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CENTRO UNIVERSITARIO AMPARAENSE

ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA
ANALITICA: TEORIA E PRÁTICA.

AISLLAN DE PAULA CALADO

PUER AETERNUS: UMA DESCRIÇÃO


SIMBÓLICA

VITÓRIA 2017
AISLLAN DE PAULA CALADO

PUER AETERNUS: UMA DESCRIÇÃO


SIMBÓLICA

Trabalho realizado como requisito de conclusão de curso


da especialização em Psicologia Analítica: teoria e prática
do Centro Universitário Amparaense.

Orientador: Fabricio Fonseca Moraes.

VITÓRIA

2017
TERMO DE APROVAÇÃO

A aluna _______________________________ regularmente matriculado (a) no Curso


de ______________________________________________________, desenvolveu o
Artigo Científico intitulado de “_________________________”, referente à Conclusão do
seu processo de orientação, obtendo a aprovação do mesmo.

Conceito: _________
___________________, ________ de _______________ de 2015

Professor Orientador: ___________________________________

Assinatura:
“Há tempo, há muito tempo,

Criado por Deus,

Criado por Pajana,

Um menino vivia órfão.

Sem alimentos que comer,

Sem roupas para vestir,

Assim vivia ele.

Ali não há mulher que case com


ele.

Uma raposa veio até ele;

A raposa falou com o jovem:

Como te tornarás um homem?

Perguntou-lhe.

O menino disse:

Como me tornarei um homem,

Nem eu mesmo sei!”

Fragmento de um conto da
floresta negra dos tártaros.

(in JUNG e KERENYI, 2011, p.


51)
SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO

2- MÉTODO

3- DESENVOLVIMENTO

3.1) Identificação no indivíduo.

3.2) Os Complexos e as Feridas do Puer.

3.3) A Dimensão arquetípica do Puer Aeternus.

3.4) O Senex como equilibrio.

4- CONCLUSÃO

5- BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO.

A estrutura deste estudo se baseou na metodologia de pesquisa bibliográfica, a qual


proporcionou os meios necessários para iniciar o diálogo entre os comentários de
distintos autores, principalmente Marie-Louise Von Franz e James Hillman sobre o tema
do Puer, abordado em algumas ocasiões brevemente por Carl G. Jung em suas obras.

Dentro da Psicologia Analítica o Puer passou a ocupar um lugar de destaque graças à


sua fenomenologia tão presente na coletividade. O Puer se caracteriza por uma atitude
infantil, à qual atravessa suas relações interpessoais e intrapessoais, esta atitude foi
descrita extensivamente por Von Franz e caracteriza a base da qual partir para uma
construção do conceito. Posteriormente James Hillman aborda o tema desde outro
ângulo, apresentando o Puer distante do indivíduo e mais próximo de sua dinâmica
impessoal.

Entre estes dois aspectos, o pessoal no Puer de Von Franz e o impessoal no de Hillman
e auxiliado por outras referências que permitam o diálogo entre ambas perspectivas, este
estudo procura elaborar a construção de um conceito nos moldes da perspectiva
simbólica, considerando ambos aspectos e relacionando-os apesar de sua aparente
oposição.

3.1) A Identificação e os problemas do Puer Aeternus.

Marie-Louise Von Franz abre sua obra sobre o Puer Aeternus afirmando que o homem
que se identifica com o arquétipo do puer aeternus permanece durante muito tempo como
adolescente” (2011, p. 9).

Esta descrição inicial de Von Franz é de grande utilidade, pois nela encontramos a
perspectiva sob a qual trabalha no decorrer de sua obra, nos direcionando em relação ao
fator determinante em suas descrições; a identificação com o arquétipo.
Whitmont define a identidade como um sinônimo da inconsciência, neste caso, o autor
se refere, desde à perspectiva de Jung; a inconsciência como um estado a priori (1991,
p. 59).

Podemos entender a identificação como a não-diferenciação do indivíduo do inconsciente


e seus conteúdos, no caso do Puer, vemos o indivíduo inconsciente de suas atitudes e
relações externas e internas.

