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CAPITULO 11 PRINC{PIOS INFORMADORES DAS NULIDADES PROCESSUAIS PENAIS 11.1 Sentido e alcance do conceito de principio Principio é vocabulo caracterizado pela vaguidade. Tra- ta-se de uma extensa classe que pode abranger contetdos diversos. Principio significa causa primeira, inicio, comego, fonte. No direito, o seu sentido é metaférico, ou seja, cuida-se de eixo comum, ponto de convergéncia, base a partir da qual se ramificam regras. No plano do sistema, principio é norma juridica. Norma juridica é género. Regras e prineipios sio espécies. Aque- las sao mais precisas. Os ultimos sao fundamentos finalisti- Para ser principio é necessario que a sua incidéncia seja ‘ias regras. cos abrangente, compativel com va Em outras palavras, 0 pressuposto basico é 0 de que prin- cipio é categoria de norma juridica. Alias, nao deve haver nor- ma que ndo resulte de base empirica, seja ela direta (prinefpio deduzido de um enunciado constitucional ou legal, sem neces- sidade de maior formulagao interpretativa) ou indireta (princi pio decorrente da ideia depreendida de mais de um enunciado ou de fragmentos de enunciados do ordenamento juridico). ia’ A irregularidade, por ser vicio menor, pode pene incidéncia principiolégica para afastar o efeito desconstitutivo. Por outro lado, tratando-se de nulidade absoluta, nao h4 lugar para a aplicacgao de princfpios que autorizem a convali- dago de vicios, toda vez que tal proceder implicar menoscabo a direitos fundamentais. Em outros termos, princfpios conva- lidadores néo respaldam a perpetuagdo de nulidades catego- rizadas como absolutas, ressalvadas as regras de calibragao em favor do acusado, que desviam a consequéncia normativa. Para o adequado cumprimento das formas, sob bases constitucionais, indispensdvel que o sistema seja compreen- dido criticamente, colorindo as balizas classificat6rias dos vi- cios, para que a pléiade de direitos fundamentais dispostos na Constituicao de 1988 nao seja objeto de relativizagao por intermédio do baixo controle de nulidade. Os limites a direi- tos e garantias individuais de status constitucional nao devem dispensar cognicao. Rémulo Andrade Moreira escreveu sobre a afirmagao autoritaria — e fonte da abusiva relativizacao das nulidades — de que “parte dos advogados especializou-se em apontar nulidades ‘porque nao possuem condicées de enfrentamento do mérito’”. Colocando as coisas em seu devido lugar, o autor lembrou que “a formalidade inserta em uma norma proces- sual penal nao pode ser desconsiderada em nenhuma hipé- tese”. Nao se cuida de “mero formalismo”, porém “de uma exigéncia legal e constitucional de cumprimento obrigaté ssegurando-lhe a até como uma garantia para o acusado”, de direitos humanos fundamentais”. “satisfe Sob a lente estrutural, os prinefpios sao normas juridieas que incidem quando da aplicagao do preceito secundario da 390, MOREIRA, Romulo Andrade. Apontar nulidades é buscar ganho ficil, disse @ juiz. Emporio do direito, 31 mai, 2015, Disponivel em; httpsy//bitlyA8ROIkKB Acesso: Se nao for com o objetivo de maximizar 0 direito do im- putado, os prinefpios que informam as nulidades nao se apli- cam aos casos de inexisténcia jurfdica ou de nulidade abso- luta. Toda vez que o legislador tiver a pretenséo de mitigar direitos constitucionais fundamentais por meio de imposic4o principioldgica aquelas categorias de nulidade, deve o juiz se valer das técnicas de controle de constitucionalidade. 11.2 Objeto dos principios informadores da nulidade Como regra, os principios tem, na nulidade relativa, o seu objeto de aplicagdo. Essa categoria admite relacdo com a norma juridica principiolégica apta a mitigar a consequéncia juridica de invalidagao. A consequéncia juridica decorrente da classificagao do vicio como nulidade relativa, também sera do- cumentada por meio de construgao de outra norma juridica. Esse efeito juridico pode se apresentar como invalidacao, saneamento ou convalidagdo. Haveré convalidagéo quando cabjvel a incidéncia de uma terceira norma juridica, caracte- rizada como principio, de forma a evitar 0 efeito desconstitu- tivo da norma juridica consequente. 11.3 Principios constituidos a partir de base empirica direta Os prineipios documentados em enunciados do ordena- mento juridico sao os formulados sob base empirica direta. O 10 dos prinefpi e apresenta como: ado, por tipific aplicado, devera incidir e assumir configuragao de norma iy nds ay partinge de ° eninge sonstiteia cia mais elaborada. Sob outra dtica, é poss{vel dizer que, havendo base em- Pfrica para a produgdo da norma, o percurso ter4 ignig4o no prinefpio-enunciado e seré encerrado no princfpio-norma. 