token,
classificação fornecidos por Dixon (2006), complementado por Dik (1997b), Cristofaro
(2003) e Noonan (1985). Esses tipos de classificação prevêem uma correlação entre uma
(i) e (ii), no tratamento quantitativo eles são vistos como três diferentes grupos de fatores,
definidos abaixo como grupos de fatores 1, 2, para a forma de expressão, e 3 para a natureza
O grupo de fatores 1 é, por assim dizer, definido como variável dependente em relação
aos demais grupos de fatores, já que, por identificar a codificação morfossintática das
Tal como apresentado no início desta seção, para a seleção dos tipos de
nominais: num extremo, construções completamente verbais, isto é, orações que têm as
ou seja, orações mais dependentes, como (4-2b), e não-finitas com um verbo infinitivo
pessoal (4-2c) e impessoal (4-2d) como núcleo; finalmente, no outro extremo, orações não-
finitas com uma nominalização como núcleo (4-2e), isto é, construções que não apresentam
1988).
(44 )b. Pedro pediu que João entregasse os documentos para Renata.
(44)e. Pedro viu a entrega dos documentos para Renata [por Pedro].
a) indicativo
b) subjuntivo
c) infinitivo pessoal
d) infinitivo impessoal
e) nominalização
148
f) indicativo e subjuntivo
tipos de complementação, mesmo eles não aparecendo no corpus. Como salientado neste
capítulo, para completar o continuum dos tipos de construções encaixadas completivas, que
corpus, foram testadas outras possibilidade de ocorrência, (4-3b) e (4-3c), de modo a verificar
além da forma não-finita. A marcação com (*) em (4-3c) indica que, de acordo com minha
própria intuição, o fasal começar não licencia estruturas com verbo finito.
(4-3)a. ... “cadê a mãe desse moleque num sei quê?” – aí veio uma senhora FORte -- ele
contando assim -- e pegou e falou assim – “é sou eu a mãe” – aí ele começou a discutir
nisso veio o pai aí começaram a discutir:: (IBORUNA – AC 051: 165)
(4) b. ... “cadê a mãe desse moleque num sei quê?” – aí veio uma senhora FORte -- ele
contando assim -- e pegou e falou assim – “é sou eu a mãe” – aí ele começou a discutir
nisso veio o pai aí começaram a discussão::
(4)*c. ...“cadê a mãe desse moleque num sei quê?” – aí veio uma senhora FORte -- ele
contando assim -- e pegou e falou assim – “é sou eu a mãe” – aí ele começou a discutir
nisso veio o pai aí começaram que o pai discutiu com a senhora ::
149
complemento sugerido por Dixon (2006), complementado por Dik (1997b), Cristofaro (2003)
e Noonan (1985) (cf. Capítulo 2, seção 2.3.2, p. 84): de enunciação (4-4), de atitude
(4-8) João fez Valdomiro entregar a relação de cargos de confiança do terceiro escalão.
base os tipos de predicado sugeridos por Dixon (2006) e outros autores, e a Hierarquia de
Ligação, tal como proposta por Givón (1980). Na tipologia de complementos, Givón (1980)
estabelece uma relação entre a estrutura semântica do predicado encaixador, que pode ser
vista como um fato indicativo do grau de integração da oração subordinada à oração matriz, e
identidade entre os referentes nas duas orações e o traço [+/- controle] dos sujeitos
envolvidos.
Hipótese 2
governadas pelo princípio funcional de economia, que representa uma pressão para a
não precisa ser especificada a referência temporal, aspectual ou modal de um estado de coisas
que for predeterminada por traços semânticos do predicado da oração matriz, ou de qualquer
segunda oração participantes que forem compartilhados por dois estados de coisas
conectados.
(i) análise das restrições de seleção possíveis dada pela natureza semântica do predicado da
e aspecto verbais.
O grupo de fatores (4), um parâmetro de análise que está, em geral, presente em nos
TAMM, 1993; CRISTOFARO, 2003; MALCHUKOV, 2004), diz respeito à codificação dos
nominalização (4-14c), mas não licencia um complemento sob a forma de uma construção
sujeitos da oração matriz e da oração encaixada, pode-se esperar a ocorrência dos dois tipos
com oração finita (4-15a) somente é possível com participantes não correferenciais.
(22 )c. João quer o relato [de Pedro] dos últimos acontecimentos.
a) relação de simultaneidade
b) relação de anterioridade
c) relação de posterioridade
temporal do evento na oração matriz e a do evento na oração completiva como um dos fatores
mais relevantes para a integração gramatical entre duas orações. Para o autor, quanto mais
dependência temporal entre esses eventos e maior também será o grau de integração
construção completiva. Givón (1990, p. 520) resume essa sua consideração na seguinte
Hipótese 3
dependente, está vinculada aos níveis e às camada de organização estrutural definidos pela
67
Cf. o original: The more co-temporal two events are, the higher is the probability that they are not independent
of each other.
154
As relações completivas são identificadas com base no predicado que codifica o estado
complementação dizem respeito aos diferentes níveis de estrutura da oração, por isso torna-se
parece refletir o grau de integração gramatical (maior ou menor) que essa oração mantém com
propriedade (4-20):
Esse grupo de fatores trata da natureza do complemento como tipo de entidade, isso
designa.
155
com a camada mais alta que as contém. Diferentes predicados encaixadores requerem diferentes
tipos de complemento: o verbo dizer, por exemplo, requer um argumento que designe um evento
por sua vez, toma um conteúdo proposicional como argumento. Os complementos podem, então,
Hipótese 4
mesmas condições tipológicas que definem posições diferentes numa escala implicacional, em
de grau mínimo.
resultados parciais relativos à análise de todos os grupos de fatores previstos para a avaliação
quantitativa das evidências empíricas constituem evidência para a resolução dessa hipótese.
156
CAPÍTULO 5
A especificação dos resultados torna-se ainda mais detalhada na seção 5.3, que trata
Essa seção é dividida em subseções, cada qual abordando um tipo específico de predicado
A seção 5.4 apresenta os resultados referentes a outros fatores que, assim como o tipo
também mostra que, no corpus analisado, determinadas formas completivas podem ser
indicativo < subjuntivo < inf. pessoal < inf. impessoal < nominalização
Tendo em vista essa classificação para os tipos de completivas, cabe salientar que, no
de A-complementos para atos discursivos, como em (5-3), fato que justifica, portanto, a
(5-2) Embora seja difícil fazer generalizações sobre um público tão diverso, é fácil concluir [que,
em suma, essas ações levaram a uma perda líquida da cobertura vegetal em relação às
condições pré-colonização, bem como a uma mudança substancial no tipo da atual
vegetação. Ao mesmo tempo, a consciência pública concernente à importância da
vegetação urbana certamente tem aumentado nos últimos dez anos, embora seja uma
questão aberta quanto daquela conscientização traduziu-se em mudança de comportamento
158
(5-3) Acrescentou, ainda, que a cópia do depósito recursal não está devidamente autenticada
(Adaptado de Braga, 2008, p. 12)
Isso significa que, hierarquicamente, na análise aqui proposta, a camada mais alta de
Como apresentado nos Capítulos 2 e 4, na análise aqui proposta, tomam-se por base os
tipos de predicados propostos por Dixon (2006), complementados por Dik (1997b), Cristofaro
(2003) e Noonan (1985). O Quadro 5-1 apresenta a classificação geral utilizada neste
68
Exemplo retirado de Hengeveld e Mackenzie (2008, p.364). Cf o original: While it is difficult to make
generalizations about such a diverse public, it is easy to conclude [that, in sum these actions have led to a net loss
of vegetative cover relative to pre-settlement conditions, as well as a substantial change in the type of vegetation
present. At the same time, public consciousness regarding the importance of urban vegetation has certainly risen
in the last ten years, although how much of that awareness has translated into changed behavior vis a vis urban
plants in Quito is an open question.]
69
Com exceção das unidades representativas do Nível Interpessoal, todas as outras estruturas são consideradas
unidades semânticas, como já apresentado no Capítulo 3, e é em termos dessas unidades que as orações
completivas são tratadas na GDF (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).
159
com base nos critérios apresentados no capítulo anterior e aqui ligeiramente sumarizados.
os resultados gerais que dizem respeito (i) à distribuição dos tipos de orações completivas de
acordo com o tipo semântico de predicado encaixador, apresentada na Tabela 5-1, e (ii) aos
Predicado encaixador IND SUBJ INF PES INF IMPES NOM Total
N % N % N % N % N % N %
de Enunciação 36 100 36 11
de Conhecimento 24 76 4 12 4 12 32 9
de Volição 4 5 32 38 44 52 4 5 84 24
de Manipulação 1 3 2 6 22 69 7 22 32 9
de Percepção física 2 20 8 80 10 3
Fasal 92 95 5 5 97 28
de Tentativa 14 100 14 4
70
A tabela 5-1 introduz a análise em função de sua relevância metodológica: é o ponto de referência básico para
o estabelecimento das correlações que serão feitas a seguir.
160
indicativo < subjuntivo < inf. pessoal < inf. impessoal < nominalização
Com base nessa escala, pode-se colocar no extremo mais verbal predicados cujo
majoritariamente, verbais.
média da escala.
161
seguintes.
5-1:
Completiva 70
mais nominal 57
60
50 43
40
30 24
20
20
9
10
0
Tentativa
Conhecimento
Psicológica
Fasal
Enunciação
Manipulação
Perc. Física
Proposicional
Volição
Exp.
At.
à verbalidade.
Aprofundando um pouco mais essa observação, predicados que requerem (ou que,
além de complementos nominais, aceitam) complementos mais verbais também podem ser
100%
90%
80%
70%
67
60%
89
50% 100 100 100 100
40%
30%
20%
33
10%
11
0%
Conhecimento
At. Proposicional
Perc. Física
Volição
Enunciação
Manipulação
Subjuntivo
Indicativo
(5-5)a. Doc.: assim… cê me disse que cê estuda na COOPEN né? ce poderia me descrever como
é a tua esco::la?... (IBORUNA – AC 012: 120)
(1) b. o senhor acha que essa preocupação do pai com o aluno essa observação no aluno é::
ajuda no desenvolvimento do aluno na esco::la é importa::nte?…(IBORUNA – AC
145:291)
c. e:: eu vou contar agora do:: ah minha amiga que ficou com o meu colega e ela me ela num
queria me conta::r que ela sabe que eu ia brigar com ela porque eu num gosto muito dele
que é muito galinha... (IBORUNA – AC 016: 139)
163
(5-5)d. ... assim na hora que ele puxou- e ele correu ... um BAITA de um negão cumprido assim ...
é novo mas aqueles mulecão alto ... ai mas eu corri grita:ndo e xinga:ndo ... e xinguei tudo
quanto é nome MESMO ... e fui atrás mas corri ... corri atrás dele “filha da puta ... vem cá::
((risos)) eu/ me dá minha chave::... não tem dinheiro aí .. não tem nada::: me dá minha
chave” ... e fui correndo ... corri ... corri ... ele pegou e:: ... sabe ... FOI CORRENDO
abrindo a bolsinha .... ele viu que não tinha nada ...- tinha um real dos reais -...ele pegou e
viu que eu tava corre::ndo ... eu não ia desistir eu ia correr atrás dele até o/ até quando eu
conseguir ... aí ele pegou e:: jogou a bolsinha n/no chão ... com a chave tudo ...
