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DENISE STOKLOS:
FLORIANÓPOLIS
2007
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEATRO
MESTRADO EM TEATRO
JAQUELINE VALDÍVIA
DENISE STOKLOS:
FLORIANÓPOLIS
2007
JAQUELINE VALDÍVIA
DENISE STOKLOS:
Banca Examinadora:
Orientador:
Prof. Dr. André Carreira
UDESC
Membro:
Profª. Drª. Verônica Fabrini
UNICAMP
Membro:
Prof. Dr. Milton de Andrade Leal Jr.
UDESC
Não é de cimento
The present dissertation discusses the concept of theatrical actor which arises from
Denise Stoklos’ Teatro Essencial. Through a view of her artistic path, since its beginning in the
State of Paraná until the present day, transformations of technical and poetic procedures wich
culminate in the consolidation of Teatro Essencial (Essential Theatre) are presented. By means
of a theoretical and practical approach, this work also relates the procedures that characterize
Stoklos’ actor to the development of other ways of expression that may emerge from the
confluence of different trends, such as performance art and mime.
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 9
1 TRAJETÓRIA DA ARTISTA....................................................................................................... 16
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................................... 78
REFERÊNCIAS............................................................................................................................ 105
9
INTRODUÇÃO
Clarice Lispector
O significado deste trabalho surge de uma etapa importante do caminho que venho
percorrendo como atriz, pesquisadora e docente desde o ano de 1994, quando se deu o início
da minha relação com o teatro – primeiro como atriz autodidata, depois estudante em cursos
livres de teatro, para então ingressar no curso de Licenciatura em Artes Cênicas. A partir de
minha entrada como aluna do curso de graduação, trabalhei durante seis anos com o Grupo
(E)xperiência Subterrânea, sob direção do professor André Carreira, sendo que, naquele
momento, o grupo estava voltado para a articulação poética de três elementos básicos: o espaço
âmbito do teatro. Percebi também que meu foco de interesse apontava para o trabalho de ator, e
que a investigação poderia dar-se a partir do meu próprio corpo. Em linguagens, espaços e
festivais de teatro pelo Brasil e, neste período travei meu primeiro contato com o trabalho de
Denise Stoklos no ano de 1997, a exatamente dez anos atrás, na ocasião do VI Festival de
Teatro da Universidade de São Paulo. Era o espetáculo Des-Medéia, o qual chamou minha
10
atenção pelo fato de Stoklos acumular em si características disciplinares tão variadas como solo
performer e criadora de seu próprio teatro. Aquele momento foi marcante para mim e o desejo de
encontrar um caminho próprio, análogo àquele, naturalmente foi sendo instalado: primeiro
quando comecei a trabalhar com a criação de solo performances1, em seguida dentro da própria
viria uma oportunidade de conviver diretamente com a visão artística de Denise Stoklos, através
relaciona-se, portanto, com minha experiência como atriz e aluna de Stoklos, e está vinculada à
propostos pela diretora/atriz. Com relação à abordagem solo performer, elemento constituinte do
Ainda que seja um modo de trabalho de longa tradição, na atualidade observa-se uma
recorrência de manifestações espetaculares feitas com um intérprete só, ou seja, um
único sujeito atuante. [...] Em vários países encontro artistas que elegeram esta
modalidade de trabalho, tais como Luisa Calcumil do sul da Argentina, Spalding Grey e
Karen Finley de Estados Unidos, Robert Lepage do Canadá, Maria Helena Ansaldi e
Denise Stoklos do Brasil, entre muitos outros. Estes artistas não apenas empregaram
esta modalidade em suas carreiras, como contribuíram fortemente para o
desenvolvimento desta modalidade [...] o Manifesto do Teatro Essencial e todas as
produções de Denise Stoklos são algumas das expressões que contribuem pra o
desenvolvimento do solo (DIP, 2005, p.17).
A citação acima situa Stoklos como referência internacional no que tange o trabalho solo.
Em muitos aspectos, Stoklos tem servido como referência também para outros artistas
encontros com o trabalho da artista, seja em cena, seja através de seus textos ou aulas. O
1
Em 2000, atuei como performer no projeto Máquina Pedagógica do artista plástico Fernando Lindote
(Premio: Bolsa Vitae de 2000), e em 2001, dirigi, executei e performei em: Carnificação de um Pensamento Sonoro, na
III Bienal de Artes Visuais do Mercosul em Porto Alegre/ RS e, desde então tenho participado frequentemente de
experimentos relacionados às artes plásticas e visuais.
2
2001: Espetáculo Women´s, direção: André Carreira. Estreou no Museu de Artes de Santa
Catarina.Temporada no Centro Cultural São Paulo. Festival Nacional de Teatro Isnard de Azevedo (prêmio de melhor
atriz). Projeto Reflexos de Cenas 2001, no SESC Consolação de São Paulo. Festival Nacional de Teatro de Presidente
Prudente, SP. Festival Internacional de Teatro de Rio Preto, SP. Festival Nacional de Teatro Universitário de Blumenau,
SC (prêmio de melhor atriz).
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Stoklos tornou-se notório quando da realização do projeto Solos do Brasil, organizado pela
artista no ano de 2002, na cidade de São Paulo. Minha vivência no projeto Solos do Brasil
representa um elemento chave na elaboração do presente texto, de modo que este contato
direto com a artista repercute aqui em reflexões, impressões e relatos advindos de minha
experiência pessoal.
Este trabalho tem como ponto de partida a trajetória artística de Denise Stoklos, desde
1968 até os dias de hoje. Durante estes 39 anos de carreira, Stoklos tem se dedicado
dissertação visa reconhecer, no trabalho de Stoklos, o conceito de ator o qual emerge de seu
teatro essencial, para discutir o fim da dicotomia autor/ator, e a mudança de paradigma de ator
No panorama atual do teatro brasileiro, Denise Stoklos pode ser destacada por
representar – com uma perseverança singular no que se refere à sustentação de uma posição
ética e estilística – seu teatro no Brasil e no exterior, tendo representado, ao longo de sua
Stoklos é conhecida principalmente por suas incursões no teatro La Mama Experimental Theatre
Club, em Nova Iorque3, o mesmo que deu início à carreira de Gerald Thomas e que até os dias
Apesar de não haver fundado uma escola específica para difundir seus conhecimentos,
década de noventa, o Prêmio Denise Stoklos, destinado ao jornalista com maior empenho em
promover, por meio de colunas e artigos, o teatro no Brasil4; em 1992, após ter se tornado tema
3
Teatro com 300 lugares, localizado no centro de Nova Iorque, em Greenwich Village e, coordenado por Ellen
Stuart e tem como característica a apresentação de espetáculos de cunho experimental.
4
Matérias sobre Denise Stoklos eram desconsideradas por este prêmio, que tinha como objetivo destacar o
melhor crítico.
12
central da tese de doutorado de Suzy Capó Sobral5 pela New York University, foi convidada pela
mesma instituição, em 2000, para atuar durante um semestre como professora, ensinando seu
Teatro Essencial para classes de teatro; em 2002 foi responsável pela criação artística do
Projeto Solos do Brasil que reuniu artistas de diferentes partes do país para estudar sob as
A recepção de seu trabalho junto à crítica nos remete a nomes importantes da crítica
teatral, passando pelo crivo de jornalistas de peso como Alberto Guzik, Nelson de Sá e Antônio
estudiosos na área do teatro, como Suzy Capó Sobral, Leslie Damasceno e Eduardo Coutinho.
Muito também nos diz a respeito da relevância de seu trabalho no cenário nacional o fato dela
haver contado com dois profissionais entre os mais importantes no cenário do teatro brasileiro
para serem professores assistentes do Projeto Solos do Brasil (2002): Gianne Ratto e Antônio
não só com suas palestras, como também estabeleceram contato direto com o Teatro Essencial,
Em sua reflexão sobre aquilo que ela denomina Teatro Essencial, Stoklos destaca o
trabalho de ator sob o ponto de vista prático, desde a escolha do tema a ser trabalhado até a
condição desse ator enquanto cidadão. Conseqüentemente, sugere que o ator pode
espetacular, com a criação de cenas onde predomina a figura do ator como eixo central da
execução teatral. Essa posição axial do ator adquire importância determinante na estrutura e
O objetivo central desta dissertação é colocar luz nessa noção, situando sua importância
entendimento das etapas de composição contidas no procedimento proposto por Denise Stoklos.
5
Suzy Capó Sobral analisou três peças do repertório de Denise Stoklos: Um Orgasmo Adulto Escapa do
Zoológico (1983), Mary Stuart (1987) e Basement (1991).
13
execução da performance cênica, o qual não exclui o uso de elementos oriundos de outras áreas
artísticas. Tais elementos podem ser detectados no repertório de Stoklos no emprego, por
exemplo, de quadros que se repetem6 e que originalmente pertencem aos campos da mímica7 e
Este trabalho visa ainda conferir a forma pela qual os elementos de composição acima
citados participam e corroboram para a compreensão do seu teatro e da sua concepção de ator.
Para tanto, fundamenta-se em um referencial que toma por base os conceitos de corpo
propostos pela fenomenologia de Maurice Merlau-Ponty (1971), sob cuja luz podem ser
revelam simultaneamente por meio da produção cênica de Stoklos. O texto abaixo pode nos
produção de linguagem:
Neste ponto, cabe observar que a noção de corpo, presente no estudo de Merlau-Ponty
do corpo no uso de gestos e palavras em expressão. Tal compreensão se dá no modo como são
produzidos seus significados (linguagem), por meio da inquietação produzida pela relação de
6
Ver capítulo 1, item 1.2.1, ressonância 2 sobre a Mímica.
7
Chama a atenção para o trabalho de ator centrado no aspecto físico (corpo e voz): Uso de ponto fixo,
movimento isolado, gesto transformado, figuras de estilo, da técnica da parede imaginária, da prisão, da máquina de
escrever, uso da máscara facial entre outros.
8
Uso da colagem (cenas e textos), elementos de contradição, uso de espaço não convencional e repetição.
14
expressão de conduta. Ao mesmo tempo, esse corpo se vê obrigado a criar sentidos que
justifiquem sua existência e, por isso, solicita no outro a possibilidade de parceria e troca de suas
localizada no comportamento que um dado corpo é capaz de produzir em outro corpo, exigindo
reciprocamente a legitimação do seu próprio significado. Desse modo, faz-se entre ambos os
corpos um reflexo de suas próprias possibilidades, ou seja, a potência expressiva que reside na
materiais: a) fontes bibliográficas de autoria da própria Denise Stoklos9, com foco nas seguintes
publicações: Teatro Essencial (1993) e Denise Stoklos in Mary Stuart (1995); b) dissertações e
teses de autores que tratam sobre o trabalho da artista ou temas transversais, tais como a
mímica (2005). Incluem-se também aqui os trabalhos dos autores: Eduardo Coutinho, que em
sua tese de doutorado discute a evolução da mímica (1993), Cristiane Moura cuja dissertação de
mestrado discute o trabalho de Denise Stoklos à luz de seus espetáculos (1998), Pedro Brício
experiência pessoal, realizados entre 2002 e 2003, durante minha participação no Projeto Solos
do Brasil.
de espetáculos, vídeos e fotografias sobre o trabalho de Denise Stoklos. Das aulas e ensaios
coordenados por ela no Projeto Solos do Brasil, das quais tive oportunidade de participar, e que
Teatro Essencial, bem como de uma série de entrevistas feitas posteriormente com alguns
colegas de Solos do Brasil, também extraio alguns dos textos apresentados no decorrer da
9
Todos os seus livros, sem exceção, foram produzidos pela série 25 anos, selo criado em homenagem aos
seus 25 anos de teatro, momento em que descortina seu Teatro Essencial por meio da escrita, após longo período de
pesquisa na produção de textos e adaptações para teatro e espetáculos.
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dissertação. No que se refere aos vídeos e fotografias, chamou minha atenção o fato de
reflexo do meu desejo de discutir as características desse ator que se assume como performer e
que aparece sozinho no palco, no desenvolvimento de uma prática que constitui o objeto de
1)Descrição acerca da poética teatral desenvolvida por Denise Stoklos; 2) Discussão dos
conceito de ator no Teatro Essencial de Denise Stoklos por meio da investigação dos elementos
estruturantes de uma abordagem que reconhece no fim das dicotomitas mente/corpo, autor/ator,
ator. Tal abordagem imprime uma transformação ao paradigma de ator, que de ator-intérprete
1 TRAJETÓRIA DA ARTISTA
existe um conceito de ator inerente ao trabalho de Denise Stoklos, quais são as bases de sua
formulação? E, como esta noção foi afirmada no trabalho da artista? Na tentativa de responder a
estas questões, encontrei, nas proposições de Stoklos sobre o Teatro Essencial, alguns
elementos que chamam a atenção para o trabalho de ator centrado no aspecto físico (corpo e
marcada por uma cultura híbrida, própria de seu tempo. Neste sentido, idéias tais como, por
exemplo, “a atriz torna-se já a mensagem em si”, (STOKLOS, 1993, p. 32) indicam uma
concepção espetacular centrada na figura da atriz, aquela que cria e elabora seus próprios
projetos, traduzindo uma noção de ator que tem vínculos com um pensamento cênico pós-
moderno.
Em consonância com este argumento, Márcia Strazzacappa define o artista cênico que
Aquele cuja obra não é um objeto exterior a ele, mas está nele próprio. Em outras
palavras, é aquele que traz em seu próprio corpo o resultado de sua arte. A percepção de
que o corpo do artista cênico é, ao mesmo tempo, o agente e o produto de sua obra de
arte possibilitou a conscientização de que o desenvolvimento de um trabalho corporal
interfere no resultado final da obra cênica, mesmo apoiando-se em outros recursos.
Enquanto agente, o corpo é técnica; enquanto produto, ele é arte (STRAZZACAPPA,
1997, p.163).
sua concepção teatral e como isso repercute em possíveis procedimentos para o ator
interessado na idéia de um Teatro Essencial. Neste sentido, procuro apontar para a presença da
17
idéia de ator essencial no trabalho de Stoklos desde a genealogia de seu processo criativo até a
conceituais com a mímica e a performance art. Para realizar essa tarefa, subdividi a trajetória de
Denise Stoklos em três fases que privilegiam tanto a ordem cronológica dos fatos quanto a
presença de algumas formulações de ação que, ao longo do todo, por vezes ultrapassam as
percurso da artista. As três fases às quais me refiro são: fase do encontro, fase da gestação e
Teatro Performático), que tem como característica comum o fato de serem estrangeiros ao
universo de conhecimento prático no teatro brasileiro até então (1960), e que chegaram ao
mesmo tempo em que Stoklos foi se afirmando no teatro, por meio de contato direto ou indireto,
fases, percebemos que as fases acima mencionadas encontram-se relacionadas entre si pelo
desenvolvimento de uma escrita (texto) que se dá por meio das necessidades da atriz em
destes elementos a cada novo espetáculo, isto é, a repercussão, ao longo do seu percurso
mesmo tempo pela manutenção da liberdade de escolha, tais quadros aparecem enquanto
gesto transformado, figuras de estilo (mímica), presença de música, coreografia, texto, citação,
reprodução, colagem, uso de ponto fixo, gesto transformado, figuras de estilo, máscara facial,
10
A liberdade é entendida aqui como um plano de ação de transformação da realidade vivida.
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experiência no mundo. Conforme esta visão, a liberdade só pode ser alcançada por meio da
partir da liberdade do sujeito encarnado, localizado como ser em relação com o ambiente de seu
dimensão de coisa que todo ser humano tem, é o conjunto das suas determinações. Segundo a
grupo social e situamo-nos em um tempo e espaço que não escolhemos. No entanto, de acordo
com a possibilidade da transcendência, não estamos no mundo da mesma forma que as outras
coisas estão. A transcendência é a ação pela qual o ser humano executa o movimento de ir além
dessas determinações, ainda que não necessariamente para negá-las, mas para dar-lhes
desfaz a idéia tradicional de que de um lado está o mundo dos objetos, do corpo, da pura
realidade externa não aparece da mesma forma à percepção das pessoas, mas se dá a partir da
vivência de cada um; não surge por meio de uma consciência explícita, mas por um modo de
Da relação entre a imanência e a transcendência surge o vínculo vivo entre arte e vida o
qual detecto na biografia de Stoklos e que orienta a minha compreensão de sua obra. Um
exemplo disto diz respeito à segunda fase: o evento da maternidade em sua vida coincide
historicamente com o momento final da ditadura, a partir do qual se passa a observar uma maior
abertura no Brasil. Neste caso, o nascimento do seu primeiro filho pode ser considerado como
metáfora de um novo ciclo que se iniciou na vida da artista, tanto sob o ponto de vista pessoal
quanto artístico. Esta fase também representou um período de isolamento, em que a artista se
submeteu, uma vez mais, ao exercício da escrita, em um retorno ao seu primeiro gesto para com
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o teatro, e ainda, ao encontro com conteúdos estruturantes (temas) que vieram se tornar uma
maternidade e a liberdade.
o sociólogo Jean Duvignaud (1980) articula seu discurso a partir do universo produzido pelo
teatro em relação permanente com as sociedades, não havendo para ele exclusivamente uma
sociedade, mas sociedades, ou seja, diferentes grupalidades que se organizam de acordo com
que a solo performance é uma expressão que emerge das necessidades de seu tempo. Não
apenas pelo quanto se está inserido, mas de que maneira o homem insere-se na sociedade em
que vive. “...es absurdo preguntarse si el teatro refleja a una sociedad, ya que es la sociedad
1980, p. 513). Há, portanto, diferentes níveis de relação espetáculo-sociedade de acordo com
essa visão. Resta-nos saber: quais são? Que tipo de necessidade instalada na sociedade a solo-
performance expressa ou atende? Qual a expressão característica do nosso tempo que melhor
diretamente comprometidas com as tramas da vida e que, por esse motivo, nunca estão fora do
ambiente social. Faz, portanto, referência ao “fora” como um lugar criado e ocupado pelo próprio
homem (o outsider, o que está à deriva ou na periferia), seja pela falta de espaço ou excesso do
mesmo. Assim sendo, este “fora” ao qual se refere Duvignaud é mais uma forma que o homem
outras palavras, o exterior pode ser entendido como uma condição do interior, ambos existindo
e o interior são ambos íntimos; estão sempre prontos a inverter-se, a trocar sua hostilidade. Se
há uma superfície-limite entre tal interior e tal exterior, essa superfície é dolorosa dos dois lados”
11
É absurdo perguntar-se se o teatro reflete uma sociedade, já que é a sociedade realizando esteticamente o
desenvolviemnto enfrentado pela revolução permanente (Tradução da autora)
20
(BACHELARD, 2000, p. 221). A partir desta reflexão, pode-se afirmar que, de maneira análoga,
só existe o grupo porque existe a solo performance como procedimento. A solo performance
Trazendo o Teatro Essencial para este contexto de discussão, pode-se verificar que um
dos seus principais preceitos é o lidar com a transgressão que se origina da tentativa de agir na
de partida for a micropolítica: “Não são mais necessários fuzis, canhões, batalhões ou
guerrilheiros. A tática agora é outra: quanto mais mudarmos o pequeno espaço onde estamos,
mais mudaremos a sociedade”.12 A mudança ocorre, portanto, por meio do engajamento pela
vida, reforçando-se convicções através da postura que o artista assume em sua vida cotidiana,
Neste sentido é que localizo, no Teatro Essencial, o “fora” como elemento próprio do
corpo performático, em seu comprometimento com alternativas oferecidas por este corpo
conexões entre o lugar e o “fora de lugar”, o grupo e o performer, o certo e errado, a obediência
no lugar de alguma personagem, é localizado a persona que serve para designar tanto um papel
discurso de Denise Stoklos aponta para um conceito de essencial que se revela como condição
para a criação de um novo aspecto cênico em consonância com a natureza própria do performer,
partindo do contexto de onde vem, para refletir sobre a realização de um teatro calcado na
12
Entrevista de Denise no jornal Brasil de Fato, Edição n. 128, de 11 a 17/8/2005.
