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Feh Bellyne
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2.ª edição – 2022
Paula, esposa do tio Jorge, nos recebeu e não sei o que me irritou mais, se foi
seu sorriso falso ou o cabelo cheio de laquê que tornou sua cabeleira uma nave
espacial bizarra. A chata nos guiou até a sala de estar, lindamente decorada, tenho
que admitir, e começou a falar igual a um papagaio grotesco demonstrando o
quanto era fútil e ridícula. Não permaneci junto delas, me afastei sentando numa
poltrona próxima à janela, ocupando-me com o celular.
— Boa noite — meu tio chegou falando. — Que prazer tê-la aqui na minha
humilde casa, amada irmã.
Porra.
Revirei os olhos, enjoada com a falsa modéstia.
Aquela casa estava longe de ser humilde, tínhamos ali quilômetros de
terreno muito bem aproveitado, com direito a um jardim extenso, piscina, área
para empregados, sauna e muito mais que nem lembro por não frequentar mais o
lugar. Agora humilde, não era. O homem me cumprimentou com um beijo na
testa, que limpei assim que se afastou para juntar-se às mulheres e ficaram lá
conversando sobre a dama da noite, até a infeliz aparecer.
— Boa noite, gente — a voz soou macia. Quase de algodão. Melissa estava
vestida com um lindo vestido preto e sandálias altas. — Demorei? — Sorriu, indo
encontrar a tia, que já estava de pé para abraçá-la.
— Tá linda, Mel.
Quase vomitei.
Avaliando o quadro, me arrependi amargamente de ter vindo. O que eu
quero provar afinal? Que esqueci tudo? Que se foda ela ter transado com o filho
da puta do Caio? Que não ligo? Quero convencer quem, se eu mesma ainda sinto
o azedo na boca? Esse fingimento não fazia meu gênero, a vaca permaneceu
conversando com os mais velhos, enquanto eu saí sem disfarçar o abandono para
o jardim. Caminhei morosa na grama amparada, respirando ar puro e implorando
a Deus, no trajeto, uma dose extra de paciência; precisava suportar o jantar, a
arrogância, e ir embora como uma bela dama.
Longe de tudo estava sendo até fácil superar, mas estando aqui de volta,
principalmente neste jardim que brinquei muitas vezes quando criança, era
impossível.
— Júlia…
Voltei-me para a entrada, ali estava ela.
Cínica.
Um passo, dois… e eu neguei a aproximação, mas a garota nada inocente
quis me encontrar.
— Podemos conversar?
— Conversar, Melissa? Quer falar sobre o quê? Esmalte?!
Ela apertou os olhos e se esquivou.
Nada que fosse dito apagaria a revolta que movimentava meu peito. Não
havia palavras, por mais sinceras que fossem, capaz de superar a imagem, a cena,
o instante que permaneci parada, imersa em choque no cenário desleal.
— Eu errei, tá legal? Me iludi com aquele cretino, mas…
— Mas…?
Ah, o interesse no “mas” esticou meus lábios, talvez um motivo ilustre
explique as razões da minha prima e amiga ter me apunhalado pelas costas.
— Eu amo você, Júlia, sinto sua falta e nada é o mesmo sem a sua amizade.
Segurei a gargalhada e só sorri com ironia, é claro. Amor. Essa garota
reafirma minha burrice. Jesus. Achava mesmo que as lágrimas que escorriam
poderiam apagar a foda daquela noite?
— Melissa, vai se foder.
— Como pode ser tão dura?
— Como pôde ser tão vaca!?!
O olhar duelou e a fúria muito bem representada estava a ponto de esmagá-
la.
— Meninas, os convidados chegaram. — Paula nos interrompeu, ainda
assim o contato visual permaneceu queimando. — Mel, o Ruben está na sala com
o primo, venha recebê-lo.
Ela quebrou aquilo a tempo de a merda não respingar no jantar, busquei
controle do âmago, pois chorar não era o que pretendia fazer, me sentir frágil,
ferida diante deles, estava longe de demonstrar que superei a traição. Ignoraram
meus sentimentos, pisotearam minha dignidade, como se tivesse que sentir calada
a navalha ferindo meu coração.
Tapei a boca e engoli o pranto.
Não aqui.
— Dane-se, não suporto nenhum deles, não faz sentido minha presença…
Alcancei o ambiente em tempo recorde, disposta a mandar todos à merda e
retrucar qualquer protesto, só que o destino, como um leviano, desarmou seja
qual fosse o armamento que estivesse em punho. Meu sangue pulsou diferente
assim que reconheci um dos convidados.
05 | Ricky Walke
Correr sempre foi um dos meus esportes favoritos, consigo exercitar todo o
meu corpo de uma única vez, principalmente a mente, que no meu caso estava
bem conturbada. Percorri alguns quilômetros antes de sentar-me numa praça
próxima ao meu condomínio, apoiei os cotovelos nos joelhos e conflitei meus
pensamentos: trepar com a Ellen me fazia bem, havia intimidade, conexão. Nem
de longe um relacionamento possuía os mesmos quereres, sufocava, entediava.
Sei o quanto ela é uma mulher incrível, parceira que sempre esteve ao meu lado
em momentos turbulentos que nem reconhecia o meu “eu”. Mas ela merecia
“mais”, algo muito distante dos meus planos, mesmo com ela.
A solução óbvia, embora recusada por vezes, seria a distância.
Ellen seguiria ao encontro do compromisso que lhe importava e eu
permaneceria com os hábitos que estou acostumado.
Ótimo raciocínio.
O difícil seria descarrilhar para fora do círculo vicioso que se tornou o que
mantemos: ela pede mais, eu me recuso, nos afastamos por um tempo, até que
suas carícias a devolvam para minha cama novamente.
Hipocrisia.
Desviei para o celular, o toque desconectou minha mente de pensamentos
contraditórios às minhas ações. Peguei o aparelho e verifiquei a tela, era o
Nicholas, outra mensagem, resolvi ler, já que ignorei a anterior.
Não posso esquecer de agradecer ao Ruben por esse convite, jamais imaginei
que reencontraria essa garota logo dessa forma, que mundo pequeno. Obviamente
que desconfiava se tratar de uma funcionária, ela não estaria lá se não fosse. A
garota de olhos atrevidos atraiu meus instintos naquela tarde, além de um flerte
diferente, inusitado, me fissurar nos lábios de um tom rosa natural saltados e
suculentos. Um corpo curvilíneo, delicado, pecado puro. Maluco esse primeiro
contato, dado aos dias exorbitantes que estava vivendo, algo novo, me
estimulando, como havia tempos que não acontecia, me excitou.
Só que assim que as portas fecharam, voltei à consciência de que
funcionárias são problema, ainda mais trabalhando no mesmo prédio da Ellen.
Portanto, apaguei a bela imagem da mente, e segui, até revê-la no restaurante, um
brilho diferente me atraiu ali e esqueci facilmente dos alertas que me fizeram
recuar.
Até esse momento.
Júlia é uma tentação: jovial, linda, inteligente. Captar o seu nervosismo com
a minha investida atiçou o meu sistema. Perdi a cabeça ao me deparar com a
estagiária adentrando a sala com seu jeans apertando as curvas pecaminosas.
Gostosa pra caralho. Ok, havia um lado racional me incomodando, a idade.
Principalmente por fatores práticos, eu gosto de relações conquistadas por meio
de momentos, mulheres que valorizavam o tempo, fodendo comigo, sem sonhar
com um pedido de casamento no final do mês. Ellen era uma exceção da vida e
algo que pretendo resolver em breve.
Logo percebi que a família da Melissa era formada por pessoas esnobes e
dificilmente fariam parte do meu convívio social por motivos explícitos. Me
incomodei com a exposição desnecessária da Paula, depreciando Júlia, como se
isso fosse possível. Eu criei e estruturei o programa, sei mais que ninguém as
dificuldades que designei aos aprovados. Portanto era plausível constatar, “a
garota era um crânio”.
Júlia não se igualava ao nível social deles, mas não falho, sua integridade é
superior.
Porra, encantei-me ainda mais por sua simplicidade.
Por sorte, sentei-me à frente da garota, visivelmente incomodada com tudo,
só não pesquei o que a fez participar do evento, visto que visivelmente se
deslocava do círculo. Dei atenção aos anfitriões babões, assuntos soberbos sem
sentido condenando minha paciência, quase ri imaginando o que seria do Ruben
se casasse com a garota e tivesse que suportar o convívio dos sogros.
Lastimável.
Futuro infeliz para o garoto.
Melissa, em contrapartida, se mostrava diferente dos pais, era tranquila e não
desperdiçava seu tempo com ninguém que não fosse o namorado.
Autocontrole, um ponto crucial para a profissão que exerço. A prática
facilmente me abandonou durante o jantar, a tentação à frente e seus traços
perfeitos, provocaram diversos espasmos no meu pau. Enquanto comia a torta de
chocolate com tanta dedicação, imaginei aquela boca que me guiou ao interesse
na primeira vez, na altura da minha cintura com meu membro enterrando até onde
a possibilitasse respirar. Sendo assim, acreditem, os instantes naquela mesa foram
angustiantes.
Para mim e para meu pau.
Infelizmente, sufocado com os anfitriões, um segundo contato com a Júlia
não aconteceu. Apenas uma despedida casual e logo a noite interessante brochou.
Precisava fazer algo a respeito. Apesar do desgaste, estava cheio de tesão
reprimido e voltei aos planos com Athos. Deixei um Ruben feliz da vida na frente
do seu prédio e encontrei o investigador num PUB, na Avenida Paulista.
— Ricky, seu filho da puta — me xingou como sempre fazia, puxei o
monstro para um abraço e quase fui esmagado com seus braços similares a
concreto. — Porra, cara, você emagreceu, não lembro de conseguir encaixá-lo
nos meus braços.
— Vai se foder, Athos — disse e me sentei.
— Irmão, me acompanha? — Ele se referiu ao que estava bebendo.
— Claro, preciso de uma dose de uísque. — Aguardei que ele fizesse o
pedido ao garçom que, mesmo longe, estava atento. — O que aconteceu, bebeu
concreto? — indaguei, citando seu estado físico. O homem estava gigante, bem
maior do que da última vez que nos vimos meses atrás.
O garçom serviu-me do desejado, e meu amigo esperou que ele saísse para
me responder:
— Estou malhando muito, só assim consigo viver.
— Mas tudo nas normas? Quero dizer, tem veneno aí?
Ele me observou com seu sorriso sacana, me fazendo entender que nem tudo
é cem por cento certo ou errado. Athos é policial federal, e não sei como
consegue se manter na área tendo ética, mas desenvolve um trabalho foda, e é
considerado o melhor investigador do país.
— Nada que prejudique minha saúde, pode confiar.
— Não confio em você, olha sua cara, você é um babaca.
Ele riu e virou o copo, degustando sua bebida.
— Por que queria desmarcar? — Ele quis saber, apoiando os cotovelos na
mesa. — Como você praticamente cancelou, eu tinha outros planos.
— Uou, me sinto privilegiado pela preferência, só digo que não vou fazer
nada, mesmo bêbado.
— Eu devia prender você por isso — disse zombando do seu poder.
— Irmão, prenda-me com uma garota que estou louco para ter.
— Se ela te deu um fora, ganhou um fã — avisou ele, interessado. — Quem
é?
Respirei fundo e pedi outra dose, antes de iniciar o assunto “estagiária”
com ele, refleti como um disco riscado o quanto descumpriria tudo que sempre
pensei se executasse o que passava por minha cabeça.
— Ela trabalha na WIS… — Abri o jogo.
— Sério, cara, pode isso? — inqueriu. — Não era você que repudiava a ideia
depois de tudo que aconteceu?
Muita merda aconteceu, segundo ponto que meu pau devia lembrar.
— Quero aquela mulher só uma vez.
— O perigo é algo fascinante, meu caro. — Bebericou seu copo. — Tudo
que aconteceu devia traumatizar você, mas vejo que essa garota vai te
impulsionar a descumprir as próprias regras.
— Uma trepada com ela basta.
— Analisando sua cara de babaca, a garota é fascinante. Quero provar —
disse sacana.
— Não, ela não, quero aquele corpinho delicioso só pra mim.
— Tá certo, respeito. — Chocamos os copos. — Faz tempo, irmão, que não
fazemos uma festinha, quando foi a última vez? — Sorvi o uísque tentando
lembrar.
— Talvez com a Ellen no meu apartamento, eu acho.
— E como tá aquela diaba? — Falar da Ellen sempre trazia um sorriso ao
rosto do puto. — Não pretende colocar um anel naquela perfeição de mulher?
Enruguei a testa.
O desgraçado riu.
— Que foi? — Se defendeu. — Sabe o quanto torço por vocês.
— Não torça. Essa relação que mantenho com a Ellen tem prazo de validade.
Athos me fitou, lendo o semblante que expus a ele. Compromisso não era
um plano praticável na nossa posição. Eu mal conseguia passar três meses no
mesmo endereço e o investigador por sua vez tinha uma vida digna de um filme
de ação policial.
— Considero a Ellen pra caralho, irmão.
— Minha amizade por ela não vai mudar em nada. Só cansei, sei que ela
ainda tem esperança de me levar para um altar, é a hora de findar qualquer que
sejam seus planos comigo. — Ergui um dedo para o garçom, em segundos ele se
colocou ao meu lado. — Traga a garrafa, parceiro.
— Agora o PUB vai esquentar.
— Vamos beber irmão, celebrar esse encontro.
Brindamos, pois eram raros momentos assim.
Athos, além de guiado por suas investigações perigosas que muitas vezes me
fizeram temer perdê-lo diante do terrorismo da sua profissão, corria contra o
tempo na busca desfreada por sua irmã, Gaia, então estarmos no mesmo país
merecia uma comemoração digna do acontecimento.
Num certo momento, o riso explodia fácil, o papo recordava o passado,
olhares femininos nos cobiçavam por toda parte, mas não era ali que aliviaria as
minhas bolas. Nossos carros ficaram para ser entregues no dia seguinte, o dono
do lugar conhecia nossa dinâmica, sem condições para dirigir pedimos um táxi
que estacionou minutos depois em “Al’CUBE” uma casa de swing que
experimentava às vezes.
O ambiente sexy, nutrido de tesão, estava consideravelmente lotado,
escolhemos um espaço privado pois havia uma preocupação mútua com
repórteres, afinal, não éramos nem de longe desconhecidos. O local dava visão
para a pista principal e sua acústica, mas facilmente se tornaria totalmente
privado se apertássemos alguns botões. O ambiente era rodeado por um sofá de
couro roxo, um bar abastecido e, ao fundo, uma enorme cama.
Indecência e luxúria.
Elementos necessários para aliviar o tesão.
— Sejam bem-vindos, Sr. Walker e Sr. Garbo, desejam algo especial para
essa noite?
— Diana…
— Não — interferi no pedido particular de Garbo. — Quero uma gar… quer
dizer, mulher, que ainda não esteve conosco. De preferência com cabelos
castanhos até o ombro, corpo… gostosa e… — Olhei rápido pra Garbo que
arqueou uma sobrancelha sem entender o sentido daquilo. As mulheres do lugar
eram lindas e por que justamente agora eu queria um cardápio? Enlouqueci.
Depois de me sentir um completo imbecil, continuei. — Esquece… queremos
uma garota especial, só isso. Garbo?
— Você quem manda, irmãozinho — ele se abstraiu, indo na direção do bar.
— Sei do que precisam, com licença.
Virei para Athos que rapidamente já estava em posse de uma cerveja.
— Quero algo diferente hoje.
— Estou vendo, que porra é essa de especificar o porte da mulher
detalhadamente?
Dei de ombro e recebi uma garrafa de cerveja para acompanhá-lo.
— Culpa do meu pau.
Ele riu canalha.
— Porra, cara, dispensou minha garota, Diana é tudo.
— Diana é o segundo round, pode ser?
Ele assentiu sem maiores considerações.
— Boa noite, rapazes.
A entrada se tornou uma visão e tanto.
Ela era… caralho, talvez minha retina estivesse viciada, ou meu pau me
pregando uma peça, mas a mulher era um pouco parecida com a Júlia.
Porra, eu ia enlouquecer caso não trepasse com aquela garota.
— Entre, princesa — Garbo saudou. — Qual seu nome?
— Juliana, senhor.
— Porra… — O líquido dentro da boca esguichou forte. Destino, seu filho
da puta traidor.
— Tudo bem, Ricky? — Athos franziu o cenho.
— Tudo certo. — Limpei a garganta, concentrando-me na garota linda. —
Vem, delícia. Primeiro, não nos chame de senhor, meu nome é Ricky, e aquele
com cara de babaca é o Athos. — Ela desfilou na nossa direção, evidenciando a
pouca roupa.
— Ricky e Athos, dois gostosos.
— Você também é muito gostosa. — Acariciei o rosto fino. — Tem interesse
em saber quais são os nossos planos, antes de iniciarmos com você?
Ela umedeceu os lábios vermelhos.
Lábios vermelhos, normal em qualquer mulher. No entanto, um em especial
pregou-se na memória de uma forma irritante para o momento atual.
— Sim, muito interessada…
O investigador iniciou, enquanto me afastei para me desfazer da camisa.
— Vamos fazer você gozar enlouquecida, até suas pernas perderem a força,
só queremos essa boca, essa boceta e seu cu. Teremos, amor?
Voltei a tempo de ouvir seu consentimento e fitar o olhar de expectativa da
mulher.
— Tire o vestido — ordenei. Athos matou o líquido que restava na garrafa e
despiu-se próximo ao bar. — Linda ela, não acha, Athos?
— Sim, um pecado que quero foder até o talo.
— Juliana, se ajoelha aqui — indiquei a posição e, de esguelha, vi Garbo se
sentar na poltrona próxima ao parapeito que dava visão à pista, abrir outra cerveja
e relaxar no assento. — Vou foder essa boquinha… — Meu polegar moveu os
pequenos lábios marcando com o vermelho toda a região.
O contato visual devasso da mulher se manteve em todo o momento que ela
buscava a promessa dentro da minha calça, eu estava duro, latejando de tão duro.
E sua boca traria alívio por ora à angústia. Reconheço estar um tanto emocionado,
nunca uma mulher me fascinou assim e, puta que pariu, a Júlia tem o quê? Vinte
anos! Que ninguém escute os pensamentos fodidos, mas cada célula minha
desejava afundar entre as pernas da ladra de sanidade. Caralho, aquele jeans
coladinho ao traseiro empinado era o fetiche perfeito, se ela soubesse do seu
poder, um cessar fogo seria facilmente aceito, caso a estagiária parasse diante da
guerra com o seu jeans.
Passei a ser um tarado por jeans.
É isso.
Soltei o ar, Juliana carecia de atenção e por mais que a outra estimulasse
faíscas, quem engolia meu cacete fazia um trabalho excelente. Acariciei o cabelo
castanho com alguns cachos, assim como.… Porra, enfim, entranhei os dedos nos
fios prendendo-os firmes e aumentei o ritmo do boquete, aliviar a tensão da
cabeça de baixo talvez trouxesse a de cima para alguma coerência por assim
dizer. Como um desgraçado egoísta, meti com força, castigando meu lábio
inferior de tanto que o prendi entre os dentes. Buscava o clímax como se minha
existência dependesse do feito.
Juliana lamuriava com cada estocada que atingia sua goela, boca gostosa,
garganta profunda, amava a combinação. Rosnei, a sensação inflou meu pau e
aliviou meu corpo, foi rápido, mas eu estava a ponto explodir há tempos. Soltei a
cabeça da gostosa e sua bunda caiu sobre os calcanhares.
— Engole, vadiazinha…
Jorrei jatos de porra na boca aberta.
Garbo tomou meu lugar pegando a garota no colo e deitando-a sobre a cama.
— Abre as pernas pra mim, quero chupar essa boceta.
Deixei a cabeça pesar na nuca, havia um turbilhão de interrogações girando
ali, só não entendia a necessidade da agitação, tal como esse jantar convulsionou
minha corrente sanguínea. Devolvi o olhar para a garota, a acústica dos gemidos
enquanto Garbo chupava seus grandes lábios, instantaneamente, trouxe reação à
minha espada. O tesão de vê-lo entre suas pernas ferveu meu sangue, precisava
me conectar com o cenário que me excitava, geralmente compartilhava de
ambientes assim com Athos ou então Anthony, o piloto mais sacana que conheço,
amigos de longa data sedentos por um ménage.
— Meu Deus… — Juliana gritou, se contorcendo com o orgasmo que meu
amigo proporcionou a ela. — Quero os dois — exigiu em gemidos.
— E você terá — garanti, destacando a embalagem de umas das camisinhas
que peguei no caminho, a outra lancei ao homem que se posicionava rente à beira
da cama. — Athos vai comer sua boceta e eu seu cuzinho, está excitada o
suficiente para nos receber duplamente?
— Muito excitada… — ela praticamente ganiu.
— Então, delícia, desliza essa rachada aqui na rola do Athos. —
Prontamente, ela posicionou cada joelho na altura da cintura de Garbo, rasgando
o sexo na descida que engoliu por completo o cacete do meu amigo. — Porra, que
delícia…
Enquanto ela quicava no pau de Athos, segurei novamente os cabelos
castanhos inclinando-a para facilitar a sucção dos seus mamilos pontudos,
dediquei-me bem aos peitos fartos, até descer sua coluna colando-a no tórax de
Garbo.
— Relaxa…
— Come meu cu, por favor…
— Ricky… vamos lá… faça a safada balançar ainda mais sobre mim.
Ri para ele.
— Ok, vou comer essa bundinha que tá piscando pro meu pau.
Separei a bunda empinada, percorrendo com o indicador o canal apertado até
o anel, cuspi para facilitar a penetração, mas senti a necessidade de lubrificar,
peguei um dos frascos jogados ao lado de Garbo e apliquei uma porção generosa.
Sem mais delongas me enterrei no centro que, mesmo apertado por conta da
dupla penetração, sugou todo o comprimento. Segurei sua cintura para iniciar as
estocadas, era visível a experiência da Juliana, mas sem jeito a dupla penetração
podia machucá-la.
— Preparada, safada?
— Sim…
— Grita, putinha, quero ouvir seus gemidos. — O outro que metia em baixo
bramiu. — Porra, Ricky, é sempre um prazer, irmão.
— Eu te amo também, seu puto.
— Ei, rapazes, parem com essa melação e me comam, Diana disse que essa
seria a melhor noite da minha vida.
Athos gargalhou eu o acompanhei.
— Diana estava certa, delícia.
Movi o pau no anel estreito, ela esmiuçou lamentos pervertidos e, sem adiar,
estoquei com força.
Uma, duas, três, quatro, cinco… golpeei seu rabo com meu pau.
A sincronia torpe corrompeu tudo, a brincadeira à trois se tornou frenesi, me
senti o Ricky de sempre, saciando a fome numa boa trepada.
Eu sabia que teria um dia vibrante assim que acordei e passei praticamente
duas horas escolhendo o que vestir, por que…?
É o meu primeiro dia oficial na WIS CONECT.
Essa indecisão ou um panapanã de borboletas terroristas estarem
perambulando como loucas o meu estômago, não tinham nada a ver com o fato
de, hipoteticamente, encontrar como quem não quer nada, meu chefe na empresa.
Ponto um: ele é meu chefe (já repeti isso muitas vezes).
Ponto dois: tenho tesão por ele (visivelmente explícito após a véspera).
Ponto três: me sinto uma cadela.
Encontrar o Ricky ali foi, no mínimo, a surpresa do ano, e tê-lo tão próximo
ainda era difícil de acreditar, demorei a dormir revivendo seu toque na nuca e
provando dos olhares chamativos que ele me lançou durante todo o jantar.
Que sedução saborosa.
Que timbre capaz de encharcar qualquer calcinha, inclusive a minha.
Bem, não se enganem, temos uma Júlia excitada aqui, tal qual uma Júlia
cagando de medo consciente dos riscos. Ricky Walker me atraiu, talvez por ser
um homem e não um moleque como os que já havia me relacionado, tudo nele era
intenso e faiscava meus olhos com a curiosidade de provar do perigoso.
O fato, cônscio, não eliminava o risco que corria com minha carreira. Sei
como funciona a dinâmica — chefe e funcionária —, sempre dá merda. Não que
eu já tivesse passado por esse tipo de experiência, mas os filmes e os livros
sinalizam que geralmente não era o poderoso que ficava com a pior, e sim, a
funcionária que perdia o emprego e sofria com a paixão.
Apesar disso, seus sussurros me alucinaram e as palavras me faltaram
naquele momento, duvidei, pensei estar variando, era possível? Ou eu era mesmo
o foco desejoso de seu flerte? A resposta explanou quando o comentário patético
de tia Paula ao tentar me diminuir foi rebatido com classe pelo executivo, por um
triz não me rendi e lasquei um beijo na boca dele. Meu herói. Certamente
premeditaram o circo armado, notável que o convite surgiu por conta da presença
dos convidados ilustres. A intenção era esfregar na minha cara que a princesa
vadia namorava o herdeiro da faculdade onde a gata borralheira dramática era
bolsista. Senti-me sufocada e testada todo o tempo, como se tivesse que provar
meu valor a eles.
“Não preciso provar nada para ninguém.”
Essa lição eu aprendi cedo e, às vezes, desaparecia do meu sistema como na
véspera. Não vou negar que, por um momento, estive a ponto de explodir em
meio a todos os desaforos ditos, mas me contive, Ricky foi o responsável, não
posso negar.
O look?!
Basta dessa merda.
Voltei aflita ao emaranhado de cabides, desmontei toda a estrutura na busca,
para que, finalmente, optasse pelo óbvio. Júlia, a confusa (eu).
Ostentei um jeans comum, blusa de corte aberto nas costas e sandálias altas,
acrescentei algumas bijus e foquei no meu rosto, analisando se uma maquiagem
mais caprichada não seria muito extravagante para um dia de trabalho, por fim,
fiz algo leve e não me preocupei com meus cabelos, já que o corte que Marcos
fez, o deixou incrivelmente prático.
Não pude desfrutar da presença da minha mãe naquela manhã, a empresária
teve compromissos logo cedo no salão, mas deixou agradinhos para o café, além
de um bilhete de boa sorte sobre a mesa.
Ricky
Foi difícil finalizar minha agenda naquela tarde, o encontro com a Júlia, que
eu mesmo fiz questão de provocar, me perturbou durante a reunião. Eu quase
beijei a garota, na escada de emergência, na WIS CONECT. Caralho, não pensava
mais com a cabeça que devia pensar. Impulsivo, desmarquei as duas
videoconferências que teria e liguei. Senti um certo receio da sua parte e, se desse
vazão a isso, não conseguiria levá-la para jantar.
Por um momento até cogitei deixar para lá a atração, já que o alerta
"funcionária", ainda estava presente no meu subconsciente, no entanto ao
acariciar sua pele macia e inalar a inocência do seu perfume doce, deletei todos os
avisos e só pensei no corpinho delicioso cavalgando no meu colo e gemendo no
meu ouvido.
Ok, admito, sou um canalha excitado, sedento por uma garota de vinte anos.
Não previ nada, há um ponto importante a ser ressaltado: Júlia estava longe de ser
qualquer uma, sei que não.
Acredito que por isso estou vidrado nela.
Peguei o cardápio de sua mão já sabendo exatamente o que pedir. Ela rondou
curiosa, finalmente, deixando fluir um sorriso relaxado. Estudei seus traços, cada
linha delicada do seu rosto levemente corado, olhos envolvendo tons claros, boca
metricamente delineada à espera de um beijo, o cabelo agora mais curto que da
primeira vez que a vi, trazia uma elegância para a silhueta desenhada por Deus.
Sou apaixonada pela beleza feminina, considero as mulheres a riqueza da raça
humana. Embora houvesse essa admiração da minha parte, não recordo quando
me atentei tantos aos detalhes das que frequentaram minha cama.
Por ora me incomodei em constatar isso.
— Vai lá, me surpreenda.
— Vou ser sincero, trouxe você aqui só para impressionar, pois o que eu
gosto mesmo é de comida simples e caseira — admiti, entregando o cardápio para
o garçom que se apresentou. Outro tratou de encher as taças com vinho. Notei um
certo desconforto da Júlia ao perceber o líquido ondulando o cristal. — Fui
imprudente com o vinho?
— Não, é que amanhã estou de pé cedo, prefiro não beber. — Ela curvou os
lábios, quando eu ia sugerir que pedisse outra coisa, meneou a taça e provou o
líquido. — Vou acompanhá-lo somente com essa taça.
— Se preferir pode pedir outra bebida, não me importo.
— Tudo bem. — Devolveu a taça à mesa e me encarou. — Você teria me
impressionado se tivesse me levado num food truck.
Informação importante.
— Sério?
— Sim, sou simples, Ricky — disse e recostou. — Não que algo assim
luxuoso não chame a minha atenção, mas prefiro coisas palpáveis para mim.
Ergui os braços em rendição.
— Sou palpável para você, pode pegar.
— Engraçadinho…
— Nunca falei tão sério.
— Você é meu chefe — ela lembrou, e o sorriso recém-conquistado
desapareceu. — Acredito que estamos burlando diversas regras estando aqui, não
acha?
Sim, estamos!
Regras que eu mesmo fiz questão de impor após uma tragédia no passado,
que acarretou muita dor e incertezas, no entanto, uma atração incomum surgiu e
não pensava mais com clareza, só agia.
— Talvez, estamos atraídos um pelo outro, não há nada de errado nisso.
— Estamos atraídos?
— Eu estou. — Me inclinei e, se não houvesse a mesa entre nós, estaria
sentindo o sabor da pele macia na boca. — Só vamos aproveitar o jantar, depois é
depois.
Fiquei alguns segundos sob a mira dos seus olhos coloridos, até que ela
tomasse novamente a taça em sua mão e virasse um gole generoso naquela boca
que eu tanto desejava. Júlia definitivamente não era uma menina, o que tinha
diante de mim era uma mulher e isso me fascinava.
Nossos pratos foram postos e a vi sorrir quando um filé com purê de
mandioquinha apareceu diante dela, pedi algo simples porque também não tinha
frescura com comida. O silêncio permeou durante a refeição, e claro que tomei a
liberdade e toquei sua mão em algum momento, meu toque arrepiou sua pele,
notei, foi inevitável, e o clima voltou ardente conforme nossos olhos se
encontravam, havia um desejo iminente ali, pronto para explodir. Mas diferente
de outras, a universitária me mantinha capturado, receoso de um avanço brusco,
não entendia, mas era assim que me sentia.
— Como se sente agora que é oficialmente uma estudante da WIS?
— Com a sensação de sonho realizado, sabe como é?
— Sim, sei.
Ela me lançou um olhar duvidoso.
— Já lutou por algum sonho, Ricky?
Ah, agora eu entendi.
Quem conhecia o CMO Ricky Walker, não imaginava o quanto estudei para
me tornar o profissional que sou hoje, claro que ser herdeiro de tudo que meu pai
construiu me daria um futuro promissor, sem sombra de dúvidas. Entretanto,
como o velho, eu quis estar à altura de tudo que um dia ia herdar, estudar no meu
seio familiar não era opção e sim, uma ordem. Nick e eu tivemos uma educação
regrada e muito pouca infância. As melhores lembranças que tenho de brincar
quando criança, estão todas aqui no Brasil, em especial Angra dos Reis.
— Ser filho de Robert W. Walker não me poupou de nada, também tenho
meus sonhos. E posso dizer que, desde o elevador, ganhei outro para a minha
coleção.
Ela balançou a cabeça enquanto sorria com a investida. A conversa ficou um
tanto particular para o que tínhamos, melhor contornar e ir ao ponto que
realmente me interessava. Analisei seu prato vazio e toquei sua mão sobre a
mesa.
— Posso te apresentar o que mais gosto nesse restaurante?
Ela estreitou os olhos, levando para trás das orelhas fios de cabelos
castanhos perdidos em sua têmpora, flexionou os lábios, mas assentiu. Finalizei o
vinho num gole, chamando a atenção do garçom à mesa, conversei com ele
brevemente sobre aonde íamos e recebi o cartão de acesso. Conduzi a garota de
corpo provocante até o corredor restrito a alguns clientes e segurei sua mão
durante o trajeto — era inevitável sentir como meu toque a provocava (me
divertia com isso). O elevador nos deixou no vigésimo andar, subimos uma
estreita escadaria para ter acesso ao grande terraço. Eu amava aquele espaço, a
vista perfeita da grande metrópole, a brisa da noite capaz de amassar os
pensamentos tortuosos.
— Uau… São Paulo é muito mais bonita daqui de cima — Júlia declarou,
caminhando até o parapeito. — Por que me trouxe aqui?
— É um lugar que me dá algumas respostas.
Ela olhou um pouco mais a vista antes de me encarar novamente.
— Acha que há alguma dúvida, Ricky?
Dei o passo que faltava para unir os desejos, busquei sua face com os nós
dos dedos, deslizando sem pressa as linhas do rosto quente, ela prendeu as
pálpebras rendendo-se ao toque, então explorei a carícia percorrendo o pescoço,
levemente o colo, trilhando a costura de sua blusa até abertura que evidenciava o
tronco nu. Alisei a carne exposta, era possível senti-la estremecer, bem como o
abrasado do seu corpo se misturar com o meu. Eu a tinha sob espera, mas
exigente, quis dedilhar cada detalhe ao caminho da sua boca.
— Quero essa boca.
— Eu sei, eu também quero a sua.
Segurei sua nuca e a trouxe para mim, grudando seu corpo no meu.
— Talvez não tenha mais sossego, depois de provar de seu beijo, no entanto,
estou disposto a pagar o preço.
