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UNIRIO – UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CURSO: ESTÉTICA E TEORIA DO TEATRO

ALUNO: MARCELO APARECIDO DA CRUZ PRATES

MATRÍCULA:20212415007

DISCIPLINA: INVESTIGAÇÕES CONCEITUAIS EM TEORIA DO


TEATRO

PROFª. FLORA SUSSEKIND

ANO 2023.1
UNIRIO – UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

O teatro, como forma de expressão artística, tem desempenhado um


papel significativo na sociedade ao longo dos séculos. A interação entre o
público e a performance teatral é um elemento essencial para a criação de
significado e impacto emocional. Nesse contexto, a teoria da recepção surge
como um campo de estudo que busca compreender a experiência do
espectador e sua influência na apreciação e interpretação da obra teatral.

Este trabalho tem como objetivo explorar a teoria da recepção do


espectador de teatro, examinando os principais conceitos e abordagens
teóricas utilizadas nesse campo. Compreender como o espectador recebe e
interpreta a performance teatral é fundamental para uma análise aprofundada
do processo de comunicação teatral e da maneira como as mensagens são
transmitidas e assimiladas.

A teoria da recepção, originada na década de 1960, representa uma


mudança de perspectiva em relação aos estudos teatrais tradicionais, que
muitas vezes se concentravam exclusivamente na análise dos elementos da
obra e na intenção do autor. Em vez disso, essa abordagem coloca o
espectador como peça central, reconhecendo a sua atuação ativa na
construção do significado teatral. A teoria da recepção aborda questões
relacionadas à recepção estética, ao papel do contexto sociocultural, às
expectativas individuais e à subjetividade do espectador.

Ao explorar essa teoria, será possível analisar como a interação entre a


performance, o espaço cênico e o espectador contribuem para a construção de
significados múltiplos e complexos. Além disso, a compreensão da teoria da
recepção permite investigar como fatores como a formação cultural, o
background individual e as experiências pessoais do espectador influenciam
sua percepção e interpretação da obra teatral.
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Para embasar este trabalho, serão considerados estudos teóricos que


abordam a teoria da recepção do espectador do teatro, bem como,
experiencias deste signatário como espectador em alguns espetáculos teatrais
que vistos nos anos de 2022 e 2023. Através da revisão da literatura existente,
pretende-se identificar as principais correntes teóricas, os conceitos-chave e os
debates em torno dessa abordagem, bem como fornecer exemplos práticos
que ilustrem a aplicação da teoria da recepção em produções teatrais
específicas.

Dessa forma, este trabalho busca entender a contribuição dos estudos


teatrais ao trazer uma perspectiva que valoriza a participação ativa do
espectador e sua capacidade de atribuir significado à experiência teatral. Ao
compreender como a teoria da recepção pode ampliar nossa compreensão do
teatro como um fenômeno cultural e social, estaremos mais bem equipados
para apreciar e analisar as produções teatrais contemporâneas e suas relações
com o público.

Salienta-se que não serão esgotados todos os estudos existentes sobre


o assunto, por se tratar de um trabalho de conclusão de disciplina –
Investigações Conceituais em Teoria do Teatro - em curso de graduação, ou
seja, não havendo tempo hábil e nem saberes acadêmico que poderiam
desembocar na criação de um novo conceito a respeito do tema. A intenção
aqui é discutir o tema com base nos estudos já feitos por pesquisadores e
acadêmicos da teoria do teatro e da recepção teatral, salientando ainda que
este é um campo de estudo de interesse de pesquisa futura desse signatário,
conforme já dito a Profª Flora Sussekind.

Preliminarmente, vamos falar sobre alguns dos principais conceitos e


abordagens teóricas utilizadas no campo da teoria da recepção do espectador
de teatro, a saber:

Atividade do espectador: A teoria da recepção enfatiza a atuação ativa


do espectador no processo de recepção teatral. Em vez de ser um mero
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receptor passivo, o espectador é considerado um participante ativo que


contribui para a construção de significado e interpretação da obra teatral.
Durante uma peça teatral interativa, os espectadores são convidados a
participar ativamente da performance, interagindo com os atores, tomando
decisões e influenciando o curso da narrativa. Sua participação ativa contribui
para a criação de um ambiente teatral imersivo e envolvente. Eu tive uma
experiencia dessas ao assistir uma peça do Gregório Duvivier (Portátil), na
qual, os atores no palco iam até a plateia e pediam para contarem uma história
de acordo com determinada pauta por eles mencionada. E a partir, daquelas
histórias eles elaboravam a dramaturgia na hora e iam encenando a estória
narrada pelo espectador, com o mais alto grau de improviso. Depois o
espectador é chamado ao palco para avaliar se a cena saiu a contento. Cá
entre nós, acho difícil que alguém diga que detestou a cena ou coisa do tipo,
porque o espectador já esta envolvido pelo que se passou no palco.

