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TEATRA

DEZEMBRO 2023
O Centro de Pesquisa Teatral (CPT_SESC) foi criado em
1982 como laboratório permanente de criações teatrais,
formação de atores e de dramaturgos. Ao longo das dé-
cadas, ganhou reconhecimento da crítica e de seus pares
como referência no fazer teatral.
TEATRA
De 7 a 16 de dezembro, o Sesc Consolação recebe o lançamento
da Série TEATRA, projeto que nasceu em 2018, a partir de um
convite do Prof. Flávio Desgranges para a Profa. Dodi Leal.
A ideia seria ela organizar uma série vetorizada partindo
de referências de sua pesquisa de doutorado no Instituto
de Psicologia da USP sobre Performatividade Transgênera.
As duas primeiras obras da série foram lançadas em 2021 e,
agora, em 2023, as demais quatro estão sendo lançadas simul-
taneamente. Dessa forma, o projeto traz mesas de cada uma
desses livros, além de performances e conferências.
Tramaturgias
Estamos em meio a guerras exorbitantes, vivendo processos
de calamidade de saúde em escalas pandêmicas, com superaque-
cimento global, onde extinções e genocídios caminham um ao
lado do outro, e em que a fome e a pobreza têm feito sangrar
as veias já arrombadas de Abya Yala. É deste metrônomo do
fim que ainda se tenta conjugar abismos corpóreos em tempos
verbais que se pretendem planimétricos.

Ora, mas de que fim falamos? Quando o imaginário do fim apoca-


líptico hollywoodiano é o único paradigma que está no balcão
da sociedade, o atacarejo do futuro torna-se o agenciador de
um produto vendável e rentável, o qual eu tenho nomeado de
fimturo. Este escrito, inclusive, está sendo elaborado numa
fimturo
Black Friday. Mais do que o lema de que é preciso por tudo à
venda, assume-se que é preciso aproveitar o máximo das ofer-
tas, por que elas vão “acabar”. Alguém avisa que é o próprio
“acabar” que está sendo vendido?

É nos escombros de uma sucessão de projetos coloniais e im-


perialistas que nos encontramos. Nestas ruínas é que se faz o
teatro. Bem, mas ao longo da história o fazer teatral não es-
teve exatamente aquém da colonialidade. É, portanto, partíci-
pe e consequente da produção colonial do resto, do que sobra.

Assim, fazer teatro tornou-se uma insídia. Mas quem é que


trai quem? Se o que caracteriza o teatro é sua geolocalização
imbricada até as vísceras com a vendabilidade do fim, podemos
dizer que a teatra é uma traição ao teatro. Uma blasfêmia ao
ilusionismo dramático, emergida de suas próprias periferias.
Ao longo da história, onde havia o teatro, a teatra sempre
foi subterrânea e tectônica.

Mas ainda há quem tente medir as mazelas da sociedade do


espetáculo com a espetacularização da sociedade. Os textos
se esgarçam junto com analistas que buscam saber qual o
maior horror possível: se as atrocidades que acompanhamos no
Oriente Médio, ou se as perversidades já bem naturalizadas
do “Ocidente Baixo”, onde reinam as baixarias neoliberais.
Pois, aí, talvez o teatro já tenha deixado de ser um absurdo
há muito tempo.

É texto que fala. Aliás, para fabular o fim do teatro — em


seus percalços e tensionamentos coloniais — é preciso que
seja observada a quebra da cumplicidade da narrativa cênica
com o drama como um paradigma de textualidade. Mas, será
que o teatro está para o drama assim como a teatra estaria
para a trama?

De 7 a 16 de dezembro no Sesc Consolação teremos a opor-


tunidade de esgarçar essa reflexão acompanhando um conjunto
de ações do lançamento da Série TEATRA,
TEATRA da Editora Hucitec.
Além de debates com autoras e convidadas, teremos duas con-
ferências, uma oficina e três apresentações performativas.
Procuramos reunir nestes encontros elaborações provocativas
e que nos incitam a encontrar caminhos de tramaturgias
tramaturgias.

Tenho dito que a Série TEATRA é um feitiço. Efetivamente,


quando criei a palavra teatra na minha tese de doutorado sobre
Performatividade Transgênera — cuja parte dela, inclusive,
é o primeiro livro da série — quis sublinhar que ela é uma
anunciação transfeminista que indica não apenas uma renovação
do teatro (fulgurado tradicionalmente pela macharia cisgênera
branca-elitista da arte). Trata-se mesmo de lidar com as ru-
ínas e os restos coloniais das artes da cena. Neste sentido,
a teatra não é um fenômeno histórico do pós-teatro, mas uma
fabulação do pó do teatro.

É preciso dizer que a Série TEATRA nasce de processos de com-


panheirismo, seriedade e luta. Em 2018, na ocasião da banca de
defesa da minha pesquisa de doutorado em Psicologia Social no
Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, o Pro-
fessor Flávio Desgranges, editor das já consolidadas séries
Teatro e Pedagogia do Teatro da Editora Hucitec de São Paulo,
me convidou a organizar uma nova série vetorizada a partir de
paradigmas referentes da investigação. Eu prontamente aceitei
o desafio e procurei desenhar uma conciliação entre as possi-
bilidades editoriais e algumas ideias de autoras para começar.