Esta identificação com o Inconsciente confere duas características ou tendências que se


relacionam ao Puer; a de permanecer inconsciente, que para Neumann (2014, p. 16) não
pode ser considerado um desejo, e sim um estado natural no homem, e neste caso
encontramos no motivo do Puer a ideia de um estado coletivo de pré-consciência.

O indivíduo identificado com este aspecto apresenta comportamentos que podem ser
vistos como os traços infantis no adolescente. Tais traços como o estado de
alheiamento1, a sonolência, falta de disciplina e a tendência a ficar à toa, com a mente
vagando (FRANZ, 2011, p. 21). Estes traços representam apenas uma face do Puer, cuja
aparente negatividade é constelada na presença da identificação.

“Sempre que há identificação, como já observamos, há compulsão. Quando


somos idênticos com um impulso nunca questionamos porque nos movemos ou
para onde nos dirigimos: existe apenas a resposta automática a um impulso” (ibid,
1991).

A compulsividade à qual Whitmont se refere pode ser vista como a incapacidade do


individuo de se reconhecer ante a situação ou a aparente impossibilidade de reagir de
outra maneira.

Von Franz descreve o problema do Puer Aeternus de maneira extensiva utilizando como
exemplos a vida de obra de Saint Exupery, o Pequeno Príncipe, Werther de Goethe e
Das Reich Ohne Raum (O reino sem espaço) de Bruno Goetz. A partir de suas descrições
sobre a identificação com este arquétipo é possivel sugerir que o problema do Puer
Aeternus seja sua insistencia em permanecer indiferenciado em oposição à tendencia
natural do desenvolvimento da personalidade.
A descrição que melhor se encaixa ao problema do Puer seria esta:

“Consequentemente, o puer nunca se lança inteiramente nas experiências, nunca


está em contato pleno com a realidade. Sua vida é uma vida provisória[...]. Tem
medo de entrar no tempo e no espaço do real, por isso tudo é provisório”
(MONTEIRO, 2008, p. 28)

O Puer, ao não entrar por completo na vida nunca passa completamente pelas
experiencias que se esperam de um individuo, porém como bem se sabe, o
desenvolvimento e a vida continuam em movimento, isto significa que a Identificação com
o Puer o coloca na posição onde os outros aspectos de sua personalidade têm seu
desenvolvimento alterado por sua atitude.

Von Franz descreve isto da seguinte maneira:

“Se você recusar o crescimento ele o arrastará, o que significa que a pessoa
permanecerá completamente infantil e não terá outras possibilidades o que
certamente acarretará um empobrecimento em sua vida” (FRANZ, 2011, p. 70).

James Hillman (2008), utiliza as imagens do aleijo, das mãos mutiladas e do sangramento
ao explicar algumas características problemáticas do Puer.

Sobre o Aleijo, Hillman nos diz:

“O pé ferido, diz algo básico acerca da condição do puer. Sua postura, sua posição
está marcada de tal forma que sua conexão com a rex extensa é atrapalhada,
heróica e mágica. O Espírito não alcança totalmente para baixo em direção a este
mundo, uma vez que naquele lugar de contato com o mundo a figura puer é
mortalmente fraca” (2008, p. 120).

O aleijo reflete a atitude vetical que o Puer tem com a vida, a facilidade de fugir à
imaginação e a dificuldade de tocar e se deslocar horizontalmente. O sujeito identificado
com o Puer assimila tudo a través deste principio (FRANZ, 2011, p. 55), isto se relaciona
ao problema do Puer de entrar no tempo-espaço, o andar horizontal pode ser visto como
o caminhar histórico que deixa marcas e se afirma, porém os pés feridos do Puer,
segundo Hillman, dificultam a ação.