11.4 Principio da dignidade humana Anulidade lato sensu é categoria juridica que esté na base das garantias do direito processual penal (art. 1°, III, CF; art. 3°-E paragrafo tnico,*! CPP). O resguardo as formas tem, em primeiro lugar, compromisso com o prinefpio constitucional da dignidade humana. A aplicagao do jus puniendi é de ser pre- cedida de funcionamento regrado da estrutura estatal e deve obedecer a tessitura juridica pelo préprio Estado estabelecida. O prinefpio em tela deve ser densificado. Para tanto, a én- fase deve recair na constatacao de que “a identidade humana nao possui um sentido em si, mas ela sé existe dentro de um elo de reciprocidade, que une um sujeito ao outro”. Com essa percepgao, Eduardo Rabenhorst arremata que é 0 outro que confirma a identidade do seu semelhante.*” Sob por a rela vertente, a dignidade do ser humano deve com- 40 que se desenvolve entre os sujeitos do processo penal. Trata-se de aspecto central da intersubjetividade, que se caracteriza pela bilateralidade essencial do direito, como explicado por Machado Neto." Para equilibrar o liame entre 391, Dispositivo com eficdcia suspensa, consoante decisio monocratica (STF ~ ADL 6298/DF ~ Medida utelar ~ Rel, Min, Luiz Fux ~ 22 jai 392. RABENHORST, Eduardo, Dignidade humana e moralidade demoerdtica. ae lia; Brasilia Juridica, 2001. p47. 393, MACHADO NETO, A. L. Compéndio de introdugda a eiéucia do direito. Paulo; Saraiva, 1988, p.169. si ‘H& um cerne indevassével de igualdade e de respeito ao ser humano que no deve ser objeto de violagdo. Além desse aspecto nuclear de consideragéo que respeite o ser humano enquanto tal, a dignidade humana é cAnone de interpretagao e argumento preferencial diante da imposigao de escolhas limftrofes. Nao sem razao, André Nicolitt, embasado em ampla pes- quisa, expde a fungao do principio da dignidade humana no processo penal. O sistema de direitos fundamentais ganha, com esse postulado, unidade de sentido e concordancia prati- ca. O propésito de densificar sua normatividade é possibilitar, de um lado, obediéncia e, de outro, exigéncia.™ José Joaquim Gomes Canotilho pontifica que se deve buscar “o principio material subjacente a ideia de dignida- de da pessoa humana” (dignitas-hominis), consoante o pro- jeto espiritual do individuo. Objetiva-se proteger 0 homem contra a sua aniquilacéo, em sentido amplo, reconhecendo © homo noumenon, compreendido o “individuo como limite e fundamento”. O jurista portugués descreve sugestao de den- sificagdo normativa da Constituigao, conforme o contexto ju- ridico-cultural que interpreta, com énfase em sua integragao pragmatica, por meio da “teoria de cinco-componentes (Pod- lech)”, com estrutura que articula o seguinte contetido: (1) sufragaedo da integridade fisica e espiritual do ser humano, enquanto “dimensao irrenunciavel da sua individualidade autonomamente responsavel”; (2) protecao da identidade e da integridade da pessoa pelo “livre desenvolvimento da personalidade”,(3) “li- bertagao da angistia da existéncia da pessoa” pelos meios de “socialidade, dentre os quais se incluem a GRFGFar Gs viscera provtdencial ¢ ante contemplagéo da “garantia e defesa da autonomia individual” por intermédio da “vinculacdo dos pode- res ptblicos a contetidos, formas e procedimentos do estado de direito”; e (5) o realce da “dimensao da igualdade-justi¢ga dos cida- daos, expressa na mesma dignidade social e na igual- dade de tratamento normativo”, vale dizer, “igualda- de perante a lei e através da lei”. 11.5 Principio do estado de inocéncia A Constituigao e as leis podem conter déiticos que evi- denciam o seu alicerce. Por exemplo, a nivel constitucional, 0 principio da presun¢ao de inocéncia ou de nao culpabilidade esta tipificado, de forma explicita. Em compasso com o que dispée 0 inciso LVII, do seu art. 5°, “ninguém ser considerado culpado até o transito em jul- gado de sentenga penal condenatoria”. Trata-se de postulade auténtico, sobreprincipio que nao se restringe 4 natureza de regra de tratamento, mas que possui contorno de vetor inter- pretativo de todo o processo penal. 11.6 Principio do devido processo legal © devido proceso legal ¢ diretriz. essencial(art. 5°, LIV, é © quadro onde a forma se convola em matéria. Funda- CF). mentos do processo civil nado podem ser incorporados ao pro- ‘sso penal, especialmente quando o propdsito for a evitagao do controle de vicios. 395, CANOTILHO, J. J, Goms Coimbra: Almedina, 1998, Waperatic da RSBISE'K dibcriclofiariedade, oladors do dato prGAsad 1G gal (due process of law) em sentido material. A objegéo a essa categoria decorre do fendmeno, indesejavel, apontado por Ri- cardo Jacobsen Gloeckner: “o sistema de nulidade brasileiro se caracteriza pela relativizacao de limites ao poder estatal”.” De fato, ojus puniendi nao pode ser exacerbado por dispo- sig6es relativizadoras, eis que tal significa ampliar demasiada- mente os contornos fixados para 0 exercicio da competéncia de um 6rgao jurisdicional, resvalando em inconstitucionalidade. Paulo Silas Taporosky Filho e Edson Luiz Facchi Junior afirmam que “forma é contencao do exacerbo. E a definicao de um limite de poder. E 0 procedimento previamente previsto, a fim de evitar surpresa aos jogadores. Forma é garantia”. Para 0s autores, "todo e qualquer ato que viole e desrespeite as