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ESCOLA DE

TEOLOGIA MONTE
SINAI
ACONSELHAMENTO
PASTORAL
Pastorado no Mundo Pós-Moderno
Júlio Paulo Tavares Zabatiero
Introdução

• Guy Debord denominou nossa época de “a sociedade do


espetáculo”, o que é apropriado em grande medida.

• As grandes personalidades são formadas e deformadas pela


onipresente TV, quem não conhece os dramas de uma Vera
Fischer; quem não cultua os novos ídolos Ronaldinho e Guga,
consagrados no vácuo deixado pela prematura morte de Ayrton
Senna do Brasil?
• Os grandes eventos históricos são aqueles televisionados para
quase todos os países do mundo:

• a infame cobertura da guerra do Golfo,

• a estúpida morte de uma lady inglesa erigida em mito da


solidariedade humana;

• o narcisismo coletivo exacerbado nas heroicas disputas por


medalhas e pelo troféu nas Olimpíadas e copas do mundo.

• O maior fenômeno religioso neste fim de século no Brasil é a


IURD, igreja-teatro-televisão, que atrai multidões sedentas em
experimentar o inefável e alcançar o inalcançável,
• e dita os comportamentos das demais igrejas, necessitadas de
fazer frente à terrível concorrência que as assusta e ameaça
roubar os cada vez menos fiéis ...

• Os novos gostos litúrgicos, nas igrejas históricas, traem a


sedução imagética.

• A imagem apaixona, o espetáculo seduz mentes, corações e


corpos, e imperceptivelmente a igreja se transforma em um
imenso teatro coletivo;

• O culto converte-se em arrebatadora performance das coisas que


se deveriam esperar.
• Realidades escatológicas são temporalizadas, capturadas nas
agradáveis sensações da confusa presença do sagrado no
extasiante consumo dos

• novos cânticos,

• novos ritmos,

• novos gestos,

• novas palavras de ordem,

• novos ritos,
• meios sempre novos para se performar os mesmos e velhos ritos
da celebração cristã do Crucificado.

• As cenas litúrgicas desencarnam a fé, não mais certeza das


coisas que se esperam e convicção das coisas que não são
vistas;

• o êxtase catártico substitui o ouvido atento para ouvir a Palavra


de Deus;

• a emoção teatralmente liberada no espetáculo cúltico reafirma


poderosamente a rejeição da racionalidade da fé.

• No espaço litúrgico se santificam as necessidades humanas


1. de auto-realização,
2. satisfação,
3. consumo
4. conquista do ser,

• pois a realidade se tornou tão crua e violenta,

• tão escatológica em sua irrealizável promessa de felicidade


plena através do consumo,

• que só pode mesmo ser mitificada no tempo espiritualizado do


encontro coletivo secreto com Deus, e sacrificada no altar das
religiosas emoções purificadoras de nossas angústias, sonhos e
incertezas.
ESPETÁCULO ESPIRITUALIDADE

• Em meio a estas novas e sedutoras imagens-realidades, novo


papel se descortina aos pastores da Igreja de Deus:

• o de catalisadores das expectativas dos atentos templo


espectadores;

• pastores performáticos, imagens visíveis do Deus invisível –


• homens de sucesso,

• realizadores de heroicas façanhas espirituais:

• tombos, curas, sinais, milagres e prodígios.

• Especialistas em emoções, em novidades litúrgicas,

• tornam-se os pastores em personificações do desejo coletivo


mal realizado de consumo;

• tornam-se, também, cada vez mais exigentes: maiores salários,


maiores igrejas, maiores honrarias.
1 Cuidai de vós mesmos e do rebanho sobre o qual o Espírito vos
constituiu bispos!

• Esta é a primeira reverberação da voz bíblica para nós no mundo


pós-moderno.

• Diante dos desafios que a sociedade do espetáculo proporciona à


Igreja, nossa primeira tarefa pastoral é a do cuidado.

• Cuidem de vocês mesmos! Não aceitem o papel que a pós


Espetáculo Espiritualidade modernidade reserva aos líderes
religiosos.

