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0981 h = 2.ed. 104768/IFCH Leandro Konder, ‘um marxista universal. Nascido em Petropolis, RI, em 1936, {illo de Valério Konder, médico comu- nista, Leandro teve o primeiro conta: to com 05 ideais manistas durante a juventude, em sua prépria casa, onde intelectuais do Partido Comunista se reuniam, Tanto que ele militou dos 15 208 47 anos no partido, © que era apenas ur interesse juvenil gerou uma extensa produsdo que tem sido estimulo intelectual significative para vérias geragbes, constituindo-se em referencial imprescindtvel para todos ‘que pretendem urn conhecimento mais sélido da realdade brasileira. Além dos indmeros artigos publicados no Brasil no extetior e das traducies de auto- res mandstas, como © hingaro Georg Lukécs, € autor de caudalosa e diversi ficada biblografia em que se destacam: “"Marsismo @ alienacdo” ~ Contribui «Bo para um estudo do conceito mar- vista de alienacdo (1965). Reeditado erm 2008 pela Editora Expressao Popular. "Os manristas @ a arte” ~ Breve estudo hist6rico-critico de algumas tendéncias da estética marxista (1967), “IntroducSo ao fascismo" (1977). Ree- ditado em 2009 pela Edltora Expresso Popular “A democracia € 0s comunistas no Brasil” (1980) ‘0 que & dialética” (1981) "O marxsmo na batalha das ideias” (1984), Reeditado em 2009 pela Edito- «a Expressio Popular “A derrota da dialética ~ A recepcéo das ideias de Marx no Brasil até o come- {G0 dos anos 30” (1988). Reeditado em 2009 pela Ecitora Expressdo Popular. Intelectuais brasileiros eo marxismo” (1990). “O futuro da filosofia da praxis” ~ 0 pensamento de Marx no século XX! (1992). “Flora Tristan: Uma vida de mulher, uma paixéo socialista” (1994). “A poesia de Brecht e a histéria” (1996) “Qs sofrimentos do homem burgues” (2000). Digna de nota sua incurséo pela ficgao em “Bartolomeu” (1995) € “A morte de Rimbaud” (2000). Por causa da luta poltica, e com a di- tadura militar em seu encalco, na dé- Leandro Konder HISTORIA DAS IDEIAS SOCIALISTAS NO BRASIL gh gas UNIDADE, AF NY CHABADA 232.0 533! v. ed, rouse ach 104% 8 proc._teo fiery cl oe x f 0 Pe 1 t Copyright © 2008, by Elitora Exeressdo Popular a gt | own] © | Projeto grafico, diagramacio e capa: cap, 1H S625 Se Zap Design Revisdo: Geraldo Martins de Azevedo Filho, Maria Fernanda de Almeida Prado Campos, Orlando Augusto Pinto. Pesquisa de imagens e edigio de textos: Garlito de Campos, Geraldo Martins de Azevedo Filho, Vladimir Sacchetta, Fotos ¢ ilustragées: = ACERVO ICONOGRAPHIA, com exclusio do abaixo identificado, ~ACERVO MST (p. 70 - Jodo Amazonas: p. 75 Paulo Freire, foto de Ana Maria Aratjo Frere: p. 87 ~ Encruzilhada Natali, foto de Juan Carlos Gomes; p. 91 ~ Marcha Nacional, foto de Paulo Pereira Lima). ~ACERVO DIRETORIO NACIONAL DO PT (p. 72 - Herbert José de Souza, foto de Roberto Parizott p. 87 ~ Convencéo Nacional do PT, foto de Milton Guran; p. 89 ~ Florestan Fernandes) Andrew St.George (p, 80 Mulheres querrilheiras). = Sebastido Salgado (p. 93 - Ccupacdo da Fazenda Pinhal Ralo) impresséo e acabamento: ‘Cromosete Konder, Leandro ke2h Historia das ideias socialistas no Brasil / Leandro Konder, ~ Sao Paulo : Expres- 80 Popular, 2003. 96 p. Qi ISBN 85-87394.42-8 1. Socialismo - Histéria. 2. Socialismo - Brasil. |, Titulo. COD 21.ed. 320.5310981 Blane M.S, Jovanovich CRB 9/1250 ‘Todos 05 direitos reservados. Nenhuma parte deste tivro pode ser utiizada ou reproduzida sem a autorizacao da editora, 2 edicao: maio de 2010 EDITORA EXPRESSAO POPULAR LTDA Rua Aboliceo, 197 CEP 01319-010 ~ Sao Paulo-SP Fone/Fax: (11) 3105-9500 vvendas@expressaopopular.com.br ‘www.expressaopopular.com.br SUMARIO Introducao 1-0 que tem sido 0 socialismo 2 ~ As ideias socialistas chegam ao Brasil 3 — Os comunistas brasileiros 4~Do golpe de 1937 ao golpe de 1964 5 ~ Da ditadura militar aos nossos