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Explorando Momentos de Generos Inconform
Explorando Momentos de Generos Inconform
Resumo
Abstract
2 O relatório do projeto 'Transrespect versus Transphobia' (Transrespeito contra Transfobia), “Reported Deaths
of 816 Murdered Trans Persons from January 2008 until December 2011” (Mortes Registradas de 816
Pessoas Trans Assassinadas entre Janeiro de 2008 e Dezembro de 2011) traz informações mais detalhadas
sobre algumas destas violências (TvT, 2012).
3 Posição profissional que também se articula a vários outros privilégios sociais que marcaram minha
subjetividade, como a branquitude, o acesso a recursos educacionais, meu gênero legitimado, entre outros.
gastos e maior independência de minha família – independência que, em minha
percepção, poderia ser ameaçada caso aceitasse sua ajuda financeira (apesar dela
ter sempre sido oferecida sem quaisquer contrapartidas). A busca por trabalho,
entretanto, agora era complicada pelo 'fator trans*': embora tivesse recursos vários
que me posicionavam bem no mercado de trabalho – como um diploma socialmente
tido como 'bom' e experiências profissionais –, inseguranças significativas passaram
a fazer parte deste processo. Entre elas, dúvidas em relação ao(s) nome(s) a
ser(em) utilizado(s) nos currículos, a angústia de saber que minha presença trans*
irá chocar ambientes normativos, e as reflexões sobre que estratégias políticas
utilizar para tratar de minha identidade de gênero inconforme caso necessário – e
provavelmente será necessário.
Atualmente, atribuo a estas difíceis inseguranças ter realizado uma busca por
trabalho que avalio como medíocre. Compreendendo-as como resultado discursivo
de uma incipiente inserção e autoidentificação como mulher – e, particularmente,
uma mulher trans* – em um entorno social profundamente cis+sexista e transfóbico,
pude perceber como os processos normativos trouxeram desestímulos
consideráveis para que eu procurasse oportunidades profissionais em minha área de
formação e experiência (ciências econômicas, auditoria interna, planejamento
econômico, hoje áreas que parecem um pouco distantes de minha realidade trans*).
Dessa forma, concentrei minha procura de emprego em setores que imaginei (a
partir de certos estereótipos sociais, entre outros fatores) serem mais abertos a
identidades e expressões de gênero inconformes, em particular o da hospitalidade
(hoteis e restaurantes, por exemplo), e onde supus que minhas qualificações
poderiam suplantar eventuais impulsos discriminatórios.
Foi assim que, ao tomar conhecimento da abertura de vagas em um restaurante que
estava por ser inaugurado, decidi me inscrever para a função de atendente de
restaurante. A primeira etapa da seleção aconteceu em um hotel no bairro em que
se localiza o restaurante, de caráter fundamentalmente turístico e de entretenimento.
Decidi que iria, pela primeira vez em ocasiões do tipo, me apresentar em meu
gênero feminino: o nervosismo é intenso, mas tudo corre bem enquanto as pessoas
candidatas nos acomodamos nas carteiras para o preenchimento das fichas de
inscrição. Minha identidade de gênero inconforme passa a se destacar quando
algumas pessoas são chamadas para uma breve entrevista com futuros gerentes, e
eu estou entre elas: o trato dispensado pelo entrevistador é respeitoso (e, até onde
me recordo, incluiu meu chamamento como viviane), ainda que seu desconforto com
a presença 'inusitada' de uma pessoa transgênera fosse visível. Ele me informa que
entrarão em contato comigo para as próximas etapas do processo seletivo.
Posteriormente, em caderno de anotações, descrevo a situação como “melhor que o
esperado, com estranhamentos discretos e respeito”, percebendo também como
“certos privilégios me auxiliaram nisso”, particularmente minhas qualificações
profissionais e minha passabilidade como pessoa cisgênera 4.
Alguns dias depois, sou chamada para uma prova e uma entrevista com a
proprietária do restaurante. Desta vez, decido ir vestida de maneira socialmente
percebida como masculina: camisa, calças e sapato sociais. À chegada para a
realização da prova, a pessoa que a administra, gerente do restaurante, me faz
várias perguntas sobre minha identidade de gênero, incluindo-se curiosidades sobre
minha 'transição'5. Apesar do tom respeitoso, não posso evitar a percepção da
inutilidade (dados os propósitos profissionais de minha presença) e invasividade das
perguntas, que respondo de maneira forçosamente cordial. Após terminar a prova,
sou chamada pela proprietária para uma breve conversa.