Beijei a garota com voracidade, estava completo, inexplicavelmente me
completei naquele salto. Suguei sua língua macia embebedada de vinho,
recebendo o mesmo tratamento. A ganância que tínhamos era forte, ávida,
apanhei um punhado do seu cabelo, afastando um pouco nossos lábios, eu
precisava provar da carne salpicada de desejo, lambi toda a extensão da cavidade
formulando absurdos. Ergui seu corpo e ela fechou as pernas me montando.
— Adivinhe meus pensamentos? — disse, mas eram os seus seios que
ocupavam o meu campo de visão.
— Só se você adivinhar os meus.
Mordi de leve o peito sobre o tecido, e nos levei direto ao apoio do concreto
que beirava uma parte do espaço. Com isso, pude esfregar sua bunda na minha
ereção dura pra caralho àquela altura. Júlia gemeu e mordeu os lábios que
recuperei no instante seguinte. Queria como um louco, comer essa garota, fodê-la
de um jeito único para que ela nunca mais tirasse meu nome da cabeça.
Ela interrompeu o beijo e voltamos a respirar.
— Não devemos.
Ofegante, desfez o laço perfeito de suas pernas, obrigando-me a colocá-la no
chão.
— Calma, Júlia, está tudo bem.
— Não, não está.
— Por quê?
— Porque você… — Ela hesitou por um momento. Mas eu sabia a resposta:
É MEU CHEFE. Era gritante a afirmação em seus olhos. — Tenho que ir, tá
tarde, não avisei minha mãe, eu vou embora. Vou pedir um Uber.
Seus pés já a guiavam para longe.
— Calma. — A tempo segurei seu pulso. — Eu levo você.
10 | Júlia Sales
Assim que acordei defini sem hesitar o que ia vestir. Já que participaria da
reunião, seria em grande estilo. Escolhi um vestido preto com decote comportado,
porém sensual e sapatos vermelhos, que peguei emprestados da minha mãe.
Arrumei meus cabelos com cachos largos e fiz uma maquiagem caprichada.
Quando me olhei no espelho, avaliando a composição, fiquei chocada com o
resultado.
Agora estou insegura, achando que exagerei um pouquinho.
— Girl, você está linda! — Raica exclamou, admirando meu look. — Você
caprichou hoje!
— Raica, vou participar de uma reunião de estratégia com a diretoria —
expliquei, controlando a empolgação. — E você, bem-vinda ao andar do
Marketing.
— Obrigada, finalmente estou no meu lugar. — Espalmou o peito. — E
você, reunião com a diretoria? Parabéns.
— Obrigada, mas estou nervosa. — Encolhi os ombros. — Acha que
exagerei?
— Amada, arrasou, está parecendo uma executiva. — Ela se aproximou e
cochichou. — Pode competir de frente com a nossa chefe que, cá pra nós, é linda,
mas azeda.
Não aguentei, deixei escapar uma gargalhada.
— O que é tão divertido, garotas? — Orion chegou perguntando.
— Nada, não. — Disfarcei, ainda com vestígios do riso.
— Ok, é bom vê-las animadas. Raica entregue essas pastas para Celly no
décimo andar, por favor.
— Claro, até mais tarde, Jú.
— Almoçamos juntas. — Pisquei para ela, que pegou os materiais e saiu em
seguida.
— Uau. — Orion assobiou, paralisei encabulada. — Caprichou para a
reunião.
— Exagerei, né? — perguntei e esmoreci.
— Claro que não, ficou ainda mais linda.
Exagerei, é fato.
— Tudo certo para a reunião, Orion.
A voz grave bateu nas costas, sabia quem era, então respirei antes de virar e
flanar entre os homens.
— Tudo certo, Ricky. Iniciaremos em dez minutos.
— Por favor, chame alguém da manutenção, os computadores da sala de
reunião estão sem conexão com a internet.
— Impossível, testei todos há uma hora, vou verificar, com licença. — O
homem, agora aflito, saiu disparado para a sala, enquanto o outro se aproximou.
— Bom dia, Júlia — sussurrou perto, só para que eu e ele participássemos da
conversa.
— Bom dia, Ricky.
— Acho que será umas das minhas reuniões preferidas ou talvez a mais
difícil.
Vadiei o olhar só para certificar se não estávamos sendo observados.
Por ora, não.
— Por que a mais difícil? — indaguei no mesmo tom.
— Vai ser impossível me concentrar em qualquer coisa que não seja você.
Tudo isso foi somente para a reunião? Ou me enlouquecer foi a real intenção
quando escolheu esse vestido?
— Acha mesmo que me vesti para você?
Hipoteticamente, podia ter feito essa proeza.
— Como posso? Sou um miserável sonhador.
Sem autorização meus lábios sorriram.
— Me vesti para reunião e por incrível que pareça você estará presente,
então se considere um homem de sorte — murmurei equilibrada, no entanto, se
seus olhos pudessem enxergar o meu interior saberiam o caos que estavam meus
neurônios. Ricky me desconectava do coerente com facilidade, estávamos no
meio do andar, com vários colaboradores em torno, que porra tínhamos na cabeça
para iniciar uma conversa nessa estirpe?
— Às vezes tenho sorte, como ontem, que provei um sabor inesquecível.
Como você é uma garota inteligente pode me ajudar. Não consigo esquecer o
gosto doce que ainda se encontra tortuoso no meu paladar. O que faço a respeito?
— O timbre entoava a perdição de recordar a véspera, titubeei, sentido a pele
pinicar.
— Esquecer… talvez… seja o certo a se fazer.
Seus olhos quentes me invadiram. Tão exigentes que senti meus pontos mais
sensíveis sendo tocados por ele.
— Tem razão — se afastou —, reunião em dois minutos, Srta. Sales.
Ah?
Ele tinha o dom de me alucinar e enlouquecer na mesma medida.
Continuei na mesma posição, testemunhando o executivo caminhar
tranquilamente para a sala onde ia acontecer a reunião, já não tinha liberdade com
meus pensamentos, estava confusa, agitada e perturbada com o perfume delicioso
do Ricky que ainda permanecia pairando no ar. Olhei ao redor e, graças, ninguém
percebeu a turbulenta viagem, todos estavam entretidos nos seus próprios
Macbooks. Respirei fundo, retomando o controle, peguei o meu bloquinho de
anotações e fui ao encontro do perigo.
Até aquele momento não havia entrado na sala master, a primeira coisa que
chamou a atenção foi a enorme mesa oval que ocupava o centro, uma televisão de
mais ou menos cem polegadas à frente, e o CMO, que se destacou de todos os
presentes, fazendo anotações, sentado na cabeceira como o rei. Ellen, ao seu lado,
também parecia bem centrada no seu computador. Procurei Orion no meio de
tudo aquilo, inédito para mim, e o encontrei na outra ponta da mesa, digitando
como um devorador de teclas, me aproximei, sem chamar atenção.
— Oi! Tudo certo? — sussurrei, ocupando a cadeira ao lado.
— Não, estou nervoso. Tenho várias ideias e quero passá-las de uma maneira
incrível.
— Cara, você é o máximo, relaxa. — Ele me encarou e forçou um sorriso,
mas era visível o quanto estava em pânico. — Obrigado, Júlia.
— Bom dia a todos! Vamos iniciar — declarou Ellen ao lado de Ricky. —
Sr. Walker a palavra é sua.
O executivo iniciou com uma apresentação breve dos rumos tomados pelo
Marketing na atual gestão, pontos positivos e negativos. Embora eu achasse o
assunto muito interessante, algo fez meus olhos perderem o rumo dos gráficos e
pousarem na postura sexy de Ricky.
Puta que pariu.
A sensação do seu pau se esfregando entre as minhas pernas fez com que eu
soltasse um leve gemido, ao mesmo tempo que a cadeira ficou desconfortável
para o meu corpo que começou a afoguear com as lembranças do nosso momento,
e suas palavras não tinham mais sentido, estava totalmente hipnotizada com a
figura máscula…
Um desejo me remeteu em congelar o tempo, ajoelhar-me diante dele, pegar
o seu pau, que ainda não tinha visto, e chupá-lo.
Colocá-lo por inteiro na minha boca e degustá-lo…
Jesus!
Me tornei uma pervertida.
— Júlia… — Alguém me chamou e eu desorientada saí do meu devaneio
sexual. — Júlia…
— Sim, quem? — perguntei, perdida.
— Aqui!
Porra! É o Ricky.
— Tudo bem? — O chefe indagou com a testa enrugada.
Inferno.
E todos os olhares estavam em quem? Em mim!
Parabéns, Júlia, sua indecente.
— Tudo ótimo. — Pigarreei, uma, duas, três vezes. Ridícula. — Continue,
por favor.
— Claro, gostaríamos de desenvolver ótimos profissionais, por isso você
está aqui hoje. Vai aprender na prática como funciona a área que está estudando.
— O irresistível colocou aquele sorrisinho cafajeste de canto de boca,
intensificando o olhar, engoli em seco, enquanto meus pés formigavam dentro do
salto. Havia uma troca insana de desejo entre nós, algo incompreensível a olho
nu. — Então, aproveite, Srta. Sales.
— Obrigada, vou dar o meu máximo, lembrando que todos da equipe foram
bastante amistosos comigo, estou com muitas expectativas referente à WIS.
— Ótimo. — Ele permaneceu com seus olhos castanhos fixos em mim,
inflamando a minha pele, não me dignei a olhar ao redor, apenas me preocupei
em controlar o fogo no rabo, até… obrigada Jesus, ele voltar a falar: — Ok,
agora vamos falar sobre a ação de marketing nas mídias sociais. Acredito que
temos ideias aqui. Orion, pode começar.
Estou com frio…
Estou com frio…
Estou com frio…
Repeti mil vezes a frase como uma espécie de exercício mental, aprendi isso
com o meu professor de educação física no ensino médio: foque em um
pensamento, repita-o continuamente até o torná-lo real.
Não estava funcionando como devia, por isso, permaneci tentando.
Precisava resfriar esse fogo que queimava minha pele. Que coisa maluca era
essa entre Ricky e eu, como conseguimos nos levar ao limite assim? Tínhamos
que parar, não podíamos mais nos encarar daquela forma, acreditei fielmente que
ninguém percebeu o desconforto sexual entre nós, caso contrário, estaria em
maus-lençóis.
Ar frioooooooo…
Finalmente o ar-condicionado começou a fazer efeito e, mesmo com
dificuldade, tentei me concentrar na reunião.
O tempo preenchido com debates e avaliações estratégicas não passou tão
rápido, mas me fascinou a cada segundo, se havia alguma dúvida de que
marketing seria minha carreira, nessa manhã desconsiderei todas elas. Olhei
minhas anotações, satisfeita com tudo que aprendi, mesmo sob a pressão atraente
de um certo executivo de terno cinza. Comentei rapidamente com Orion alguns
pontos, que iam ser esclarecidos quando eu retornasse do almoço, chequei a hora
e estava um pouco atrasada do horário que marquei com a Raica, portanto me
apressei em sair da sala, mas fui barrada por uma voz feminina, nada suave:
— Júlia — olhei para trás —, depois que você retornar do almoço, vá direto
à minha sala, tenho algumas tarefas para lhe passar — Ellen solicitou ao lado de
Ricky que, por sua vez, não disse nada, manteve suas mãos escondidas no bolso
da calça e uma seriedade no rosto perfeito.
— Claro — anuí e caminhei até a saída sentindo os olhares com diversas
vertentes queimando minhas costas.
Encontrei Raica no térreo e ela logo reparou a falta de um sorriso, mesmo
com muita insistência a caminho do Chill, não mencionei nada, ainda assim
considerei desabafar com ela, quem sabe a preta me norteasse nesse deserto que
estavam meus sentimentos.
— Raica, tem um cara — soltei sem que ela esperasse, após ocuparmos uma
mesa no fundo da hamburgueria.
Ela ergueu uma sobrancelha.
— Eu sei, girl.
— Mas não posso dizer quem, não agora.
— Ele magoou você?
— Não, só… — Hesitei, encontrando a melhor maneira de me expor, sem
expor muito. Tá legal, não tinha como, precisava soltar o verbo. — Só temos um
tesão sufocante que nos consome sempre que estamos perto e…
— Isso é um problema? — Ela praticamente me chamou de idiota.
— É — falei e massageei a face, sentindo uma leve ardência nos olhos. —
Não podemos ficar juntos.
— Não! Por quê?
— Raicaaaaaa… não piora.
— Amada, preciso de um motivo para você ter tesão pelo cara, ele por você
e ambos não transarem.
— Ele é o Ricky Walker.
A preta ficou branca e tapou a boca.
— O CMO? Dono? Gostosão?
Encarei a filha da mãe, sem querer sorrir, mas esticando os lábios sem ter
como. Raica coçou a nuca e batucou na mesa. Entendendo finalmente meu
dilema.
— Júlia, como aconteceu essa aproximação?
— No primeiro dia, no elevador, nos olhamos e eu não sabia quem ele era.
Descobri por acaso, num jantar nada agradável, que o namorado da vaca da
minha prima é primo dele.
— Uauu…
— Tem mais. — Ela arregalou os olhos. — Saímos para jantar, nos beijamos
e quase pá… é isso.
A garota teve um faniquito momentâneo, seguido por tosse e uma brusca
descoloração facial, por pouco não chamei o SAMU.
— Vocês quase, “tico tico no fubá”? “Fuc fuc”?
Gargalhei mesmo, a ponto de explodir.
— Quase transamos, Raica. O homem me enlouquece, estou praticamente
tarada por ternos e na reunião ele quase me infartou, sou muito nova pra morrer
com tesão reprimido, amiga.
— Mulher, se morrer após o orgasmo eu até entendo, agora se morrer na
vontade, mana, é sacrilégio.
Quase enforquei ela.
— Raica, me ajuda — pedi, colocando seriedade no assunto. — Temos uma
atração louca e inconsequente. Porra, ele é meu chefe…
— Bilionário…
— … e gostoso pra caralho, é sobre isso.
Ela sibilou.
— Júlia, suponhamos que ele esteja usando você. O homem é poderoso, voa
pelo mundo com seu jatinho e corre na rua com um conversível, imagine as
periguetes que correm atrás dele.
— Eu sei… — confessei derrotada.
— Jú, um homem desse ilude qualquer mulher, até eu que não sou muito
chegada a branquelo, molharia a calcinha fácil por ele, mas… — Ela semicerrou
os olhos, como uma agente prestes a desvendar um mistério. — Também pode ser
uma atração mútua, e aí, minha filha, só transando pra saber.
— Raicaaaa….
— Peçam, meninas! — Chill chegou de súbito e estranhamos de primeira a
ausência da Eduarda.
— O que houve com a Duda? — Raica quis saber.
— O filho dela está muito doente — respondeu o chinês. — Agora façam os
pedidos.
— Não sabia que a Eduarda tinha filho — exclamei, surpresa.
— Tem sim, um menininho de seis anos — contou Raica.
Com o chinês impaciente ao nosso lado, fizemos os nossos pedidos, o
serviço demorou um pouco a acontecer devido à ausência da garçonete, portanto,
nem finalizamos como devíamos a refeição e corremos para a WIS. Raica
garantiu me ligar à noite, para conversarmos sobre o segredo que a fiz prometer
guardar. Depois de dividir com a preta, me senti mais aliviada, fui ao banheiro
antes de encarar a Ellen, passei alguns minutos me olhando no espelho e
questionando meus sentimentos, “talvez” era a palavra que oscilava entre uma
frase ou outra, quando o “Ricky” não ganhava em disparado na turbulenta onda
que estava o meu cérebro.
Respirei fundo e bati à porta.
— Pode entrar — a resposta veio de dentro.
Minha cabeça entrou primeiro e depois coloquei meu corpo para dentro da
enorme sala rodeada por vidros.
— Com licença.
Ellen parou de imediato o que fazia e me avaliou sem disfarce, mas se
manteve atrás da sua mesa de vidro metricamente organizada.
— Sente-se, por favor.
— Você tem tarefas para mim?
Uni a ação com a fala, admirava a executiva que pra mim era um exemplo a
ser seguido, porém pretendia ficar o menor tempo possível ali dentro, não me
sentia confortável por diversos motivos: e se Ricky tiver um caso com a Ellen? E
se eu estiver no meio deles como uma idiota. E se ele estiver fazendo as duas de
idiotas?
Cacete.
De qualquer forma não me interessava, meu cérebro cortou relações com
meus instintos. Decidi que não me deixaria mais levar por esse desejo
descomunal que sinto pelo Ricky.
— Sim, tenho, vejo que Ricky é bem generoso com os novos e está sendo
com você.
Calma aí.
O que ela quis insinuar?
— Não entendi. Generoso?
— Você é muito inteligente, sei que vai se dedicar muito para crescer. Com
isso, quero que você faça uma grande pesquisa referente às críticas negativas dos
nossos estudantes. O que eles falam sobre nós e como eles nos veem como
universidade.
Ela ignorou descaradamente a pergunta, posso seguir interpretando a
estagiária agradecida com o elogio, ou repetir a pergunta, o que criaria um
impasse e não seria nada satisfatório para quem acabou de conquistar uma bolsa.
Sou pequena na WIS.
Melhor evitar problemas.
— Os veteranos? — Me atentei aos detalhes.
— Sim, você consegue? — ela não perguntou, foi praticamente um desafio
em bom tom. — Tenho dúvidas — provocou.
— Se há dúvidas, não devia me designar à função.
Ok, ela me ofendeu.
— Estou lidando com uma estagiária com língua afiada.
— Não é essa a questão, Sra. Ellen.
— E qual é?
— Darei o meu melhor, preciso que confie em mim — abrandei o meu tom.
Acredito ter deixado claro com quem ela estava lidando. — Para quando? —
perguntei educada.
— Segunda-feira. Eu quero números e fatos.
— Terá conforme o solicitado.
— Agora pode sair — disse, áspera.
Inalei um sorriso, sem ocultar meu desagrado com o rumo da conversa.
— Obrigada, Sra. Ellen.
Não retribuiu, nem sequer moveu um músculo por educação, ela apenas
permaneceu me encarando, havia vários tons rebuscando seu rosto. Ellen me
queria por perto, e melhor, queria que eu soubesse quem mandava.
Voltei para minha mesa. Orion já estava presente, contei a ele o pedido feito
pela chefe e aproveitamos para conversar um pouco sobre a reunião. O resto da
tarde me ocupei com o início da pesquisa, havia muito trabalho a ser feito,
portanto ignorei todos à volta, focando somente no que me foi proposto. Só me
dei conta de que havia anoitecido quando fui à copa pegar um café, o andar estava
praticamente vazio, silencioso, tranquilo. Tomei com calma meu cafezinho,
pensando um pouco no meu dia e no jeito como as coisas vinham acontecendo.
No caminho de volta, reparei uma placa dourada na sala ao lado da Ellen, me
aproximei, pois não tinha percebido o brilho da placa.
— CMO - Ricky Walker — murmurei e olhei em volta, mas não havia
ninguém no andar que pudesse me escutar, impulsiva, intrometida, arrisquei e
girei a maçaneta. Tendo a entrada liberada, sei que cometeria uma grande loucura
entrando ali, mas afinal, quais foram as loucuras cometidas nos últimos dias que
me impediam?
Primeiro espiei da porta o amplo espaço ainda em reforma, com cheiro de
tinta fresca, não contive os passos e avancei até as largas janelas, sem cortinas ou
persianas. O crepúsculo da cidade iluminada por pingos de luz ofuscava a sala,
fiquei contemplando a vista na penumbra que mantinha meu corpo oculto.
— Gostou da vista? — A voz rouca ecoou pelo cômodo quase vazio, e
percebi que tinha coração quando virei e me deparei com o Ricky.
12 | Júlia Sales
Digamos que acordar foi algo quase que impossível, minha mãe me chamou
três vezes, abriu as janelas — coisa que odiava, os passarinhos cantaram, assim
como as buzinas dos carros, o homem do pão gritou “pão fresquinho freguesia”
com sua bicicleta, mas nada foi suficiente para me tirar da cama, parecia que
estava pregada. Não tinha energia, um sentimento de tristeza se apossou de mim.
Cogitei não ir ao trabalho, só um dia, talvez uma desculpa como um resfriado
fortíssimo convencesse o Orion de que eu pudesse contaminar todo o andar.
— Júlia, tenho cliente cedo, tenho que ir para o salão — dona Ana
esbravejou, retornado pela quarta vez ao meu quarto. — Filha, o que houve?
Olhei para ela e senti uma vontade de chorar.
— Júlia, fale comigo, estou preocupada.
Ela se sentou na beirada da cama.
— Estou cansada, mãe — menti, bem que não foi uma mentira completa,
visto que nem eu mesma sabia meu diagnóstico. — Recebi uma tarefa que mexeu
um pouco com a minha confiança.
— Amor, isso se chama trabalho, não pode ficar assim toda vez que receber
uma responsabilidade.
— Eu sei, mãe.
— Eu conheço você, tem mais coisa aí, conta, é uma ordem.
E qual era a resposta, Júlia?
Responda para si mesma.
Devia estar na plenitude, linda e radiante depois do sexo maravilhoso que
me consumiu na véspera, no entanto estava um bagaço, triste e sem fé. Parecia
que um trator havia passado por cima de mim, os sentimentos bagunçados. Eu
nunca fui a garota de uma noite, eu sou intensa demais, em tudo, se quero
conquistar algo me entrego por completo. Inferno. Onde eu estava com a cabeça
quando permiti provar desse homem? Quando me permiti ser marcada por ele?
Ricky é meu chefe e em breve estará em outro país, com outras garotas e
eu… Dei um salto da cama, que assustou minha mãe e fui para o banho, “não
posso e não vou remoer acontecimentos como se eles me custassem a vida”. Não
sabia exatamente onde li a tal frase, mas me apeguei à estrutura e me aprontei
para o trabalho.
Basta!
Mesmo sem acreditar nas desculpas esfarrapadas que dei, dona Ana não me
encheu de perguntas, apenas me desejou um ótimo dia, logo após me dar uma
carona. Entrei no andar do Marketing, com um sorriso forçado no rosto,
disfarçando para não sei quem, não sei o quê. Já que era provável que ninguém
soubesse o que aconteceu naquela sala. Parei um pouco distante do recinto, já
recebendo a imagem do Ricky escorado no batente…
— Bom dia, Jú — Raica me saudou, andando na minha direção. —
Melhorou?
— Não.
— Qual remédio você tomou, girl? — ela disse preocupada, foi quando
lembrei da maldita dor de cabeça que usei como desculpa. — Tenho um ótimo,
quer o nome?
— Já tomei Advil, Raica. Obrigada.
Atravessamos juntas o escritório até a nossa ilha, onde ficava concentrada a
equipe do Orion, sentei-me na minha mesa com uma sensação esquisita — talvez
seja pelo fato de ter transado com meu chefe na sala dele, logo ali à frente —,
deixei cair a cabeça no meu antebraço, e só levantei quando ouvi a voz da Ellen,
desejando um “bom dia a todos”, e notei que a Raica me encarava sem piscar.
— O que foi, Raica? — perguntei antes de ligar o computador. — Pare de
me olhar assim — avisei, tamborilando a mesa com as pontas dos dedos,
aguardando que o computador, lerdo para cacete, iniciasse.
— Aconteceu, então?
— Aconteceu o quê? — dupliquei a pergunta.
Ela praticamente colou em mim, pois não estávamos sozinhas, havia três
mesas com espaços consideráveis, mesmo assim era possível que escutassem.
— Foi por isso que não me atendeu ontem? — sussurrou.
— Estava com muita dor de cabeça, já disse — sussurrei também.
— Júlia, olha pra mim.
Olhei para ela, senti meus olhos arderem, então cobri o rosto com as mãos.
— Meu Deus, Jú. Vem cá. — Ela me segurou pelo braço, e me arrastou para
o banheiro. Antes de abrir a boca se certificou que não havia ninguém nas cabines
e trancou a porta.
— Raica não podemos ficar aqui, alguém pode ter uma dor de barriga a
qualquer momento — disse e escorei na pia, me encarando no espelho que
também refletia a imagem da Raica, encostada na porta.
— Esse não é o único banheiro da empresa, que procurem outro para cagar.
— O Orion vai chegar e sentirá nossa falta.
— Desenrola, aconteceu? — ela me encurralou.
Inspirei e assenti.
Sua boca foi ao chão.
— Júlia… — Ela se aproximou, chocada. Mas logo franziu o cenho
intrigada com a minha expressão nada feliz. — E qual é o problema? Não foi
bom?
— Foi… — choraminguei. — Bom demais.
— Ué? — Ela girou meu rosto para que seus olhos lessem os meus. — Meu
Deus, você gosta dele?
— Gosto dele?
— Eu perguntei isso, girl. Mas agora estou afirmando. Você gosta dele e não
é pouco.
— Não!!! — Explorei o banheiro, todos os cantos, andando de um lado para
outro igual a uma desorientada. Raica enlouqueceu, só pode. — Eu nunca transei
com uma pessoa com a ideia de esquecer no dia seguinte. É isso.
— Com quantos você transou, Jú?
— Um!
Ela gargalhou, a filha da mãe riu muito da minha cara e depois me segurou
pelo braço para que eu aquietasse.
— Jú, experiente você não é, vamos combinar. Porém não é por isso que
estou rindo.
— É por que, então?
— Não era e nunca foi só tesão, amada.
— Sim, sempre foi e ainda é.
— Júlia, no Chill, quando me contou, já tinha percebido a maneira que seus
olhos brilhavam quando você falou como ele te enlouquecia. Mas preferi não
falar nada.
— Raica, então permaneça não falando, estou muito confusa para assimilar
qualquer coisa.
— Você se apaixonou.
Arregalei os olhos com o absurdo. Eu sei exatamente o que é estar
apaixonada, e não sinto isso pelo Ricky.
Não sinto.
— Negativo… — Peguei várias toalhas de papel, as umedeci na torneira e
tateei a nuca. — Eu saberia se estivesse. É apenas uma atração, Raica.
— Atração? É nisso que prefere acreditar?
— Isso é a verdade.
— Tá bom. — Ele destrancou a porta. — Melhor irmos, o Orion já deve ter
chegado.
— Vá na frente, por favor, preciso de um minuto.
Minha amiga me lançou um olhar carinhoso e saiu enquanto eu permaneci
me encarando pelo espelho, perturbada, inquieta. Ocupei uma cabine quando
percebi que precisava de um tempo antes de voltar. Não enxerguei coerência em
nada dito pela Raica, pelo contrário, achei tudo um grande absurdo. Eu me
apaixonei pelo Caio e sofri muito quando ele me traiu, o filho da puta não se
dignou a me pedir um perdão que fosse, simplesmente seguiu com a fama de
comedor e ignorou a cafajestada que fez. Eu lembro que chorei muito por aquele
idiota. Mas sofro até hoje quando penso na Melissa, toda nossa infância, amigas
leais e a vaca jogou tudo pelo ralo por uma trepada.
Se fui capaz de esquecer parte da canalhice, não vou esquecer uma transa?
Levantei-me, ajustei a postura, abandonando o estado melancólico naquela
cabine.
Quando surgi no andar, o olhar de Orion se prendeu ao meu até que eu
alcançasse sua mesa.
— Desculpe, Orion, não estava me sentindo muito bem.
— Tudo bem, Júlia. — Ele pegou minha mão e a segurou. — Como se
sente?
— Eu estou melhor.
— Seu rostinho triste me mostra outra coisa. Acha que pode continuar?
— Sim, claro. — Tirei minha mão devagar, para não parecer indelicada. —
Com licença, vou trabalhar.
Sentei-me no meu lugar, que ficava em frente à mesa da Raica, com um
certo pudor da aproximação de Orion, mas como ele sempre foi gente boa, não
me importei. Diferente da preta, que parece que tirou o dia para me atormentar. A
pirracenta ficou, sem que o homem percebesse, imitando o jeito que ele pegou na
minha mão, zombando, o que a transformou numa amiga muito chata.
O período da manhã passou bem rápido, pois estávamos muito atarefados
com a nova campanha e eu ainda tinha a tarefa extra solicitada pela Ellen. Num
exato momento do dia, Orion entregou a Raica alguns papéis repassando para ela
algo novo, que devia ser confiado em, no máximo, duas horas. Quando o homem
se afastou, perguntei curiosa, do que se tratava.
— Jú, só sei que tenho que finalizar essas planilhas no Excel, para o Orion
enviar para o Ricky Walker, que ficará em home office hoje — ela explicou, com
um sorrisinho zombeteiro que passei a odiar.
— Ele não vem hoje?
— Não, Jú.
— Sabe por quê? — perguntei só pra saber mesmo. Vai que estivesse doente,
ou… sei lá, uma virose. Coisa do tipo.
— Provavelmente esteja muito cansado da noite…
Arremessei três das minhas canetas nela e revirei os olhos.
A Raica realmente estava irritante hoje.
Ricky
Parei em meio à calçada e apoiei as mãos nos joelhos, quando o
aplicativo apitou marcando meu tempo e quantos quilômetros havia percorrido
essa manhã, alcancei 15 km, já era o bastante, atravessei para comprar uma
garrafa de água no bar da frente. Peguei uma banqueta do próprio lugar e fiquei
por ali mesmo, enquanto o senhor dono do local finalizava a abertura das portas,
ainda eram seis da manhã, o sol despertava distante, lento, preguiçoso. Não havia
tons alaranjados garantindo um lindo dia ensolarado, quem sabe o sol preferisse
ficar entre nuvens cinzentas e carregadas.
Assim como eu.
Penei ao pegar no sono, a madrugada me condenou a ficar acordado
relembrando tudo que permiti acontecer naquela sala e, mesmo após uma garrafa
de vinho, o gosto da ninfeta permaneceu na minha boca.
Ainda permanece.
Não pretendia aparecer na WIS, ia permitir que Júlia tivesse um dia
tranquilo, pelo pouco que a conheço minha presença podia desestabilizá-la ou até
prejudicá-la. Apesar dessa distância também ser algo que precisava, não sei por
que, mas as coisas não estão como deveriam.
— Ricky — chamou, com as mãos no volante, o investigador cafajeste. —
Vou estacionar, um momento, irmão.
Athos manobrou o carro e estacionou na vaga do bar. Logo a sua expressão
pesada e aflita obteve a minha atenção, pelo visto sua noite não foi das melhores.
— Cara, que bom ver você — falei puxando-o para um abraço. — O que faz
na rua tão cedo?
— Irmão, pergunto o mesmo. — Seus olhos caem para a minha garrafa
d’água. — E ainda bebendo água?
— Estava correndo. Quer que eu beba o quê? Após bater 15 km.
— Cerveja, lógico — ele brincou. — Vou acompanhar você na próxima
corrida, comprei um apartamento aqui perto, quando estiver no Brasil já tem um
vizinho.
— Um vizinho putão, era o que eu precisava para entrar na linha.
— Saiu da linha, irmão? — Apertou meu ombro. — A Ellen conseguiu
finalmente?
— Não a Ellen, e não é bem isso, preciso conversar um pouco. — Respirei
fundo, ordenando meus pensamentos. — Um drink, que tal à noite?
— Al’CUBE para extravasar?
Desconsiderei a ideia, um drink e a companhia do meu amigo, era o que
precisava.
— Não, meu apartamento, o que acha?
— Hum… o assunto é sério pelo visto. Então, no meu, assim te apresento
meu novo espaço.
— Combinado.
Um pouco depois de Athos explicar o que fazia ali tão cedo, mencionando,
em confidência, um pouco sobre sua vida de investigador, ele foi embora, pois
precisava descansar após um plantão de quase trinta e seis horas.
Não demorei muito e voltei para a cobertura, sem sol como imaginei. Ao
decorrer do dia, trabalhei na próxima campanha nacional, em poucos dias havia
uma viagem agendada para o Sul, e até o final do mês voltaria para a Califórnia.
Pretendia passar um tempo com a minha mãe, coisa que há meses não acontecia,
antes de ingressar nas campanhas internacionais.
— Como você está? Trouxe comida.
Ellen suspendeu duas sacolas e cruzou a porta.
— O que faz aqui? Não disse que hoje trabalharia em casa?
— Sim, disse, mas achei que estaria com fome e trouxe delícias para
jantarmos.
— Já comi, tenho cozinheira, Ellen — falei ao alcançar os degraus e retornar
para o closet, ia colocar a camisa quando Ellen apareceu sem avisar. Ela me
seguiu e se calou até entrarmos no cômodo.
— Ricky, o que está havendo afinal?
Olhei para ela quando abotoei o último botão da camisa, já com algumas
palavras formuladas, talvez esse fosse o momento de me afastar um pouco.
Muitas vezes essa constatação cruzou meus pensamentos, e tentei, mas a mulher
de lindos olhos azuis me convencia do contrário. Ellen precisava seguir e eu não
estava preparado para acompanhá-la e, ao mesmo tempo, cansei desse tipo de
relacionamento que mantemos um com o outro. Não sei, mas algo me despertou,
sinto-me um egoísta.
— Vai sair? — ela perguntou, quando analisou minha movimentação no
closet, estava me arrumando para o drink no apartamento novo do meu amigo. —
Com quem vai sair?
— Com Athos.
— Hum, ótimo, posso ir, estou com saudades de conversar com ele. E se
permitir, quem sabe não prove dos dois? Faz tempo que não fazemos uma
festinha assim.
Ardilosa e sempre com o mesmo armamento, a sedução.
— Não, precisamos conversar, eu e você. — Intensifiquei, quando parei. —
Agora!
— O que quer, Ricky? — esbravejou, e passou suas unhas compridas pelos
longos cabelos, abrindo algumas frestas no véu negro. — Mais um tempo? Esse é
o motivo da distância?
— Sim, é. Mas não é um tempo que preciso, é um fim.