(IBORUNA – AC 062:99)
e. Inf.: ah! que meu pai contou é meu pai contava que:: quando ele namorava minha mãe
minha mãe era era muito bonita né e tinha bastante moço que gostava dela não queria que
ele namorasse (IBORUNA – AC 136: 084)
f. eu pedi que ele fosse me visitar pra que a gente falasse da bíblia... (IBORUNA – AC 124:
011)
Em relação aos predicados que requerem (ou que, além de complementos verbais,
Nominalização
100%
8 5 Inf. Impessoal
90% 24
80% Inf. Pessoal
50
70%
60%
50% 100 92 95 100 100
40% 76
30%
20%
50
10%
0%
Conhecimento
Fasal
Perc. Física
Psicológica
Tentativa
Manipulação
Volição
Exp.
pessoal e como mais nominais os complementos não-finitos com infinitivo impessoal e com
manipulação são mais verbais em relação aos outros por selecionarem exclusiva ou
(5-6)a. eu tava em ca::sa meu pai ligou éh:: meio nervoso assim que tinha acontecido alguma coisa e
eu atendi o telefone... aÍ ele mandou eu chamar a minha tia mas eu perguntei o que
aconteceu e ele não queria me falar... (IBORUNA – AC 008:051)
(1) b. ... e diz que ele tava assim perto da porta... ele viu passar um:: um::/ ele não sabe
identificar mas diz que é uma sombra... (IBORUNA – AC 035: 230)
(5-8) a. Inf.: ... acontece que eu num tô ven(d)o um fim pra minha... (dissertação de mestrado) eu
não sei onde eu quero chegá(r)... sabe? eu num tenho... ai eu quero estudá(r) tal coisa eu
quero prová(r) tal resultado [(inint.)] (IBORUNA – AI 011: 107)
(1) b. depois apareceu a Chagas no intesti::no... né... aí então cê vê... foi aquele tratamen::to...
mé::dico... mé::dico... parou de trabalhar:: porque o médico proibiu... (IBORUNA – AC
132: 020)
c. então eu acho que a:: sobre a puniÇÃO éh:: a gente não gosta de punir ninGUÉM
entendeu? (IBORUNA – AC 141: 164)
d. Inf.: das outras vezes ele:: ele tentou matar acho que um:: um moço... ele foi preso
165
5-3 é o reflexo da frequência das ocorrências detectadas no corpus. Cabe salientar, entretanto,
9f), respectivamente.
(5-9)a. aí eu e/ eu esqueço das outras coisas eu esqueço de bagagem eu esqueço de/ de check in de
conferência de bilhete esqueço de desembarque esqueço de embarque esqueço de tudo
(IBORUNA – AC 051: 366)
(1) b. e eu já tava meio envolvido com E:la e ele pressioNOU pressioNOU basTANte... a mãe
NÃO queRIA namoro só que o pai dela falou que era pá ficar aqui na porta de CAsa...
(IBORUNA – AC 047: 114)
c. ... aí hum tava/ trabalhava eu e mais três pessoas uma dessas pessoas dessas/ o Laércio foi::
pediu demissão porque ele ia embora pro Japão fazer um curso de línguas (IBORUNA –
AC 051: 126)
d. ::... e ele tava no ônibus e quando ele sentou... ele sentou numa coisa da/ na cadê::ira... e
sentou e até cont/ e continuou a via::gem... vindo de São José do Rio Preto pra Bady
Bassit... (IBORUNA – AC 035: 160)
f. A editora Rocco voltou a perder no Tribunal de Justiça do Paraná na ação que tentava a
liberação do livro "Canto dos Malditos", do escritor Austregésilo Carrano, 45, proibido
preventivamente pelo mesmo tribunal em maio passado.
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u27313.shtml)
Uma dedução a que se pode chegar é a de que, para um predicado licenciar uma
nominalização como complemento, ele deve, necessariamente, também licenciar uma forma
mais verbal. Não há, assim, predicados encaixadores que requeiram somente nominalização.
nominalizações.
166
A tendência apresentada na Tabela 5-1 e nos Gráficos 5-1, 5-2 e 5-3, sustentada pelas
das que foram propostas por Cristofaro (2003) e por Givón (1980), sobretudo no que diz
Givón, essa hipótese também parece prevalecer. A diferença entre o que postulam Cristofaro e
Givón e os resultados aqui obtidos está no fato de, nas ocorrências analisadas do português,
Outra dedução que se pode extrair dos resultados apresentados na Tabela 5-1 é a de
que 52% (179/346) dos complementos selecionados são complementos não-finitos com
infinitivo impessoal como núcleo. Entretanto, as próximas seções mostrarão que essa
predominância tem relação com os tipos de predicados encaixadores que fazem parte da
amostra, bem como com o compartilhamento de participantes e referência TAM. Esse aspecto
não tem muita relevância quantitativa, mas é extremamente pertinente sua distribuição
qualitativa. Além disso, é necessário considerar que o fato de o tipo de completiva assumir
A Tabela 5-1 mostra ainda que a alternância entre construções finitas e não-finitas está
complemento, não há alternância entre tipos mais verbais e mais nominais e os complementos
Essa constatação parece coadunar-se com o fato de que quanto mais baixa a camada
que subjaz a uma oração particular tanto maiores as probabilidades de essa oração particular
mais nominal, não-finito. No modelo da Teoria de Gramática Funcional (DIK, 1997a, 1997b;
HENGEVELD, 1989, 1990), a oração pode ser descrita como uma estrutura disposta em
camadas e cada camada está contida na imediatamente superior. Segundo Cristofaro (2003),
O que vale destacar, segundo o autor, é que a seleção do tipo de oração complemento depende
da natureza das camadas interpessoal e representacional. Uma generalização que se pode fazer
é a de que, quanto mais baixo o nível em que se baseia uma oração subordinada, tanto maior é
A Tabela 5-2 toma por base a camada de representação definida pela GDF:
168
Camada de representação IND SUBJ INF PES INF IMPES NOM Total
N % N % N % N % N % N %
Conteúdo proposicional 40 84 4 8 4 8 48 14
[40/48]).
aponta para uma tendência geral de ser esse complemento uma oração finita no indicativo.
Não há uma relação hierárquica entre os níveis de representação; portanto, não se pode
que pode ser representada nos seguintes termos: complementos mais verbais estão associados
caso, estados de coisas. Essa relação mostra haver uma correspondência muito relevante entre
Conteúdo comunicado
Conteúdo proposicional
nominais.
Conteúdo comunicado
predicados de enunciação
Estados de coisas
predicados de volição, manipulação, de
> percepção física, fasal, de experiência
psicológica e de tentativa
Conteúdo proposicional
(5-13)a. ...e aí:: aí a polícia chegou lá falou que NEM sabia dirigir o carro num ti::nha aí ela ficou
com:: aquela coisa de mila::gre sabe? (IBORUNA – AC 012: 106)
(1) b. aí ela:: dona Iracel perguntou se eu queria descer... (IBORUNA – AC 051: 109)
significado, de tipo de entidade representada por seu complemento, mas em termos da função
complementos, porque, como a verdade do que está sendo dito ou perguntado depende dos
discurso e não à sentença em si. Justamente por isso, a camada relevante de análise para esse
comunicado, esses complementos podem ser modificados por material lexical relacionado à
ênfase, como realmente, ou por modificadores que expressam a atitude do falante em relação
(5-14)a. ...e aí:: aí a polícia chegou lá falou que (segundo testemunhas) (ela) NEM sabia dirigir o
carro num ti::nha aí ela ficou com:: aquela coisa de mila::gre sabe? (IBORUNA – AC 012:
106)
(5-15)a. ...e aí:: aí a polícia chegou lá achou que (provavelmente) (ela) NEM sabia dirigir o carro
num ti::nha aí ela ficou com:: aquela coisa de mila::gre sabe?
( 3)a’. ...e aí:: aí a polícia chegou lá achou que (*segundo testemunhas) (ela) NEM sabia dirigir o
carro num ti::nha aí ela ficou com:: aquela coisa de mila::gre sabe?
(1)b’. aí ela:: dona Iracel supôs que (*de acordo com José) eu queria descer...
que o falante está relatando o ponto de vista de outro e, por isso, causam estranheza se
aplicados em nível e camada diferentes, como ocorre em (5-15a’) e (5-15b’). Como a relação
entre os predicados falar e perguntar, por um lado, e achar e supor, por outro, e seus
No entanto, não é vedada a ocorrência de complementos mais nominais com esse tipo de
(5-16) Imagine V. Exª, Senador e Governador Roberto Requião, o que está prestes a acontecer,
que bazar persa será instalado no Congresso Nacional! E não digo que essa disposição
de barganhar exista no Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, porque, como será
a primeira vez que exercerá um cargo executivo, não se pode acusá-lo de já ter feito isso
antes.
(Fonte: http://www.senado.gov.br/sf/atividade/pronunciamento/detTexto.asp?t=327621)
O fato de, no corpus analisado, dizer não aparecer com outro tipo de complemento que
não a forma finita no indicativo não significa a impossibilidade de ocorrência mais nominal,
como em (5-17a-c):
(5-17)a. Marta diz não acreditar em vitória no primeiro turno das eleições
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u422289.shtml)
(5-11)b. Lula diz lamentar desaparecimento de avião e torce para que pior não tenha ocorrido
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u574890.shtml)
(5-11)c. Lula diz querer eleger alguém para fazer mais do que fez
(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,lula-diz-querer-eleger-alguem-para-fazer-mais-
do-que-fez,386491,0.htm)
com um infinitivo impessoal como núcleo. Embora isso não invalide os dados apresentados
na tabela, que mostram uma preferência desse predicado por formas mais finitas, não basta
que, muitas vezes, a realização do complemento como oração finita ou não-finita tem a ver
com outro traço semântico da sentença como um todo, no caso, a correferencialidade dos
participantes.
(5-18) meus colegas disseram que eu dei traba::lho que eu comece::i é:: a mexer com o po::vo...
(IBORUNA – AC 055: 019)
colegas) e da oração completiva (eu) impede que o complemento de dizer seja codificado
(*5-19) meus colegas disseram que eu dar traba::lho que eu comece::i é:: a mexer com o po::vo...
de dizer como uma oração finita com indicativo, como em (5-20a), ou como uma oração não-
finita com infinitivo (somente esse tipo de complemento mais nominal é permitido), como em
(5-20b):
(5-20)a. Inf.1.: –“M.... cê não confia”– ela falô(u) –“não... eu:: o(u) ela vai com o menino ou ela vai
comigo”– ela NÃO DE(i)xa ele levá(r) a menina... porque ela diz que num conFIa... UAI é
duro uma mãe num confiá(r) num pai c’uma filha é:: é:: é dificil né? (IBORUNA – AI
002:082)
(5-20)b. Inf.1.: –“M.... cê não confia”– ela falô(u) –“não... eu:: o(u) ela vai com o menino ou ela vai
comigo”– ela NÃO DE(i)xa ele levá(r) a menina... porque ela diz não confiar... UAI é duro
uma mãe num confiá(r) num pai c’uma filha é:: é:: é dificil né?
com complementos finitos. Isso seria perfeitamente justificável se, nessas ocorrências, os
participantes não fossem correferenciais. Ocorre que, em 73% (8/11) dos casos, os sujeitos
são correferenciais, o que licenciaria o uso de uma oração não-finita com infinitivo impessoal
como núcleo. Como, porém, essa alternativa não se manifesta, é plenamente justificável dizer,
ele não licencia outra forma alternativa. Tal como com dizer, é relevante a marcação temporal
ocorrência de contar com complementos finitos cujos participantes são correferenciais e não-
(5-21)a. Inf.: a::i... meu amigo me contou que ele foi:: pra Dis::ney pra:: pousada do Rio
Quen::te... lugares assim que eu queria ter ido sa::be?... (IBORUNA – AC 012: 073)
(13) b. Inf.: contaram... que ele tentou assaltar acho que uma:: uma:: acho que uma:: uma
loja lá... em Mirassol... uma loja de roupa... então no dia ele tentou assaltar só que aí
tinha poli/ Mirassol é pequena... tem polícia né... (IBORUNA – AC 039: 086)
Por outro lado, o corpus não inclui nenhum caso de C-complemento mais nominal,
que, ainda assim, é possível nos casos em que, tal como com o predicado encaixador dizer,
(5-22) Em entrevista ao O Dia, o cientista político Alberto Carlos Almeida contou acreditar que
Gabeira teria tido mais chances se sua campanha tivesse focalizado o eleitor
desmotivado, que não estava inclinado a votar.