Não entrar na história também aponta para a relação do Puer com a sua realidade de
forma adequada, pois parte suas experiencias pessoais não se encontra totalmente
consciente. Esta dissociação do Puer com a História refere-se a sombra do individuo.
Whitmont (1991, p. 160) se refere à sombra como parte da personalidade que foi
reprimida pelo bem do ego, e que em sonhos e fantasias representa os aspectos pessoais
que permanecem inconscientes.

Por outro lado, temos a imagem das mãos mutiladas:

“Aqui a ferida concerne ao nosso agarrar das coisas e nosso lidar com o mundo
com ferramentas. Com o despertar da anima a través do sofrimento da palma de
nossas mãos [...], essa mesma mão ferida revela a alma da mão, tornando-a
dolorosamente conscia do dar e do receber” (HILLMAN, 2008, p. 130).

Esta ferida, como o autor chama, se refere especialmente aos aspectos sentimentais do
Puer. Para Von Franz (2011, p. 222) o problema do Puer sempre está ligado à relação
com uma anima fraca.

A anima lida com as emoções e afetos (JUNG, 2009, p. 102), quando esta função se
constela em maior grau afeta o humor e a personalidade do individuo. Quando projetada,
assume a forma de um ideal que ao cair ante a realidade leva consigo o interesse do
Puer, pois a realidade significa conflitos.

Sobre o Sangramento, Hillman propõe quatro características que podem ser observadas:

A primeira é o sangrar como vulnerabilidade e propensão a vitimização, ou a atrair


pessoas hostis (2008, p. 135). Em segundo, está o aspecto da vitalidade excessiva e
entusiasmo em seu estado de inflação. O terceiro, fala mais uma vez da dificuldade do
puer com o eros, a pois não há contenção em seu sangrar. Isto fala da falha no amor
proprio do puer, que termina doando aos demais e terminando no final com suas mãos
vazias ou recuando para proteger-se, há uma incapacidade em conter sua vitalidade. O
quarto ponto fala sobre o vazar e o conter oferecendo a possibilidade de uma
estruturação que será discutida mais adiante, o vazar refere-se também ao que se
conhece como castração, o enfraquecimento por influencia dos complexos, o aspecto
regressivo e histérico do Puer (ibid, p. 142).

O Eros pode se expressar como relacionamento psiquico (C.WHITMONT, 1991, p. 170)


e não apenas como compreensão mas também como contato e fusão (ibid, p. 175). O
Problema do Puer se relaiona à sua capacidade de relacionarse com os aspectos
sentimentais e instintuais da vida, que graças à sua fraqueza, tendem a ser evitados. Von
Franz descreve (2011, p. 19) o problema do Puer como uma questão criativa, pois o Puer
não atua na vida em seu aspecto histórico e sentimental.

3.2) Os complexos e as feridas do Puer.

Para que exista uma identificação com o Puer Aeternus há outros fatores que podem
propiciar tal situação. Nos aspectos pessoais e relacionado ao problema da história e da
sombra, encontram-se os complexos. Na Psicologia Analítica, os complexos são
formações autônomas que interferem na consciência de alguma forma. Surgem a través
das vivencias durante o desenvolvimento da personalidade, e possuem uma forte carga
afetiva, podendo-se dizer que são o acumulo de associações de fundo emocional. O
complexo é a personalização de aspectos impessoais, ou coletivos, que Jung nomeou
de arquétipo (GRINBERG, 2006, p. 100). Pode-se entender que no centro ou núcleo de
cada complexo encontra-se um aspecto arquetípico o qual será descrito brevemente
neste momento, e em maior extensão mais adiante. Sobre o aspecto arquetípico de um
complexo pode-se afirmar que representa de forma imediata a experiência filogenética e
como tal é um elemento fundante da estrutura psíquica.