Nesta entrevista, a proprietária faz questão não somente de afirmar que 'gostou de
mim' e que eu 'tinha o perfil do restaurante', mas particularmente de aprovar as
vestimentas (tidas como 'masculinas') que utilizava no dia. Interpretando seu 'gostar
de mim' como o conforto com alguns de meus (aparentes) alinhamentos normativos
– como a respeitabilidade, a branquitude, a adequação a certos critérios corporais
estéticos e funcionais, as qualificações 'acima' dos requisitos da função, entre outros
–, sua aprovação de meu crossdressing 'como homem' não passava de mais um
exercício de normatização que se explicitaria na frase “Prefiro que você trabalhe
como [meu nome civil masculino]”. Ciente de que sua 'preferência' era um
eufemismo que camuflava relações de poder desiguais, assenti dizendo que,
naquela etapa de minha 'transição', tanto um nome quanto outro ainda serviam,
ressalvando que esta era uma situação que poderia se alterar. Ela prometeu
4 Tomo a 'passabilidade cis' como a invisibilidade contingencial que alguns gêneros inconformes (trans*, mas
não somente) possam experimentar. A passabilidade enquanto pessoa cisgênera configura um privilégio, em
uma sociedade cissexista e transfóbica. Nas palavras de Hailey Kaas (2013): “O termo 'passar' significa que
algumas pessoas trans* 'passam como cis' dentro da lógica social ciscêntrica. Ou seja, que no geral, em
situações cotidianas, essas pessoas não são percebidas como sendo trans*, de acordo com um conjunto de
critérios cissexistas (aparência, por ex.)”.
5 'Transição' é um termo comumente utilizado para designar alterações corporais e sociais relacionadas ao(s)
gênero(s) percebido(s) de diversas pessoas transgêneras. Pode ser problematizado por se associar a ideias
de 'antes e depois' e de gênero como algo binário ('homem que virou mulher'), nem sempre aproximações
tidas como válidas por pessoas transgêneras.
mantermos um 'diálogo aberto e sincero' a respeito do assunto.
Devido a questões acadêmicas, somente iniciei no restaurante alguns meses depois
de sua inauguração, passando por um novo processo seletivo. Novamente, me foi
reforçado que eu trabalharia como 'homem', ao mesmo tempo em que havia um
esforço de construção de um discurso, por parte da proprietária, de que esta
exigência era feita para “me proteger” (curiosamente, sem me consultar sobre quais
formas de proteção eu considero pertinentes) e que eu me sentiria bem naquele
ambiente de trabalho 'respeitoso às diversidades', por estar 'cheio de gays e
lésbicas', quase me levando a agradecer pelo supostamente generoso gesto de me
empregar6. Os esforços autoetnográficos que proponho neste artigo são, em certo
sentido, uma forma de desconstrução destas proposições, e uma tentativa de pensar
nas maneiras que minha identificação enquanto pessoa transgênera influenciaram
minha inserção no restaurante, tomando em consideração, também, outros
posicionamentos subjetivos, como classe social, raça-etnia socialmente percebida, e
acesso a recursos educacionais e culturais.
Estruturo o artigo da seguinte maneira: a seguir, discuto brevemente como uma
perspectiva autoetnográfica trans* pode ser relevante no contexto acadêmico
contemporâneo, para posteriormente apresentar um esquema simplificado do
espaço social do restaurante. A partir daí, seguem-se algumas reflexões preliminares
sobre alguns episódios ocorridos durante minha experiência profissional, bem como
algumas conclusões esboçadas a partir deles. As análises propostas aqui são
fundamentadas, especialmente, em perspectivas anticoloniais e dos estudos
transgêneros (transgender studies).
6 Inspiro-me em algumas palavras de Malcolm X para desconstruir esta suposta generosidade: “Como você
pode agradecer a uma pessoa por lhe dar o que já é seu? Como, então, você pode lhe agradecer por lhe dar
somente parte do que é seu?” (X, 1964)
percebidas por mim e por outras pessoas, sobre minhas possibilidades econômicas
e profissionais, entre vários outros aspectos. Sendo assim, acredito que a realização
de um esforço autoetnográfico, que consiste em “aproveitar e fazer valer as
'experiências' afetivas e cognitivas de quem quer elaborar conhecimento”
(SCRIBANO & SENA, 2009, tradução minha), pode servir adequadamente às
minhas inquietações intelectuais e políticas tão entrelaçadas com minha vivência
transgênera.