Ela ergueu uma sobrancelha, procurando algo para se apoiar, não disfarçou o
choque das palavras. Pelo contrário, trouxe à tona sua fragilidade; a que somente
eu conhecia; a que me quebrava sempre; me fazendo repensar e então
permanecer.
— Fim? Houve um começo, Ricky? — cobrou, dramática.
— De novo? Pare de se vitimizar. O que prometi a você até hoje?
Havia várias coisas pendentes entre nós, que fomos carregando sem atenção
todo esse tempo, mas que uma hora ou outra pesaria. Temos esse relacionamento
aberto e sem hipocrisia, aberto só para mim, há anos. Exatamente desde a
faculdade, quando ainda éramos jovens e tudo era possível. Namoramos e
chegamos a noivar, só que nunca foi o que eu quis, minha família me pressionou
e me senti na época obrigado a me responsabilizar, já que Ellen era querida por
todos. Mesmo eu não querendo prosseguir, ela insistiu em ficar.
Ok, eu permiti.
Ok, sou um filho da puta por isso.
Contudo, nunca menti.
Além do que a Ellen guardava segredos meus obscuros, covardes. Não me
julgou quando devia ter julgado, ficou ao meu lado quando eu merecia desprezo.
Portanto, tinha que libertá-la desse círculo vicioso que nos colocamos.
Ela merecia mais.
— Quem é ela?
— Não há ninguém.
— Mentira, conheço você, distante e sem sexo. São os alarmes de que tem
alguma vagabunda na vez, aí depois que você se farta com o novo, volta para
quem? A Ellen!
— Ellen, não tem ninguém, estou falando sobre nós. Porque a desculpa
sempre é outra?
— Sempre é assim, Ricky. Quer que eu comece a lista?
— Porra, Ellen, não consigo dar o que quer. Qual é a parte que não
entendeu? — gritei, ferindo o meu autocontrole. Ela não disfarçou a surpresa com
o tom, visto que nunca fui tão agressivo com ela. — Desculpe, não queria gritar
com você. — Não entendo o porquê estou tão irritado se já tivemos esse tipo de
conversa e sei como funciona.
— Mas gritou, eu vou embora…
Ela movimentou o corpo rápido e atravessou a porta, considerei por um
instante não aceitar sua partida até que finalizássemos a conversa. No entanto, me
sentia exausto mentalmente, devido à vontade existente e incompreensível de
ligar para a garota de boca provocante, estava ficando incomodado, como os
meus pensamentos sem permissão voltavam para a Júlia.
Não fazia nenhum sentido o desejo sem medidas que eu nutria por ela, ao
mesmo tempo que me excitava, me irritava. Júlia trazia consigo uma energia
diferente, capaz de realçar minha percepção. Me julguei louco ao notar uma
pintinha delicada um pouco abaixo de sua boca sexy, a mistura de verde com
caramelo em seus olhos fazia com que seu olhar fosse intenso, atraente, sincero…
deixei-me fascinar, como um universitário cretino.
Outros diriam o quanto patético eu sou, estava praticamente vidrado no jeans
apertado, tarado nas curvas que Deus caprichou propositalmente para me
enlouquecer de certo.
Eu seria um hipócrita se não admitisse que uma garota de vinte anos feriu
meu ego. Uma recusa não era tão aceitável assim, não existiu um dia na terra em
que almejei algo e não o obtive.
Desafiado.
E com tesão.
E isso fodia com tudo.
Por outro lado, era admirável sua maturidade, Júlia batalhou para conquistar
uma vaga na WIS, respeitava muito seu esforço e jamais permitiria que alguém a
prejudicasse. O que de fato era uma possibilidade caso eu insistisse em ouvir
minha cabeça de baixo. Chequei a hora, liberando meus pensamentos, beber com
o puto traria a solução a uma parcela dos meus problemas. Sem prolongar a
sandice, peguei o necessário e segui para o apartamento de Athos.
O prédio, muito bem localizado a uma quadra do meu, era uma construção
nova, com isso destilava bom gosto e sofisticação. Admirava meu amigo, além de
o considerar como um irmão, ele merecia o melhor, trabalhou pra caralho, não
aceitou as sobras que a vida lhe ofereceu, quis se fartar dela, acompanhei mesmo
de longe o quanto ralou para atingir seu patamar profissional. Athos Garbo é um
sobrevivente da guerra cruel que alguns são convocados na vida, aprendi com
esse cara coisas que meu pai não foi capaz de me ensinar.
Desci no nono andar, o número 206 entrou no meu campo de visão, nem
precisei bater à porta, ele sentiu minha chegada.
— Sou sensitivo agora, fiz um curso no youtube — brincou e abriu
passagem.
— Porra, o bebezão tomou até banho para me receber — disse, avaliando o
ambiente e a cara lavada do monstro. — Brother, que lugar.
— Ricky, precisava de uma casa para chamar de minha, um lugar para voltar
depois de visitar o inferno. Anos de economia e cá estou eu. — A carga na sua
voz revelou o quanto sua profissão o sugava, o oprimia. — Como pode ver, tenho
pouca mobília, mas há um bar, um sofá, uma cama, e cara… — Ele sibilou,
enquanto avança para a bancada. — Tenho uma vizinha gostosa pra caralho, a
quem vou pedir uma xícara de açúcar ainda hoje.
Gargalhei, com sua habilidade em conhecer a vizinhança.
— Deu tempo de conhecer arredores?
— Você sabe que sou atento a tudo, adoro conhecer pessoas com bundas
empinadas e bocetas úmidas, sou investigador, tenho o faro. — Ele riu e me
entregou o copo.
Olhei para a dose de uísque como se fosse a salvação dos meus
problemas.
— Preciso muito disso. — Virei de uma vez, pressionando o rosto quando o
gosto amargo desceu pela garganta.
— Ricky, fiquei preocupado, senta aí, irmão. Vamos conversar.
Nos acomodamos no sofá, logo após eu preparar outra dose para
acompanhá-lo, rapidamente reconheci, Garbo estava descontraído e relaxado,
bem diferente do estado angustiado que presenciei pela manhã. Já eu, permanecia
desordenado, embora tentasse disfarçar o descontentamento, não consegui.
Porra. Qual o meu problema?
— Mano, você transou com a estagiária no escritório em reforma? Na WIS?
— O filho da puta fez a pergunta, repetindo tudo que contei segundos antes. Já
tinha sido difícil falar e ouvir foi um pouco pior. — O que tinha na cabeça?
— Tesão, muito desejo, aquele que enlouquece e não conseguimos ver mais
nada.
— Tesão capaz de fazê-lo esquecer do passado?
— Júlia é diferente não tem nada a ver com a… aquela história… você sabe.
Dei um gole na bebida, ligeiramente incomodado.
— Sim, eu sei. — Ele tomou um gole da bebida, me examinando com seu
olhar excêntrico, um que odeio, como se ele fosse dez anos mais velho que eu,
quando temos a mesma faixa de idade. — Ok, não vou comparar presente com o
passado, então partimos deste princípio: você comeu a garota e o que mudou?
Não entendi essa parte. Que porra de cobrança é essa na sua cara? Nunca houve.
Embora eu seja o campeão de foda, você, cara, tem várias amantes pelo mundo. O
que tem a tal estagiária?
Boa pergunta, amigo.
O que a Júlia tem que se mantém nos meus pensamentos?
— Não sei.
Ele estreitou os olhos, enquanto “matou” o líquido do copo.
— Foi mais que sexo, não foi? — indagou.
Analisei o fluido âmbar do copo, meneando a bebida levemente.
— Não sei, Athos. — Pousei o copo no assoalho e joguei as costas no
encosto. — Foi diferente, só isso.
— Ok, diferente, tá certo. — O puto se levantou, em busca de outra dose. —
Diferente… hahahah…
Não prolonguei mais a conversa sobre o conteúdo proibido chamado “Júlia”,
fiz o possível para esquecer e nos concentramos em outros assuntos. Como fazia
um tempo que não nos víamos, tínhamos muito o que falar.
— Me atualiza da investigação da Gaia, alguma pista?
— Nada novo, tenho uma viagem agendada há algumas semanas, algo me
diz que vou encontrar algumas respostas na Califórnia.
— Se precisar de qualquer coisa, pode contar comigo e aproveita para visitar
dona Sara, ela vai explodir de felicidade com a sua presença…
— Saudades da Sara, e um pouco do carrancudo do Robert.
— Meu pai, sempre o mesmo.
— Nicholas, por onde anda?
Engoli o amargo.
— De volta ao Brasil, quem sabe você não topa com ele na Al’Cube,
qualquer dia desses.
— Irmão, faz muito tempo, o quê? Sete anos?
— Quase isso.
— Então, essa parada entre vocês, tem que ter um fim, não acha?
Misturei o amargor da bebida com o ácido da descrença, e engoli. Pensar no
meu irmão, ou no passado que nos desuniu era mexer na ferida não cicatrizada.
Apesar de me apetecer eliminar o ocorrido e, na melhor das hipóteses, voltar a ter
um irmão, não acreditava na tal possibilidade, o Nicholas evidenciava seu ódio
sempre que o destino nos confrontava.
— Não tenho certeza — confessei sem fé.
Permaneci um pouco mais de três horas na companhia de Garbo, fazendo
daquele momento o escape para amenizar os outros que me perturbavam. Ignorei
meu lado irritante, abrindo espaço para descontração, precisava falar bobagem,
extravasar com o álcool no sangue. O peso que carregava nas costas comandando
a WIS UNIVERSITY CONECT, por diversas impediu que relaxasse por completo,
e Garbo era esse lado, nosso encontro me permitia ser outro Ricky.
14 | Júlia Sales
No dia seguinte o Ricky também não apareceu na WIS, assim como nos
outros três dias que restaram para completar a semana. Tudo era reportado por e-
mail e, mesmo distante, era visível que seus olhos se mantiveram ligados. Orion
não sabia o que fazer para agradar os pontos da campanha que o CMO não
aprovava. Em contrapartida, sua ausência aliviou a pressão da sua presença, os
momentos inesquecíveis do escritório eram frescos, ou melhor, eram tão vivos no
meu peito quanto entre minhas pernas, provavelmente meu sistema entraria em
colapso se a cada passo que desse tivesse sua estrutura atraente a me rondar.
Ainda sentia o gosto de sua boca, assim como seu toque na minha pele.
Ricky avisou um pouco antes de tomar-me para si que se eu ficasse nunca
mais seu nome sairia da minha cabeça, e ele não estava errado.
— Sextooooouuu, Jú. — Raica surgiu de repente, enquanto eu aguardava o
elevador. — O que a senhora pretende fazer hoje?
— Nada de novo. — Entramos quando as portas metálicas abriram no andar.
— Fazer brigadeiro e assistir a um seriado.
— Credo — ela resmungou. — Tem coisa melhor pra fazer não, amada?
— Não, Raica, a semana foi interminável, preciso de descanso.
— Tá certo, desculpa aí. — Descemos do elevador e fomos em direção à
saída. — Tenho um convite, na verdade, um apelo. Mudança, preciso de ajuda,
topa? Amanhã?
— Quer que eu carregue caixas em pleno sábado? — dramatizei.
— Nossa, Jú, sou uma amiga tão dedicada…
— Ah, sei, tá mais para pirracenta. — Fiz charminho, mas claro que topei.
Raica deu uma trégua nas gozações e me aconselhou bastante durante a
semana, o que fez com que eu ficasse mais tranquila em relação ao Ricky. Agora
era minha vez de apoiá-la, já que a mudança para o novo apartamento ia ser um
passo enorme, a sonhada independência. O desejo de qualquer jovem, só que no
caso dos irmãos era a libertação da repressão dos pais que não aceitavam a
escolha sexual do filho. Renan, por sua vez tinha opinião firme, não havia
dúvidas em relação à sua sexualidade, admirava isso nele, a sinceridade e
aceitação de si mesmo.
Foda-se se a sociedade dos hipócritas nos obrigasse a pensar o contrário.
Antes de atravessar a catraca do metrô, procurei o celular para enviar uma
mensagem para minha mãe, ia sugerir um jantarzinho especial, já que seu
restaurante preferido ficava no caminho. Não encontrei o aparelho mesmo
revirando cada canto da bolsa. “Merda” me amaldiçoei por ser tão distraída. Sem
escolha, decidi retornar para a WIS, talvez o tivesse esquecido em cima da mesa,
marchei de volta ainda inconformada.
Diante do prédio, travei os pés, meu coração também parou de bater naquele
instante, quando avistei o Porsche de Ricky estacionado no lugar de sempre.
Foram várias as tentativas que meu subconsciente ofereceu para me convencer a
ir embora, deixar o celular pra lá e não entrar no prédio, no elevador e no andar.
Quem dera tivesse escutado.
O andar estava com meia luz, praticamente deserto, claro que havia aquela
esperança de encontrar o executivo, mas sem chances, provavelmente ele tinha
ido em outro andar. Dei de ombros e fui até minha mesa encontrando o safado do
aparelho perdido, chequei rápido as mensagens e aproveitei para enviar uma para
mamãe com a sugestão do jantar. Guardei o celular na bolsa e, ao virar para sair,
esbarrei numa pilha de papéis na mesa da Raica, provocando uma desordem aos
meus pés.
“Merda.”
— O que há comigo hoje? — resmunguei, agachando-me para recolher as
folhas espalhadas.
Foi então que ouvi o barulho do elevador, anunciando sua chegada no
saguão, o som soou bem mais alto que de costume, em consequência do silêncio
do local. Reconheci as vozes acompanhadas dos passos que exploraram o solo,
me encolhi temendo ser descoberta, tapei a boca para não deixar escapar nenhum
ruido, até que não houvesse sinais de alguém por perto. Aliviei o pulmão,
levantando-me em seguida com cuidado. Só havia uma única decisão a se tomar,
guiar-me na direção do elevador e evaporar sem que ninguém desconfiasse da
presença infeliz, porém meu nome é Júlia e quase sempre desafio o sensato.
De longe a conversa ou discussão, não soube definir, magnetizou meus
passos até a sala iluminada que manteve a porta entreaberta. Sim…, considerei
não prosseguir, afinal nada ali era da minha conta, mas…
— Não, Ricky, eu amo você.
A declaração desesperada, fez com que eu cravasse os dois passos que
faltavam para ter a visão do casal.
— Ellen, por favor…
Dei mais um passo, outro e deparei-me com o beijo caloroso, tal como o
deslizar da boca da mulher muita íntima em seu pescoço, depois houve uma troca
indecente de olhar, uma espécie de autorização vinda dele. Ellen, por sua vez,
dobrou os joelhos. Ricky, visivelmente excitado, acariciou o cabelo liso na altura
da sua cintura. Ela, certa do que faria; abriu o cinto, a calça…
— Meu Deus! — Tapei a boca.
Nunca senti meu coração bater com tanta força contra meu peito e, mesmo
inconsciente, só soube que tinha lágrimas nos olhos quando uma traiçoeira
escorreu e a imagem dos dois não era mais nítida. Meu Deus, a Raica tem razão,
eu… Não! Respirei de forma dolorosa, correndo desnorteada para o elevador,
nem sequer dei importância ao barulho que repercutiu, a única coisa válida era me
distanciar daquela cena.
Ricky
— Ellen, não. — Segurei seus punhos ao ouvir o barulho do elevador
explodir no andar, parecia um sinal que devia parar aquilo, não queria ferir os
sentimentos dela, então estava disposto a seguir com o que achava certo, só que
ela sabia ser vistosa com suas carícias. E não sou o tipo grosseiro e impetuoso,
mesmo estando no meu limite.
Tudo começou no jantar que sugeri para retomarmos o que iniciamos no
meu closet, em público Ellen me pouparia de um desgaste, tudo correu melhor do
que esperava, ela fingiu entender e aceitar, até que, por motivos fúteis, paramos
para pegar documentos que, segundo ela, eram importantes.
— Sei que quer…
— Vem, levanta, alguém pode aparecer.
— Qual é Ricky, quantas vezes eu já te chupei num expediente de trabalho?
— Sério que tudo que falamos há minutos atrás, no restaurante, evaporou da
sua cabeça?
— Ricky, não vou perder você. — Partiu para o outro extremo. — O que
você precisa? Me fale!
— Pare, Ellen, você não é assim…
— Eu sou louca por você, essa paixão fode comigo, fico frágil, dependente.
Sabe o quanto custa para o meu ego confessar isso a você?
— Eu sei o quanto me custa ouvir, não sou um miserável que vou me
aproveitar disso — declarei e pensei no quanto me aproveitei todos esses anos.
Da sua fragilidade.
Lealdade.
Amor.
Segurei seu rosto e invadi seus olhos como nunca havia feito.
— Eu sou egoísta por só receber quando não posso dar a você o que merece.
— Funcionamos assim todo esse tempo, por que mudar agora, Ricky?
— Porque eu preciso me libertar disso… de nós.
Busquei o máximo de controle, pois nem eu mesmo tinha certeza do que
procurava, a única coisa certa era dar um basta no que mantinha com a Ellen.
— Há outra mulher, eu sei. — Ela se desvencilhou com brutalidade das
minhas mãos. — Fale, Ricky, nada mais vai me abalar.
— Não tem ninguém, garanto a você — reforcei, tentando também me
convencer.
A mulher frágil me analisou, buscando motivos, circunstâncias, onde não
existia mais nada. Seu olhar penetrou no meu, obscuro, frio, deixando
transparecer o quanto estava ferida. Quis não me importar, como um dia ocorreu,
dar um foda-se e bater a porta.
Mas não desta vez.
— Vou descobrir quem é — avisou, secando os olhos com os punhos. —
Agora vá embora, não fique aí me olhando com pena.
— Não tenho pena de você.
— Ah, tem sim… VAI EMBORA, RICKY — sua voz brandou doída, ácida.
Era o fim.
Ela aceitaria cedo ou tarde.
— Tá certo. — Depositei um beijo na sua testa antes de deixá-la com
lágrimas nos olhos.
No térreo, peguei a chave com o manobrista e não precisei esperar, já que ele
não levou o carro para o estacionamento subterrâneo. Como informei que ia ser
breve, ele estacionou em frente ao prédio. Um pouco antes de desligar o alarme e
abrir a porta, notei, distante, um jeans bem-marcado num quadril que fiz questão
de registrar na memória, sabia perfeitamente a quem pertencia aquelas curvas,
não pensei, fui atrás.
Júlia andava rápido ao mesmo tempo que digitava no celular, previ o
acidente avaliando o caminho que ela percorria sem atenção alguma, havia uma
mureta que dividia a praça até o metrô, ela ia tombar com a mureta a qualquer
momento. E provavelmente cairia de cara no chão.
— Júlia — gritei, próximo. — Cuidado.
Ela virou, seus olhos desnortearam ao me perceber, suas mãos tentaram me
afastar e, simultaneamente, soltaram o celular que estatelou no chão.
— Merda, quebrou.
— Provavelmente.
Ela tentou agachar, porém fui mais rápido e o peguei. Não restava vida
naquele aparelho, com a queda, a tela trincou e uma mancha preta ocupava seu
centro.
— Deixa eu ver o estrago? — pediu com a mão estendida.
— Você não devia andar assim tão distraída, quase se chocou com a mureta,
se não tivesse te chamado teria caído — avisei.
— Não estava distraída — a garota linda, bufou. — Pode devolver meu
celular?
Devolvi, identificando que fugia dos meus olhos.
— O que faz aqui a essa hora? — indaguei.
— Não é da sua conta, Ricky. — Ela deu as costas e avançou.
Fiquei parado sem ação, tentando entender o porquê do desprezo.
— Júlia, espere — chamei, alcançando-a. — O que eu fiz? — perguntei
depois de segurar seus braços e tê-la de frente. Foi difícil me concentrar, seus
lábios rosados me distraíram, mas seus olhos me preocuparam. — Fale, posso
ajudar em alguma coisa, eu…
— Faz um favor, não fale nunca mais comigo. — Não pareceu um pedido.
— Me solta, Ricky.
Liberei-a, no entanto não me afastei.
— Não lembro de ter feito algo que mereça essa grosseria.
— Grosseira, eu?
— Sim, você.
— Ah, tá.
Cruzei os braços e inspirei paciência.
— Assim fica difícil mantermos um diálogo.
— Quem disse que quero dialogar com você?
— Não precisa me tratar assim, não depois de tudo que aconteceu no meu
escritório.
A irritada guardou o que sobrou do celular na bolsa e ironizou cada palavra.
— Escritório? Não faço ideia do que esteja falando, com licença, tenho que
ir…
Ela se distanciou e, mesmo perdido na troca sem sentido, a impedi de
prosseguir.
— Posso te dar uma carona, meu carro está na frente da WIS.
Ela sorriu sem entusiasmo.
— E como a Ellen vai embora? Devia dar uma carona para ela.
Espera, raciocinei rápido. Será possível a Júlia estar no andar no momento,
em que…
— Você estava na WIS?
Ela revirou os olhos.
— Ricky, vai se ferrar.
— Por que está brava, se foi você que não quis mais sair comigo?
— Desculpe, senhor CMO, por não ter caído na sua sedução. “Ah, Júlia,
fique comigo, tá legal, mas eu também vou ficar com sua chefe. Aceite,
estagiária, é o máximo que posso oferecer” — vociferou. — Me poupe, Ricky.
— O que você quer de mim?
— Distância.
— Sério?
Segurei-a entre meus braços, procurando os olhos que teimavam em fugir
dos meus. Estávamos em meio a uma praça, com fluxo de pessoas, e nada
importava.
— Me solta, Ricky — exigiu, num fio de voz. — Eu vou gritar.
— Então grita — provoquei, unindo-me à corpulência revestida com um
jeans e uma regata decotada que evidenciava seus seios fartos. A garota que não
libertou meus pensamentos nos últimos dias não precisava de muito para me
enlouquecer. — O que quer de mim? Responde!
Pressionei, precisava de um motivo para arrastá-la dali.
— Nada, já disse. — Ela umedeceu os lábios, deixando-os molhadinhos,
atiçando o desejo de reviver aquele beijo que ainda provocava todos os meus
instintos. — Devia voltar, a Ellen está esperando o segundo round.
Então ela estava lá.
— Não tenho mais nada com a Ellen.
— Como pode mentir assim? Não sou tola.
— Não estou mentindo, terminamos o que quer que existisse entre nós —
murmurei a verdade, mas não foi o bastante.
— Ahaa, que jeito lindo de finalizar um momento.
— Vamos sair daqui e conversar num lugar tranquilo.
— Lugar tranquilo? — Ela sorriu irônica. — Nossa, é assim que resolve
tudo?…
— Espera, não foi bem isso que…
— Me deixa em paz, Ricky.
Por mais que tentasse mantê-la no calor dos meus braços, Júlia exigiu
distância. Eu respeitei. Compreendendo, por fim, num milésimo de segundo o
quanto sentia sua falta. O quanto estava fodido por sentir sua falta.
14 | Júlia Sales
Domingo, dia de dormir até não querer mais, até parece, avisem a maldita
insônia que não permitiu que eu pregasse os olhos me mantendo acordada até as
seis da manhã, portanto, sem me prolongar na cama, levantei decida a correr.
Mamãe quase vomitou o café da manhã de tanto que riu quando me viu de calça
legging e top. Precisava urgentemente liberar a adrenalina e uma atividade física
faria o papel de esgotar o meu corpo, já que minha mente tripudiava, me
instigando a querer vocês sabem quem.
Resumindo o rolê, eu estava a ponto de explodir.
Nem cronometrei os quilômetros que percorri, parei assim que a exaustão
fraquejou as pernas, apoiei a palma da mão em uma árvore, uma das poucas do
meu bairro pobre em paisagismo e rico em poluição, deixando a cabeça pesar à
frente do corpo. Tomei fôlego como se o ar me faltasse no peito. Em seguida,
decidi caminhar tranquilamente de volta ao meu prédio. Isso se o universo não
gostasse de gozar com a minha cara. Veja bem, a estrutura esgotada, suada,
descabelada, na qual me encontrava, não estava preparada pra contemplar a
imagem que encontrei quando virei a esquina.
Ele, a razão de todos os meus sonhos e pesadelos, ali, escorado no seu carro
de luxo, os óculos escuros camuflando a tonalidade mel avelã dos seus olhos,
jeans preto rasgado e, para o desequilíbrio geral, camiseta branca — colada ao
seu abdômen —, era a visão do puro pecado. Recuei dois passos na tentativa
fugir, mas estaquei quando ele me viu e me presenteou com seu sorriso. Meu
coração errou as batidas. Meus joelhos perderam a força. Teria desmaiado, se não
houvesse meia garrafa d’água em mãos, que ingeri como se nunca tivesse
experimentado o líquido.
MEU. PAI. AMADO.
— Oi.
— Oi… O que faz aqui?
Ele desceu o aro dos óculos ao passo que corria seus olhos atrevidos pelo
meu corpo.
— Linda roupa. — Sorriu canalha, anulando o pouco de distância que me
permitia respirar. — Mas não é perigoso andar assim, sozinha na rua?
Revirei os olhos, já o tendo próximo demais.
— Estava correndo — expliquei. — Veio pessoalmente pegar o celular?
Ele assentiu, com aqueles olhos castanhos querendo invadir os meus.
— Só um instante, vou pegar. — Fugi, com leves tremores no estômago.
Nunca entrei e saí tão rápido do meu apartamento, graças a Deus minha mãe
estava no banho e não percebeu a velocidade que peguei a caixa e bati a porta.
— Foi muita gentileza sua, mas não posso ficar com ele — disse e estendi a
mão devolvendo a caixa.
— Então quando presenteio alguém, não aceito devolução. — Baixei o
braço, chocada com o que ouvi. Como assim? É um Iphone, meu filho.
— Ricky, não posso sair dando um Iphone para qualquer pessoa.
— Então fique com ele — propôs, simplesmente. — Comprei para você.
— Já tenho um celular — reforcei e estreitei os olhos antes de indagar. —
Então por que veio? Se não quer o celular de volta?
— Queria ver você. — Ele voltou a se aproximar, para o meu desespero. —
Vamos tomar um café, vi uma delicatessen na esquina.
— A padaria do seu Zé está longe de ser uma delicatessen, Ricky.
— Não vejo diferença, lá tem café?
— Sim, tem.
— Ótimo.
— Mas eu já tomei café.
— Júlia, podemos ao menos ser amigos? Amigos tomam café, fazem sexo
pelo telefone, nada demais.
Gargalhei nervosa com a cara de pau dele.
E claro, corei em seguida.
— Eu não faço sexo pelo telefone com meus amigos.
— Eu sabia que era especial pra você — sorriu pretencioso.
Balancei a cabeça.
— Não posso, estou cansada. — Dei um passo para o lado, ele também,
bloqueando a minha passagem. — Ricky, não.
— Só um café? — Ele fez charminho e as tais borboletas ariscas
perturbaram meu estômago. — Em nome dos nossos laços familiares?
— Laços familiares? — Gargalhei com seu argumento. — Sério isso?
— Claro, meu primo tá caidinho por sua prima, então prevejo casamento,
sendo assim, seremos parentes.
— Negativo!
— Por que? É meio óbvio, não acha?
— O que eu acho, é… — Foi difícil responder com seu dedo alisando meu
antebraço. — Pare, Ricky.
— Você está nervosa?
— Não, nervosa, eu? — Dei os ombros. — Nem pensar, não estou nervosa.
— Hum, acho que está sim, estou sentindo leves tremores nessa pele
temperada com suor.
Ele subiu seu dedo até meu ombro, causando uma vibração contínua em
certos pontos… Ai, Jesus!
— Ricky, estou muito suada, eu…
— Você está muito suada… deliciosamente suada… — repetiu, com seu
timbre sedutor, enlouquecedor, molhador de calcinha. — Sabe, Júlia — sua boca
já estava próxima ao meu ouvido —, precisamos tomar café.
— Sim, precisamos…
— Tá vendo, não doeu nada, é só um café.
— Eu… eu… — Ergui uma sobrancelha. Ah?! Eu aceitei, como assim? —
Tenho que subir, preciso finalizar um trabalho.
— Só um café, garota. Depois prometo ir embora. — Ergueu os braços em
rendição.
Merda… ok, ok, ok.
Só um café e ele vai embora.
Ponto final!
— Ok, mas…
— Mas?
— Pegue a caixa — ofereci novamente, ele pegou contra a vontade e jogou
no banco de trás do carro. Sem sequer se importar com o conteúdo, porra, era um
Iphone.
— Estou com fome, quero que saiba.
— Informação preciosa, vou vender para os paparazzis.
— Vai?
— Talvez eu faça uma pequena fortuna, vi algumas matérias sobre você,
sabem até o número do seu sapato.
— Pesquisou sobre mim, Srta. Sales? Algum interesse pessoal?
Merda!
Fica quieta, Júlia.
— Quem eu? — Tossi uma, duas, três vezes, depois quis me esganar por
falar asneiras. Como posso revelar que pesquisei sobre ele. — Pesquisa
profissional, é claro.
— Pesquisou sobre mim, profissionalmente? — O executivo cruzou os
braços. — Continue, estou interessado, fale mais, o que encontrou?
Arregalei os olhos, amaldiçoando minha boca grande, enquanto o debochado
se divertia às minhas custas.
— Nada demais, você é ganhador de vários prêmios, tem uma carreira
construída com muito esforço, mesmo sendo herdeiro, e é uma referência de
CMO pelo mundo, e…
— E? — Ele quis saber com os olhos atentos. — Continue.
— E sempre posou com lindas mulheres.
Ele sorriu, buscando com as pontas dos dedos alguns fios de cabelos soltos
do rabo de cavalo que fiz antes de correr, colocou-os com delicadeza atrás da
minha orelha, e declarou:
— Você é linda e mulher. — O maluco agarrou minha cintura ficando ao
meu lado, antes de anunciar em alto e bom tom: — Se houver algum fotógrafo
por aí, pode tirar a foto para capa.
— Fala baixo, Ricky. — Tapei sua boca. — Café, vamos — falei, dando um
ponto final no constrangimento e puxei seu braço na direção da esquina, cobrindo
meu rosto envergonhado com a mão livre.
16 | Júlia Sales
Caminhamos lado a lado até a padaria do seu Zé, durante o percurso procurei
me concentrar em qualquer coisa que não fosse aquele perfume que, num sopro
de ar, invadiu as minhas narinas. Num certo momento, à medida que
alcançávamos o lugar, ele, atrevido, tocou levemente o dorso da minha mão, eu
logo abracei o corpo evitando o contato. O safado riu, pois percebeu como
arrepiou cada pelo do meu braço.
Iludida, talvez, mas o pensamento me acompanhou. O que o trazia em pleno
domingo para a frente do meu prédio, quando um mundo de glamour o esperava
de braços abertos? Mulheres. Boates. Festas. Lugares que muito provavelmente
ansiavam por sua estada, no entanto, aqui estava ele, caminhando ao meu lado,
como se guardasse o tempo na palma da mão, dilatando o momento no qual
esquecemos quem somos, esquecemos a WIS. De soslaio marquei o tempo de um
sorriso faceiro, o sol alvorecendo em sua pele, em seus traços, nos castanhos de
seus olhos, tornando-o ainda mais lindo, como se fosse possível.
— Delicatessen, ponto pra mim — disse e apontou para a fachada.
Hein?! Meu queixou caiu.
— Déia, desde quando seu Zé trocou a placa? — perguntei para a filha do
padeiro, que prontamente nos recebeu.
— Ele agora quer ser chique, Jú. — Deu de ombros. De qualquer forma,
para mim, sempre será a padaria do seu Zé, e ponto. — Querem uma mesa?
— Por favor. — O galante tirou alguns suspiros da menina. — Pode ser
aquela ao fundo?
— Claro.
Seguimos na direção, nos acomodamos na mesa e fizemos os pedidos.
— Você corre sempre? — Ricky perguntou apoiando o queixo sobre as mãos
entrelaçadas.
— Sim, sempre que estou muito frenética procuro correr para liberar um
pouco da adrenalina.
— A WIS tá exigindo muito de você? — indagou, pegando seu café e um
croissant, que a Déia disponibilizou na bandeja, aproveitei e peguei minha salada
de frutas e um suco de laranja. — Ou sou eu o motivo? Sabe que podemos
resolver esse “detalhe” a qualquer hora.
Embora estivesse certo, pois sabemos o quanto esse homem me arrasta para
o penhasco da perdição, desde a primeira vista, não ia, nem em sonho, dar esse
ibope pra ele.
— Você se sente. Acha mesmo que minha vida gira em torno do tesão que
tenho por você?
EU NÃO DISSE ISSO!
Puta merda.
O que restou foi cruzar os braços e encarar, argh, vermelha igual a um
pimentão, o desgraçado gargalhando às minhas custas.
— Eu disse, Julinha, podemos resolver isso, é só pedir.
— Definitivamente, pretendo manter minha boca fechada nas próximas
horas.
— Se quiser, posso manter sua boca ocupada, sem problema.
— Ricky, para de ser um ordinário pornográfico — lancei vários
guardanapos na sua direção —, você só pensa em sex… — Me calei, não
estávamos sozinhos no recinto, além do mais, aparentemente, toda a vizinhança
resolveu comprar pão no mesmo horário.
A fofoca estava feita.
— Safadinha, há diversas formas de manter sua boca ocupada, alimentando-
a é uma delas.
— Ah, tá. Sua cara de cafajeste não transpareceu essa inocência, fique
sabendo.
Ele me fitou por cima da xícara de café.
— Sei que gosta da minha cara de cafajeste e todo resto.
Rolei os olhos, ele realmente era ciente da sua gostosura.
Provei um morango ignorando o pretensioso.
— Hum… — O azedo do morango se misturou ao sabor doce da manga.
