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O ENSINO DA ARTE E SUA HISTORICIDADE:

UMA ANÁLISE DAS MUDANÇAS

Comunicação: ET-03- Cultura e processos educacionais.


SILVA, Sandra Maria – CAJ/UFG.1
PINTO, Suely Lima Assis – CAJ/UFG.2

A partir da década de 30 várias mudanças ocorreram no sistema educacional


brasileiro, houve um crescimento considerável da demanda efetiva que acabou
pressionando o sistema educacional existente, num momento em que se acentuavam no
país mudanças sócio- político-econômico, a favor da industrialização fazendo aumentar
a procura por educação. Segundo Romanelli (2003, p.59) “a intensificação do
capitalismo industrial no Brasil, que a Revolução de 30 acabou por representar,
determinou conseqüentemente o aparecimento de novas exigências educacionais”.
Antes deste período a falta de instrução não era sentida pela sociedade. Com a nova
situação implantada no país houve uma profunda modificação nas aspirações sociais e
começou uma preocupação com a preparação formal que a escola iria proporcionar.
A partir daí houve uma expansão jamais vista antes no sistema de ensino,
que acarretou deficiências profundas na estrutura escolar, devido seu baixo rendimento
e por seu aspecto de descriminação social vinculadas às contradições políticas causadas
pelas lutas ideológicas, das camadas dominantes na estrutura do poder. Por um lado,
aumenta-se a procura por oportunidades educacionais, por outro lado, a escola não
estava estruturada de forma adequada para oferecer a qualidade de ensino que a
sociedade necessitava. De acordo com Romanelli (2003, p.56), “quando, pois, a
economia passou a exigir que se introduzissem na escola certas mudanças, manifestou-
se a defasagem, mas esta ocorreu em função do modelo econômico. Este exigiu
mudanças no setor do ensino e foi, quanto a este, que a distância apareceu”.

1
Graduanda em Pedagogia-CAJ/UFG.
2
Mestre em Educação, doutoranda em História – FCHF/UFG, professora do curso de Pedagogia
CAJ/UFG.
2

Essas mudanças que se processaram no âmbito educacional, também


aconteceram ao longo da história com o ensino da arte. A aprendizagem da arte passa
a ser obrigatória no ensino fundamental e médio a partir de 1971 de acordo com a
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº. 5.692. Esta lei visava uma
educação tecnicista tornando a escola secundária completamente profissionalizante,
formando mão de obra barata para atuarem no mercado de trabalho. Segundo Barbosa
(2003), no currículo escolar, a Arte é incluída com o título de Educação Artística3, não
sendo considerada como disciplina e sim “atividade educativa”. Com a implantação da
nova lei os professores não estavam preparados para ministrar as atividades exigidas
pelo currículo. A partir de 1973 criam-se os cursos de educação artística nas
Universidades que pretendiam preparar um professor de arte em apenas dois anos, com
capacidade para trabalhar música, teatro, artes visuais, desenho, entre outras
habilidades. Este modelo de educação tem reflexo até hoje na educação e a formação
acadêmica têm se limitado a saberes encomendados vinculados ao mundo do trabalho e
do mercado. A preocupação que se tem não é de formar para a cidadania, pessoas
capazes e autônomas que busquem o saber, e por meio dele ultrapasse o imediatismo,
exercendo seu poder de liberdade e criação, e sim formar para o mercado. “A
Universidade tem se preocupado, sobretudo, em formar funcionários para o Estado,
peritos em saber–fazer, profissionais técnicos e especialistas nas várias áreas da
atividade humana, incluindo a filosofia, as letras, as artes e a educação”. (Coelho, 2006,
p.44 – 45).
Essa educação apontada por Coelho (2006) é o mesmo processo que se
percebe em relação ao Ensino da Arte no período da criação da disciplina, que no
contexto inicial pela falta de formação de professores, atuavam de uma forma
mecanizada, dando um valor excessivo à espontaneidade e ao improviso. De acordo
com Coelho (2006) a educação deve contribuir para compreensão racional da existência
humana e sua transformação no sentido de realizar a autonomia, a liberdade, a
igualdade, criar novas formas de existência social e individual.
Essa preocupação só apareceu no ensino da Arte a partir dos anos 80 com o
movimento “Arte-Educaçao”, com a proposta de uma educação numa dimensão mais
ampla em todos os níveis e formas de ensino. Nesta proposta amplia-se o conceito de
3
A nova lei propõe uma mudança não só na terminologia, a LDB reafirma a presença da Arte como
construtora de conhecimento, revendo as atitudes dos educadores como transmissores do saber.
3