Tomando-se em especial consideração o contexto histórico contemporâneo, que
imagino poder ser caracterizado como de colonização das vivências, percepções e
identificações de gêneros que sejam inconformes, em variadas formas, à
normatividade cisgênera7 – colonização que se instaura de forma intersecional 8 a
outros vetores normativos, como raça-etnia, classe social, padrões corporais, etc. –,
considero o processo de construção autoetnográfica como um projeto político que se
opõe criticamente a alguns aspectos de inspiração colonial que Sandy Stone
(1991:163, tradução minha) percebe na relação de pessoas trans* com o
establishment médico, onde “o fascínio inicial com o exótico, [que se estende] a
pesquisadorxs profissionais” coexiste com uma situação em que pessoas trans* 9
“não têm voz nessa teorização [de gênero]” e são vistas como possuidoras de “algo
aquém de agência”, pessoas “infantilizadas, consideradas ilógicas ou irresponsáveis
demais para alcançar uma verdadeira subjetividade, ou clinicamente apagadas por
critérios diagnósticos”. Esta percepção de oposição política e, acima de tudo, da
relevância de uma perspectiva autoetnográfica trans*, é reforçada por uma análise
mais centrada na teorização social sobre pessoas trans* realizada por Katherine
Cross (2010, tradução minha):
Tudo isto se faz manifestar no fascínio que algumas pessoas teóricas
têm conosco, fetichizando as exóticas pessoas trans que elas veem
em suas mentes como inerentemente radicais ou conservadoras,
negando que as autocompreensões individuais das pessoas trans
são importantes […], e crendo que as ideias articuladas na medicina,
psiquiatria ou na academia patriarcalmente controladas podem de
alguma forma nos salvar. Permeando tudo isso […] está a ideia de
7 Esta caracterização é trabalhada no artigo “Pela descolonização das identidades trans*” (V., 2012).
8 A intersecionalidade é uma importante perspectiva defendida, particularmente, por pensadoras negras
feministas. “A tendência a se tratarem raça e gênero como categorias mutuamente exclusivas de experiência
e análise” (CRENSHAW, 1989:139) é objeto central desta perspectiva, mostrando as limitações de
tratamentos unidimensionais e propondo uma crítica profunda às lutas antirracistas e antissexistas que se
utilizam deste tratamento. Este raciocínio também pode ser ampliado para diversos outros vetores
normativos.
9 Ampliando o que Stone conceitua, em seu contexto, como 'transexuais' ('transexuals', no original). Para os
efeitos desta reflexão, acredito que não haja problemas nesta ampliação.
que nós não podemos falar ou agir por conta própria, de que nós
nunca poderemos ser produtorxs adequadxs de conhecimento sobre
nossas próprias vidas.
Uma autoetnografia trans* crítica é uma proposta, portanto, que procura “reconhecer
que a presença dos pontos de vista de quem pesquisa pode favorecer a captação de
experiências não acessíveis desde outra perspectiva” (SCRIBANO & SENA, 2009),
considerando particularmente importante que haja, à diferença da maior parte da
produção acadêmica relacionada a identidades de gênero, uma teorização que parta
de um ponto de vista trans* comumente tido como perspectiva válida somente
enquanto 'campo'10 a ser filtrado pela pessoa pesquisadora não trans (ou cis). A
autoetnografia, assim, é uma “estratégia experiencial” que se configura em “uma
possibilidade de incorporar minha voz e realizar uma leitura atenta de vozes
múltiplas” (ibid.), com a intenção de analisar como a presença de uma existência
abertamente trans* afetou o espaço e as pessoas do restaurante em que trabalhei.
Sendo assim, espero poder, através do esforço autoetnográfico que se esboça neste
artigo, “enriquecer e adicionar credibilidade à pesquisa […] de uma população
marginalizada e bastante específica” (SMITH, 2005:6, tradução minha).
A seção a seguir procura esboçar o espaço do restaurante em que trabalhei,
delineando os elementos que, esquematicamente, considerei relevantes para a
análise autoetnográfica.
10 Em um projeto sobre pessoas trans* de que participei, um antropólogo, diante de um questionamento crítico
que fiz, inferiu que tal questionamento foi possibilitado por eu ser, em sua opinião, 'o campo', uma percepção
limitada que analiso como resultado discursivo da exclusão ou inserção subalternizada (enquanto 'campo') na
academia, ignorando minha perspectiva sobre estas questões (também) enquanto pessoa acadêmica.
de relacionamento social que ocorrem no espaço do restaurante, em uma
perspectiva que está alinhada à concepção de como “espaços são organizados para
sustentar relações sociais desiguais e como essas relações conformam os espaços”
(RAZACK, 2002:01, tradução minha). Neste sentido, espero que o esquema
simplificado seja útil para as reflexões propostas no artigo, e que também promovam
um olhar intersecional que as complexifique para além do vetor normativo ligado a
identidades de gênero – também destacando, assim, questões relacionadas a como
este espaço é diversamente ocupado em termos de classe social, raça-etnia e
sexualidades, e de que maneira estas presenças dialogam com identidades de
gênero inconformes.
Para os propósitos deste artigo, sugere-se a seguinte estruturação analítica do
restaurante:
Áreas de suporte, compreendendo estoques, áreas de atividades
administrativas e de uso de funcionárixs (vestiários, área de alimentação);
Cozinha, que pode ser subdividida em dois subespaços: o da preparação de
ingredientes e o da preparação de pratos;
Salão, subdividido entre áreas do bar, das mesas e da recepção de clientes.
