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DA EXULMAÇÃO DA CARNE
AO RETORNO DO ESPÍRITO:
A LINHAGEM MACABRA DE SETH
LIGEPSI
Carl Gustav Jung
Nasceu em 26 de julho de 1875, na Suíça;
Faleceu em 6 de junho de 1961;
Filho de um reverendo luterano e uma fiel
calvinista;
Entrou para a faculdade de medicina aos 20 anos;
Em 1900, tornou-se assistente de Eugen Bleuler;
Método da Associaçã o de Palavras;
Em 1907, envia uma série de artigos, de sua
autoria, para Freud, iniciando uma amizade que
perdurou por seis anos;
Foi o primeiro presidente da Associaçã o
Psicanalítica Internacional.
“[...] o doente tem uma histó ria que nã o é contada e que, em geral, ninguém conhece.
Para mim, a verdadeira terapia só começa depois de examinada a histó ria pessoal.
Esta representa o segredo do paciente, segredo que o desesperou. Ao mesmo tempo,
encerra a chave do tratamento. É , pois, indispensável que o médico saiba descobri-la.
Ele deve propor perguntas que digam respeito ao homem em sua totalidade e nã o se
limitar apenas aos sintomas.” (JUNG, 1988, p.110)
JUNG (Psicologia Analítica) X FREUD (Psicaná lise)
Divergências
A libido
O inconsciente
Os sonhos
A mitologia
O INCONSCIENTE COLETIVO E PESSOAL
O inconsciente coletivo é uma parte da psique que pode distinguir-se de um inconsciente pessoal pelo fato de que
não deve sua existência à experiência pessoal, não sendo portanto uma aquisição pessoal. Enquanto
o inconsciente pessoal é constituído essencialmente de conteúdos que já foram conscientes e no entanto
desapareceram da consciência por terem sido esquecidos ou reprimidos, os conteúdos do inconsciente coletivo
nunca estiveram na consciência e portanto não foram adquiridos individualmente, mas devem sua existência
apenas à hereditariedade. Enquanto o inconsciente pessoal consiste em sua maior parte de complexos, o
conteúdo do inconsciente coletivo é constituído essencialmente de arquétipos (JUNG, 2000, p.52)
Os arquétipos são, assim, dotados de iniciativa própria e também de uma energia específica, que lhes é peculiar.
Podem, graças a esses poderes, fornecer interpretações significativas (no seu estilo simbólico) e interferir em
determinadas situações com seus próprios impulsos e suas próprias formações de pensamento[...] enquanto os
complexos individuais não produzem mais do que singularidades pessoais, os arquétipos criam mitos, religiões e
filosofias que influenciam e caracterizam nações e épocas inteiras (JUNG, 2008, p.75)
Aproximar-nos-emos mais da verdade se pensarmos que nossa psique consciente e pessoal repousa sobre a
ampla base de uma disposição psíquica herdada e universal, cuja natureza é inconsciente; a relação da psique
pessoal com a psique coletiva corresponde, mais ou menos, à relação do indivíduo com a sociedade. (JUNG, 2008,
p.32)
O MITO
“[...]esclarece a libido inconsciente pelo ‘sentido’ consciente que lhe dá , mas lastreando a
consciência através da energia psíquica que veicula a imagem” (DURAND, 1998, p. 63)
“Há uma importâ ncia essencial da mitologia na organizaçã o da vida diá ria dessas culturas. Sem o
mito, essas sociedades simplesmente nã o se organizariam. O nascimento, a infâ ncia, o casamento,
a caça e a guerra, o comércio e a morte, todas as atividades, enfim, sã o ritualizadas e mitologizadas
para ganharem sentido.” (BOECHAT, 2008, p. 19)
A GÊNESE TORTUOSA DE SETH:
Certos deuses nasceram de maneira monstruosa: Seth saiu da boca de Nut ou, segundo uma tradição referida por
Plutarco, rasgou brutalmente o ventre de sua mã e, Eis por que Seth, responsável por inevitáveis desregramentos
do mundo, não era um menino divino querido de sua mã e Nut. Desde seu nascimento, esta se irritou com ele:
"Meus dedos estã o contra ele como facas afiadas, minhas unhas estã o contra ele como lâ minas metálicas" (papiro
Louvre 3.129) (TRAUNECKER, 1995, p.74)
A NARRATIVA MÍTICA:
Mas Ísis e seu marido, Osíris, eram gêmeos, nascidos da deusa Nut. E seus parentes mais jovens eram Set e Néftis,
que também eram gêmeos, nascidos de Nut. Uma noite, Osíris dormiu com Néftis, pensando que era Ísis[...]. Em
resultado, nasceu Anú bis, filho mais velho de Osíris, mas da esposa errada. Set, marido de Néftis, nã o gostou nada
do que aconteceu e planejou matar o irmã o mais velho, Osíris. Secretamente, tomou as medidas de Osíris e
mandou confeccionar um sarcó fago muito bonito do tamanho exato do irmã o. E entã o, uma noite, enquanto
transcorria uma festa encantadora, entre os deuses, Set chegou com o sarcó fago e declarou que o daria de presente
a quem ele servisse. Todos na festa tentaram, e, é claro, quando chegou a vez de Osíris o sarcó fago lhe serviu
perfeitamente. Em seguida, entraram correndo setenta e dois cú mplices, colocaram a tampa, prenderam-na
firmemente e jogaram o sarcó fago no Nilo. O que temos aqui, então, é a morte de um deus. Sempre que ocorre a
morte de um deus desse porte, pode se esperar em seguida uma ressurreiçã o. A morte de Osíris foi
simbolicamente associada à cheia e ao transbordamento anuais do Nilo, que periodicamente propiciava a
fertilização do solo do Egito. Foi como se a decomposiçã o do corpo de Osíris fertilizasse e vitalizasse a terra.