21
essência do próprio sujeito, ou seja, em trajetória própria, única e intransferível e até mesmo
autobiográfica.
Para uma melhor visualização dessa trajetória apresento abaixo um quadro onde estão
continua
22
Conclusão
O caminho escolhido no presente texto foi pensar o trabalho de Denise Stoklos à luz do
sucederam ao longo de sua trajetória, desde a produção do seu Teatro Essencial. Por força
desse tema, que está tão próximo da pessoa Denise Stoklos, não se pode desconsiderar fatos
importantes que aconteceram no decorrer da vida da artista como um elemento a ser vinculado
com os processos criativos abordados. Daí a importância da presença, neste texto, da menção
23
de eventos de sua vida pessoal que julgo terem sido transformadores do seu teatro como, por
exemplo, o tempo de estudos na Europa e a já citada maternidade. Além disso, fatores históricos
contato com a obra da artista. Para tanto, adotei um enfoque cronológico, pois este é mais claro
de iniciação e formação artística de Denise Stoklos. Em 1968, então com dezoito anos de idade,
PUC. Além disso, neste período, participava como editora de um telejornal local, em um quadro
de editoria sobre assuntos do dia. Seu desabrochar para o teatro começou pela produção de
textos para o teatro e, se por um lado, esta é uma atividade que se caracteriza pela
individualidade e até mesmo por certo grau de isolamento, seu trabalho como escritora era,
Ferramenta. Textos, portanto, que envolviam a presença de várias personagens – ou seja, uma
escrita de diálogos, não de monólogos. Seus primeiros textos com este caráter incluem: Círculo
na Lua, Lama na Rua (1968), A Semana (1970), Vejo o Sol (1970), Mar Doce Prisão (1971) e
Denise Stoklos iniciou sua carreira com o espetáculo Círculo na Lua, Lama na Rua
(1968), de sua própria autoria, no qual, além de atuar, foi também responsável pela cenografia,
direção e produção. Após esta primeira experiência de caráter autodidata, no estado do Paraná,
ofício no qual a experiência viva foi condição imprescindível para seu desenvolvimento e
aprendizado.
24
Apesar de seu trabalho ter experimentado maior destaque no que tange à solo
particular na fase que compreende historicamente o período da ditadura militar. Neste período,
destaca-se a sua experiência com espetáculos realizados em grupo, sendo natural que o fato
sócio-político da ditadura tivesse motivado Denise Stoklos – assim como outros artistas,
grupo) alguma resposta para o momento cultural e político vivido pelos brasileiros neste período,
Em 1968 criou o Grupo Ferramenta tendo, reunindo atores motivados pela possibilidade
de fazer teatro através da montagem do texto Círculo na Lua, Lama na Rua. No exemplo abaixo,
o registro histórico da fundação do grupo, em uma foto na qual vemos o grupo reunido em
meados de 1968, composto pelos atores locais, podem ser vistos logo abaixo em pé esquerda
para a direita Humberto Schaich, Cristóvão Tezza, Denise Stoklos, Joatan e, sentados Vera
Salamanca, Gilberto Camargo, Wanda Cristina, Ciro Camargo, Heloisa Rodrigues e Raul
Bianchi.13
Fonte: http://www.cristovaotezza.com.br
13
Foto estúdio Bianchi, de Ponta Grossa (PR), 1968 ou 1969.
25
trabalho que colocasse ênfase no aspecto físico da arte do ator. Este grupo tinha como
referência o teatro desenvolvido por Wilson Galvão Rio Apa em Antonina, no litoral do Paraná e
posteriormente em Florianópolis (Santa Catarina). Também jornalista, ator e diretor de teatro, Rio
Apa tinha como projeto de teatro, neste mesmo período, unir a arte à vida. Stoklos encontrava-se
motivada pelas experimentações de Rio Apa, como a negação da literatura ou qualquer texto fixo
... Rio Apa descarta não só o texto fixo, mas a própria palavra, propondo um teatro de
catarse em contrapartida a uma arte que, limitada racionalmente a um texto escrito, lhe
parecia então morta e sem perspectivas. Mais uma vez, estamos diante de um trabalho
que se recusa a ser apenas um objeto estético; na verdade, a proposta de Rio Apa supõe
uma atitude diante da vida, uma revolução pessoal. O seu teatro sem palavras deveria
representar o mergulho do ator em sua realidade subterrânea, digamos assim, para
"purificá-lo", retomando o clássico sentido aristotélico sobre a função catártica da
tragédia. Abandonando os palcos convencionais, apresenta suas peças em bares e locais
públicos de Curitiba e São Paulo - a proposta assumida por ele terá pontos de contato
com a teoria do polonês Jerzy Grotowski e seu espetáculo ritual fundado em arquétipos e
centrado no ator, que só mais tarde chegaria ao Brasil (Cristóvão Tezza. Site
http://www.cristovaotezza.com.br> acesso em: 01 de abril de 2007).
Neste momento, por ser estudante de jornalismo e ciências sociais, a principal influência
consta no depoimento de Maria Amélia, amiga de Stoklos da juventude, para o tablóide digital 14.
... até que ponto a Denise amiga, conservou sua modéstia e simplicidade dos dias em
que chegando a Curitiba, no inverno de 1966, aqui recebia suas primeiras informações
artísticas. Nos tempos em que Jamil Snege e Wilson Galvão do Rio Appa eram espécies
de gurus culturais em saudáveis reuniões boêmias artísticas que cruzavam a madrugada
da Velha Adega, Denise ali, embevecida, ouvia os amigos mais velhos e experientes, em
torno das coisas da arte e literatura (http://www.tabloidedigital.com.br> acesso em 30 de
outubro de 2006).
14
O texto foi produzido pelo jornalista Aramis Millarch, que trabalha há mais de trinta anos como jornalista com
foco em cultura e história no estado do Paraná, o Tablóide digital reúne textos publicados desde 1957.
26
Sua estréia no teatro deu-se em espaço universitário, o que leva a crer que Stoklos já
tinha apreendido noções básicas sobre teatro e alguma técnica especifica de atuação do
romancista Cristóvão Tezza, que participou do movimento teatral de Curitiba das décadas de
sessenta e setenta e que fez parte do Grupo Ferramenta, confirma que Denise Stoklos teria
sofrido influência do teatro provocativo de Wilson Rio Apa, que naquele período era rico em
idéias de liberdade, não sendo Stoklos figura tão autodidata como costuma afirmar ter sido.
Cristóvão Tezza afirma que participou também de performances teatrais orientadas pelo diretor
Rio Apa e que, contava com o apoio do espaço universitário para ensaios e eventuais
A criadora, líder, autora, diretora do grupo era a Denise. Lembre-se de que eu tinha 16
anos, por aí, ávido por participar de tudo que contestasse o sistema. Tenho agora comigo
o livro da Denise com o texto da peça de que participei: "Círculo na lua, lama na rua".
(Edição O Debate, 1969). Impresso em Irati. Diz o texto da primeira página: "Círculo na
Rua, Lama na Rua estreou no dia 27 de novembro de 1968, numa produção do Grupo
Ferramenta, da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Paraná, no Teatro de
Bolso de Curitiba. Seguem os nomes do elenco e equipe. Eu apareço no item
"Iluminação". Sintomaticamente, a epígrafe é uma frase de Alceu Amoroso Lima:
"Precisamente por serem filhas da liberdade, as artes constituem um fator de libertação
dos povos" (TEZZA, informação verbal 02 de maio de 2007).
Stoklos que, neste sentido, após o período da ditadura, declarou: “Fui sempre militante. Nunca
pertenci a nenhum centro acadêmico nem fui filiada a nenhum partido ou organização nunca,
mas estive em muitas passeatas, nos movimentos estudantis de rua e de alma”. (STOKLOS,
1993, p.26).
27
A militância mencionada por Stoklos, ao dizer “de rua e de alma”, parece chamar atenção
para a necessidade de acrescentar valor àquilo que está fora de ambientes formais ou à mercê
não pertencer a uma instituição ou movimento específico), procedimento que pode ser definido
como anárquico. Amplamente defendida pela artista, essa forma de “militância” pode ser
compreendida como uma forma de dar importância ao devir, aos bons encontros provocados
pelo acaso (da rua) ou por ideais em comum (da alma). Na execução de ações ou movimentos
para ir além das determinações oficializadas, não necessariamente as nega, mas lhes dá um
Como resposta a esta condição, ainda no Paraná, surgiram algumas tentativas de ações
paranaense que vinha se afirmando no âmbito universitário aos poucos passou a buscar
espaços alternativos, como a Velha Adega em Curitiba, que servia de ponto de encontro para
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artistas, escritores e filósofos. Ao mesmo tempo esse teatro começou despertar interesses,
sendo que desta ocasião datam dois textos de crítica ao trabalho de Denise Stoklos: "O Círculo
de Denise", por Philomena Gebran (1968), artista plástica bastante conhecida no Paraná; e
"Denise fez um círculo na lua com ferramenta", pelo jornalista Doream (1969).
Esse interesse pela cena teatral universitária no Paraná se deu pela necessidade de
época, gerando novas perspectivas e trocas com experiências tanto da Europa, como do
restante da América Latina, conforme descreve Doream Jr. em sua crítica ao espetáculo Círculo
A peça termina com uma seqüência de slides coloridos, onde são focalizadas as duas
personagens: a que luta e participa. E a outra que se omite, mas que alcançou sua
realização pessoal. Aliás, estão aí as duas opções: lutar ou fugir. E ambas são válidas,
desde que ato consciente. No texto do Círculo a segunda personagem torna-se útil à
nova ordem estabelecida, após o fechamento da fábrica de violinos desafinados, quando
é chamada a fazer a fórmula do verniz para os novos violinos. E como última figura
projetada, surge Che Guevara, não como símbolo revolucionário, mas como expressão
da devoção, da persistência e dedicação total a uma causa; como exemplo de renúncia
ao luxo e honrarias para entregar-se ao ideal (JR. DOREAM, 1969).
É neste clima que Stoklos inicia sua carreira no teatro, tomada pelo pensamento
ideológico daquele momento, sendo possível perceber que seu fazer teatral chamava atenção
perceber que, do ponto de vista estético, isso se dava à maneira de Rio Apa, Isto é, a vida que
aparece colada à arte. No espetáculo Círculo na Lua, Lama na Rua (1968) a maioria das
personagens recebeu o mesmo nome dos respectivos atores, como por exemplo: Vera (Vera
Salamanca), Wanda (Wanda Cristina), Raul (Raul Bianchi), Denise (Denise Stoklos) e Heloisa
(Heloisa Rodrigues). Havia ainda o uso de projeção de slides15, onde os atores/ personagens
aparecem sugerindo uma luta, na qual a última figura projetada é a de Che Guevara, “não como
15
O slide como precursor das atuais projeções de imagens freqüentemente utilizadas no teatro
contemporâneo, foi retomado por Stoklos nos espetáculos: Olhos Recém Nascidos (2005) e Selvagem como o Vento
(2002), período em que Stoklos afirma estar trabalhando com elementos políticos mais sofisticados, chamados de
micropolitica.
29
Segundo Stoklos, o Grupo Ferramenta já nasceu com caráter profissional, sendo que sua
primeira montagem, o espetáculo Círculo na Lua, Lama na Rua16 - escrito, dirigido e produzido
pela própria artista, com estréia no mesmo ano de sua criação, contava com produção e também
Na ocasião de sua estréia no teatro, foi convidada pelo diretor de teatro mais experiente
de Curitiba naquele momento, Oraci Gemba para fazer duas substituições como atriz, nos
espetáculos Arena Conta Zumbi (1970) e Arena Conta Tiradentes (1970), ambos no Teatro Paiol
textos que na época já haviam sido consagrados no Brasil através de produções do Teatro de
Arena de São Paulo. Gemba também dirigiu Stoklos no texto Via Crucis (1970), de autoria da
própria artista.
condição cultural de alguém que, como a própria artista afirma: “sendo e vindo de um sul já não
representado (no meu país nem o sotaque paranaense entra no palco), eu já vivia um isolamento
que me impelia à crítica”. Então sai de Curitiba para Rio de Janeiro e São Paulo “em perseguição
busca destes dois elementos pode ser definida como uma provocação ao seu próprio universo
grupo, Stoklos teria a chance de sair do contexto ao qual ela denominava de isolamento.
16
“É uma história de uma cidade onde todo mundo toca violinos, e ninguém percebe que os violinos são
fabricados por uma fábrica só e estão desafinados. Aí o clube dos artistas, que tem o ouvido mais afinado, começa a
fazer vários tipos de ação. Uns acham que tem que chegar e pedir para alguém tocar uma peça bem difícil. Ao
requisitar uma peça mais difícil, ele percebe que o violino está desafinado. Outro grupo acha que não, acha que é
contando, contando. Outro grupo acha que... enfim, eram essas teorias maoístas, diversas formas de se conscientizar,
as pessoas de que o sistema estava errado. E aí se descobre que só tinha uma usina capaz de movimentar uma
fábrica. Então o que era preciso era não só desmontar a fábrica, mas chegar até a usina. E uma das pessoas do clube
dos artistas não consegue suportar o barulho desafinado, e vai embora, diz que vai morar numa outra cidade. Porque
ela quer estudar química. E aí na hora que eles estão chegando na usina, e eles querem fazer um novo violino. - Estão
fazendo a revolução, quebram todas as máquinas e tal - tem que fabricar um novo violino, tem que fazer um verniz,
mas ninguém sabe fazer um verniz de um novo violino. E aí volta aquela que foi estudar química. Então ela foi útil
também na revolução. Porque você pode ser útil de várias formas. Não é só pegar na arma e ir para o mato. E era,
claro, ligado ao 68, que foi o momento mais apertado da ditadura no Brasil” (CANCIO, 2006).
17
Antigo paiol de pólvora construído em 1906 e reciclado para teatro de arena em 1971. Sua inauguração
teve batismo do poeta Vinícius de Moraes, que compôs música especialmente para a ocasião. Símbolo da
transformação cultural de Curitiba.
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Denise via a si mesma como ilhada. Mas ao nos perguntarmos em relação a quem ou ao o quê
especificamente, percebemos que tal isolamento não era absoluto. Conforme depoimentos
coletados em entrevistas com Cristóvão Tezza e Romário Boreli, sabe-se que Stoklos, além de
trabalhar no Grupo Ferramenta e contar com o espaço da Universidade para apresentar seus
trabalhos, estava em contato direto com os diretores mais importantes de Curitiba naquele
Tampouco havia grandes abismos entre a técnica utilizada pelos atores de Curitiba e os
atores dos grandes centros tendo em vista que, naquele momento, o Teatro Guaíra desenvolvia
com a produção de outros estados do país. Não devemos considerar, portanto, a saída de
Stoklos de Curitiba como busca por uma técnica específica, mas como uma ação impelida pela
relacionar-se com novos contextos e novas subjetividades que nascem da dialética entre o
indivíduo e sociedade. Somente essas novas relações poderiam delimitar o tipo de técnica a ser
buscada, bem como conhecer a própria técnica a qual ela então detinha. Daí compreende-se a
percepção de isolamento à qual Stoklos faz referência, que nos remete também à distância em
relação aos centros teatrais mais dinâmicos do país, tais como São Paulo e Rio de Janeiro.
Denise Stoklos afirma que: estes foram os “anos que englobam todo o período de meu
contato profissional com o teatro (iniciara escrevendo, dirigindo, produzindo e atuando em 68.
Coincidência que tenha sido também o ano de emersão dos estudantes franceses?)” (1993, p.
26). Assim o foi no Brasil no período em questão, no que se refere à necessidade pela
pela censura. Convém mencionar outros artistas que, ainda no período em questão, foram
obrigados a sair do país em busca de uma pátria que os abrigasse, tais como José Celso
Martinez Corrêa (no exílio de 1974 a 78) e Augusto Boal (no exílio a partir de 1969). Enquanto
31
isso, os que aqui ficaram foram obrigados a encontrar estratégias e saídas para o complexo
Tinham ainda como exemplo a rebeldia dos jovens do Maio Francês e dos punks – os quais
chegaram posteriormente ao Brasil e se mantém com bastante expressão até hoje em capitais
como Curitiba.
ditadura e censura ainda tinha como alicerce modelos estéticos oriundos da Europa, modelos os
dramaturgia própria e formação local de atores. Com a ditadura, foram dados alguns passos
importantes para mudar o quadro deste período, sobretudo por meio da produção de
dramaturgia que, ainda que tivesse de driblar os censores da época, davam voz às
político, talhados pelo perfil do povo brasileiro, o que pode ser visto em textos como: O Rei da
Vela (Oswald de Andrade,1933), Roda Viva (Chico Buarque, 1967), Se Correr o Bicho Pega se
O contexto social no qual se deu a primeira década da carreira de Stoklos foi, portanto,
marcado pela ditadura militar, período na política brasileira (1964 a 1985) caracterizado por uma
18
Carlos Alberto do Santos é o autor do texto acima citado. Desde 1999, o site HistoriaNet, é coordenado
pelo Cláudio Barbosa Recco, formado em história pela USP.
32
era desencorajado pela sociedade militar no poder e pela sociedade civil no terror”. (1993, p. 26).
ordem política e repressão aos opositores da regularidade militar. É preciso reconhecer que as
diretrizes ideológicas do trabalho de Denise Stoklos, bem como a elaboração de sua noção de
teatro tiveram seu encaminhamento senão determinado, ao menos influenciado pelo fato de sua
... Eu tive sorte de ter 18 anos em 68, de estar na universidade naquela época. Nunca fui
líder estudantil, nunca fui presa, torturada ou exilada por imposição. Mas convivi com
colegas que tinham liderança e com os quais eu entendi que não era possível pensar o
Brasil de uma forma macro, porque tudo naquela época era tão difícil, pequeno e limitado.