A partir de tais elementos, faço alguns apontamentos sobre sua ocupação social:
a maior presença de pessoas racializadas conforme se passava do salão
para o interior do restaurante. Duas exceções são o pessoal de limpeza de
salão (predominantemente composto por pessoas não brancas) e
administrativo (predominantemente composto por pessoas brancas).
a existência de uma certa divisão de gêneros entre as atividades de cozinha:
nas atividades de preparação dos ingredientes que servirão de base para
preparações posteriores, há uma presença maior de mulheres (cis), enquanto
na preparação dos pratos predominam homens (cis). Em ambas áreas da
cozinha, a presença de pessoas racializadas é predominante.
as proporções aproximadamente iguais de homens e mulheres (cis) na
limpeza das áreas internas, excetuando-se a parte de limpeza de utensílios
de cozinha, composta somente de homens (cis). A predominância também é
de pessoas racializadas.
alguns alinhamentos normativos mais presentes entre as pessoas do salão
(excetuando-se, no geral, as pessoas envolvidas em sua limpeza), como por
exemplo em relação aos padrões dominantes de beleza e faixa etária, ou em
relação a padrões de consumo dominantes. Também é um grupo mais
branco, como sugerido anteriormente, e sem predominâncias acentuadas de
gênero, à exceção da recepção, exclusivamente composta por mulheres (cis).
finalmente, compreendo minha inserção neste espaço social enquanto
atendente de restaurante como não destoante, no geral, em parte devido à
branquitude socialmente perceptível em mim e a privilégios relacionados a
classe social, portanto estabilizando, em certo sentido, o perfil da ocupação
social do restaurante de um ponto de vista étnico-racial e de classe, apesar
de minha inconformidade de gênero.
Um pouco depois de iniciar meu treinamento, soube que, antes de minha entrada, a
administração decidira fazer uma reunião com as pessoas trabalhadoras do
restaurante para 'expor a situação', isto é, para dizer que, em breve, haveria uma
pessoa transgênera na equipe. Não estando presente a esta reunião, escutei em
alguns relatos que a reunião teve o propósito de enfatizar o respeito a mim enquanto
pessoa, assim como de reiterar que meu tratamento naquele espaço seria
unicamente enquanto homem. Relataram, ainda, que nesta reunião as pessoas
foram informadas de que esta preferência de tratamento teria sido escolhida por mim
– o que é uma versão bastante questionável diante das conversas que tivemos,
onde a 'preferência' da administração fora explicitamente colocada.
Em outra ocasião, preocupei-me com o teor que tal reunião possa ter tido. Em certo
momento, depois de aproximadamente 3 meses de trabalho, o restaurante foi
obrigado a contratar pessoas portadoras de deficiência 11, e uma outra reunião para
'expor a situação' foi convocada. Nela, efetivamente se falou da necessidade de se
11 Ver o artigo 93 da lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, sobre as exigências legais para contratação de
pessoas portadoras de deficiência. (CÂMERA DOS DEPUTADOS, 2013:106).
respeitarem as pessoas que estariam por chegar, porém a partir de um tom
condescendente, como se o respeito estivesse condicionado à percepção destas
pessoas como 'coitadas'. Adicionalmente, enfatizou-se a importância de se prestar
atenção ao comedimento nas 'piadas', pois seriam pessoas 'muito inocentes' que
talvez se 'magoassem' por não entenderem que, afinal, 'piadas são piadas'. O
detalhe é que, nesta mesma reunião, a proprietária denominou, como 'piada', uma
das pessoas funcionárias (não deficiente) como alguém que seria 'menos
desenvolvida intelectualmente', levando a uma certa descontração problemática.
Talvez as ofensas capacitistas não tenham atingido a todas as pessoas, e eu me
perguntava se 'piadas' similares não teriam acontecido sobre a 'travesti' ou
'transexual' que estava, poucos meses antes, para entrar no restaurante.
De todas maneiras, desde o início me propus a ir para o trabalho me apresentando
como mulher. Foi um processo complicado pelo fato de eu não estar acostumada a
fazer desta apresentação de gênero algo cotidiano: até então, apresentar-me
socialmente como mulher era ocasional. No entanto, considerei a adoção cotidiana
daquela performatividade de gênero feminina como um ato político de
desestabilização, e como uma forma de resistência à obrigatoriedade de, no
trabalho, ter de me apresentar como homem.
Este ato político não se estabeleceu sem resistências conservadoras. Apesar de, em
meu primeiro dia de trabalho, uma pessoa da gerência ter me orientado a utilizar o
vestiário feminino, e de isso ter sido aparentemente tranquilo, no terceiro dia uma
outra pessoa da gerência, sob ordens da proprietária, me solicita que eu utilize o
vestiário masculino, e que eu não utilize os pequenos brincos (femininos) que estava
usando. Anoto em caderno que “me sinto afrontada com a forma pela qual se deu o
'repasse da ordem' – sem me pedir opinião”, e que fico “ansiosa sobre as [...]
mudanças corporais” que estavam acontecendo. Aquilo não parecia em nada
próximo, afinal, ao 'diálogo aberto e sincero' que se me havia prometido.