A identificação com o Puer é acompanhada do complexo materno, ou como Jung coloca:

“A amável aparição do puer aeternus é uma espécie de ilusão. Na realidade, este


é um parasita da mãe, uma criatura de sua fantasia, que só vive em tanto tenha
suas raízes no corpo materno” (JUNG, 1963, p. 271).
O Puer vive um vínculo permanente com o complexo materno, seja pela experiência de
uma mãe excessivamente presente ou completamente ausente (MONTEIRO, 2008, p.
144), como fora dito, no núcleo de cada complexo encontra-se um aspecto fundante da
estrutura psíquica, no caso do complexo materno encontram-se as experiências
vinculadas à maternidade. Em seu aspecto dinâmico, a maternidade fala da capacidade
de apreender e experimentar o cuidado e a privação, bem como a capacidade de
simbolizar esta experiência (EISENDRATH, 2002, p. 76).

Graças ao vínculo com o complexo materno o indivíduo identificado com o Puer se coloca
na posição do filho de maneira inconsciente, que pode ser visto como o não se
responsabilizar por sua vida (FRANZ, 2011, p. 19). O complexo materno deixa o mal-
humorado e deprimido, distante em suas relações (ibid, p. 102). Pois o Puer é o filho de
sua mãe, e na identificação o individuo sente-se infantilizado pelo ambiente que ainda lhe
proporciona tudo o que necessita para continuar vivendo sem as dificuldades que tanto
odeia.

Com uma figura materna forte encontramos uma situação oposta ao pai, sendo este
também ausente ou uma figura excessivamente forte. Em seu aspecto dinâmico, o
paterno fala da imposição de limites, expressão de amor e cuidado (MONTEIRO, 2008,
p. 37). Em sua expressão negativa o paterno uma figura raivosa, que pune com culpa e
ameaça com o exilio, o pai retira do filho a capacidade de desenvolver suas
características masculinas. Com isso o filho fica infantilizado, preso ao mundo da mãe e
identificado unilateralmente com o arquétipo do Puer (ibid, p. 115). Desta relação surge
também o Eros ferido, pois há um afastamento da vida criativa, e um sufocamento das
forças inconscientes da individualidade (ibid).

Como foi mencionado anteriormente, nas quatro imagens do puer ferido. O vazar e conter
mencionado por Hillman coloca-se em sua relação com seus complexos materno e
paterno, pois um proporciona a qualidade da vitalidade excessiva que jorra de sua
personalidade, porém o outro em seu aspecto positivo envolve a contenção desse
sangramento, ou continente psíquico para refrear, reter, estancar o momento de reflexão
(HILLMAN, 2008, p. 141), e proporcionar meios para a administração correta dos
recursos de sua personalidade.
Pode-se dizer que ao Puer faltou amor, seja pela sobre proteção que impediu a
diferenciação da personalidade, ou por uma relação negativa com a realidade objetiva,
pode-se apenas afirmar que o Puer carrega consigo uma imagem materna que o coloca
em um estado de proximidade com os conteúdos do inconsciente, mas que carecem da
forma necessária e produto da experiência concreta.

3.2) A Dimensão arquetípica do Puer Aeternus

O nome “Puer Aeternus” surge na obra de Ovídio “Metamorfoses” quando o autor se


refere ao deus-criança Iaco com este nome, mas é possível encontrar outros exemplos
que encaixem nesta categoria (Tammuz, Átis, Adônis). Como já foi mencionado
anteriormente, o termo “Puer Aeternus” provém do Latim e significa “Juventude Eterna”
ou “Jovem Eterno” (FRANZ, 2011, p. 9).

Em sua natureza impessoal o Puer Aeternus se fusiona com o arquétipo da Criança


Divina (MONTEIRO, 2008, p. 22). A palavra “arquétipo” em seu sentido etimológico vêm
do grego “túpos” que significa “marca feita de golpe, marca impressa, etc”, e arkhê, “o
que está na frente desde o começo, origem, principio” (GRINBERG, 2006, p. 100). Com
esta definição é possivel construir uma noção deste conceito, sendo o arquétipo a marca
primordial, ou o molde da construção psiquica.

O núcleo arquetípico (ou as manifestações do arquétipo), como diz Whitmont (1991, p.