E isso me acompanhou por todo o tempo, desde que sai da universidade e comecei
minha vida teatral, vindo para São Paulo e Rio. Quando comecei a ser vista como uma
boa atriz na juventude, o único caminho era tornar-me intérprete de novela de sucesso.
Não havia possibilidade de encontrar companhias ou grupos que desenvolvessem uma
linguagem própria, o medo era grande...
A mudança de Denise Stoklos de Curitiba para o eixo Rio de Janeiro - São Paulo se deu
tendo em vista a realização de testes para atuar em espetáculos, tendo trabalhado em diferentes
espetáculos teatrais, tais como: Missa Leiga (1973), com o ator Sérgio Brito no elenco, sob a
direção de Ademar Guerra, e Bonitinha, mas ordinária (1974), dirigida por Antunes Filho e cujo
elenco contava com a presença de Luiz Antonio Martinez Corrêa e Cacá Rosset. Participou
ainda de peças curtas de Brecht, como Sai de mim, Tinhoso (1976) com direção de Luis Antônio
Martinez Corrêa, e ainda de espetáculos dirigidos por Mario Masetti, Roberto Vignati e Fauzi
Arap. Sob a direção de Antonio Abujamra, trabalhou em teleteatros da TV Cultura. Mais tarde,
em 1983, Stoklos criou e dirigiu outro grupo – este sem nome – com o qual montou o espetáculo
Maldição, e que tem sua duração associada ao tempo em que o espetáculo ficou em cartaz. Este
espetáculo traz consigo um dado curioso: a participação de sua família (pais e filhos) em cena.
Já na década de 90, em Elogio (1995), dividiu novamente o palco com seus dois filhos, além da
cantora Cida Moreira e o designer Fabio Namatame. Em Santos Dumont (1996), contou com os
33
pequenos monólogos.
Desde 1979 até os dias atuais, Stoklos vem dividindo seu tempo entre a solo
performance e espetáculos feitos para ou com grupos ou artistas de teatro, além de que,
paulatinamente, vem se dedicando ao ensino do seu teatro, por meio de cursos, projetos e aulas.
Tanto no Brasil quanto em Nova Iorque, Denise Stoklos tem procurado, através da experiência
pedagógica, consolidar e divulgar um pensamento teatral. Para tanto, ela não se dedica apenas
à exposição de técnicas visando sua reprodução – pelo contrário, sua ênfase pedagógica está
na proposição de reflexões de caráter filosófico. Por isso, diferentemente das características que
se costuma atribuir ao seu trabalho, isto é, um certo individualismo ou isolacionismo que advém
da figura do artista solo performer, sua trajetória perpassa até hoje a experiência do coletivo.
Seu trabalho individual encontra articulação com seu trabalho coletivo à medida que
realiza a extensão de uma idéia autocentrada para um âmbito ampliado. Durante os dez
primeiros anos de sua carreira (1968 a 1979), Stoklos trabalhou em diversas peças e – conforme
expressão comumente utilizada por ela - “freqüentou” entre os anos de 1973 a 1979, importantes
diretores de teatro entre o eixo Rio de Janeiro – São Paulo, tais como: Ademar Guerra, Antunes
Filho, Antonio Abujamra, Fauzi Arap e Luis Antonio Martinez Corrêa. Posteriormente seguiu, em
1979, para Londres, onde foi estudar mímica. Estaria Stoklos, neste período, em busca de novos
Stoklos trabalhou como atriz sob a direção de Antunes Filho no espetáculo Bonitinha,
mas ordinária, e ainda em uma de suas telenovelas – A Serpente – realizada na extinta tevê
Tupy em 1974 (ambos com dramaturgia de Nélson Rodrigues). Antunes Filho é um dos mais
renomados diretores do teatro brasileiro contemporâneo e sua proposta para o percurso artístico
do ator tem um ponto em comum com os preceitos stoklianos, o qual diz respeito à conquista
gradual de autonomia por parte do ator. Neste sentido cabe situar um pouco da trajetória artística
34
de Antunes Filho19: o Grupo Pau Brasil surge em 1978 sob sua direção, com uma estrutura
meio de uma pesquisa sobre a obra Macunaíma de Mário de Andrade. Dois anos após o
Sensível aos acontecimentos no cenário político do país, o grupo Macunaíma precisou redefinir
sua estrutura de funcionamento nos idos dos anos 80, que correspondem ao período final da
ditadura.
particular e pessoal de cada sujeito, diretor e ator, dentro e fora da cena? Abandonando o
passou a funcionar como grupo não estável e submetido à direção de Antunes Filho. Este diretor
passou então a conduzir, no CPT - Centro de Pesquisas Teatrais (subsidiado pelo SESC - São
Em 1998, Antunes Filho deu início a um projeto que dava total ênfase a tais abordagens:
ator como criador e responsável pela própria cena, desde a criação do argumento, passando
pela confecção do texto, à criação da cena, o que estabelece uma nova autonomia para o ator,
O Prêt-à-Porter é a busca do afastamento, para chegar à sensibilidade. O afastamento nada mais é do que
"saia da paixão e vá para a sensibilidade". Se você ficar tomado de emoção, fica travado. Mas o "Prêt-à-
Porter" ainda não é a sensibilidade plena, que o ator só vai poder alcançar com a colocação vocal. Corpo e
voz são uma coisa só. Não adianta só ensaiar voz, que não vai resolver; não adianta só ensaiar corpo. Tenho
que ensaiar as duas coisas. No "Prêt-à-Porter" ensaiei muito corpo, mas havia muita ansiedade ainda. Para
mim, a voz é a coisa fundamental do teatro. Estou chegando agora a essa conclusão, com "Fragmentos
Troianos", embora as pessoas não saibam ler e estejam estranhando o espetáculo. No início, nos primeiros
dias, a maioria era contra esse tipo de voz. Agora, já mudou. Estão vendo a eufonia da língua portuguesa.
19
Antunes filho, um dos importantes diretores com quem Denise Stoklos trabalhou, no projeto para teleteatro:
A serpente, de Nelson Rodrigues, na extinta tv tupy. Vale destacar que trabalharam juntos e apesar de Antunes filho ser
de uma geração anterior a de stoklos, ambos receberam influência de um mesmo período em comum, que foi a
ditadura, assim que mediante a passagem deste momento histórico reelaboraram seus projetos artísticos.
20
“O sucesso nacional e internacional, as muitas viagens e crises no sistema de cooperativa obrigam a
mudanças e o elenco passa a ser conhecido como Grupo Macunaíma, depois de 1980. No ano seguinte, já renovado,
estréia Nelson Rodrigues - O Eterno Retorno, baseado em quatro textos do autor. Nesse formato, ou na abreviação
Nelson 2 Rodrigues, faz 231 sessões, igualmente excursionando pelo exterior, até 1985. A complexidade do
empreendimento e as constantes viagens obrigam seja redimensionada a infra-estrutura, as condições materiais e o
aprofundamento da pesquisa contínua. Transferido para o Sesc São Paulo, o grupo encontra tais condições, através da
fundação do Centro de Pesquisa Teatral, CPT, em 1982” www.itaucultura.org.br > acesso em: 20 de junho de 2006.
35
Antunes Filho inaugura uma nova teatralidade (1998) com o projeto Prêt-à-Porter, tendo
como ponto de partida o imaginário do ator, onde a representação é dada a partir de suas
de um texto próprio e na direção dessas cenas. Estes procedimentos são considerados por
Antunes Filho (que define seu papel neste projeto como o de um “coordenador”) como novos
Revista Camarim (2004), Antunes Filho ajuda-nos a compreender o que ele espera de um ator:
Parei para me dedicar ao ator. Só tenho saída para fazer um bom teatro se eu me apoiar
no ator... Eu tenho que jogar tudo fora. Preciso deixar o ator com ele mesmo, torná-lo
simples, humilde, franciscano. Limpar tudo, permitindo o contato com a sua
espiritualidade. O Prêt-à-Porter é uma limpeza, a queima dos estereótipos, o ator com
técnica e consciência de sua arte, dono da sua expressão. E esse encontro com a própria
espiritualidade transcende a realidade, embora imite-a. Você está jogando e ao mesmo
tempo está entregue num outro nível. Justamente por isso é falso.
encontramos em ambos um discurso que solicita do ator múltiplas qualidades, não restrito
exclusivamente à atuação. Nos dois casos, o trabalho do ator não se fechou em si, mas se deu
em outras instâncias, antes mesmo da cena propriamente dita, desde a escolha de um tema,
passando pela confecção de um texto até a criação da cena. A necessidade pelo engajamento
na realização da performance do ator reflete-se numa atitude autônoma nas escolhas dos temas
abordados, ainda que sob coordenação artística de um ou de outro diretor. A disciplina técnica,
no caso de Antunes, configura-se em seu método particular de ensino com foco no uso da voz,
enquanto em Denise Stoklos, dentro das perspectivas do Teatro Essencial, as atenções voltam-
21
O site Teatro Brasileiro existe desde 1999, o responsável pelo site é o ator Dário Yama.
36
Nos últimos anos da ditadura militar apareceu, no teatro brasileiro, a fase da “supremacia
dos diretores” (FERNANDES, 2000), ao passo que, à medida que a democracia foi restaurada,
trouxe também consigo um deslocamento das necessidades dos diretores e seus respectivos
grupo, o que aconteceu com alguns dos grupos de teatro que viveram esse período de transição.
afirmação da trajetória de Denise Stoklos como artista. Nesses casos, os valores hierárquicos
próprios da cena tradicional e da estrutura de grupo de teatro foram subvertidos, dando vazão a
uma noção formal mais individualista, mais centrada em cada sujeito. A figura do ator – que no
Brasil também passou a ser chamado de performer – passou a obter status de artista
consta como sendo “vinculo vivo entre o texto do autor, as diretivas de atuação do encenador e o
pontos de vista: cantando, dançando, realizando mímica, fundindo diferentes habilidades em prol
da cena. As idéias de Stoklos produzem uma noção de sujeito que constrói sua dramaturgia a
ator/performer que representa ‘sendo’, e faz um teatro que é encontro porque é exposição do
sujeito social que é o ator no Teatro Essencial.Tal dramaturgia pode ser entendida como uma
busca pela essência do ser que se revela para uma platéia, cujo eixo central está na cena, na
revelação do ator para a platéia. Stoklos eliminou tudo o que considerava supérfluo ao seu fazer
teatral.
tomando o exercício de desconstrução como instrumento para iniciar seu trabalho. Empurra,
assim, o corpo para o centro da cena, fazendo deste o produtor de idéias e construtor de
linguagem própria.
Na segunda fase, chamo atenção para o duplo sentido que o termo “gestação” carrega.
Ao mesmo tempo em que a palavra indica o lapso de tempo vivido entre e durante as gestações
de seus dois filhos Thais e Piatã, refere-se também à “solidão” artística do período, e ao possível
impacto que isso teve no que se refere a uma retomada de sua produção textual. Neste período
“aconteceu para mim o fato mais importante de minha vida: a maternidade. Meus filhos me
ensinaram o sagrado, e desta revelação nunca mais se recupera. Tudo foi se resgatando do
Presente desde o início de sua trajetória, o exercício da escrita foi interrompido quando o
enfoque de Stoklos passou a ser exclusivamente voltado à sua produção como atriz, a partir de
retorno marcado justamente pelas gestações, ocasião em que “se deu o inadiável reencontro:
minhas possibilidades autorais teriam de ser levadas agora ao extremo, a sério, ao concreto”
vínculo com o teatro. São relevantes dois pontos: a formação de técnica corporal por meio do
estudo da mímica e – como conseqüência desta – uma compreensão da dramaturgia além das
teatro que, segundo Stoklos, tem características próprias, do mesmo modo que cada filho é
único e exclusivo para sua mãe. Ainda assim, é possível encontrar semelhanças com outros
artistas com trabalhos solo: os italianos Dario Fo e Franca Rame, por exemplo, reviram modelos
monólogo Tutta casa, letto e chiesa, que em tradução brasileira recebeu os nomes de Um
que só vai consolidar suas características próprias na próxima fase (nascimento) – aparecerá,
portanto, na forma como esta artista irá organizar e compor os elementos formais e estruturais
No início da década de oitenta, logo após uma temporada de um ano estudando práticas
teatrais na Europa, onde freqüentou aulas de mímica com Desmond Jones e de técnicas de
clown com Frank Anderson23, Stoklos começou a ganhar projeção frente à crítica especializada
por meio de espetáculos calcados na técnica, sobretudo na mímica. São dessa fase, por
exemplo, Elis Regina (1982) e Mary Stuart (1987), este último com estréia no teatro La Mama24,
em Nova Iorque. Seguiu-se o convite feito a Stoklos pela própria coordenadora do La Mama,
22
Segundo Veneziano (2002), há registros desta montagem na biblioteca da Compagnia Teatrale Fo e Rama.
23
posteriormente com Leonard Pit na Califórnia
24
O La Mama e o Living Theatre surgiram praticamente de forma concomitante, mas enquanto o Living
enveredava por caminhos mais próximos ao happening, o La Mama dava vazão ao teatro experimental nova-iorquino
dos anos 60. O teatro viu nascer as carreiras de Robert Wilson, Philip Glass, Andrei Serban, Meredith Monk, além de
abrigar trabalhos experimentais vindos de todo o mundo, como os espetáculos de Grotowski e de Tadeusz Kantor.
(FERNANDES, 1996, p.7)
39
autoral. Fazem parte deste período os espetáculos: 500 Anos - Um Fax de Denise Stoklos para
maternidade e com ela, o retorno ao exercício da escrita por ela chamada de solitária, cujo foco
está na elaboração da linguagem cênica. Neste ponto, a palavra falada passa a ter uma
importância diferenciada em seu trabalho. “Recomenda-se à atriz que leia trinta e uma vezes a
cena 4 do ator 3 , de Hamlet, a da morte de Polonius atrás da cortina... Cada nova leitura deve
lhe trazer mais evidencia sobre a vulgaridade dos que exercem o poder” (STOKLOS, 1995, p.
40). Pode-se detectar isso em seus espetáculos, à medida que Stoklos descobre, na idéia de
performer, o sujeito que deixa de estar calado, anunciando o início de uma nova fase, onde o
texto é entendido como roteiro ou idéia para a projeção do corpo no espaço, ou ainda, como
artilharia para discutir alguma questão por meio de textos fragmentados, silêncios com foco na
Os temas centrais encontrados em seus textos a partir daí passam a ser: a liberdade, o
amor e a maternidade, um pouco diferente do que vimos na fase anterior na qual os assuntos
pós-moderna, no trabalho de Stoklos é o fato da atriz dispor de uma grande liberdade de escolha
25
Termo criado por Denise Stoklos proveniente da palavra inglesa deface, que significa desfigurar, deformar.
40
responsabilidade como artista. Cabe neste sentido um paralelo com a Commedia dell`arte,
contexto no qual o ator se via frente a uma ampla gama de possibilidades técnicas para
meio do uso da narrativa como forma de contar fatos e histórias. A aplicação de citações ou
servia como carta na manga para que a improvisação se desse em resposta a alguma reação do
pelo conhecimento de uma gramática plástica comum que se revela pelo uso do gesto mímico,
máscara (facial), enquanto material técnico, contribuiu para o surgimento da segunda fase
(gestação) na trajetória de Stoklos, na qual o seu interesse aponta para o corpo como suporte de
escola Desmond Jones, apoiando-se nas pesquisas de Etienne Decroux e Jacques Lecoq. Com
base na disciplina técnica como plataforma para a ciência de sua arte, libertou-se do que
Londres, seu primeiro espetáculo solo: One Woman Show (1980), no qual assumiu os papéis de
autora, diretora, produtora e atriz, com base nas técnicas de mímica apreendidas, até então. Na
verdade, One Woman Show (1980) foi seu único trabalho que pode ser considerado estritamente
Como essa linguagem era pouquíssimo explorada no Brasil – tínhamos apenas o grande
Ricardo Bandeira –, fiquei marcada pela mídia como mímica. Mas todos os meus
trabalhos seguintes foram a mescla de gesto e palavra sob uma dramaturgia que
considera o social e o institucional e que chamei de teatro essencial”, explica. Para ela, a
função do teatro é incitar reflexão e apontar as perversões do sistema sociopolítico-
econômico. Habitué do teatro político, está no centro de suas preocupações pensar o
Brasil para transformá-lo. (Jornal Spiner:
http://www.spiner.com.br/JornalSpiner/noticias.php?subaction=showfull&id=1156365995&
archive=&start_from=&ucat=33>26 acesso em 30 de outubro de 2006.
Foi, portanto, no silêncio da mímica que Stoklos encontrou possibilidades mais profundas
voz, a voz no corpo, a língua como desafio coreográfico, e outros desdobramentos. Descobriu
cênico. Assim, constrói para si uma mímica que integra a voz ao corpo, mergulhando na
expressão das sonoridades das palavras, por meio da repetição enquanto linguagem, para
explorar outros níveis de presença e experiência cênica, através daquilo que chama de
defacetação.
Se na língua portuguesa essa palavra não existe e na língua inglesa a palavra deface
sIgnifica deformar, desfigurar, Denise inventa um novo vocabulário, “aportuguesando” a
palavra que para ela passa a significar ver as diferentes faces de uma mesma idéia, de
um mesmo sujeito, de um mesmo objeto real ou ficcional (MOURA. 1998, p.11).
frutos, de ação transgressiva que ganham dinâmica própria a medida que são solidificados e
26
O Jornal virtual Spiner é um espaço destinado para jovens e diferentes grupalidades, foi lançado no ano de
2004, e tem como colaboradora a jornalista Suzi Capó que desenvolveu uma tese do doutorado sobre a partir do
trabalho de Denise Stoklos.
42
do corpo com foco no tronco, ao mesmo tempo em que critica o universo o império do texto,
Stoklos se afirma na palavra e no uso do corpo. Concentra-se em: mãos, rosto, pés, na
com foco na musculatura) e no esforço. Sobre a técnica de Stoklos, Yan Michaski diz:
Por trás do resultado convincente está não só uma inteligência criativa, mas também uma
técnica segura e variada. Gestos nítidos, precisos, desenhados com elegância; um
domínio do corpo que permite extrair efeitos surpreendentes desse fundamento da
gramática mímica que é a variação rítmica; um rosto expressivo, versátil, capaz de
27
intensas mutações. (MICHASKI, 1981, p.2) .
Em 1982, a artista viajou para a Califórnia, onde estudou com Leonard Pit (discípulo de
Decroux) e, a partir desta experiência, com o trabalho de desconstrução gestual, criou um novo
espetáculo solo chamado Elis Regina, composto por coreografias para músicas interpretadas
arbitrariamente partes fragmentadas do corpo, sobretudo rosto (máscara), mãos e pés, como
centro expressivo para a construção da cena Essencial. Todos os trabalhos que se seguiram a
este passaram a se caracterizar, segundo a própria Stoklos, pela fusão entre gesto e palavra,
sob uma dramaturgia focada em questões relacionadas ao social e o institucional por meio de
desenvolvimento.