criatividade, a partir da apreciação e releitura de obras de arte. Barbosa (2003) analisa o


conceito de criatividade:

Para o modernismo, dos fatores envolvidos na criatividade o máximo valor era a


originalidade. Atualmente, a elaboração e a flexibilidade são extremamente valorizados.
Descontruir para reconstruir, selecionar, reelaborar, partir do conhecimento e modificá-
lo de acordo com o contexto e a necessidade dos processos criadores, desenvolvidos
pelo fazer a ver Arte, fundamentais para a sobrevivência no mundo cotidiano.
(BARBOSA, 2003, p.18).

Barbosa (2003) aponta a arte como um meio de se fazer com que às crianças
desenvolvam a criatividade e que sejam capazes de perceber a realidade que a cerca e
que por meio da reflexão possam romper com os padrões já existentes na sociedade.
Neste contexto, a preocupação maior é com a formação da personalidade da criança, o
seu desenvolvimento intelectual, porém, sabe-se que isso não é o bastante para
modificar a realidade do ensino da arte na escola. O que se pode perceber é que a arte
ainda não ocupa um lugar de relevância nas escolas e que poucas pessoas têm acesso a
ela, por falta de incentivo ou mesmo de conhecimento por parte dos educadores. Muitas
vezes esses educadores oferecem desenhos mimeografados para colorir ou cobrir com o
papel, impossibilitando seu poder de criação, a arte parece estar restrita a proposta de
profissionais que trabalham cópia, modelos prontos e acabados.
A arte-educação, no contexto da educação formal, é um instrumento que
proporciona às crianças o desenvolvimento de seu poder de criação, refletindo sua vida
cotidiana. Ao se relacionar com a arte a criança adquiri maior conhecimento de mundo.
Percebe-se, no entanto, que este ensino passou por diferentes momentos históricos, mas
nem sempre estes objetivos foram alcançados.
Ferraz e Fusari (1993, p.27) fazem uma reflexão sobre a trajetória histórica
do Ensino da Arte e apontam que “as práticas educacionais surgem de mobilizações
sociais, pedagógicas, filosóficas, e, no caso de arte, também artísticas e estéticas.
Quando caracterizadas em seus diferentes momentos históricos, ajudam a compreender
a questão do processo educacional e sua relação com a própria vida”.
No Brasil desde o século XIX, ocorreram vários movimentos culturais entre
a arte e a educação, como a criação da Escola de Belas-Artes no Rio de Janeiro, a
presença da Missão Francesa, a Semana de 22, a criação de Universidades entre outras.
Percebe-se que esses movimentos culturais que aconteceram não foram por acaso, nem
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desvinculados das práticas sociais vividas pela sociedade, mas são características da
dinâmica social que interfere,modificando as práticas vigentes.
Nos anos de 1950, além do desenho, passam a compor o currículo escolar as
matérias de canto orfeônico, trabalhos manuais e músicas, nos quais predominavam a
transmissão de conteúdos reprodutivistas influenciadas pela cultura dominante,
evidenciando ainda mais a divisão social existente na sociedade.
Nesse contexto, com a industrialização do Brasil, surge no país no final da
década de 70 o movimento arte-educação fundamentada nas idéias da escola nova que
tinha como ênfase a livre expressão. Essa Pedagogia nova tinha como idéia central a
criatividade, o desenvolvimento espontâneo da expressão artístico e da auto-expressão.
Segundo aponta Ferraz e Fusari (1993), o foco principal de suas atividades é centrada
no fazer artístico, encorajando a criança a livre expressão e improviso, fundamentada na
Psicologia e na Biologia.
No Brasil no século XX vários autores marcam os trabalhos de educadores
da arte, entre eles se destacam John Dewey, Victor Lowenfeld e Herbert Read. Neste
período um dos mais significativos movimentos de arte teve a contribuição de Read e
influência da escola nova, esse movimento incentivou Augusto Rodrigues a criar a
“Escolinha de Arte”, no Rio de Janeiro em 1948. Com a criação da Escolinha de Arte
novas concepções se abrem sobre o ensino de Arte.
De acordo com Ferraz e Fusari (1993), essa escola via o aluno como ser
criativo, a quem se deviam oferecer todas as condições possíveis de expressão artística,
supondo-se que, assim, ao “aprender fazendo”, saberiam fazê-lo, também,
cooperativamente, na sociedade. Entretanto, a criatividade foi confundida com
imaginação, e o professor tinha a tarefa de estimular a imaginação da criança e
promover meios para que elas se expressassem. A Arte-Educaçao vem sendo
reestruturada ao longo da história, novos objetivos são traçados, mas nenhuma mudança
é operada no métado de trabalho, o que dificulta a apreensão por parte dos alunos.
Diante disso Barbosa (1978, p.74) ressalta que “devemos pensar em termos de um
programa de Arte que desenvolva o entendimento das relações entre a forma e
conteúdo”.
Conforme comenta Barbosa (1978) o ensino de Arte deve contar com
professores que tenham orientação filosófica e metodológica sobre o ensino das artes
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visuais, orientação sobre a evolução perceptiva, criativa e expressiva da criança. Sendo