(Fonte: http://noticias.terra.com.br/eleicoes/2008/interna/0,,OI3285838-EI11874,00
Riotem+maior+indice+de+abstencao+desde.html)
Embora esse tipo de predicado também licencie uma codificação não-finita com
Outro predicado que também traz como complemento, exclusivamente, orações finitas
encaixador falar, a codificação dos participantes não interfere na forma que a completiva
(5-23)a. ... e foi muito engraçado ela falou que chegou na escola bem mansinho chegou com
quase quarenta minutos de atraso até levou uma bronca né no dia mas que depois ela teve
que se justificar para diretora e quando ela começou a contar a história pra diretora a
diretora começou a rir... (IBORUNA – AC 088: 217)
( 7)*b. ... e foi muito engraçado ela falou chegar na escola bem mansinho chegou com quase
quarenta minutos de atraso até levou uma bronca né no dia mas que depois ela teve que se
justificar para diretora e quando ela começou a contar a história pra diretora a diretora
começou a rir...
(5-24)a. Doc.: cê falou que eles se separaram... cê lembra de alguma coisa assim da separação?
(IBORUNA – AC 039: 051)
(7 )*b. Doc.: cê falou eles se separarem... cê lembra de alguma coisa assim da separação?
ou negativa.71
(5-25) aí ela:: dona Iracel perguntou se eu queria descer... (IBORUNA – AC 051: 109)
podem ser assim sintetizados (com base no corpus e nas possibilidades de ocorrência):
71
Sousa (2007) considera que a oração completiva introduzida pela conjunção se não representa eventos e,
assim, nunca equivalerá a um estado de coisas, porque a expressão de um evento implica que uma realidade se
instaure, mesmo que apenas na mente dos interlocutores, e a conjunção se não é capaz de instaurar realidades.
177
(b) subtipos dessa classe de predicados (dizer e contar) podem, no entanto, selecionar a forma
não-finita com infinitivo impessoal; nesse caso, o que determina a possibilidade ou não de
casos, a preferência por formas finitas pode estar relacionada à referência TAM.
para determinar o tipo de completiva (como, por exemplo, falar e perguntar); há,
Com base nessa constatação, é possível propor uma escala de tipos morfossintáticos de
(5-26)
infinitivo impessoal
NOONAN, 1985; DIK, 1997b; CRISTOFARO, 2003). Por sua natureza semântica, requerem
A Tabela 5-1, na seção anterior, mostra que esse tipo de predicado, tal como os
(5-27)a. ... acredito que eles conservam muito ma::is as/assim as tradições dos antigos italianos
do que os próprios italianos modernos hoje (acho) que eles conservam muito mais...
(IBORUNA – AC 084: 205)
b. Inf.: eu não sei sabe eu acho que o::... o espiritismo ele me preencheu... (IBORUNA – AC
100: 386)
exemplificam (5-28a-b), que poderiam ter o complemento na forma finita como mostram (5-
29a-b):
b. Aprendam que com time gaúcho não se brinca e que o povo gaúcho honra com seus
compromissos, ao contrário desta imprensa júnior paulista que acha saber discutir
futebol.
(Fonte: http://blog.miltonneves.ig.com.br/2008/09/21/verdao-quase-lider/)
b. Aprendam que com time gaúcho não se brinca e que o povo gaúcho honra com seus
compromissos, ao contrário desta imprensa júnior paulista que acha que sabe discutir
futebol.
houver correferencialidade entre os participantes dos dois estados de coisas envolvidos, como
modo, também pode vir complementado por uma oração finita no subjuntivo, como mostra
(5-30), em que o fato de o predicado encaixador aparecer negado implica maior grau de não
factualidade do complemento:
participantes.
(5-31) Bom, acho que é possível. Eu não acho que faça uma música diretamente por
política. Eu tive uma participação política em 64, depois não tive mais.
(Fonte: http://www.chicobuarque.com.br/texto/entrevistas/entre_vogue_79.htm)
construções desse tipo figurarem como complemento de um predicado como achar, como em
(5-29b) acima.
180
pode admitir, além do indicativo (5-32d), complementos com subjuntivo (5-32e) e com
(5-32)d. as ve::zes os/ por os alunos tarem pagan::do eles pensam que eles não precisam
estuda::r ou que eles não precisam se esforçar porque... (IBORUNA – AC 055: 212)
e. Suzane explicou para a amiga que sua vida mudou depois que deixou de estudar no
Colégio Porto Seguro. Contou que descobriu um mundo que jamais pensou que existisse,
disse a colega.
(Fonte: http://www.estadao.com.br/arquivo/cidades/2002/not20021110p20984.htm)
f. O Officer Crabtree é, sem dúvida umas das personagens mais apreciadas pelos entusiastas
do Allô Allô. A personagem interpretada pelo actor Arthur Bostrom retrata um agente
inglês que pensa saber falar francês, e que acaba por fazer uns trocadilhos com a língua
inglesa que são de ir às lágrimas.
(Fonte: http://outrasescritas.blogspot.com/2009/11/allo-allo-uma-retrospectiva-iv-arthur.html)
com infinitivo impessoal. Nominalizações não são licenciadas para esse tipo de predicado.
seção, podem ser assim sintetizados (com base no corpus e nas possibilidades de ocorrência):
(b) o predicado encaixador pode também licenciar a forma no subjuntivo e não-finita com
complementos. Nesses casos, a preferência por formas finitas pode estar relacionada à
referência TAM.
181
Com base nessa constatação, é possível propor uma escala de tipos morfossintáticos de
(5-33)
complementos requeridos por esse tipo de predicado designam uma entidade de terceira
entidades representadas pela completiva não podem ser localizadas nem no espaço nem no
76%
IND
INF IMPES
NOM
12%
12%
complementos introduzidos por saber, ver, perceber e lembrar são complementos finitos,
(5-34)a. e quantas vezes pegamos ele com faca na mão tudo né... a gente num sabia se ele queria
matar ele ou matar a gente... então a gente tinha medo né (IBORUNA – AC 132: 075)
b. é menino que qualquer coisinha quer dinheiro... num estuda num leva nada a sério vê que
uma coisa errada dá dinheiro rápido vender droga... vender tráfico mexer com droga sei
lá... (IBORUNA – AC 024:395)
( 13)c. só que só que ela se mandô(u) emBOra... ela quando ela percebeu que eu percebi ela el/ela
ligô(u) p’uns pessoal aqui da maloca dela e foi emBOra foi dormí(r) pra lá... (IBORUNA –
AI 002:282)
d. ...tinha uma boa:: uma área bastante diversificada e eu lembro que eu gostava muito de
andar ali... (IBORUNA – AC 084: 140)
como predicados de conhecimento. A autora chama atenção para o fato de, em algumas
conteúdo proposicional.73
complemento finito como argumento. Contudo, esses predicados podem permitir tanto uma
completiva finita no indicativo quanto uma nominalização, isto é, a seleção vai, diretamente,
infinitivo. Observem-se os exemplos dos predicados ver (5-36a-b) e perceber (5-36c-d) com
(5-36)a. O Brasil inteiro viu a falência do sistema judiciário, prisional e policial ao mesmo
tempo.
(Fonte: http://taruimmastabao.zip.net/)
(5-42)b. O Brasil inteiro viu que o sistema judiciário, prisional e policial faliu ao mesmo tempo.
É possível afirmar, desse modo, que os predicados de conhecimento ver e perceber, tal
como o predicado saber, vão, diretamente, do polo mais verbal, representado pelo p-
72
Essas observações poderão ser mais bem analisadas quando somadas às considerações sobre os predicados
encaixadores de percepção física, na seção 5.3.6, p. 196.
73
Dik e Hengeveld (1991) fazem distinção entre predicados de conhecimento, de percepção mental e de
percepção direta (física) em sua classificação, como pode ser observado no Capítulo 2, seção 2.3.2 (p. 76). A
classificação que apresento aqui está de acordo com a que Noonan (1985) e Cristofaro (2003) apresentam,
considerando os predicados que denotam percepção mental como um tipo de predicado de conhecimento, na
medida em que, ao se ver/ouvir/perceber/notar um conteúdo proposicional, esse conteúdo passa a fazer parte do
conhecimento do experienciador (cf. CRISTOFARO, 2003).
184
(5-37b):
(5-37)a. ...tinha uma boa:: uma área bastante diversificada e eu lembro que eu gostava muito de
andar ali... (IBORUNA – AC 084: 140)
(5-37)b. FHC não se lembrou de comentar a queda na desigualdade social do país graças ao
governo Lula, não se lembrou de falar do PROUNI, não se lembrou de falar que no
governo Lula as classes D e E passaram a ser classe média.
(Fonte: http://dilma13.blogspot.com/2009/11/fhc-o-invejo-surtou.html)
(5-37)c. Lula lembrou de uma viagem que fez à região, em 1993, quando era apenas presidente
nacional do PT, e encontrou-se com Peres e também com o então líder palestino Yasser
Arafat.
(Fonte: https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2009/11/12/lula-
defende-visita-de-ahmadinejad)
formas mais verbais, como mostra (5-38a), quanto formas mais nominais. No corpus
(5-38)a. E eu não esqueço a minha origem, e não esqueço que, quando eu deixar de ser presidente,
eu voltarei para o meu berço natal, lá dos metalúrgicos do ABC, para continuar vivendo
a minha vida.
(Fonte: http://cafe.ebc.com.br/programas/160.2009-10-06.4140476367)
oração matriz e da completiva. O falante pode optar por uma construção finita, se pretender
marcar a assimetria temporal entre os dois eventos. Isso significa que a condição necessária
completiva.
podem ser assim sintetizados (com base no corpus e nas possibilidades de ocorrência):
(b) subtipos dessa classe de predicados (ver, perceber, esquecer e lembrar) podem, no
entanto, selecionar a forma não-finita com nominalização (é o caso de ver, perceber, esquecer
e lembrar) ou com infinitivo impessoal (somente esquecer e lembrar); nesse caso, o que
(c) o predicado saber é o único que admite somente p-complementos finitos no indicativo.
Com base nessa dedução, é possível propor uma escala de tipos de predicados
(5-39)
nominalização
sempre num tempo posterior, identificado como futuro, por isso, identifica-se como não-
factual.
