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RETALHOS ARCAICOS DA ONIPOTÊNCIA:

AS URDIDURAS DA FANTASIA
EM O MÁGICO DE OZ, DE LYMAN FRANK BAUM
Matheus Pereira de Freitas (UFPB/LIGEPSI)
Hermano de França Rodrigues(PPGL/LIGEPSI)
Lyman Frank Baum (1856-1919)
•The Maid of Arran (peça de teatro,1882)
•The Book of Hamburgs (guia de aves de capoeira, 1896)
•By the Candelabra's Glare (poesia, 1897)
•Mother Goose in Prose (prosa que reconta as rimas da Mother Goose, (1897)
•Father Goose: His Book (poesia sem sentido, 1899)
•The Army Alphabet (1900)
•The Navy Alphabet (1900)
•Songs of Father Goose (Pai Ganso, com mú sica, 1900)
•The Art of Decorating Dry Goods Windows and Interiors (publicaçã o Trade, 1900)
•Dot and Tot of Merryland (fantasia, 1901)
•American Fairy Tales (fantasia, 1901)
•The Master Key: An Electric Fairy Tale (fantasia, 1901)
•The Life and Adventures of Santa Claus (1902)
•The Magical Monarch of Mo (fantasia, 1903) (Publicado originalmente em 1900 como A New
Wonderland)
•The Enchanted Island of Yew (fantasia, 1903)
•Queen Zixi of Ix (fantasia, 1905)
•John Dough and the Cherub (fantasia, 1906)
•The Sea Fairies (fantasia, 1911)
•Sky Island (fantasia, 1912)
O MÁGICO DE OZ (1900)
“-Entã o isso explica tudo. Nas terrar civilizadas, acho que nã o sobrou nenhuma bruxa; nem
má gicos, nem feiticeiras e nem bruxos. Mas a Terra de Oz nunca foi civilizada, porque vivemos
separados do resto do mundo. E é por isso que ainda temos bruxas, feiticeiros e magos” (BAUM,
2013, p.79)

“Na mesma hora um bando imenso de corvos ferozes chegou voando de toda parte, tantos que
até cobriam o céu. E a bruxa Má disse ao Rei dos Corvos:
- Vá agora mesmo voando até esses estrangeiros, arranque os seus olhos com o bico e depois
reduza todos a pedacinhos” (Ibidem, p.151)

“Dorothy queria ver a princesa melhor, e saiu correndo atrá s dela. Mas a moça de porcelana
gritou:
-Nã o corra atrá s de mim! Nã o corra atrá s de mim!
Tinha uma vozinha tã o assustada que Dorothy parou e disse:
-Por que nã o?
E a princesa respondeu, parando também, a uma distâ ncia segura:
-Porque se eu correr posso cair e me quebrar toda [...]
-Aquele ali é o sr. Coringa, um dos nossos palhaços – continuou a moça de porcelana. – Está
sempre tentando se equilibrar de cabeça para baixo. Já se quebrou tantas vezes que está
remendado em mais de cem lugares, e ficou bastante feio” (Ibidemp. 205)
-Os seus Sapatos de Prata vã o levar você até o outro lado do deserto – respondeu Glinda.
– Se você conhecesse o poder má gico deles, podia ter voltado para a sua tia Em desde o
primeiro dia que chegou aqui.
-Mas aí eu nã o teria o meu esplêndido cérebro!-exclamou o Espantalho.- E poderia ter
passado a minha vida inteira naquele milharal.
-E eu ficaria sem o meu adorável coraçã o – disse o Lenhador de Lata. – Parado na
floresta, enferrujando até o fim do mundo.
-E eu teria continuado a ser covarde até morrer – declarou o Leã o. – E nenhum dos
animais da floresta teria nada de bom a dizer sobre mim.
-Tudo isso é verdade, e fico feliz de ter podido ajudar os meus bons amigos – disse
Dorothy. – Mas agora que eles todos já conseguiram o que mais queriam, e cada um ainda
ganhou um reino para governar, acho que quero voltar para o Kansas (Ibidem, p.219-
220)
A meu ver, os impulsos destrutivos onipotentes, a ansiedade persecutó ria e a divisã o
predominam nos três a quatro primeiros meses de vida. Descrevi essa combinaçã o de
mecanismos e ansiedades como a posiçã o esquizoparanó ide, que em casos extremos constitui a
base da paranoia e da esquizofrenia. Os concomitantes dos sentimentos de destruiçã o nesse
está gio primitivo sã o de grande importâ ncia e separo deles a voracidade e a inveja como fatores
muito perturbadores, em primeiro lugar na relaçã o com a mã e e ulteriormente com os outros
membros da família, em verdade por toda a vida (KLEIN, 1971, p.12-13)

Acredito que o ego é incapaz de cindir o objeto, interno e externo, sem que ocorra uma cisã o
correspondente dentro dele. Desse modo, as fantasias e sentimentos sobre o estado do objeto
interno influenciam vitalmente a estrutura do ego. Quanto mais o sadismo prevalece no processo
de incorporaçã o do objeto e quanto mais o objeto é sentido como estando em pedaços, mais o
ego corre perigo de cindir-se em correspondência aos fragmentos do objeto internalizado. Os
processos que descrevi estã o, evidentemente, ligados à vida de fantasia do bebê, e as ansiedades
que estimulam o mecanismo de cisã o sã o também de natureza fantasiosa. E em fantasia que o
bebê cinde o objeto e o self; porém, o efeito dessa fantasia é bastante real, porque leva a
sentimentos e relaçõ es (e, mais tarde, processos de pensamento) ficarem, de fato, isolados uns
dos outros (KLEIN, 1946, p.25)
A adaptaçã o à realidade externa aumenta e com ela a criancinha atinge um quadro menos
fantá stico do mundo que a cerca. A experiência repetida da mã e que vai e volta para ela torna sua
ausência menos assustadora e portanto sua desconfiança de que ela a abandone diminui. Dessa
forma, ela gradualmente elabora seus temores primitivos e consegue certo equilíbrio de seus
impulsos e emoçõ es conflitantes. A ansiedade depressiva nesse está gio predomina e diminui a
ansiedade persecutó ria. Acredito que muitas manifestaçõ es aparentemente estranhas, fobias
inexplicáveis e idiossincrasias que se podem observar em crianças em tenra idade sã o, a um
tempo indicaçõ es de elaboraçã o da posiçã o depressiva e da maneira de elaborá -la. Se os
sentimentos de culpa que surgem na criança nã o sã o excessivos, a necessidade de reparar e
outros processos que fazem parte do crescimento trarã o alívio. As ansiedades depressivas e
persecutó rias, no entanto, nunca sã o inteiramente superadas; podem retornar temporariamente
sob pressã o interna ou externa, embora uma pessoa relativamente normal possa lidar com esse
reaparecimento e readquirir seu equilíbrio. Se, contudo, a tensã o for demasiado grande, o
desenvolvimento de uma personalidade forte e bem equilibrada poderá ser impedido (KLEIN,
1971 p.16)
REFERÊ NCIAS

BAUM, L. Frank. O má gico de Oz. Sã o Paulo: Editora Zahar, 2013.


KLEIN, Melanie. O sentimento de solidão, Nosso mundo adulto e Outros trabalhos. Rio de
Janeiro: Imago Editora, 1971
___________________. Amor, culpa e reparação e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1991.

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