27
MICHALSKI, Yan. Denise Stoklos, uma artista do gesto. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 2, 03 fev. 1981.
43
Olhe o palco vazio. Não foi o mesmo que ocupou a genialidade das peças de
Shakespeare, a audácia de Molière, abrigou os culhões de Artaud? Não, esta atriz, este
ator não há de traí-los, nem a este público, de uma ou de vinte mil pessoas, que não sabe
que está por um fio a sua vinda até aqui. E os gênios do teatro que já se foram e
deixaram este palco não podem mais fazer nada por você. Você é quem tem que honrar
suas memórias. Vai à luta. Manda ver. Solte as energias todas, dirigidas ao cerne de
cada ser que estará ali. Há um coração, uma mente e um universo bem palpável na sua
frente, em cada poltrona. Execute o ritual. Abra a sessão. Jogue-se no abismo e plaine
acima, retire-lhes o diesel das ruas, conduza-os ao paraíso instigante e fértil da arte que
entregaram a você para monitorar. Solte o cinto e boa viagem, ator. Você sabe que no
final do rito o suor de sua testa é água benta que te unge do poder divino de ter bem
servido, como um elo nesta corrente: a dos comediantes. Vale a jornada que seja
paroxista, camarada, como uma plena trepada (STOKLOS, 1995, p.14-15).
Foram necessários vinte e cinco anos de experiência com o teatro para que Denise
Stoklos desenvolvesse sua proposta estética, que ela mesma considera uma proposta brasileira,
conforme ela afirma no seu livro/manifesto Teatro Essencial (1993). A publicação, que faz parte
de uma série intitulada 25 Anos, além de estabelecer um marco na trajetória de Denise, nos
ao que quer que fosse original eram os padrões estabelecidos” (STOKLOS, 1993, p.26).
destacar do coro para interpretar o deus Dionísio transgride a cena, criam-se ao mesmo tempo
as noções de protagonista e monólogo, colaborando para o que hoje Stoklos afirma ser a
espetáculos realizados a partir de um ponto no qual a artista consolida uma prática espetacular
caracterizada pela presença solitária da atriz em cena, ora em monólogo, ora em solo
performance, e formaliza sua noção de ator e de teatro, através dos princípios por ela vinculados
Cada corpo é único, mas nunca é um, é muito mais: são todos. Inclui desde os
exclusíveis, por arredios ou química, até os gêmeos por idênticos ou simbólicos. Por
causa dessa convivência inerente, aprendemos desde cedo sinais de comunicação. E
mímicos de nascença, exercemos as linguagens que depois, através da expressão
artística, iremos exacerbar como em uma convenção de signos. Algo mágico que nos põe
em contato um com o outro, como se nos embalássemos no colo ao som de mãe
44
cantante numa capela que segue um sino, de uma mãe canção que se chamasse: você,
eu, nós. (STOKLOS, 2002, p. 49)
O caminho aparentemente solitário desta noção de teatro, que nasce com ambição de
projeto de teatro não está fixado em nenhum extremo: pelo contrário, ele pode ser explicado na
relação entre estes dois lugares – palco e platéia. Neste sentido, conforme os estudos de
Cristiane Moura, Stoklos estabelece paralelo com caminho percorrido por artistas mambembes,
que têm tradição calcada na relação com seu espectador. Denise Stoklos sempre foi admiradora
oriundos do teatro de revista. Esta vivência de aprendizagem autodidata, que não segue um
manual específico, é a mesma encontrada na jornada de outros atores na buscas por uma ação
No que tange a relação palco/platéia, no Teatro Essencial não existe uma quarta parede,
mesmo que para isso ele tenha que se expressar em outra língua ou sem palavras, lembrando
os palhaços, os bufões ou os artistas mais populares rua, para quem a falta de limites –
geográficos ou de qualquer outra ordem – é o começo para sua jornada. No caso do Teatro
Essencial, o contexto em que o espetáculo vai se dar é sempre absorvido pela cena, tal qual
O espetáculo, que formaliza em sua estrutura o que vem a ser o Teatro Essencial e o
que pode ser esperado dele, conta com duas personagens históricas que se fundem em uma
Maria, brasileira que se coloca em sofrimento com as faltas de seu país. Em Casa (1990), a
performer faz referência à energia do lugar onde está em relação à energia de Brasília, usando
ironia faz-se presente nesta cena de forma inteligente e adequada ao seu tempo.
45
Casa (1990) e Calendário de Pedra (2003), nos remetem a procedimentos cômicos, no uso de
artifícios de conexão com a platéia por meio da máscara facial. Nesses trabalhos, pode-se
Golias na personagem Bronco, cujo bordão era "ô Cride fala pra mãe", com destaque para a
forma com que Golias articulava as palavras, projetando a língua para fora da boca. A segunda
é uma apropriação de uma máscara criada por seu filho Piatã Stoklos quando criança (dois ou
três anos de idade), que brincava com uma azeitona no lábio superior, na parte frontal da boca.
Essa utilização de máscara cômica, quase uma citação, permite pensar um procedimento
pelo qual a atriz, referencia modos expressivos específicos. Por outro lado, ela incorpora às suas
Cabe aqui situar a importância de outros eventos, práticas e idéias artísticas que, ainda
que paralelas ao foco do presente estudo, podem ajudar a iluminar a noção stokliana de ator.
notadamente das artes plásticas, assim como as interseções e interfaces entre estas diferentes
áreas. As artes plásticas retiram a palavra do seu contexto de origem, tomando-a de empréstimo
e incorporando ao seu universo referências que podem ir do uso da palavra ao corpo ao corpo
como suporte. Outras manifestações relevantes vieram, tais como o happening, a action painting
Este enfoque sobre o corpo relaciona-se com os eixos do teatro de Denise Stoklos,
sobretudo à medida que este teatro encontra no corpo grande parte da justificativa da sua
existência e de seus procedimentos. Ou, como diz a própria Stoklos, “... Todos os temas que
encontrem no corpo do ator o empenho necessário para realizar seu esforço serão interessantes
É também num contexto de aproximação entre distintas zonas artísticas que se revela o
conceito de performance art. Esta expressão foi usada para se referir a um tipo específico de
arte que se desenvolveu a partir das artes plásticas nos Estados Unidos, em meados da década
de 1960 e que, ao dar ênfase ao experimentalismo e a arte conceitual, acabou articulando várias
apoiada pela postura conceitual desta forma de arte, uma vez que tal postura considera como
elemento principal da arte, a idéia por trás de uma obra. Ou seja, o conceito da obra aparece
como fator prioritário em relação ao próprio resultado final que, muitas vezes torna-se
dispensável. A partir de 1960, essa forma de encarar a arte estabelece-se no mundo artístico
28
As vanguardas artísticas, são movimentos de ruptura, influenciados por mudanças sociais que tratam de
revolucionar as artes, e por sua vez modificaram os modos de se fazer teatro, tanto se mostrando nos textos, como na
estética.
47
com a repercussão das proposições de artistas plásticos como Marcel Duchamp29, em cuja obra
procedimento performático em que tudo acontecia de fato e em tempo real, o que representava
rompimento dos seus cânones. A linguagem da performance art instalou novos territórios e
estéticas corporais a partir do cruzamento das artes cênicas com as artes plásticas. Re-
rompeu com o isolamento das áreas artísticas, dando às formas tradicionais de expressão
experiências de intervenções teatrais com a ambição de reinventar a vida e o mundo por meio da
arte. Neste ano, Carvalho criou uma inusitada performance chamada de Experiência nº2,
1933, criou e montou um espetáculo teatral chamado de Bailado do Deus Morto, criando uma
expressão própria de fazer e pensar seu teatro. No entanto, segundo Renato Cohen, o Brasil
teve seu primeiro contato com um tipo de abordagem considerada performática somente na
Seguindo essa trilha, comecei a estudar outros teóricos como Appia e Gordon Craig, e
acompanhar o trabalho de artistas contemporâneos com John Cage...No Brasil, alguns
artistas como Aguillar, Ivald Granatto e Denise Stoklos realizavam experiências cênicas
diferentes do que se acompanhava no teatro. Em 1982, passei fazer parte da equipe
piloto de “animadores culturais” que faziam a programação do recém-criado Sesc
Fábrica da Pompéia. Foi um tempo de grande efervescência artística e, em apenas um
mês, foi lançado o I Festival Punk de São Paulo, e o I Evento de Performances (2002, p.
21).
Este espaço teatral teve destaque, no período, por ser destinado à performance.
Também na cidade de São Paulo, o Madame Satã30 era freqüentado por talentos de várias
29
Marcel Duchamp foi inicialmente influenciado pelo cubismo, tendo posteriormente participado dos
movimentos dadaísta e surrealista. Tendo-se fixado nos E.U.A., dedicou-se à antiarte e em 1914 criou o primeiro ready-
made. Suas pesquisas viriam a exercer influência também na pop-art.
48
áreas, como o escritor e dramaturgo Caio Fernando Abreu e o diretor de teatro Zé Celso
Martinez Correa. Nestes ambientes, outros nomes como Renato Cohen, Aguillar, Ivald Granatto
e Denise Stoklos fizeram suas primeiras aparições como atores performadores. No caso de
tradicional parede imaginária, até a clássica cena em que o sujeito se encontra preso em uma
cena de prisão de onde tenta sair. Neste momento, observa-se um uso técnico de mímica que
não havia repercutido na sua elaboração estética profunda, como se deu posteriormente.
formas de impacto estético. A potência expressiva do trabalho de artistas como Cohen e Stoklos
chamou a atenção para algumas de suas peculiaridades, no caso de Stoklos o uso da mímica e,
aperfeiçoando em Nova Iorque, momento em que experimentou pela primeira vez procedimentos
performer. Atriz por ter pertencido a esta categoria, sendo no teatro com características mais
tradicionais o seu berço, e performer por sua escolha posterior ligada à produção de uma
estética teatral. Foi através do teatro que se fez enquanto artista, vindo posteriormente as
Denise Stoklos afirma que foi a primeira atriz brasileira a apresentar-se em diversas
partes do mundo como Moscou, Pequim, Taipei e Ucrânia. Costuma apresentar suas peças em
mais de trinta países da Europa e Américas31, representando em idiomas como inglês, francês,
espanhol, alemão, russo e ucraniano, além de seu idioma natal, o português, por meio de uma
30
Transformado em danceteria em 1983, o casarão onde hoje está instalado o atual Madame Satã, se
transformou no mais antológico point cultural do país nos anos 80. A casa fervilhava com toda a nata da música pop
brasileira da época, artistas e intelectuais. Presenciou alguns dos primeiros shows de Ira! Capital Inicial, Legião Urbana
e outras bandas nacionais além de ter sido cenário para a produção cult do cinema "Cidade Oculta" estrelada pela hoje
diretora Carla Camurati. Nos anos 90 tornou-se Morcegóvia e depois The The, até reabrir em 1999 como o novo
Madame Satã, reverenciando o passado, mas sempre aberto às novas tendências da cultura e da música. O espaço
continua aberto para todas as manifestações artísticas (teatro, exposições, shows, performances) mostrando que o
espírito da melhor casa noturna de São Paulo continua vivo."There's a light that never goes out" .
31
“Alemanha (Berlin, Braunschweig, Bremen, Colônia, Essen, Freiburg, Hamburgo), Argentina (Buenos Aires,
Córdoba), Austrália (Sydney), Áustria (Viena), Bélgica (Bruxelas), China (Pequim), Colômbia (Bogotá, Calli, Manizales),
Cuba (Havana), Dinamarca (Copenhague), Escócia (Edimburgo) Espanha (Madri, Sitges, Cadiz), Estados Unidos (Nova
Iorque, Miami, Filadélfia, Washington, São Francisco), Finlândia (Tampeere), França (Paris, Avignon), Holanda
(Amsterdã), Inglaterra (Londres), Índia (Nova Delhi), Irlanda (Dublin), Israel (Tel Aviv), Itália (Roma), México (cidade do
México, Monterrey), Noruega (Oslo), Portugal (Lisboa, Porto), Romênia (Bucareste, Brasov), Rússia (Moscou), Suíça
(Zurique, Berna, Genebra), Suécia (Estocolmo) e Taiwan (Taipé)” (STOKLOS,1993, p. 58).
49
prática desenvolvida por Stoklos, tradicionalmente utilizada pela ópera na Europa e nos EUA,
desenhada que ocorre, por exemplo, com a recitação em outro idioma que não sua própria
língua materna... nesta divergência (ou seria confluência?) entre som e sentido da palavra”.
fotografias com inspiração em canções cantadas por Nina Simone. Também se percebe a
influência das artes plásticas em trabalhos como o espetáculo Louise Bourgeois – I do, I undo, I
redo33 (que não faz parte da fase tratada neste capítulo e cujo título pode ser traduzido para “Eu
Iorque, e no Brasil em 2005, no Centro Cultural Banco do Brasil - no Rio de Janeiro, contando
com cenografia e parte do texto da artista plástica Louise Bourgeois. No espetáculo, que presta
homenagem a esta artista, podemos encontrar uma Stoklos que impõe como linguagem a
32
Arquivo de entrevista encontrado no próprio site da artista.
33
"Durante o processo de criação, eu apresentava as cenas diretamente para ela, em sua casa. O texto do
espetáculo é fruto da compilação de seus escritos, entrevistas e declarações. Ela assistia a tudo e participava do
processo. Desde o envio do material cenográfico para o teatro até a divulgação da lista de contatos de seu estúdio. Não
faço nada que não tenha tido aprovação dela como expressão legítima de Louise Bourgeois" (Revista E, número 97,
Sesc SP).
50
Além disso, a sobreposição do trabalho dessas duas artistas neste espetáculo nos leva
mais uma vez a pensar os procedimentos que os colocaram justapostos. Se definirmos a
colagem como um procedimento que foi utilizado por diversos artistas a partir da primeira
década do século XX, como uma técnica através da qual inclui-se o objeto mesmo no
lugar de sua representação e isso podemos observar, por exemplo, nas pinturas de Pablo
Picasso onde pedaços de jornal ou tecidos (ou ainda outros objetos) eram colados sobre
as telas pintadas em substituição à pintura representando o jornal, então, nesse caso,
estou por retomar a discussão que inaugurou meu subprojeto de pesquisa, isto é,
precisamente a discussão em torno das aproximações possíveis entre certos traços do
teatro de Stoklos e algumas características presentes nas artes do início do século XX,
cujo principal expoente seria a obra de Marcel Duchamp. Nesse sentido, a colagem,
enquanto procedimento utilizado por Denise Stoklos no interior de seus espetáculos,
conforme os exemplos levantados, muito se aproxima da obra de Marcel Duchamp, que
notadamente levou o princípio da colagem ao máximo em seu famoso ready-made Fonte,
de 1917, onde um urinol de porcelana, o objeto, foi deslocado de um banheiro para ser
"colado" não mais em uma tela, mas em um espaço maior, tridimensional. (Literatura em
Cena – Comunicação Francine:
http://www.pacc.ufrj.br/literatura/emcena_comunicacaofrancine.php acesso em
21 de março de 2006).34
A fase que privilegia a solo performance, somada ao retorno às palavras (desta vez em
forma de autoria estética), junta “... o som e a imagem do ator, seu corpo e sua voz em uma
50), portanto caracterizando a autoria em todos os sentidos. O corpo da artista passou a exercer
o papel de cúmplice de suas palavras e, desta longa fase surgiu a face mais conhecida da artista
sublinhada por seu Teatro Essencial35. Nela, é perceptível uma influência da idéia modernista de
Segundo Shanks, encenadores pós-modernistas que tomaram conta da cena teatral nos
anos 80 abandonaram os valores engajados e comunais dos anos 60 e colocaram o foco
em cima e dentro deles mesmos. Ressuscitaram o individualismo, deixando para trás o
grupo, tornando-se, em suma, auto-referentes. Estes artistas ou criaram seus próprios
textos o desconstruíram textos clássicos. Entre os encenadores incluem-se, por exemplo,
Richard Foremam, Robert Wilson e Pina Bausch. Seus espetáculos estão cheios de
colagens a-históricas e fragmentos estéticos nos quais representam-se todas as artes.
Tal conceito se refere nitidamente à arte de desconstrução, noção basilar do projeto pós-
modernista, ao contrário da síntese da unidade do modernismo internacional.
(FERNANDES, 1996, p.254).
34
O que é literatura é um fórum virtual da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
35
Vemos então os seguintes espetáculos: Olhos Recém nascidos; Calendário da Pedra; Louise Bourgeois - I
do, I undo, I redo; Vozes Dissonantes; Mais Pesado Que o Ar/Santos Dumont; Elogio; Des-Medéia ; Amanhã Será
Tarde e Depois de Amanhã nem Existe; 500 Anos - Um Fax de Denise Stoklos para Cristóvão Colombo; 1990, Casa;
1988, Hamlet em Irati; 1987, Denise Stoklos in Mary Stuart.
36
Stoklos, carrega consigo influências tanto modernas quanto pós-modernas: “O artista pós-modernista, ao
contrario do modernista, já não “cria” formas originais mas “recicla” formas do passado – signos inscritos em sucessivas
camadas sedimentadas da história da arte ocidental - , misturando-as com o “lixo” da mídia e da pop arte, num
processo de multi-referência. (...) Se a arte modernista foi pura, original, autônoma, a arte pos modernista é
contaminada e “plagiada”. O modernismo os mescla. O modernismo enfocou o sujeito humano; o enfoque do pós
modernismo se fixa na linguagem, ou melhor, na metalinguagem do metateatro” (FERNANDES, 1996, p. 247).
51
coletividade e individualismo), o sociólogo Stuart Hall (1992) encontra consonância nas idéias de
relação entre sujeito e ambiente levantadas pela fenomenologia de Merlau Ponty, ao afirmar
terem sido uma resposta imediata ao desejo do indivíduo ou às exigências do gozo individual, de
acordo com o qual o sujeito seria aquilo que deseja ser. Nessa identidade cultural, ao mesmo
e pode ser descrito através da explanação de características e procedimentos que definem sua
particularidade. Neste ponto é preciso diferenciar os termos espetáculo solo e monólogo, já que
ambos fazem referência a uma forma de representação realizada por um único ator em cena,
todavia com formato espetacular distinto. Em estrutura solo, encontramos um ator que assume e
acumula para si diferentes papéis, tais como: ator, coreógrafo, diretor, dramaturgo, cenógrafo,
iluminador, (músico e outros procedimentos). Em linhas gerais cabe ao ator, neste caso, ser o
responsável por todo o projeto espetacular e também ao propor um modelo de discurso cênico
como uma sistematização de alguns princípios basilares que norteiam a noção de Teatro
produção de linguagem. O Teatro Essencial tem suas raízes também fixas nas artes da mímica,
do teatro físico e da performance art. Na síntese deste hibridismo e, respeitando a própria forma
que o performer trouxer à cena deve ser feito por solicitação do tema ao
37
Estas características surgem nesta fase por conseqüência do amadurecimento de seu projeto estético
coroado com o Manifesto do Teatro Essencial e com o Espetáculo Mary Stuart, as mesmas características misturadas a
outras observações de ordem pessoal podem ser localizadas na parte 2.3 Relatos de Experiência Pessoal.