à possibilidade, relacionadas ao desejo do falante. Bastos et al. (2007) consideram que esse
designado pelo predicado encaixado (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008), além de atuar
como um operador modal. A comparação de querer com um operador modal típico como
poder, no entanto, permite afirmar que querer pertence a uma classe lexical de palavras, por
atuar como predicado, enquanto poder pertence a uma classe gramatical de palavras, por atuar
como auxiliar modal (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 401), como mostra o
considere-se o Gráfico 5-5, que retoma os resultados apresentados na Tabela 5-1 sobre
predicados de volição:
IND
38% SUBJ
INF IMPES
NOM
5% 52%
5%
nominais, isto é, oração não-finita seja com infinitivo, seja com nominalização. Esse índice
aumenta ainda mais se, no âmbito da codificação, o subjuntivo for considerado complemento
ocorrências desse tipo de predicado com uma oração finita no subjuntivo, com uma oração
não-finita com infinitivo e com uma oração não-finita com uma nominalização como núcleo:
(5-42)a. Inf.: ah sempre tinha né? Que:: ela tinha que chegar cedo em casa... e:: num podia né? A
mãe dela já num queria que ela chegasse cedo em casa e no começo eu achava até bom
né? (IBORUNA – AC 067: 020)
(5-68)b. Inf.: ... acontece que eu num tô ven(d)o um fim pra minha... (dissertação de mestrado) eu
não sei onde eu quero chegá(r)... sabe? eu num tenho... ai eu quero estudá(r) tal coisa eu
quero prová(r) tal resultado [(inint.)] (IBORUNA – AI 011: 107)
(5-69)c. ... e o meu avô éh:: fez com o bolo... paGOU prá confeiteira não deixar o bolo pronto na
data... porque ele não queria o casamento... [da filha] (IBORUNA – AC 076: 110)
finita com infinitivo, como em (5-42b), enquanto a falta de compartilhamento conduz esse
um tanto óbvio que, se o objeto de desejo estiver na dependência de algum participante que
não o próprio indivíduo que manifesta o desejo, representado elo sujeito da matriz, a
possibilidade de realização do estado de coisas desejado é mais remoto, por isso o uso do
(5-43) mas eles num querem saber... querem que a gente borda... então cê acaba pegando não...
assim... prá prá... éh:: não ser honesta com a pessoa... (IBORUNA – AC 120: 026)
complementos não-finitos com infinitivo (há somente ocorrências assim no corpus), como em
(5-44a), com subjuntivo, como ilustra (5-44b), e com nominalização, como em (5-44c).
(5-69)b. Lula pretende que o Brasil desenvolva um projeto conjunto com a Argentina na área
nuclear.
(Fonte: http://ofca.com.br/artigos/2008/02/29/290208-crise-de-energia-do-presente-e-resolvida-
com-projetos-futuros-estranho-nao/)
(b) o predicado encaixador não é o único fator que determina a forma da completiva; a
seja como finito no subjuntivo para participantes não-correferenciais, seja como não-finito
45):
190
(5-45)
infinitivo impessoal
> nominalização > indicativo
subjuntivo
oracional (cf. GONÇALVES et al., 2008). Givón (1993) alega que, quanto maior o contato
temporal dos dois eventos, portanto, tanto maior a possibilidade de serem construídos como
um evento único.
como um único evento complexo implica alegar que é maior a probabilidade de o estado de
mostra o Gráfico 5-6, que representa visualmente os resultados apresentados na Tabela 5-1:
191
3% 6% IND
22%
SUBJ
INF PES
NOM
69%
complementos mais nominais (91% [29/32], interpretado aqui como mais nominais formas
formas nominais, é a oração não-finita com infinitivo pessoal como núcleo que é a preferida,
(5-46) Inf.: não a mãe dela entrou na briga fez um acordo... falou assim – “não tá bom ela num te
pediu então dessa vez você num empresta ou então você deixa ela pegar e pega um dela”
– aí parece que ela deixou depois a irmã usar e pegou uma (da minha amiga)...
(IBORUNA – AC 024: 153)
complemento ocorrer com uma forma mais verbal que o infinitivo. Nesse caso, como ilustra
(5-47), a forma mais verbal escolhida é o subjuntivo, que é também favorecida pela
(5-47) eu pedi que ele fosse me visitar pra que a gente falasse da bíblia... (IBORUNA – AC 124:
011)
192
Entretanto, a forma preferencial parece ser mesmo a de infinitivo, que permite sustentar que
os dois eventos nas orações matriz e completiva constituem, de fato, um único evento
complexo.
indicativo, que licencia tanto o complemento no subjuntivo quanto a forma mais nominal com
o infinitivo:
(5-48)a. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite que cê... tira pra xerocá(r) ele
(IBORUNA – AI 009:287)
(106)b. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite que cê... tire pra xerocá(r) ele
(106)c. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite tirar pra xerocá(r) ele
nominais, ou como orações não-finitas com infinitivo pessoal, que é o caso de mandar, em (5-
respectivamente.
(5-49) eu tava em ca::sa meu pai ligou éh:: meio nervoso assim que tinha acontecido alguma
coisa e eu atendi o telefone... aÍ ele mandou eu chamar a minha tia mas eu perguntei o
que aconteceu e ele não queira me falar... (IBORUNA – AC 008: 051)
(5-50)a. à noite... chegou três ladrão encapuçado lá... e:: amarraram eles pediram pra eles não
abrir a boca que senão ia ficar pior pra eles e eles ficaram muito quieto... (IBORUNA –
AC 067:086)
í:: ela pegou e contratou mais dois estagiários um mês depois quando ela contratou mais
(5-56)b.
dois estagiários aí no aEroporto uma menina pediu demissão... (IBORUNA – AC 051: 129)
193
ocorrência alternativa com orações finitas no subjuntivo, isto é, com complementos mais
(5-51)a. Inf.1.: falô(u) que ele ficô(u) morren(d)o de vontade de sentá(r) a mão na cara daquele
paraguaio nojento né?... só que ele num fez nada só::... mandô(u) o cara... tacá(r) cinza
na mão da mãe dele (IBORUNA – AI 008:110)
(21 )’a. Inf.1.: falô(u) que ele ficô(u) morren(d)o de vontade de sentá(r) a mão na cara daquele
paraguaio nojento né?... só que ele num fez nada só::... mandô(u) que o cara... tacasse
cinza na mão da mãe dele
b. eu tava em ca::sa meu pai ligou éh:: meio nervoso assim que tinha acontecido alguma
coisa e eu atendi o telefone... aÍ ele mandou eu chamar a minha tia mas eu perguntei o
que aconteceu e ele não queira me falar... (IBORUNA – AC 008: 051)
(21 )’b. eu tava em ca::sa meu pai ligou éh:: meio nervoso assim que tinha acontecido alguma
coisa e eu atendi o telefone... aÍ ele mandou que eu chamasse a minha tia mas eu
perguntei o que aconteceu e ele não queira me falar...
TAM, codificada pelo predicado matriz. Nesses casos, pode-se dizer que a incidência de
que essas construções conseguem chegar é a partir do uso do subjuntivo (5-52) e (5-53b), que,
(5-52) eu pedi que ele fosse me visitar pra que a gente falasse da bíblia... (IBORUNA – AC
124: 011)
(5-59)b. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu nesta quarta-feira (23) diante dos líderes
mundiais que o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, reassuma o cargo
imediatamente.
(Fonte: http://noticias.uol.com.br/ultnot/internacional/2009/09/23/ult1859u1490.jhtm)
(5-54)a então as pessoas às vezes obrigam a gente a esconder que nem tô te falando esconder...
os bordados (IBORUNA – AC 120:034)
(5-59)b. A exigência de Lula obrigou que o Conselho Monetário Nacional (CMN) fizesse
reunião extraordinária na semana passada para autorizar que os bancos possam
financiar veículos usados.
(Fonte: http://www.nascisul.com.br/noticias/detalhes/bancos-comecam-a-oferecer-o-modercarga)
c. Lula sanciona lei que obriga uso de air bags frontais em carros.
(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,lula-sanciona-lei-que-obriga-uso-de-air-bags-em-
carros,341459,0.htm)
encaixadas no tocante a vários tipos de construção, esse fator parece não se aplicar a
de um modo geral, não encaixam estados de coisas que envolvam o mesmo participante do
manipulativas são voltadas para o “outro” e raramente para o próprio referente do sujeito
(b) subtipos dessa classe de predicados, como mandar, deixar, podem selecionar de e-
com infinitivo, mas não complementos nominalizados. Uma explicação plausível, que precisa
de coisas pressupostos.
(c) subtipos dessa classe de predicados, como pedir e obrigar, podem selecionar de e-
(d) a opção por complementos com infinitivo na codificação não-finita não está relacionada
aos participantes, que não são, por definição, correferenciais, mas pode estar relacionada à
referência TAM.
licencie construções mais verbais e mais nominais que o infinitivo pessoal. A necessidade de
marcar o evento denotado pelo verbo como um fato irreal, ou simplesmente possível ou
196
desejado (afinal, a ação de manipular não significa que o estado de coisas pretendido se
Com base nessa afirmação, pode-se propor uma escala de tipos de predicados
(5-55)
indicativo
assumir diferentes formas, com diferentes significados, que podem ser interpretados com base
O contraste entre predicados que denotam uma percepção física e predicados que
funcionam como predicados de conhecimento tem atraído a atenção de muitos linguistas (cf.
DIK; HENGEVELD, 1991). É essa diferença de significado que pode ser codificada em
diferentes tipos formais. Postulo aqui, em conformidade com a proposta de Dik e Hengeveld
percepção física tem o estatuto de um estado de coisas (uma entidade de segunda ordem),
74
Cf. nota 73 (p. 183) sobre as classificações de predicado de conhecimento e predicados de percepção mental.
197
proposicional, que designa um fato possível (uma entidade de terceira ordem). Isso significa
que predicados como ver e ouvir, dependendo de sua natureza semântica, podem requerer
complementos.
Os dados apresentados na Tabela 5-1 mostram que, em oito das dez ocorrências de
infinitivo pessoal. Aos descreverem uma percepção direta, esses encaixadores designam um
estado de coisas, que, no caso do português, parece preferir a forma de uma oração não-finita,
com infinitivo pessoal, como em (5-56), ou com uma nominalização como núcleo, como em
(5-57). A razão dessa distribuição é a de que há maior dependência conceitual entre os estados
de coisas da matriz e encaixada, visto que, no mundo real, os estados de coisas de percepção
(5-56) o rio fica lá na:: no como que fala ali? Nas comporta E... (doc. Ah sim) o rio fica/ a
comporta cai no rio (doc.: uhum) quer dizer que nosso rancho fica na represa mesmo
acima... então você vai daqui prá lá... você olha a:: as comporta tão aberta... você vê cair
no rio... então nós tamos lá na represa mesmo... mas é muito gosTO::SO... (IBORUNA –
AC 132:203)
De acordo com a PM, um taxista que estava na região e viu o atropelamento seguiu o
(5-57)
motorista suspeito depois que ele saiu do local sem prestar socorro à vítima, que morreu
no local.