a arte uma disciplina que atinge o desenvolvimento do aluno numa maior dimensão, o
professor precisa se preparar para entender o pensar, o sentir e a criatividade de seus
alunos, e assim organizar o ensino e a aprendizagem da arte.
Entre as décadas de 60 e 70, no momento em que o processo de
industrialização e o desenvolvimento econômico se expandiam no país e que a educação
deixava de ser suficiente para a preparação de profissionais surge no Brasil a Tendência
Tecnicista, na qual o aluno e o professor são peças secundarias e o sistema técnico de
organização da aula é peça central. Seu surgimento esta ligada as decisões políticas,
voltadas para moldes estrangeiros, visando uma preparação adequada dos indivíduos
conforme o mercado de trabalho exigia.
Em 1971, como citado anteriormente com a promulgação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação n° 5692, a aprendizagem da arte se torna obrigatória no
ensino fundamental e médio. Nesse período não havia curso universitário de Arte –
Educação, com as novas exigências o governo federal cria em 1973, o curso
universitário de licenciatura em Educação Artística, com duração mínima de dois anos.
Essa medida tomada pelo governo federal não supriu a deficiência de
profissionais aptos para ministrar a disciplina de arte, pois o tempo de duração do curso
é muito curto para formar professores capacitados nesta área. Nota-se um descanso em
relação a esta disciplina se compararmos as demais consideradas acadêmicas.
Outro fato que evidencia esse descaso em relação ao ensino da arte é que o
sistema educacional não exige nota do aluno, “seu ensino passa a ser compreendido
como uma atividade, não como uma disciplina, de acordo com a interpretação da lei
educacional 5.692/71” (Barbosa, 2001, p.12). Algumas escolas procuram dar
importância a essa disciplina exigindo notas, mas sem nenhum critério de avaliação,
pois nenhum aluno reprova nessa disciplina, o que se avalia é o desempenho do aluno,
seu comportamento e o interesse pelo trabalho proposto. A arte continua a ser encarada
dentro da escola, como um momento de lazer, uma distração entre as atividades de
outras disciplinas. De acordo com Barbosa (2001):