dias, 25 4 59 7 INTRODUCAO 0 que os seres humanos pensam depende do que eles fazem, e depende também de como eles vivem. A histéria das ideias ¢ sempre parte da histéria geral da sociedade, e sé faz sentido quando relacionada ao movimento global da transformagao social. Para entendermos os pensamentos e as representacdes da realidade, precisamos enxergar na cultura aquilo em que ela reflete a vida pratica: as, condicdes da existéncia material dos homens. Esse condicionamento da produgao cultural pelas tensdes internas do quadro em que funciona a produgdo de bens materiais, na sociedade, constitui o que alguns costumam chamar de “dimensao ideolégica da cultura”. A histéria das ideias & assim, uma historia de ideo- logias. Mas a ideologia néo é um acompanhamento mecanico automatico, das atividades pra- ticas; nao ¢ mera reproducdo ou o registro passivo, na consciéncia, das ages que os seres humanos realizam, (Al/eonseiéncia nao s6 0 plano em que os homens percebem as coisas, mas também © plano em que eles fazem suas escolhas e tomam suas decisdes. Como observou 0 historiador francés Georges Duby, “a ideo- logia nao é reflexo do vivido, mas um projeto de agir sobre ele”. Por isso, na sua riqueza, a histéria das ideias nao se deixa reduzir a um simples apéndice da histéria econdmica ou da histéria A dase oper constitu a base ea eferEncia dos politica. Na histéria das ideias, muitas vezes somos desafiados a observar (e a tentar compreender melhor) os esforos do pensamento de pessoas que nao tiveram participagio destacada nas instituigdes e organizagdes que fizeram, com maior eficdcia, a histéria politica ea histéria econémica. Procurariios levar isso em conta quando, nas paginas seguintes, evocamos os sonhos, os anseios e os projétos de pessoas que, hoje em dia, andam um tanto esquecidas. Mas merecem ser lembradas. Por outro lado, nao teria sentido transformar este livro num elenco infindavel de nomes, uma espécie de catdlogo de todos os que fizeram a historia das ideias socialistas no Brasil. Por mais completo (e cansativo) que fosse o rol, as omissdes seriam inevitaveis; muita gente altamente significativa, de qualquer modo, ficaria de fora. Contudo, nosso objetivo nao era esse (nem poderia ser). 0 que queriamos, realmente, era contribuir para que os estudantes se aproximassem da histéria das ideias socialistas no Brasil, nao através de uma exposi¢ao caluniosa ou “triunfalista”, n&o por meio de um relato escrito para denunciar erros ou exaltar acertos, ¢ sim pela leitura de um texto capaz de ajudé-los a refletir sobre as grandes questdes (nao resolvidas) que aparecem na historia aqui abordada. 1-0 QUE TEM SIDO O SOCIALISMO O que é socialismo? A politica é uma atividade que costuma despertar muitas paixées. Por isso, os con- ceitos politicos frequentemente sao discutidos de maneira acalorada por pessoas que ndo esto de acordo a respeito deles. 0 conceito de socialismo, por exemplo, tem sido tema de muitas polémicas, De maneira geral, podemos dizer que 0 socialismo é um (@HSHeHO Hpico da histone Antes do aparecimento dos socialistas, houve muita gente que protestou contra as desigualdades sociais, contra a con- centracio da riqueza em poucas mios. Os profetas do Velho testamento ja condenavam o egoismo dos ricos, a falta de sensibilidade dos poderosos diante dos sofrimentos dos pobres. Cristo, nos Evangelhos, dizia: “Nao podeis servir a Deus ¢ a0 dinheiro”. E depois afirmava: “E mais facil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mateus, 19; Marcos, 10; Lucas, 18). Na Roma antiga, os irmaos Tibério e Caio Graco, no segundo século da Era Cristi, foram eleitos tribunos do povo ¢ tenta~ ram reformar as condigdes da produgdo agricola, facilitando a aquisigao de terras pelos pobres ¢ contrariando os interesses dos grandes proprietarios; porém, foram assassinados. Numa