(Fonte: http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1285822-5605,00.html)
como ver e ouvir, por exemplo, depende da natureza semântica do predicado encaixador, que,
por sua vez, pode requerer um conteúdo proposicional, quando tem a função de predicado de
conhecimento, ou um estado de coisas, quando indica uma percepção direta. Essa observação
está de acordo com a associação que Dik e Hengeveld (1991) e Hengeveld e Mackenzie
(5-59) Sheila saw that Peter had left. (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 208, p. 177)
a conclusão a que Sheila chegou com base em sua percepção (o fato de Peter não estar no
carro, por exemplo), enquanto (5-58), com o complemento não-finito, descreve o estado de
coisas diretamente percebido por Sheila. Dik e Hengeveld (1991) formalizam a diferença
entre as duas construções alegando que o complemento em (5-59) se identifica com uma p-
categoria e o de (5-58), com uma e-categoria. Fica clara a associação entre complementos
(5-60) Inf.1.: ah depois que abriu essa igreja aí (inint) ((arrastou uma cadeira)) eu também fui lá
olhá(r) mas eu desliguei eu já esqueci o arro::z
Inf.2: não (isso aí) eu vi que cê desligô(u)
Inf.1: é né? eu/ mas eu fui lá olha de novo (IBORUNA – AI 002:004)
ai mas eu corri grita:ndo e xinga:ndo ... e xinguei tudo quanto é nome MESMO ... e fui
(5-61)
atrás mas corri ... corri atrás dele “filha da puta ... vem cá:: ((risos)) eu/ me dá minha
chave::... não tem dinheiro aí .. não tem nada::: me dá minha chave” ... e fui correndo ...
corri ... corri ... ele pegou e:: ... sabe ... FOI CORRENDO abrindo a bolsinha .... ele viu
que não tinha nada ...- tinha um real dos reais -...ele pegou e viu que eu tava corre::ndo
... eu não ia desistir eu ia correr atrás dele até o/ até quando eu conseguir ... aí ele pegou
e:: jogou a bolsinha n/no chão ... com a chave tudo ... (IBORUNA – AC 062:99)
leitura possível de (5-60) é a de que o Informante 2, ao dizer que viu o Informante 1 desligar o
fogão, revela ter visto tão somente o fogo apagado, inferindo, portanto, que o Informante 1
199
teria desligado o fogão. No entanto, não é impossível uma leitura que o Informante 2 tenha de
assaltante física, visual e não mental. Essa leitura permite sustentar o postulado de que, no
português, diferentemente do que defendem Hengeveld e Mackenzie (2008), bem como Dik e
possibilidade, a preferência nos dados é mesmo por e-complementos não-finitos (80% [8/10]).
podem ser assim sintetizados (com base no corpus e nas possibilidades de ocorrência):
(b) o predicado encaixador de percepção física pode ser suficiente para determinar o tipo de
finitos com infinitivo pessoal, o falante pode optar por marcar a oração dependente com
TAM, casos em que opta por uma oração mais verbal. Com os predicados de percepção física,
há um grau de maior dependência conceitual entre os estados de coisas, visto que, no mundo
(5-62)
indicativo
continuação, fim) do estado de coisas por eles designados. De acordo com Dik (1997a), esses
simultâneo ao estado de coisas descrito na oração matriz. O estado de coisas designado pela
entre o predicado fasal e a oração dependente: começar, continuar ou parar uma ação é, na
verdade, parte da ação. Por isso, predicados fasais agem como se fossem operadores
A GF (DIK, 1997a, 1997b) considera que os fasais são operadores que modificam a
estrutura interna do estado de coisas a que eles se referem. Na medida em que especifica a
considerados operadores aspectuais. Entretanto, como observado por Siewierska (1991 apud
CRISTOFARO, 2003), predicados fasais operam de modo bastante diverso dos outros
por outro lado, relacionam o estado de coisas que eles modificam, tomado como um todo, a
201
outro estado de coisas, a saber, o fato de que uma certa entidade se encontra numa certa fase
desse estado de coisas não é afetada pelo operador aspectual (cf. CRISTOFARO, 2003).
Com base nessas observações, é possível, então, uma análise que considere os fasais
fasal e operadores aspectuais, como o perfectivo/imperfectivo, pode ser observada por uma
O enunciado de (5-63b) especifica que a ação de trabalho está em curso, mas não há
desenvolvimento da ação (por exemplo, ele pode ter apenas começado a trabalhar, ou estar no
de trabalhar. Além disso, observe-se que, para atuar como verdadeiros operadores aspectuais,
começar, parar e continuar não poderiam ser classificados como classes lexicais de palavras
Para tanto, não é absolutamente clara a possível auxiliaridade desses predicados, que
causativos (5-64b).
bom testemunho de que predicados fasais assumem uma construção completiva verbal, como
se observa em (5-65):
Há, no entanto, outras línguas em que, para se expressar noções fasais, é necessário
(5-66) akiuti-usaar-puq
resist-keep.on-3SG:INDC
O fato é que há línguas que dispõem de predicados fasais, como o português, e outras
que não dispõem – e marcam as noções fasais de um outro modo, tal como o groenlandês
ocidental, que se vale de afixos verbais. Mutatis mutandis, há línguas em que os modais são
funcionam como verbos auxiliares e, como tais, constituem classes gramaticais de palavra.75
Bastos et al. (2007, p. 210) consideram que um predicado fasal “indica que a
propriedade de ‘ter um começo’, ‘ter um fim’ ou ‘ter uma continuidade’ se aplica ao evento
predicado são classificados como uma propriedade, isto é, como um f-complemento, quando
75
Cf. Quadro 2-6, Capítulo 2, seção 2.3.2 (p.83).
76
Cf. original: To indicate that the property of ‘to have a beginning’, ‘to have an end‘ and ‘to have continuity‘
applies to the event embedded in the predicate.
203
Mackenzie (2008) também sustentam o argumento de que os fasais são predicados e, como
predicados fasais como operadores que modificam a estrutura interna do estado de coisas a
que eles se referem e, por isso, atuam, na primeira camada (predicados e termos, na versão
standard do modelo). Essa posição parece se manter no novo modelo, já que Hengeveld e
uma propriedade (que equivaleria à primeira camada na versão padrão do modelo). É possível
que essa associação tenha diretamente a ver com o fato de predicados fasais sempre tomarem
Na medida em que o estado de coisas principal não tem uma referência puramente
interna ao estado de coisas relevante (como acontece com os operadores aspectuais), postulo
isto é, estados de coisas, e não uma propriedade, como defendem Bastos et al. (2007) e
Hengeveld & Mackenzie (2008). Essa posição é sustentada por Cristofaro (2003), que acha
problemático postular que a atuação dos predicados fasais se dá no nível do predicado e não
no nível da predicação.
nominalização, como em (5-68).77 No corpus, 95% (92/97) dos complementos de fasais são
77
O fato de os predicados fasais também selecionarem nominalizações como complemento é mais uma razão
para considerar as completivas de predicados fasais como e-complementos e não f-complementos, já que não
seria possível considerar um complemento nominalizado (derivado de verbo) como uma propriedade.
204
(5-67) Inf.: ai às vezes eles fazem joguinho prá gente ficar cansado depois... éh::... ele/ éh tacar
um prá outro... o goleiro/ o::/ o::... guarda-campo taca pro ou/ pro time dele e aí ele/ a ge/
a gente fica tacando aí a gente fica cansado eles começam a queimar todo mundo do
outro time inimigo... (IBORUNA – AC 004: 163)
(5-68) ::... e ele tava no ônibus e quando ele sentou... ele sentou numa coisa da/ na cade::ira... e
sentou e até cont/ e continuou a via::gem... vindo de São José do Rio Preto pra Bady
Bassit... (IBORUNA – AC 035: 160)
Como observam Bastos et al. (2007, p. 209), nesse caso, “o verbo começar pode, no
adverbiais, como primeiramente e em primeiro lugar”. Bastos et al. (2007) entendem que, no
exemplo em (5-69), começar toma um A-complemento, isto é, um ato que, juntamente com
de maneira nenhuma (pode estar) pensando em sair. E conclui a série de estados de coisas
para começar que é diferente do valor característico desse tipo de predicado. Os predicados
uma completiva finita, a base é a mesma, mas a noção fasal normal, aqui preservada, abrange
205
uma camada acima da do estado de coisas por dar início ao primeiro argumento de uma
original, como uma extensão metafórica, como se o falante assinalasse que o primeiro
fazem parte de um discurso compõem um episódio, definido pela GDF como um conjunto
coerente de estados de coisas. Cada estado de coisas constitui, então, parte de um episódio, ou
relação entre estado de coisas e episódio toma nos termos da GDF. Nesse caso, o que postulo
é que esse exemplo inovador de começar não sai do âmbito do Nível Representacional.
Os resultados sobre os predicados fasais, apresentados nesta seção, podem ser assim
sintetizados:
(a) o predicado fasal admite tanto formas infinitivas quanto nominalizações como
(5-70)
trabalho. Como apresentado na Tabela 5-1, esse tipo de predicado requer exclusivamente e-
(5-71) Inf.: olha eu gosto muito assim de trabalhar na cidade eu gosto no final de semana no
domingo... (IBORUNA – AC 067: 168)
(5-72) Jucá diz que Lula gostou da indicação de Lobão para Minas e Energia.
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u362452.shtml)
(5-73)a. Mas o que eu estranho é que a Abin, depois que eu disse isso ao presidente Lula, parte
para mandar arapongas contra o PTB. Alguém, dentro do governo, não gostou que nós
passamos essa informação ao presidente Lula.
(Fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=333ASP002)
5-80)c. Solnik conta que Borgneth se contrariou com o depoimento do ex-deputado Airton
Soares, que teve de deixar o PT porque votou em Tancredo Neves. Não gostou que Fafá
de Belém contasse o boicote que Franco Montoro tentou impor-lhe, nem de Mário
Covas Neto dizendo que hoje o PT está à direita do PSDB.
(Fonte: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=281ASP003)
(5-80)d. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou ontem as solenidades do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC), em Belo Horizonte e Ribeirão das Neves, na região
metropolitana, para mais uma vez negar que esteja utilizando suas viagens pelo País para
fazer campanha eleitoral. “A minha oposição não gosta que eu ande. Ela fala que eu
estou fazendo campanha. Eu não sou candidato...”
(Fonte: http://www.cut.org.br/content/view/1148/170/)
seção, podem ser assim sintetizados (com base no corpus e nas possibilidades de ocorrência):
(b) a natureza semântica do predicado encaixador não é o único fator que determina a forma
de experiência psicológica:
(5-74)
infinitivo impessoal
nominalização
>
indicativo
subjuntivo
tentar e de procurar, que, em 100% (14/14) das ocorrências, licenciam um complemento não-
predicados de tentativa são os que mais restringem a ocorrência de um estado de coisas com
78
O uso do indicativo em vez do subjuntivo não tem qualquer motivação pragmática ou semântica; é, na
realidade, o produto de processos sociolinguísticos de variação e mudança.
209
(5-75)a. Inf.: contaram... que ele tentou assaltar acho que uma:: uma:: acho que uma:: uma loja
lá... em Mirassol... uma loja de roupa... então no dia ele tentou assaltar só que aí tinha
poli/ Mirassol é pequena... (IBORUNA – AC 039: 087)
(31) b. Inf.: não ela foi na casa da:: irmã dela… procurou saber onde eu morava e começamos a
namorar… (IBORUNA – AC 145:045)
quanto em relação a TAM, mais nominal o complemento. Essa natureza tão integrada entre
predicado encaixador e predicado encaixado pode levar, inclusive, à omissão da forma não-
finita, nas situações em que o verbo da dependente for [+ dinâmico] e [+ controlado], como
fazer ou dar:
(5-76)a. Ela [Carmo] tentou (dar) um risinho impudico, sem resultado (DM, 229)
(Retirado de BORBA, 1990, p. 1284)
(31) b. Seu vigário, me desculpe, mas eu tentei (fazer) de tudo (PP, 99)
(Retirado de BORBA, 1990, p. 1284)
compatível com construções ainda mais nominais, com nominalizações como núcleo, como
ilustra (5-77):
(5-77) Estimulado por alguns de seus ministros, Lula tentou a aproximação dos dois partidos em
vários momentos.