A apreciação artística e histórica da arte não tem lugar na escola, as imagens


oferecidas às crianças em sala de aula são retiradas dos livros didáticos, com imagens
ruins para eles colorirem e no melhor dos casos elas mesmas produzem, o livro nunca
lhes é oferecido devido o preço. (BARBOSA, 2001, p.12).
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Essa falta de interesse em relação ao ensino da arte nas escolas evidenciada por Barbosa
(2001) aumenta a crença de que arte é apenas intuição ou emoção é que só é necessário
oferecer aos alunos materiais e deixa-los livres para fazerem o que quiserem.
Partindo dessas reflexões a respeito do processo de Ensino da Arte,
inferimos que os professores de arte precisam ter conhecimentos teóricos sobre as
teorias da arte-educação, e que pensem a arte de forma que possa ajudá-los a
desenvolver atividades artísticas nas escolas. O professor deve saber a função social da
arte para poder transmitir de forma que não seja uma mera atividade agradável, mas
algo que tenha significado para que ocorra a aprendizagem. Barbosa (2003) aponta esse
problema da educação, afirmando que:

Somente a ação inteligente e empática do professor pode tornar a Arte ingrediente


essencial para favorecer o crescimento individual e o comportamento de cidadão
como fruidor de cultura e conhecedor da construção de sua própria nação (...).
Portanto, os poderes públicos, além de reservarem um lugar para a Arte no currículo
e se preocuparem em como a Arte é ensinada, precisam propiciar meios para que os
professores desenvolvam a capacidade de compreender, conceber e fruir Arte.
(BARBOSA, 2003, p.14).

Barbosa aponta essa necessidade de se adequar esses profissionais que


muitas vezes trabalham de forma desvinculada. Apesar das dificuldades de
reestruturação no ensino da Arte, esse campo tem passado por um período de grande
evolução, mas como toda mudança, seja no campo da política, da educação, da
economia ou nos aspectos sociais, é constituída por vários problemas, barreiras e
resistências. O ensino de Arte no Brasil passa por esses constrangimentos, pois a Arte é
restrita a poucos círculos acadêmicos, devido ao reduzido número de centros
especializados nesse estudo no país.
Sabe-se que várias reflexões a cerca de mudanças foram inseridas no
contexto do ensino da arte, onde a fruição, o contato, a freqüência passam a fazer parte
das discussões dos arte-educadores. Neste contexto, de novos paradigmas de Ensino da
Arte a criança deixa de ser peça secundária e passa a ser o foco central, e desde pequena
começa a ser inserida no mundo da arte, das cores, de materiais, de sons, melodias e
uma infinidade de experiências novas, sendo influenciada pelo universo cultural que as
rodeia.
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A arte, na contemporaneidade, está firmada mais em dúvidas do que em


certezas. E o papel da educação neste contexto, está ancorada nas diferenças e nas
diversidades “que somos e quem somos” (FRANGE, 2003, p.36). Atualmente existe
uma preocupação com o “eu” interior, da personalidade e do desenvolvimento
intelectual da criança, mais isso não tem sido o bastante para modificar a realidade do
ensino de Arte na escola, que continua a trabalhar com cópias modelos prontos e
acabados que não possibilitam a expressão pessoal.
Sabe-se que a criança aprende o tempo todo em interação com o meio social
em que vive, mas que ainda existe trabalhos sem nenhuma individualidade, sem
expressão pessoal que leva o aluno a continuar a ser meros copiadores, para Martins
(2003) existem vários mediadores, mas na escola, o professor é o principal:

São vários os mediadores possíveis, mas na escola, certamente, o educador é o


principal deles, assim como num museu, o monitor ou em algumas outras instituições
poderia ser chamado o agente cultural, cabendo-lhes mediações pedagógicas
profissionais competentes frente à cultura. A mediação pode provocar a
disponibilidade e a empatia, mas também o rebaixamento da sensibilidade e o
distanciamento de uma experiência estética e artística... (MARTINS, 2003, p.56).