53
e sustentação da imagem.
e) Presença: O ator essencial deve aproveitar cada movimento para ser único e
exclusivo no mundo, pois outro como ele não existe. Este item diz respeito à
nos recursos usados pela voz, já em Desobediência Civil chama atenção à força
com que a artista se coloca em cena, finalizando com a canção Gracias pela
mesmo sem a palavra, mas não sem um ator. Mesmo que haja teatro sem a
figura do ator, ainda assim ele terá servido como inspiração para uma outra
54
teatralidade onde ele não é o centro. Desse modo, tudo que é produzido pelo
humana no palco.
não a ficção, ele não representa uma personagem, ele apresenta a si mesmo em
determinada situação.
tableau vivant.
convencionais.
experiência prática para a construção de um procedimento estético, embora, por vezes em sua
trajetória, Stoklos tenha se re-iniciado no teatro, por meio do exercício da linguagem cênica,
Tais características puderam ser levantadas por mim durante o projeto Solos do Brasil
(2002), como delimitadores de uma base para a proposta do Teatro Essencial enquanto escola
Esse teatro carrega consigo a vontade de existir sem depender de um convite de algum diretor
de teatro da realização de testes com objetivo de compor algum elenco de espetáculo ou fazer
O projeto autônomo deve ser compreendido aqui como meio para desenvolver o próprio
projeto ou idéia de teatro. A autonomia expressiva do ator dá-se, portanto, para que ele se sinta
participação ativa e autoral. Essa autonomia, que possibilita ao performer atuar mesmo na falta
ofício, o que lhe confere até mesmo algumas vantagens do ponto de vista mercadológico (a
individualidade e a economia no uso do aparelho cênico reduzem custos, por exemplo), mas a
liberdade almejada por Stoklos se dá antes no campo ideológico, uma vez que a lógica do
Este teatro tem, como um de seus eixos principais, a produção de espetáculos com o
mínimo de efeitos, em defesa da presença exclusiva do ator no palco, o que faz da condição
humano, pensando a realidade para transformá-la. Stoklos destaca em seu teatro, portanto, o
ator ou performer como o mais importante instrumento do seu fazer artístico e exige que ele
discursos radiofônicos muitas vezes acoplam parasitárias imagens no ator. Não quero
decoração” (STOKLOS, 1993, p.6). O termo essência, neste caso, diz respeito ao uso do mínimo
Stoklos deve ser o encontro com algo central no ser do ator. Esse algo seria o seu “essencial”,
oriundo de seus vínculos (compromissos) e escolhas com relação à vida e a arte, constituindo o
inteiramente original, ao menos fiel às características do meio e tempo em que vive o artista,
promovendo assim o surgimento de novos autores, que encontrarão em suas próprias buscas
uma ação teatral coerente com suas origens. No caso de Stoklos, tais origens poderiam dizer
56
respeito à sua condição de mulher fazendo teatro num país ainda com resquícios de cultura
contexto, ela pode ser vista também como responsável por abrir espaços para que a abordagem
autoral do teatro conte com a participação das mulheres e para que autoras e diretoras possam
se afirmar num contexto em que a mulher se via restrita normalmente ao papel de atriz -
intérprete. Acima de tudo, Stoklos não opta por negar o fato de ser cidadã de um país com
inúmeros problemas sociais, assim como não foge da tarefa de analisar tais problemas não só
Conforme podemos apreender de relatos da própria artista, fatos mais recentes têm
redirecionado mais uma vez a trajetória da artista. Um deles, de caráter profundamente afetivo e
pessoal, a perda de seu pai em 2004 e o outro, infelizmente não menos pesaroso – o suicídio do
amigo e ator performer americano Spalding Gray – a influenciaram na concepção do seu mais
apenas cinco movimentos durante todo espetáculo. É interessante observar, no entanto, que em
verdade Stoklos não se despe inteiramente de seu gestual mimético expressivo e gestual neste
apresentando um outro procedimento cuja origem pode ser associada à mímica: o Tableau
Vivant.
capta, por meio de um tableau vivant, (quadro vivo) a presença e essência cênica de Gray por
semelhanças entre si e Gray. A imagem capturada por Stoklos diz respeito à famosa
performance de Spalding Gray em que ele narrava textos autobiográficos, usando para isso
apenas uma mesa e um microfone. A situação é reproduzida por Stoklos neste espetáculo para
o qual, aparentemente movida pelas perdas (de seu próprio pai e de Spalding Gray), escolhe o
título Olhos Recém Nascidos, acreditando que a vida contada – ou melhor, recontada – já é em
Figura 6 - Fotos: Denise Stoklos em Olhos Recém Nascidos (2005) e Spalding Gray.em performance autobiográfica.
Fonte: www denisestoklos.uol.com.br e http://www.spaldinggray.com/home.html.
Ponty, no movimento das coisas no mundo, e na coexistência com os outros. Nessa percepção,
é o outro quem lhe oferece algumas informações sobre você e que até então não eram
percebidas, em palavras que talvez estivessem em gestação na boca de outro para então virem
à tona e transformarem o seu próprio ser. Durante um exercício de cena (2002), Danilo Souto
Pinho, um dos integrantes do projeto Solos do Brasil afirmou: “eu não sabia que era inteligente,
afirmada pelas dinâmicas relacionais. Por meio da construção do conceito de liberdade, pode-se
relação entre o sujeito, seu ambiente e os outros. No teatro, isso se dá entre o palco e a platéia.
Ou seja, é relacional e não está fixada em nenhum lugar. Trata-se de uma experiência que não é
Se não pudermos falar propriamente dos seres humanos como ilhas, podemos, por outro lado,
pensá-lo em ação, tentando sair ou entrar numa ilha. Assim sendo, o outro “não é o limite da
Escrever, dirigir e atuar sozinha é solitário como qualquer processo criativo (como ao
nascer e morrer?). Tem-se de estar só, pois se a orientação é à originalidade, não há
modelos. Não há parâmetros conhecidos para conceber um trabalho que não esteja
interessado em reproduzir a idéia de outro autor. Isso me levou a procurar estabelecer
esse sistema que chamo de “Teatro Essencial”, e que compõe as bases desse trabalho
para atuação, direção, texto e produção (STOKLOS, 1993, p. 50).
58
lógica do Teatro Essencial. Ele se apresenta como exercício cênico que busca no vínculo, seu
espaço livre e criativo. O entre que é o interstício vital do teatro. A noção de performance é uma
ressonância que conduziu Denise Stoklos para esta zona autônoma em relação à idéia de um
teatro tradicional. Ocupar este espaço de performance permitiu a Stoklos aprofundar sua busca
de liberdade - que como foi dito – existe de forma relacional. Situar-se no entre parece ser a
chave para as formulações do Teatro Essencial, e é exatamente isso que representa uma
No que diz respeito a esta etapa da trajetória de Denise Stoklos, convém destacar a
importância do espetáculo Denise Stoklos in Mary Stuart, que estreou em 1987 em Nova Iorque,
em comemoração dos 25 anos do teatro La Mama. Mary Stuart é mantido até hoje em cartaz no
seu repertório de espetáculos fundamentados nos princípios do Teatro essencial38. Este trabalho
estabelece, do ponto de vista desta pesquisa, o marco inicial da fase aqui chamada de
nascimento e serve como referência para a noção de ator que se revela a partir de reflexões
O espetáculo apresenta uma imagem ampla do trabalho da atriz, podendo ser analisado
com o apoio do livro de mesmo título lançado em 1995. A publicação nos traz “subtexto,
(STOKLOS, 1995, p. 4). Este espetáculo põe em evidência, na sua estrutura formal e de
conteúdo, os fundamentos da poética teatral desenvolvida pela artista de maneira mais clara do
(1995), uma cena “mais esclarecedora do teatro da atriz do que todo o corpo de teorização que
ela reuniu sobre o que chama de teatro essencial” (SÁ, 1997, p. 362), considero que uma
compreensão das estruturas que constroem o espetáculo Mary Stuart (1987) é elemento de
38
Atualmente são mantidos em seu repertório os espetáculos: Olhos Recém Nascidos (2005); Louise
Bourgeois – I Do, I Undo, I Redo (2000); Vozes Dissonantes (1999); Desobediência Civil (1997); Des-Medéia (1994);
500 Anos- Um Fax de Denise Stoklos para Cristóvão Colombo; Casa (1990); Denise Stoklos in Mary Stuart (1987).
59
importância crucial no que se refere ao entendimento do Teatro Essencial, uma vez que ele nos
traz tal noção em sua integralidade, mais do que em apenas uma cena.
performance art (conhecida também como arte performática). No início do século XX, a
de então, a voltar seu foco de interesse para uma interpretação de si mesmo, colocando seu
corpo em primeiro plano e no centro da cena. Passa a afirmar-se, portanto, enquanto obra, por
cunho plástico e físico, interesse que revela uma forte declaração a respeito da forma de pensar
lugar do ator no teatro e trazendo à tona um novo postulado para o próprio conceito do ofício do
ator.
Como evolução deste conceito, surgiu, na década de sessenta, uma outra concepção de
trabalho de ator, chamada de “novo ator”. Segundo Marco De Marinis, professor da Universidade
de Bolonha, o “novo ator” teria surgido juntamente com o aparecimento das vanguardas
históricas. Com relação ao teatro brasileiro, a nova circunstância coincide com o contexto
estética, sob o preceito da conquista de uma maior liberdade de expressão. Desta forma, o
39
Dentre tantas importantes figurações sobre o tema seria interessante observar as colocações de LEHMAN,
2003 acerca dos artistas que, ao longo de suas trajetórias, foram diretamente contaminados por experiências
performáticas de cunho vanguardista, e que promoveram uma reformulação de aspectos das formas tradicionais de
representação.
60
teatro brasileiro foi paulatinamente re-elaborando sua estrutura, especialmente no que toca a
Sendo poeta é preciso ter o que dizer, ter uma postura política no palco, e considerar o
teatro como um espaço social, uma tribuna capaz de gerar uma reflexão coletiva. E como
uma máquina de combate, o Ator Essencial de pé avança e revoluciona. Com forte
influência do teatro físico e da performance o Ator Essencial não representa um
personagem, mas fala em nome próprio, e é minimalista, extraindo o máximo de
expressão do seu recurso mais fundamental, o seu corpo numa orquestração entre as
suas diferentes partes. E finalmente, o Ator Essencial é trágico e cômico, é um artista
autônomo, mestre do seu ofício, e, portanto é um homem livre. Ele tem a cara do mundo,
mas o espírito é brasileiro. Denise Stoklos ficará para a história como sendo uma das
40
grandes expressões brasileiras desse novo ator (PINHO, Danilo Souto em
entrevista para esta dissertação, 2006).
O propósito deste novo ator tem servido, ao longo de sua trajetória, como plataforma
semântica para produção de outras subjetividades no âmbito das artes cênicas, inclusive como
com manifestações teatrais as quais, ainda que se apresentem como formas dramáticas muito
diferenciadas, têm um denominador comum que é terem por trás de si uma história (LEHMAN,
próprio corpo como suporte e objeto de arte e estabelece outras relações entre performer e
Encontramos na gênese deste novo ator o próprio teatro enquanto ato performático,
conceito apoiado nas idéias vanguardistas contidas no teatro da crueldade de Antonin Artaud, no
teatro radical de Tadeusz Kantor e no teatro pobre de Jerzy Grotowski. Podem-se mencionar
Brasil, o encontro com o grupo Living Theatre, que esteve no país para uma série de
no Centro Cultural de São Paulo o qual contou com a participação de Zé Celso Martinez Correa,
40
Danilo Solto Pinho participou do projeto Solos do Brasil. Ator, fonoaudiólogo, pesquisador e professor do
Curso Superior em Artes Cênicas do Cefet-Ce, em depoimento para esta dissertação – 30/03/2007.
61
Renato Coen e Denise Stoklos. Empregando o corpo do ator como o maior responsável pela
construção da cena, junto com o ambiente performático e com a conseqüente ampliação da zona
espetacular, nomes como Denise Stoklos refizeram suas trajetórias, enquanto artistas que
tiveram seu fazer teatral atravessado por conceitos oriundos da idéia de performance.
atores foram sofrendo modificações e, a partir das décadas de setenta e oitenta. Estas relações
têm se amalgamado, culminando no século XXI, na constituição de uma zona híbrida que abarca
diferentes saberes artísticos. No caso do Brasil podemos destacar nomes importantes como os
já mencionados Hélio Oiticica, Renato Coen e Denise Stoklos, além de Marcelo Gabriel e Michel
Melamed, que através do emprego dos novos procedimentos, têm atualizado constantemente o
conceito de ator. Estes artistas têm promovido a manutenção de uma cena experimental no
como performador e propiciador de outras possibilidades estéticas, que por sua vez se
O teatro de ator performático rompeu com a ética tradicional de cena, que refletia uma
construção hierárquica de elementos e ações, onde cada indivíduo cumpria apenas com seu
no qual o ator se torna seu próprio autor e diretor, tendo como base o uso da presença humana
No período que diz respeito à ditadura militar no Brasil, muitos artistas foram obrigados a
encontrar estratégias para escapar dos censores da época, o que de certa forma provocou
grande interesse pelo que estava acontecendo fora do Brasil. Como produtor de idéias e
construtor de linguagem própria, o teatro performático foi produzido inicialmente no Brasil por
com alguns cânones do teatro. Assim, o teatro brasileiro começou a atualizar-se e a encontrar
punks, as dinâmicas de grupos de teatro e artistas, que colaboraram com suas inquietações e
ditadura veio a democracia, trazendo para o teatro uma necessidade de construir relações e
62
podendo, neste sentido, encontrar particular interesse nas formulações dos estudiosos Roselee
Goldberg e Renato Coen, sobretudo no que diz respeito ao protagonismo do artista enquanto
ponto de partida para o conceito de ator performador. As idéias que giram em torno da noção de
ator performador, no contexto do teatro brasileiro das últimas décadas, parecem considerar este
necessidade de discutir-se sua atual significação no contexto do teatro contemporâneo, com foco
nas diferenças entre o ator tradicional e o ator performer. Compreender os procedimentos que
constituem o conceito do ator performático nos permite abordar e definir o fenômeno teatral em
principalmente, em reinvenção.
Ao longo de sua trajetória no teatro, Denise Stoklos concebeu uma idéia de teatro e de
atuação que acabou se afastando dos modelos até então transmitidos nas escolas no Brasil,
cujos paradigmas baseavam-se, ainda, nos parâmetros tradicionais do teatro dramático, tanto
em termos de uso da palavra enquanto dramaturgia tradicional quanto do ponto de vista das
artista busca a cada trabalho uma outra forma de lidar com a questão da textualidade, havendo
um deslocamento das formas tradicionais de teatro, o que permite considerar a imagem como
diferentes âmbitos. Passando por muitos criadores - Meyerhold e Grotowsky - chegando aos
palavra e de idéias pré-concebidas, assumindo citações que apontam suas idéias ou rearranjam
outras para conferir-lhes novos sentidos, e para criar uma cena autônoma.
Foi quando a proposta de teatro desenvolvida por Stoklos trouxe para o centro da cena
brasileira o ator como solo performer, autor, compositor e protagonista de sua encenação. A
esse respeito, Stoklos anuncia: “Estou, perigosamente, achando que sou capaz de tudo” (1993,
p. 25). Em declarações como esta, ela chama atenção, com seu senso de humor característico,
para o seu afastamento da noção de grupo, momento em que passa a tornar-se independente e
responsável única por seu próprio repertório e por todo processo de criação e produção do
mesmo. As relações de Stoklos com a idéia de grupo, ao longo de seu percurso no teatro, estão
relacionadas com a idéia de encontro, o que nos remete a uma viagem pessoal que mesmo em
No que se refere à descrição do seu trabalho por parte de alguns críticos, mesmo por
aqueles que o apóiam – como Nélson de Sá e Yan Michalski – parece ter havido uma redução
equivocada. Por um lado, temos denominações tais como “artista de monólogo” e a associação
unívoca a dois gêneros específicos – o primeiro e mais divulgado, a mímica, como se esta
técnica conformasse uma parte fechada e separada do seu próprio teatro e, por outro, a sua
produção textual, a qual já fez com que, sua autora fosse vista mais como poetisa ou
dramaturgista do que como atriz. O presente trabalho visa contribuir para desfazer essa
distorção, fator de compreensão que muitas vezes constitui a base do olhar sobre sua obra. O
trabalho de Stoklos não está circunscrito apenas nestes dois nichos, uma vez que, como mulher
de teatro que é, ela pode ser vista, acima de tudo, como pesquisadora de seu próprio teatro, seja
singular, pois nela as referências técnicas, estéticas e ideológicas se misturam, ainda que isso
não constitua um modelo fechado. É necessário pensá-la como uma criadora que materializa
sua prática como zona de interface artística entre diferentes procedimentos de composição para
a construção da cena teatral. Assim é que a artista afirma “... me espano no meu ofício de
performer e autora e coreógrafa, pois me refestelo nos talentos múltiplos... na máquina que
atuação, fazendo-se necessário, para isso, sistematizar seu procedimento particular, o qual ela
... Aquilo que o ator tem como instrumento: seu corpo, voz e pensamento seria tudo. Do
corpo o espaço, o gesto, o movimento. Da voz a palavra, a sonoridade, o canto. Do
pensamento a crítica, a dramaturgia, a organização dos elementos. Espetáculo feito na
estrutura de monólogos, música e gestual. Peça de Teatro cuja leitura pode ser feita ao
nível da imagem e ao nível do verbo, ambos muitas vezes complementando-se ou até
contradizendo-se. A meta é uma comunicação mais ampla com estímulos a uma nova
organização perceptiva. A plataforma da representação está nos signos resultantes de
ritmo entre espaço e som calcados na agilidade da decodificação. Não há mais nada no
palco do que não seja ambientação cênica exteriorizada da presença humana (nada
decorativo). E dessa presença todos os momentos teatrais são articulados. Diversos
gêneros, modalidades e tempos, são rotas para um percurso plástico em direção ao
contexto apresentado: um poema sobre nossa natureza. A perspectiva é a realização
técnica rigorosa e humorista. Ensaio teatral em que se pretende elevar ainda que
sísifamente a pedra de confiança na auto-suficiência genuína do ser humano...