73), pode ser descrito em termos de seu aspecto dinámico e formal. O primeiro se
relaciona à dinâmica pessoal em seu aspecto energético onde vemos sua manifestação
em ações, reaçoes, padrões emocionais e a través comportamento e, pode-se dizer,
incluir também ideias e crenças sobre certos aspectos da vida, o que chamamos de
complexos. O segundo, envolve o que o autor chama de “percepts” ou experiencias
representacionais.
Estes “percepts” ou representações também são conhecidos como imagens mitológicas
por sua aparição em mitos, contos de fada e tradições religiosas (ibid, p. 73) tanto no
homem primitivo quanto no moderno.

O caráter mitológico do Puer Aeternus associa-se às representações do arquétipo da


Criança Divina, e neste arquétipo é possivel ressaltar a dinâmica e aspectos positivos
encontrados também no Puer, este principio possibilita traçar uma conexão entre ambos
para assim compreender melhor o aspecto impessoal do Puer Aeternus a través do
motivo da Criança Divina.

Ao iniciar sua descrição do arquétipo da Criança Divina, Jung inicia com a pergunta “qual
é a finalidade biológica deste arquétipo?” para responde a esta pergunta, Jung propõe
duas respostas:

A primeira: “O motivo da criança é o quadro para certas coisas que esquecemos da


prórpia infancia” (JUNG e KERENYI, 2011, p. 123).

Neste caso, Jung se refere ás fantasias e outro tipo de representações inconscientes que
podem remeter ao passado do individuo, isto é à uma situação pessoal que deve ser
atendida. A criaça como uma figura que representa a infancia e suas experiencias, porém
ainda proxima da pessoa.

A segunda: “O motivo da criança representa o aspecto pré-consciente da alma coletiva”


(ibid).

Com esta proposta, Jung nos aproxima à função do arquétipo ao traçar uma comparação
entre o homem primitivo, que é considerado mais próximo do instinto (Ibid, 2011, p. 125),
desta forma também caracterizado por ser regressivo. Esse mesmo estado de regressão
pode ser encontrado no homem moderno como forma de compensação à sua atitude
unilateral, ou que se afasta do inconsciente.

Como estado pré-consciente, assim como a infancia, contém em si as bases para o


desenvolvimento futuro da personalidade (NEUMANN, 2014, p. 36), ou como Jung
afirma; “ a criança é o futuro em potencial” (JUNG e KERENYI, 2011, p. 127).
Em suas várias representações mitológicas a criança divina tem um nascimento
miraculoso, o abandono e a perseguição como características recorrentes. O primeiro,
fala de sua origem divina, que por sua natureza não ocorre de modo empírico, a
concepção é miraculosa e a partir de orgãos não naturais (Ibid, 2011, p. 129). O
abandono, exposição e o perigo referem-se à dificuldade de alcançar a totalidade
psíquica. E a ultima, fala da impotencia, e desamparo do impulso de vida que nos leva
ao desenvolvimento.

Outra característica que deve ser considerada é seu carater invencivel, que descreve o
motivo da Criança Divina que aparenta insignificancia e fraqueza, mas em realidade
encontra-se o oposto, a criança, pois representa a personificação das forças vitais
fundamentais para a existencia, que escapam à percepção consciente. A Criança Divina
representa o mais forte e inelutavel impulso do ser (ibid, p. 135).

Por ultimo, é importante ressaltar o caráter integrador da Criança Divina. Sendo esta um
estado de potencialidade psíquica e anterior a separação dos opostos, este aquétipo
também representa a unificação dos mesmos, sendo um propiciador da completitude
(ibid, p. 127), pois possui dentro de si a imagem da totalidade, como foi mencionado
anteriormente.

O motivo mitológico da Criança Divina se relaciona ao Puer Aeternus quando se afirma


que o Puer tem uma morte prematura (FRANZ, 2011), pois é um deus que representa a
renovação (MONTEIRO, 2008, p. 61), dentro do Puer Aeternus está a semente do
renascimento, pois ele morre e volta a nascer eternamente, sempre jovem e nunca
alcançando a totalidade.