Como aponta Martins (2003), o professor mediador tem papel fundamental


no processo de aprendizagem do aluno, podendo contribuir para o fortalecimento das
funções que ainda não estão consolidadas. É necessário que se crie um ambiente
provocativo que permita a criança por meio dessa mediação do adulto acelere seu
processo de aprendizagem. A arte-educação possibilita ao aluno expressar os
sentimentos e sentidos de sua vida cotidiana, e não a imitação de valores alheios. Sabe-
se que a criança aprende a escrever, mas não consegue entender a realidade que a cerca.
Muitas vezes olha uma obra de arte, mas é incapaz de refletir sobre ela, “ainda é comum
encontrar nas aulas de arte, a proposta de confecção de presentes para o ‘dia dos pais’,
‘das mães’, ‘das crianças’, etc.” (DUARTE, 1991, p.83), como se estivessem fazendo
uma obra de arte.
A partir dos anos 80, constitui-se uma maior preocupação em relação as
mudanças nas ações sociais e culturais dentro da escola, levando os educadores de Arte
a se conscientizarem da necessidade de uma organização no contexto do ensino de Arte.
O papel da arte na escola ganha nova dimensão, visando à transformação da sociedade,
tendo a formação estética como sendo primordial para o ensino da Arte. Essa proposta
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que sistematizou-se no Brasil a partir de 1982, visava um lugar de destaque no currículo


e melhor nível de ensino em arte, que até então valorizava quase que exclusivamente a
auto-expressão e a criatividade. A proposta que teve seu início nos EUA a partir dos
anos 60 com o DBAE4, além da produção artística, valoriza também a cultura, a história
da arte, a estética e a análise das obras de arte.
Essa nova concepção de ensino de Arte foi adaptada para nosso contexto e
introduzida no Brasil pela professora Ana Mae Barbosa, denominada inicialmente
5
“Metodologia Triangular” por envolver três vertentes: o fazer artístico, a leitura da
imagem e a história da arte. “O que a arte na escola principalmente pretende é formar o
conhecedor, fruidor e decodificador da obra de arte, a escola seria a instituição pública
que pode tornar o acesso à arte possível para a vasta maioria das crianças em nossa
nação” (BARBOSA, 1991, p.10).
A Proposta Triangular, no Brasil, teve como ponto principal de seu
desenvolvimento o Museu de Arte Contemporânea-MAC/SP. Em 1989, recebeu apoio
da Secretaria da Educação do município de São Paulo, do Itaú Cultural entre outros.
Isso contribuiu para o desenvolvimento de outros projetos educacionais relacionado ao
ensino-aprendizagem de Artes. O MAC foi a primeira instituição no Brasil a tratar as
três vertentes da proposta triangular. “A metodologia de ensino da arte usada no museu
de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo integra a História da arte, o fazer
artístico, e a leitura da obra de arte” (BARBOSA, 2005, p.37). O lançamento dos
Parâmetros Curriculares Nacionais em Educação Infantil também contribuiu para a
divulgação dessa Proposta Triangular.
De acordo com Barbosa (2003, p.17) um dos pontos que diferencia a
Proposta Triangular das propostas tradicionalistas anteriores é o “maior compromisso
com a cultura e com a história”, o papel da Arte na educação agora se volta para os
aspectos artísticos e estéticos do conhecimento e o caminho mais eficiente para
estimular a consciência cultural do educando é partir da apreciação da cultura local, da
necessidade de se resgatar a identidade cultural e construção da própria realidade. Sabe-