Olhei para o pote e alguns pedaços estavam perdidos ali. Droga, eu pedi para a
filha do seu Zé não colocar manga. — Ei, Déia, tem manga — indiquei de longe e
ela acenou pedindo um instante. — Não gosto de manga.
— Então eu resolvo o problema, pode colocar todas aqui. — Ele se inclinou
um pouco para frente e abriu a boca.
Franzi o cenho.
— Quer que eu lhe dê na boca? — perguntei, vai que eu fiquei doida ou algo
do tipo. Não lembro de ter batido com a cabeça.
— Ahaaa…
Ah, Deus, não faz isso, não.
— Ricky, então…
— Poxa, Júlia, você não pode alimentar um homem que gosta de manga?
Ele abriu em maior grau a boca, exibindo sua arcada dentária perfeita.
— Tá bom.
Garfei um pedaço da fruta, levando à sua boca. Ricky mastigou assim como
a Ana Maria Braga saboreia seus pratos, com tanto gosto, que fiquei com vontade
de… Hum… Pediu mais um pedaço assim que engoliu o primeiro, e quando me
dei conta estava alimentando o homem, enquanto sorria igual a uma boba,
simples assim.
— Mangas extintas…
— Obrigado, gosto de manga. Há alguma outra fruta que você não coma?
— Melancia, ainda não sei por que, mas não gosto — fiz uma careta.
— Já provou alguma vez?
— Sim, mas não fez muito bem para o meu paladar.
— E qual a sua fruta preferida?
— Morango!
— Oi, Jú, desculpe a demora — a menina chegou de repente. — Algum
problema?
— Eu…
Ricky interrompeu:
— Você pode colocar uma porção extra de morango na salada de frutas, por
favor?
— Claro que sim, um instante — ela pegou o pote e saiu apressada.
— Ricky, não precisava.
— Vamos substituir a manga pelos morangos — ele piscou.
Crispei os lábios querendo, na verdade, abrir um sorriso enorme. Déia não se
prolongou muito em entupir meu pote com pedaços de morangos.
— Obrigada — agradeci a ela, que voltou para o balcão. — Bora se entupir
de morango, então. — Garfei vários pedaços e levei à boca.
Ricky, estático, deixou cair as íris quentes para os meus lábios em
movimento.
— Que foi? — quis saber, já pegando o guardanapo.
— Então, eu… — Ele pigarreou. — Imagem difícil, morangos e sua boca,
combinação perfeita e tentadora.
Parei de mastigar e estreitei os olhos.
— Ok, parei, meu cérebro já produziu material suficiente para me levar à
loucura nas próximas horas. — Ele pigarrou novamente. — Amigos, entendi.
— Ahaaaa, amigos. — Sorri e balancei a cabeça, alguma coisa dentro de
mim dizia que estava num sonho.
— Então a senhorita gosta de correr? — Mudou rápido de assunto.
— Sim.
— Corro também, e concordo que alivia o stress. — Ricky levou a xícara até
sua boca e eu segui o movimento, sendo lembrada de como seus lábios sabem
trabalhar em certas situações. — Posso te perguntar uma coisa?
Coloquei algumas uvas na boca, talvez mastigar distraia o meu intelecto
pervertido.
— Pode.
— Qual o lance com a família da sua prima?
O jantar artificial não disfarçou o quanto somos indiferentes como família,
foi visível o desdém da tia Paula e como meu tio conduzia sua amostra de um
apatacado idiota.
— Percebeu o quanto nos odiamos?
— Percebi que há um fato que levou a isso.
Meu rosto endureceu sem disfarce, pois lembrar do passado me remeteu a
más lembranças.
— Sim, aconteceram algumas coisas que mudaram o rumo da minha
amizade com a Melissa — murmurei descontente.
Ricky se mostrou interessado pela forma solícita que me olhou e tocou a
minha mão solta sobre a mesa. Apesar disso, contar não estava em meus planos,
poderia acabar com o relacionamento de Melissa, caso o Ruben soubesse de algo
tão desleal, e por mais que odiasse a ruiva, não agiria por vingança.
— Foi sério, então?
— Sim, mas está enterrado — falei e tomei um gole de suco, dando a
entender que o assunto não me agradava. — O que está achando da campanha,
Ricky?
Ele riu lindamente com a mudança súbita.
— Estou gostando, falta pouco para finalizarmos…
Reconheço, a tensão sexual que nossos encontros causavam, era intensa e
saborosa. Precisamente, palpáveis de desejo. No entanto, a leveza em especial
desse “café” inesperado, apesar das frases soltas e safadas provocadas por Ricky,
se tornou um ponto fascinante da nossa relação, quer dizer… do início da nossa
amizade.
— Você não acha que falta algo? Como uma propaganda diferente das que
os estudantes atravessam os corredores falando dos seus cursos e apresentado o
espaço?
— Sim, acho. Este é o maior motivo de não ter aprovado nenhuma das
propagandas. — Ele me encarou com atenção, pois acho que a minha ideia
despontou no meu rosto inesperadamente. — Tem alguma ideia?
— Sim, acredito não ser inédita, mas…
— Fale, estou interessado — murmurou, enquanto apoiava os cotovelos na
mesa.
— Sou apaixonada por musicais, então eu acho que podemos fazer algo
grandioso, como um flash mob, com uma música original, talvez o funk, que
abordasse sonhos e os influenciadores, ou tik tokers, fazendo parte disso,
incentivando seus seguidores a estudarem se quiserem chegar na posição que eles
estão hoje. O que acha?
O executivo franziu os lábios e permaneceu calado, o que fez com que eu me
achasse ridícula.
— Funk?
— Ahaaa.
— Gostei.
Isso, garota!!!
— Jura?
— Sim, vou falar com o Orion.
— Eeeeeee. — Bati várias palminhas animada, porra, ter algo aprovado pelo
Ricky era sensacional. — Eu ia comentar com ele amanhã, mas já que você
perguntou.
— Quem leva a Júlia para casa, a venda ou a criação?
Não entendi como investida, meneei a cabeça, pensando na resposta:
— O marketing ou a publicidade? — Ele assentiu. — Os dois casam, no
entanto, a publicidade ganha.
— Sim, consigo ver nos seus olhos e nas suas ações uma grande publicitária.
Que pena que não vou acompanhar de perto o seu crescimento.
— Quando finalizarmos a campanha você vai embora?
— Sim, vou. — Ele parou de comer e se concentrou no meu rosto por
segundos que pareceram infinitos. — Tenho compromissos inadiáveis na
Califórnia ainda este mês.
Por que meu coração acelerou? E as frutas perderam o sabor?
Ricky completou:
— Quer me ver longe?
— Não, claro que não.
— Não?
Só saquei sua jogada ao perceber seu sorriso preenchendo seu rosto.
— Ricky… — Joguei as costas para trás. — Qual o seu problema?
— Você!
Soltei uma gargalhada.
— Agora eu sou um problema?
— Sim, é.
— Diga por quê?
Ele se levantou, posicionou sua cadeira ao meu lado, e eu parei de respirar.
— Desde o dia em que a vi dentro daquele elevador, que graças a Deus ficou
parado tempo suficiente no térreo para que eu desejasse sua boca deliciosa mais
que tudo, eu estou louco por você — ele sussurrou, e eu movimentei o lábio
inferior prendendo-os entre os dentes. O executivo me manteve à sombra de seus
olhos castanhos febris, que causou reações adversas no meu corpo, violando o
autocontrole que fui construindo ao longo deste café. — E agora vou precisar de
tratamento psicológico, pois provei de algo que não posso ter mais.
Ele brincou de um jeito sexy e, novamente, o ar palpável do desejo volveu,
chegava a ser surreal como nos levávamos ao limite. Impossível negar a excitação
crescendo enquanto os olhares se comiam, o apetite por um beijo consumindo o
paladar… era enlouquecedor.
— Preciso ir. — Levantei tão rápido que a cadeira tombou para trás. —
Merda!
— Calma, Júlia. — Ricky se colocou ao meu lado, me auxiliando com a
cadeira irritante. — Não precisa ficar nervosa, eu…
— Preciso ir.
— Ok, vou pagar a conta.
Aguardei do lado de fora, tomando o ar que me faltava. Não devia ter vindo,
como fui capaz de idealizar tal tolice? Sou um poço de fraqueza perto desse
homem, é muito maluco e descontrolado. Caralho, namorei aquele idiota do Caio
e nunca tivemos essa brasa, esse negócio pulsante.
No percurso de volta, tentei manter o controle, se bem que estava quase
infartando. Um pouco antes de virarmos a rua, Ricky me girou rápido, não houve
tempo para uma reação, quando me dei conta estava prensada na árvore com seu
nariz fungando meu pescoço.
— Júlia, escuta — seu hálito quente atiçando meus sentidos —, teu cheiro,
teu gosto, teu sorriso, tirou o encanto de todos os outros… Talvez precise me
trancafiar em uma cela, porque está impossível controlar o desejo pulsante que
tenho de beijá-la. Me condene como um louco, mas sei que sente o mesmo.
— Ricky, não faz isso, eu…
— Me escuta, por favor — interrompeu com tom de súplica. — Jamais
deixaria que alguém a prejudicasse na empresa, minha estadia no Brasil é curta, e
não pretendo desperdiçar um segundo sequer se não for com você. — Ele tocou
de leve meus lábios, nossa respiração pesada se misturando, a saliva aguçando o
sabor, o peito subindo e descendo com evidência. — Garota, você me alucina. —
Se afastou, massacrando os cabelos com os dedos.
— Não é tão simples assim.
— Por que não? Acabei de garantir que jamais permitiria que alguém a
prejudicasse na empresa. — Seus olhos me encaram diferente. — Você está
saindo com alguém? É este o motivo? Por isso chegou tarde e devolveu o celular?
— Ricky, são muitas perguntas.
— Então responda ao menos uma.
— Por motivos óbvios, já falamos sobre isso. — Abandonei o ambiente
quente, mesmo desejando ficar, meus pés acostumados com o caminho cravaram
cada passo, ainda o sentia próximo, sei que não finalizamos, mas digo em choque,
não seria hoje. — MÃE!!!
— Ricky — ela exclamou, com seus olhos de águia mirando o homem atrás
de mim. — O que faz aqui?
— Mãe, o Ricky… bem simples… ele veio… quer dizer, ele estava
passando por perto, o encontrei enquanto corria, pura coincidência — expliquei,
na verdade, gaguejei ridiculamente. Minha mãe unia as sobrancelhas, ficando
igual à Frida Kahlo. Inferno. Isso não era um bom sinal. — Mas agora ele vai
embora. Não é, Sr. Walker? — Indiquei seu carro estacionado no meio fio.
Ele apenas desprezou o conselho.
— Olá, Ana, como vai?
Não faz isso.
Puta merda, ele fez.
O executivo passou por mim, tomou a mão de mamãe e beijou o dorso.
Desgraçado, a madame sorriu envergonhada, puro disfarce, conheço a fera, nesse
exato momento ela está tramando seu interrogatório, no qual, provavelmente, eu
vou entregar tudo.
— Estou bem, nossa, que prazer revê-lo, passeando pela zona sul?
— Sim, tenho um amigo pelas redondezas — mentiu descaradamente.
— Nossa, como você é bonito, né, Júlia?
— Mãe!
Sério, isso?
Ricky gargalhou com a audácia da senhora assanhada que garantiu um
acréscimo no seu ego.
— Obrigado, Ana, ganhei o dia.
— Imagino. — Rolei os olhos. — Mãe, o Ricky tem compromisso, não é,
chefe?
— Filha, você tem sorte por ter um chefe tão bonito e educado. — Agora ela
passou dos limites. Isso é resultado da cerveja de domingo. Só pode. — Ricky,
quando estiver no bairro novamente venha tomar um café.
— Claro, será um prazer. — Ele completou os dois passos e beijou meu
rosto. — Até amanhã, Júlia.
— Até amanhã.
Cobri o rosto, enquanto minha mãe acenava para o safado que fez questão de
ligar o carro numa lerdeza, adorando a atenção gratuita. Antes de seu carro cruzar
a esquina, corri para dentro, pois o rosto da senhora assanhada mudou, não estava
tão simpático.
— Júlia, espere — ela gritou, mas o elevador fechou. E a última visão que
tive foi que nada ia me livrar de várias explicações.
Entrei no apartamento e apelei para o café, um gole, nada além disso, e então
a porta fechou, a testa enrugou e eu comecei a rezar.
— O que o Ricky Walker fazia aqui?
— Já falei, mãe. — Contornei a bancada e me sentei no sofá. — Toda
assanhada com o homem, ele é muito jovem para a senhora, não pretendo ter um
padrasto com essa idade.
— Um ponto que eu concordo, também não pretendo ter um genro com essa
idade.
— Assunto resolvido.
— Sem gracinha, garota, eu quis ser simpática. Aliás, ele é seu chefe, dono
da universidade na qual você estuda, dono da empresa na qual você trabalha, isso
não foi esquecido, né? — Não foi uma pergunta, e sim, um lembrete assíduo. —
Filha, eu vi a troca de olhares de vocês no jantar, só não falei nada porque pensei
ser coisa de momento. Mas vê-lo aqui depois de receber uma caixa com o nome
dele. — Ela se sentou ao meu lado. — Júlia, conversa comigo, sempre fomos
sinceras uma com a outra.
Deixei cair a cabeça para seu colo e um choro angustiado explodiu de
repente, estava tão confusa e perdida com os sentimentos que não controlei as
emoções, só chorei enquanto mamãe acariciava meu cabelo.
— Oh, meu amor… — ela murmurou.
— Mãe, eu e o Ricky nos esbarramos antes de eu saber quem realmente ele
era — balbuciei, as lágrimas desciam e meu coração apertava. — Sentimos uma
atração e, mesmo com o fato de ser meu chefe, não consigo parar de pensar nele,
não sei o que fazer.
A mulher ergueu meu rosto e olhou, plácida.
— Houve somente uma atração? — Ela quis saber, seu tom intensificou. —
Só isso a deixou assim?
— Não.
Ela meneou o rosto soltando o ar.
— Júlia, não, está errado. Ele é encrenca filha.
— Eu sei, mãe. Mas…
— Mas você gosta dele? É isso?
Esfreguei o rosto numa almofada, querendo negar, precisava negar a loucura.
— Júlia, responde — ela gritou.
Olhei para ela antes de responder, com as emoções ainda mais aparentes.
— Não sei.
— Meu Deus, filha. Não tem como dar certo, um homem bilionário que, por
fonte chamada Paula, viaja mais do que dorme na própria cama, galante e bonito,
não se apega a uma garota de família como você. Ele quer curtição. Quando ele
cansar, como fica? A empresa? Você? Muitos para se livrar do problema dão o
famoso pé na bunda, também conhecido como demissão.
— Mãe, eu sei.
— Sabe mesmo?
Sim, ela estava certa.
— Estou cansada, vou tomar um banho e dormir.
Levantei-me, não querendo ouvir e fui direto para o banheiro. A água quente
enevoou o ar e me coloquei embaixo dela tão perturbada, que implorei evaporar,
sumir. As palavras ditas por mamãe me perseguiam enquanto esfregava a pele
com a esponja macia. Tudo fazia sentido, jamais neguei o contrário, só que meu
coraçãozinho, mesmo diante de todos os erros gritantes, agia como um
adversário, um sabotador da coerência. Sonhando com suspiros apaixonados,
eternizando a união perfeita que eram nossos corpos.
Mas não, sei que não, jamais passaria de um sonho.
Um doce e apaixonante sonho.
Demorei muito mais que o habitual no banheiro, coloquei o meu pijama, e
fiquei um longo tempo olhando para a parede, até dona Ana abrir a porta.
— Mãe, eu entendi — fui falando ao mesmo tempo que acompanhava seus
passos. — Tudo que disse está claro na minha cabeça.
Ela sentou-se na beirada da cama.
— Não quis diminuir você diante dele, não foi isso. Você é grande e pode ser
o que quiser, lembre-se disso. O céu é o limite para uma garota sonhadora como
você.
“O céu é o limite”, minha mãe sempre usava essa frase em momentos que
ousei desistir, em momentos que achei a WIS inalcançável pra mim. Por muitas
vezes nos diminuímos, a estrada é longa, cheias de espinhos, névoa, perdemos a
coragem e a audácia, e nos consumimos de incertezas e medo. Nada é
inalcançável. Um sonho só se concretiza se o sonhador alçar as asas da
perseverança e, mesmo consciente das quedas, nunca desistir de aprender a voar.
— Eu sei, nunca esqueci, mãe.
— Só que não consigo ver o lado bom nessa história.
— Como disse, vou ficar longe dele, prometo.
Ela beijou com carinho minha testa e bateu a porta ao sair.
Aninhei-me na cama e peguei meu celular, haviam diversas mensagens da
Raica, a última dizia que o irmão passou a manhã apreensivo com medo de que o
pai retornasse. Por um instante, me preocupar com meus amigos fez com que
meus anseios ficassem de lado. Liguei para ela e conversamos um pouco,
principalmente sobre o Renan abalado por conta das barbaridades cruéis do pai.
Voltando ao átimo infeliz da véspera, quando eu estava diante das ameaças
do genitor dos irmãos, uma voz gélida soou no meu ouvido e imediatamente um
arrepio correu minha espinha. Descartei o minuto, ignorando a impressão
negativa. Mas logo que desliguei o celular e pronunciei pro nada a palavra pai —
um termo que excluí do vocabulário por motivos óbvios —, outra vez a sensação
arremeteu.
Estranha.
Angustiante.
O clima pesou no curto espaço, exasperada, fui à sala e entrei no exato
instante em que minha mãe desencaixou um cartão do enorme buquê de rosas
vermelhas.
— Recebendo rosas, dona Ana? — perguntei, mas não parei, fui em linha
reta para a cozinha. — Quem enviou?
Hum… carne de panela com batata, inalei o aroma delicioso que subiu assim
que destampei a panela, sentindo as reações diversas de um estômago faminto.
— Mãe! — chamei novamente, a mulher permaneceu intacta olhando sem
piscar o cartão prateado. — Quem enviou?
Não obtive resposta.
A quietude me preocupou, num salto estava ao seu lado.
— Mãe, o que houve?
Girei seu rosto e uma lágrima escorreu.
— Mãe!!!
A face tomada por uma branquidão anormal apertou meu coração, os lábios,
sempre saudáveis, acompanhavam sua pele. Tirei o cartão de sua mão, tendo ali a
leitura mais dolorosa, pavorosa, a que sempre temíamos.
17 | Ricky Walker
Ricky
— Você está bem? — Ellen perguntou e se acomodou na cadeira da frente,
me mantendo sob aqueles olhos que mais pareciam o oceano.
— Sim, por que, pareço doente? — falei irritado. Porque estava irritado.
Muito irritado. — Os contratos — referi-me aos papéis em sua mão, esse era o
motivo dela entrar na minha sala, os malditos contratos.
— Ok. — Entregou os papéis. — Quer almoçar?
— Não — respondi, avaliando a papelada. — Pode ir, assim que finalizar a
leitura, assino e envio a você.
— Tudo bem, chefe. — Ela avançou alguns passos para a porta, mas voltou-
se para mim. — Ricky, olhe para mim. — Soltei uma lufada de ar e olhei
impaciente. — Quer conversar?
— Não, quero ficar sozinho.
Ela uniu as sobrancelhas, mas não insistiu.
— Tudo bem, estou saindo.
Ellen deixou a sala e eu voltei para os contratos, os malditos contratos, fiz o
possível para me concentrar na papelada, contudo nada me conectou, estava
navegando em outros mares, caralho, por mais esforço que fizesse de me
desvencilhar dos pensamentos, mais eles me confrontavam. Nunca fui impulsivo
ou movido por emoções, no entanto, como me portei nessa manhã?
Como um adolescente inconsequente.
Confesso, fiquei emputecido por ver a Júlia tão próxima daquele cara…
Orion — educado e galanteador —, que porra, meu anseio em beijá-la e marcar
território como um lobo caçador por um fio não fodeu com tudo.
Caralho.
Como posso ansiar algo assim? “Marcar território”.
Quando meus planos modificaram sem a minha autorização?
Curtir o momento e seguir em frente sempre deu certo, nada nunca abalou a
mudança de curso. Por que não estou convencido que esquecer é o certo a se
fazer?
Depois dos acontecimentos com o Nicholas, era a primeira vez que me
sentia impotente diante de uma situação. Não nego que em outros tempos as
coisas acabariam naquela noite do escritório, comi a garota — desejo concedido e
viramos a página para não termos problemas. Só que ambas as cabeças
permaneceram ambicionando por mais e manter tudo distante combateu o
racional. Quero a Júlia, mas sei que tenho limites, restrições.
Sim, estou fodido! Literalmente fodido.
Um pouco depois, finalmente, revisei os contratos e solicitei a presença da
minha assistente.
— Ricky, acabei de enviar sua agenda de amanhã — Valéria avisou,
enquanto pegava os contratos. — Seu voo é para às oito da manhã e a primeira
reunião é às treze no hotel.
— Ok, por favor, entregue logo para Ellen, os papéis são importantes.
— Claro, com licença. — Ela avançou para a porta, porém interrompi sua
partida.
— Valéria, um instante, como anda Léo na escola?
— Primeiro da turma Ricky, sempre aplicado, tenho muito orgulho.
— Sei que o aniversário dele é somente na próxima semana, mas… — Abri
a gaveta ao lado e peguei a caixa. — Um presente de aniversário antecipado. —
Entreguei a ela, que tomou nas mãos com um certo espanto.
— Um pouco caro para uma criança, Ricky — falou revirando o pacote.
— Faço questão, manda um abraço para ele.
— Você como sempre mimando o garoto, obrigada. Ajudo em algo mais?
— Não, pode ir.
— Licença.
— Valéria… — A impedi novamente. — Você… quer dizer, por acaso sabe
onde está o Orion?
— Na sala master com a estagiária Júlia.
Pigarreei.
— Sozinhos?
— Acredito que sim, mas não tenho certeza — declarou, atenta. — Quer que
eu verifique? Deseja falar com ele?
— Não, não. Pode ir. Obrigado.
A assistente cruzou a porta e eu massageei as têmporas me julgando um
idiota. Que porra estava acontecendo comigo? Resolvi, por fim, ir para o meu
apartamento, talvez fosse o melhor a fazer, trabalhar longe desse ambiente onde
me sentia estranho podia trazer um pouco de concentração.
— Valeria, vou finalizar o dia no meu apartamento — informei quando
passei por sua mesa e ela assentiu. Olhei na direção do elevador, meu destino até
então, porém um impulso me dominou, guiando-me ao caminho oposto, senti
meu corpo esquentar e uma necessidade desconhecida (muito similar à
necessidade que tenho em respirar) me posicionou diante de uma porta, fechada,
ironicamente fechada. Estiquei o braço para girar a maçaneta, mas repudiei
aquilo. Caralho. Júlia feiticeira, jogando meu autocontrole para o espaço.
Que diabos eu fazia ali?
Dei meia volta rumo ao elevador, alcançando o estacionamento minutos
depois e por fim relaxando no assento do meu carro.
— Um banho e uma taça de vinho, é o que preciso para parar de pensar
nessa merda toda que angustia meu peito — falei pro nada e deixei meu rosto
tombar para o lado a encontro do celular que tocava. A foto de Athos piscou no
visor e soube imediatamente: era com meu amigo que precisava desabafar.
— Fala, seu puto.
— Cara, eu sou policial, mereço respeito.
— Ok, senhor Polícia. O que manda?
— Oh, senhor executivo, vou te dar duas opções: quinze km ou um drink?
— Estou a caminho do meu apartamento, ia trabalhar em casa, porém vejo
uma proposta considerável desviar meus planos, tenho voo cedo, então prefiro
correr.
— Fechou.
Acionei minha playlist e quando The Weeknd e Calvin Harris começaram a
cantar Over Now, entrei no trânsito.
Correr com Athos era uma exposição, o homem que passava de dois metros
tinha um condicionamento físico nitidamente melhor que o meu e parecia uma
máquina mortífera correndo, aliás, enquanto percorríamos o parque do Ibirapuera
igual a loucos em busca de um troféu. Recordei o exato momento em que conheci
Athos, o homem muito similar a um armário entrou na companhia de mamãe,
numa temporada em que ficamos hospedados em Angra dos Reis. Meu pai,
sempre muito obcecado por segurança, nunca permitiu que sua esposa e herdeiros
permanecessem na América Latina sem uma tropa de guarda-costas. E Athos se
tornou o mais fiel de todos. Um tempo depois, quando a barreira das formalidades
caiu por terra, e por termos praticamente a mesma faixa de idade na época,
acabamos nos tornando amigos, numa de nossas conversas regada à cerveja,
mulheres e putaria, ele deixou escapar que tinha o sonho de cursar Direito e ser
investigador federal, pois tinha uma missão na terra. Claro que na época,
comentei com Sara, que o tratava como um filho. Não demorou e ele ingressou na
universidade se formando como primeiro da turma.
— Chega, Athos — falei, ofegante, apoiando as mãos nos joelhos. — Cara,
corremos vinte km.
— Tudo isso? — Ele socou de leve meu ombro. — Não achei que você
chegaria a tanto, estou orgulhoso.
— Sério? Vai se foder, Garbo.
Andei adiante para observar o lago, escorei na cerca e ele parou ao meu lado.
— Parece melhor.
— Você também.
— Sim, precisava, voltei de uma investigação delicada que envolve crianças,
cenas que não me deixam dormir.
Encarei ele.
— Nossa, cara, pesado.
— Sim, é. — Ele deixou seus olhos pesarem sobre as águas tranquilas. —
Em breve vou iniciar a investigação da minha vida, quem sabe depois disso, não
case e tenha filhos?
— Oh, casar e ter filhos? Grande passo para quem não consegue dormir com
a mesma mulher duas vezes.
— Não posso me dedicar a uma família agora, Walker. Esse é o motivo de
evitar paixões — murmurou e se sentou no gramado, acompanhei ele. — Agora o
que impede você?
— Eu o quê?
— De pedir a Ellen em casamento e ter uns bacuris de olhos coloridos.
Gargalhei, jogando a cabeça para trás.
— Quer perder o seu parceiro de putaria?
— A putaria continua, é só chamar.
— Não estou apaixonado pela Ellen.
— Como não? Vocês trepam há anos, cara. Assume a moça.
— Acho que é isso, só trepamos mesmo. Nada além.
Athos inspirou e voltamos para o lago.
— Quanto tempo você fica no Brasil?
— Tenho uma viagem para o Sul amanhã, volto no sábado, depois tenho
mais uma semana aqui, antes de embarcar para a Califórnia. Pretendo ficar uns
dois dias com a minha mãe, volto a embarcar, rumo à Europa, tenho várias
reuniões por lá e assim segue a agenda enviada hoje pela Valéria.
— Irmão, boa sorte. Tem um lado bom nesse início de agenda, as gaúchas,
bah, são gostosíssimas.
— É, são… — Me escutei dizer sem entusiasmo.
— Ricky, olha pra mim, irmão. — Encarei o investigador. — Tem alguém?
Sim, tem.
Não consigo negar totalmente.
— Eu provei e agora estou viciado.
— A estagiária?
— Júlia, esse é o nome dela, Athos.
— Transou com ela novamente?
— Não. — Ri à toa. — Só tivemos momentos diferentes em que eu desejei
outras coisas, como…
— Como?
— Como ficar perto e acariciar seu rosto, nada mais — revelei. — A Júlia é
uma mulher, além de linda, transparente, obstinada. Quando a toco e vejo seu
corpo reagir, inocente, gracioso, quero protegê-la, mantê-la entre meus braços,
entende?
— Irmão, você gosta dela.
— Talvez, ou… — movimentei a cabeça —, o desafio em tê-la está tornando
as coisas mais intensas do que parece.
— Bom ponto de vista, isso é visão de executivo, o famoso ‘dois lados da
moeda’.
— Não sou um moleque, ainda consigo controlar meus sentimentos.
— Tem certeza?
A pergunta permeou.
Voltei para o lago, agora meio alaranjado por conta do pôr do sol que nos
presenteou com sua beleza no fim de tarde, observei uma família de patos
atravessarem, unidos, alinhados. Athos se afastou por um instante para atender
uma ligação de trabalho. Portanto, sem pensar muito (novidade), retirei meu
celular da capa de braço e liguei para a Júlia. Não demorou muito para que ela
atendesse e iniciássemos uma conversa nada agradável.
20 | Júlia Sales
Primeiro dia de aula; não sabia descrever o quanto estava feliz, andei pelos
corredores como uma caloura deslumbrada, me preparei tanto para viver aquela
emoção que era impossível não transparecer a satisfação com lágrimas. Diferente
de outras universidades, a WIS UNIVERSITY MADE IN BRASIL, tinha um nível
elevado, 99% dos alunos eram ricos ou milionários, o que fazia muitas coisas
serem ridículas e incomuns quando sabíamos a realidade do nosso país e as
dificuldade dos brasileiros, com um litro de óleo custando dez reais. Era estranho
testemunhar um mundo diferente e ostensivo, uma garota vestindo uma calça de
três mil reais ou segurando uma bolsa de dez mil reais, quando muitos
batalhavam vinte e quatro horas por dia para ganhar suado um salário-mínimo
que sustenta uma família inteira. Não estou julgando, só me senti esmagada nesse
novo universo, enquanto observava os arredores analisando os grupinhos de
milhões.
— Ah, passeio de iate no final de semana… — Uma garota passou por mim
conversando com sua amiga.
“Passeio de iate…?”
Claro que sim!
— Júlia? — Raica chegou de repente e logo capturou minha expressão. —
Tudo bem, girl?
— Ahaaa. — Dei de ombros. — Eu só estou degustando do sabor que é
realizar um sonho. Sabe, Raica, eu sonhei com esses corredores durante o ensino
médio inteiro, então acredite, mesmo que esse alto padrão me assuste um pouco,
nada consegue tirar a sensação prazerosa do meu peito. Estou na WIS!!!
Raica gargalhou e seu rosto ganhou o mesmo brilho.
— Estamos na WIS, miga…
Minha visão ficou um pouquinho embasada.
— Jú, sem mico de chorar no corredor, não quero iniciar meu ano letivo toda
borrada — ri e colhi rápido a lágrima que não se contentou e rolou pelo meu
rosto. — Então calma, respira, relaxa, novinha… Então calma, respira, relaxa
novinha… tchu tcha, tchu, tcha… — Raica cantou um trecho de funk, brincando
também com o ritmo. — UP sábado, novinha, estou tão ansiosa.
Estiquei os lábios lentamente.
— Ah, Jú, vai ser legal.
— Tá… não vejo a hora — falei e abri um sorriso falso.
Ela deu um saltinho de entusiasmando, mesmo sabendo que eu não estava
nada empolgada para o rolê do final de semana.
— Pegou seu plano de aula? — perguntou e seguimos na direção da sala.
— Sim, estamos juntas em quase todas, preparada?
— Sim. Adeus sociedade, adeus mundo, adeus pênis, me esperem, estarei de
volta daqui a cinco longos anos, formada e bem-sucedida — narrou dramática e
se aproximou para cochichar no meu ouvido. — Jú, já conferi, tem muitos paus
de ouro por aqui, estamos bem servidas — ri e dei um soco de leve no seu ombro.
— Pare de ser vadia, Raica — repreendi a safada.
— Ah, espere, a novinha já tem um pau bilionário, não é mesmo?
— Filha da mãe — sibilei. — Aula!
Dei as costas para a engraçadinha e entrei no auditório.
Um dia depois…
Passei toda a manhã ajustando o material da reunião de apresentação que
teríamos por vídeo conferência com o CMO, embora estivesse exausta e muito
apreensiva, afinal minha ideia seria a pauta principal da reunião. Um encontro
com Ricky, mesmo que em vídeo, inquietava o meu coração. O novo homem que
se revelou — talvez ciumento, mas certamente insensível —, não me agradou.
Não como aquele que apareceu de repente na porta do meu prédio e segurou a
minha mão em meio ao meu desespero emocional.
— Orion, tudo pronto, quer que eu prepare a sala? — sugeri com o conteúdo
em mãos.
— Júlia, então… — Ele meneou a cabeça. Oscilando. — A Valéria,
assistente do Ricky, já fez isso, não se preocupe.
— Então vamos. — Chequei o horário no celular. — Temos dez minutos,
correto?
— Júlia, o Walker… — Ele pausou e olhou diferente. Achei estranha sua
expressão opaca. Algo errado piscava ali. — Então…
Ajustou a gola da camisa, se movendo sem necessidade na cadeira. Ah? O
que estava acontecendo? Semicerrei os olhos a espera da explicação.
— Orion, o que houve?
Ele mirou meus olhos, engatilhou as palavras e disparou de uma só vez:
— O Ricky não quer você na reunião.
— Não? — perguntei e quase tombei na mesa ao lado. — Por quê?
— Somente a diretora.
“Somente a diretora?”
Ricky não seria capaz de…? Mesmo sabendo o quanto eu esperava por esse
encontro. Minha ideia era… não… ele, não.
— Desculpe, eu lamento…
Orion fugiu do contato, iniciando algo no seu computador. Bem provável
que minha expressão tenha entregado o quanto estava ferida.
— Ah, entendi, eu sou uma estagiária, tá certo — murmurei fraca. — Com
licença, vou ao banheiro.
Orion assentiu, desconsertado.
Corri na direção como se aquilo me custasse a vida, segundos depois me
tranquei em uma cabine que ficou pequena para tudo que corroía o meu peito.
Como pode as coisas mudarem de tal modo? Sua atitude insensível, egoísta,
capaz de anular qualquer imagem perfeita que eu tivesse construído dele. Ele não
tinha esse direito, ou melhor, ele tinha esse direito como chefe.