(Fonte: http://abcpolitico.com.br/index.php?secao=secoes.php&sc=5&url=cenario_politico.php)
predicados encaixados:
(5-78)
complementos representam. Os dados analisados mostram haver uma relação entre o tipo de
O Gráfico 5-1, repetido aqui por conveniência, mostrou que há um declínio no grau de
esquerdo para o polo direito, isto é, dos predicados de enunciação em direção aos predicados
de tentativa.
211
Completiva 70
mais nominal 57
60
50 43
40
30 24
20
20
9
10
Tentativa
Conhecimento
Psicológica
Fasal
Manipulação
Enunciação
Perc. Física
Proposicional
Volição
Exp.
At.
como núcleo. Isso não significa, no entanto, que esses predicados não licenciem também
participantes, o falante pode optar por um complemento finito, quando for relevante assinalar
referência TAM, ou por um complemento não-finito, quando não é relevante essa marcação.
com verbos finitos no indicativo. Os predicados achar, acreditar e pensar licenciam também
e esquecer podem licenciar complementos ainda mais nominais, ou seja, formas não-finitas
complemento finito no subjuntivo: nesse caso, o uso preferencial da forma não-finita parece
estar relacionado às referências a tempo, modo e aspecto, visto que o compartilhamento desse
com infinitivo e nominalização. Complementos finitos no indicativo não são licenciados para
psicológica, casos em que é relevante observar que participantes não podem ser
correferenciais.
no Quadro 5-2.79
79
Cabe relembrar a taxonomia para a referência aos tipos de completivas, apresentada no início deste capítulo:
C- complemento para conteúdos comunicados, p-complemento para conteúdos proposicionais e
e-complemento para estados de coisas (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).
80
Os predicados encaixadores que aparecem no Quadro 5-2 como tendo duas formas preferenciais (de volição e
de experiência psicológica) são aqueles em que se deve observar a correferencialidade ou não do participante
para determinar a forma da completiva. No corpus, houve maior predominância de complementos não-finitos
com infinitivo em relação ao subjuntivo e isso se deve à correferencialidade de participantes. Em outras palavras,
tanto o subjuntivo quanto o infinitivo podem ser preferenciais porque, para determinar qual forma será escolhida,
é necessário verificar se os dois estados de coisas envolvidos compartilham ou não participantes.
214
representação, como estado de coisas, permitem formas mais verbais (também não-
preferenciais), sobretudo o indicativo. Não é possível afirmar, desse modo, que, no português
envolvam integração semântica, tal como alega Cristofaro (2003) em seu estudo tipológico.
predicado encaixador, com base em critérios definidos por Cristofaro (2003) e Givón (1980,
modo e aspecto.
Postulo que são mais integrados os eventos com compartilhamento de marcação TAM,
completiva de maior grau de integração tende a apresentar a mesma relação temporal que a
oração matriz, o que é observado principalmente nas completivas não-finitas com infinitivo
como núcleo, que, por não apresentarem referência TAM distinta do verbo da matriz, tendem
81
Vale lembrar que marcação TAM é mais abrangente que cotemporalidade. No entanto, se, por um lado, a
referência aspectual está fortemente conectada à referência temporal na morfossintaxe do português, a referência
modal, por outro, está ligada, às vezes, à factualidade do evento, e, às vezes, está ligada exclusivamente ao grau
de dependência da completiva em relação à predicação matriz.
215
N % N % N % N %
de Enunciação 36 100 36 11
de At. proposicional 9 7 16 5
de Conhecimento 26 4 2 32 9
de Volição 84 100 84 24
de Manipulação 32 100 32 9
Fasal 97 100 97 28
de Tentativa 14 100 14 4
de tentativa compartilham marcação de tempo (e, por conseguinte, de modo e aspecto, já que
essas referências encontram-se marcadas na predicação matriz) em 100% dos casos, o que
mais nominal. O critério para considerar dois eventos como cotemporais é a dependência de
referência temporal, como se infere da proposta de Givón (1990): eventos simultâneos são
eventos cotemporais.
significa que o que é desejado ou mandado ocorra) e seu valor modal é irrelevante. Esses
traços determinam um alto grau de perda de distinções TAM (que se reflete na forma do
Há, então, uma clara dependência conceitual entre os estados de coisas dependentes e
semântica. Predicados que envolvem preferência (tais como querer e mandar) determinam
que não envolvem preferência estão relacionados a um baixo grau de integração semântica.
que, desse modo, são concebidos como dois eventos. Em 95% (80/84) das ocorrências que
o grau de integração. Quanto maior o grau de independência semântica entre os dois eventos
Outro traço que identifica maior ou menor grau de integração morfossintática consiste
N % N % N %
de Enunciação 8 22 28 78 36 12
de At. proposicional 3 19 13 81 16 5
de Conhecimento 11 39 17 61 2882 8
de Volição 44 52 40 48 84 24
de Manipulação 32 100 32 9
Fasal 97 100 97 28
de Tentativa 14 100 14 4
Uma vez mais, os dados apontam para uma correlação entre predicados que codificam
mais nominal para participantes correferenciais. Por isso, além da determinação semântica do
82
As ocorrências com predicados de conhecimento totalizam 32. Na tabela, aparecem 28 casos a que se aplica a
correferencialidade ou não de participantes; 4 casos não computados dizem respeito à nominalização, que, no
corpus, tem estatuto genérico.
218
próprio predicado encaixador, que age como motivação primária, a nominalidade majoritária
correferencialidade de participantes.
explicação para a nominalidade majoritária dos complementos pode, então, estar assentada na
perda de distinções TAM: no caso dos predicados de manipulação, como se trata de eventos
percepção, como os eventos são simultâneos, a referência TAM é codificada como marcada
na oração principal.
A Tabela em 5-1, representada pelo Gráfico 5-1 na seção anterior, mostra que há
os dados discutidos na seção 5.3, que tratou de cada predicado encaixador separadamente,
permitiram mostrar que o fato de uma forma de completiva não se encaixar em determinado
morfossintáticas possíveis.
O que mostram a Tabela 5-1 e o Gráfico 5-1 são as estruturas preferidas registradas
nos dados da amostra, que, como já mencionado, não espelham completamente as exigências
do predicado encaixador. É relevante, por isso, apresentar agora dados relativos às reais
possibilidades de ocorrência das completivas no corpus, que, muitas vezes, são restringidas
Tabela 5-5 dizem respeito à restrição de outra completiva além do tipo originalmente
encontrado no corpus.
219
Tipo de Restrição a
predicado encaixador outro(s) complemento(s)
N % Total
de Atitude proposicional 16 100 16
de Enunciação 28 78 36
de Conhecimento 25 78 32
de Volição 63 75 84
de Tentativa 9 64 14
de Experiência psicológica 15 60 25
Fasal 53 55 97
de Percepção física 5 50 10
de Manipulação 1 3 32
Total 215 62 346
62% (215/346) dos casos não há possibilidade de ocorrência de outra forma de oração
volição são os que mais restringem a ocorrência de outras formas de complementos além da
nominal restrita a 22% (8/36). Essa incidência se refere aos casos de compartilhamento de
(5-79)a. Doc.: Everton... éh cê me disse que cê sabe fazer TRU:fa BO::lo enTÃO eu queria que
cê me explicasse COmo que é assim como que cê aprende::u como que fAz essas
coisas? (IBORUNA – AC 047: 177)
(131) b. Doc.: Everton... éh cê me disse saber fazer TRU:fa BO::lo enTÃO eu queria que cê me
explicasse COmo que é assim como que cê aprende::u como que fAz essas coisas?
(95% [19/20]). O único caso que permite outro tipo codificação de complemento além da
forma finita no indicativo licencia uma construção não-finita com infinitivo impessoal, porque
(5-80)a. ...tinha uma boa:: uma área bastante diversificada e eu lembro que eu gostava muito de
andar ali... (IBORUNA – AC 084: 140)
(131) b. ...tinha uma boa:: uma área bastante diversificada e eu lembro de gostar muito de
andar ali...
(5-81)a. que eles saindo com uma profissão eles num:: pensaria em roubar... pensaria em
matar... pensaria em se vingar... (IBORUNA – AC 051: 483)
(131)b. que eles saindo com uma profissão eles num:: pensaria em roubo... pensaria em matar...
pensaria em vingança...
(5-82)a. aí eu e/ eu esqueço das outras coisas eu esqueço de bagagem eu esqueço de/ de check in
de conferência de bilhete esqueço de desembarque esqueço de embarque esqueço de
tudo (IBORUNA – AC 051: 366)
221
(131)b. aí eu e/ eu esqueço das outras coisas eu esqueço de bagagem eu esqueço de/ de check in
de conferir bilhete esqueço de desembarque esqueço de embarque esqueço de tudo
(5-83)a. aí eu e/ eu esqueço das outras coisas eu esqueço de bagagem eu esqueço de/ de check in
de conferência de bilhete esqueço de desembarque esqueço de embarque esqueço de
tudo (IBORUNA – AC 051: 366)
(131)b. aí eu e/ eu esqueço das outras coisas eu esqueço de bagagem eu esqueço de/ de check in
de conferir bilhete esqueço que (as pessoas) desembarcam esqueço de embarque
esqueço de tudo
nominais (cf. Gráfico 5-1), os predicados de volição são os que mais restringem outra forma
volição que restringem a ocorrência de outros tipos de complementos dizem respeito (i) aos
que requerem construções não-finitas com infinitivo (das 44 ocorrências, 40 não licenciam
outro tipo de complemento): por terem participantes correferenciais não permitem, por
exemplo, a ocorrência da completiva codificada como subjuntivo, e (ii) aos que requerem
complemento), uma vez que, por terem participantes diferentes, não permitem a expressão de
(5-84)a. Inf.: ah! que meu pai contou é meu pai contava que:: quando ele namorava minha mãe
era era muito bonita né e tinha bastante moço que gostava dela não queria que ela
namorasse (IBORUNA – AC 136:084)
(128)b. Inf.: ah! que meu pai contou é meu pai contava que:: quando ele namorava minha mãe
era muito bonita né e tinha bastante moço que gostava dela não queria o namoro dela.
(5-85)a. e eu já tava meio envolvido com E:la e ele pressioNOU pressioNOU basTANte... a
mãe NÃO queRIA namoro só que o pai dela falou que era pa ficar aqui na porta de
Casa... (IBORUNA – AC 047:114)
(129)b. e eu já tava meio envolvido com E:la e ele pressioNOU pressioNOU basTANte... a
mãe NÃO queRIA que a gente namorasse só que o pai dela falou que era pa ficar
aqui na porta de Casa...
(5-86)a. existe muito preconceito é a menina que:: por exemplo a menina que:: nu::m num tá
afim de namora::r tá afim só de fica::r se ela fica com um monte de meni::no ela fica
com fama de gali::nha de menina fá::cil acho que isso deveria acabar porque se a
menina num se sente prepara::da pra namora::r se ela num quer namora::r...
(IBORUNA – AC 016: 393)
(128)b. existe muito preconceito é a menina que:: por exemplo a menina que:: nu::m num tá
afim de namora::r tá afim só de fica::r se ela fica com um monte de meni::no ela fica
com fama de gali::nha de menina fá::cil acho que isso deveria acabar porque se a
menina num se sente prepara::da pra namora::r se ela num quer um namoro...