No entanto, aproximadamente 20 dias depois desta 'ordem', a proprietária me
chama para uma conversa em que “diz que as meninas do restaurante a procuraram
e pediram a ela que eu utilizasse o vestiário feminino […]. [Eu] [f]ico emocionada, e
escrevo um agradecimento a elas” (anotações de caderno). Este talvez tenha sido
um dos momentos mais emblemáticos nesta minha experiência profissional: ter
recebido o apoio de mulheres (cis) que legitimavam meu uso do vestiário adequado
e, de alguma forma, minha identidade de gênero, configurou um profundo exemplo
de sororidade fundamentado na minha consideração enquanto mulher. Como havia
mencionado no agradecimento que escrevi, este importante posicionamento político
estava alinhado aos Princípios de Yogyakarta 12, o que é particularmente importante
em um cenário histórico de constante desrespeito a existências não cisgêneras. Em
minha leitura, ainda, este apoio também esteve significativamente associado a meus
posicionamentos subjetivos em outros vetores normativos, tais como minha
passabilidade como mulher cisgênera e meu comportamento tido como 'respeitável'.
De todas maneiras, deste dia em diante até o dia em que pedi demissão, somente
utilizei o vestiário feminino, à exceção de alguns momentos de pressa em que recorri
ao velho vestiário masculino que tinha cabine disponível. Abafa.
12 Os Princípios de Yogyakarta são “uma série de princípios jurídicos internacionais sobre a aplicação da
legislação internacional de direitos humanos às violações baseadas em orientação sexual e identidade de
gênero”, “em resposta a quadros documentados de abusos”, o que inclui “assassinatos extrajudiciais, a
tortura e maus tratos, as agressões sexuais e estupros, as ingerências na privacidade, as detenções
arbitrárias, a negação de emprego ou de oportunidades educativas.” (ICJ, 2007, tradução minha)
eixos: o estético, o de gênero e o étnico-racial. Evidentemente, estes eixos são
intersecionais, com diferentes composições de acordo com o contexto. Faço breves
observações sobre eles a seguir:
o eixo estético: com frequência, clientes (especialmente mulheres cis) me
perguntavam sobre minhas sobrancelhas feitas de forma 'feminina', ou me
faziam elogios do tipo “você é muito bonito”. Percebo que meu alinhamento a
determinados padrões estéticos dominantes é elemento importante na
aceitação de uma pessoa supostamente 'homem' que utiliza de 'ferramentas
de gênero' para construir feminilidades, como maquiagem – a minha era leve,
porém marcadamente feminina, com lápis de olho, rímel, blush e batom.
o eixo de gênero: os estranhamentos de gênero mais comuns vinham de
clientes com quem não interagia diretamente: acontecia de ser chamada
como 'moça' por várias destas pessoas. Nas interações diretas – como nas
mesas que eu atendia –, e até mesmo pelas condições a mim impostas,
minha identidade enquanto 'homem' era pouco questionada, ou talvez
indiretamente questionada através das perguntas e afirmações relacionadas à
estética (o eixo anterior) ou a minhas origens étnico-raciais (o próximo eixo).
O eixo étnico-racial: minhas origens étnico-raciais foram objeto de frequentes
perguntas de clientes. De maneira compreensível em se considerando o
contexto da cidade de Salvador, Bahia, este estranhamento era bastante
associado à leitura de minha pessoa como proveniente de outra região (mais
ao sul) do Brasil. Infelizmente, meu serviço, quando considerado bom, se
constituía em elemento de reforço a certos preconceitos de ordem racista ou
regionalista – 'ah, então é por isso que você é tão educadinho', 'por isso que
você é tão atencioso' e quetais. Interpreto, ainda, que há uma racialização de
gênero que tende a reduzir o estranhamento de gênero de um corpo 'tido
como de homem' que demonstra sinais de feminilidade: me parece algo
associado à feminilização estereotipada de homens leste-asiáticos.
Babas
'Bater um baba' é uma expressão comum na Bahia para uma partida de futebol
informal. Em um dado momento no final de janeiro, pessoas – principalmente do
turno da noite, e em particular duas mulheres (cis) – começaram a organizar o 'baba'
em algumas madrugadas, após o fechamento do restaurante. No geral, os jogos
começavam às 3 da manhã e se estendiam até o nascer do sol, pelas 6.
Fiquei verdadeiramente entusiasmada em poder jogar esses babas: além de gostar
bastante de futebol, seria uma das primeiras possibilidades de jogar após minha
decisão de buscar me apresentar cotidianamente como mulher transgênera –
decisão que, dado o cis+sexismo dominante, me afastava de babas pelo receio de
violências transfóbicas e sexistas. E assim, com um certo medo de que jogar o baba
poderia colaborar para minha invalidação como mulher – afinal, no Brasil, jogar
futebol é algo tido como 'masculino' –, aguardei ansiosa para jogar.