É possivel entender a função da Criança Divina como o potencial ou força necessária


para alcançar a totalidade psíquica, porém no caso da identificação com o arquétipo e a
presença da unilateralidade, temos apenas isso.

Pode-se supor que a identificação ocorra durante os estagios iniciais da infancia onde
existem os sentimentos de abandono e incompreensão (JUNG e KERENYI, 2011, p.
148), acompanhado por fatores externos com relação as figuras parentais.
3.3) O Senex como equilibrio.

A unilateralidade do Ego, Identificação do indivíduo com o Puer o coloca em relação com


o complexo materno, pois o papel de filho jamais é superado ao não integrar as
experiências. Hillman em sua descrição dos problemas do Puer propõe uma solução em
seu vazar e conter, abrindo o caminho para uma perspectiva mais ampla com relação ao
Puer. Se, como foi visto anteriormente o Puer se associa a potencialidade do
desenvolvimento, Hillman, propõe um equilíbrio no dinamismo psíquico ao considerar o
Senex, o velho como figura oposta.

Edinger afirma que os opostos constituem a anatomia mais básica da psique, o fluxo da
energia psíquica é gerado pela polarização destes (EDINGER, 2008, p. 12).

Ele prossegue explicando que:

“Assim, sempre que somos atraídos em direção a um objeto desejado, ou


reagimos contra um objeto odiado, somos capturados pelo drama dos opostos”.
(Ibid, p.13).

Ou como Guggenbühl-Craig descreve:

“O ser humano reage arquetipicamente a alguém ou a algo quando se defronta com uma
situação típica e recorrente. A mãe e o pai reagem arquetipicamente ao filho ou filha, o
homem reage arquetipicamente à mulher etc. Nesse sentido certos arquétipos tem dois
polos, por assim dizer. Sua situação básica contém uma polaridade” (GUGGENBÜL-
CRAIG, 2008, p. 84).

Considerando este princípio, é possível propor um olhar ao Puer Aeternus não pelo
caminho do “Puer-Filho”; que preso em seu complexo materno investe seus recursos
nessa relação, mas um que possibilite o desenvolvimento da personalidade e o uso
adequado de sua potencialidade, pois quando existe a identificação, seu oposto surge
em outro lugar.
Como oposto, o Senex possui características que se contrapõe as do Puer, sobre isto
Moneiro afirma que o Senex está ligado a alma, traz consigo a história, está ligado à
reflexão, à ponderação, aos limites fixos e ao ensaio humano, ele coagula a experiência,
e ligado aos primórdios da vivencia humana, é testemunho de nossa falibilidade” (2008,
p. 102).

O Senex representa aquilo que o Puer não é capaz de fazer por si só, o encontro com
seu passado e a contenção de si mesmo e da experiência. Como função, o Senex
encontra-se ao lado do Puer nas raízes para a formação do Ego (HILLMAN, 2008, p. 32).
Quando visto unilateralmente, o Senex, é o impulso ao desenvolvimento realizado, é a
perpetuação das coisas a través do hábito, memória, repetição e tempo (ibid), por isso
pode ser representado em seu aspecto negativo em figuras tirânicas, assim como em
estados anímicos como na depressão e melancólica (MONTEIRO, 2008, p. 39).

Quando existe identificação, o Puer e o Senex são “tipicamente iguais” (HILLMAN, 2008,
p. 50), pois ao considera-los opostos entendemos que ambos são aspectos distintos da
mesma coisa, perder esta noção de vista propicia a identificação, e com ela a imobilidade
ou estancamento do desenvolvimento.

Porém o retiro do Puer de sua condição de apenas “Filho”, possibilita o surgimento de


seu oposto complementar, o Senex. A proposta do eixo Puer-Senex, ou Puer-et-Senex,
surge para evitar a unilateralidade ao unindo sempre um com o outro e permite o
surgimento de outra possibilidade para o Puer, aquele do desenvolvimento de sua
personalidade.