regras do jogo gera prejuizo e deve ser declarado nulo, sendo desne- cessdria a sua efetiva demonstraco”, arrematando que seria imprestavel 0 conceito de nulidade relativa, em face de ser “con- ceito do proceso civil”2" Em linha similar, Alberto Binder observa que a formula expressa uma técnica normativa especifica. Isto 6, para ga- rantir 0 cumprimento de princfpios constitucionais proces- 40 estabelecidos requisitos para os atos processuais ou para sua sequéncia. Essas condicées legais sao formas proces- suais. Em outros termos, “quando nao se cumpre uma forma (com o descumprimento de um requisito legal ou com 0 rom- suai’ pimento de uma sequéncia necessaria) a atividade processual se torna invalida ou defeituosa”. A objecao do autor se poe 396, GLOECKNER, Ricardo Jacobsen, Una nuova teoria della nullita: costruzione di prineipi alla luce della strumentaliti costituzionale della inorile (rivista giuridica trimestrale}, Sd0 2015 (tradugio livre), di un nuovo sisten procedura penale, Diritto ¢ Giustizia Paulo, 397. TAPOROSKY, Paulo dson Luiz, FACCHI JUNIOR, Superando. dade relativa no provesso penal, Empério do direito, 12 jul. 2015. Disponivel tps:/bitly/ahCekvV Acesso em: 02 jan. 2021. asa n 3, n.1, p.66, gennaio-marze tobre Talldadee tela ooh p PETG cshevtro de veritcoric da grat data RABI d6N peinetptos constitucionais, que néo devem estar apenas reconhecidos, mas também garantidos.™ Paulo Silas Taporosky Filho e Edson Luiz Facchi Junior criticam o uso da nulidade relativa, justificando ainda que ela causa consequéncias graves, “levando a condenagées injus- tas, com argumentos pffios e utilitaristas”. Acrescentam que “a protegao do réu é publica, pois publicos s4o os direitos fundamentais que o tutelam”. Nessa perspectiva, a afronta a direitos do imputado, por interferir em interesse publico, con- duziria, sempre, a nulidade absoluta”.*” A simplificagao, todavia, pode tornar ainda mais dificil balizar os critérios para a aplicacdo de efeitos juridicos aos miltiplos vicios passiveis de ocorrer em um devido e justo processo penal. A construcao de categorias com lastro em fundamentos légicos e semanticos pode se adequar melhor & imposicao de limites e a conteng do da contingéncia. Se a dogmatica nao é perfeita, pior podera ser nao ter esse instrumento a disposigao. O problema maior parece se si- tuar nao na classificacao unitaria das nulidades, mas no érgao que desvirtua sua aplicacao. Essa contatagao decorre, inclusi- ve, dos que propdem aboli-la. Alberto Binder, inclusive, verbera que “o nivel de ade- quacao de um sistema processual aos prineipios do Estado de Direito nao se mede somente pela incorporagao desses postu- lados & ordem normativa, senao pelo grau em que sao garan- tidos”. O jurista argentino explica que, salvo os prineipios que sao cumpridos de um modo cabal (o que nao é corrente nem comum), “o nivel e a forga dessa garantia se descobre através 198. BINDER, Alberto M. El incumplimiento de las formas procesales: elementos 's nulidades en el proceso penal, Buenos para uma eritica a la teoria unitaria Aires; Ad-Hoc, 2000. p.56 \traducao livre). 399, TAPOROSKY, Paulo Silas; Edson Luiz, FACCHI JUNIOR. Superando a nulic dade relativa no proceso penal, Empério do direito, 12 jul. 2015, Disponivel em: ht- tps://bitdy/3hCekvV Acesso em: 02 jan, 2021, 300, Sem embargo, um ponto é convergente entre a doutrina que sustenta aquela superagao da classe nulidade relativa e € que propée uma classificagéo unitéria e compatfvel com o devido processo legal: 0 objetivo de nao transigir com a efeti- vidade dos direitos fundamentais. Cabe enfatizar, o mau uso da classe de defeitos proces- suais penais, rotulada de nulidade | relativa, nao deve significar a imprestabilidade das distingdes. A simplificagao incorre no excesso de reduzir todos os vicios possiveis a aplicagao direta ou indireta do texto constitucional quando, na realidade, mui- tos enunciados podem ensejar construgao de normas que re- gram atos com elementos nao afetos a direitos fundamentais, mas que sejam direitos processuais dos : sujeitos envolvidos. Nem porisso poder significar que | tais tos fiquem i imunes a controle, pois as formas sao tesultado de contornos ao atuar estatal, sejam eles constitucionais ou infraconstitucionais, de- vendo cumprir a finalidade de previsibilidade do sistema. —_ Daf o pressuposto firmado de que os principios tendentes & convalidagao de vicios sé devem ter lugar para os casos de prejui- zos nao pre: midos, isto é, para hipéteses de nulidades relativas, ao deve se dar de maneira normativamente rigo- rosa. Trata-se de elemento imanente ao devido processo legal. 