• Não se deixem seduzir pelo sucesso, pela grandiosidade, pelas


possibilidades de progresso financeiro.
• Acomodem-se às coisas humildes, assim como Jesus é manso e
humilde de coração.

• Construam suas vidas à imagem do Filho de Deus que, sendo


igual a Deus, não recuou diante da humilhação da encarnação no
mundo cheio de pecado e miséria, assumindo a condição de
escravo, a condição mais abjeta dos tempos neo-testamentários.

• Como Jesus Cristo, solidarizem se com os excluídos e excluídas


de nossa sociedade de espetáculos.

• Que o seu ministério priorize as pessoas que não contam no


mundo das imagens, mas são preciosas diante do Deus e Pai de
nosso Senhor Jesus Cristo.
• Resistam às tentações do culto-performance e do ministério-
espetáculo.

• Reaprendam, junto com suas igrejas, a adorar a Jesus Cristo em


Espírito e verdade.

• Em Espírito, porque conduzidos pelo Espírito do Filho, amor do Pai


derramado em nossos corações para que possamos estar no mundo
como Igreja peregrina e missionária.

• Em verdade, porque direcionados pela santa expectativa da vinda


sempre iminente do Reino de Deus para governar nossas vidas e
nosso mundo, transformando-o de espetáculo pecaminoso em
espaço de salvação.
ESPIRITO VERDADE ESPERANÇA

• Aos doces imperativos do êxtase e da catarse emocional


contraponham o exigente discernimento espiritual,

• exercício ativo de mentes disciplinadas sob a Palavra, treinadas


na contemplação do Deus vivo e verdadeiro,

• nutridas na reflexão teológica corajosa diante da história


cambiante da raça humana alienada de Deus.
• Sejam, acima de tudo, dignos pastores-mestres do rebanho de
Deus!

• Conduzam suas próprias MENTES em Espírito e Verdade

• As mentes de seus rebanhos e as mentes de todas as pessoas a


que vocês vierem servir à obediência de Cristo,

• demolindo os falsos argumentos, as fortalezas espetaculares de


nossos dias,

• construindo com suas igrejas uma nova mentalidade, gerada e


sustentada pela mente de Cristo em nós infundida pelo Espírito
divino.
• Aos sedutores apelos do consumo e da paixão religiosa,

• contraponham o seguimento e a imitação de Jesus Cristo,


companheiro de pecadores, leprosos, prostitutas, publicanos...

• A vocês, amigos e colegas na educação teológica, ousem


repensar e rever a formação pastoral e teológica.

• Temos buscado novos caminhos, novas soluções para a


educação, novas propostas diante dos desafios da pós-
modernidade.

• Não se acomodem ao já conquistado! Ainda é preciso avançar,


transformar, ousar verdadeiramente!
• O vinho novo da ação de Deus no mundo pós-moderno não pode
ser contido pelos odres velhos dos moldes tradicionais da
educação escolar.

• Permaneçamos aliados na busca do sopro renovador do Espírito


para nossa tarefa ministerial.

• Permaneçamos companheiros na incessante busca da


inteligência da fé,

• na permanente construção de uma teologia reformada contextual


e missionária,

• na incansável pesquisa por uma educação participativa,


libertadora e construtiva.
• Permaneçamos amigos na adorável jornada do discipulado
cristão,

• mestres-discípulos que sentados aos pés do Mestre ousam


sonhar com novos horizontes e trilhar os compassivos caminhos
de Cristo nestes dias do mundo pós-moderno.

DISCIPULADO DISCIPULADO DISCIPULADO


PARTICIPAÇÃO LIBERTAÇÃO EDIFICAÇÃO
• À sociedade de espetáculo, privatizada, individualizada ao extremo,
Deus Pai propõe um diferente tipo de espetáculo,

• "porque a mim me parece que Deus nos pôs a nós, os apóstolos, em


último lugar, como se fôssemos condenados à morte;

• porque nos tornamos espetáculo ao mundo" (I Co 4,9).

• A contradição inerente à sociedade espetáculo é que ela torna


privatizado tudo aquilo que é público, e público aquilo que deveria
ser particular.