(5-87)a. Inf.1.: 28[ai] eu acho o cúmulo (falo) –“gen::te por que que foi fazê(r) isso? largasse lá
no planalto... que é duzentos reais... então o padre qué(r) que a gente paga o
aluguel... cada um dá um tanto pa pagá(r)... eu dei dez reais (IBORUNA – AI
002:190)83
(5-95)b. Inf.1.: 28[ai] eu acho o cúmulo (falo) –“gen::te por que que foi fazê(r) isso? largasse lá
no planalto... que é duzentos reais... então o padre qué(r) que a gente pague o
aluguel... cada um dá um tanto pa pagá(r)... eu dei dez reais
(5-95)c. Inf.1.: 28[ai] eu acho o cúmulo (falo) –“gen::te por que que foi fazê(r) isso? largasse lá
no planalto... que é duzentos reais... então o padre qué(r) o (nosso) pagamento do
aluguel... cada um dá um tanto pa pagá(r)... eu dei dez reais
além do tipo selecionado em 64% (9/14). Como o Gráfico 5-1 mostra, esses predicados
com infinitivo como núcleo. Nas cinco ocorrências em que esses predicados licenciam outro
83
A alternância da forma no indicativo, em (5-86a), e no subjuntivo, em (5-86b), parece estar relacionada muito
mais à variação linguística do que a formas alternativas de gramática.
223
(5-88)a. Inf.: contaram... que ele tentou assaltar acho que uma:: uma:: acho que uma:: uma
loja lá... em Mirassol... uma loja de roupa... então no dia ele tentou assaltar só que aí
tinha poli/ Mirassol é pequena... tem polícia né... aí prenderam ele em flagrante ((doc.:
ah éh)) é ele tava com porte ilegal de arma... (IBORUNA – AC 039: 086)
(131) b. Inf.: contaram... que ele tentou um assalto acho que em uma:: uma:: acho que em
uma:: uma loja lá... em Mirassol... uma loja de roupa...
60% (15/25) dos predicados de experiência psicológica não licenciam outro tipo de
como em (5-89a-b):
(5-89)a. você vai lá você passa um feria::do... você leva a famí::lia você leva os ir/ você leva
conheci::do... os cole::ga... a turma gosta de pescar::... (IBORUNA – AC 132: 205)
(131) b. você vai lá você passa um feria::do... você leva a famí::lia você leva os ir/ você leva
conheci::do... os cole::ga... a turma gosta de pescaria::..
complemento além do tipo originalmente encontrado. Nos casos em que se licencia alguma
complemento original for uma forma no infinitivo (5-90a-b) – isso ocorre em 90% dos casos
(5-90)a. ::.. ele ele/ esse tio esse avó dele convidou a gente pra tá entrando em estu::dio... a gente
já começou a gravar já... a gente tá gravando e::... (IBORUNA – AC 035: 134)
(131) b. ::.. ele ele/ esse tio esse avó dele convidou a gente pra tá entrando em estu::dio... a gente
já começou a gravação já... a gente tá gravando e::...
(5-91)a. ::... e ele tava no ônibus e quando ele sentou... ele sentou numa coisa da/ na cade::ira... e
sentou e até cont/ e continuou a via::gem... vindo de São José do Rio Preto pra Bady
Bassit... (IBORUNA – AC 035: 160)
(131) b. ::... e ele tava no ônibus e quando ele sentou... ele sentou numa coisa da/ na cade::ira... e
sentou e até cont/ e continuou a viajar...
224
tipos de complementos. Além da forma não-finita com infinitivo, esses predicados licenciam
(5-92)a. Inf.1.: e se ele escuta conversá(r) ele fica na grade uh:: uh:: ele faz né Fernanda?
(IBORUNA – AI 007:012)
(131) b. Inf.1.: e se ele escuta uma conversa ele fica na grade uh:: uh:: ele faz né Fernanda?
completivas na forma de subjuntivo em 69% (22/29) das ocorrências (22 ocorrências com
exemplificam (5-93a-b). Além disso, uma ocorrência com indicativo licencia também a
licenciam tanto a forma de complemento com infinitivo pessoal quanto a de subjuntivo, como
aparece em (5-96a-c).
(5-93)a. Inf.: não a mãe dela entrou na briga fez um acordo... falou assim – “não tá bom ela num
te pediu então dessa vez você num empresta ou então você deixa ela pegar e pega um
dela” – aí parece que ela deixou depois a irmã usar e pegou uma (da minha amiga)...
(IBORUNA – AC 024: 153)
(131)b. Inf.: não a mãe dela entrou na briga fez um acordo... falou assim – “não tá bom ela num
te pediu então dessa vez você num empresta ou então você deixa que ela pegue e pega
um dela” – aí parece que ela deixou depois a irmã usar e pegou uma (da minha amiga)...
(5-94)a. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite que cê... tira pra xerocá(r)
ele (IBORUNA – AI 009:287)
(106)b. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite que cê... tire pra xerocá(r)
225
(106)c. Inf. 1.: enquanto isso você vai lá no no::... conversá(r) com essa::... m/moça do conselho
pra pegá::(r) vê(r) se tem algum documento se ela permite tirar pra xerocá(r) ele
(5-95)a. eu pedi que ele fosse me visitar pra que a gente falasse da bíblia... (IBORUNA – AC 124:
011)
(5-05)b. eu pedi pra ele ir me visitar pra que a gente falasse da bíblia...
(5-96)a. í:: ela pegou e contratou mais dois estagiários um mês depois quando ela contratou mais
dois estagiários aí no aEroporto uma menina pediu demissão... (IBORUNA – AC 051:
129)
í:: ela pegou e contratou mais dois estagiários um mês depois quando ela contratou mais
(5-
dois estagiários aí no aEroporto uma menina pediu para a demitirem...
106)b.
í:: ela pegou e contratou mais dois estagiários um mês depois quando ela contratou mais
(5-
dois estagiários aí no aEroporto uma menina pediu que a demitissem...
106)c.
Com base nos dados, pode-se dizer que predicados que requerem majoritariamente a
forma de complemento além da original (em 47% [123/262] dos casos), tendem a permitir
finitos no indicativo. Isso significa que, quando o predicado encaixador licencia mais de uma
forma alternativa para a construção dependente, há certa tendência para que (i) se a
completiva for uma oração não-finita com infinitivo, ele admita majoritariamente a expressão
84
A relação parece óbvia: se o predicado admite um complemento codificado em formas mais nominais, então,
na hierarquia verbo/nome, ele também pode admitir complementos codificados em formas mais verbais.
226
subjuntivo (35% [33/94] dos casos); (ii) se a completiva for uma nominalização, ele admita a
codificação de completivas sob a forma não-finita com infinitivo como núcleo (19% [3/16]
dos casos), sob a forma de subjuntivo (25% [4/16] dos casos), e sob a forma de indicativo
(12% [2/16] dos casos), ou ainda sob a forma de infinitivo e de subjuntivo juntas (44% [7/16]
dos casos).
(5-97)a. Lula detesta aplausos e honrarias. Por isso, pediu para não ser anunciado no sistema de
som, entrou depois de iniciado o desfile e recusou o convite do Neguinho.
(Fonte: http://www.notivaga.com.br/mpa_mostra.asp?sid=20092251055395059)
modo geral, esse tipo de predicado licencia também a expressão da oração dependente sob a
forma de oração finita e não-finita com infinitivo impessoal. Ocorre que o uso do
complemento como oração finita implica a expressão de referência TAM, bem como a de
eventos etc.
agente para a ação de aplaudir e não representa a contraparte verbal direta do que é expresso
designação genérica.
determina a forma do complemento, mas a escolha do falante pode também estar relacionada
denotação do significado verbal como uma entidade ou conceito em si, como em (5-97a), em
que o nome aplausos se refere à noção verbal em si, genericamente, sem nenhuma
convida seu interlocutor a atentar para alguma entidade (ou conjunto de entidades), ou seja,
para o referente, que não pode ser uma pessoa, animal ou outro objeto tangível. Nos termos de
Lyons (1977), deve ser uma entidade de ordem superior: de segunda ou de terceira ordem.
nome de primeira ordem (Dik, 1985; Lyons, 1977). Desse modo, na escala gradativa, essas
núcleo de predicado que prescinde de termo, porque é tomado genericamente, sem implicar
Há que se considerar ainda que, muitas vezes, para um predicado verbal, não existe, no
então, que o encaixador tome uma nominalização como expressão do complemento, muito
embora esse mesmo predicado encaixador, em outra situação, possa licenciar uma
(5-98)a. Inf.: argola ainda eu não aprendi mas só que... que e::u vou... eu vou fazer um dia... éh eu
vou/ eu... eu já fiz... eu já:: quando eu tenho hoRÁrio eu faço corda... mas só que num é
no/ no solo e:: também tem... eu gosto muito de fazer casinha e parada de cabeça...
(IBORUNA – AC 004: 197)
(d7 b. ... quis vim pra cima de mim tal... só que... de certa forma eu num gosto de bri::ga... só
que eu sei me defender... corretamente né?... eu empurrava ele dava uns empurrão nele...
(IBORUNA – AC 035: 113)
Finalmente, cabe ressaltar que parece haver uma clara razão discursiva para o uso da
nominalização nos dados reais retirados da internet. Muitas vezes, esses enunciados
abaixo. De acordo com Mackenzie (1996), a nominalização permite ao falante dar um nome à
entidade de segunda e de terceira ordem, um nome que desfruta de uma versatilidade de uso
nominalização é, então, um traço que motiva o seu uso em elocuções sumárias, como as que
aparecem em manchetes.
(5-54)c. Lula sanciona lei que obriga uso de air bags frontais em carros.
(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,lula-sanciona-lei-que-obriga-uso-de-air-bags-
em-carros,341459,0.htm)
229
está relacionada:
(i) ao tipo/subtipo semântico de predicado encaixador, que pode licenciar somente a expressão
impessoal;
correferenciais ou não, podem permitir /restringir outros tipos de complementos, como ocorre
com o predicado volitivo querer, que, com participantes correferenciais, licencia somente e-
Em vista das considerações feitas até aqui a respeito da relação entre o tipo de
a hierarquia proposta em (5-10), repetida abaixo por conveniência, pode ser reorganizada da
de enunciação estão no extremo mais verbal porque, na análise dos dados, requerem a
predicado de tentativa foi considerado mais nominal porque, na análise dos dados, é o que
mais requer complementos não-finitos (no infinitivo), excluindo outras formas de codificação.
forma de indicativo ou, quando muito, sob a forma de predicados não-finitos com infinitivo
proposicional e de enunciação porque, além da forma verbal finita e não-finita com infinitivo
experiência psicológica porque, entre as formas mais nominais, admite somente construções
pelos outros três predicados). Predicados fasais e de tentativa, por fim, são menos verbais
máximo de verbalidade que a codificação de seu complemento pode tomar é o uso da forma
de infinitivo impessoal.
mais nominais.85
85
Não há uma relação hierárquica entre C-complemento e p-complemento, visto que as camadas de conteúdo
comunicado (C-complementos) e de conteúdo proposicional (p-complementos) não são ordenadas
hierarquicamente.
232
PARTE III:
GENERALIZAÇÕES E IMPLICAÇÕES
TEÓRICAS
233
CAPÍTULO 6
a tese de que:
governadas pelo princípio funcional de economia, que representa uma pressão para a
Essa é a função da seção 6.2, à qual cabe ainda relacionar os resultados obtidos com
tentativa de apontar em que os resultados obtidos nesta pesquisa convergem ou divergem com
Cumprida essa tarefa, na seção 6.3, volto a atenção para a tentativa de fornecer uma
semântica.