11.7 Principio da instrumentalidade das formas A instrumentalidade, no processo penal, é do direito penal. A forma (0 processo penal) é substancia (art. 5°, LIV, CF). A questao é de ponto de vista, eis que os fins nao podem 400, BINDER, Alberto M. El incwnplimiento de las formas procesales: elementos para uma critica « la teoria unitaria de las nulidades en el processo penal, Buenos Aires: Ad-Hoc, 2000. p.37 (tradugao livre). RMT Grn sevalants Ge § 566; 572, tL cory quanto na jurisprudéncia, tem sido reiterada a ideia de ins- trumentalidade do processo, sob a influéncia do processo ci- vil. Essa interpretagdo inverte a hierarquia do ordenamento jurfdico que tem, no 4pice, a Constituigdo. A instrumentalidade do processo, na ligao de Candido Rangel Dinamarco, deve estar comprometida com o cumpri- mento da Constituigdéo, podendo ser dividida em: (1) instrumentalidade em sentido negativo: ha um re- ptdio ao exame da instrumentalidade exclusivamen- te pelo seu Angulo interno, a fim de que nao se torne somente um meio de culto intitil a forma; (2) instrumentalidade em sentido positivo: autori- za “abertura do sistema para a infiltragao dos va- lores tutelados na ordem _ polttice: -constitucional e jurfdico-material”.” Em poucas palavras, o filtro te ‘regras processuais pe- nais deve ser realizado a partir daquele nucleo garantidor dis- posto na Constituicao. As formas podem ser mitigadas para tornar mais eficaz o direito fundamental processual penal, nascido dos direitos de primeira geracao, positivados no art. 5° da Constituigdo de 1988. O principio da instrumentalidade das formas decorre de mais de uma base empirica direta enunciativa: (1) a primeira é a do art. 566 do CPR, que disciplina que “nao sera declarada a nulidade de ato processual 401, ROSA, Alexandre Morais da; ‘CAR; Rosmai nal, 4 instrumentalidade é do direito material. Conjur, it-ly/2Mr77DE Acesso em: 02 jan, 2021 402. DINAMARCO, Paulo: Malheiros, 302 Rodrigues. No proceso pe- 3 ago. 2019, Disponivel em: http: ndido Rangel, A instrumentalidade do proceso. 4, ed. ma 4. p3ll. (2) asegunda é assentada no art. 572, inciso IT, do CPP. que reza, sufragando o princfpio da finalidade ao estampar que sero convalidadas as nulidades ali apontadas que, praticadas de outra forma, nao impecam o alcance do objetivo colimado pelo ato processual defeituoso. Ricardo Gloeckner pontua, a propésito, que o princfpio da instrumentalidade das formas é “consolidado na Itélia, in- clusive sob forma de sanatéria geral”. Ao seu lado, o desenvol- vimento de conceitos como “mera irregularidade e ‘nulidade relativa’ contribuem sensivelmente para um sistema cada vez mais capaz de contribuir para um regime de nulidade absolu- ta mais limitado”.* ip Com efeito, a preocupagéo do autor é coincidente com a que ora se expée.* A divergéncia, no ponto, é quanto a inconve- niéncia de se abandonar a disting&o de classes, haja vista a sua utilidade para o controle do itrio quando da aplicagéo das consequéncias juridicas. Tratar écie de vicio, desde a mais infima (a exemplo da falta de adverténcia A testemunha so- bre o dever de falar a verdade) até a mais grave (tal como a con- denacao penal imotivada) é descurar de que, na realidade, nem todo ato processual viciado necessariamente repercute em direi- to da parte ou afeta obrigatoriamente enunciado constitucional. Tirante esse distanciamento, exata é assertiva de Ri- cardo Gloeckner de que “um sistema de nulidade destina- do a preservar os direitos fundamentais nao admite banali- zacio, nem pode ser considerado (como para boa parte da 403. GLOE di un nuovo sister KNER, Ricardo Jacobsen, Una nuova teoria della nullita: costruzione -ostituzionale della 1 trimestrale], S80. « di principi alla luce della strumental Diritto ¢ Giustizia Minorile [rivista giurid’ p66, gennaio-marzo 2015. procedura pe Paulo, anno 3, n, Rodrigues. Teoria da nulidade no processo penal. Sao Pau De tal modo, a instrumentalidade afirmada doutrinaria- mente deve receber interpretagdéo conforme a Constituig4o, devendo ser reconhecida inconstitucional toda norma que autorizar o menosprezo da forma concretizadora dos direitos fundamentais em prejufzo do jus libertatis do imputado. 11.8 Princfpio do prejuizo (pas de nullité sans grief) Dos prinefpios que decorrem de base empfrica enunciati- va direta no nivel infraconstitucional, o que inaugura as dispo- sigdes sobre o tema, é 0 de que nao hd nulidade sem prejuizo, vazado no art. 563, do CPR Sem distinguir a espécie de vicio, declara que “nenhum ato sera declarado nulo, se da nulidade nao resultar prejuizo para a acusacéo ou para a defesa”. No ponto, calha ponderar que o principio epigrafado tende a deferir subjetivismo judicial. Finda por conferir ao juiz po- der, um tanto aberto, para dizer os casos de nulidade, bem como para deliberar pela (no) invalidacdo. Permeia essa possibilida- de a nogao de demonstracao de prejuizo ao direito da parte. O sistema processual brasileiro adota técnica nao unifor- me, incrementando 0 risco de antinomia: (2) primeiramente, o CPP prevé o prineipio pas de nulli- té sans grief (art. 563); (2) em seguida, arrola casos de nulidades no seu art. 564, com 0 indicativo de pretensa taxatividade; (3) todavia, essa taxatividade 6 flexibilizada quando o seu inciso IV declara ocorrer nulidade também dian- 0 de elemento te de atipicidade concernente a omi Ricardo