Recordo-me estar bastante insegura antes do primeiro baba. Diante do espelho, era
doloroso pensar que minha identificação enquanto mulher poderia estar em (ainda
maior) risco de deslegitimação ao vestir minha camisa do Barcelona, short e tênis de
futebol – ainda que houvesse alguma alegria com o fato de, devido ao acesso que
tive a certos procedimentos e substâncias, me sentir confortável com um certo nível
de 'passabilidade cis' que me legitimava, se não como uma mulher inquestionável,
ao menos como uma mulher trans*. Pensando em elevar um pouco essa sensação
de conforto, uso maquiagem leve e meu 'top de ginástica' de maior bojo, coloco um
som, inspiro(-me) e saio de casa.
Percorro a distância entre minha casa e a quadra, localizada na orla de Salvador a
aproximadamente 10 minutos de corrida leve. É um caminho conhecido por mim,
devido ao meu costume de correr ali; o vazio das 3 da manhã, contudo, associado
às percepções de perigo que permeiam a área, me amedronta. Corro de forma
contida e bastante concentrada, e vou passando por alguns pontos de forte
significado para mim, como a bica onde, certa vez, vislumbrei uma pessoa
aparentemente trans* se banhando de espelho amarelo na mão, e a santa cristã que
acolheu tantos de meus choros ateus. Chego à quadra e fico um tanto constrangida
com os efeitos de minha chegada, que desperta alguns elogios e surpresas que
interpreto como possíveis reações ao que Benjamin Singer caracteriza como o
“sublime transgênero”13 que o corpo de uma mulher trans* em um jogo de futebol
pode incitar: uma presença corporificada e generificada que, por suas incoerências
normativas, excedia as leituras e narrativas dominantes sobre corpos e gêneros.
Neste sentido, reflito sobre que efeitos desestabilizantes a minha performatividade
de gênero (enquanto mulher trans*), junto à minha performance enquanto jogadora
de futebol, poderia ter sobre narrativas e estereótipos dominantes relacionados a
vivências trans*. De forma simplificada, acredito que os babas são espaços
interessantes para que eu, enquanto uma mulher trans* branca, leste-asiática,
passável como cis, com acesso a recursos educacionais e culturais valorizados –
13 O 'sublime' se caracteriza na distinção com o 'belo': enquanto “se diz que a forma da beleza consiste em
limitação […], o sublime desafia o próprio ato de julgamento em si ao sugerir a possibilidade da infinitude”
(SINGER, 2006:614). Desde uma perspectiva trans*, podemos pensar que o sublime se constitui através da
“visível variedade de corpos e gêneros trans [que] excede […] a capacidade cognitiva de sua compreensão.
Este excesso é justamente a condição que possibilita o surgimento do sublime.” (ibid.: 616)
isto é, uma pessoa normativa em vários aspectos – possa provocar rupturas
antinormativas em relação a construções de gênero cis+sexistas que supõem
gêneros pré-discursivos, binários, permanentes, bem como a supremacia das
posições 'cis' e 'homem+macho' nestas estruturas 14.
E, neste sentido, penso que os babas têm sido oportunidades micropolíticas para
fazer com que o 'sublime transgênero' desfaça certos mapas binários de gênero,
centrados naquilo que se chama de 'civilização ocidental' – em uma interpretação
bastante parcial da história 15 –, incapazes e desinteressados em nos situarem em
lugares que não sejam os da abjeção, da patologia, e do imoral.
05. Conclusão
04 de agosto de 2013, aproximadamente 15 horas. Jardim dos Namorados, bairro
da Pituba, Salvador, Bahia. 'Observações do campo'. Chego à quadra onde meninos
(alguns deles, amigos) combinaram de jogar baleô (ou queimada, noutras
localidades). Uso camisa de futebol, short curto de corrida, tênis de futsal. O sol
arde, e as bichas se queimando em baleados. Em duas outras quadras, rolam
babas; a que está adjacente ao baleô parece ser mais competitiva. Cumprimento os
meninos que se sentam à pequena arquibancada assistindo ao baleô, e também os
que já conheço e jogam; mais tarde, soube que perguntaram de mim “quem é a
amapô16”. Sento-me e assisto ao jogo, até que chega um amigo da universidade.
Conversamos, entre outras coisas, sobre frustrações e possibilidades de resistência
acadêmicas, e sobre um texto de Deleuze (1997:9) que fala de Go e Xadrez que,
segundo pensamos, poderia ser pensado desde uma perspectiva trans*:
As peças do xadrez são codificadas, têm uma natureza interior ou
propriedades intrínsecas […]. Elas são qualificadas, o cavaleiro é
sempre um cavaleiro, o infante um infante, o fuzileiro um fuzileiro. [...]
Os peões do go, ao contrário, são grãos, pastilhas [...], cuja única
função é anônima, coletiva ou de terceira pessoa [...]. Os peões do
go são os elementos de um agencia-mento maquínico não
subjetivado, sem propriedades intrínsecas, porém apenas de
situação. Por isso as relações são muito diferentes nos dois casos.