O Senex tem um papel disciplinador e administrativo para o Ego, isto nos retorna ao vazar
e conter de Hillman. Quando Puer e Senex se comunicam de forma ideal, permitem o
estancamento do sangramento do puer, ou seja, a perda de energia desnecessária
(MONTEIRO, 2008, p. 45) e a contenção, ou retenção da experiência.

Onde o Puer sofre e manca ao andar, o Senex encontra sua realização; na rotina e na
impossibilidade de se isolar na fantasia (ibid, p. 31) ele é capaz de se adaptar à realidade.
CONCLUSÃO

Com base à revisão bibliográfica é possível compreender e descrever algumas


características marcantes no Puer Aeternus e sua dinâmica interna quando existe
unilateralidade, a qual a través da identificação com os conteúdos inconscientes
enfatizam a relação do indivíduo com seu complexo materno, assim como as
características e atitudes infantis que se advém desta relação. O infantilismo do Puer é
descrito por Von Franz e pode ser completado com as feridas descritas por Hillman, onde
encontramos os problemas do puer em conter e reter seus recursos, a dificuldade de lidar
com sua história e suas relações afetivas.

Quando se considera o Puer como representação do Arquétipo da Criança Divina abre-


se a possibilidade da dimensão impessoal do Puer e suas características basais para o
desenvolvimento da personalidade, podendo então entender a problemática do Puer a
partir do potencial arquetípico característico da Criança Divina incluindo a possibilidade
de reintegração da personalidade.

Em sua dimensão arquetípica apresenta-se também a possibilidade de um oposto que


se contrapõe à dinâmica indiferenciada do Puer. O Senex como oposto, é a possibilidade
de organização do indivíduo a través da disciplina e da administração efetiva dos recursos
pessoais. A proposta do Senex é a da diferenciação do Puer e seu dinamismo com o
complexo materno, da contenção e da estruturação de sua individualidade.

Entende-se então que as características positivas do Puer se perdem ante a dimensão


do infantilismo característico do “jovem eterno” ou “o jovem que não deseja crescer”, mas
podem ser resgatadas e trabalhadas a través da figura do Senex.
BIBLIOGRAFIA

C.WHITMONT, E. The Symbolic Quest- Basic Conceptsof Analytical Psychology. 7. ed. New Jersey:
Princeton University Press, 1991.

EDINGER, E. F. Ego and Archetype. Boston: Shambala, 1992.

EDINGER, E. F. O mistério da coniuctio: Imagem alquímica da individuação. São Paulo: Paulus, 2008.

EISENDRATH, P. Y. Manual de Cambridge Para Estudos Junguianos. Porto Alegre: Artmed, 2002.

FRANZ, M.-L. V. Puer Aeternus- A luta do adulto contra o paraìso da infância. 4. ed. São Paulo: Paulus, v.
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FRANZ, M.-L. V. Puer Aeternus: A luta do adulto contra o paraíso da infância. São Paulo: Paulus, 2011.

GRINBERG, L. P. Jung e os arquétipos: arqueologia de um conceito. In: CALLIA, M.; FLEURY DE OLIVEIRA,
M. Terra Brasilis: Pré-história e arqueologia da psique. São Paulo: Paulus, 2006. p. 99-123.

GUGGENBÜL-CRAIG, A. O abuso do poder na psicoterapia. 2. ed. São Paulo: Paulus, 2008.

HILLMAN, J. O livro do Puer: ensaios sobre o Arquétipo do Puer Aeternus. São Paulo: Paulus, 2008.

JUNG, C. G. Símbolos de Transformación. Barcelona: Paidós, 1963.

JUNG, C. G. Arquetipos e inconsciente colectivo. Barcelona: Paidós, 2009.

JUNG, C. G.; KERENYI, K. A criança divina. [S.l.]: Vozes, 2011.

MONTEIRO, D. D. M. R. Puer-Senex Dinâmicas Relacionais. 1. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

NEUMANN, E. The Origins and History of Consciousness. New York: Princeton Classics, 2014.

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