Uma primeira afirmação a fazer, em vista da discussão apresentada até aqui, é a de que
plano, pelo predicado encaixador. O predicado encaixador é, desse modo, o primeiro fator
semântico mais relevante na delimitação do tipo formal de construção que pode figurar como
complemento. Justamente por isso, é possível pensar numa escala de predicados encaixadores
isto é, predicados característicos de ligações mais frouxas com seu complemento; no extremo
estabelecendo-se entre oração matriz e completiva uma ligação mais tensa, como aparece na
Figura 6-1:
235
que pode assumir forma de verbo finito a predicado plenamente lexicalizado como nome.
principalmente por construções mais verbais, e, alternativamente, uma forma mais verbal,
O tipo semântico de predicado encaixador pode não ser, no entanto, o único fator na
determinação do complemento. Com efeito, outros fatores podem também contribuir para o
grau de integração entre as orações nas construções com complementos oracionais finitos e
quanto o da oração encaixada, numa relação de subordinação, são marcados por diferentes
TAM, fato que é conhecido na pesquisa tipológica como integração semântica (GIVÓN,
1980, 1990; NOONAN, 1985, CRISTOFARO, 2003). Com efeito, é possível propor a
(6-1)
argumentos e a codificação da completiva sob a forma de subjuntivo indica apenas que é uma
oração dependente: parece que TAM seria dispensável porque o que o subjuntivo indica é que
definição, não, na medida em que se tem o indicativo para o predicado matriz e o subjuntivo
237
participantes bem como a perda de distinções TAM não tem relevância alguma. A relação que
complemento.
predicado encaixador e seu complemento sob a perspectiva tipológica, que prevê o estudo de
Givón (1980, 1995) destaca uma relação de isomorfismo entre as dimensões semântica
integração formal de uma oração na outra. Parte-se do princípio de que quanto maior a ligação
semântica entre dois eventos tanto maior a integração sintática de suas orações em uma
(2003), por seu lado, focaliza os seus traços semânticos com base em três aspectos: (a) nível
Com base em Givón (1980) e Cristofaro (2003), o Capítulo 2 mostrou que a natureza
semântica do predicado encaixador pode ser vista como um fator indicativo do grau de
são explicados pelo princípio de iconicidade diagramática (HAIMAN, 1983), segundo o qual
participantes do estado de coisas ligado. Segundo Givón (1993, p.7), “quanto maior a
contiguidade temporal entre dois eventos tanto maior a probabilidade de serem representados
cognitivamente como um evento único do que como dois eventos independentes”.86 Essa
TAM. Com base nesse parâmetro, vale relembrar que Cristofaro (2003) propõe uma relação
86
Cf. original: The more temporally contiguous two events are, the more likely they are to be represented
cognitively as a single event, rather than as two independent events.
240
semântica. Com efeito, a possibilidade que esses predicados apresentam de tomarem como
complemento predicados não-finitos permite postular que eles também envolvem relação de
integração semântica com a oração dependente, ainda que tendam a admitir a codificação de
Tentativa, Fasais > Percepção física > Volição, Experiência psicológica >
Manipulação > Conhecimento > Atitude proposicional, Enunciação
trabalho e a tipologia de Cristofaro (2003) pode estar no fato de ser o português uma língua
indo-européia, românica, um tipo de língua que não aparece na amostra de Cristofaro, que
Na escala gradativa de integração semântica que Givón (1980) constrói, quanto maior
a tendência para o polo esquerdo das relações entre predicado encaixador e predicado, maior o
tendência para o polo direito das relações de complementação, maior o grau de lexicalização
avançam para a zona mais à direita da escala, as construções vão se tornando mais
fechadas, mas preferenciais, de modo não ser possível sustentar que um determinado tipo
Novamente aqui, o que está em foco é que, em menor ou maior grau, todos os tipos de
morfossintática do complemento, que pode ser mais ou menos verbal/nominal. Não é possível
Tal como aponta Givón (1980), são predicados que requerem completivas nominais,
infinitivas ou nominalizadas.
Predicados de enunciação, por seu lado, envolvem baixo grau de integração semântica,
visto que, como predicados de atitude epistêmica fraca, tomam complementos oracionais
podem, em algumas situações, licenciar a forma infinitiva para o complemento, fenômeno que
semântica do predicado.
grau de integração semântica. Cabe salientar, entretanto, que esses predicados também
licenciam, além da completiva finita, oração não-finita com infinitivo e com nominalização.
construções mais integradas também licenciam a expressão de uma forma mais independente.
requerida pode também ser vista a partir do tipo de entidade que a completiva representa.
oração completiva reflete o grau de integração gramatical (maior ou menor) que ela mantém
infinitivo pessoal*
nominalização nominalização
estrutural definidos pela GDF (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008) nos seguintes termos:
quanto mais alta a camada mais externa de uma oração complemento, mais provavelmente ela
Não obstante, em conformidade com o Quadro 6-3, não é possível alegar que as
diferentes entidades designadas pelo complemento refletem fielmente essa relação entre
mais nominais. Do mesmo modo, e-complementos podem ser considerados como mais
interna; deveriam, desse modo, ocorrer com complementos mais nominais, mas, embora
formas mais nominais sejam requeridas, e-complementos também licenciam formas mais
verbais.
complexa determinar o tipo de língua com base em um estudo não comparativo como este.
De qualquer modo, vale lembrar que Koptjevskaja-Tamm (1993) alega ser possível
deranking languages).
246
de construções encaixadas proposta por Dik (1997b) e adaptada por Camacho (2009),
apresentada na Figura 2-2 (p. 88), deduzo que ela é insuficiente para abrigar a escala de
completivas de o português dispõe, já que aquela tipologia inclui apenas dois extremos,
representados pelas construções encaixadas finitas e pelas não-finitas. Vimos, todavia, que, no
assumo a posição de Cristofaro (2003), que, divergindo de Hengeveld (1998), para o qual
somente as primeiras podem ser assim consideradas.88 Já no polo das não-finitas, o português
encaixadas nominalizadas.89
88
Conforme vimos, há construções de experiência psicológica que requerem o subjuntivo não por razões de
ordem semântica, mas apenas para assinalar a dependência sintática da encaixada.
89
Lembro que existe a possibilidade também de contarmos com construções participiais reduzidas de gerúndio,
que não foram consideradas neste trabalho por definirem apenas aspecto progressivo.
247
Hengeveld (1989) sugere que construções subordinadas sejam classificadas de acordo com a
camada mais alta que as contenha. Diferentes predicados encaixadores requerem diferentes tipos
que designam. Essa dependência permite fazer fortes predições sobre a possibilidade de
expressar operadores de tempo, modo e aspecto: quanto mais alta a camada mais externa de
uma oração complemento, mais provavelmente ela será expressa por uma forma verbal
independente. Esse fato está plenamente de acordo com a correlação entre tipos
predicação matriz.
seja em termos de suas funções semânticas (Actor, Undergoer etc), seja em termos de sua
animacidade e a de pessoalidade.
248
princípios que se resolvem apenas no Nível Morfossintático: são de natureza formal, mas
de Haiman (1983), vista por Givón (1980) como mecanismo de integração semântica: tendo
encaixado mais sentencial ou menos nominal é a oração completiva. Essa relação tem a ver
com as camadas definidas pela GDF. A natureza semântica do predicado encaixador define o
tipo de completiva, ora no Nível Representacional, ora no Nível Interpessoal. Quanto mais
TAM desencadeia uma economia semanticamente motivada, na medida em que esses traços
reflexividade para referir-se ao mesmo fenômeno semântico ocorrendo no interior dos limites
de uma oração.
dessa língua dispõe de uma estratégia perifrástica envolvendo o nome ‘wáa’, ‘corpo’, que
serve justamente para indicar correferência no interior da oração, como se vê em (6-2a). Nas
Mesmo assim, é possível postular que o sistema morfossintático do português contempla essa
A GDF identifica os casos de anáfora zero com a categoria de núcleo ausente (Absent
Head) que se opõe à categoria de núcleo vazio (Empty Head). Observem-se (6-3a) e (6-3b):
250
entre a descrição precedente o pintor, representada pela variável coindexada para indivíduo
(xi). Como em (6-3a) o núcleo da segunda oração está simplesmente ausente, é essa variável
em si mesma que explica o processo de designação. Em (6-3b), por outro lado, ausência de
menção estabelece uma relação anafórica com a propriedade homem antes mencionada, que é
representada pela variável coindexada para propriedades (fi), conforme a representação em (6-
3c):
(6-3)c. (xi: [fi: homem(fi)) (xi) ] : [(fj: honesto (fj)) (xi) ]).
Nessa segunda situação, há uma posição de núcleo dentro da camada-x, mas ela é
preenchida com a variável propriedade, não com um material lexical, como ocorre nas
situações de ausência de núcleo como (6-3a). Trata-se em (6-3b) de um caso de núcleo vazio.
logoforicidade do babungo é mediante o uso de zeros anafóricos, que a GDF representa como
representacional.
morfossintática final da construção, que pode variar conforme a natureza própria de cada
sistema linguístico. Pode-se alegar, portanto, que o grau de universalidade que a teoria
encaixamento.
que designam estados de coisas tendem a requerer complementos mais nominais (e-
orações. Desse modo, juntamente com outras formas dependentes com verbos não-finitos,
Resta-me, para finalizar, realizar um pequeno balanço para avaliar perdas e danos em
relação ao compromisso que este trabalho firmou com a fixação de seu objetivo e os
252
Vale lembrar que o principal objetivo deste trabalho foi o de sustentar a tese de que de
que há uma variação escalar entre dois extremos. Num haveria construções mais verbais ou
O continuum que medeia esses dois extremos seria capaz de fornecer um conjunto de
1988), que se define nos interstícios desse continuum, configuraria uma forte relação de
dados analisados sustentaram fortemente essas previsões, o que justificaria alegar que, no
final, o balanço aponta mais para uma situação de crédito do que uma de débito. Além disso,
as evidências discutidas confirmaram algumas das mais fortes predições funcionalistas. Uma
delas é a de que nada na língua é matéria de tudo ou nada, mas de construções escalares que
radicalizam ainda mais esse princípio por envolverem alternativas preferenciais não
mais opaca em contraposição ao princípio da motivação icônica, que torna a estrutura mais
relação de conexão entre os dois estados de coisas, ela não precisa ser especificada no verbo
compartilham argumentos, também a referência a eles, seja mediante expressão valencial seja
mediante concordância de pessoa, pode ser omitida na construção dependente. Quanto maior
língua, como a que serviu de base para este trabalho, estão muito fortemente propensos a
mostrar grau maior de adequação entre teoria e dados. Nesse aspecto, considero que o saldo
O otimismo que esse balanço gera não significa excluir a discordância do ponto de
vista de outros auditores. Muito pelo contrário, quanto mais debate este trabalho suscitar
maior prova para seu realizador de que outros pesquisadores não são indiferentes aos seus
resultados. Pior que a discordância só a indiferença. Espero que o saldo positivo deste balanço
seja a predição otimista de que esta tese continue a suscitar discussão e como todo trabalho de
grau seja, como o fenômeno investigado, um continuum, mas num sentido diferente, de estar
sempre dialogando com outros textos similares num processo contínuo de elaboração que não
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Autorizo a reprodução xerográfica para fins de pesquisa.
LILIANE SANTANA