4
Esta é uma proposta inglesa e norte-americana denominada Disciplined Based Art Education – DBAE,
concebida por professores de arte, como Richard Hamilton, Manuel Barkam e Elliot Eisner.
5
Na primeira publicação sobre este assunto, no livro “A Imagem no Ensino da Arte” (2005) – Ana Mae
Barbosa denomina o estudo que está iniciando de Metodologia Triangular. Posteriormente, por
compreender que metodologia é um trabalho singular que cada professor desenvolve em sala de aula,
modifica a nomenclatura para Proposta Triangular.
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se que a arte nos transmite significados que nenhum outro tipo de linguagem pode
transmitir, e que, a cultura de um povo só pode ser entendida se conhecermos sua arte.
Outro ponto da proposta de mudanças da educação por meio do ensino de
Arte é a ênfase no desenvolvimento da apreciação da obra de Arte. Mas a situação do
uso e da valorização de imagem no ensino da Arte não se modificou na prática, mesmo
que a Lei 5692/71, propusesse uma educação que levasse o aluno a apreciação,
ensinando-o a ver da mesma forma que se ensina a ler. No entanto, existe ainda um
afastamento do mundo da arte, visando apenas o desenvolvimento do potencial criador
de cada pessoa. Para Rossi “a apreciação estética continuou sem espaço na escola,
durante os anos de abordagem tecnicista no Brasil, embora já houvesse críticas à
preservação da livre-expressão do aluno”. (ROSSI, 2003, p.15).
Segundo Barbosa (2003, p.17) “só um saber consciente e informado torna
possível à aprendizagem em Arte”. Atualmente se percebe que a arte tem múltiplos
significados, que levam o aluno a pensar mais inteligentemente suas manifestações no
mundo, nessa perspectiva, tem-se uma abertura maior para a fruição da arte
contemporânea. De acordo com Frange (2003, p.36), “a arte na contemporaneidade, esta
acordada muito mais em dúvidas do que em certezas, desafia, levanta hipóteses e
antíteses em vez de confirmar teses”. Ou seja, a produção artística contemporânea se
preocupa com a criatividade, a sensibilidade e a percepção do mundo, existe atualmente
a preocupação com a formação da personalidade, do desenvolvimento do intelecto da
criança, cabe a escola abrir espaço para o desenvolvimento dessas habilidades nos
alunos.
Para Pillar (2003), a educação envolve os processos formais e informais
pelos quais a cultura é transmitida aos alunos, e a escola é apenas um desses processos,
sendo assim a arte-educação precisa mediar a arte com o público ao qual se destina.
Outro aspecto proposto para a mudança no ensino de Arte é a ampliação do conceito de
criatividade, como vimos no início deste estudo, o que se propõe é que haja uma leitura
da obra de arte, e não apenas o desenvolvimento de criatividade do aluno. Agora já
existe um maior aprofundamento no processo criativo da arte substituindo a visão
emocional sobre o fazer artístico. A originalidade tinha um grande valor no contexto
educacional, mas atualmente a reapropriação, a releitura da obra consiste no ponto
fundamental do ensino, ao mesmo tempo em que, a maneira de ver a arte, como fonte de
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muitos significados, fez com que surgisse a preocupação do desenvolvimento da


criatividade na apreciação da obra de arte. Para Barbosa (2003, p.18), o conceito de
originalidade modificou-se. “Pretende-se não só desenvolver a criatividade por
intermédio do fazer Arte, mas também pelas leituras e interpretações das obras de Arte”.
Neste novo paradigma de ensino de Arte com as novas mudanças de estilo,
surge uma necessidade de alfabetização visual, e a disciplina de Arte pode ser um
espaço de ampliação do conceito de alfabetização na educação contemporânea
confirmando assim a importância da Arte na escola. Segundo Barbosa (2003, p.18)
“Não se trata mais de perguntar o que o artista quis dizer em uma obra, mas o que a obra
nos diz, aqui e agora em nosso contexto e o que disse em outros contextos históricos a
outros leitores”. Nós vivemos num mundo visual, por isso, o ensino da Arte se preocupa
tanto com o contexto em que obra foi produzida, quanto o contexto da pessoa que está
observando. Ensinar à criança a gramática visual através da arte desde pequena é uma
forma de prepará-la, no sentido de poder compreender e avaliar todo tipo de imagem, de
forma que elas se tornem conscientes de que se aprende por meio das imagens. Nesse
sentido, Rizzi (2003) enfatiza que:

A leitura de obra de Arte envolve o questionamento, a busca, a descoberta e


o despertar da capacidade crítica dos alunos. As interpretações oriundas
desse processo de leitura, relacionando sujeito/obra/contexto, não são
possíveis da redução certo/errado (...). (RIZZI, 2003, p.67).