Horizonte de expectativas: Esse conceito, desenvolvido por Hans Robert


Jauss, refere-se ao conjunto de conhecimentos, crenças e experiências prévias
que um espectador traz consigo ao assistir a uma peça de teatro. O horizonte
de expectativas influencia a maneira como o espectador interpreta e recebe a
obra teatral. Um espectador que cresceu assistindo principalmente a comédias
leves pode ter um horizonte de expectativas específico ao assistir a uma peça
de teatro. Se essa pessoa assistir a uma peça de teatro experimental e
provocativa, suas expectativas podem ser desafiadas, o que pode resultar em
interpretações e reações diferentes das que teria em uma comédia
convencional. Um exemplo que sempre citarei porque por mais que espere
tudo e nada quando saio de casa para ver algum espetáculo do Zé Celso, ele
sempre consegue subverter meus sentimentos em relação ao que espero. Seja
na dramaturgia a exemplo do seu atual Esperando Godot, seja nas soluções
cênicas envolvendo os espectadores através de suas orgias antropofágicas.
Muito provavelmente, o espectador que viu a peça o Rei da Vela na década de
60 teve uma recepção diferente de quem viu a montagem em 2019, porque
eram tempos históricos diferentes, um pais com anseios e expectativas
diversas, apesar das tentativas de macularem a democracia em ambos os
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momentos; fato que se concretizou na década de 60. Essa proposta da


Estética da Recepção é o diálogo entre diacronia e sincronia no processo de
compreensão total da obra, sendo que a historicidade da literatura revela-se
justamente nos pontos de intersecção entre ambas.

Recepção estética: A recepção estética diz respeito à experiência


estética do espectador ao assistir a uma performance teatral. Envolve a
resposta emocional, a apreciação estética e a reflexão crítica em relação à
obra teatral. Durante uma apresentação teatral emocionalmente intensa, os
espectadores podem experimentar uma resposta emocional profunda, como
tristeza, raiva ou alegria intensificada. A apreciação estética nesse caso está
relacionada à experiência emocional despertada pela performance. Um
exemplo disso ocorreu a pouco mais de 3 semanas atrás quando fui ver o
espetáculo Macacos, do Clay Nascimento e confesso que a dramaturgia feita
em cima das dores e experiencias de pessoas negras sofrem com o racismo
me ocasionaram de forma exponencial durante as quase 3 horas de peça um
misto de extrema tristeza e muito ódio. E me fez ficar pensando no assunto por
quase uma semana inteira com aquela mesma mistura de sentimentos do
momento. Apesar de vivenciar tais dores diariamente, sem contudo, sofrer de
forma direta o racismo, pois apesar de ser um homem preto, pertenço a uma
classe social melhor que a maioria dos demais negros no país, ser o
espectador naquele momento me fez passar por coisas que cotidianamente
não sofro e foi uma experiencia bem ruim. Estava acompanhado de um amigo
branco, que ficou tão ou mais perturbado que eu, pois como ele me disse a
peça tocou nele num lugar de culpa pelos privilégios advindos de sua cor, e
mais, por ele achar que não estava fazendo o mínimo necessário como aliado
da causa antirracista.