Desgraçado.
Ele é o dono, tem o poder na palma das mãos, não é mesmo? Mentiroso…
ouvi de sua própria boca que jamais seria prejudicada na WIS, ele viu em meus
olhos o quanto tudo isso aqui é importante para mim. Minha mãe estava certa, o
lado frágil é o primeiro a romper.
Ricky é um mentiroso, um maldito mentiroso.
Totalmente dedicada ao trabalho levei a semana, as junções entre setores
iniciaram e pude presenciar algumas gravações, tietei influenciadores dos quais
era fã, tirei muitas fotos e o meu Instagram começou a bombar de novo. Orion
não me deixou fora de nada, me manteve conectada — como o chefe especial e
solidário que era —, sua atitude amenizou a decepção dos dias anteriores.
Na WIS UNIVERSITY fiz algumas amizades, ao contrário de Raica que já
estava entre os populares. A minha melhor amiga não conseguia passar batida por
lugar algum, conquistou os ricos com seu papo, beleza e bom humor.
— Oi, Jú — Renan saudou e sentou-se ao meu lado. — Uma vitamina, por
favor — pediu para o atendente da lanchonete da universidade.
— Oi, Renan, intervalo?
— Sim, exausto. — Ele observou os flyers que eu avaliava com atenção. —
Trabalho?
— Sim, alguns materiais que estou estudando, procurando erros.
Meu amigo pegou um papel entre tantos e estudou com atenção.
— Encontrou?
— Vários, erros de destaques ou letras que não encaixam com a marca,
também cores, muita coisa — falei segura.
— Garota, tem certeza de que está no primeiro ano de publicidade? — ele
perguntou divertido e pegou sua vitamina na bandeja do atendente. — Obrigado
— agradeceu ao rapaz.
— Renan, tive muita sorte de trabalhar com o Orion, o cara é um crânio.
— Sim, minha irmã chegou a comentar. — Ele sorveu sua vitamina antes de
falar. — Realmente valeu a pena todo esforço, né? Estudamos tanto para estar
entre os vinte e cinco, e hoje estamos aqui, na melhor universidade do mundo.
Somente por isso que não acredito em sorte — não que ela não exista ou não
aconteça em alguma ocasião —, mas trabalho e esforço são reais para mim,
valorizo cada madrugada em que tive que aprender o que o ensino público não fez
questão de ensinar. Foram muitos os “é muito concorrido” ou “talvez uma
universidade mais viável". Possivelmente, se tivesse escutado, hoje não estaria
saboreando meu sonho. Lembro-me de uma palestra logo no final do cursinho,
regida pelo mentor Jair Almeida, ele segurou duas sacolas plásticas populares de
supermercado, uma furada na parte de baixo rente ao lixo e outra intacta, pegou
duas bolinhas de papel e relatou:
“É assim que vocês devem direcionar os feedbacks na vida, os construtivos
coloquem na sacola da vida, a que acrescenta, a intacta. Os destrutivos joguem
na furado e os destinem direto ao lixo, pois nada neles acrescentará no seu
desenvolvimento. Isso os fará soberbos? Não! Pelo contrário, vocês verão que o
fluxo maior será o da sacola furada, garanto.”
Nunca esqueci dessa mensagem, como nunca me deixei levar pelos
desaforos que meus tios fizeram ao longo da minha infância.
— Sim, merecemos — concluí, tirando-me do torpor das recordações.
— Amanhã, tudo certo para a UP? Théo já reservou tudo.
— Hum, posso desistir? Dormir para mim seria ótimo.
Ele fitou descontente.
— Nem pense, garota. Levo a senhorita amarrada se for necessário.
— Tudo bem, eu vou. — Seu sorriso não coube no rosto charmoso. Passei a
admirar Renan desde o dia infeliz no seu apartamento, o garoto de dezoito anos,
apesar da rejeição, não demonstrava fraqueza, e sim, uma força capaz de inspirar
qualquer um. — Renan, seu pai, falou com ele após aquilo?
Por um longo instante, seu olhar pairou no líquido laranja do copo.
— Não, e nem quero, você viu, ele queria me matar.
— Talvez estivesse muito nervoso para chegar a esse ponto. — Minha
intenção não era suavizar a atitude do pai, presenciei naquela sala um ato
ofensivo, não esqueceria jamais as palavras injustas proferidas pelo homem de
olhos perturbados.
— Júlia, não justifica, agressões verbais ouço desde os onze anos, na escola,
nas festas em família, já escutei tantos absurdos que não consigo nem comentar,
agora agressão física, não. Ele passou dos limites.
— Sua mãe nessa história?
— Não tenho, nunca tive, meu pai falou, ela acatou e seguimos o bonde. —
Senti o amargor no relato.
Nossa, deve ser uma barra passar por essa descoberta de sexualidade sem o
apoio dos pais. Não me vejo sem a participação da minha mãe nos detalhes da
minha vida. A baixinha é brava, mas nunca me negou colo, sempre esteve
comigo. Provavelmente sem a presença de mamãe, nunca, nem em sonho, a WIS
seria possível.
— Que barra, Renan — segurei sua mão —, estou aqui para qualquer coisa,
tá bom?
— Eu sei, Jú. — Ele ergueu minha mão e deixou um beijo doce no dorso. —
Obrigado.
— Última aula, vamos? — falei recolhendo os materiais que espalhei sobre a
mesa.
Fazia exatamente uns quatro dias que não jantava com a minha mãe, nossos
horários se desencontravam, então muitas vezes os bilhetinhos na geladeira eram
o nosso meio de comunicação, na noite de sexta um cheiro de molho à bolonhesa
atiçou meu paladar assim que abri a porta. Corri para a cozinha e esmaguei as
bochechas coradas da mulher a quem devo a vida, ela sorriu e pediu para que eu
tomasse um banho antes do jantar, fiz tudo bem rápido, pois uma lasanha estava à
minha espera no forno.
Conversamos muito, sobre as coisas boas que estavam acontecendo, tudo tão
mágico, eu na universidade, ela com o salão repleto de clientes, cogitou até em
antecipar as prestações do apartamento, pois o lucro nos negócios estava sendo
exorbitante.
— Mãe, talvez meu salário feche a conta e possamos completar o ano sem
dívidas — falei enquanto lavava a louça. — O que acha?
— Júlia, junte seu dinheiro e compre um carro, será muito útil para você. Eu,
por enquanto, consigo dar conta, caso precise eu aviso, ok?
Assenti, talvez demorasse muito para juntar o suficiente para um carro.
Contudo, sem gastos e economizando, conseguiria em… muitos meses.
Finalizamos a noite com uma barra de chocolate, um pouco de televisão e
minha mãe roncando no sofá. Ajudei a dorminhoca a se acomodar no seu quarto e
enquanto apagava as luzes o interfone tocou.
“Que estranho”, pensei antes de atender.
— Alô.
— Júlia, querida, é o Beto da portaria.
— Sim, aconteceu algo seu Beto? É tarde.
— Não, querida, somente um homem que disse que precisa falar com a
senhorita com urgência, avisei que era bem provável que estivesse dormindo,
porém ele insistiu.
— Qual o nome dele?
— Ricky Walker, querida.
Merda, não.
De acordo com a fofoqueira master Raica, Ricky só estaria de volta à
empresa na segunda-feira. Tempo suficiente para eu eliminar uma parcela da gana
que pesava meus punhos para acertar a cara dele. Portanto, condenei o sorriso que
forçou em aparecer no meu rosto por saber de sua presença no portão e expulsei o
ar com força, antes de seu Beto ser novamente o foco da ligação.
— Diga ao tal homem que estou dormindo, por favor.
— Tudo bem, querida.
Desliguei e respirei, colocando as palmas sobre o peito. Puta merda,
condenei meu coração por reagir por ele. Ele não merece, órgão frágil, se
passaram uma semana e somente agora ele apareceu. Não… mil vezes não.
Deus sabe o quanto me esforcei nos últimos dias para manter a cabeça no
lugar, esquecer os delitos sexuais que andei aprontando em um tal escritório e,
por fim, voltar a viver como uma garota de vinte anos, universitária, sem maiores
emoções. Ricky provou, no final das contas, que ser meu chefe era de fato o muro
de erros que existia entre nós. Eu esqueci esse detalhe, fraca, curiosa, quando me
deixei embalar por sua sedução.
Não sou mais aquela Júlia.
Definitivamente, não sou.
Permaneci, sem motivo, parada encarando o interfone, como se esperasse
uma insistência, uma recusa, um novo toque. Júlia, sua tola… trin… O silêncio
durou pouco, não precisou uma segunda chamada e o fone já estava posicionado
no meu ouvido.
— Oi, seu Beto.
— Júlia, o homem disse que não sairá da portaria até a senhorita atendê-lo,
devo chamar a polícia?
— Não, eu… eu… vou descer.
— Ok, vou informá-lo.
Vesti um agasalho por cima da camiseta, verificando rápido se a calça larga
xadrez era adequada. Calcei meus chinelos a caminho da porta. O elevador
parecia estar à minha espera, entrei e senti meus ombros tensionarem, fiz uma
careta quando meu cabelo desgrenhado quase trincou o espelho, penteei os fios
com os dedos e logo a palavra térreo piscou acima da minha cabeça. Desci e
caminhei a passos curtos até hall, estagnei um pouco antes de atingir os degraus,
o homem escorado no carro, braços cruzados, rosto fechado, vestido de moletom
e jeans entrou no meu campo de visão e paralisou todo o meu sistema. Podia
admirá-lo por horas, babando, ao mesmo tempo que múltiplas reações boas e
ruins transcorriam pelo meu corpo.
No entanto, fui ao seu encontro, certa do que precisava ser feito.
— Ricky, o que faz aqui a essa hora? — cheguei falando.
— Preciso fazer uma pergunta — falou, mas não se moveu, apenas seus
olhos me encararam efusivamente. — Posso?
Ah? Ele veio até aqui para fazer uma pergunta?
— Não — declarei. — Como meu chefe, não devia estar aqui.
— Não estou falando de trabalho.
— Mas eu estou, temos algum assunto pendente, Sr. Walker? Não lembro.
— Por que pegou carona com aquele cara? — ele vociferou, mantendo-se na
mesma posição. Estávamos a três ou quatro passos de distância, talvez fosse
melhor eu me aproximar, ou então amanhã todos do prédio saberiam da minha
vida.
— É essa a sua dúvida? Veio até aqui para isso?
— Uma delas.
Balancei a cabeça puta da vida.
Ele quer me enlouquecer, só pode.
— Não é da sua conta, vai se ferrar e boa noite. — Virei em direção ao
portão, não vou dar satisfação da minha vida para o Ricky.
— Espera, Júlia. — Ele segurou meu braço. — Me responde.
Girei tendo seus olhos como centro.
— Não sou obrigada a responder nada que não seja relacionado ao trabalho.
— Você saiu com ele? — A pergunta veio seca, amarga. — Saiu com aquele
idiota?
— Como assim? Não te entendo, não era você que gostava de momentos,
relação livre? — Joguei os braços no ar.
Ele trincou a maxilar.
— Então saiu com ele?
— E se…?
— Sem sarcasmos, Júlia.
— Pense o que você quiser.
— Ok. — Seus olhos escureceram. — Foi o que imaginei.
Ricky liberou meu braço e, antes de entrar no carro e bater a porta com
força, permitiu que eu lesse seus olhos, havia algo diferente, inédito, pairando no
castanho intenso, não sei… mas me perturbou assistir sua partida.
22 | Ricky Walker
Noite de sábado.
Em quarenta e oito horas ultrapassei limites que até alguns dias atrás me
afastaram de problemas, sempre simplifiquei tudo, tive liberdade desde a
faculdade sobre a área na qual ia atuar. Depois, com as viagens, a instabilidade
trouxe em vários momentos muita diversão e, quando queria me sentir de certa
forma em casa, era a Ellen quem eu procurava. Portanto ao embarcar para o Sul,
em mais uma viagem curta, nada demais, uma entre tantas que ainda farei, o
sabor não foi o mesmo, foi ácido. Estava agitado e a concentração para resolver
assuntos que exigia a minha presença não foi muito latente.
Todos os meus pensamentos e sentidos giravam como uma roleta russa.
Cercado por dúvidas ou algo sufocante que apertou meu peito até eu largar tudo e
voltar. Procurei uma resposta: o que a garota de boca provocante tem para
desencadear meus planos.
Cogitei o fato de outro homem tocar nela e isso causou uma fúria, um desejo
de posse, impulsivo, confuso.
Desleal.
Não consigo lidar com essa ânsia.
Não consigo lidar com esse ciúme.
Que direito eu tinha sob ela? Júlia era livre para sair com quem… Caralho,
só de considerar a possiblidade, minha corrente sanguínea fervia, minha mente
formulava muita merda e meu corpo agia sem controle. Desejava como o maior
dos tesouros a garota entre meus braços, só minha. Desejava que todos os seus
beijos fossem destinados a mim, assim como suas carícias e seus pensamentos.
Enlouqueci, em que momento essa chave virou, em que momento essa distância
passou a incomodar tanto? Permiti que a cabeça pesasse no escoro do sofá,
apertei os olhos recebendo do silêncio da minha casa um pouco de sobriedade.
Não estava acostumado com essa desordem emocional, tampouco com a onda
impulsiva que dominou meu autocontrole esses dias. Precisava de uísque e uma
boa foda… meu rosto tombou para o lado com o bip do celular, a foto de Garbo
piscava na tela, era o que eu precisava, uma noitada de putaria.
— Alô, Athos.
— Fala, irmão, como foi a viagem?
— Trabalho, sem maiores emoções…
— Que merda, nada de bocetas gaúchas pelo visto?
Sorri, nem as gaúchas me atraíram nessa porra de viagem.
— Sem gaúchas, preciso relaxar, hoje é sábado, tem algum lugar novo que
você conheça?
— Irmão, estou a caminho de uma boate, só tem um problema.
— Qual?
— A Ellen vai.
— A Ellen, por quê?
— Sim, nos falamos ontem e você sabe que tenho um carinho por ela, jamais
faria algo sem a sua permissão, mas ela estava a fim de um drink, então a incluí
nos meus planos de sábado, tudo bem?
Crispei os lábios, incomodado com a ideia. Ellen era uma diaba sedutora,
faria o possível para laçar Athos e eu, como nos velhos tempos.
— Por uma condição, mantenha Ellen ocupada, e bem longe do meu pau.
Sabe o quanto ela domina a arte da sedução, e sinceramente, não pretendo voltar
atrás com minha decisão.
— Hum, mantê-la ocupada é extremante arriscado. — Riu canalha. — Ellen
é uma Deusa, irmão, sempre me considerei sortudo, por participar na festinha de
vocês dois.
— Preciso relaxar e quero algo novo.
— Seu pedido é uma ordem, oh, bebezão, tá carente?
— Vai se foder, Garbo.
— Vou te mandar o endereço.
Finalizei a ligação e fui para o banho.
Deloy Brizz, amigo de infância, fez questão de nos receber antes que um dos
seus funcionários nos guiasse para a área vip. Conversamos um pouco sobre o
investimento milionário e arriscado que o americano operou no Brasil no ramo de
casas noturnas. Ousado, revolucionário, inaugurou em torno de quinze boates, só
em São Paulo eram três. A UP localizada em Higienópolis, um bairro badalado
da metrópole paulistana, tem uma arquitetura única, estilo pirâmide, com espaços
sofisticados e alguns secretos para um público eclético. De tudo que conversamos
só o fato dele mencionar seu sócio, tensionou meus ombros.
Puta que pariu, não tenho paz.
— Não sabia que Nicholas estava nesse empreendimento.
— Na verdade, Ricky, seu irmão é majoritário. Ele trouxe toda a ideia e eu
embarquei sem pensar — Deloy sorriu antes de vestir sua jaqueta vermelha.
Olhei rápido para Athos, que passou a mão na nuca.
— Entendo, não tenho muito contato com meu irmão, por acaso ele está por
aqui? — fiz a pergunta pertinente, dependendo da resposta, imediatamente
mudaria meus planos.
Deloy franziu a testa, pareceu confuso com a questão.
— O Nick esteve aqui pela manhã, fizemos uma reunião, depois ele voltou
para o hotel onde está hospedado.
Encarei a Ellen e notei que estava ciente do desembarque do meu irmão no
Brasil. Só não fez questão de me informar.
— Ok, amigos. — Deloy desviou para um rapaz que adentrou no escritório.
— Théo, esses são meus convidados de honra, os trate como reis.
— Bem-vindos à UP — o rapaz alinhado saudou.
— No meu caso, rainha, Théo — Ellen brincou.
— Claro, linda rainha, tenho que ressaltar.
— A mais linda de todas, deixa eu ver. — Deloy observou as mãos da
mulher. — Caralho, Ricky, você ainda não colocou um anel nesse dedo. — Riu.
— Ellen, larga esse cara e vem para o meu harém.
— Eu não posso, eu o amo — a mulher declarou e colocou a mão sobre meu
ombro.
Então percebi que teria uma longa noite pela frente, nos despedimos do
amigo e seguimos Théo, o promoter da boate.
— Senhores, vou deixar um garçom à disposição de vocês, caso queiram
privacidade, peçam para ele mover as paredes e privá-los do externo. Por
enquanto, curtam a visão da pista e, se precisarem de qualquer coisa, me chamem.
O rapaz saiu, e nos acomodamos no sofá, logo o garçom colheu todos os
pedidos, enquanto as luzes se movimentavam por cima de nossas cabeças. O
intuito era relaxar, porém saber que estava na boate do meu irmão, que
provavelmente poderia aparecer a qualquer momento, não me trouxe nenhum tipo
de tranquilidade.
— Ellen, por que escondeu de mim? — disse, próximo ao seu ouvido. —
Sabia que o Nicholas estava no Brasil.
— Bem, Ricky, não sou sua secretária, então não senti a obrigação de
informar. Outra coisa, o próprio avisou que você estava ciente
— Relaxa, Ricky, viemos para nos distrair e cara, vai chegar o momento que
esse ódio tem que acabar.
— Pode ser. — Descartei a tensão, era muito para uma noite. Peguei meu
uísque servido pelo garçom e tomei um gole. A boate é magnífica, admito, meu
irmão tem talento para o ramo, no início cheguei a duvidar. Nicholas estava
possuído por ódio e se afastar dos negócios familiares soou como uma vingança
ou uma forma de punição. Porém analisando esse espaço, não tem como negar,
meu irmão cresceu e se tornou um grande empresário. — De qualquer forma, ele
fez um ótimo trabalho — comentei.
— Maninho, a boate é fantástica.
— Nick é fantástico, muito mais divertido que você, Ricky — a mulher
falou, e laçou meu pescoço com os braços. — Vamos dançar?
Observei alguns morangos na taça da Ellen.
Morangos!!!
— O que você está bebendo? — perguntei.
— Um coquetel de morango, bebida de adolescente. Preciso estar inteira
para enfrentar meu pai amanhã, então não vou de algo mais forte.
— Seu pai, no Brasil?
— Sim, de barba e bigode. Mas não quero falar sobre isso. — Ela deixou o
olhar cair para a bebida, enquanto movia os canudos nos morangos. — Athos,
como é ser vizinho desse chato aqui?
— Arriscado, talvez envelheça alguns anos com sua chatice. — O senhor
engraçado gargalhou.
— Temos que marcar alguma coisa, quero conhecer esse apartamento — A
diaba nos convocou para o jogo.
— Ellen, será um prazer lhe apresentar meu cafofo…
Athos permaneceu empolgado contando sobre seu apartamento, mas não
compreendi mais uma palavra sequer, visto que um grupo à frente atraiu toda a
minha atenção, eles riam, ao passo que retiravam da bandeja do garçom suas
garrafinhas, reconheci um dos homens iluminado pelo holofote e de imediato
meus músculos retraíram — Orion. O ar pesou. Contudo, o que cravou meus
passos vorazes na direção foi reconhecer a garota ao seu lado.
Júlia
— Bem-vindos à UP — Théo exclamou durante o percurso que fazíamos
nos guiando ao segundo andar. — Eu amo esse lugar.
— Passei a amar também — Raica falou eufórica. — Nossa, que noite
teremos.
A UP realmente era sensacional, dois andares, três pistas e área vip aberta e
privada, uma arquitetura de milhão, explicitamente destinada aos milionários.
Meus olhos brilhavam como holofotes a cada detalhe que eu contemplava.
— Meus amores, este é o espaço de vocês.
O promoter parou na entrada de uma área vip e um “UAU” repercutiu em
coro.
— Meu Deus, Théo, incrível — falei explorando o espaço. Puta merda, tô
me sentindo muito ricaaaaaa. — Isso vai custar alguma coisa para você? Porque
deve ser caro ficar aqui. — Me preocupei, o espaço além de privilegiado era
muito sofisticado para a plebeia em questão.
Théo riu, ao passo que avançávamos para o guarda-corpo deslumbrados com
a vista da pista na parte inferior.
— Fica tranquila, tenho o controle de tudo, só tem um problema.
— Qual? — Renan se aproximou rapidamente assim que escutou a palavra
“problema”.
— Hoje eu tenho que cuidar pessoalmente de dois camarotes, um de uns
americanos e outro de amigos do chefe, não consigo dar a vocês atenção e muito
menos aproveitar a noite, me desculpem.
— Tudo bem, amor — murmurou Renan e abraçou o namorado. — A ideia é
ficar bêbado e se acabar na pista, quem concorda levanta as mãos?
— EU!!! —Resposta unânime.
— Hey, cunhado, trabalhe e a gente se diverte — a preta zombou dele.
— Gentileza é seu nome, Raica — ele piscou. — Então peçam, o garçom de
vocês é aquele ali. — Indicou o homem gato vestido todo de preto parado
próximo à entrada. — Aproveitem, vou escapar quando puder.
Théo conversou um pouco mais com Renan e saiu quando foi requisitado em
outro lugar. Não nego que passei o dia indecisa em vir ou ficar em casa, mas
quem disse que a tropa permitiu que a Netflix namorasse comigo essa noite? O
look estava ousado, optei por um vestido preto rendado, curto, frente única com
um decote V ressaltando meus seios, completei com sandálias altas vermelhas,
um coque, pois se pretendia dançar até me acabar, já deixei o cabelo preso, uma
maquiagem digna de Oscar e uma bolsa clutch vermelha que peguei emprestada
com a minha mãe combinando com a sandália.
— Raica, vem cá. — Puxei o braço dela, nos afastando dos outros. Aliás,
minha amiga estava impecável num tubinho amarelo, sandálias da mesma cor e
com os cabelos volumosos que tanto amava. — Por qual motivo a senhora não
avisou que Orion viria?
— Amada, não houve tempo, ele me ligou altas horas para falar de você, e…
— De mim?
— Sim, Jú. O cara tá na sua, encara isso como um…
— Um? Um o quê? — Inspirei avistando problemas. — Um problema,
Raica, não tenho cabeça para nada, já tinha conversado com ele, deixei claro que
não estou na pista, mas parece que ele esqueceu, olha como me olha… —
Indiquei com a cabeça o homem que alternava sua atenção entre a conversa com
os rapazes e meu corpo.
— Com cara de cachorro. — A engraçadinha riu.
— Não é engraçado, achei que a noite era nossa, mas agora estou
desconfortável.
— Júlia, trabalhamos com ele.
— Eu sei. Só que na empresa é diferente.
— Girl, se não quer nada com ele, não vai ter nada com ele. Ponto final. Não
é o meu caso, quero tudo com Lucca e terei tudo com ele. — Ela suspirou.
— E cá pra nós, o moço arrasou no look — comentei e viramos para
examinar Lucca. — A preta tá babando.
— Amada, a única coisa que penso é o que tem debaixo dos panos e
especificamente o tamanho do instrumento que a boxer guarda.
— Hahahaha, você consegue diluir todos os meus problemas. — Abracei-a.
— Te amo, Raica, saiba disso.
— Eu também te amo, Jú, mas quero que saiba que estou excitada agora.
— Afê, Raica, para de ser vadia. — Soltei a assanhada. — Respira, a noite
está apenas começando, vem, vamos participar da conversa dos homens.
— Quer apostar que é sobre futebol?
Colamos no trio e, para a nossa surpresa, falavam sobre viagens, fiquei
impressionada, Lucca conheceu a Itália se aventurando como mochileiro (que
tudo), um dos meus sonhos depois de conhecer os Estados Unidos era morar na
Itália. Quem sabe quando finalizar a graduação faça uma loucura assim? O
garçom serviu nossa bebida e aproveitamos para admirar a pista na parte debaixo,
fervendo, o DJ era realmente um fenômeno.
— Boa noite.
A voz áspera parou meu coração.
— Ricky — Orion exclamou surpreso. — Que coincidência encontrar você.
— Também acho. — Ainda que o ambiente estivesse pouco iluminado,
conseguia ler perfeitamente sua expressão. — Como vão todos? — perguntou
para os demais.
— A Júlia e Raica, você já conhece.
— Tudo bem, garotas?
Raica disfarçou e beliscou meu braço, movemos nossa cabeça atônitas.
— Tudo bem — respondemos em sintonia.
— E esses são Lucca e Renan, talvez você não os conheça, fazem parte de
outras áreas da WIS.
Ricky cumprimentou os rapazes com um aperto de mão.
Lucca e Renan se entusiasmaram com a presença do chefe, sorte a minha,
pois não conseguia disfarçar que estava a ponto de explodir. Provavelmente era
um teste do universo, de todas as coisas possíveis que poderiam acontecer,
encontrar o Ricky na boate era surreal. Sua estrutura física capturou meus olhos
por alguns segundos, tempo suficiente para mandar meu autocontrole para o
espaço.
Que provação é essa?
Raica reparou meu desespero e me afastou dois passos para trás, enquanto os
outros entretinham a atenção do CMO.
— Girl, disfarça a cara de pânico — ela sussurrou —, ou então os rapazes
vão perceber seu desconforto com o chefe.
— Não estou em pânico. Estou apavorada! Com licença, eu vou ao banheiro
— falei e fugi.
Apressei os passos, precisava respirar ou vomitar, tentei me equilibrar em
cima do salto, passando por várias áreas reservada no caminho, só que uma me
fez parar ao identificar o perfil de Ellen acompanhada de homem — bem
provável que Ricky estivesse com eles. Procurei a placa que indicava o banheiro,
encontrei à frente, segui, entrei, mas não permaneci um suspiro sozinha, Ricky
entrou em seguida e trancou a porta. Naquele momento minha alma saiu do
corpo, pensei em gritar com ele ou sair correndo, só não tive força para nenhuma
das opções, congelei, enquanto seus olhos estudavam meu corpo.
— Meu Deus, você está linda. — Seu timbre, rouco, sensual, misturado com
seu estilo casual, jeans escuro e camiseta justa, causou arrepios e muitas outras
coisas difíceis de relatar. — O que você está fazendo comigo, garota?
Se houvesse distância eu até formularia uma resposta convincente, porém o
executivo já estava na minha frente, ergui meu rosto até então baixo e encarei
aqueles olhos castanhos quentes que faiscavam para os meus.
— O que faz aqui? — indaguei num fio de voz, quase nula. — Por que está
aqui, Ricky, quer me enlouquecer? Responde. Não consigo mais, esse seu
joguinho está acabando comigo, não tenho mais forças pra isso, seu desgraçado…
porque mexe tanto comigo, por me alucina dessa forma?
Ele sorriu de canto, canalha, cafajeste.
Como um maldito gozador.
— Eu te odeio.
— Duvido. — Num ímpeto ergueu-me e habilmente posicionou minha
bunda no mármore da pia. Tirou meu fôlego. — Não acredito em você. — Sem
tempo de me situar, ele abriu minhas pernas num movimento bruto e se encaixou
entre elas.
— Não sou sua.
— Não teria tanta certeza. — Suas digitais deslizaram lentas pela extensão
da minha coluna, cravando na minha bunda. — Não consigo imaginar outro
homem tocando você. Talvez não permita nunca mais que isso aconteça. — Ele
puxou meu quadril ao encontro do pau duro dentro do jeans e minhas pernas
fecharam-se ao seu redor oferecendo a calidez do meu sexo. — Olha o que faz
comigo. — Esfregou a ereção com maestria só para que eu degustasse o quanto
estava tomado de desejo.
Gemi, choraminguei, excitada, possuída por puro tesão.
— Ricky, estamos no banheiro, alguém vai bater a qualquer momento.
O executivo segurou meu rosto, olhos revelando muita coisa, boca salivando
por um beijo.
— Que forme uma fila do lado de fora, ou derrubem a porta, tanto faz, nada
e nem ninguém vai me afastar de você antes que eu faça uma coisa.
Ele moveu minha boca com o polegar, deslocando ao seu comando os
pequenos lábios desejados.
— O que fará comigo? — inqueri alheia a sua promessa.
— Vou devorar a sua boca e depois… — seus olhos deslizaram venerando
meus seios aguçados, exposto no decote atrevido —, seu corpo inteiro vai sentir
minha boca, vou marcar cada curva para que não reste dúvidas a quem pertence
cada gemido que sai da sua boca.
Selvagens, famintos, sedentos.
Nos beijamos, nos engolimos, nos comemos. Na indecência visceral de
nossos lábios, era cada vez mais maluco e descontrolado o impacto. Ricky, a
razão de todos os meus erros, o pecado que sempre confessava não cometer, mas
que em circunstâncias lascivas rendia-me aos seus desejos. Desejos esses que eu
partilhava com louvor, ajoelhava e implorava por seu deleite.
Era uma tola, uma tola ébria.
Desejava.
Pertencia.
Mas sabia dos riscos que corria sempre que me rendia.
Meu corpo queimava, conforme a boca que quase não permiti desgrudar da
minha, explorava úmida minha carne, me afastei o suficiente para me arreganhar
expondo seu banquete, a calcinha que ainda existia, pinicava minha intimidade
que pingava de tesão, queria como o ar ser fodia ali, ser comida de todas as
formas existentes pelo homem que me levava ao delírio.
— Por que faz assim Ricky, bate e depois quer fazer carinho?
Ele soltou o mamilo sensível, lambendo a extensão do meu pescoço até
encontrar o caminho dos meus olhos.
— Sou um babaca.
— Um babaca que faz merda, não é?
Sugou a minha língua, meu queixo…
— Mas você não vai ficar com aquele cara. — As íris queimando em
contato.
— Você está com a Ellen.
— Estou com amigos, Júlia.
— Eu também.
— O Orion não quer a sua amizade. Ele quer você e não vou permitir.
— Por quê? — Corajosa e latejando de tesão eu o encurralei, se havia algo
além dessa febre, que Ricky confessasse. — Responde!
Fui capaz de identificar os músculos tensionando sua face.
— Eu quero você.
— Até quando?
Ele se afastou e o clima, mesmo pulsante entre os corpos, ficou em segundo
plano.
— Não tenho uma resposta pra isso.
Me ajeitei no mármore, antes de me colocar em pé diante dele.
— Você me excluiu da reunião, o motivo, ciúmes do Orion? — A feição que
dominou meu rosto transformou a dele.
— Estamos falando de trabalho agora?
— Sim, ele sempre estará entre nós, não vê?
Seus pés percorreram o espaço amplo, com outro tipo de fervor.
— Quis me afastar quando soube que você estava com o imbecil.
— Você quis se afastar, ou você me afastou injustamente? Não, Ricky, como
pôde? Não tinha esse direito.
— Não prejudiquei o seu trabalho, sua ideia foi aprovada, o que queria
mais?
— Estar presente nessa reunião. Você prometeu que nada prejudicaria meu
sonho se nós… — Apoiei as mãos na pia e deixei o rosto pesar, controlando a
respiração que há poucos segundos incitava prazer. Ergui o rosto e o encarei
através do espelho. — Eu não devia, mas acreditei na sua promessa de que meu
trabalho não ficaria entre nós. E olha só.
— Quem está entre nós, Júlia — ele cravou cada passo até parar atrás de
mim, olhos conectados pelo espelho — é o Orion.
Girei rápido sem perder o contato visual.
— Não muda de assunto Ricky.
— Quero você longe dele.
— Tá louco, trabalhamos juntos. — Espera! Ele quer o quê? — E quem é
você para me exigir algo assim?
A fisionomia ganhou novos traços e seu maxilar se moveu de um lado para o
outro.
— Alguém que… Eu quero você. — A voz soou intensa demais para que eu
não me apoiasse na pia. Apesar do meu ventre estremecer com a intensidade, meu
raciocínio não me abandonou.
— Um capricho! É o que sou para você nessa temporada que ficará no
Brasil, Sr. CMO? Um capricho? Uma aposta? Uma conquista?
Ricky pressionou as pálpebras e, mesmo sem ter talento para ler mentes, eu
decifrei cada linha nova de sua feição que respondeu aos seus pensamentos.
— Capricho? — retrucou, ofendido.
— Sim, capricho — repeti, com o coração esmagado.
Ele balançou a cabeça várias vezes.
— Ok, Júlia, estou cansado. — O ímpeto da distância foi rápido, bem como
o destrancar da porta. — Não sou moleque, volte para seus amigos e pense o que
quiser.
Oscilei entre os caminhos a mim oferecidos e ultrapassei a porta que bateu
com força quando virei o corredor. Não havia mais nada a ser dito e, caso
houvesse, provavelmente nos machucaria ainda mais. Ricky errou comigo, por
causa de um ciúme que não fez questão de esconder, isso não significava que
havia um sentimento. Sua gana por desafios era grande e eu me tornei um quando
não aceitei seu jogo.
No entanto, eu…
Encontrei a Raica no caminho, que arregalou os olhos ao ver o meu estado.
— Júlia, procurei você por toda a parte, o que houve, porque está…?