Nesta perspectiva a autora ressalta a necessidade de proporcionar à criança


atividades de leitura, para que ela possa compreender como funciona a leitura visual e
assim poder pensar criticamente. O ensino de Arte, dentro da visão contemporânea
procura proporcionar às crianças atividades interessantes e de fácil compreensão
facilitando o processo de aquisição da leitura da obra. “Por isso, o professor tem o
direito (e o dever) de conhecer o desenvolvimento estético do seu aluno assim como o
tem de outros tipos de desenvolvimento: motor, cognitivo, emocional, social, moral
(...)” (ROSSI, 2003, p.11).
Assiste-se atualmente uma grande preocupação com a formação da
personalidade do aluno, e no seu processo de comunicação cultural, nos quais se efetiva
a difusão de imagens e sons, na diversidade das culturas e classes sociais em que vivem.
Portanto a Arte tem por finalidade na educação propiciar uma relação do ser humano
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com o mundo e para o mundo, podendo assim contribuir para a formação de pessoas
críticas, criativas, para atuarem na transformação da sociedade. É preciso reconhecer
que a construção do conhecimento é determinada pelas características da cultura do
aluno, e a aquisição do conhecimento altera conforme seus contextos culturais. À
medida que a criança se relaciona com a arte abstrai conhecimentos sobre seu mundo, e
pouco a pouco se apropria dos modos de funcionamento de tudo que as cerca, como o
comportamento e da cultura do grupo social em que vive.
É fundamental que se haja a mediação do adulto com a criança estimulando-
a em seu desenvolvimento e potencial para que ocorra a aprendizagem. Na arte a
criança expõe seus sentimentos, elabora conceitos e consegue identificar seu papel
social. Por meio dessa mediação a criança se apropria pouco a pouco do modo como
funciona a cultura em que vive.
Outro aspecto importante dentro dessa proposta de mudança é “reconhecer
que o conhecimento da imagem é de fundamental importância não só para o
desenvolvimento da subjetividade, mas também para o desenvolvimento profissional”
(BARBOSA, 2003, p.20). O ensino da arte visual prepara o aluno para compreender e
avaliar qualquer tipo de imagem, dando-lhes consciência de que se aprende com as
imagens. A imagem é considerada por Pillar (2003), um componente de total
importância na comunicação, por meio dela várias pessoas atribuem significados
diferentes ao que vêem, dependendo do contexto que está inserido É preciso
compreender como a criança lê uma obra de arte, qual é a sua interpretação daquilo que
vê, que significado ela atribui à imagem observada. Deste modo, é necessário começar a
educar o olhar das crianças desde cedo, relacionando no seu dia-a-dia atividades de
leitura de imagem, para que desde pequenas elas comecem a pensar criticamente. Para
Pillar (2003):

O ensino da Arte, dentro de uma visão contemporânea, busca possibilitar


atividades interessantes e compreensíveis à criança, por estarem adequadas ao
seu processo de aquisição da leitura. O que se busca é muito mais entender os
processos de leitura, do que indicar o que fazer com as crianças em sala de
aula. (PILLAR, 2003, p.81).