Papel do contexto sociocultural: A teoria da recepção reconhece a


importância do contexto sociocultural na recepção teatral. O background
cultural, as normas sociais, as expectativas da comunidade e os valores
dominantes podem influenciar a maneira como os espectadores interpretam e
reagem à obra teatral. Uma peça de teatro que aborda questões políticas e
sociais específicas de uma determinada cultura ou época pode ser recebida de
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maneira diferente por espectadores de diferentes origens culturais. As normas


sociais, os valores e as experiências coletivas de cada espectador podem
influenciar sua interpretação e resposta à obra. O espetáculo Macacos acima
mencionado, acho que se encaixa perfeitamente nesse conceito. Um outro
exemplo que poderia citar é o espetáculo Cuidado quando for falar de mim, que
como numa delicada peça de câmara, caminhando no arriscado limite da
simplicidade, e um elenco afiado, vai dando voz e corpo a várias histórias e
personagens cotidianos, a partir de depoimentos reais, unidos por um fio
condutor comum: o HIV. Num jogo de cena que valoriza a delicadeza, os
silêncios e os afetos, a peça é acima de tudo, uma ode a vida e a esperança e
um grito contra o preconceito. Impossível sair desse espetáculo sem se sentir
tocado e refletindo sobre tais vivencias.

Coletividade da recepção: Essa abordagem destaca a dimensão social


da recepção teatral. Considera-se que a experiência teatral é moldada pelas
interações entre os espectadores, a influência do grupo e as trocas
comunicativas que ocorrem durante e após a performance. Durante uma peça
teatral de comédia, a reação e a risada coletiva do público podem criar uma
atmosfera de envolvimento e diversão compartilhada. A interação entre os
espectadores, incluindo suas respostas emocionais e expressões durante a
peça, pode influenciar a experiência teatral individual e coletiva. Essas peças
de standy up comedy servem bem a esse propósito, e o publico ao escolher
assistir um espetáculo desse está querendo apenas se divertir naquele
período, ou até mesmo se alienar, deixando de lado um pouco as mazelas do
seu dia a dia.

Polissemia e ambiguidade: A teoria da recepção reconhece que as obras


teatrais são muitas vezes ambíguas e abertas a múltiplas interpretações. Cada
espectador pode atribuir significados diferentes à mesma peça, dependendo de
suas vivências, perspectivas individuais e contextos pessoais. Uma peça de
teatro que apresenta um final aberto ou ambíguo pode gerar interpretações
variadas entre os espectadores. Cada espectador pode atribuir significados
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diferentes à obra, dependendo de sua bagagem cultural, vivências pessoais e


perspectivas individuais. Um exemplo recente visto foi o espetáculo Misery,
Louca Obsessão estrelado pela atriz Mel Lisboa, que além de ter cenas um
tanto quanto desconexas de uma visão única, apresenta um final que dá
margem a interpretações diversas por parte do espectador.

Análise do receptor: A análise do receptor é uma abordagem que visa


compreender o público-alvo de uma produção teatral específica. Examina-se a
demografia, as características sociais, os interesses e as expectativas desse
público para adequar a performance às suas necessidades e preferências.
Antes de montar uma peça teatral voltada para crianças, os criadores do
espetáculo realizam pesquisas sobre as características e interesses do público
infantil-alvo. Com base nessa análise do receptor, adaptam a narrativa, o
vocabulário e as interações no palco para envolver e cativar esse público
específico.

Estudos de recepção empírica: Além das abordagens teóricas, a teoria


da recepção também incorpora estudos de recepção empírica. Esses estudos
utilizam métodos de pesquisa qualitativos e quantitativos para investigar as
respostas e as percepções dos espectadores diante de uma obra teatral,
fornecendo insights sobre a recepção teatral na prática.

Segundo Clovis Massa, em seu artigo intitulado Redefinições nos


estudos de Recepção/ Relação Teatral, apesar do considerável avanço
efetuado nos últimos tempos pelos estudos teatrais, as perspectivas nos
escritos sobre recepção permanecem mais defendidas do que desenvolvidas.
Ao menos no campo teatral, recepção e concretização, enquanto termos
empregados pelas teorias da recepção mostraram se inapropriados para os
princípios de origem aos quais se vinculavam. princípios de origem aos quais
se vinculavam. O vocábulo recepção, fortemente marcado pela teoria da
informação, parecia contradizer a atividade produtiva do espectador, a
concepção de que, em seu processo de apreensão, ele não apenas “recebe”,
mas é corresponsável pelos sentidos da obra. Concretização, por sua vez,
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deixou simplesmente de corresponder ao processo de interpretação do leitor, e


precisou ser diferenciada da concretização cênica, realizada pelos produtores
do espetáculo. Em busca de legitimação, as teorias de recepção teatral
esforçaram-se em explicar seu viés de oposição às práticas vigentes, porém
nunca corrigiram essa inadequação.