14 Coloco a ruptura como possibilidade, por estar consciente de potenciais reapropriações sistêmicas de minha
presença, como por exemplo no sentido de minha habilidade no futebol ser uma invalidação de meu gênero
(trans*)feminino, reforçando assim o sexismo à brasileira do 'futebol é coisa de macho'.
15 Pensando, por exemplo, na construção da “assim chamada ciência ocidental”, Amartya Sen argumenta que
“[h]á uma cadeia de relações intelectuais que vincula a matemática e a ciência ocidentais a uma variedade de
praticantes evidentemente não ocidentais” (SEN, 2006:56).
16 Amapô é um termo comumente utilizado em círculos sociais 'não cis e não hetero dominados' para se referir
a uma mulher cisgênera, sendo também um adjetivo de uso frequente entre mulheres trans* para se dizer
que ela 'passa por mulher cis', ou, em uma interpretação alinhada a discursos cissexistas, que ela 'está
bonita'. “Você está uma 'mapô hoje, mulher” é um exemplo deste uso entre mulheres trans*.
Isso nos fez pensar em como diversas vivências trans* sobrevivem a partir de
posicionamentos situacionais que, muitas vezes, são percebidos por elas como
estratégias de resistência. Pensei em como, por exemplo, meu(s) gênero(s)
passava(m), especialmente durante a 'transição', de uma função enquanto peça de
Xadrez (o masculino socialmente referendado, institucionalizado, supostamente
permanente) para uma enquanto peça de Go (a feminilidade autoidentificada, porém
produzida contingencialmente, que é deslegitimada por certas instituições e espaços
sociais, e diante destes frequentemente impelida à resignação – por necessidade
econômica, por exemplo), e na volatilidade que este(s) gênero(s) tinha(m) durante
minha experiência no restaurante.
Ríamos sobre estas e outras divagações acerca do texto enquanto as bichas do
baleô 'fechavam' e os machos do futsal performatizavam suas masculinidades
(aparentemente) cisgêneras – e nós, minha feminilidade trans* aparentemente
amapônica e sua masculinidade cis gay. Quando o sol baixou um pouco, sentamo-
nos na arquibancada, mas nos voltando para assistir ao baba. Eu quis ficar mais
próxima para, quem sabe, ver alguma possibilidade de entrar no jogo, e seguimos
conversando. Até o final do baleô, com a noite iniciando o escuro e as estrelas, não
me senti segura o suficiente para pedir para entrar 'na outra' (no próximo time de
fora da quadra que irá jogar). Era hora de voltar para casa.
Caminhei com dois amigos ao ponto de ônibus, e não cheguei a esperar para seguir
em direção ao Rio Vermelho, onde moro. Decido parar para uma cerveja e, talvez,
um aperitivo. Consigo uma mesa com uma garçonete que me atendera (muito bem)
anteriormente, peço uma cerveja e uma porção de pasteis. Penso, preocupada, nos
prazos para finalizar este artigo, e particularmente em como seria sua conclusão.
Uma ideia me vem à mente, e procuro papel e caneta: tenho comigo uma sacola de
farmácia com algumas das substâncias que utilizo em minha 'transição', comprada
há algumas horas, e encontro na bula do gel de estradiol um pedaço de papel em
branco por entre as informações direcionadas exclusivamente a mulheres cis.
Escrevo:
“Análise da normatividade cis somente pode ser feita via intersecionalidade.
Autoetnografia como possibilidade epistemológica interessante para grupos
marginalizados.”
Acredito que estes dois pontos possam ser uma pertinente conclusão preliminar
para estes esboços autoetnográficos. Em uma mesa próxima, um homem (cis) me
olha: como estou vestindo camisa de futebol e sem nenhuma maquiagem, fico
preocupada se ele catou17 que sou trans*. Trocamos olhares, ele sorri algumas
vezes, e em dado momento vai ao banheiro, passando por mim. Ele é atraente, e
quando volta, pede para se sentar comigo, ao que assinto apesar de estar muito
insegura. Ele se senta em uma cadeira a meu lado, um pouco atrás de mim.
Conversamos sobre nossas atividades, ele me pergunta sobre a sacola de remédios
que deixo em cima da mesa (sobre a qual desconverso, com medo), e me elogia o
sorriso, dizendo que sou uma mulher linda. Minha insegurança se acentua conforme
ele fica mais próximo a meu rosto, e ao mesmo tempo eu o desejo. Em meio a
conversas, sorrisos e aproximações, nos beijamos, e eu ignoro o fato de estarmos
em local público, as roupas que vestia, os cabelos bagunçados, e o amigo dele na
mesa próxima. Por pouco tempo, no entanto: preocupada com alguma situação que
me 'denunciasse' enquanto pessoa trans*, digo a ele que iria para casa, e
combinamos de nos encontrar dali a uma hora.