Em 2021, temos a primeira concretização da série com a pu-


blicação de dois livros: o meu próprio — já me dividindo
entre editora e autora — e do Ian Habib em torno dos Corpos
Transformacionais, fruto de sua pesquisa de Mestrado em Dan-
ça na Universidade Federal da Bahia.

Em 2023, a série ganha com este lançamento simultâneo de


novos quatro livros de pessoas autoras e pesquisas exponen-
tes do campo das Artes Cênicas: Stela Fischer, André Rosa,
Daniel Colin e Galiana Brasil. Explorando os temas de corpo-
ralidades, feminismos, performance, desobediências e curado-
rias, essas novas obras compõem a abertura de campo da série
que prevê a veiculação de quatro obras por ano ao público.
Com capas personalizadas, únicas e feitas a mão pelas artis-
tas Raphaellie Läz e Duda Faria, a Série TEATRA constitui-se
como um marco na direção de difusão de livros-obras e na tro-
ca profícua das visualidades com as textualidades da cena.

Estas ações para as quais convidamos a todes significam a


reunião de muitos trabalhos preciosos. Esperamos que se ve-
rifique que a emergencialidade da teatra é a sua acontecência
em giras não-lineares do tempo da cena. Neste sentido, as
obras dessa série são rasgos de contiguidade, nos quais se
observa nódulos de cruzo.

Ao me apresentar agora ao público me dividindo entre as fun-


ções de editoria e curadoria, aponto que as disjunções mo-
leculares que se examinam nos textos desta série conferem à
teatra uma condição clínica da cena. Neste sentido, os cruzos
teatrais não remetem apenas às crises sociais, mas às travas.
Travar como sintagma analítico de fissuras ao CIStema.

Aqui as pesquisas são atitudinais e as investigações são


sonhos. Diante do teor industrial do marcado mercado edito-
rial, outorgamos neste projeto a artesania como modo de re-
velação dos conteúdos que transbordam de dentro dos livros.
Assim, a leitura aqui é feitura, e não fatura. A teatra te
lê tal como ela rompe com o binarismo conteúdo-continente.
Procuramos, então, enfatizar a noção de que a magia de um
livro é uma encruzitrava
encruzitrava.

Mais do que livros orgânicos e sustentáveis, dispomos cada


livro como um corpo. E cada número da série é também uma
peça de um outro corpo composto. Cada ponto que se faz nestes
pedaços desfaz o ideário especista de humanismo. Por isso,
a técnica usada não é a costura, mas a sutura
sutura. E, por sua
vez, o que revelamos é o abalo dos padrões e dos patrões do
teatro. A sutura é também um surto do capitalismo e das artes
cênicas. As obras da teatra são, portanto, esquizolivros não
de artes cênicas, mas de artes cínicas.

A teatra conjuga pluralidade com a aversão às romantizações.


Somes infinites. Qualquer propósito transfeminista deve ser,
por excelência, a abrangência.

A teatra é feita de texto sim. Mas é também feita de contor-


nos, caminhos, experiências.

Essa é uma emboscada pro teatro. E não há teatre que não


seja teatra.

Dodi Leal
Diretora Editorial da Série TEATRA
e curadora da TEATRA

Santa Cruz Cabrália / Bahia, novembro de 2023


programação
Fotos: Acervos pessoais

conferências_

Dramas do Teatro e Tramas da Teatra


COM FLÁVIO DESGRANGES E DODI LEAL
Nesta conferência de abertura da série, o docente Flávio Desgranges
e a educadora, performer e pesquisadora Dodi Leal analisam a rela-
ção dos processos do drama do teatro e as alterações nos modos nar-
rativos da cena nos quais se desenham possíveis tramas da TEATRA.

7/12. QUINTA, 19H ÀS 20H30


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. LIVRE
Foto: Raphaellie Laz
Suturando Afetos, Estancando Feridas
METODOLOGIA LÄZ: ABERTURA DE PROCESSOS
COM RAPHAELLIE LÄZ
Apresentação e exposição de parte do processo criativo que tem
sido desenvolvido por Raphaellie Lázaro enquanto artista-criadora
da identidade visual da Série TEATRA. Raphaellie abordará também
como sua trajetória, formação e relação com a organizadora da co-
leção, Dodi Leal, impactam diretamente na metodologia da proposta
estética que compõe a identidade visual.

16/12. SÁBADO, 15H30 ÀS 17H


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. 18 ANOS
Fotos: Acervos pessoais

debates_

O Sul do Corpo é nosso Norte


COM DANIEL COLIN, PAULX CASTELLO E ANDREW TASSINARI
Tendo em vista a perspectiva pós-pornográfica e a inflexão decolo-
nial, esta atividade examina realizações cênicas produzidas por
performers e artistas brasileiros que fazem uso do sul do corpo
como ferramenta estético-política capaz de desestabilizar parâme-
tros hegemônicos perpetrados pela lógica colonial.