Jacobsen. Una nuoya teoria della nullita: costruzione di un nuovo sistema di principi alla luce della stramentalita costituzionale della procedura penale. Diritto e Giustizia Minorile a giuridica trimestrale], S80. Paulo, anno 3, n.1, p.66, gennaio-marzo 2015, 304. ~ essencial de ato processual, Tal cléusula de sber- _ tura finda por tornar o rol do apontado art, 564, exemplificativo; (4) oCPRaocabo, permite a ampliagao da discricionarie- dade judicial, perfilando configuragao inquisitéria. A relagdo entre a espécie de sistema processual e o regi- me juridico das nulidades é bem préxima. Um sistema acusa- tério deve prevé controle dos vicios processuais, enquanto um sistema inquisitério se inclina por ser refratério a ele. Adonella Presutti explica o cenério italiano sob a vigéncia do vetusto Cédigo de Processo Penal de 1930 (Codigo Rocco), que serviu de inspiragéo para o CPP brasileiro de 1941 (con- soante explicitamente declara sua Exposicao de Motivos). Se- gundo adverte, o rol fechado de casos de nulidades circunscre- veria a possibilidade de reconhecimento pelo juiz, com 0 escopo de coibir o retardamento da marcha processual. No entanto, a possibilidade de abertura para a verificagao de outros casos de nulidade tem o poder de ensejar 0 extremo oposto, tornando quase que absoluto o poder do 6rgao judicial. Permite-se, as- sim, a discricionariedade no uso completo dos “atos que atingi- ram seu objetivo, sem prejuizo dos direitos das partes” 11.9 Principio do interesse O principio do interesse para a averbagao da nulidade tam- bém deve s strito ao; sos de nulidades relativas, delimi- tando a incidéncia da norma depreendida do enunciado do art. 565 do CPP Decerto, para os casos de nulidade absoluta, deve ser entendido como irrelevante o comportamento da parte. O fato de a defesa do acusado ter concorrido, de qualquer modo, para 0 vicio do ato processual penal, nao alija a respon- sabilidade dos 6rgaos da persecugao penal de yelar para que 406. PRESUTTI, Adonella, La declaratdria delle nullita nel regime delle impugnazio- iui penali. Milano: Giufre, 1982, p.12 (tradugdo livre), do i ndeles duro principiolégico constitu- acusatério, Ali4s, a Lei n° 13.964/2019 men- MEUEAIESELItbKto’ a cai vulura eellialdela que’ deve tao processo penal (art. 3°-A,“” CPP). 11.10 Principio da oportunidade O prinefpio da oportunidade ou da preclusao temporal tem alcance delimitado pelo art. 572, inciso I, do CPB que se reporta as nulidades descritas em seu caput (art. 564, III, “a”, “e”, segunda parte, “g”, “h”, CPP). De acordo com o seu teor, serao convalidadas as nulidades que nao forem arguidas, em tempo oportuno, nas hipéteses indicadas em lei. Como se vé, quis o legislador que a ideia de momento oportuno fosse arri- mada nos estritos lindes do direito positivo. Para colmatar a questao, o CPP estatui os termos finais para que as nulidades sejam alegadas em seu art. 571. A re- dagao nao demarca da melhor forma 0 objeto a que se dirige, pois a nulidade podera sempre ser arguida, diante da impos- sibilidade de conten? da liberdade-fato da parte. O que o ordenamento juridico | pode é é delimitar as consequéncias juri- dicas aplicdveis em face da objecdo de nulidade formulada a destempo (liberdade juridica). Outro problema é que os momentos referidos pelo supra- dito art. 571 estao, em sua maior parte, desprovidos de efica- ciz edo superveniente da legislagdo a qual fazem remi incisos I, II, III, V e VI. Sera necessario ao intérprete fazer uma injuncao a partir desses enunciados, de forma analégica (art. 3°, CPP), para depreender quando ira incidir a preclusao temporal. em razao da altera Aanalogia, no entanto, nao podera eriar regra em prejuizo do direito do imputado, haja vista que para tanto é¢ necessario 407, Dispositivo com pensa, consoante decisie monoeratica (STF ~ ADI 298/DE - A elar- Rel, Min, Luiz Fux = 22 jan. 2020), 306 Har de iocedo som'd Const tileka, Dd atl 971. es n com integridade, no plano da expressio PC CHIPSIIGG Us dicetio posto, o0 tatoos V, VI @ VEIL De todo modo, 0 filtro constitucional deve ter lugar para evi- tar que nulidade absoluta ou inexisténcia juridica se submeta Aqueles marcos fatais. 11.11 Principio da anuéncia O princfpio da anuéncia est expresso no inciso III, do art. 572, do CPP Ser4o convalidadas as nulidades referidas no seu caput (art. 564, III, “a”, “e”, segunda parte, “g”, “h”, CPP), quando a parte afetada tiver aceito os efeitos do ato proces- sual produzido em desacordo com 0 padrao legal. Essa norma juridica nao deve incidir quando implicar transagao sobre di- reitos indispontveis (art. 5°, CF). 