(CAMPBELL, 1990, p.193)
Características de Seth
• Cultuado em Naqada.
A BRUTALIDADE (IN)DOMÁVEL
Sucedia que o mundo nã o girava exatamente conforme a ordem divina. Diversos deuses misturavam-se a
esse drama e assumiam o papel de inimigos nas intrigas míticas. A serpente Apó fis era um ser liminar, uma
ressurgência no universo organizado da inorganizaçã o primordial, uma das forças do nã o-existente que
perturbava o existente. Quando a fome se abatia sobre o país, era porque a barca de Ra encalhara no "banco
de areia da serpente Apó fis". Seth, tã o brutal e perigoso como Apó fis, era, ao contrá rio, um dos elementos da
criaçã o. Com certeza um elemento desordenado, o vento quente que varria o deserto, o eterno Litigante e
rival de Hó rus, mas que figurava honrosamente nos grupamentos divinos. Essa energia cega e destruidora
podia ser empregada numa boa causa. Para combater o monstro Apó fis, Ra recorria a Seth. Em suma, os
causadores de perturbaçã o pertenciam a duas categorias: de um lado, o agitador, o mal necessá rio, Seth, o
intratável, e seus diversos avatares (crocodilos, serpentes, escorpiõ es, asnos etc.), de outro, Apó fis e suas
transformaçõ es (serpentes, Nehaher, Nik, Rik etc.). Inimigo mortal de Ra, Apó fis era o niilista da catá strofe
final. Para ele nã o se tratava de levar a perturbaçã o ao mundo, mas de suprimi-lo. A Seth, a desordem, a
Apó fis, a nã o-ordem (TRAUNECKER, 1995, p.107)
Um personagem brutal e ávido, Payom, o deus do mar, aterroriza e extorque os deuses do Egito.
Consternados, os deuses enviam-lhe Astarté, mas ao que parece sem sucesso. Finalmente apela-se a Seth, o
combatente. A segurança do país dependeria da luta colossal entre as potências indomadas do deserto
terrestre e os elementos em fú ria do deserto líquido (Ibidem, p.133)
SETH E OS SEMBLANTES FARAÔNICOS
Seu pai é Ramsés I (1306-1304 a.C.), soldado originá rio do nordeste do Delta. Subira ao trono idoso, depois
de ocupar os cargos de comandante de fortaleza, superintendente das bocas do rio, intendente dos cavalos e
comandante-chefe do exército real. Muito depressa associou ao poder seu filho Seth, que nã o escondia a
intenção de restituir ao Egito a sua verdadeira grandeza. Com o seu nome, o rei presta homenagem ao deus
Seth, senhor da força vital espalhada pelo cosmos, que, uma vez controlada, transforma o faraó num
indô mito guerreiro. Graças à proteçã o de Seth, ele se lança sobre o adversá rio qual terrível leã o. Ninguém
lhe escapa. Esmaga os povos revoltosos. Manda representar nas paredes dos templos cenas imensas, nas
quais aparece sereno, vitorioso, símbolo perfeito da ordem do mundo, esmagando uma confusão caó tica de
inimigos que exibem esgares e estã o desarticulados. Nã o se trata de favorecer uma forma de brutalidade: se
o rei age desta forma, é para surgir como o protetor que vela sobre o Egito [...] O reinado de Seth I é
característico da monarquia egípcia, no sentido de que este faraó de temperamento guerreiro é também um
homem profundamente religioso. A devoçã o que tem por Seth, deus da tempestade, da trovoada e da força,
não o impediu de mandar executar os relevos rituais mais perfeitos da arte egípcia (JACQ, 2010, p.183)
Arquétipo do herói
“Olha bem, os dois [o bem e o mal] necessitam-se mutuamente; pois mesmo no melhor e
precisamente no melhor existe o germe do mal. E nada é tã o mal que nã o possa produzir um
bem.” (JUNG, 1987, p.59)
Arquétipos Anima e Animus
Essas duas figuras crepusculares do fundo obscuro da psique, a anima e o animus (verdadeiros e semigrotescos
"guardiõ es do umbral", para usar o pomposo vocabulá rio teosó fico), podem assumir numerosos aspectos, que encheriam
volumes inteiros. Suas complicaçõ es e transformaçõ es sã o ricas como o pró prio mundo, e tã o extensas como a variedade
incalculável do seu correlato consciente, a persona. Habitam uma esfera de penumbra, e dificilmente percebemos que
ambos, anima e animus, sã o complexos autô nomos que constituem uma funçã o psicoló gica do homem e da mulher. Sua
autonomia e falta de desenvolvimento usurpa, ou melhor, retém o pleno desabrochar de uma personalidade. Entretanto, já
podemos antever a possibilidade de destruir sua personificaçã o, pois conscientizando-os podemos convertê-los em
pontes que nos conduzem ao inconsciente. Se nã o os utilizarmos intencionalmente como funçõ es, continuarão a ser
complexos personificados e nesse estado terã o que ser reconhecidos como personalidades relativamente independentes.