(STOKLOS, 1993, p. 17).
teatro e na nudez da cena. E zelando pela preparação do ator, ele cria uma companhia regida
não só pela estética, mas também pela ética. Assim como Copeau, Stoklos (1993) buscou, pelo
mundo, ferramentas necessárias para se fortalecer como artista e colocar-se, com toda a sua
potência, num palco nu, na tentativa de eliminar todo o supérfluo de cena, e assim investiu na
força do ator: “o mínimo de recursos para o máximo de teatralidade”. Mas é preciso destacar
algumas exceções como em Casa (1990) ou em Louise Bourgeois (2000), para cujas realizações
espetáculo. Ainda assim, a presença do ator é o ponto alto da cena, primando pela essência da
arte de atuar: o elemento vital do ato teatral com ou sem incrementos cenográficos se mantém
na presença do ator. Vale lembrar que em Casa (1990) o ponto alto do espetáculo acontece
aquela que diz respeito à diversidade de referentes sem significar necessariamente uma simples
descontextualização dos modelos de ordem vigentes através de críticas ao sistema, por meio da
micro-política exercida por cada individuo em seu cotidiano. Com o objetivo de criar um novo
contexto, onde o ator deve posicionar-se política e afetivamente, Stoklos faz uso de
pode ser visto em inúmeras cenas que compõem o espetáculo Casa (1990). Chamo atenção
para a cena do jantar, onde a atriz dá inicio à sua refeição, repetindo e ampliando a cena de
levar o talher até a boca, chegando ao final da cena devorando o próprio talher e seu recipiente,
O ator essencial deve buscar a integração do corpo com seus sentimentos e com sua
mente no ambiente em que vive, para então criar seu próprio espetáculo-solo, onde deverá
escrever, dirigir, atuar e produzir-se. Para lançar mão de seus questionamentos através de uma
e procedimentos próprios, com base em seu histórico pessoal de vida, ainda que seja
necessário desfazer-se de seus próprios proclames – sem jamais deixar de entender, contudo,
que comunicar um pensamento demanda domínio técnico. O procedimento técnico mexe com
as ordens estabelecidas, à medida que ele pode servir como alfabeto para compor um discurso
66
obra. As técnicas assumidas por Denise Stoklos determinam o seu discurso ideológico, à
medida que estimula o espectador para a transformação social. Por meio de elementos que
ainda que no silêncio e no conflito da artista consigo mesma, com pode ser visto no espetáculo
central, como no caso de Des-Medéia (1994), em que a performer nega-se a compactuar com o
ela esteja organicamente integrada à performance, tendo sido gerada em um processo gradual e
reforço de uma autoconfiança que é fundamental para a atuação solo, desde a escolha de
idéias, temas, textos ou citações. É aparentemente contraditório o fato de Stoklos afirmar: “Não
cito, não reproduzo, não ponho idéias de outros em cena, não estou interessada em ser
comparada com ninguém, nem em ser classificada em nenhuma categoria especifica: faço
Teatro Essencial”, ao mesmo tempo em que se pode observar um número grande de referências
41
Silvana Abreu foi uma das idealizadoras do projeto Solos do Brasil, produtora e participante – seu
depoimento para esta dissertação foi recebido por e-mail em 07/03/2007 às 16:23h.
67
Aires, Gertrud Stein, Louise de Bourgeois, Milton Santos entre outros, compõem o corpo de
figuras presentes em seus espetáculos através de citações. Podemos ainda perceber que
algumas idéias são reproduções de idéias de outros artistas, como por exemplo, no caso de
Olhos Recém Nascidos (2005) onde a artista reproduz a imagem e procedimentos realizados
pelo ator Spalding Gray em cena, ou em Louise de Bourgeois (2000), quando do uso de textos
Em tese, Stoklos parece não resolver esses paradoxos sendo que, do ponto de vista da
estrutura dos espetáculos, tais referências funcionam como elementos formais que servem como
contradição é desfeita quando atentamos para o fato de que a declaração acima citada na
acostumado. Cabe ainda observar que, quando Stoklos escreveu seu manifesto Teatro
Essencial em 1992, já havia levantado as bases de seu teatro por meio dos espetáculos Mary
Stuart (1987) e Casa (1990), onde há presença de citações e referências (e repetição de idéias)
crítico como instrumento de análise e ação para uma vida teatral que se entrecruza com a vida
real, “onde a dramaturgia tem que fugir de qualquer parâmetro e cabular as aulas de teatro dos
Padres Vieiras e, em contrapartida: ir brincar com os índios, bater com seu pau-brasil na mesa
do conservadorismo” (STOKLOS, 1995, p.18). Há nessa opção uma conotação política que
entende a arte como ação de cidadania, e neste caso todo “bom encontro” deve ser preservado.
Stoklos, o primeiro é um fragmento de diálogo encontrado no texto Circulo na Lua, Lama na Rua
WANDA – Senhores, estou aqui para denunciar determinados fatos que não podiam estar
acontecendo. Ontem, às 17 horas, o menor Euzébio Lopes, residente ao lado da fábrica
Trafapro de Violinos, teve seus tímpanos completamente estourados. Foi levado com
68
urgência ao Pronto Socorro, onde faleceu após duas horas de imensos sofrimentos, sem
que os médicos conseguissem, com as providencias tomadas, minorar as conseqüências.
Outras pessoas sofreram aleijos por todo o corpo, e muitas enlouqueceram. O causador
desses distúrbios já se encontra detido na 4ª Delegacia de Violinistas Sem Dedos.
Segundo declarações de testemunhas, porém, o criminoso sempre foi um virtuose.
(MUDANDO DE TOM) Esses fatos nos demonstram, portanto, que alguma coisa de
errado existe com os violinos Trafapro.
JOÃO – Essas coisas só acontecem para os lados da fábrica. Deve ser a insalubridade
do terreno que modifica o som. Como é que aqui nunca acontecem essas coisas?
(STOKLOS, 1968: P. 16-17).
Quase vinte anos depois da criação do texto supracitado, encontramos uma Stoklos que
não mais compartilha seus textos dramáticos, seu interesse agora é comunicar os subtextos que
Prólogo – Atriz entra em cena. Dá duas voltas em círculo largo pelo palco, olhando a
platéia. É um toureiro apresentando-se na arena. Ou um saltimbanco conclamando, em
silêncio, uma multidão para assistir a uma narrativa. Um herói desfilando sua vitória: é
uma atriz encontrando-se com o seu público, apresentando seu corpo, seu olhar, que
conduzirão a lenda a ser discorrida. Diminui o passo cautelosamente, para que haja
tempo de leitura da desaceleração do corpo, até parar no centro, abarcando a frente mais
ampla, com a vista dirigida ao espaço que corresponde ao que lhe está oposto: o
interlocutor, o outro (STOKLOS, 1995. P: 6-7).
busca de um encontro entre seres humanos dispostos a refletir sobre sua existência. Partindo
deste princípio, Stoklos propõe um encontro entre ator e público em determinado espaço/tempo
corpo em um espaço, onde o ator não entra em conflito com seu público, tentando convencê-lo
teatro atual, que vem substituindo a figura humana por imagens e efeitos especiais.
cria seu próprio poema. Na sua abordagem, é o artista quem revela ao espectador essa
existência do teatro como lugar de troca, de comunicação, onde o ator oferece ao espectador a
possibilidade de refletir sobre si mesmo. O ator é quem gera e dele parte a realização de
projetos, no entanto ele só é realizado quando em contato com seu público, e é naquilo que
existe entre os dois (ator e espectador) que está o que pode ser salvo: a possibilidade do
relacionamento.
Esta visão autônoma de ator busca uma opção radical de transgredir e ultrapassar os
técnica, mas também a exposição ideológica. Ao refletir sobre a realidade social, o ator pode
sobre temas sociais contemporâneos, ainda que venha a citar ou colocar em cena idéias de
Talvez falar sobre o essencial seja diferenciar a ficção da realidade, sem, no entanto, nos
atrelarmos à imitação da vida ou sua transposição à cena.
O ator essencial encontra em sua relação com a realidade, sua matéria prima, o ponto de
partida para a sua criação, que mais parece um provocar a si mesmo, profundamente,
sobre escolhas e atitudes no mundo, do que falar do mundo através de histórias de
outros. Assim, o ator essencial quer compartilhar com o espectador suas próprias
urgências. Isto faz dele um criador em amplo sentido: ele é autor de sua própria atuação
e diretor de sua própria cena. Tarefa delicada, difícil e perigosa. Delicada porque não é
todo mundo que consegue escolher em si mesmo sua maior potência, difícil porque
muitas vezes o artista essencial se depara com seus próprios demônios sem uma
interlocução fora de si e perigosa porque oferece o risco de jogar o artista dentro de sua
própria esquizofrenia, perguntando e respondendo a si mesmo suas profundas questões
ou fazendo de si mesmo o espetáculo, ao invés de afirmar a vida em toda a sua
complexidade. Porém, se for capaz de escapar destas armadilhas o ator essencial, será
aquele que não estará em cena para ser contemplado ou para encantar o espectador.
Estará em cena para se expor e agir, diante do outro e sobre o outro, como quem se
oferece em sacrifício, transformando suas próprias incompreensões, indignações e
percepções em denúncias e revelações, através de sua presença cênica e de suas
possibilidades corporais, que terão que ser capazes de transformar o homem comum em
arquétipo e sua história pessoal, em mitologia (VIANNA, Tiche em depoimento para
esta dissertação,2007).42
como o próprio mercado. A escolha por um fazer teatral solitário ou autônomo, no qual o ator
42
Tiche Vianna, é atriz, pesquisadora e professora de teatro, é diretora do grupo Barracão de teatro de
Campinas São Paulo e participou do projeto Solos do Brasil.
70
performador acumula em si toda a responsabilidade por sua produção artística, carrega consigo
os ideais de uma geração a qual pertenceu Stoklos, uma geração que continua sendo radical e
de expressiva importância. Não se deve atribuir a essa radicalidade, no entanto, uma idéia
intrínseca de inviabilidade mercadológica, uma vez que Stoklos tem demonstrado, ao longo dos
anos, ser capaz de viver de seu teatro. Devemos entender, ao contrário, que a artista soube
conduzir uma carreira com seu teatro essencial sendo, no entanto, radical com relação a se
manter fiel ao seu caminho estético e à sua postura ética com relação à sua ideologia artística e
política.
O Teatro Essencial fomenta, antes de tudo, a luta contra a inércia artística que pode
afligir o ator. Mesmo estando sozinha no palco, há na maneira do fazer de Stoklos um coletivo
intrínseco, no qual o teatro é o que existe entre o ator e a platéia, ou seja, naquilo que se pode
encontrar na relação entre um lugar e outro. Além disso, ela costuma tratar de temas prementes
na sociedade em que vive, e que evoluem com o passar do tempo, tornando -se assim coletiva e
Quanto à temática, o Teatro Essencial sugere que se parta de sua realidade, no nosso
caso, a realidade brasileira. Propõe que o Brasil seja visto pelo Brasil, numa dramaturgia feita
para um teatro que cobra o direito humano de ser respeitado e que luta pela honestidade e
liberdade de expressão. Um teatro curativo, no qual tudo deve ser dito, e bem dito, para que
tanto o artista quanto a audiência possam recriar o mundo e integrar-se nele novamente. Isso
implica também numa exigência com relação ao engajamento do ator, sendo ele o único
responsável por sua arte, seus erros e acertos. Em depoimento para esta dissertação, Danilo
Souto Pinho (2007), um dos participantes do Projeto Solos do Brasil, afirma que:
durante esta atividade permitem perceber que o seu teatro é feito com base na premissa da
conjunção absoluta entre técnica e intuição. Embora traga consigo algumas confusões em torno
da produção de dramaturgia e, ainda que a própria artista defina sua técnica como “anárquica”, é
71
igualdade no seu processo artístico. Mesmo que haja uma parcela passível de ser transmitida
intransferível e somente pode ser compartilhada através da entrega generosa da artista em seu
Na época em que transcorreu o projeto Solos do Brasil (2002), não imaginava fazer das
minhas anotações parte da presente dissertação, razão pela qual é possível perceber nas
anotações uma organização que é conseqüência de não ter, naquele momento, aspirações
acadêmicas. No entanto, isso não tornou o “diário de bordo” menos importante que o restante da
bibliografia utilizada, uma vez que constitui documentação em primeira mão do trabalho
impressões, eu fazia anotações livres a partir das aulas, incluindo algumas descrições de
exercícios propostos por Stoklos e pelos professores assistentes, além de comentários acerca
percorridos pelo Teatro Essencial, na história e em mim, foi necessário fazer escolhas de método
aplicativo. Se por um lado estas notas careçam de certa clareza descritiva sobre o todo que do
todo que abrangem, o diário de bordo ganha importância à medida que se constitui um olhar
Essencial. Assim, escolho como método a mistura entre os corpos do diário de bordo, feito à luz
do trabalho diário em sala de ensaio, e a memória reflexiva do que ainda hoje permanece em
72
mim, introduzindo o meu relato como amálgama de saberes, para então compartilhar minha
experiência pessoal.
As anotações que se seguem estão aqui colocadas tal como se apresentam em sua
forma original. Elas revelam em seu caráter pessoal, a singularidade da experiência direta. As
imprecisões provocadas pela passagem do tempo, não negam a importância deste material
agregados aos relatos, mantendo-se, ainda assim, a sua estrutura fiel à forma como foram
registrados durante o projeto, para não perder o vínculo vivo com o momento passado.
Descrição do projeto:
O projeto Solos do Brasil, que teve coordenação artística de Denise Stoklos, ocorreu
entre abril de 2002 a março de 2003, em São Paulo. Os artistas foram escolhidos por um
processo de seleção que envolveu mais de 2.000 candidatos, espalhados em duas etapas: a
No sábado dia dois de março (2002) tivemos a oportunidade única de um encontro com
600 pessoas interessadas em se desenvolver através do sistema teatral que oferecemos
e que denominamos Teatro Essencial. Para o preenchimento das quinze vagas
disponíveis no projeto Solos do Brasil estimamos buscar, nesta convivência de sete horas
que ocorreu naquele sábado, contato no qual estivéssemos todos compartilhando o
mesmo momento, o mesmo espaço e o mesmo objetivo. (...) Chegamos enfim a uma lista
de quinze selecionados que tenta honrar com os critérios do projeto, o qual deve absorver
um grupo composto de pessoas de diferentes origens regionais, sociais, de diferentes
73
Teatro Essencial de Denise Stoklos. Esses artistas foram: Claudia D’Orey, Danilo Souto Pinho,
Fabio Vidal, a autora da presente dissertação, Jefferson Monteiro, Jô Rodrigues, Jorge Baia,
Miguel da Guia Rocha, Roberto Salles, Silvana Abreu, Silvio Paulino dos Santos, Simone Faro,
era formado, além de Stoklos, por: Antonio Abujamra (direção e “provocações”), Caio Ferraz
(Canto), Eduardo Coutinho (texto corporal), Gianni Ratto (direção), Hugo Rodas (dança), Luis
Fugante (filosofia e estética), Luis Louis (mímica) e Ricardo Napoleão (teatro dinâmico e
máscara neutra). Esta equipe alternava sua presença através de módulos, ao que fez exceção
A conexão dos profissionais acima citados, com o Teatro Essencial de Denise Stoklos,
em alguns casos vem de longa data outros por relações mais recentes, porém não menos
importantes como, por exemplo: Luiz Fugante, professor de filosofia de Piatão Stoklos e foi por
ele indicado para acompanhar o projeto Solos do Brasil, já Antonio Abujamra, dirigiu Denise
74
Stoklos em 1983 no monólogo Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico (1983), texto de Dário
Fo e Franca Rame. Este espetáculo foi importante na trajetória de Stoklos, pois com ele a artista
viajou para festivais de teatro na América Latina e estabeleceu contato com Helen Stuart,
fundadora do teatro La Mama. A partir deste encontro, Stoklos foi convidada para apresentar-se
no La Mama, o que deu início a uma duradoura relação e convites para apresentação de
espetáculos. Além disso, Stoklos pôde conhecer o trabalho solo de Iben Nagel Rasmunsem, o
qual impressionou Stoklos, por apresentar um modelo solo performático até então não conhecido
por Stoklos. Caio Ferraz, enquanto professor de canto, acompanha o trabalho de Marilia Pêra de
longa data, sendo ela atriz também interessada no ambiente da performance (canto, dança e
atuação).
Coutinho foi um dos primeiros mestres de mímica do Brasil, conhecedor desta técnica e do
trabalho de Stoklos desde seu início, sendo um conhecedor de sua abordagem. Já Luis Louis
tem formação em mímica pela Desmond Jones School e foi professor e assistente do próprio
Desmond Jones.
Ricardo Napoleão e Guilherme Weber (o último esteve uma única vez conosco no projeto
Solos do Brasil, enquanto Napoleão acompanhou todo o projeto) trabalharam com Stoklos no
espetáculo Mais Pesado que o Ar – Santos Dumond (1996). Gianni Ratto, representante do
teatro italiano no Brasil, acompanhou a evolução do teatro brasileiro por mais de quatro décadas,
Vento. Sua filha, Antonia Ratto, foi assistente de direção de Stoklos nos espetáculos Calendário
da Pedra, Selvagem como o Vento (2002) e no Projeto Solos do Brasil. Hugo Rodas, outro
Durante o processo, também ocorreram aulas abertas, com a presença dos professores
pesquisas individuais dos atores e debate com o público, gerando desdobramentos e retorno
75
conceitual para o trabalho do grupo. Paralelamente, foi criado um site43 sobre o projeto na
Internet e um fórum eletrônico específico que ampliaram a abrangência das discussões para
todo o Brasil e para o exterior, dando a oportunidade para qualquer interessado de acompanhar
estimulou cada artista a expandir seus potenciais expressivos, experimentar novas perspectivas
e criar um estilo próprio de encenação, que pudesse estar inteiramente colado às suas
participantes perante as diversas questões que envolvem a cidadania brasileira. Isso pode ter
influenciado Stoklos em sua escolha por pessoas de trajetórias e perfis artísticos diferentes para
fazer parte do projeto, procurando revelar depoimentos férteis da expressa necessidade coletiva
de novos arranjos nas relações, afirmando cada expressão como geração de potência
transformadora.
Com foco no corpo como meio e na poética do fazer teatral e entre as tantas questões
que aí se interpõem, havia um ponto de especial interesse para mim, o qual estava relacionado
com corpo: o corpo na passagem, o ato de atravessar a ponte. Sendo Florianópolis uma ilha e,
para mim, sempre um lugar único (o meu mundo no teatro, o meu começo), a passagem ou
travessia despertava em mim a curiosidade de saber o que eu poderia encontrar do outro lado
da ponte. Essa “ponte” sempre representou pra mim mais do que um lugar de passagem,
representava naquele momento, o meu espaço sempre em movimento, meu Shiva dançando44 e
43
http://denisestoklos.uol.com.br/solosdobrasil/.