Nem se afirmaram como instância pragmática, com a finalidade de


interagir diretamente na atividade receptiva, através do impacto que a reflexão
poderia propiciar à prática com a instauração de novos paradigmas cênicos,
como a teoria da recepção de Hanss-Robert Jaus pretendeu que, com o tempo,
a história da literatura interferisse na experiência estética do leitor.

Ao longo deste trabalho, exploramos a teoria da recepção do espectador


de teatro, examinando seus principais conceitos e abordagens teóricas. Foi
possível perceber que a teoria da recepção coloca o espectador no centro do
processo teatral, reconhecendo sua atuação ativa na construção de significado
e interpretação da obra.

A atividade do espectador é fundamental nesse contexto, pois ele não é


apenas um receptor passivo, mas sim um participante ativo que traz suas
experiências, conhecimentos e expectativas para a experiência teatral. O
horizonte de expectativas do espectador desempenha um papel importante na
forma como ele interpreta e assimila a obra teatral, podendo ser desafiado e
transformado ao entrar em contato com produções que fogem de suas
expectativas habituais.

A recepção estética é uma dimensão crucial desse processo,


envolvendo a resposta emocional, a apreciação estética e a reflexão crítica do
espectador diante da performance teatral. É por meio dessa experiência
estética que o espectador se conecta com a obra, atribuindo significados e
estabelecendo uma relação íntima com o universo teatral.

A teoria da recepção também nos leva a considerar o papel do contexto


sociocultural na recepção teatral. As influências culturais, normas sociais e
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experiências individuais moldam a interpretação do espectador, trazendo


camadas de significado e ressonâncias únicas para a experiência teatral.

A coletividade da recepção destaca a importância das interações entre


os espectadores durante a performance teatral, criando um ambiente de troca e
participação compartilhada. É nesse contexto que a polissemia e a
ambiguidade emergem, permitindo que cada espectador atribua interpretações
e significados distintos à obra teatral, refletindo suas perspectivas individuais e
experiências de vida.

A análise do receptor nos leva a considerar a importância de conhecer o


público-alvo de uma produção teatral específica, adaptando a narrativa e a
abordagem cênica para criar uma conexão mais profunda com os
espectadores.

Em suma, a teoria da recepção do espectador de teatro amplia nossa


compreensão do teatro como um fenômeno cultural e social, colocando o
espectador como um participante ativo na criação de significado. Ao
reconhecer a importância da experiência individual e coletiva do espectador,
somos capazes de apreciar e analisar as produções teatrais contemporâneas
de forma mais rica e significativa.

A compreensão da teoria da recepção do espectador de teatro nos


permite valorizar a complexidade e a diversidade das respostas do público,
promovendo uma apreciação mais profunda e significativa da arte teatral.
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Bibliografia

Jauss, H. R. A história da literatura como provocação à teoria literária.


São Paulo: Ática.1982

Eco, U. Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva. 1994

Iser, W. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. São Paulo: Ed. 34.
1996

Barthes, R. O prazer do texto. São Paulo: Perspectiva. 2004

Rancière, J. O espectador emancipado. São Paulo: Martins Fontes.2009

Zilberman, Regina. Estética da Recepção e História da Literatura. São


Paulo: Ática, 1989.

Massa, Clóvis Dias. Estética Teatral e Teoria da Recepção. Link:


https://www.academia.edu/63138985/Est
%C3%A9tica_Teatral_e_Teoria_da_Recep%C3%A7%C3%A3o

Espetáculos Mencionados:

Esperando Godot, peça dirigida por Zé Celso Martinez, com Marcelo


Drummond, Alexandre Borges, Ricardo Bittencourt, Roderick Himeros e Tony
Reis. 2022.

Portátil, peça dirigida por Gregório Duvivier, com Luiz Lobianco, João
Vicente de Castro, Gustavo Miranda e o próprio diretor. 2023.

Macacos, peça com direção e atuação de Clay Nascimento, 2022

Misery, Louca Obsessão, Com Mel Lisboa, Marcelo Airoldi e Alexandre


Galindo. Direção Erick Lenate. 2022

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