Por outro lado, nã o podem ser integrados à consciência enquanto seus conteú dos permanecerem desconhecidos. No
entanto, a tentativa de explicaçã o com eles deverá trazer à luz seus conteú dos; só quando esta tarefa for cumprida, isto é,
só quando a consciência familiarizar-se suficientemente com os processos inconscientes refletidos na anima, esta ú ltima
será percebida como uma simples funçã o. (JUNG, 2008, p.97)
ANIMUS
Assim como o cará ter da anima masculina é moldado pela mãe, o animus é basicamente influenciado pelo pai da mulher. É
o pai que dá ao animus da filha convicçõ es incontestavelmente "verdadeiras" , irretrucáveis e de um colorido todo especial
— convicçõ es que nunca têm nada a ver com a pessoa real que é aquela mulher. Por isso o animus, tal como a anima, pode,
algumas vezes, tornar-se o demô nio da morte [...] O animus negativo nã o aparece apenas como o demô nio da morte. Nos
mitos e contos de fadas faz o papel de assaltante ou o de assassino. Barba Azul, que mata em segredo todas as suas
mulheres, é um exemplo deste tipo de animus. Sob esta forma, o animus personifica todas as reflexõ es semiconscientes,
frias e destruidoras que invadem uma mulher durante as horas da madrugada, especialmente quando ela deixou de
realizar alguma obrigaçã o ditada pelos seus sentimentos. (JUNG, 2008, p.253)
Mito do ser andrógino de Platão: os primeiros
seres possuíam os princípios masculino e
feminino dentro de si, mas, por inveja dos
deuses, foram divididos em duas partes. Assim,
cada um passou a procurar sua metade para que
pudesse voltar a ser completo. Todavia, esse
esforço nã o constituía uma tarefa simples, tendo
em vista que, com a divisã o, houve uma falta de
identificaçã o entre o homem e a mulher;
Assim como no mito, o ser humano, ao longo do Antes desse declínio do feminino, existia uma
processo civilizató rio, demonstrou uma imensa relativa equidade entre o masculino e o feminino.
dificuldade em reconhecer o princípio No que tange aos deuses, o feminino primordial
complementar dentro de si, o que acabou dando era, em alguns casos, até mais importante que o
início, entre outras coisas, a valorizaçã o do masculino. Isso começou a mudar a partir do
masculino e de tudo que remetesse à s suas surgimento do ideal de coito heterossexual entre
características, e, concomitantemente, a os deuses, pois o masculino ganhou o status de
desvalorizaçã o do feminino e da maioria das suas detentor do potencial vital, enquanto o feminino
características. Nesse contexto, incluem-se crianças, passou a ser considerado o seu receptá culo.
mulheres e homossexuais.
Em uma sociedade totalmente atrelada à religiã o,
como a egípcia na Antiguidade, essa "evoluçã o" nas
relaçõ es de poder entre as figuras divinas também
influenciou as relaçõ es de poder entre os casais
humanos.
Khnumhotep e Niankhkhnum
Papiro Chester Beatty I
7. Considerações Finais
“[...] os processos inconscientes se acham numa relaçã o compensató ria em relaçã o à consciência.
Uso de propó sito a expressã o “compensató ria” e nã o a palavra “oposta”, porque [...] nã o se acham
necessariamente em oposiçã o, mas se complementam mutuamente, para formar uma totalidade:
o si-mesmo”. (JUNG, 1987, p. 53)
REFERÊNCIAS