44
Shiva, divindade hindu que personifica a dança e as transformações, simboliza a eterna mutação do
universo, a qual consiste na cíclica entre destruição e criação.
76
Florianópolis, antiga Desterro e mais antiga ainda Ilha de Santa Catarina, neta da bruxa
Catarina, aqui nasci e cresci. Desterro, desterrada, ilhada, isolada, jogada à própria sorte, trago
comigo meus ancestrais – alguns reconheço, outros nem imagino, mas todos se encontram em
mim e continuam lutando. Aqui o homem não quer se relacionar com sua própria história de
vida. Frente a esse quadro, meu dever passa a ser a própria resistência teatral. As produções
teatrais dos grandes centros do país sobrevoam a ilha. Acredito na força genuína e efêmera do
teatro a qual ressurge mais forte a cada manhã, vindo não se de onde, para seguir em frente
treinando, trabalhando, ativando o corpo inteiro e deixando-o preparado para o encontro com o
outro, (é eterna a corrida em torno da ilha, na busca por parceria). E eis que na exaustão, surge
em mim o ator presente firme e pronto, comprometido com o aqui e agora, com um eterno
investimento atorial e sobretudo de vida, com esta experiência que nenhum de nós pode
descrever, pois exige expressões tão incríveis que só existem no “dicionário das palavras não
ditas”. Penso que participar do projeto Solos do Brasil representa uma grande oportunidade de
investir numa pesquisa de caráter teórico, prático e sobretudo humano. Provocar e transformar,
sob o olhar de uma das maiores personalidades artísticas do Brasil. Em tempos de dificuldades,
este projeto surge como uma iluminação, um caminho que deverá ser percorrido com empenho e
suficiente: a qualidade deverá estar conectada com a espontaneidade, tomada de decisões além
arte, é fundamental encontrar, por meio de múltiplos esforços, ferramentas adequadas para cada
educativo e social, neste caso a presença mediadora e provocadora é garantia certa de uma
prática singular que considera o ser humano como um todo, um ser inteiro, essencialmente
preparado do ator ao seu processo interno de criação somado ao universo externo político,
77
social atual, deve transformar a prática diária do ator, tirando-a de um âmbito de mero acúmulo
de habilidades para conduzi-la em uma busca consciente de sentido para suas ações, e fazendo
com que a presença do ator seja encarada como substrato básico no qual se edifica a sua
expressão total. Desfazer o aparente paradoxo entre a precisão absoluta das ações do ator e
sua espontaneidade é algo que pode ser experimentado no ato presente da criação, no trabalho
constante do ator sobre si mesmo. Desenvolver maturidade para exercer e conduzir o próprio
trabalho é garantia certa de retorno e multiplicação, pois permite ao ator seguir investigando e
buscando sentido em seu trabalho aonde quer que esteja. O surgimento de tal autonomia exige
experiência humana. É essencial aos meus anseios como ser humano e artista, essa orientação
de caráter diferenciado, que aponte para uma verdadeira excelência do fazer artístico e por essa
razão me apresento ao Projeto Solos do Brasil. (Projeto Solos do Brasil: Período total de
Não desejo representar quero ser – presentificar – tornar presente. Do outro lado da ponte... A
solidão vivida na ilha, como filha única do Biguaçu45, foi transportada para uma solidão única que
se encontra em mim mesma. Minha fricção será a de ir até o fim, terminar este ciclo que eu já
não sei se está começando ou terminando. Não desejo mais representar, quero ser –
presentificar – tornar presente. Quem sabe na minha solidão encontrarei resposta para aquilo
que desejo. Qual lugar ocupa o meu trabalho no teatro que faço e desfaço e refaço46?
Estas notas que expressam minhas reflexões no centro do processo do Solos do Brasil
podem ser consideradas marcas de uma experiência que me aproximou da percepção do tecido
leitor uma descrição das sessões de trabalho para criar uma imagem dos procedimentos do
45
Biguaçu é um município que pertence ao perímetro urbano da cidade de Florianópolis, lugar onde a autora
da presente dissertação viveu até o ano de 2.002. Acredita-se que o nome da cidade tenha sua origem relacionada à
expressão tupi, Biguá (pássaro) e Açu (rio), ou ainda, que tenha relação com a fruta Baguaçu, espécie encontrada
facilmente na região.
46
Menção ao espetáculo de Denise Stoklos: Louise Bourgeois: Faço, Desfaço, Refaço.
78
CONSIDERAÇÕES FINAIS
no centro da cena, afirmando-o enquanto obra. Revela-se assim, uma forte declaração a respeito
A experiência do teatro como lugar de pesquisa e renovação estética e ética das artes
passou a demonstrar maior interesse no uso do corpo do ator, com vistas à produção de novas
Teatro de Denise Stoklos e da sua noção de ator essencial. A idéia de ator que emerge na
manifestação teatral stokliana se preocupa com algo mais do que economia, quando propõe a
presença de um único ator no palco. Há, nessa opção, uma conotação política que permite
entendermos a arte como ação que estabelece um diálogo direto com a platéia, sem que para
Tal concepção de teatro busca dar lugar a uma possibilidade teatral menos vertical e
mais democrática, pois como pensamento oriundo de um processo pós-ditatorial, contribuiu para
79
Stoklos trouxe o ator para o centro do espetáculo, não só enquanto produto, mas como modo de
produção de conceitos, o que faz com que, ao conceber esta noção de Teatro Essencial dá-lhe
condições de agir com autonomia: reinventar textos, participar de outros textos como co-autor,
noção de ator. Enfatizo, portanto, que a atualização do conceito de ator não se sustenta apenas
em suas implicações éticas ou políticas, mas afirma-se também através de uma técnica (ou
técnicas). Se, por um lado, o Teatro Essencial propõe o autodidatismo, ao mesmo tempo
dança, máscara neutra e voz. Tais técnicas visam dar suporte ao seu mote “um corpo no espaço
e uma idéia na cabeça”. A experiência do teatro como lugar de pesquisa e renovação estética e
ética das artes volta seu interesse no corpo do ator, com vistas à produção de novas abordagens
artísticas. Tendo também o corpo como suporte da ação teatral – ou performance – o teatro
stokliano reúne em torno de si uma série de habilidades técnicas distintas através das quais o
Toda ética – cujo radical grego ethos pode ser traduzido como “costume”47 – revela uma
estética e toda estética revela-se em ética. Sob tal ponto de vista, a ética e a estética
encontram-se intimamente relacionadas, e fazem parte de uma única estrutura, que fundamenta
modo de sentir e de pensar, isto é, a postura individual de cada artista diante da existência e
atingir o gozo de forma compartilhada com a audiência. Se o gozo individual está presente como
elemento propiciado pelo desejo, faz-se presente também no Teatro Essencial, afirmando o
corpo do ator e colocando-o no centro da ação. Fundem-se, neste corpo, as relações autor –
47
Os conceitos de moral e ética, ainda que diferentes, são com freqüência usados como sinônimos. Aliás, a
etimologia dos termos é semelhante: moral vem do latim “mos”, “moris”, que significa “costume”, “maneira de se
comportar regulada pelo uso”.
80
diretor – ator, através de um rigor técnico que encontra as suas bases nas diversas tradições e
Ainda como apontamento final, menciono ter localizado na prática da artista alguns
pontos discordantes com seu discurso teórico sobre o essencial, que se constituem, no entanto,
mais como paradoxos poéticos, geradores de tensão criativa, do que contradições propriamente
ditas. Neste sentido, é possível encontrar no universo espetacular de Stoklos elementos que
fogem ao rigor do Manifesto. Primeiro, Stoklos não apresenta em seu Manifesto Essencial os
elementos técnicos e de composição dos quais faz uso para encontrar seu caminho na busca
por uma essencialidade cênica. No entanto, aponta, através de seus espetáculos e da prática do
ensino do seu Teatro Essencial, para procedimentos que se repetem em todos os seus
espetáculos, seja em grupo ou em solo performance. Elementos específicos e pontuais que são
claramente explorados em seu repertório e que fazem uso de diferentes essencialidades para a
Segundo: o elemento da ficção que, assim como a preponderância dos efeitos de cena, é
banido do seu projeto de teatro, faz-se presente na sua prática, seja através da mímica, que por
natureza trabalha com a idéia de ilusão, seja por meio de diferentes elementos ficcionais
Casa, Stoklos desconstrói a ficção cenográfica solicitando sua retirada de cena por um técnico,
torno da obra da própria Bourgeois. Em sua prática, a artista demonstra não haver uma forma
única na qual o seu teatro se concretiza, preferindo apontar para formas que podem emergir
naturalmente à medida que for necessário, seja por solicitação do performer ou do ambiente ao
qual pertence.
E, por fim, Stoklos afirma a importância, em seu teatro, (aludindo ainda ao não uso de
outras idéias, solicitando a produção de textos originais produzidos pelo próprio performer. No
entanto, seus espetáculos assumem idéias que passam por Eurípides, Milton Santos, Louise de
Bourgeois chegando a Spalding Gray. A criação de textos para a performance essencial passa,
de pensamento, em um só corpo de ator. O ator que Stoklos propõe é aquele que busca
da riqueza que há em cada solidão. Quando tal riqueza é explorada, a solidão deixa de ser
articulação e expressão de uma idéia específica faz a ponte entre o indivíduo criativo e o
solidão. Note-se ainda que, de qualquer modo, a prática de Stoklos privilegia a performance solo
como instrumento, onde ela cria e dirige sua cena, sem colaboração hierárquica ou colaborativa,
entrando em contato com o outro principalmente por meio da exposição de seu projeto de cena –
seja em ensaio, seja em performance pública – numa condição de organização que mantém a
Quem procura o Teatro Essencial? Viajantes (atores e performers) que compõem esta
suposta escola, artistas que se sentem oprimidos e desvalorizados pelos apressados processos
assumem no cenário artístico nacional, destaco alguns nomes que tomaram contato direto com o
trabalho de Stoklos, e que hoje atuam em grupo ou como solistas, ligados às áreas de atuação,
direção, coreografia ou dramaturgia: Guilherme Weber da Cia. Sutil de teatro (Paraná); Ricardo
Napoleão (Minas Gerais); Silvana Abreu (São Paulo); Luis Louis (São Paulo); Vinicius Piedade
(São Paulo); Fabio Vidal (Bahia) entre tantos outros, cada um à sua maneira, encontram-se
Stoklos.
Acredito que Stoklos esteja à procura de um teatro essencialmente nacional, ainda que
tenha, em seu repertório, influências estrangeiras. Não por acaso, o projeto criativo e pedagógico
no qual participei, sob sua orientação, tinha como título Solos do Brasil, isso pode ser entendido
como Solo no sentido de solo performer, mas também com o significado de terra ou chão, visto
que seus integrantes que constituíam o projeto eram oriundos de todas as partes do país.
82
Compreender o título do projeto sob estas duas formas simultaneamente, permite perceber
dimensões mais complexas da iniciativa de Denise Stoklos em seu projeto teatral pedagógico.
É importante dizer que concluindo esta dissertação tenho a certeza que não esgoto
APÊNDICE
01/04/2002:
busca de verdades... Acabo de anotar e já não sei se sou eu ou ela onde, está a verdade?
Teatro é presença. O performer tem que ter presença, o resto é brincadeira, uma vez que
brincamos quando fazemos teatro. Luz, cenário, figurino, texto... Tudo isso são adereços que
escolhemos para compor a tela e, somos nós que escolhemos as cores que farão parte dela.
Projeto Solos do Brasil - Aula aberta com Denise Stoklos Técnicas e procedimentos do
Teatro Essencial.
Tarefa 1: Apresentação dos quinze integrantes do grupo: nome, um gesto e uma frase.
Segunda parte do primeiro encontro - com Luis Louis: Exercício 1: Caminhada pelo espaço e
percepção do ambiente ocupado. Aproveitar este momento para ser único, exclusivo, procurando
enraizar os pés, e empregar a presença para ocupar o espaço. Em seguida, sem se fixar no
lentamente, sentindo e percebendo o todo (perna esticada) usar somente o essencial. Exercício
2: Torre Eiffel: inclinar separadamente partes do corpo primeiro para direita, depois para
Exercício 3: Mímica - O plano da mesa: pegar a garrafa, o prato e servir o café (joelhos
flexionados). Perceber diferentes qualidades para cada movimento: choquinho, pontual, rápido,
Exercício 4: Em duplas falar um para o outro sobre seus problemas, tudo aquilo que não
agüenta mais em sua vida, ser forte e ir até o fim, depois falar das coisas boas e gostosas.
por Etienne Decroux (1898-1991). Inspirado em estátuas gregas e nas obras de Auguste Rodin,
02/04/2002:
1- Em pé, pés paralelos, mão direita percorre frente do peito, segue subindo, cruza a
Repetir a seqüência para o lado esquerdo, depois repetir com as duas mãos juntas
2 - Coluna inclinada para frente, braço direito balança na frente do corpo sentido direita >
esquerda, com o braço esquerdo balançar para frente e trás juntos e alternados para não haver
3 - Improvisação: Empregar toda energia pra fora, pra cima, em estado de fé e entrega.
04/04/2002:
Conte alguma coisa, sem linearidade, usando diferentes tons e estilos, sempre sob seu
domínio de escolha, ainda que aparentemente anárquico. Permita que coisas novas apareçam
na tentativa de fugir do lugar comum. Nosso cotidiano não é alimentado de emoção, ele padece
de secura e assim se mantém na ignorância. Valorize sua identidade partindo deste centro (o
seu centro). Este trabalho não é racional. O ator tem medo de ser ele mesmo e de começar a
viver de verdade. Tome seu destino nas mãos. Pegue a sua presença, só assim você estará
protegido.
Por que sempre temos que fazer coisas? Lembrei de uma música: “Eu não sei dizer nada
Tenho que quebrar o padrão, parar de repetir padrões de gestos, ritmos e idéias. O tapa
Tem algo bom na repetição? Sim, ela nos dá a chance de rever os procedimentos e
recomeçar. Será? A repetição faz parte do processo, ela é primordial, a criança aprende
Ser testemunhal não é o mesmo que ser confessional. É importante a relação do artista
com a dramaturgia, você deve estar apto, pronto para presentificar, tornar idéias vivas.
O “conte alguma coisa” acima mencionado, diz respeito ao uso do corpo como meio
expressivo. Apesar da palavra não ser negada, o foco do trabalho era a criação por meio do
corpo físico. Ao longo do Projeto Solos do Brasil, em momento algum foi privilegiada a
dramaturgia como texto, a orientação recebida sempre foi a de partir da experiência do corpo.
Mesmo durante as aulas de filosofia com Luiz Fugante ou com Gianne Ratto, que trouxe uma
visão mais tradicional de pensar o teatro, entre os outros professores. Todos tinham como mote
plástica). Fomos instigados a escrever sobre o processo e publicar nossas produções no site do
projeto, como forma de compartilhar nossas vivências e instigar possíveis discussões sobre o
Teatro Essencial.
Diferentemente daquilo que é proposto pela pantomima, que visa substituir a palavra por
gestos, a mímica de Decroux, que também estuda o movimento do corpo, procura faze-lo na
aplicação de princípios ligados ao drama na prática e uso do corpo. Exemplos utilizados: pausas,
O aquecimento foi feito pela Jô Rodrigues (uma das alunas): pés separados e paralelos,
estender bem a parte de trás, peso do corpo nos dedos dos pés, pulsar dez tempos e repetir,
86
juntar os calcanhares e repetir, repetir agora com os pés mais próximos, repetir novamente com
1- Criar uma cena, encontrar um problema e tentar resolver pela insistência. Exemplo:
(partiturizar).
Comentário de Denise:
As coisas de cunho psicológico são pura aparência, cada um aqui sabe que nosso
interesse é outro.
Reflexão do dia:
Fica esperta. Foi muito emocionante, todos nós estávamos finalmente envolvidos,
inclusive Denise. Em particular vivi uma experiência impar, foi um grito desafinado em meio ao
silencio do rito, todos abraçados, envolvidos, entregues e meu grito curto ecoando nos corpos,
Acho que Denise saiu emocionada. Sei que nosso interesse é outro. Vamos a pesquisa.
sobre a própria vida) tinham como objetivo encontrar no drama pessoal material para
desenvolver novos padrões de movimento, como uma forma de alargar as idéias de Decroux, na
08/04/2002:
87
Denise não veio. Um dia antes ela disse: “Tenho medo que vocês se sintam
desprotegidos”.
Seguimos a idéia de ritual sugerida pela Tiche Vianna (outra aluna do projeto), então
fizemos uma roda de conversa, onde cada um tinha apenas uma única oportunidade de falar.
Exercício novo...muito legal parece com Tai chi chuan, acho que era mesmo.
Exercício 1: Todos juntos; “Vamos brincar de ser uma cobra? Sim vamos”.
Exercício 2: Caminhadas pelo espaço com ponto principal, que deve anteceder todo o
resto do corpo. Testa, nariz, queixo, peito, barriga, quadril, joelho e finalmente pés. Verificar a
Exercício 1: Apresentar um gesto cotidiano, insistir nele como se ele estivesse colado,
até transformá-lo em outro, e então, congelar uma parte do corpo, enquanto o resto continua em
expressão sonora;
determinada máscara;
cada uma das partes, para que cada uma possa ser destacada.
Leitura de textos: Rubens Correa, Umberto Eco, Pina Bausch, Dalai Lama, movimento
Orientação dada para exercício de improvisação: Seja original, de acordo com sua
origem. A técnica escolhida deve estar a seu serviço, para ajudar no levantamento de temas e
88
dramaturgia. As buscas pessoais devem nos levar a uma identificação geral, referencia direta e
depoimentos e biografias.
Comentários:
compreender que agir criticamente é dar uma informação para fazer o outro crescer, ajudá-lo a
encontros e desencontros, acontece que vivemos em uma cultura sentimentalóide, por isso
temos medo de ser brega ao representar, tememos aquilo que não é e usamos sinônimos, por
isso não há emoção, há reprodução da emoção, precisamos romper com isso, necessitamos
estar em contato com a emoção mais pura, a mais forte de todas aquela capaz de transformar.
Não há separação entre a vida e o teatro. No teatro estamos protegidos a medida em que
realizamos escolhas na tentativa de encontrar um lugar onde seja possível atuar com autoridade
e, neste sentido, cada ator tem seu teatro essencial que, corresponde a requisição pessoal,
necessidade e emoção.