11.12 Principio da convalidacao O art. 568, do CPP estatui o principio da convalidagao quando dita que “a nulidade por ilegitimidade do represen- tante da parte podera ser a todo tempo sanada, mediante ra- tificagao dos atos processuais”. O texto estabelece uma facul- dade da sanatéria, realgando a necessidade de descrigao do consequente normativo que deve se seguir ao vicio processual e ao suprimento de fato: a inicialmente, deve existir ilegitimidade do represen- tante da parte, a exemplo dos atos realizados por ad- vogado sem mandato; diante dessa constatacéo, mais um elemento de fato deve ser somado ao primeiro, com a ratifieagao dos atos anteriores pelo legitimo representante da parte (advogado com procuragao); e 8 logo depois, deve o juiz, deserevendo a situagao fat ca, declarar a convalidagao dos atos anterior Nprinctplos’ SuidaAa UeGhas seer aalslgn my Pilea sm, do CPP (precluséo temporal, finalidade e anuéncia). Para as nulidades que néo comportarem a con- validagéo, o CPP preconiza 0 refazimento do ato processual penal (saneamento), seja total (renova¢4o), seja parcial (reti- ficag&o), a teor do seu art. 573, caput. A expressfo saneamento é uma daquelas que suscitam diividas quanto ao seu significado e efeitos. Examinando o Titulo I, do Livro III, do CPB pode-se concluir que o legisla- dor néo foi uniforme quanto ao teor e a func&o que pretendeu atribuir ao verbo sanar. A dificuldade persiste diante de nao ter sido usado o vocdébulo convalidar para diferenciar situa- ¢des concretas. Também a ambiguidade do préprio termo nu- lidade é um fator de impreciséo. Por exemplo, pode-se dizer que a palavra sanada, do art. 570, primeira parte, do CPB foi empregado de forma imprépria (no lugar de substituida), quando assevera que “a falta ou a nulidade da citagao, da intimagao ou notificagao estara sanada, desde que o interessado comparega, antes de o ato consumar- -se, embora declare que o faz para o unico fim de argui-la”. De outro prisma, os termos convalidacao ¢ saneamento sio muitas vezes usados como sindnimos. Nao obstante, en- tende-se ser Util distingui-los, para precisar as consequéncias dos vicios. juridi Na doutrina, Gustavo Badaré faz uso dos vocabulos con- validacao e sanatoria (particfpio: sanada) com 0 mesmo signi- ficado. No entanto, o processualista exemplifica, como caso de sanatéria, a ratificacao prevista no art. 568 do CPR! Note-se, no entanto, que a ratifieagao de atos praticados por representante ilegitimo da parte é, a rigor, nove ato pro- cessual, com efeito retro-operante relativamente a atos pro- », nessa toada, € cessuais anteriores com atipia. A convalid 408. BADARO, Gustavo Henrique, Processo penal. 3. ed, Sto Paulo: RT, 2015, p.805. 308 11.13 Principio da verdade substancial A interpretagdéo da instrumentalidade das formas no deve resvalar naquele sentido negativo descrito por Candido Rangel Dinamarco,” ou seja, nao deve ter o objetivo de au- torizar o alcance da verdade substancial a todo custo, eis que nao é de valia para o Estado punir de qualquer maneira.*” Antes, é indispensavel o respeito as regras do jogo. Nao é sem raz4o que se admite o julgamento antecipado da lide penal favor rei, mesmo antes dos momentos préprios de absolvigado sumaria (art. 397, CPP). O mesmo nao é correto para 0 caso de condenagao, sendo imprescindivel o perpassar pelas fases e formas gizadas nas leis de processo. Dafa necessidade de que 0 art. 566, do CPR receba interpre- tacao conforme a Constituigdo. O seu teor, expressando que “nao sera declarada a nulidade de ato processual que nao houver in- fluido na apuracdo da verdade substancial ou na decisao da cau- sa”, somente poderd incidir se nao refutar os direitos e garantias individuais fundamentais, a exemplo do devido processo legal. 11.14 Principio do confinamento ou da conservagao dos atos processuais direta é odo pio da conser vagio dos alos processuais penais. Nos termos do art. 567, do Outro principio decorrente de base empiri confinamento da nulidade processual ou print 409. DINAMARCO, Candido Rangel. A instrumentalidade do processo, 4, ed. Sa0 alheiros, 1994. p.3ll Paulo 410. JARDIM, Alranio Sil antismo no progesso penal: breve e parcial refle= xio. Revista EletrOnica de Direito Processual ~ REDP, Rio de janeiro (VERY), n.l4, p.10, jul-dez, 2014. Aexemplo da maioria dos princfpios, ele deve ter seu 4m- bito de incidéncia jungido as nulidades relativas e as irregulari- dades. Nao deve ser admitida sua aplicagéo contra direito fun- damental constitucional do acusado. Para tal restrico, exige-se lei enquanto fonte de cognigao do direito processual penal. Alias, os defeitos decorrentes de ferimento de regra de competéncia, seja ela absoluta ou relativa, sao objeto de criti- ca doutrindria que defende o nao aproveitamento de qualquer ato processual produzido. Afinal, “ninguém ser4 processado nem sentenciado sendo pela autoridade competente” (art. 5°, LUI, CF). O legislador constituinte nao discerniu a tipologia da in- competéncia. Também o CPP naoconsigna distingaéo, man- dando aplicar indistintamente 0 prinefpio do confinamento dos atos processuais. Diante da colidéncia da Constituigao com o enunciado do art. 567, do CPR deve-se concluir pela sua nao recepgao pela Lei Maior. — 11.15 Prinefpio da causalidade, extensivo, da conse- quencialidade ou da concatena¢ao O CPP traz expresso o principio em tela no seu art. 573, § 1°. Dispoe que “a nulidade de um ato, uma vez declarada, causard a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam fal principio também é denominado de prin- consequéncia”, T cipio do efeito expansivo. E considerado, por parte da doutrina, como caracteristi- ca da nulidade. Assim se vé na doutrina processual chilena, conforme destaque de Julio E. Salas Vivaldi, que assevera ser “caracteristica da nulidade a natureza extensiya de seus efei- tos. A inefiedcia do ato declarado nulo nao somente o afeta”, 11.16 Princfpio da restrigfo processual a decretacéo da ineficdcia No § 2°, do art. 573, o CPP estampa que “o juiz que pro- nunciar a nulidade declararé os atos a que ela se estende”, sedimentando o prinefpio em epfgrafe. Veja-se que a restri¢éo processual & decretacdo da ineficdcia (modulagao de efeitos) € de abrangéncia geral. Aplica-se, sem limitagdes, 4 nulida- de latu sensu. Isso porque sua incidéncia, geralmente, , no implica decote de direito fundamental individual inserto no ntcleo constitucional de peeey penal. 11.17 Principios constitu a partir de base empirica indireta a Os prinefpios podem | ser inferidos de combinacées de enunciados do ordenamento juridico. Além dos principios depreendidos diretamente, outros decorrem de interpretagdo do conjunto, indiretamente. Por exemplo, o prinefpio acusatério, no texto constitucio- nal, é depreendido pela constatacao de regras que sio comuns A estrutura acusatoria. No CPR 0 principio foi expressamente ou art. 3°-A, incluido pela Lei n° 13.964/2019, trutura acusatoria, Sob esse enfoque passou a ca direta, mas com eficacia suspensa.!® estampado no ao estatuir a ter base empii Em out s palavras, constituem base emp! indireta as nogoes e os fragmentos tomados de varios textos estatais, sejam_ estes aproveitados por inteiro ou parcialmente, porém sempre 411, VIVALDI, Julio E. Salas, Los incidentes y en especial el de nulidad procesal, 2. ed, Santiago: EJC, 1981. p.100 (tradugao livre). 412, Consoante decisiiy monocratica (STF ~ ADI 6298/DF = Medida Cautelar Min. Luiz Fux » 22 jan, 2020) tro constitucional e ser coerente com o texto 11.18 Princfpio do dever de mitigar o prejuizo (the duty to mitigate the loss) Um exemplo de prinefpio que nao decorre de texto legal pro- cessual penal é 0 the duty to mitigate the loss. No entanto, é incor- reto aplicar, as nulidades absolutas, princfpios contratuais para se afastar o dever de invalidar processo penal que violou direitos constitucionais, como os da ampla defesa e do contraditério. Incorrendo nesse proceder, sao encontrados julgados do Superior Tribunal de Justiga que declararam a incidéncia da boa-fé objetiva (principio da lealdade) e do seu subprincipio do dever de minorar o prejuizo no direito processual penal. Nao ha, contudo, fragmentos de dispositivos que sejam fontes processuais penais para permitir essa ilacdo. Deveras, em uma das ementas, consignou o STJ que “o principio da boa-fé objetiva ecoa por todo o ordenamento juri- dico, nao se esgotando no campo do Direito Privado, no qual, originariamente, deita raizes”. Dessa configuragao, haveria des- taque para “o duty to mitigate the loss”, porque a insurgéncia da parte, teria ocorrido “somente apés a realizagao de diversos atos processuais, como o interrogatorio, alegagoes finais e sentenga”. Dai ter entendido pela “consolidagao da situagao, sedimentan- do a tacita aceitacdo da auséncia de oitiva da testemunha. Nao devi sual que cré irrita, sob pena de investir tempo e recursos de modo infrutifero”. a a parte insistir em marcha proc No direito italiano, alids, antiga ligao de Antonino Gala- ti adverte que a nocao de relevancia do comportamento da »rafastada a possibilidade de reconheci- mento de nulidade, ¢ restrita aos casos de nulidade relativa. Segundo o processualista, 6 verdade que “também em termos: partes’ Veni face da existtrcla de dlaposltivo eepecttcd - tessa directo. No entanto, no siléncio da lei, “n&o se diz que a relevancia deva ser atribufda ao comportamento da pessoa que causa uma nulidade absoluta”.*” A aludida excecdo de nulidade absoluta “san4vel”, citada por Antonino Galati, seria algo semelhante ao conceito de regra de calibragao, cuja fungao é a de afastar 0 normal efeito jurfdi- co de invalidacao, para conferir justeza ao sistema (regulagem). 11.19 Princfpio da eficacia do ato viciado Oprinefpio em tela decorre de fragmentos de varios enun- ciados, bem como do viés pragmatico do processo. Com efeito, a regra é a de que os atos processuais, mesmo os gravemente viciados, sejam aptos a produgao de efeitos até que advenha atividade normativa especifica que os subtraia (principio do controle expresso da ilicitude). Trata-se de norma que incide em todos os casos de atipia, da inexisténcia a irregularidade. Ao lado desse principio, os diversos artigos que regu- lamentam técnicas preclusivas (art. 571, CPP), bem como a convalidacao, a substituicao e a conservac¢ao de atos proces- suais penais defeituosos militam na faixa da necessidade de um dizer expresso do juiz acerea da atipicidade para que, a partir daf, sejam impostas as consequéncias juridicas, para, por exemplo, tornar sem efeito um ato processual atipico. 