Nesse mesmo sentido Richter, (2003), enfoca a multiculturalidade e a


interdisciplinaridade. No que se refere à interdisciplinaridade, são trabalhos que muitas
vezes são desenvolvidos em forma de projetos, e tem mostrado grandes resultados em
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relação ao ensino de Arte, o que se busca com o trabalho interdisciplinar não é colocar
uma disciplina a serviço de outra, mas uma atitude que abranja os problemas de
conhecimento dos alunos. Outro termo também utilizado, segundo Richter (2003) é
“transdisciplinaridade”, esse enfoque também é conhecido por “transversalidade”, que
foi apresentado no Brasil pelos Parâmetros Curriculares Nacionais com propostas de
temas transversais para serem desenvolvidos no currículo escolar de Educação Básica,
tendo como um de seus temas transversais a Pluralidade Cultural, usada para
demonstrar as várias culturas existentes em nossa sociedade.
O termo multiculturalismo, apesar de ser considerado recente por vários autores
envolve vários sentidos e pode ser exprimido de diversas maneiras. Podendo ser
compreendido como modelos de paradigmas de intervenção social. O multiculturalismo
no ensino da Arte numa visão antropológica, segundo Richter (2003), abrange o
desenvolvimento de competências em vários sistemas culturais. Essa educação busca
uma aproximação entre os grupos étnicos, pondo de lado as diferenças, promovendo um
enlaçamento cultural entre esses grupos, essa troca cultural não requer a perda da
cultura dos grupos do qual o aluno está inserido, mas uma ampliação de seu contexto
social. Quando se fala de multiculturalidade o que se pretende não é apenas colocar os
alunos para elaborar trabalhos de datas comemorativas, mas estabelecer em sala de aula
uma atmosfera de investigação de culturas compartilhadas pelos alunos, levando em
conta que cada pessoa participa de mais de um grupo cultural. Segundo Richter (2003):

O grande desafio do ensino de arte, atualmente, é o de contribuir para a


construção crítica da realidade através da liberdade pessoal. Precisamos de um
ensino de arte por meio do qual as diferenças culturais sejam vistas como
recursos que permitam ao indivíduo desenvolver seu próprio potencial humano
e criativo, diminuindo o distanciamento existente entre arte e vida.
(RICHTER, 2003, p.51).

A educação multicultural envolve o desenvolvimento de competências em


vários sistemas culturais, visando promover a igualdade no sistema educacional “no
entanto tal enfoque foi sendo ampliado, tendo em vista as numerosas culturas presentes
em toda a sociedade, baseadas em aspectos como religião, idade, gênero, ocupação,
classe social etc.”, (Richter, 2003, p.87). Trabalhar com a multiculturalidade no ensino
da Arte pressupõe levar o conceito de Arte de uma relação excludente para um sentido
mais amplo, de experiência estética. O multiculturalismo no terceiro mundo ainda sofre
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grande preconceito de classes, o que é produzido pela classe baixa é considerado


artesanato, não podendo ser considerado como arte, este ainda é o pensamento vigente
na sociedade. “O grande desafio multicultural do Brasil é minimizar o preconceito
social, diminuir a distância entre a elite e as pessoas comuns” (Barbosa, 1998, p.87).
Assim, compreende que a arte, a partir das mudanças propostas para este
ensino, não tem por objetivo formar artistas, e sim, o conhecedor, o fruidor e o
decodificador da obra de arte. Mas também é sabido que o espaço reservado a arte nas
escolas é bem pequeno. São poucas as pessoas com a oportunidade de visitar museus,
galerias de arte ou assistir concertos, teatros, dança, é preciso que a criança ou o adulto
tenham a oportunidade de conhecer a produção artística no contexto profissional, que
são apresentados nesses espaços culturais, mesmo que a realização de alguns desses
eventos se efetive no âmbito escolar. Caso não se efetive, a escola, seria o local de
acesso das pessoas à arte, por meio deste ensino, pois se a criança não tiver um
conhecimento de arte e história, a consciência de identidade nacional do aluno seria
prejudicada. Compreende-se então, que existe um distanciamento cultural dentro de
uma mesma sociedade, no que se refere ao acesso à arte, mas a escola, ao possibilitar o
acesso à cultura por meio de visitas guiadas, excursões, leitura de imagens, etc.
contribuirá com a formação de um novo olhar sobre o mundo e a realidade e o
patrimônio que o cerca.

BIBLIOGRAFIA

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