8/12. SEXTA, 14H ÀS 16H


ESPAÇO PROVISÓRIO. GRÁTIS. 18 ANOS
Performatividade Transgênera:
Equações Poéticas de Reconhecimento
Recíproco na Recepção Teatral
COM DODI LEAL, JAQUELINE GOMES DE JESUS
E RENATA CARVALHO
Reflexões da pesquisa de doutoramento da performer e professora
Dodi Leal, que visa investigar elementos sensíveis da teatralidade
transgênera para avaliar como ocorrem as situações de reconhe-
cimento e desrespeito nessa cena a partir de dimensões poéticas
atuantes na recepção e na performatividade de gênero.

9/12. SÁBADO, 17H ÀS 19H


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. LIVRE
Fotos: Acervos pessoais

Mulheres, Performances e Ativismos


na Cena Latino-Americana
COM STELA FISCHER, DÉBORA MARÇAL E VERÔNICA FABRINI
Identificação e análise de ações performáticas de mulheres artistas
latino-americanas, tendo como base a teoria crítica feminista e
os estudos de gênero.

14/12. QUINTA, 17H ÀS 19H


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. LIVRE
Protocolos de Convivialidade:
Performance, Pedagogia e
Dissidências Anticoloniais
COM ANDRÉ ROSA, JULIANA NOTARI E NATT MAAT
Práticas e teorias artísticas e educacionais que elaboram desi-
dentificações às epistemologias ocidentais hegemônicas por meio da
proposição de metodologias criativas e políticas em performance
e pedagogia que reinscrevem e reconstroem discursos, representa-
ções, imaginários e práticas corporais.

15/12. SEXTA, 17H ÀS 19H


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. LIVRE
Fotos: Acervos pessoais

Artes Cênicas em Transe: Notas sobre


a Curadoria
COM GALIANA BRASIL, VALMIR SANTOS E ISADORA RAVENA
Discussão sobre curadoria como organismo vivo, pulsante, portanto,
aberto a transformações. Repercute alguns aspectos ligados à atua-
ção da curadora Galiana Brasil como gestora cultural por 15 anos no
Sesc Pernambuco e, mais fortemente, o exercício da gestão das artes
cênicas no Itaú Cultural, onde atua desde outubro de 2015.

16/12. SÁBADO, DAS 17H ÀS 19H


ESPAÇO DE LEITURA. GRÁTIS. LIVRE
Foto: Jenniferglass
performances_

Não Ela: O Que é Bom Está


Sempre Sendo Destruído
COM OLIVER OLÍVIA E LUCAS MIYAZAKI
Um casal começa a morar junto ao mesmo tempo que um deles começa
seu processo de transição de gênero. O marido cisgênero então
escreve um texto sobre suas questões que emergem no convívio com
seu marido trans.

8/12. SEXTA, 19H ÀS 20H


ESPAÇO PROVISÓRIO. INGRESSO R$ 30 | R$ 15 | R$ 10
18 ANOS
Foto: Murilo Simões

BACI
COM ANDRÉ ROSA
Protocolo de convivialidade que compartilha do sagrado, da vida e
das fantasias através do ato de abraçar. O abraço solicita dos
corpos numa reprogramação biotecnomágica, que reconfigura nossas
vidas na comemoração de nossos excessos e transbordamentos. A única
ação é o abraço!

14/12. QUINTA, 19H ÀS 20H


DIVERSOS ESPAÇOS. GRÁTIS. LIVRE
Foto: Alessandra Haro
Trava Bruta (fragmento)
COM LEONARDA GLÜCK
Excerto do espetáculo homônimo, criação da atriz e dramaturga bra-
sileira Leonarda Glück a partir de sua experiência transexual. A
montagem original, de 2021, com direção de Gustavo Bitencourt, foi
realizada através da 6a Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos
Cênicos do Centro Cultural São Paulo.

15/12. SEXTA, 19H ÀS 20H


ESPAÇO PROVISÓRIO. INGRESSO R$ 30 | R$ 15 | R$ 10
16 ANOS
Fotos: Acervos pessoais

workshop_

Suturando Afetos, Estancando Feridas


COM RAPHAELLIE LÄZ E DUDA FARIA
Voltada à prática da manufatura e da artesania que dá vida a iden-
tidade visual da Série TEATRA. As artistas se propõem a uma expe-
riência imersiva que se inicia a partir de uma mediação das obras
expostas e uma atividade com o público por meio de interferências
estéticas nas matrizes.

7 E 14/12. QUINTAS, 14H ÀS 16H


ESPAÇO PROVISÓRIO. INSCRIÇÃO R$ 30 | R$ 15 | R$ 10
18 ANOS
TEATRA
CPT_SESC
De 7 a 16 de dezembro de 2023

Foto da capa: Camila Falcão para o documentário “Abaixa que é tiro!”

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