11.20 Principio da economia processual Outros prinefpios de formatacao indireta podem ser construidos, mas sempre com o cuidado de evitar afastar a finalidade de garantia das formas. E 0 caso do principio da’ 413, GALATI, Antonino, It eomportamento delle parti nel regime delle mullita proces: suali penali. Milano; Giufre, 1970. p.166-1 oe processual que pode ser fruto da injungéo de varios do CPP (art. 394-A) e da legislagio extravagante (art. 71, Lei n° 10.741/2003), em conjunto com o principio da celeridade disposto expressamente na Constituigéo de 1988, mediante tipificagdo direta do princfpio da duracao razo4vel do processo. Sao garantias fundamentais da pessoa imputada (art 5°, LX XVII, CF). Adonella Presutti destaca a dificuldade de adotar um critério de plena atuacao do princfpio da economia processual. Na sua dicgao, com ele haveré maior risco, nao remoto, de “administra- co arbitréria de solucées desiguais”, o que “leva a se duvidar da confiabilidade do método que suprime o valor da legalidade”.“* A nog&o de economia processual representa a relagao entre 6timos resultados e minimo dispéndio. Sua incidéncia nao deve relativizar as garantias constitucionais, bem como nao devem ser utilizados argumentos econémicos que supri- mam 0 elemento nuclear da dignidade humana e do estado de inocéncia. Por exemplo, a audiéncia de custédia nao pode ser suprimida ou substituida por meios virtuais, sob a justificati- va econémica. E da sua esséncia ser presencial e de ser um direito do imputado (arts. 287; 310, CPP). No entanto, problemas de satide publica podem consti- tuir justificativa excepcional para ser ordenada audiéncia de custédia por videoconferéncia. Ademais, 0 risco de contagio, com colo 0 de pessoas em risco de morte, foi o motivo de ser permitida sua realizacao por meios digitais. Nessa toada, o STF explicou que a pandemia provecada pela COVID-19, “nao afasta a imprescindibilidade da audién- er realizada, caso necessario, por ia de lei em cia de custédia, que deve meio de videoconferéncia”, em face da inexistén sentido formal vedando 0 uso da tecnologia. Ainda, de acordo sse ato processual, “sob a presidéncia com a Suprema Corte, 414. PRESUTTI, Adonella. La declaratéria delle nullita net regime delle impugnazio= ni penali. Milano: Giufré, 1982. p.12 (tradugao livre). 314 ARTERIES Nit4 do contexto pandannted soim's dineblo'ante jetivo do preso de participar de ato processual vocacionado a controlar a legalidade da prisio”." 11.21 Estratégia de resolugao de questées Vide Site da Editora Noeses: www.editoranoeses.com.br 11.22 Aplicagao a caso concreto O STF invocou 0 principio da economia processual para reconhecer a urgéncia de produgao de prova testemunhal, diante do “justo receio do perecimento da prova”. Ponderou que tal poderia ocorrer em razao: (1) do esquecimento dos fatos pela testemunha; (2) do risco de que nao possam ser localizadas; (3) da imprevisibilidade do momento em que o processo retomaria seu curso, diante da fuga do réu; de ser medida de economia processual, em razao da existéncia de testemunhas em comum com outro réu; (4 ‘iente, ante a nomeagao da Defen- ti-lo; (5) de prejuizo ao p. soria Publica par (6) da possibilidade de reiteracao, em jufzo, da inquiri- cao de testemunhas, observando-se 0 contraditério e a ampla defesa; 415, STF - Segunda Turma - HC 186421 - Rel, Min. else da Nees ae \ dio Min. Edson Fachin » publicado em: 17 noy, as A parte (pas de nullité sans grief); (8) de no caber falar na existéncia, mesmo que remota, de constrangimento ilegal ao direito de locomog4o do paciente.""* O julgado deu valor maior ao direito da acusagao de pro- duzir a prova (art. 129, I, CF), que aos postulados da presun- go da inocéncia e da ampla defesa (art. 5°, LVII e LV, CF). A ampla defesa, nao custa lembrar, reGne uma pléiade de regras que colima assegurar a presenca ea audiéncia do réu, seja sob a 6tica da autodefesa, seja sob a luz da defesa técnica. Por outro lado, a argumentagao para antecipar a prova nao deve se supedanear em elementos em tese ou abstratos (art. 366, CPP). 11.23 Conclusao e Préximo capitulo sy fh Os prinefpios so normas juridicas que podem assumir a fungao de calibragem do sistema. O enchimento de contetido correto de cada uma dessas normas de maior vaguidade de- pende da observancia do texto constitucional, mediante con- trole continuo, seja por via difusa, seja pelo meio concentrado. A relacao entre os elementos constitutivos de uma teoria da nulidade e a teia principioldgica que informa a sua incidén- cia é fundamental a delimitagéo ao seu Ambito de imponibili- dade e ao controle dos atos processuais penais. E 0 que sera visto no proximo capitulo, 416. STF - Primeira Turma ~ HC 165581 ~ Rel. Min, Alexandre de Moraes ~ public do em: 11 mar, 2019, 316. i

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