A ação é revolucionária e o anarquismo às vezes anda junto. Não precisa ter receios
somos diferentes, nem superiores a qualquer outra pessoa e, não há nada e ninguém que possa
nos ajudar, apenas o confrontamento consigo mesmo, e neste sentido o ator nunca está
satisfeito. Seja uma autoridade no seu teatro, informe isso à comunidade, assuma este papel,
Quatro pontos importantes percebidos hoje: Todo teatro é político; Todo teatro articula
O termo político aqui mencionado faz referência àquilo que Stoklos assume como micro-
12/04/2002
Aquecimento com Tiche Vianna: espreguiçamento, uso dos quatro apoios, um e dois
apoios nos três planos (baixo, médio e alto). Corpo inteiro em movimento, paradas mantendo o
Com Denise:
Leitura de textos:
provocar uma determinada pausa e que contenha um tônus, seguir experimentando, procurando
ponto fixo.
toque;
Apenas três atores apresentaram suas improvisações eu, Danilo e Roberto. Foi
importante ter apresentado, e ela gostou muito! Trabalhei a partir do vazio, não tinha preparado
nada, fui pega de surpresa, jamais imaginei ser chamada, ainda mais para iniciar os trabalhos do
dia. Fiz cara feia, mas fui. Enquanto Denise explicava os princípios do trabalho fiquei ao seu
lado, fiz pequenos gestos e movimentos. Durante o exercício poderia usar uma cadeira. Iniciei no
vazio, um ou outro gesto, nada importante, então me voltei pra cadeira e a arrestei até o fundo
90
da sala e assim comecei, no vazio. O corpo entrou em movimento, a voz, e as idéias foram
surgiram. Foi minha biografia mesmo, parti de assunto bem antigos...Biguaçu (Pássaro que voa
sobre o rio), Prefeito perfeito, problema genético, casa, sobre pessoas e suas opiniões, IPTU e
um pouco diferente daquela que eu já conhecia, esta é mais pontual e exige bastante alongando
do corpo. Abrir os braços esticados na lateral do corpo, subindo-os até as mãos se encostarem,
depois descer os braços até o chão com as pernas alongadas, (os pés devem estar juntos e os
dedos abertos). Subimos primeiro a cabeça então alongamos formando a imagem da mesa,
descemos novamente, num salto levamos as pernas pra trás todo o peso do corpo nos braços
sem encostar o peito no chão, alonga o peito frontal, aponta a bunda pro teto abri os ombros e
alonga os braços enraíza as mãos, “senta” sobre as pernas e num salto volta a ficar em pé com
Exercício 1: Montar uma figura, fixar, rapidamente desmontar e remontar a mesma figura.
Eglâ, Elvis, Jorge e Jô. As flores começaram a desabrochar, todos estavam apropriados,
fazendo um teatro de alta qualidade. Foi muito bonita em especial a história tocante contada pelo
Anotação dos comentários feitos por Denise: A gente não maneja as coisas que criou
para nos servir. Estou em busca de uma dramaturgia nacional. Mais uma vez Stoklos nos pediu
pra escrevermos sobre o processo que estamos vivendo o que pretendemos com nosso teatro,
Denise orienta que, nossa autoria e escolha de linguagem devem partir de um caminho pessoal,
Chame-me, me convide a assistir, não vá até o fim daquilo que está fazendo, é
importante não sentar no pensamento, precisamos ir de um lugar para o outro com facilidade e
91
assim variar o universo, solicitar a persona. Coisas concretas, nada deve ser aleatório. O
performer tem que estar engajado e agir politicamente para trabalhar com diferentes propostas
emocionais como por exemplo: ser amoroso, ter compaixão, honestidade (como encontrá-la?).
parte por partes de uma figura estatuaria utilizando movimentos com qualidades de staccatto e
Exercício 2: Câmera lenta iniciando com velocidade normal alternando com ritmos mais
lentos, fazendo pra si mesmo e para o outro, variando o foco do trabalho e outras velocidades.
Exercício 4: Modelagem: um modela o outro com apenas um dedo, depois dois dedos e
não na “massa”.
Observação: quem está sendo modelado pode variar determinadas partes do corpo ao
receber o toque, por meio de impulsos que reverberam até partes não tocadas. Qualidades de
movimentos: a) flutuação (continuo leve e com velocidade equilibrada); b) Câmera lenta (atenção
com o olhar, nele a velocidade pode ser alternada também); c) Estátua e estátua em movimento
Exercício 5: Contar histórias: em circulo um vai pro centro e faz movimentos grandes
Sem data
Exercício 1: Coreografia com música e objeto imaginário, criar várias situações diferentes
de uso do objeto criando pequenas histórias, criando uma lógica organizada por pulos ou
associações;
Exercício 2: Câmera lenta com foco nos pés e mãos, procurando trabalhar a introversão
limite e, quando o cérebro começa a produzir endorfina ele se sente exausto mas não cansado,
aproveitar para colocar o cérebro para trabalhar em diferentes direções, tamanhos e energias.
automatismo. Alguém falou em teoria quântica. Ser um com sua ação, para isso é necessário
estar decidido, ter intenção é o mesmo que ter tensão dentro do corpo, energia que você injeta
Eu sou...
Eu estou.
Por favor, me digam o que eu sou, que espaço eu ocupo no mundo? Já sei que todas as
pessoas no mundo possuem bons sentimentos inclusive aquelas que renegamos ou que nos
renegam. Cada utensílio novo tem um propósito e resolve um problema à custa de gerar outros
dez complexos e novos problemas, mas e o artista? Que compromisso tem? Com quem?
adaptar? Eu sempre penso que não vou me adaptar, e logo me dou conta que já estou
adaptada, dá minha forma, muitas vezes sem forma. E caso eu, venha a não acreditar na
verdade que estão me apontando? E se eu quiser voltar? E se eu for mal avaliada? Padrões de
avaliação, as pessoas comumente empregam falsos padrões de avaliação. O que realmente tem
valor na vida? Existem discrepâncias existentes entre os pensamentos das pessoas e suas
93
ações como também a diversidades em seus impulsos plenos de desejo. Sentimento oceânico.
Não é fácil lidar cientificamente com sentimentos. Não tente descrever seus sinais fisiológicos,
não pularei para fora deste mundo. Estamos nele de uma vez por todas, e é o único eu
conheço.Isso equivale a dizer que se trata do sentimento de um vinculo indissolúvel de ser uno
com o mundo e seus externos, como um todo. Estou sendo corretamente interpretada?
Exercício 2: Criação de cena com texto biográfico com uso dos seguintes recursos:
diferentes ritmos, tonalidades e intensidades. Partindo da emoção para construir um outro gesto
especialmente para esse teatro que não é teatro (no sentido do faz de conta); Entre um assunto
e outro deve haver uma teatralidade específica, para isso utilizar os isolamentos. Valorizar o
começo e o fim de cada processo. O corpo inteiro deve estar comprometido para sair da sala de
visitas. Construir para desconstruir. Dar ao detonador uma nova oportunidade de reorganizar e
destruir tudo que não te proporciona ser livre e feliz, sair da cadeia da inutilidade humana,
Meus comentários: Tudo é tão ilimitado. Quero uma arte que revele. Que lugar eu ocupo
no mundo. Não quero ser apenas um ruído. O que me leva até aqui é o sofrimento “estou cada
vez mais só”. Einstein. Preciso pegar a “coisa em si” o que faz alguém pegar uma florzinha? E o
outro uma pedra? O que eu tenho, o que nos une? O que eu significo para o outro, e o outro
para mim?
Comentários de Denise Stoklos: não nego passar para vocês aquilo que me ajudou até
agora, sei que deixo um certo mal estar, também sei que isso não ajuda muito. Tenho uma
sensação, parece que tudo que acontece tem um motivo. Os sinais aparecem, apontam,
conduzem. Qual será a melhor leitura? Temos que encontrar nosso lugar no mundo, nosso
Mundo labiríntico.
Corpo labiríntico.
94
Caminhada menos solitária, mais solidária, o que é o sagrado dentro do ser humano,
como tocá-lo? Como reacender a esperança e a magia? O ser humano e seus abismos,
vertigem. Provocar no espectador o pensar, emocionar, amar, ser intenso. Qual a condição
necessária para se viver no Brasil? Representar é uma possibilidade de comunicação, num jogo
incrível que mistura realidade e ficção, consciente e inconsciente, sagrado e profano, amor e
ódio, vida e morte, num difícil equilíbrio entre conquistas técnicas e simplicidade na execução.
Levo pro palco minhas idéias, minhas histórias, meus abismos, minha dor, minha luz. Exponho
minhas idéias e recebo como resposta uma nova compreensão de meus problemas, saímos
enriquecidos, com o tempo fui aprendendo a me observar e entender que o ser artista e o ser
humano que sou são a mesma coisa. Arte e vida essas são minhas aspirações. Era brutalizada e
massificada, uniformizada, percebo que o artista, o ator, consegue dissolver essa rigidez
O artista precisa ter um drama, o medo causado pela falta de sentido, nos faz dar-nos as
costas à vida e começamos a morrer.Quero entrar em contato com toda minha vida, com toda
É difícil conceber esse horror que é o interior e o exterior, que são o verdadeiro espaço.
O interior e o exterior são ambos íntimos, estão sempre prontos a trocar de lugar. O espaço
íntimo perde sua clareza. O espaço exterior perde seu vazio. O medo é o próprio ser. O excesso
rosto para construir uma máscara em oito tempos. Temos que ter controle da máscara. Exemplo:
Com Denise:
95
esses elementos ajudarão a organizar o corpo, o ritmo é elemento que transforma e torna
interessante o que é visto. O hara (barriga) deve estar sempre iluminado, para isso utilizar
sempre os Isolamentos.
Comentários de Denise: não precisamos contar (no sentido de ilustrar), expor as técnicas
que adquirimos e que gostamos de usar, o mais importante é respeitar o estilo, sua técnica não
pode ser uma prisão, os isolamentos devem ser gostosos, feitos a sua maneira. Para isso, crie
uma segunda natureza, aproprie-se dos conhecimentos adquiridos, torne-os seus. O espectador
deve ver várias camadas do trabalho do performer. Confiar no próprio taco e com isso ter
abertura por novo. Criar uma forma e acreditar nela. É o outro (o espectador) que me dá
entusiasmo (deus comigo). A solução está em projetar, ou seja, dar para o outro algo novo para
que ele possa freqüentar lugares que geralmente ele não vai, o intocável, o intangível.
Escreva sobre o processo, o que pretende, sobre sua autoria, sobre seu teatro, sobre
É preciso variar na ótica sem sair da presença, me chame a viver, me convide a assistir,
não vá até o fim do que está fazendo, não sente no pensamento, vá de um lugar para outro,
Lembre-se: Nada é aleatório, tudo é concreto. O performer tem que estar engajado, ser
político, ter ação. Pense em diferentes propostas emocionais: ser amoroso, ter compaixão...
Exercícios do dia: Escala lateral, jogo com espada imaginária e ataque nas partes:
barriga, pés, cabeça, ombro direito, ombro esquerdo... Repassando as caminhadas, mímica
objetiva e dramática: livre, transformando um objeto em outro e figura de estilo: toca discos.
expressão verdadeira é beleza pura, as pessoas ficam mais bonitas. Ser dono de sua própria
linguagem e se aprofundar nisto, recorrer aos seus medos fará você ficar mais forte. As coisas
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de cunho psicológico são pura aparência, cada um aqui sabe que nosso interesse é outro (ela
barato, ele custa muito, custa uma vida inteira. Somos oprimidos, reprimidos, tudo está
comprometido com uma cultura estabelecida que é depreciável. As regras do mercado são
regras políticas. Meu trabalho custa minha vida. Aceitar a luta e o confronto sim, mas não as
regras estabelecidas. Ter atitude política, e perceber que a corrupção está em todos os lugares,
não só na política.
Protagonista é aquele que agoniza primeiro, que morre primeiro, e todos juntos a cada
dia, eu faço o que posso no momento do palco, naquele momento faço o que posso.
éticas, o bom e o mau existem e ponto. A nossa estética vem da nossa ética, e isso é assim.
Veja onde você está, e perceba que aquilo que perdemos por causa de uma postura política,
não nos faltará. Meu lugar é no isolamento é onde me sinto confortável, Hoje em dia, Ter é o
grande deus, é o que seduz, e se você se conforma, está vendido, neste sentido o ressentimento
Sem data
Despedida da primeira fase do projeto, comentários de Denise: como usar sua potencia
positivamente? A possibilidade de grandeza tem que ser exercitada. Na vida a gente nunca está
preparada para as adversidades, aqui não (no teatro) a gente tem que estar preparado, não
fugimos à luta, e é só com o outro (platéia) que a gente consegue ser positivo. Assim estaremos,
também, criando uma platéia. Tudo que ela (a platéia) poderia ter feito ela fez, assim só faço o
que é necessário para o outro, isso se impõe naturalmente, serei um serviçal para aquela
construção de cena. Desejar dar terra para cada um, para que se tenha um momento realizado,
que o outro saia mais forte daqui. Acredito no trabalho energético, em coisas invisíveis, ondas
sobre isto.
98
desconectado com seu original. Aquilo que é pessoal tem que ser realmente muito profundo e
deste fundo é preciso encontrar o universal o sal, o tal. No risco total, apenas uma idéia na
para onde, para quem? Tudo está permeado pela ética, algo que você acredita. Isso faz você ter
opções, escolher qualidade e não o ter, deixe o vil metal passar por você, porque ética tem uma
só e funciona como um sistema, embora o mundo esteja plena transformação, acho que nossa
profissão não existe, e por isso é necessário criar no mundo posições revolucionárias. É
importante analisar critérios, às vezes tenho raiva de não poder fugir dos meus critérios. A
solidão é muito grande se você não quer se entregar. Por exemplo, a questão da produção:
como fazer?
O que vocês querem fazer e como? Quem gosta de mim sofre como eu, sou
provocadora. Pra que estudar? Satisfação pessoal é para o outro. Me preocupo com vocês,
tenho certa compaixão diante de tanta vontade, gente que largou tudo e veio de tão longe, sei
que alguns estão sofrendo. E mesmo assim, vocês estão acreditando de que só se
desenvolvendo é possível continuar, mas só isso basta? É preciso articular as idéias, se você
não consegue mexer com a sociedade nada tem valor. Se a gente está aqui e quer interferir na
sociedade vai fazer o que? Até o teatro dos estudantes é pago, estamos vivendo um momento
de evolução. É preciso comover-se com sua própria profissão. Com seu país. Estamos
protegidos enquanto estamos fazendo nossas aulinhas. Estamos sabendo para onde estamos
indo? Eu não tenho solução, vamos fazer tudo, mas não vamos aprender a colocar no mundo o
nosso trabalho. Tem que furar o sistema, conseguir ter o mesmo que o Miguel Falabella, temos
que revolucionar. Invento e levo lambada. Intenção e resultado, depoimento pessoal, minha
angústia colocada. Quero mudar o mundo, minha a única certeza é a incerteza, não basta ser
48
Entre os solistas que mais tem se apresentado e dado segmento as pesquisas destaco: Silvana Abreu
(espetáculo em cartaz, palestras e cursos), Vinicius Piedade (espetáculo em cartaz, escritor, diretor), Fábio Vidal
(espetáculo ainda em cartaz e mestrado), Tiche Vianna (espetáculo em cartaz, diretora e cursos), Jô Rodrigues
(espetáculo em cartaz), Tainá Azevedo (espetáculo em cartaz e performances) e Jaqueline Valdívia (foco na pesquisa
de mestrado em teatro essencial).
99
1) Engajamento na realização de projetos: o ator deve ser o único responsável por sua arte -
elaboração de projetos, isto é, tudo o que o performer trouxer à cena deve ser
Na busca por autonomia, ainda que o performer do Teatro Essencial não esteja
3) Autodidatismo: para que o ator encontre em suas próprias buscas uma ação teatral coerente
O performer não precisa pertencer a uma determinada escola: antes disso, ele
precisa reconhecer em si mesmo seu desejo de expressão e ser fiel para com a
sua natureza. A técnica é bem vinda, mas a expressão não deve se submeter a
coletiva ou individual.
5) Expansão e multiplicação: um solista nunca está só, a platéia é cúmplice, ator e o público
transformadora.
empírica.
produza o novo.
Este ponto remete aos ideais da geração Hippie, que tinha como lema a
e sustentação da imagem.
101
10) Presença: o ator é performer e, neste sentido, é necessário ter presença e ocupar o
O ator essencial deve aproveitar cada movimento para ser único e exclusivo no
mundo, pois outro como ele não existe. Este item diz respeito à importância da
outros (platéia).
chama atenção à força com que a artista se coloca em cena, finalizando com a
figurino e até mesmo sem a palavra, mas não sem um ator. Mesmo que haja
teatro sem a figura do ator, ainda assim ele terá servido como inspiração para
uma outra teatralidade onde ele não é o centro. Desse modo, tudo que é
humana no palco.
102
não do humilhado.
Não deve haver conformismos na arte e na vida, vida e arte devem se encontrar
em que vive.
O teatro procura anular dicotomias como as que separam o corpo e mente, o ser
situação.
18) Resistência à alienação: encenar e escrever sobre temas sociais contemporâneos, para
seja, perceber a história. Desse modo, o teatro deve ser uma escolha
necessária, não deve ser perda de tempo ou uma escolha trampolim para uma
convencionais.
presente uma necessidade de registrar minha compreensão sobre o Teatro Essencial, a qual
Após o final do Projeto, segui mantendo contato com Stoklos por aproximadamente seis
meses, período durante o qual me apresentei em diferentes lugares do Brasil. No entanto, sentia
que ainda havia pouco de mim naquilo que eu estava fazendo, pois minha relação com o Teatro
acentuado a necessidade de organizar todas as idéias e impressões por meio da escrita, com
objetivo de finalizar esta etapa da minha vida e de buscar a minha maneira de viver o Teatro
O fato é que eu nunca abandonei meu Solo do Brasil. Ainda que não o tenha mais
apresentado desde o ano de 2004, procuro mantê-lo vivo na memória do corpo e das idéias, no
sentido de tentar manter e restaurar algo até então ainda não acabado. Por meio desta
dissertação de mestrado, creio ser possível compartilhar a experiência para iniciar uma nova
etapa, uma vez que os conhecimentos adquiridos naquele momento já passaram por seu
amadurecimento. Penso ter encontrado, na realização deste mestrado, uma forma correta para
compartilhar o investimento pedagógico que com tanta honra recebi, ao participar do projeto
fundamental no que diz respeito a restaurar algumas lacunas conceituais necessárias a uma
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Solos do Brasil
Solos do Brasil. (espetáculo) Direção e Produção: Denise Stoklos, Cláudia Dorey e Jaqueline
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Roda Viva
- Denise Stoklos. Realização e produção: TV Cultura, 2001.
- Marcel Marceau. Realização e produção: TV Cultura, 1997.
- Milton Santos. Realização e produção: TV Cultura, 1997.
Entrevistas e depoimentos:
2007: Com Alberto Guzik, Claudia Dorey, Cristóvão Tezza, Denise Stoklos, Silvana Abreu e
Tiche Vianna, por e-mail.
2006: Jorge Baia, Fabio Vidal e Danilo Souto Pinho em São Paulo.
2002: Denise Stoklos no projeto Solos do Brasil em São Paulo SESC - Ipiranga.