historia das lutas contra as injustigas sociais, muitos nomes mereceriam ser lembrados. No entanto, o socialismo, com o sentido que a palavra tem nos nossos dias, s6 inaugurou ‘campesve romana, —— 9 —_ REVOLUGAO FRANCESA (1789-1799) culottes), que ern Paris somavarh cerca de 600 mil. Situada no quadro das revolugées burguesas que A Queda da Bastiha (14 /7/1789) constitu-se no caracterizaram 0 Ocidente, nela surgiram os conceitos _primelio passo desse importante movimento, de esquerda e direta, a primeira Assembleia Nacional que se estendeu durante dez anos, num processo Constituinte e a pratica do terror e da quetra revolucionario consolidado apenas em 1799 com a revolucionéria. Apesar de ter levado a burguesia lideranca politica-miitar de Napoledo Bonaparte. A 0 poder politico, a revolugéo nao fol somente Franca deixou de ser absolutista e feudal. Estavam bburguesa, contando também com a participagao de _abertas as partas para o desenvolvimento do ‘camponeses e da massa de pobres urbanos (sans- capitalism. uma nova etapa nessa histéria depois da Revolugio Francesa. Quer dizer: sé apareceu em cena no final do século 18. 0 socialismo surgiu como um continuador da luta contra as injustigas sociais, porém introduziu nessa luta um elemento novo: programa politico defendido pelos socialistas, em nome das necessidades vitais da comunidade, passou a impor restrigdes aos direitos dos proprietarios particulares. Vamos ver como essa nova historia comegou. Liberalismo e democracia 0 século 18 foi chamado de “Século das Luzes". Muitos escritores daquele tempo estavam convencidos de que as luzes da razdo iriam dissipar as trevas da ignorancia e da superstigéio, de modo que os seres humanos superariam todos os seus preconceitos € viveriam num mundo melhor. Esse otimismo (palavra criada no comeco do século 18) e essa confianga no progresso animavam o pensamento liberal, representado pelos filésofos mais avangados da época. rc 0 movimento do liberalismo correspondia aos inte- | Asidelasituministas infuenciaram | resses da burguesia, quer dizer, refletia os anseios dos ‘movimentos como a Independencia . ducal 7 dos Estados Unidos, alnconfidéncia | CoMerciantes ¢ industriais, que ndo se conformavam Mineita ea Revolugso Francesa com as leis ¢ as instituigdes da sociedade feudal, que ~ os reis e os nobres insistiam em manter em funcio- namento. Os burgueses, em geral, tendiam a achar que uma pessoa vale pelo que faz, por sua habilidade individual, por sua capacidade de ganhar dinheiro, por seu espirito empreendedor, ¢ nao por seus titulos nobiliérquicos, pelo fato de ser bisneto de algum nobre ou em consequéncia de um pretenso “sangue azul" que Ihe correria nas veias... Os liberais Iutaram por novas € maiores liberdades para os cidadaos. Eles exigiram, por exemplo, que os camponeses deixassem de ser servos da gleba, isto é, que tivessem o direito de sair do campo e ir para as cidades, em busca de trabalho nas induistrias que estavam se desenvolvendo. Com os acontecimentos da Revolugao Francesa, entretanto, 05 liberais levaram um susto, Muitos deles tiveram a impressaio de que o stibito aumento da participacao popular na vida politica havia desencadeado tumultos prejudiciais a causa da liberdade. Para esses liberais, 0 ressentimento decorrente da exploracao e da opressio a que estiveram submetidas as massas popula- | | a " res levou-as a exigir mudancas bruscas, insensatas, para criar Jean-Jacques Rousseau uma igualdade impossivel de ser efetivada na sociedade. Com. Suigo, em 1742 foi para Pars isso, a participacdo popular acabou por danificar as delicadas € vinculou-se ao movimento instituiges da democracia liberal: destruiu a harmonia dos Huminist. Publicou 0 Discurso poderes (Legislativo, Executivo e Judiciario) ¢ abriu caminho 5722s

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