— Raica, vem comigo. — Segurei sua mão nos afastando dos olhares.
Entramos numa espécie de corredor pouco iluminado e sem fluxo de pessoas. —
Eu gosto dele, Raica. Não devia, mas gosto, estou apaixonada por Ricky e porra,
estou me condenando por isso, somos um conjunto de erros um para o outro, ele é
meu chefe, falta poucos dias para ele ir embora, e só de pensar na distância, meu
coração sangra, tem noção da gravidade desse sentimento que me sufoca? Mesmo
eu estando puta da vida pelo que ele fez, mesmo eu querendo esmagá-lo por conta
da decepção, nada disso abate o desejo que tenho de ficar com ele, eu… — Cobri
meu rosto com as mãos frias.
— Se acalma, Jú, vem cá. — Seus braços me cobriram e seu peito abafou
meus soluços. — Estava com ele, não é?
— Sim, no banheiro — consegui dizer.
— Imaginei, você demorou, então precisei inventar uma desculpa para os
meninos não fazerem perguntas.
Embora os braços da minha amiga fosse um refúgio revigorante, precisei
erguer-me para olhar em seus olhos.
— Ele foi atrás de mim e, primeiro nos beijamos, depois quase transamos,
para só então brigarmos e finalizarmos com um adeus.
— Adeus? Quem deu o adeus?
— Eu, ele, nem sei — Tentei limpar com as pontas dos dedos a tragédia que
se tornou meu rosto. — Eu não passo de um desafio para ele, Raica.
Ela curvou os lábios, pensativa.
— Por que tem essa certeza?
— Só tenho — Afirmei derrotada.
Obviamente, que Raica não se contentou com a explicação rasa e como uma
irmã mais velha — preocupada e insistente —, quis entender um pouco mais da
conversa do banheiro. A noite pra mim já havia perdido o brilho e cogitei ir
embora, no entanto, uma corda de aço chamada ‘amigos’ me puxou para a pista.
Para os meninos eu disfarcei a indisposição com uma enxaqueca súbita e eles
pareceram acreditar, senão, fingiram muito bem. A pista estava frenética, um
tempo depois me encaixei no emaranhado de pessoas pulando e dançando ao som
de “It Feels Like” do Alok, o suor brilhava minha pele e, finalmente a diversão
me dominou, sorri para os irmãos que dançavam ao meu lado, tinha esquecido
como eram bons momentos assim, o foco nos estudos me privava de coisas como
essa. O clima mudou, Hrs and Hrs da Muni Long, mesmo remixada, colou alguns
casais, inclusive Raica e Lucca que se afastaram do grupo, Théo apareceu e
puxou seu namorado para dançar agarradinho e uma mão tocou minha cintura.
— Júlia, dança comigo? — Girei e encontrei Orion.
— Eu vou beber uma água, Orion, pulei pra caramba, com licença. — Fiz
menção de me afastar, eu sabia seu interesse por mim e dançar agarradinho não
era uma forma de manter distância, porém, sua mão fechou no meu braço me
impedindo de seguir. — Orion não tô a fim, desculpe…
— Júlia, só uma música, e…
— E solta ela. — A voz grave mesmo misturada com a música alta, bateu
potente nas minhas costas e modificou de imediato o semblante de Orion.
Virei e Ricky estava lá, olhos de navalha cravados no homem ao meu lado,
voltei-me para Orion que não se afugentou e ainda por cima deu um passo, o que
o deixou à frente e mais próximo do chefe.
Meu coração parou.
— Por que, Ricky, o que faz aqui?
— Não é da sua conta. — Ricky avançou esbarrando em Orion e tocou meu
rosto com delicadeza. — Tudo bem?
— Ricky, o Orion não…
— Ele tocou em você sem a sua autorização, acho que entendeu o recado —
falou ácido. — Vamos sair daqui.
— Não, Ricky, eu não entendi o recado, pode explicar?
Não sei se era eu que estava atônita com a situação, mas a cabeça do Ricky
se moveu lentamente ao encontro do homem com olhos desafiadores, a pista
estava quente, contudo, o fervor que planou entre eles não era nada bom, ia dar
merda se não saísse com Ricky imediatamente.
— Ricky, tá tudo bem. — Segurei sua mão. — Orion, Ricky e eu temos
parentes em comum e, com isso, temos uma vivência entre famílias fora da
empresa, eu não mencionei antes porque não queria nenhum tipo de privilégios,
somos amigos, sabe. Mas agora que já expliquei eu… vou… diga a Raica, quando
ela voltar com o Lucca, que precisei ir embora. Com licença. — Por sorte pensei
rápido na desculpa, reunindo um pouco mais de força, pois o Ricky dificultou
nossa saída, encarando Orion como um alvo de guerra. — Ricky, por favor,
vamos — quase implorei.
— Ok — anuiu seco e se deixou conduzir.
Norteei nossos passos para fora da pista principal até estarmos em outro
ambiente mais reservado, não sabia bem que espaço era aquele, só queria me
afastar da multidão e, principalmente, da tensão entre ele e Orion, quando
identifiquei que não havia ninguém conhecido num tipo de mini hall com duas
entradas escuras e dois casais concentrados em suas próprias bocas, soltei sua
mão e o mirei com fúria.
— O que foi aquilo, Ricky? Enlouqueceu?
Ele umedeceu os lábios e a pouca luz autorizou um olhar que me despiu
inteira, me desarmou.
— Você é minha, caralho. — Suas mãos grudaram minha cintura erguendo
meu corpo que ele apoiou na parede à frente, minhas pernas fecharam-se no seu
quadril e sua boca respirou meus lábios, enquanto suas palavras saíam cálidas. —
Você é minha, Júlia, entendeu?
Não respondi, só acatei o que meu corpo implorava, segurei seus cabelos e
possuí sua boca com desespero, com apetite. Novamente estávamos no limite,
suas mãos ousadas deslizaram por baixo do vestido, apalpando a carne que
começou a queimar, ele me prensou um pouco mais e deslizou sua língua até
minha orelha, circulando cada ponto da região, fazendo gemidos se despregarem
ávidos da minha boca, quase gritei quando seus dedos escorregaram sem
gentileza por dentro da minha calcinha.
— Tá molhadinha pra mim, linda? — Arfei com o timbre rouco. — Eu vou
comer você aqui, Júlia, não pense que conseguirá escapar desta vez.
— Aqui não…
— Então saia comigo desta boate agora.
Umedeci meus lábios e quase os sangrei de tanto que os apertei entre os
dentes, quando seu dedo circulou meu ânus.
— Eu não posso — murmurei sôfrega. — Ah, meu Deus, Ricky.
O safado deslizou o dedo umedecido com a minha lubrificação, não muito,
mas o suficiente para sentir meu buraquinho sendo invadido, depois apertou
minha boceta com seu pau por cima do jeans.
— Então é aqui que vou saborear você de novo?
— Ricky, não estamos sozinhos…
— Mas podemos ficar e garanto a você, vou foder tão forte essa boceta e
jorrar porra nela e foder de novo e de novo, que talvez seja difícil você andar
amanhã…
Minha cabeça girava ao passo que meu corpo embaraçava, tudo misturado,
obsceno, tentador. Ricky era o ponto do meu descontrole, tudo ruía quando isso
aqui acontecia. Essa brasa que nunca apagava entre nós era capaz engolir o
conjunto de erros que nos separava, que nos fazia enxergar que um nós, mesmo
com data de validade, não seria possível. Só que…, meu coração batia forte por
ele, meu desejo incondicional era ele, então…
— Tá bom, vamos sair daqui — aceitei e o sorriso que cresceu ali nos lábios
marcados com os meus incendiou meu coração. — Quais são seus planos?
— Os piores possíveis — falou cafajeste.
— Ok, aceito esses também, desde que você cumpra os primeiros.
Ele riu e me colocou no chão.
Olhei constrangida para os outros casais ali, enquanto ajustava meu vestido,
identificando que estavam em seus limites e logo o espaço seria pequeno para a
pegação.
— Confesso que vai ser difícil me segurar até chegarmos, mas vai valer a
pena.
Espera, não vamos para o outro lado do mundo, né?
— Chegarmos aonde?
— Surpresa, linda.
23 | Júlia Sales
Ricky, todo enigmático, conversou por alguns minutos com alguém pelo
celular, em seguida, ainda sem mencionar seus planos, me colocou em seu carro
como se eu fosse um presente. O caminho me era familiar, estávamos na direção
da WIS CONECT, peguei meu celular e enviei uma mensagem para Raica,
explicando tudo, e outra para minha mãe. Não estava totalmente segura da
decisão, mas segui meu coração, me permiti viver esse momento ao lado dele, e
depois… não sei.
— Quis matar aquele filho da puta quando tocou em você na pista — ele
rompeu o silêncio, sem desviar sua atenção da direção. — Idiota.
— Você estava me vigiando?
— Lógico, achou que a perderia de vista? — disse simplesmente.
Joguei a cabeça para trás perplexa.
— Nunca tive nada com o Orion. Eu quis provocar você, quando insinuei o
contrário — confessei.
— Ficou claro quando você recusou o toque dele.
— Ele é somente um amigo.
— Só que ele ainda não entendeu isso — oscilou o olhar —, acho que terei
que explicar.
— Sei me defender, Ricky.
— Não tenho certeza. — Sua atenção voltou para o trânsito.
Argh.
Ele tem o dom de me excitar e me irritar, num estalo.
Inalei o silêncio no restante do percurso, evitei olhar pra ele, como eu disse,
uma hora estamos nos pegando e na outra brigando. De qualquer forma, o que
mais me desagradava eram suas nuances. Ricky sabia ser galanteador e
possessivo na mesma medida — sempre no extremo. Na tentativa de eliminar o
clima, ele levou a minha mão para seu colo e a acariciou enquanto dirigia, não
recusei o carinho, mas também não cedi totalmente. Como suspeitei, estávamos a
caminho da WIS, o carro conduzido por uma entrada que desconhecia percorreu
um longo corredor de luzes, até o executivo estacioná-lo numa vaga reservada
com seu nome. Analisei o lugar, era um estacionamento privado, e cada vaga
destinada a um dono, claro que o da Ellen Castiel estava lá, assim como o do
Orion.
— Aqui é um estacionamento privado? — perguntei, durante o trajeto até o
elevador.
— Sim, ele estava em reformas, mas reativamos há dois dias.
Como alguns momentos imprevisíveis são capazes de transformar a nossa
vida. Um olhar no elevador, uma descoberta no jantar do terror, um convite na
saída de emergência, um beijo no terraço, muito tesão no escritório, sabor de
manga e morango, jardim, brigadeiro, momentos esporádicos que me uniram ao
homem de momentos. Por mais inesperado que seja, nunca esquecerei desses
ápices que a vida me proporcionou.
— Então foi por isso que pegou o elevador principal naquele dia?
— Sim, devo agradecer ao engenheiro. — Ele sorriu e beijou de leve meus
lábios. — Talvez não tivesse conhecido você se aqui estivesse funcionando.
Linda, desfaz esse bico, prometo não agir mais como um babaca.
Semicerrei os olhos, duvidando um pouco da promessa.
— Ricky, sem babaquice, tá legal. — Suavizei minha feição. — Vamos
aproveitar o momento, é o que temos agora.
— Não sei o que você fez comigo, mas algo dentro de mim se transforma só
de imaginá-la em perigo.
Pousei minhas mãos no seu ombro e as deslizei pelo seu tórax.
— Estou diante do maior perigo da minha vida, devo ficar ou devo correr?
Ele abriu um sorriso de canto e me puxou para seus braços, seus lábios bem
próximos aos meus, seus olhos castanhos desenhando meu rosto.
— Quem lhe deu duas opções? — Sua língua deslizou no meu lábio inferior
que entreabriu para recebê-la, porém, o bip do elevador virou nossas cabeças. —
Vamos, o Anthony está a nossa espera. — Ele avançou e meu ar saiu forte e
frustrado.
Queria um beijo.
— Aliás, quem é Anthony? — Pisei firme entrando na caixa empata beijo e
arregalei os olhos quando o vi apertar o botão no painel. — Ricky, você pode, por
Deus, por todos os anjos e arcanjos, me explicar por que apertou o andar do
heliporto? — indaguei com a boca seca.
— Surpresa. — SURPRESA!? Ele respondeu zen. Enquanto minhas mãos
ficaram geladas. Sigam o meu raciocínio: se estávamos indo para o heliporto do
edifício, que era alto demais para minha compreensão e tranquilidade, só tinha
uma razão. — Sei que é uma garota corajosa.
Ele riu, a criatura riuuuuuuuu do meu desespero.
— Meu Deus, Ricky — gritei, assim que as portas se abriram e me deparei
com um helicóptero grande, voador, real.
Muito similar a um monstro de sete cabeças.
— Vou roubar a senhorita — murmurou e agarrou a minha cintura me
guiando para fora, por um instante pensei em segurar no apoio e permanecer
segura dentro da caixa metálica. — Será somente minha por algumas horas.
Ok, era um sonho! Um sonho voador.
E qual era o meu maior medo de toda a vida: voar.
Altura.
Altitude.
— Ricky eu tenho medo de altura, não é uma boa ideia, quem sabe não
podemos rever esse plano maluco — tentei negociar, quase à beira de um infarto.
Ele negou. O DESCARADO NEGOU. — Ok, então me conta o destino desse
troço? — Me empenhei em descobrir o itinerário, talvez houvesse uma chance de
fugir.
— Para o paraíso, topa? — zombou.
— De helicóptero?
— É o transporte mais viável.
— Ricky. — Choraminguei.
Ao se tratar de altura, sempre fui medrosa, nas vezes em que me permiti
entrar num avião, um calmante bem forte foi meu aliado.
— Olha… — falou sério dessa vez. — Não sabia desse seu medo, a viagem
é curta, optei pelo helicóptero por ser mais rápido e assim podermos aproveitar
melhor a noite, mas se prefere desistir, eu entendo.
Encarei a máquina e depois ele. A máquina de novo e ele depois.
Inspirei e soltei o ar devagar.
— Tá bem. — Ele voltou a sorrir. — Mas não solte a minha mão por um
segundo sequer.
Ele amparou meu rosto e deixou em meus lábios um beijo devoto.
— Talvez tenha que tirar uma foto para registrar esse momento — A voz
grossa não só nos surpreendeu como nos separou. — É muito bom ver meu amigo
assim.
— Saudade, irmão. — Os homens se abraçaram como amigos de infância.
— Júlia, esse é meu amigo e piloto, Anthony.
Anthony estendeu a mão para um cumprimento simples e sorriu com os
olhos de um tom azul-céu, ergui a cabeça e reparei um óculos aviador encaixado
no bolso direto da sua camisa do uniforme, tais como as tatuagens que fechavam
seu braço.
Caramba, ele era bonito pacas.
— Como vai, Júlia? — falou ele.
Desviei meus olhos para a grande máquina voadora.
— Tensa!
As criaturas fizeram questão de rir da minha cara.
— Será uma viagem rápida.
— E para onde vamos, Anthony?
— Nem pensar. — Ricky não autorizou o amigo a revelar, o que me deixou
ainda mais preocupada. — Garota, como você é curiosa, só confia em mim.
— Sei não. — Abracei meu corpo.
— Júlia, te garanto uma viagem tranquila.
— Ahaaa. — Deixei com eles meu desânimo e caminhei a passos curtos na
direção do monstro de sete cabeças.
Dentro da máquina, mesmo relutante, me acomodei e segui todos os
procedimentos de segurança.
— Júlia, infelizmente, por ser noite, você não vai apreciar a vista — o piloto
comentou.
— Hum, que vista exatamente? — especulei, tentando descobrir o meu
destino. Mas nem assim consegui uma deixa.
— Júlia, é surpresa — Ricky disse e beijou a minha testa.
— Ok. Vamos, Anthony, estou pronta. Espera! — Respirei fundo e fiz o
sinal da cruz cinco vezes. — Agora sim, pode ligar o trem.
Anthony se divertiu com o meu desespero, as hélices começaram a girar, a
máquina a subir e eu perdi a respiração por alguns minutos. Ricky já estava
acostumado com isso, viajava o tempo todo, mas eu, não. Aquilo para mim era o
apocalipse na terra, apertei a mão do homem ao meu lado, quase me fundindo
com sua carne, um suor frio correu minha espinha, uma dor de barriga
movimentou meu abdômen ao passo que o solo se tornava um imenso tapete de
luzes.
Engoli em seco.
— Fica tranquila, Anthony tem muitas horas de voo.
Bem, ter ciência do currículo do piloto não eliminou em nada o medo
absurdo que movimentava meu peito.
— Não sei como as pessoas conseguem relaxar estando acima de tudo.
— Olha, tenta apreciar a beleza surreal que enche sua visão, e se sentir uma
privilegiada por poder observar o mundo de cima, assim como Deus, talvez o
pânico passe.
Esvaziei a caixa toráxica com força, e não tão confiante assim dei um passo
contra o medo, impressionante o quão bela era a natureza. Deus pensou em cada
detalhe ao desenhar o universo, a paisagem abaixo (o oceano) calmo, manso,
negro, contrastava com a luz da lua. Lindo em todas as suas vertentes, era capaz
de nos elevar como um grande tapete mágico. Inconsciente um sorrindo frouxo
escapou, e Ricky logo prendeu-me em seu corpo quando notou o meu mais
sereno. Seu coração batia forte, seu hálito quente vadiava minha orelha e como se
não bastasse, ele sussurrou:
— Assim que desembarcamos, vou pausar o tempo, pois cada minuto ao seu
lado custarão eternos momentos — e assim um beijo doce afundou meu cabelo e
nada mais parecia errado como antes.
Era a primeira vez que me sentia segura e sem culpa.
Era a primeira vez que sentia que havia tomado a decisão certa.
Suspirei e me guardei em seu refúgio.
Em torno de cinquenta minutos depois, aterrissamos.
“Caramba” pensei enquanto descíamos e meus olhos não conseguiram
envolver toda a vista.
— Bem-vinda a Angra dos reis, Júlia — Ricky sussurrou no meu ouvido. —
Meu paraíso particular.
— Angra? Rio de Janeiro?
Ele assentiu e desviou para Anthony que veio ao nosso encontro.
— Obrigada, Anthony. O voo foi tranquilo — agradeci, recebendo um
sorriso do piloto charmoso.
— O prazer foi meu, Júlia.
— Obrigado, Thony, estou te devendo uma — Ricky agradeceu e puxou o
amigo para outro abraço. — Te ligo depois.
— Vou ficar aguardando, amigo. Até mais, Júlia.
— Até mais, Anthony.
O piloto caminhou de volta para o helicóptero, assistimos por uns minutos à
decolagem, até eu ser cutucada pela minha curiosidade.
— Ricky, estamos numa ilha, certo?
Ele virou para responder.
— Sim, a sete quilômetros da costa de Angra dos Reis. Como disse,
considero aqui um paraíso particular, minha infância foi marcada por esse lugar
— declarou, nostálgico, enquanto seus olhos valorizavam tudo ao redor.
— É uma ilha particular? — Quis ter certeza, às vezes sou um pouco lenta.
— Sim, é da minha família.
Ai, caramba!
— Estou na ilha particular da sua família Walker? — Ele assentiu. — AÍ.
MEU. DEUS!
Ricky gargalhou e deu alguns passos adiante.
Eu permaneci imóvel.
Não esperava uma surpresa nesse nível, imaginei tudo, menos algo tão
íntimo, tão chique, tão bilionário, tão... puta que pariu!
— Surpreendi você?
Uau…
— Não, a mim? Imagina, querido! Ilha particular é normal na vida de uma
estudante da zona sul.
Meu executivo lançou aquele sorriso safado.
— Estamos sozinhos aqui, liberei os empregados que cuidam da casa. Então
trate de ficar à vontade.
— Ficar à vontade! Isso soa com duplo sentido para mim.
— Com certeza foi, apesar... — Ele segurou minha mão e me rodopiou. —
Quase infartei quando a vi com esse vestido, gostosa, sexy. — Me puxou para ele.
— O que estava pensando quando saiu de casa vestida assim? Você está linda,
muito linda.
Beijei ele com doçura.
— Obrigada, você também está lindo com esse visual casual, mas confesso
que passei a ter uma tara por ternos e gravatas, o conjunto sexy inserido dentro de
um escritório, é perfeito. Hum… — Circulei o desenho de sua boca com meu
dedo.
— Ternos, é?
— Executivos de cabelos pretos e olhos castanhos, sendo mais explícita.
Seus olhos caíram para minha boca, provoquei, umedecendo-a com a língua.
Ricky anelou, mordeu meu queixo e, num movimento inesperado, me jogou em
seu ombro.
— Vamos subir. — Os degraus já recebiam seus passos.
— Ricky, me coloca no chão agora. — Esmurrei suas costas. — Ai… — Ele
mordeu minha bunda que provavelmente estava de fora por conta do vestido
curto.
O heliporto da ilha localizado na parte de trás da casa ocupava um vasto
terreno, seguimos por um caminho de pedra estilo uma pequena estrada rodeada
por flores. No topo, Ricky pediu arrego e me colocou no chão, de modo que
consegui contemplar, um pouco distante, uma enorme piscina cercada por muitos
coqueiros. Passamos por alguns ambientes abertos com sofás e mesas rústicas,
mas o que me deixou de joelhos foi a casa principal, nunca havia visto algo
parecido, de um bom gosto extremo. Coisa de filme. Sempre soube que a família
Walker era bilionária, seu sobrenome estava entre as famílias mais ricas do
mundo. Contudo, desfrutar de tal fortuna era, até então, estava fora da minha
realidade.
— Ricky, que casa linda — exclamei sem esconder meu deslumbre.
— Minha mãe decorou cada espaço pessoalmente, mesmo que tentasse, seria
impossível te mostrar tudo.
— Sra. Sara Walker, sua mãe é brasileira, não é?
— Sim, paulistana, assim como você.
Sara, a linda brasileira que encantou o americano Robert Walker, em uma
das suas viagens de férias ao Brasil. Tá legal, eu fiz a lição de casa.
— Sua mãe é linda, digamos que a vi pousando ao seu lado em alguma
matéria online.
— Quando pesquisou sobre a minha vida? Profissionalmente, é claro…
Rolei os olhos, sendo magnetizada por uma parede de vidro na outra
extremidade da sala, andei até lá.
Que vista INCRIVÉL!
A ilha inteira abraçada a essa mansão no topo das pedras, o mar, o céu,
minha nossa…, era no mínimo surreal, se não fantástica ao extremo.
— Uau… — suspirei maravilhada. — O que são essas espécies de cabanas?
— São bungalows, alguns são suítes externas e independentes, outros sauna,
espaço para massagem, meditação. Minha mãe reformou algumas áreas que não
estou atualizado. Quem frequenta muito aqui é meu irmão Nicholas, eu quase não
consigo, então por sua causa me dei esse descanso.
— Descansar? — inqueri espantada, ajeitando o decote do meu vestido. —
Tem certeza?
— Está flertando comigo?
— Descaradamente!
— Garota, você é sexy, sabe perfeitamente me deixar aos seus pés.
A impureza daquele olhar me despiu toda.
O safado eliminou a distância nada bem-vinda e tocou a alça do meu vestido,
brincando com a dobra de tecido por alguns segundos.
— Hum, não sabia que tinha todo esse domínio sobre você.
— Posso te confessar uma coisa?
— Se não for um assassinato, ou algo do tipo, pode.
— Talvez tenha matado algumas mulheres de prazer nessa longa jornada de
cafajeste. — Embalou um beijo doce no meu ombro, no pescoço, e na dobra da
minha orelha, para suspirar tórrido no instante seguinte. — Mas nenhuma delas
me rendeu ao desejo como você. — Meu coração, coitado, gritou por socorro.
Tudo dentro de mim abrasou. E aquele olhar…, intenso, apaixonado, ardente. Eu
registrei. Talvez, amanhã, quando só restasse a recordação desse momento, ele
fosse o meu consolo.
— Ricky, eu…
— Não precisa falar nada, não vamos intitular em palavras, só vamos sentir,
combinado?
Aquiesci, meio desconexa.
— Ok, não resisto mais a você.
Outra vez, ele me jogou em seus ombros, carregando-me até a escadaria para
o primeiro andar. Não decorei o caminho que ele tomou pelos corredores, pois
pousei o rosto no seu ombro me embriagando com seu perfume. Ricky empurrou
a porta com o pé e adentrou no cômodo escuro, iluminando-o assim que me pôs
no chão. Corri a visão na suíte enorme, em tons rústicos, cortinas e roupas de
cama claras, um belíssimo quarto. Dali era possível apreciar a lua que não se
resguardou através da porta-balcão que dava acesso à sacada.
— Muito lindo aqui — murmurei, dando alguns passos na direção. — Que
céu!
A noite preenchida por pontos estrelados, refletia como uma grande pintura,
inclusive, o clima de excitação também poderia ser rabiscado em uma tela de tão
tátil que estava. As mãos quentes do homem sexy tocaram meus ombros e
deslizaram suaves até a alça do meu vestido, havia uma respiração sôfrega
ouriçando a carne delicada do meu pescoço. Ricky era capaz de me excitar só
com seu cheiro de homem potente, robusto. Tudo nele carecia de tato, então
ansiava tocá-lo constantemente, porém naquele átimo o deixei embalar.
Como se desembrulhasse um presente, ele deslisou as alças, que seguiram
seu curso junto com a renda, formando aos meus pés um círculo de tecido, um
frescor lúbrico da noite transpassou meu corpo provido de uma única peça,
enquanto seus lábios umedeciam minha orelha com palavras ternas:
— Como poderia ser somente um momento, se meus sentidos e desejos
permaneceram ansiando por você? A desconhecida dos lábios provocantes do
elevador, a garota estudiosa e batalhadora da WIS, a mulher irresistível que
dominou meus pensamentos. — Girei recebendo dos seus olhos além da sua
confissão. — Mesmo se quisesse, era impossível uma única vez. É preciso tempo
para saborear, para me embriagar de você, Júlia.
Não houve tempo para gesticular, seu beijo capturou qualquer que fosse
minha ação, lacei seu pescoço entregando-me a ele e tudo pareceu contrastar,
desejo, fervor, batidas fortes de corações que se tocavam, faltou ar, pois o beijo se
intensificou.
Ricky me ergueu a tempo de eu abraçar com as pernas sua cintura, acarinhei
seus cabelos, mordi seu queixo e estranhei quando a minha coluna tocou o macio
do colchão, relaxei, assistindo-o retirar sua camisa, aquela pele lisinha que cobria
cada musculatura brilhou e quis lamber cada centímetro, porém o homem
pertencente se afastou, juntou minhas pernas esticando-as, uma mão segurou
meus calcanhares enquanto a outra correu obscena toda a lateral até chegar aos
pés, o toque ardeu, tremeu meu ventre, provocou um desejo absurdo.
— Você me provocou esse tempo todo, então estou no limite, mas saiba que
vou foder essa boca depois — o safado falou ao mesmo tempo em que se colocou
entre as minhas pernas, encaixando meus joelhos nos seus ombros e deixando-me
suspensa. — O que eu preciso é me alimentar dessa bocetinha que me fez viciado.
— Ele esfregou a boca na fenda úmida, fazendo minha coluna ondular. Depois
cravou as mãos na minha bunda, apertando, apalpando, estimulando todo o resto.
Sem que eu previsse, ele rasgou a peça e afundou ali, pincelando sua língua entre
os lábios ávidos e exigentes, circulou meu clitóris com movimentou frenéticos,
tirando de mim gritos de prazer. — Hm, desejo muito foder esse cuzinho também
— ele cuspiu na região e depois circulou com a língua. — Essa pérola já foi de
alguém, Júlia?
— Não…
Ele inclinou para me olhar transparecendo o quanto a resposta o envaidecia.
Safado.
— Quero muito ser o primeiro a foder esse cu. — Aquele dedo diabólico
continuou a torturar o meu traseiro. MEU. PAI. AMADO. No segundo seguinte
sua língua escorregou do ponto até minha boceta que pulsava. — Podemos
negociar minha entrada, o que acha?
Gargalhei.
Ricky interrompeu um oral para negociar meu cu.
É isso mesmo?
— Se o contrato for interessante, quem sabe.
— O que quiser, contrato, algema, minha vida por seu cu.
— Hm, talvez tenhamos um acordo — sussurrei instigada com aquilo. —
Continue, preciso degustar o material antes de liberar outra porta.
Ele apertou os lábios.
— Ok, tá certo. Quer gozar, gostosa?
— Sim…
Ele deu um tapa no meu sexo e voltou a manipular a língua entre as dobras,
pincelando do ânus às fendas encharcadas, dois de seus dedos também eram
presentes, penetrando com constância enquanto sua língua rastejava meu clitóris,
ora frenética, ora vagarosa, me levando ao êxtase. Gemi alto. Gozei.
— A canção mais linda de todas, seus gemidos.
Me contorci com ele apertando meu sexo, sugando os fluidos que escorriam
em sua boca.
— Caramba… bom demais.
Ricky era sensacional no oral, praticamente um medalhista na arte de
manipular a língua. Isso me fez pensar que teria que me esforçar muito para
atingir suas expectativas quando chegasse a minha vez de retribuir, pois ansiava
em possuir seu pau inteiro na minha boca. A experiência que tivemos no
escritório desatou alguns nós, não tenho vergonha, como não tive naquele dia de
me entregar a ele. Havia uma intimidade descomunal, que sempre estava
propensa à explosão, nos guiando ao limite e eu estava fascinada com isso.
— Ricky… — implorei.
Imaginei que meu segundo orgasmo viria com o Ricky me chupando
daquele jeito, porém o executivo me surpreendeu quando retirou minhas pernas
encaixadas no seu ombro, empurrou o meu corpo um pouco mais para a cabeceira
da imensa cama e arreganhou minhas pernas o máximo que a minha flexibilidade
autorizou, fiquei órfã da sua boca, mas logo salivei quando o vi tirar a calça, a
boxer e encapar seu pau inchado e suculento. Olhar conectado, corpo queimando.
E não foram necessárias palavras, tudo na gente esboçava devassidão, eu gemia
igual uma cadela, enquanto minha boceta recebia um comprimento viril, gostoso,
que quase não se ajustou ao sexo. Era grande, muito grande. Mas se coube uma
vez, ia caber de novo. Ricky circulou o quadril antes de meter compassadamente,
pressionou uma mão no meu colo, mantendo-me presa ao colchão, trabalhando o
abdômen em um vaivém sem pausas.
— Ah, Ricky... — gritei com a primeira socada forte, que me levou um
pouco mais para a cabeceira, meu executivo riu safado, o suor embaçando sua
pele, na medida que o cacete atingia o meu ventre de tão fundo que penetrava.
— Deliciosa, eu amo essa bocetinha apertada e quente...
Sou tarada por essas putarias cuspidas por ele, não nego. Elas atiçam,
incitam, me capturam para o ambiente indecente que construímos.
— Puta que pariu — seus gemidos roucos me enebriaram. — Gostosa…
Outra.
E mais outra enterrada rápida.
Porra.
Sua pélvis chocando minha intimidade, atingindo pontos sensíveis.
Peregrinei meus dedos ao encontro do meu clitóris e me toquei.
Ricky urrou com a visão que proporcionei a ele.
— Minha putinha gostosa.
Socou meu ventre.
Surrou gostoso.
Comeu minha boceta com força.
Um fastígio violento devastou-me.
Então, gozei.
Grita seu nome.
— Caralho…
O homem gostoso se deitou sobre mim, usando a boca para ir ao encontro de
tudo que podia, soltei gritinhos quando ele mordeu meus mamilos e depois os
sugou como se puxasse seu alimento, permaneceu me comendo durante as
lambidas no meu pescoço e orelhas, até diminuir o ritmo estocando e rebolando
na mesma sincronia do nosso beijo. Abandonou minha boca e minha boceta,
girando meu corpo pra ele.
De quatro era posição.
Ele esmagou as popas da minha bunda, e depois as separou, cuspiu no meu
ânus e judiou do ponto rastejando sua língua em devoção ao que queria. Não
tardou e seu pau afundou violento no meu sexo novamente, suas digitais
marcaram meu quadril, o ritmo imposto por ele me arregaçava deliciosamente
contra sua ereção.
— Você é minha perdição, sua safada gostosa.
Um tapa ardeu minha bunda e incendiou meu corpo.
— De novo.
Ele o fez, mais forte.
E meteu mais fundo, me sacudindo enquanto socava minha boceta com seu
pau.
Abrasados.
Famintos.
Nossos corpos se comiam.
A dança devassa, viciante, queimava tudo.
Voltei a estimular meu clitóris que babava de prazer.
— Nossa…
Contraí seu pau apertando-o com minha musculatura úmida, gemi sem
limites durante o orgasmo intenso, minhas unhas cravaram nos lençóis. Gemi
desesperada. No segundo seguinte, Ricky urrou alto e pude sentir, mesmo seu pau
encapado com a camisinha, o jorro quente do seu gozo. Ele desmoronou sobre
mim e achei que estava à beira de um infarto fulminante de tanto que meu
coração batia forte e meu pulmão expulsava ar.
— Caralho — disse ele, se jogando ao meu lado. — Júlia, que loucura...
— Muita — ri, ainda sem controlar nada, tudo em mim pulsava
descontrolado. — Nossa loucura.
Ele me puxou para um beijo.
Um longo e abundante beijo.
— Quero dar um banho em você, posso? Quero cuidar de você, posso? —
Acariciou meu rosto.
— Cuidar como? — Vire para a mesma posição. — Não sou inocente,
Ricky, nada acontece sem o meu consentimento, o que fez na boate não foi legal,
se caso eu não tivesse inventado uma desculpa, o que estaria passando pela
cabeça de Orion agora?