Chego ansiosa em casa, falo com uma amiga trans* sobre o acontecido – ela me
recomenda não contar que sou trans* –, tomo um banho gelado, me arrumo com um
som positivo, e então converso com um amigo (cis e gay) – ele me recomenda
contar. Após relutar, decido contar: ligo para seu celular, Queria falar uma coisa para
você, Que foi, Eu sou uma mulher trans*, O quê [a ligação é ruim], Trans*, Trans,
Isso mesmo, [pausa] Estou confuso, vamos conversar, Você está bem, Sim, só estou
confuso, Você está bravo, Não, confuso, Tá bem, então você vem, Sim.
Eu o esperei, e ele não veio. Trocamos mensagens, então:
[eu (22:43 – 04-ago)]: “Preferi ser sincera com vc desde sempre. Gostei de nossa
conversa hj. Fique bem, te envio boas energias..bjos!”
[ele (22:53 – 04-ago)]: “eu tb, não fazia a menor ideia, não tem como perceber, e to
aqui confuso querendo entender, você fez a cirurgia também foi?, desculpe
perguntar...”
[eu (22:54 – 04-ago)]: “Não fiz não..”
[não há resposta dele]
[eu (10:45 – 05-ago)]: “Bom, eu preferi ser sincera com vc logo de cara. Não
costumo sair c homens, sou lésbica, mas gostei d vc. Nossos olhares não mentiram.
Bjs e boa sorte […].”
***
Esta experiência profissional por que passei foi bastante importante para mim,
particularmente por haver sido a primeira ocupação econômica em que me
apresentei abertamente como uma pessoa transgênera e por, consequentemente (e
devido às características da função), ter sido uma oportunidade de fazer reflexões
de caráter pessoal, político e acadêmico (sem enxergar separações e fronteiras
entre estas dimensões) sobre minha inserção trans* no mundo.
A partir das relações sociais estabelecidas com as pessoas colegas de restaurante,
com sua administração corporativa e com clientes, pude observar, desde um ponto
de vista trans* bastante privilegiado, como a respeitabilidade de minha identidade de
gênero esteve intersecionalmente atrelada ao meu alinhamento (ou não) a outros
vetores normativos, bem como às interações sociais entre meus posicionamentos
em relação aos de outras pessoas 18. Esta observação me leva à primeira conclusão
preliminar a partir destes esboços: a análise crítica da normatividade cisgênera
somente pode ser feita via intersecionalidade.
Por outro lado, acredito que os esforços autoetnográficos que venho realizando me
permitiram atentar criticamente para a percepção de que muitas das preocupações
teóricas e políticas trabalhadas no meio acadêmico – no qual pessoas trans* têm
historicamente participado como objetos de estudo ou 'campo' – não levam em
consideração as demandas políticas trans* mais prementes. Esta leitura fortalece a
ideia de que a autoetnografia pode ser um instrumento que colabore
construtivamente para a existência de “novas perspectivas” sobre gênero, algo que é
particularmente importante “para pessoas que se sentem em desvantagem na
ordem social” (ECKERT & McCONNELL-GINET, 2003:9, tradução minha).
Não gostaria de propor aqui que os grupos marginalizados se utilizem
necessariamente do instrumental autoetnográfico para produzir questionamentos
intelectuais críticos, mas somente de apontar que esta pode ser uma trincheira de
resistência acadêmica possível aos esforços de caráter exploratório, exotificante, e
18 Frases como 'você não é igual às trans que já conheci ou ouvi falar', frequentemente ouvidas de colegas de
restaurante, representam bem a interpretação social destas associações entre posicionamentos normativos.
reformista que permeiam a produção acadêmica relacionada, mais especificamente,
às questões trans*. Neste sentido, portanto, acreditando que a epistemologia
autoetnográfica potencialmente pode se configurar em trincheira que se expanda a
ponto de colocar as prioridades políticas trans* em maior evidência, e também a
ponto de possibilitar que pessoas trans* produzam teoria não somente de formas
não autoetnográficas, mas em qualquer campo teórico, seja ele 'diretamente' ligado
a questões trans* ou não. Destacando, finalmente, que qualquer teoria crítica deve
ser fundamentalmente comprometida com esforços intersecionais. É neste sentido
que penso, como a segunda conclusão preliminar deste artigo, na autoetnografia
como possibilidade epistemológica interessante para grupos marginalizados.
Referências
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Volume 36, Números 3 e 4. Disponível em: http://bit.ly/142WDLt , 2008.
KAAS, Hailey. Sobre o “casal trans*” e porque a mídia continua a nos exotificar e
higienizar. Disponível em: http://bit.ly/17qVmeT , 2013.
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Juang, R., & Minter, S. (ed). Transgender Rights. Minneapolis: Univ. of Minnesota
Press, p. 141-170, 2006.
RAZACK, Sherene. Race, space, and the law: Unmapping a white settler society. In
Razack S. (ed). Toronto: Between the Lines, 2002.
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Norton & Company, Inc., 2006.
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STONE, Sandy. The "Empire" Strikes Back: A Posttranssexual Manifesto. In: Straub,
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