— Não estraga o momento, Júlia — reprovou, mas eu deliberei, aquilo
estava entalado na garganta.
— E se ele espalhar um monte de mentiras ao meu respeito na WIS?
Ele trincou o maxilar e respondeu sem emoção.
— Ele será demitido e fim da história.
— Não, Ricky, não é assim que funciona.
— Ok, fui um babaca.
— Um babaca ciumento?
Ele sacudiu a cabeça, fazendo um esforço surreal para concordar comigo:
— Certo, um babaca ciumento, sem direito algum pra isso. — Seus dedos
desceram até meu queixo. — Agora, vamos esquecer o mundo exterior e o idiota
do Orion. Vamos para o banho, meus planos com você na hidro requerem tempo.
— Bastou um instante e ele já estava em pé, puxando meu corpo para a beirada
da cama e pegando-me em seu colo rumo ao banheiro.
Logo após dois orgasmos múltiplos na hidromassagem, sentamos na sacada
da suíte, abraçados, de roupão, a vista era um espetáculo por si só, a acústica, algo
sem igual, um silêncio que se misturava com os sons que a natureza emitia. Quis
eternizar aquilo, me manter nos braços de Ricky, enquanto o mundo seguia seu
curso sem a nossa presença.
— Lindo demais — disse ao levantar-me e tê-lo de frente. — Você tem
razão, é um paraíso.
— Durante o dia é ainda mais lindo — ele falou suave, relaxado. Senti uma
felicidade que me amedrontou, tudo tão perfeito que parecia quebrar a qualquer
momento. — Você pode ficar se quiser, passamos o dia e voltamos no final da
tarde?
— Ricky, não sei, minha mãe vai enfartar se souber onde estou e com quem
estou — avisei, demonstrando preocupação. Havia enviado uma mensagem e
claro que não contei a verdade, falei que estaria com a Raica e dormiria na casa
dela. — Se ela desconfiar que estou com você, nem sei.
— Nossa, ela me odeia tanto assim? Não foi o que pareceu na última vez que
nos vimos.
— Eu sei que a velha ficou assanhada aquele dia, mas acredite, recebi um
sermão daqueles depois.
— Fica, vai? — ele pediu baixinho, fungando meu cabelo molhado com o
nariz. — Vai ser difícil te devolver para o mundo, preciso de mais algumas horas
sozinho com você. E de preferência dentro de você.
— Dentro de mim?
— Bem fundo.
24 | Ricky Walker
Dois dos empregados da casa, serviram o nosso café na praia. O dia, para
nosso regalo, estava ensolarado, lindo e quente. Há algum tempo o domingo era
um dia qualquer, não fazia questão alguma de presentear as horas com algo
especial, mas não nessa manhã. Me senti um tolo por não comandar o relógio da
vida e multiplicar aqueles instantes preciosos e únicos ao lado dela.
O papo surgia natural, assuntos diversos, sorrisos espontâneos e carinhos
nunca desperdiçados. Admirava sua simplicidade, nada forçada, tal como a
obstinação pela carreira (nesse quesito éramos bem parecidos). A Júlia ia se
tornar uma excelente profissional, não havia dúvidas.
Entendi e respeitei o receio que Júlia sentia em relação à mãe, então não
forcei muito sua permanência.
Após o café, caminhamos na beira da praia, ela escolheu um biquíni
vermelho (minúsculo, não me impus de modo algum) que contrastou com sua
pele clara, a parte de baixo entrando na bunda empinada, meu amigo, juro que dei
um troféu para o meu autocontrole, estava a ponto de lançá-la sobre a areia fina e
comê-la sob o calor escaldante do sol. Portanto, mergulhar foi um alívio, o mar
nunca esteve tão refrescante.
— Essa gruta era esconderijo meu e do Nick, quando crianças, minha mãe
ficava desesperada tentando nos encontrar.
Uma pequena gruta, um pouco afastada do mar.
Confidenciei um dos meus lugares favoritos na ilha, ali guardei lembranças
da infância e principalmente do meu irmão, dois garotos unidos, amigos, até…
— Realmente deve ter sido uma infância linda, pois o lugar promete.
— Sim, foi — afirmei e apontei para a parede de pedra. — Aqueles palitos
eram as empregadas que trouxemos para cá.
Júlia paralisou chocada.
— Meu Deus, vocês transaram bastante aqui.
Gargalhei, lembrando.
Minha mãe queria nos matar toda vez que um casal de caseiro pedia
demissão, pois Nick e eu já tínhamos aprontado com as filhas.
— Jovens e com fome, essa era a nossa definição.
— Muita fome, pelo visto — ela brincou. E depois me encarou séria,
conforme meu olhar nostálgico a convidou para reviver algumas orgias que fiz
por ali. — Nem pense, pode parar de me olhar com essa cara de esfomeado,
jamais vou entrar nessas estatísticas.
— Nunca, você é especial. — Busquei minha garota, agarrei sua cintura,
beijei sua boca, pescoço, tateei beijinhos pelo ombro. — Muito especial —
sussurrei contra a pele molhada.
— Seu irmão? Trabalha na WIS?
Parei.
— Não!
Júlia logo percebeu a troca de humor.
— Por quê?
— Ele tem seu próprio empreendimento.
— Deve ser incrível ter um irmão, amigo, companheiro como vocês dois.
— Nós… — Me calei, talvez não fosse viável entrar nesse assunto com ela.
— Nos vemos pouco por conta do trabalho, agora… melhor irmos.
Obviamente que fugir do assunto não eliminou a curiosidade da Júlia, a
relação que mantenho hoje com Nicholas não era nada amistosa, portanto, sempre
que mencionavam nós dois um nó se formava na garganta. O tempo (no meu
caso) não curou nenhuma ferida, bem como as lembranças insistentes não deram
trégua. Era revoltante concluir que uma amizade como a nossa ruiu, evaporou
como pó, sem segunda chance ou perdão. Era ainda mais revoltante admitir o
quanto sou o maior culpado por isso acontecer.
25 | Júlia Sales
Ricky
Ricky
Entornei o vinho nas taças sobre o balcão, observando a linda garota sentada
no sofá da sala. Júlia estava tímida e acanhada, se encolheu no estofado e percebi
seu desconforto, propus vinho para ver se ela relaxava um pouco.
Gostava da Júlia, não havia dúvidas quanto a isso, a garota me laçou com
algo a mais, tentei encontrar uma palavra que definisse, mas não havia. Era algo
nosso, coisa forte, ardente, incapaz de controlar.
Pensar nela era sorrir bobo, sonhar acordado, fazer babaquices românticas,
viver em constante excitação, agir sem pensar, ser outro Ricky — melhor, talvez.
— Como foi a aula? — perguntei e entreguei a taça, ela sorriu e tirou uma
mecha de cabelo dos olhos, antes de sorver com delicadeza a bebida nobre.
— Cansativa, aliás, tenho reclamações a fazer sobre a universidade, já que
tenho a honra de estar na presença do dono.
Gargalhei e me acomodei ao seu lado.
— Reclamações? — Pousei minha taça na mesa de centro e me concentrei
no que viria a seguir. — Fale, não se cale.
— Ricky, estou entupida de trabalhos, que tipo de primeiro semestre é esse?
O que vocês têm na cabeça?
— Temos um corpo docente competente, só isso.
— Ok.
— Ok? Ok o quê?
— Já reclamei, agora me sinto melhor — disse colocando a mão sobre o
peito.
— Está mais relaxada? — Quis saber, enquanto acariciava seu rosto. —
Percebi um certo desconforto no fato de estarmos na sala. Se quiser vamos para o
quarto.
Ela deu um tapa leve no meu ombro.
— Para de ser safado, Ricky.
— Eu sei que gosta… — peguei sua taça e coloquei bem rápido sobre a
mesa —, quando sou safado, falo sacanagem… — Girei com agilidade seu corpo
e puxei suas pernas me encaixando entre elas. — E faço coisas piores ainda com
seu corpo delicioso. O que acha de ficarmos pelados, estou sentindo seu rosto
quente? Está com calor?
Júlia gargalhou igual a uma criança, sacudindo o corpo enquanto ria sem
controle.
— Você é um pervertido, fique sabendo.
— Tenho certeza de que ganhei pontos com isso.
— Talvez alguns… tá, muitos. — Ela ergueu o pescoço na direção da sala de
jantar. — Me lembro de ter sido convidada para jantar, e não vejo o rastro de
comida por aqui.
— Está com fome?
— Ahaaa.
— Não vai demorar muito.
— Demorar pra quê? — Crispou os lábios, movimentando a pontinha do
nariz, igual a uma criança de cinco anos.
— Já disse que é muito curiosa. — Ela deixou os ombros caírem. — Vem,
vou te apresentar o apartamento e o meu cômodo preferido.
— O quarto?
Joguei ela sobre meus ombros e mordi a bunda que sou apaixonado.
— Aí…
— Certa resposta.
Apresentei cada espaço da cobertura que comprei há mais ou menos oito
anos, não sou amante de hotel, gosto de ter um espaço meu por onde passo e no
Brasil não seria diferente, são dois andares espaçosos, três quartos, escritório, sala
de vídeo, academia e um terraço com uma vista panorâmica maravilhosa.
— Ricky do céu, que visão magnífica, poderia passar horas aqui —
exclamou com seu tom jovial que adoro. — E horas dentro daquela jacuzzi…
— Posso considerar isso como um convite? E encher essa jacuzzi agora? —
sugeri, e não perdi tempo, puxei aquele cós do jeans pra mim, aceitando qualquer
proposta. — Eu sou praticamente tarado por você de jeans, você fica uma delícia
com essas calças apertadas.
Júlia movimentou os lábios e segurou meu olhar.
Um instante ou mais, nos entreolhamos, como se ambos perguntassem o que
viria a seguir, não em ações físicas, mas sim, sobre nós dois. Júlia não ia dar
nenhum passo ou fazer qualquer questionamento, a garota era muito mais madura
do que sua idade exigia, admirava muito isso, portanto esse era o meu papel.
— Posso tirar minha curiosidade? — perguntei, abraçando-a um pouco mais.
Ela pensou e só então assentiu. — Quantos homens já passaram por sua vida?
Formulei a pergunta o mais compreensível que consegui, receoso para não
ofendê-la ou ser invasivo.
— Como? — Ela ergueu uma sobrancelha. — Por quê?
— Como disse, é uma curiosidade.
— Não sei se devo responder.
— Por quê?
— É muito pessoal a informação, e não tenho certeza do número.
— Como? — Puta que pariu, só de imaginar outros homens tocando-a eu
sinto algo incontrolável nas mãos. — Tudo bem, confesso que fiquei nervoso.
Sou um babaca.
— Um!
— Um… namorado?
— Sim. Caio é o nome do desgraçado.
O efeito “Caio” transformou seu rosto, sou um imbecil por tocar no assunto
que mudou da água para o vinho o humor da garota. Ela se desvencilhou dos
meus braços e apoiou no porta-copos.
— Quer contar o que aconteceu?
— Caio foi o meu primeiro tudo, namoramos durante quatro anos e eu o
peguei na cama com a minha melhor amiga, simples assim.
— Uau — sibilei, digerindo. E quis abraçá-la ou até mesmo arrancar a
recordação do seu peito. Caralho, por que toquei nesse assunto? — Faz quanto
tempo que esse filho da puta magoou você?
— Tudo aconteceu e acabou há dois anos. Depois da facada nas costas meu
foco passou a ser a WIS. — Ela deixou sair um ar atenuado. — E continua sendo,
ainda mais depois que… você for embora.
Entramos na vertente, uma hora ou outra teríamos que desencadear esse
assunto. Na ilha em dois momentos a Júlia quis conduzir a atenção da conversa
para esse foco, não dei continuidade, cortei, pois, a ideia era aproveitar a
intensidade do que vivíamos. Mesmo ciente das mudanças internas, da confusão
de sentimentos que sufocavam ao mesmo tempo que me realizavam.
— Júlia, eu…
— Ricky — Maria chamou na entrada. — Está tudo pronto. Olá, Júlia.
A empregada riu com a cara de espanto que a saudou.
— Olá.
— Obrigado, Maria.
— Com licença. — Desapareceu.
— De onde saiu essa mulher?
Não pude deixar de rir da maneira hilária com que inqueriu.
— Maria é uma empregada muito discreta, Júlia.
— Praticamente um fantasma com essa roupa branca. — Ela riu. — Ela
estava aqui o tempo todo?
— Sim, ela que cuida de tudo, mora mais aqui que eu — esclareci. — Vamos
descer?
Adiei um certo assunto que, provavelmente, discutiríamos mais tarde,
conduzindo a linda mulher à sala de jantar impecável posta por Maria. Júlia
suspirou e travou na entrada. Atônita. Emocionada. Uma mistura graciosa de se
ver. Isso devido ao cenário romântico que exigi para a noite. Talvez tivesse
exagerado um pouco, admito, era novo em atos dessa estirpe, sempre improvisei
convidando a um bom restaurante, mas não com ela.
— Perfeito, assim como nos filmes — murmurou com a chama da vela
incendiando as íris de cores diferentes.
Bem, não podia esquecer de presentear Maria, ela arrasou na produção, claro
que dei várias instruções.
Durante o jantar descobri algumas coisas interessantes. Ela gostava muito de
comida japonesa, apesar de odiar os hashis. Tirou seu passaporte há dois meses
— e sonhava com um primeiro carimbo para os Estados Unidos. Adora nadar,
aliás, pude perceber na ilha o quanto o mar fez bem a ela, seu estilo de leitura é
romance com fantasia, atualmente ela acompanha o seriado Riverdale, do qual
nunca ouvi falar, ressaltou o seu medo de altura, dizendo que um dia pularia de
paraquedas…
Essa parte soou confusa.
— Preciso eliminar esse medo da minha vida.
— Pulando de paraquedas?
— Sim, talvez infarte na queda, mas aí, só pulando pra saber.
— Eu posso dizer que é muito bom, já tive a experiência com meu irmão.
— Sério?
— Bem, o Nick sempre foi mais aventureiro que eu, só que perdi uma
aposta, então fui obrigado a pagar.
Ela cravou os olhos em mim, com a expectativa brotando.
— Ok, pela sua cara, não vou saber o conteúdo da aposta?
— Nem pensar. — Não contaria jamais, nem sob tortura.
— E como fica a minha curiosidade que desperta altos picos de ansiedade,
passo até mal, às vezes.
— Não, fora de questão.
— Ricky, falaaaaaa...
— Posso cessar sua curiosidade com beijos, mas não, é muito pessoal. —
Extremante pessoal. Afastei o prato, satisfeito, não evidenciando o quanto as
recordações de quando tinha um irmão, me machucavam, me feriam, por saber
que não o tenho mais. — Vinho?
— Só mais um pouquinho, amanhã estou de pé bem cedinho.
— Eu também trabalho amanhã.
— Mas você é o chefe.
— Que fixação em me chamar de chefe, é algum fetiche, excita você?
— Ah, excita, sim, principalmente quando você chega com a pose de
executivo, trajado naqueles ternos de corte nobre e... — Ela tapou a boca,
arregalou os olhos e corou de imediato. Ri pela sua espontaneidade e também por
saber que desperto tanto fogo. — Melhor eu não beber mais.
Levantei enquanto ela escondia o rosto entre as mãos e a abracei por trás.
— Agora tenho um motivo a mais para usar terno — sussurrei em seu
ouvido.
— Criei um monstro, pode parar de se sentir. Você sabe que a mulherada fica
piscando quando você chega.
— De uns tempos para cá, não estou muito preocupado com a grande massa,
e sim com somente uma — disse e girei a cadeira, pousando na altura dos seus
olhos. Júlia, ainda corada, analisou a intenção. — Essa roubou meus
pensamentos.
— E quem é essa ladra?
— Vem cá. — Peguei sua mão e a conduzi para a sala. — Um momento.
Fui até o aparador na outra extremidade do cômodo e peguei uma caneta.
— Seu braço — pedi, ela me olhou confusa, mas esticou o membro.
Segurei a pele delicada, e escrevi nas costas do antebraço.
Ricky
Trouxe a Júlia para o quarto e aplaudi meu autocontrole, meu desejo era
fodê-la assim que a acomodei na cama. Mas contive, priorizei levá-la à loucura
com alguns orgasmos primeiro. Bati uma punheta no tempo em que a admirava
nua, que mulher gostosa, sua pele brilhava com resquícios de espuma pois não a
enxuguei completamente, olhos envolventes, mamilos vermelhos e enrijecidos
com meus chupões, barriga negativa e uma virilha depiladinha para meu regalo.
Apoiei os joelhos na beirada da cama e puxei suas pernas, escancarei-a em
seguida e quase gozei com a imagem suculenta daquela boceta rosada pingando
desejo.
Fui com calma, estava muito ansioso.
Primeiro beijei sua boca, sugando sua língua, selvagem, sedento por seus
lábios, um beijo demorado intenso, molhado, meu pau friccionava as fendas
quentes, úmidas. Júlia gemeu, se contorceu, até implorou, mas estava só
começando. Trilhei botando fogo em cada parte que lambia, mordia, chupava. Me
tornei um viciado no seu sabor de morango, no perfume natural de sua pele
sedosa, na delicadeza das curvas e, claro, na boceta mais apetitosa que comi até
hoje. Lambi seus grandes lábios molhadinhos, um sabor picante embebedou meu
paladar, então escorreguei a língua rodeando seu clitóris rijo e precioso, suguei o
diamante e o estimei, ora frenético, ora serpeando, ela arfou, arqueando o corpo,
precisei cravar as mãos na sua bunda de tanto que vibrava. Devorei sua boceta
com vontade, fodendo com a língua a entrada deliciosa.
— Meu Deus, oh… Ricky...
— Gostosa demais…
Ergui o rabo gostoso, obtendo a visão do cuzinho, raspei a língua no anel
apertadinho
— Ricky, eu… eu…
Júlia fissurou para meu acesso, soltando lamentos, pincelei o canal, incitei
lascivo. Senti no processo seus dedos correrem pelos fios dos meus cabelos,
empurrando cada vez mais meu rosto para o paraíso entre suas pernas.
— Caralhooooo…
— Goza, Júlia, goza na minha boca, amor…
Seu corpo trepidou ao mesmo tempo que seu mel escorria, lambi cada
espasmo embriagado com seu gozo.
— Ricky, eu… — Ela tentou falar, seu corpo em constante delírio,
respiração movimentando os seios, olhos semicerrados. — Quero você —
ordenou gulosa.
— Você é uma delícia — sussurrei, me afastando para pegar um
preservativo. Júlia, ainda sob o efeito do orgasmo, se remexia na cama enorme,
me cercando com cobiça. — Já tenho pontos o suficiente para meter nesse
cuzinho?
Girei seu corpo.
— Empina esse rabo, amor.
A gostosa obedeceu sem hesitar.
Lasquei um tapa na bunda macia, ela soltou um grito, abri as partes e vaguei
um dedo no estreito que levou o indicador para o buraco que eu queria foder. Júlia
tinha uma boceta apertadinha e quente (deliciosa), porém passei a desejar meter
nesse cu mais que tudo na vida.
— Oh, linda, deixa eu comer esse seu rabinho?
— Ricky, ainda não pensei bem sobre isso — a voz saiu sussurrada
conforme meu dedo atiçava a região. — Isso é bom…
— O que tenho que fazer?
— Não sei, vou pensar no caso.
Simulei teatralmente um choro.
— Pensa rápido, meu pau agradece. — Ela gargalhou e girou o corpo.
— Podemos ensaiar para quando você liberar esse cu pra mim.
— Ensaiar?
— Não se mexe — falei e massageei minha ereção que doía pra caralho de
tão rija, precisava foder a Júlia logo ou então teria um infarto. Fui até a cômoda,
me masturbando no caminho, o tesão já estava insuportável, peguei uma caixa,
mais preservativos e um lubrificante. Júlia me olhava com atenção, tirei da caixa
um plug anal de metal médio, na sua ponta uma joia vermelha de formato similar
ao de um morango. — Júlia, sabe o que é isso?
— Um plug.
— Sim, linda. Um plug anal, quero colocar em você enquanto penetro sua
bocetinha doce, o que acha, topa?
Ela analisou a joia, oscilou, cobriu o rosto com as mãos e respondeu:
— Sim — a resposta soou abafada, então entendi que ela estava
envergonhada. — Nunca fiz isso, Ricky.
— Eu sei, mas relaxa, será nossa primeira vez. — Rodiei a língua na ponta
do plug e lancei uma piscadela. — Será somente uma prévia do que posso
proporcionar a você, quando meter completo no seu rabinho.
Ela sorriu ordinária, alguns fios de cabelos molhados perdidos em seu rosto,
pele avermelhada, a visão pecaminosa de uma mulher fascinante, queimei dos pés
à cabeça. O tesão vadiou impiedoso.
Abri uma camisinha e a coloquei no plug de metal, deixei outra preparada
para meu membro, peguei o óleo lubrificante, abri e olhei para a Júlia.
— Putinha, paga de quatro gostoso pra mim.
Ela me fitou de um jeito perverso, uma diabinha sexy pra caralho e se
posicionou conforme o exigido.
— Relaxa, linda…
— Ok.
— Se quiser parar me fala, tá bom, não se force.
— Certo.
Encapei minha espada ereta e inchada com a camisinha reserva, antes de
pegar o lubrificante e colocar uma porção generosa na palma e no plug, depois
passei com delicadeza — segurando a ansiedade e o tesão — lubrificando aquele
cu apertado. Aticei a carne melecada da sua boceta com dois dedos, engolindo
seus gemidos, fui introduzindo o plug devagar, abrindo espaço com o metal na
musculatura, a garota passou a arquejar baixinho e a respirar
descompassadamente.
— Tudo bem, linda? — indaguei. — Posso continuar?
Ela soltou um longo suspiro e assentiu quando me olhou com os olhos
entrecortados.
Não demorou nada, terminei o encaixe e meu coração disparou ao ter a visão
da joia vermelha entre as polpas empinadas daquela bunda apetitosa. Movimentei
o plug e Júlia estremeceu.
— Como se sente, linda.
— Preenchida.
Rimos juntos, mas, com malícia, intimidade.
— Então agora vou te preencher duplamente, preparada? — avisei. Ela só
suspirou. — Relaxa…
Júlia empinou a bunda redonda e durinha, então deslizei na fissura cálida,
pressionada (não muito) por conta do plug, com cuidado, sem pressa, a ereção
abrigou-se na boceta encharcada.
— Porra, que delícia é estar dentro de você…
Num golpe súbito, me apropriei do seu sexo, inteiro; arremeti fundo,
comendo gostoso. Segurei seu quadril com uma mão e com a outra fodia seu cu
com plug, ao mesmo tempo que socava sem piedade sua abertura. Júlia,
desesperada, ia e vinha, engolindo meu cacete inchado com seus grandes lábios
pingando excitação.
— Ricky… — gritou e contraiu minha ereção.
Urrei igual a um animal.
— Assim vou gozar logo, gostosa.
— Ahhhhh, isso é bom demais.
Gemidos e mais gemidos ecoavam no quarto.
Meus golpes atingiam seu ventre, ela se empinava mais, finquei a joia no
cuzinho, provocando uma vibração na garota que arfou suplicante, marquei mais
um tapa no rabo saboroso. E ela gozou.
— Puta que pariu… — Lamuriou alto.
O tesão evaporando febril dos meus poros, desejo e paixão se misturando,
lascivo, voluptuoso. Meti duas vezes, antes de me pôr para fora latejando e beijar
sua boceta, sugando seu gozo. Júlia esfregou a rachada na minha cara e eu me
embebedei com seus fluidos. Quando parei, contornei seu corpo escorando na
cabeceira da cama.
— Trepa em mim amor. — Júlia logo posicionou os joelhos ao redor do meu
quadril. Abocanhei um seio, depois o outro, circulando os bicos sensíveis de tanto
que receberam minha boca. — Me engole delícia…
— Assim…? — Ela segurou diabólica a minha ereção e se afundou ali,
porra, deixei escapar um urro, que ela engoliu no segundo seguinte. — Sua boca.
— A safada castigou-me com um beijo demorado, profundo, provando seu sabor.
Na mesma proporção sua boceta se apropriando, se derramando no meu cacete.
Cravei na sua bunda esmagando as polpas contra o plug, conforme ela subia e
descia. — Ahhhhhhh…
O grito em meio a um sorriso, tirou outro de mim, embora eu mal
conseguisse raciocinar com a gostosa cavalgando no meu pau, resvalei a mão
para a joia, violando um pouco mais o ponto. Júlia, enlouquecida com a sensação,
agarrou meus cabelos, se desmanchando com golpes nas minhas bolas.
— Se toca… — Esmiucei o pedido, arfando, tomado, abrasado.
Ela perpassou os dedos por seu ventre e tocou lépida o clitóris.
— Minha nossa…
Sons sôfregos vazando na garganta.
Ela esmurrando meu pau.
Sons derrapados esfregando a carne.
— Caralho.
— Eu estou quase… — Ela não conseguiu terminar, me apertou, e eu contraí
na angústia, no anseio.
— Olha pra mim, amor. — Segurei seu rosto o quanto pude, queria ter a
imagem logo que gozasse.
E foi lindo, suas pálpebras pesaram, seus lábios se apertaram no átimo de
mais uma onda ardente que estremeceu seu corpo e a fez sorrir. Não me segurei
mais, como podia, estava inchado, saciado, jorrei com força, num orgasmo
intenso, grudei a garota contra meu corpo, deixando que as sensações
acontecessem e nos possuíssem por completo.
Acordei num corredor escuro, somente um ponto de luz bem à frente era
meu guia, não conseguia levantar, não sentia minhas pernas, toquei nelas, apalpei
a carne fria, mesmo assim o toque foi inválido. Um grito rouco e sofrido ecoou,
me abatendo, me deixando alerta. Logo após, ouvi passos na minha direção, um
pavor, um medo de não sei o que ao certo, me impulsionou a rastejar até o ponto
de luz, precisava alcançar a luz e me desvencilhar da escuridão.
Fugir.
Luz.
Estes eram meus desígnios... portanto, rastejei, as mãos esfolando no solo
grosso, áspero, porém a dor era menor que o medo dos passos cada vez mais
próximos.
Alcancei a luz e o meu corpo ultrapassou a barreira da escuridão, a imagem
que presenciei torturou o meu juízo. Ricky, com os olhos vendados, de frente para
um homem que lhe apontava uma arma engatilhada. O quadro causou-me uma
dor insuportável, que se intensificou quando ouvi um disparo e vi o Ricky cair.
— Nãooooooooooooo.
Acordei num salto, o coração disparado quase saindo pela boca, toquei
minha testa, estava úmida, meus cabelos também, busquei ao redor indícios do
que vivi agora há pouco, não havia, somente meu quarto escuro.
Não foi real.
Não foi real.
Arquejei com a respiração alterada e quase infartei quando meu celular
despertou.
Cacete!!!
Desliguei o aparelho e corri para o banho, meus sentidos misturados com a
sensação horrível do pesadelo, tão real, tão doloroso. Demorei um pouco mais no
banho naquela manhã chuvosa, o tempo estava cinza e um friozinho atingiu São
Paulo. Dona Ana havia saído bem cedo, o que achei estranho, quando li seu
recado na porta da geladeira.
Dias depois...
Os dias seguintes foram intensos, exaustos, interessantes.
Eu administrava o meu tempo entre o Ricky, mamãe, trabalho e a
universidade. Pensem que no meio de tudo isso, havia dois brutamontes vigiando
os meus passos, disfarçados, discretos, mas incomodava. Hélio não deu as caras,
parece que o demônio voltou para as trevas de onde nunca devia ter saído. Ainda
assim, esperávamos a chegada de Athos, já que o advogado do maldito conseguiu
um alvará de soltura alegando bom comportamento e afins.
Que porra é essa de afins?
Fiquei chocada com a irresponsabilidade do juiz de merda, que autorizou a
soltura do bandido com tamanha ficha criminal, essa atitude era praticamente um
crime.
Na WIS CONECT recebia sorrisos constantes das recepcionistas — que
apesar de serem simpáticas, nunca me notaram. Gerentes, coordenadores e
simples colaboradores como eu, me cumprimentavam o tempo todo, sem falar as
minhas redes sociais que bombaram de seguidores, simplesmente por causa de
um IG de fofoca que postou uma foto minha com o Ricky almoçando em um
restaurante. Na universidade virei popular, engraçado que pensei que esse tipo de
visibilidade não acontecesse nas universidades brasileiras, enfim me enganei.
Admito, não me preparei para nada disso, sinceramente não pensei que o
Ricky, apesar da sua carreira de sucesso e o fato de ele ser herdeiro de um
patrimônio bilionário, tivesse tantos holofotes na sua direção.
Já os meus amigos, Lucca, Renan e Théo quase infartaram com a novidade.
No caso do Orion, houve uma mudança brusca, o diretor assumiu outro
setor, os rumores de que eu era o principal motivo para a transferência pipocaram
no andar.
— Ricky, não acredito que tenha feito isso.
Ele jogou o punhado de papéis sobre a mesa e mirou seus olhos impacientes
na minha direção.
— A escolha foi dele, Júlia.
— Escolha? — rebati. — Estou curiosa para saber as opções que o levaram a
essa escolha.
— Infelizmente, são assuntos que não posso compartilhar contigo.
Arquejei, jogando os braços sobre a cabeça.
— Sério?
— Agora sua chefe é a Jessica Gonçalves, tão competente quanto o Orion e
ponto final — afirmou seco.
— Uma mulher?
Ele uniu as sobrancelhas e eu rolei os olhos com o cinismo.
— Algum problema quanto a isso? A WIS não tem distinção de cargos entre
homem e mulher, está claro?
Balancei a cabeça negando, mas evidenciei no olhar que segurou o dele por
alguns segundos, o quanto o seu ciúme estava me desagradando. O conjunto
Ricky Walker era intenso, eu amava conhecê-lo melhor a cada dia que ele fazia
questão de torná-los únicos, todavia, esse ciúme muitas vezes me sufocava, para
sua sorte estávamos em seu escritório e prolongar aquilo não nos levaria a lugar
algum, dessa forma, dei por encerrado a discursão e deixei claro antes de sair o
quanto estava chateada.
***
MELISSA
Mais que uma passagem de tempo! É um novo tempo que se inicia.
Te aguardo para comemorarmos juntos meu aniversário de 18 anos!
Sua presença é muito importante, Júlia.
Li cada frase e se houvesse uma pedra ocupando o lugar do meu coração, era
provável que as lágrimas não vertessem, mas não era assim. De toda a traição, a
pior parte foi perder uma irmã que acreditava ter. Melissa, em muitos momentos,
tornou-se um pilar e, mesmo eu sendo dois anos mais velha que ela, muitas vezes
a sua maturidade prevalecia. Não entendo, por mais que tente, como ela jogou no
ralo uma amizade tão linda por causa de um garoto imundo.
— Júlia, ela vai ficar quatro anos na Califórnia, a festa é uma despedida.
Ah, sim.
A princesa vai estudar na Califórnia.
— Mãe, eu não vou.
— Pense bem, é tempo de perdão, filha. Depois conversamos.
Finalizei a ligação, magoada por recordar outra vez essa história. Amassei
aquele convite idiota e o arremessei pra longe de mim, não ia me abater por esse
passado, não quando tudo estava perfeito na minha vida.
— Júlia, tudo bem? — Ricky apareceu de repente, foi então que notei meu
rosto molhado. — Por que está chorando?
Balancei cabeça, sem entender o quão fraca eu era para permitir que minhas
emoções fluíssem assim. Melissa não merecia uma parcela das minhas lágrimas,
muito menos meu tempo.
Como não respondi, ele seguiu meus olhos que ainda estavam cravados no
lixo que se tornou o convite. Obviamente, ele entendeu o porquê, só não tinha
ciência dos motivos.
— Fala comigo?
— Não posso — disse e me apressei em eliminar as gotas que escorriam
com o dorso da mão. — Não quero, desculpe.
Ele soltou o ar descontente, mas não insistiu.
— Vem cá. — Cobriu meu corpo com seu calor, o abraço e o cuidado
bastavam para as recordações sumirem.
Deitamo-nos no sofá, o tempo pausou silencioso, moroso. Carinho e afeto
tomaram cada gesto. Engraçado pensar, meses atrás, o que vivo com Ricky na
minha cabeça nunca seria possível. Ele optou por ficar, se tornou a melhor parte
do meu mundo, o safado pegou meu coração e o segurou junto ao seu. Julguei os
romances, onde as paixões aconteciam rápido, num estalo, mal sabia eu o que
estava traçado pra mim.
— Está mais tranquila? — perguntou baixinho.
— Ahaaaa…
— Júlia, tenho que ir, por uma questão de diplomacia.
Sim, eu sei.
— Tá tudo bem.
— Sou primo do Ruben, seus pais estão fora do país e, além do mais, seu tio
me ligou pessoalmente, insistiu para que eu comparecesse, dei a minha palavra.
Rolei os olhos, bem ao estilo do meu tio.
Contato de milhão ter Ricky Walker por perto.
— Já disse, Ricky, tá tudo bem.
— Prometo marcar presença, beber dois drinks com seu tio e depois te pego
para sairmos, o que acha?
Por outro lado, deixar o Ricky sozinho no ninho das cobras era, no mínimo,
arriscado, provavelmente a festa estaria infestada de amigas da Melissa, piscando
por um certo executivo sem acompanhante. Tia Paula, pelo que a conheço, faria
questão de apresentar meu namorado para todas as amigas — assim como ela,
fúteis, chatas e grudentas —, exibindo-o por todo o salão como um troféu.
Argh.
— Eu vou! — Me ouvi dizer e a posição em que estávamos passou a ser
desconfortável, portanto, levantei-me ficando de frente para ele.
— Vai? Mas…
— Vou acompanhar você.
Ricky franziu a testa.
— Tem certeza?
— Sim, não vou deixar você sozinho no ninho de cobras.
— Que mudança repentina de decisão, talvez minha namorada tenha sido
dominada por uma força maior chamada ciúmes?
— Hipoteticamente, sim — resmunguei e rolei os olhos.
O safado soltou uma gargalhada nada divertida, tirando sarro com minha
cara hipoteticamente avermelhada. Nem a pau ia deixá-lo solto nessa festa, nem
que para isso tivesse que suportar alguns minutos da presença de Melissa.
— Jesus — exclamei, apavorada, lembrando de um fator nada dispensável.
— Não me preparei para a festa, tenho poucas horas para arrumar um vestido,
fazer cabelo, maquiagem, esquece…
— Não se preocupe, resolvemos tudo isso num instante.
Uma interrogação apareceu no meu semblante, ao mesmo tempo que Ricky
tateava a tela do celular completamente seguro de si.
32 | Júlia Sales
— Júlia… Júlia…
Ah…? Quem… oi… uma voz melódica, calma, macia, soou aproxima ao
meu ouvido. Despertei de um pesadelo horrível e tudo desadormeceu assim que
consegui despregar os olhos, inclusive dores musculares, ai… cada músculo se
fez presente, dolorido, latejante. O que aconteceu comigo afinal? Fui atropelada
ou caí de um penhasco?
— Mãe! — murmurei, a visão tornando-se possível. — O que aconteceu?
Onde estou?
— Filha, você desmaiou, calma, estava com a pulsação muito baixa por
conta da notícia, sofreu um colapso nervoso e veio para o hospital — ela
explicou, movendo os dedos no meu cabelo. — Como se sente agora?
— Hospital? Notícia? Por que eu desmaiei?
— Você não lembra?
— Não. Cadê o Ricky?
A pergunta surgiu, tal qual a consciência me golpeou.
— Jesus, o Ricky, mãe, preciso sair daqui — vociferei aflita, colocando as
pernas para fora da cama. — Ai, que merda, porque tudo dói?
— Júlia, calma. — Ela tentou conter as ações. — O Nicholas está no
apartamento do Ricky, estão cuidando de tudo. Se acalma, pelo amor de Deus,
você passou muito mal.
— Eu não sou o foco, mãe. E sim o Ricky, preciso de notícias.
— Júlia, você está há oito horas desacordada.
— Tudo isso! E até agora o Ricky está desaparecido, na mão daqueles
bandidos… — blasfemei, tentando angustiosamente descer da cama, entretanto
dona Ana me conteve, o que me deixou ainda mais aborrecida. — Mãe, preciso
descer.
— A senhorita não vai a lugar algum até receber alta.
— Serve o velhote aqui?
Viramos em sincronia para a porta, tendo ali um senhor de olhos graúdos.
— Bom dia, doutor — a mulher teimosa saudou. — A mocinha aqui não é
fácil.
— É o vigor da juventude. Sou o doutor Henrique Duarte. Como vai, Júlia?
— ele quis saber já ao meu lado. — Sente-se melhor?
— Novinha em folha — menti, com uma dor de cabeça dos diabos.
— Seus exames estão normais, porém, verifiquei seu prontuário e não é a
primeira vez que esse tipo de apagão acontece, acredito ser um desgaste
emocional. Mas precisamos investigar.
— Da outra vez achei que ia morrer com a falta de ar. — Lembrei do
primeiro incidente.
— Sintomas claros de ansiedade, mas como disse, teremos que investigar as
suas causas, então vou marcar alguns acompanhamentos necessários para
descobrirmos o porquê dos surtos emocionais, ok? Por enquanto, recomendo que
evite situações desgastantes, até termos um diagnóstico preciso. Diga que vai se
comprometer com as consultas?
— Ela vai doutor, nem que seja amarrada.
Nem precisei responder.
— Obrigada, doutor, estou de alta?
— Sim, está! Se cuida, Júlia.
Minha mãe roubou os próximos minutos do doutor Henrique, enchendo-o de
perguntas sobre ansiedade, nesse meio tempo uma enfermeira me auxiliou, estava
muito agitada, tendo em vista o cenário que encontraria quando chegasse ao
apartamento de Ricky. Dona Ana me protegeu das notícias, não informou nada
que não tivesse conhecimento antes de apagar.
Antes de mergulhar num mar turbulento e inconstante.
As imagens aterrorizantes do vídeo massacravam a minha mente, segundo a
segundo e as lágrimas rolaram, logo que me encolhi no assento do carro a
caminho do apartamento. Como não desconfiei que teria algo errado na festa? O
sumiço repentino de Ricky. Não tinha como prever…, abracei meu corpo. Um
sequestro, era o improvável, ninguém estava preparado para algo assim, eu não
estou preparada para ver o Ricky ferido. Não… O pânico voltou a movimentar
meu corpo, joguei a cabeça para trás e respirei, precisava ter controle, do
contrário, o hospital seria meu lar.
— Mãe, a senhora assistiu ao vídeo? — perguntei, num fio de voz. — Viu o
que faziam com ele?
— Vi, querida — disse, enquanto dirigia. — Mas falei com a Melissa um
pouco antes de você acordar, acredite, vão resgatar o Ricky.
Assenti chorosa, acreditando fielmente na sua promessa.
Depois de intermináveis trinta e cinco minutos, entrei na sala e encarei todos
que se levantaram assim que me fiz presente, estavam ali: tio Jorge, Melissa,
Ruben e um homem que não conhecia.
— Júlia! — Melissa brandou ao meu encontro. Impactei com sua atitude, a
ruiva me abraçou tão forte, não recusei o carinho, pelo contrário, retribuí, o que a
fez sorrir quando nos encaramos. — Você está bem? Estávamos preocupados
contigo.
— Eu estou bem. Cadê o Nicholas? — perguntei por não o ver entre os
outros.
— Foi tomar banho. O coitado precisava esfriar a cabeça — disse meu tio,
acompanhado do outro homem desconhecido. — Filha, este é o Athos Garbo. Ele
é amigo pessoal de Ricky, além de investigador federal — apresentou o homem
que eu conhecia pelo nome, inclinei a cabeça para olhar a conduta firme.
— Olá, Júlia, está melhor?
— Sim, só me diga alguma coisa, temos notícia ou o paradeiro dele? Sabem
quem está por trás dessa merda?
— Calma, melhor sentar-se.
Pelo tom, concluí que as notícias não eram boas.
Avancei então pela sala, observando no caminho para o sofá o amplo espaço
que nos últimos dias me acolheu. Ruben me lançou um sorriso tristonho, mas
permaneceu do outro lado debruçado na mesa de jantar.
— Certo, abre o jogo — falei e me sentei.
— Eu assisti ao vídeo, eles são muito violentos e profissionais — Athos
contou e não contive as lágrimas, os gemidos de Ricky zumbiram no meu ouvido.
— Eu estava na Califórnia, em uma investigação particular um tanto delicada,
esse foi uns dos motivos que não desembarquei antes quando Ricky me ligou
semanas atrás. Por sorte, Nicholas entrou em contato, enquanto a senhorita era
atendida pelos paramédicos, uma amiga me emprestou o jato familiar e consegui
embarcar o mais rápido possível. Ativei alguns parceiros de confiança, em poucas
horas iniciaremos a investigação. Júlia, preciso que você mantenha o controle
emocional, pois a rotina dos últimos dias vai ser a chave para montarmos esse
quebra-cabeça, então tente lembrar de algo, ok?
— Como o quê? — quis entender perdida.
— Alguns rostos diferentes, algum acontecimento estranho.
— Certo, vou vasculhar a minha mente.
Ele continuou:
— Ligaram hoje cedo. Pediram cinco milhões de dólares.
— Meu Deus! — Quase caí pra trás. — E como eles pretendem receber tudo
isso?
— Em torno de quatro dias, querem receber em espécie e só vão liberar o
Ricky após examinarem as notas, são espertos e ambiciosos. Sabem exatamente
quem eles têm na mão, e vão nos torturar para não falharmos ou tentarmos
sabotar o plano. Aliás, seu celular foi confiscado como evidência. É melhor
providenciar outro.
Fiz um esforço sobrenatural para assimilar tudo, sem chorar
descontroladamente.
— Entendi, celular confiscado, mas e nós, ficamos aqui parados?
— Teoricamente sim, tem peritos no local do sequestro, verificando
possíveis provas. Estamos analisando as imagens das câmeras da casa e da região.
Também vamos interrogar os funcionários do buffet e todos os convidados.
— E os pais do Ricky já sabem?
— Sim, e estão a caminho. — A voz bateu no espaço, Nicholas, descendo as
escadas, logo identifiquei a roupa que usava, uma calça de moletom e camiseta,
as peças preferidas do irmão para ficar em casa. O caçula atravessou a sala
segurando meu olhar. — Você está melhor? — inquiriu, dobrando os joelhos para
que seus dedos suavizassem as gotas que não controlei.
— Estou... seus pais?
— Abalados, considere conhecê-los em no máximo umas dez horas, estão
vindo de jato com uma enfermeira monitorando o estado emocional e físico deles.
Não podia deixá-los de fora, o Athos falou o valor que pediram? Que não é o
maior problema, a prioridade é meu irmão, que dobrem o valor, pagamos, desde
que Ricky saia vivo.
Mirei os olhos de Nick não havia nada além de preocupação e amor pelo
irmão. O que me levou a crer que em momentos como este, as diferenças somem,
o sangue pulsa e o laço afetivo prevalece.
— Meu amigo vai sair vivo, é uma promessa — Athos reforçou a esperança
de todos, afastando-se para a varanda para atender o celular. Olhei um pouco ao
redor depois que Nicholas se sentou no sofá em frente, era palpável a tensão.
Massageie a face, era tudo surreal. Na véspera, aqui mesmo nessa sala,
planejávamos felizes, uma possível viagem para Itália, rindo à toa, abraçados…
agora? Ainda não consigo engolir essa realidade.
Maria, muito gentil, deixou sobre a mesa café e suco e, muito abatida, se
recolheu. Pude ler em seus olhos que chorou um bocado. Ruben se encolheu na
escada com Melissa ao seu lado, minha mãe permaneceu em oração com o terço
na mão e tio Jorge conversava alguma coisa com o Nick em relação à festa que
foi interrompida assim que o caçula comunicou o desaparecimento do irmão.
— Júlia. — Athos retornou de súbito atraindo os olhares. — Só querem falar
com você.
— Ah?
— Os filhos da puta querem que a partir de agora você intermedie as
ligações, a equipe está vindo para cá e vamos montar os equipamentos
necessários aqui.
Meu corpo trepidou com a responsabilidade, mas não recuei, daria a minha
vida para ter Ricky a salvo desses vermes.
— Ok. Eu falo.
— Não, senhora, Athos desculpe, mas a Júlia não tem condições
psicológicas para isso — decretou dona Ana. — Nem pensar.
— Eu falo.
— Júlia, pare de ser teimosa.
— Tem certeza? — perguntou Nick.
— Sim, eu vou ajudar.
34 | Júlia Sales
Hélio ergueu a minha cabeça que antes estava suspensa, seus dedos em
gomo sustentaram meu queixo. Ele ansiava por meus olhos e obteve somente um,
o outro vedado pela pálpebra inchada estava inútil. Olhou-me fleumático,
demonstrando frieza, ânsia e repulsa movimentaram meu estômago assim que o
hálito de cigarro barato vindo dele atingiu meu rosto, segurou então meu maxilar
com firmeza, meneando-o de um lado para o outro. Gargalhou como um
verdadeiro sádico, enquanto avaliava a destruição feita.
— Desculpe, não me apresentei decentemente naquele dia, minha filhinha
estava um tanto histérica. — Ele soltou meu rosto com brutalidade, o deixei cair
com o embalo da violência de sua ação, erguendo-o em seguida com certa
dificuldade. — Te garanto, meu genro, que isso ela puxou da mãe. Agora todo o
resto é do paizão aqui, diga-se de passagem, a garota é porreta nas ideias, forte,
teimosa, não é?
— Provavelmente irá odiá-lo quando souber o que fez — cuspi em pausas,
quase não sentia os lábios.
— Nunca saberá, quem vai contar, você? Acha que vai ter condições para
isso?
— Não é dinheiro que quer? Daremos.
— Nunca quero só dinheiro, meu caro. Aprecio, assim como um bom
negociador, fechar todas as lacunas do negócio, sem deixar pontas soltas,
entendeu? Meu genro.
Cuspi em sua bota a gosma de sangue escura que se formou na minha boca,
sentindo como se meus dentes fossem despregar da gengiva a qualquer momento.
Hélio olhou para a secreção enojado e sacudiu o calçado para só então continuar:
— Aliás, qual a sua real relação com a Júlia? — O desgraçado curvou os
lábios escuros, teatralmente, exigindo uma satisfação. — Sou o pai dela, preciso
saber das suas intenções, não precisa ser breve, temos tempo, hum, só não vou te
oferecer nada para beber, pelo que averiguei, você está mal do estômago.
— Eu…
— Você?
— Sou namorado dela.
— “Era”, frisa no passado, caro genro, hoje você é somente um saco de
merda, que além de me fazer rico, vai devolver minha filhinha. — Tragou o toco
da nicotina presa ao seu dedo, soltando a fumaça vagorosamente no meu rosto,
depois descartou o naco inútil no chão. Por um fio a névoa fedida não me
desnorteou.
— Você quer a Júlia?
— Sim, ao meu lado, bem longe da mãe, mas primeiro... — Ele levantou-se,
pegando em seu bolso uma cigarreira, abriu, agilizou outro cigarro na boca,
queimando sua ponta com o isqueiro, tragou ao mesmo tempo que pressionou um
dos olhos sentindo a nicotina entranhar em seu pulmão. — Dinheiro — continuou
—, é o que realmente preciso. Muito dinheiro. Soube naquele dia que você seria a
minha carta premiada.
Desgraçado.
— Como?
— Seu sobrenome, claro. Logo deduzi que se tratava de alguém importante.
Pensei, porra, minha filha é do caralho, está namorando um bilionário, juro que
tive orgulho da garota. — Apontou o cigarro na minha direção. — Foi burro
quando não providenciou seguranças para si, tenho uma equipe competente e
sempre estamos preparados. Pegar você foi mais fácil que roubar brinquedo de
criança. — O fio da sua boca encardida abriu-se para um sorriso irônico.
Uma tontura atrapalhou a pouca visão que eu tinha.
— Nunca levará a Júlia, eu te mato primeiro.
Hélio pigarreou quando tragou novamente e iniciou uma tosse sem controle,
espalmando o peito com um certo incômodo.
— Você?
— Eu! Gosta de bater em mulher, covarde. Para mim não passa de um
bandidinho de merda.
Ele enterrou cada passo, se colocando rente ao meu rosto, cuspiu e
esbofeteou. Minha cabeça só não girou com o golpe, porque meu pescoço travou.
Maldito. A gana de matar o desgraçado, atingiu cada músculo dolorido da
estrutura dopada, massacrada.
— Admiro sua coragem. Só quero ver onde ela estará quando a ponta da
minha arma mirar sua testa, vamos ver quem será o bandidinho de merda.
A porta abriu.
— Chefe, tudo certo, vamos?
Ouvi a voz do garçom e deixei a cabeça cair e voltar a ser suspensa pelo meu
pescoço, esgotado, lesionado, confundido entre outras coisas ruins que
transcorriam no meu corpo, que mais se igualava a uma carcaça imunda. De
qualquer forma, a dor e o ódio eram os meus aliados, conservavam minha mente
consciente da quantidade de drogas injetadas.
— Genro — o maldito disse ao mesmo tempo que pisou na ponta acabada do
cigarro —, terei que me ausentar, mas tenho boas notícias, essa merda está quase
no fim, para mim e para você. Magro — se dirigiu ao infeliz atrás de mim —, vê
se faz o galã aqui beber água, preciso manter meu bilhete premiado hidratado.
— Certo, chefe, vou buscar.
— Já volto, Ricky Walker! — concluiu, antes de se ausentar do cômodo, a
porta permaneceu aberta, soube pela corrente de ar que passou pelos meus pés
descalços.
Ainda não aceito como me deixei capturar, fui um tolo ingênuo em acreditar
no garçom filho da puta. Ele voltou cantarolando uma espécie de música estranha,
incompreensível ao meu cérebro estragado. Posicionou a outra cadeira, assim
como a garrafa aberta com o canudo mergulhado no círculo, ofereceu o líquido
descontente com a função, permitindo que eu o sugasse, instantaneamente a água
hidratou a cavidade seca e dolorida no interior da minha boca. Suguei um pouco
mais, fixando a visão turva no desgraçado que esmagaria se meus pulsos e pernas
não estivessem amarrados. De forma inesperada, como se lesse meu desejo, ele
puxou o canudo para em seguida chutar violentamente a cadeira, perdi os sentidos
quando colidi com força a lateral do crânio no piso encrespado de cimento.
36 | Júlia Sales
36 horas depois...
Despertei com água fria, chutes e socos. Ainda assim, o ruído de ferro que
percorria o piso cimentado era capaz de ensurdecer qualquer espécie viva e me
causou alguns transtornos. Raciocinar estava penoso, as drogas injetadas faziam
do meu corpo um fardo e até respirar era um ato doloroso, me esforcei em abrir
os olhos, negado, não conseguia mover as pálpebras inchadas. Uma ânsia, a
mesma que vivia constantemente contorcendo meu estômago deu as caras e o
vômito veio, soluçado, cuspido, quase sufocante.
— Olha aí, vomitou de novo — a voz debochada do infeliz do garçom soou
ao meu lado. — Melhor dar água pra ele, chefe.
— Depois, agora confira o parâmetro, tem algo estranho. — Essa voz
também era inconfundível. Hélio parecia nervoso, aliás todos no cômodo
inspiravam uma excitação diferente. — Brigadeiro, conferiu o percurso, tem
camelo?
— Tem, chefe! Quatro.
— Então aqueçam-se, o show vai começar.
Show? Do que esse filho da puta se refere?
— Meu genro, quero deixar aqui os meus mais sinceros agradecimentos. Por
sua causa teremos a partir de hoje vida longa. Eu não vejo a hora de reencontrar o
mar, faz tempo desde a última vez que meus pés tocaram a areia macia, quando
mergulhar vou me lembrar de você, meu caro. — Senti sua respiração rente a meu
rosto fodido, desejei mais que matá-lo, desejei esquartejá-lo com as próprias
mãos, como não havia nenhuma das opções em meu poder, cuspi na expectativa
de atingir o verme. — Não devia ter feito isso, Sr. Walker, seu bosta.
— Chefe, temos problemas.
— Não deveríamos ter, que caras são essas, seus porras?
Uma corrente de ar cruzou meu corpo jogado no piso frio, me dando a
entender que uma porta foi aberta, vários sons se misturaram com passos e vozes
gritadas.
— Magro, injeta nele um duplo.
— Chefe, tem certeza? Talvez ele não volte mais.
— Foda-se, faça agora.
Meu corpo moveu-se e as minhas pernas inválidas percorreram o solo, um
impulso violento me ergueu, o que fez com que meu corpo caísse com impacto ao
chão. Alguma coisa pressionou meu tórax e alguém esticou o meu braço.
— Me solta, porra — brami rouco, tentando, sem sucesso, impedir os
comandos dos desgraçados na carcaça que se tornou meu corpo.
— Segura direito, Magro.
— Caralho, galã, resolveu se revoltar? Fica quieto, porra, vai aplica logo,
parça.
O ardido de um líquido extremamente quente fluiu na veia infiltrada,
deixando-a pulsante e ávida. Permitiu rapidamente uma sensação anestésica,
porém, flutuante, leve e, ao mesmo tempo, atordoante. Tirou-me a dor por alguns
segundos… e...
Júlia...
Como era bom voltar a sentir sua pele.... seu cheiro...
O que tenho ao lado da Júlia é VIDA, não sabia o que era viver até
conhecê-la…
Conhecê-la… hahahah…
Um riso frouxo traçou meus lábios.
A garota linda no meu campo de visão…
Apaixonado, eu sou muito apaixonado por ela.
Não lembro de ter dito que estou apaixonado por ela. Por que não disse
quando tive oportunidade? Talvez não exista mais esse momento de declarar o
sentimento, talvez nunca mais a veja, e Júlia não vai ter conhecimento do quanto
sou louco por ela. Do quanto a amo. A sensação flutuante findou, dando espaço a
um peso, e meio que repentinamente, um fervor submergiu em brasa o meu
corpo, queimando-o, correndo-o, faltou ar… ar. Tudo queimava, tudo doía,
ahhhh… não queria respirar, não podia… Caralho de corpo inútil, minha cabeça,
uma dor débil com o pavor de sentir... Não queria sentir, me tornei um fraco, eu
sou um fraco, sim, sou um bosta fraco...
Gemidos gritados saíram unidos à respiração cuspida.
Júliaaaaaaaaa…
Eu não posso morrer.
Eu preciso proteger minha garota desse filho da puta.
Júliaaaaaaa…
Como pude ser idiota a ponto de outorgar um rapto tão imbecil? Como não
desconfiei do olhar daquele filho da puta na frente da universidade.
Preciso me livrar... me livrar de que exatamente? Não consegui conter o nó
duplo que se formou no meu estômago, dando vazão ao líquido queimante que
ocupou a minha garganta…
— Boa noite, Ricky Walker?
Virei quando ouvi a voz bater nas minhas costas.
— Sim, sou eu!
— Desculpe interromper — o garçom falou enquanto se aproximava.
— Tudo bem, só preciso fazer uma ligação, na adega não estava sendo
possível.
— Claro, senhor. Tenho um recado, sua namorada, Júlia. Estava muito
nervosa e pediu para avisá-lo que o aguarda no carro.
— Como? Sabe o que houve?
— Ao que me parece, um desentendimento com a aniversariante. A senhorita
estava chorando muito, senhor.
— Certo, obrigado. Vou encontrá-la.
Eu preciso encontrá-la, meu ar....
Cadê ela... Júliaaaaaa.
Minha voz rompeu cuspida, assim como a respiração jorrou líquida. Passos?
Muitos passos, parem de andar, parem de andar, porra. Estão me movendo de
baixo para cima, senti um toque, vários toques, toques desesperados, toques e
gotas, algumas gotas atingem meu rosto, sacudido, gotas... gotas e uma voz,
posso ouvir uma voz vazar nos meus tímpanos, a voz, impossível assimilar as
palavras e estas gotas que caem no meu rosto, agora são muitas...
— Ricky... Ricky... Ricky... reaja, irmão.
Esforcei-me para entender, raciocinar...
— Athos, o que fizeram com ele? Ele está morto?
38 | Júlia Sales
45 dias depois…
— Marcos, não vou permitir que a Júlia adoeça naquele quarto, ela não
come, só dorme a base de remédios, não… não com ela.
— Ana, as coisas não estão fáceis no salão e…
— … o movimento voltará, cedo ou tarde, o que eu não posso permitir é que
esse vínculo com o sequestro destrua a imagem da minha garotinha, você assistiu
o programa sensacionalista de ontem, as barbaridades que falaram dela, o muro
do prédio foi pichado, chamando minha filha de golpista. Tem condição? A única
forma é tirar ela do país, e darei meu rim por isso.
—Mãe!
— Filha, precisamos conversar.
Há algumas semanas, recebi em casa das mãos do advogado da família
Walker uma liminar proibindo uma aproximação, mesmo sendo inocentada de
participação no sequestro. Isso porque todas as medidas protetivas contra o Hélio,
solicitadas pela minha mãe ao longo dos anos, provou que também éramos
vítimas do bandido. Independentemente de qualquer esclarecimento, a família
Walker restringiu a minha presença e retirou meu vínculo com a empresa e a
universidade, podia entrar com um processo? Sim! Tinha os meus diretos.
Contudo quando tentei pela quarta vez explicar ou visitar o Ricky — pois a
angústia corroía, adoecia — o patriarca ao lado do filho mais novo, e dois
seguranças, na entrada do hospital, proferiu, amargo e retilíneo:
— Essa é a última vez que eu aviso, se afasta da minha família e do meu
filho, não serei tão solicito assim se voltar a vê-la novamente.
Nicholas, por sua vez, não pronunciou uma palavra, nem precisou, seus
olhos atrozes, descobertos de qualquer pudor, feriram minha alma.
— Está avisada.
O que restou depois disso; uma Júlia doente, apagada, sem vida. Demorou
dias para ver o sol e querer respirar, a dor sem igual que latejava meu peito, a
angústia martelando, moendo, esfolando. A culpa… sim, essa existia em
pequenas doses de revolta. Em melúrias mensuradas de arrependimentos de que
tudo podia ter sido diferente, se um encontro, um momento, não existisse.
Meu passado, ou a parte podre dele, arrastou sem piedade meu amor. Me
julguei, assim como Nicholas, quando descobriu de quem eu era filha, me culpei
por ter deixado Ricky entrar na minha vida e se deparar com o monstro do meu
pai, o embalo que me puxou para o martírio, por pouco não esgotou meu ar, meus
amigos e minha mãe, seguraram a minha mão.
Deitaram-me em seus pilares, e não me deixaram desistir.
Na manhã de… um dia qualquer da semana (nem sei), escutei miados de
uma conversa, que inevitavelmente, seria a reviravolta que traria a Júlia de volta à
vida.
— Sente-se aqui.
Marcos segurou a minha mão guiando meus passos frágeis até a bancada,
onde alguns papéis com um logo amarelo encheram meus olhos.
— O que é isso?
— Jú, você vai para Los Angeles em duas semanas.
— Oi? Como assim eu vou para Los Angeles? Não posso!
— Eu juntei tudo que tinha e consegui te matricular em uma ótima faculdade
de comunicação. Você vai recomeçar, filha. Não vou permitir que destruam sua
vida, estou lhe oferecendo uma oportunidade, pegue e me orgulhe.
— Mas ele, o Ricky, mãe, ele ainda está hospitalizado, eu não posso
simplesmente ir, preciso…
— … viver, você precisa viver, meu coração não bate se o seu parar, chega,
basta, é muito pra mim, vê-la sofrer e morrer aos poucos diante dos meus olhos.
— Sua mão apanhou a minha. — Ricky vai ficar bem, ele saiu do coma, acordou
há três dias.
Ele acordou.
Um fôlego alimentou o meu coração.
— Por que não me disse nada?
— Pra quê? Pra ir ao hospital e ser escorraçada de lá como uma criminosa?
— Minha cabeça pesou e algumas gotas mancharam meu pijama. — Olhe pra
mim. — Dois de seus dedos suspenderam meu rosto. — Ele não quer te ver, Júlia.
— Ana, não faça isso! — Marcos que até o momento se mantinha calado,
reprovou mamãe.
— Ela precisa saber, Marcos.
— Como? Ele acredita que eu…
— Não tenho certeza, mas não quer te ver. — Ela deslizou a papelada
próximo aos meus dedos. — Assina, filha, preciso enviar logo para iniciar o seu
processo de admissão.
Entreguei meu coração para o Ricky, ele o colocou rente ao seu, declarei o
meu amor, declarei a minha paixão, não fazia sentido ele acreditar nas bárbaras
acusações, não…, tem algo errado. Tal como, sobrecarregar novamente mamãe,
já tínhamos nos privado de uma vida confortável durante o processo da WIS,
agora ir e deixá-la com esse fardo — era indigno.
— Não posso te dar essas despesas, mãe. Estudar fora do país é caro.
— Você é minha vida, sem seu sucesso, nada faz sentido, entende? Vai… eu
sei o que estou fazendo. Recomece, cresça, voe, e se tiver que voltar um dia que
seja no salto como uma autêntica executiva.
Tomei as folhas na mão e segui rumo ao meu quarto.
Escuro.
Silêncio.
Minha rotina.
Depois, com se tivesse despertado de um coma, colhi as folhas que se
despregaram da minha mão assim que pisei no solo melancólico do cômodo.
Folheei. Visando a papelada por horas, analisei sem energia a segunda chance. A
universidade era umas das mais cotados em Los Angeles, um currículo acadêmico
excepcional, me hospedaria em um alojamento e cursaria Publicidade e
Marketing durante quatro anos, fora que experiencia de estudar no exterior
vestiria o meu currículo de forma excepcional, uma oportunidade, um novo
caminho…
Ele acordou.
Ele está bem.
Vivo.
Respirando.
Agradeci aos céus, diversas vezes.
Suspirei o ar da vida.
Como eu te amo, Ricky.
Meus olhos marejados vagaram pelas paredes de cor clara, meu cantinho
reprimido com os meus anseios, as fotos, as recordações ternas do espaço que
sorria, fatalmente, chorando a cada nascer do sol, seguiu perambulando até
estacar na mala acima do guarda-roupa.
Ele não quer me ver, e talvez esse fosse uma decisão certa.
Talvez devesse tragar a presença no hospital e clamar pelo seu perdão.
Mas…, não.
Esse ensejo seria-me negado.
Fugir, é o significado da assinatura que traçaria no contrato?
Sim…
Não.
Obediente, estava aceitando as ordens do universo.
A caneta, na mesa de cabeceira, sombreou o sim e o não.
Mesmo sabendo que restava somente uma opção.
Júlia
Ricky
Júlia
Ricky
Não poupei a irritação quando falei com minha assistente pelo telefone,
Valéria me enviou para Los Angeles de madrugada para que nenhum imprevisto
atrapalhasse o evento logo pela manhã, mas o imprevisível aconteceu e o maldito
foi remanejado para a tarde, deixando o meu dia um tanto bagunçado. Diante
desse episódio, aproveitei e almocei com um velho amigo, Benjamim Lonn, hoje
reitor da WIS de Berkeley, um momento bem agradável que renovou as minhas
energias para o que viria a seguir.
Uma bela estrutura foi elaborada e estudantes com olhos brilhantes não
permitiram que eu passasse por ali sem antes relatar um pouco da comunicação
mundial, me senti lisonjeado com a confiança, é sempre prazeroso ter
conhecimento de como o nosso trabalho atinge e inspira pessoas, já ocupei uma
daquela cadeiras, ambicionando em conquistar o mundo. Sei bem como as
palavras certas mudam a nossa direção, portanto, me coloquei diante deles para
um papo sobre Marketing:
— Hello. As a Marketing Professional...
Júlia
Ricky
Por sorte o evento foi dinâmico, então pude concluir todas as etapas
rapidamente e designar um novo itinerário para o motorista, voltaria para Nova
Iorque, pela manhã havia compromissos que necessitavam da minha estada. E se
caso a Valéria me colocasse em outra furada, estaria demitida, a sinalizei por
mensagem. E a filha da mãe riu por meio de emojis, veja só, estava sem moral até
com a minha assistente.
Relaxei no assento, o carro percorria as ruas belíssimas de Los Angeles, me
deixei fascinar pelo mar iluminado, a brisa que embalava os grandes coqueiros e
tudo de belo e exótico que a paisagem me ofertava. Inevitavelmente, meu peito
apertou com o aviso do que minha mente forçou em recordar, viajei nos próximos
segundos em detalhes inesquecíveis da linda garota. Até meu celular vibrar,
relutei em atender, contudo o Ruben nunca me importunou, se ligava era
importante.
— Alô...
— Oi, primo. Tudo bem?
— Indo, o que houve?
— Podemos falar um minuto?
Oscilei sem paciência.
— Sim, um minuto Ruben.
— Ok, serei breve, primo… agora há pouco conversei francamente com a
Melissa, e ela me fez enxergar que cometemos alguns erros, então...
Ele balbuciou, a respiração rumorejou entrecortada.
Ruben se pôs nervoso com o que ia mencionar e eu imediatamente
compartilhei do seu estado.
Ela.
— Um instante, Ruben, John estacione por gentileza. — Dei o comando para
o motorista, senti que precisava de estabilidade para prosseguir com a conversa,
voltei para o garoto. — Continue, Ruben…
— Você ainda está em Nova Iorque?
— Não, tive um compromisso urgente aqui em Los Angeles. Mas estou a
caminho do jato, pretendo retornar a Nova Iorque em vinte minutos — verifiquei
o horário no relógio de pulso, só para ter ciência do tempo e horário.
— Então, agora, está em Los Angeles?
— Estou, por quê?
Ele gargalhou, me pus confuso.
— Porque é hora de corrigimos alguns erros.
44 | Júlia Sales
Aviso: Apesar de Rivals fazer parte de uma série, é um livro único, por se tratar de casais diferentes,
cada livro pode ser lido separadamente.
Sharon Black, principal e mais famosa nas corridas da RIVALS, é popular, milionária e explosiva,
diferente das líderes de torcida que chacoalhavam pompons com suas microssaias, ela agitava um motor, se
destacando das garotas universitárias. Apesar de parecer essa fortaleza aos olhos de todos, Shar tinha uma
alma quebrada, suas apreensões familiares só alimentavam o ódio pelo seu pai, Hector Black, o principal
suspeito de um crime que aniquilou cada célula emocional de Black.
Zad Guzman era para ser um novato peculiar, dono de lindos olhos de oceano e uma beleza
avassaladora. No entanto, como nem tudo é o que parece, esse novato misterioso tornou-se parte de tudo que
Shar ambicionava destruir, senão o ponto crucial do seu ódio. Já ela, tornou-se a maior fraqueza do novato,
senão o seu maior amor.
Um romance onde vingança e ambição se misturam, colocando frente a frente dois jovens quebrados pela
perda.
Amor VS vingança.
Você consegue odiar e desejar alguém na mesma proporção?
[...]
RIVALS vai te proporcionar adrenalina e suspense, num universo universitário viciante e intenso.