• Que agrada mais a certo tipo de jornalismo do que os dramas e as


picuinhas particulares dos ídolos e astros? O que vende mais
jornais e atrai maior audiência na TV do que o conhecimento público
dos "segredos" da vida alheia?
• Por outro lado, o que menos interessa ao grande público, à
opinião pública senão os dramas públicos

• da exploração da mulher, da violência contra a criança, do


abandono dos idosos,

• da exterminação cruel e cotidiana de milhares e milhares de


pessoas famintas, excluídas pelo sistema econômico do acesso
à casa, comida, saúde, educação, dignidade?

• Estes fatos reveladores da pecaminosidade incrustada em


nossas miseráveis democracias ocidentais, e presentes também
no exótico Oriente,
• são cuidadosamente mantidos no âmbito do particular.

• Deles se noticia apenas os números, estatísticas que servem


apenas para amortecer consciências,

• criar certo desconforto logo aplacado pelas belas imagens do


mercado, grande produtor de riquezas, tecnologia e satisfações
imediatas.

MERCADO MIDIA CONSUMISMO


• Mercado espetacularizado para o grande público, que oculta com
seus longos e grossos tentáculos todas as imagens que revelam
sua sede assassina,

• trasvestindo-a de eficácia, progresso e globalização.

• Mercado à cuja sombra, inadvertidamente, as Igrejas Cristãs


tendem a se ocultar, aceitando o jogo da privatização dos afetos
religiosos.

• O Deus Criador é devidamente embalado e consumido nas festas


privê das comunidades cristãs autossuficientes e isoladas em
sua cruzada contra tudo e todos,
• sem nem sequer discernir onde estão os verdadeiros alvos e
desafios da nossa luta emprol e sob o Reino de Deus.

• Igrejas que se deixam enlevar pela sedução do maravilhoso, do


angelical, do errático mundo de espíritos conquistadores,

• de batalhas gloriosamente travadas nos recônditos seguros de


templos e de corações seguramente separados das duras

• realidades do cotidiano da opressão, exclusão e afastamento de


Deus.

• Comunidades que se protegem no âmbito privado, reduzindo a fé


a questões de crença e emoção,
• novas sensações e experiências, doutrinas e normas, crentes e
incrédulos, os de dentro e os de fora.

2 A estas igrejas, irmãos e irmãs, apascentai! ,

• A fé cristã é pública, sua arena não é o templo, não é o coração,


não é a doutrina, não é a denominação.

• Sua arena é o mundo! Não o abstrato mundo composto de falsas


doutrinas, espíritos enganadores, ou religiões concorrentes e
anti-cristãs.

• O mundo, que é nossa arena, é o mundo amado inefavelmente


por Deus.
• O mundo composto de pessoas reais, visíveis e palpáveis.

• Pessoas com cores, gostos, cheiros, modos e tons particulares,


individuais, mas construídos publicamente nesta imensa
sociedade anônima chamada Brasil.

• Diante deste mundo Deus nos colocou, a nós ministros do


Evangelho, como espetáculo.

• Portadores do morrer de Cristo pela humanidade, a fim de que a


vida de Cristo se manifeste nos moribundos e abjetos corpos
ignorados pelo Deus capital e seus profetas mercado e mídia.

• A vocação pastoral é vocação pública. Nossa paróquia não é a


IPIB, a IPB, ou qualquer outra denominação.
• Nossa paróquia é o mundo. Nossas igrejas só têm sentido à
medida que são igrejas missionárias, enviadas ao mundo como o
Filho foi enviado pelo Pai.

• Nossos ministérios só terão valor se forem ministérios que


tornem público o escândalo da cruz e a loucura da pregação.

• Resistam, portanto, à tentação do provincianismo ministerial, à


rotinização da vida que uma igreja local, ou um seminário, ou
uma denominação podem proporcionar a nós ministros do
Evangelho.

• Resistam à tentação da teologia fácil, barata, amplamente


difundida em mensagens apaziguadoras de consciências e
acalentadoras de desejos de tranquilidade e consumo.
FIDELIDADE
ESPETÁCULO
DIGNO
DEDICAÇÃO

TESTEMUNHO
CARÁTER
PÚBLICO
DIGNIDADE
• Assumam o morrer de Cristo em seus corpos, corações e mentes.

• Revistam-se do poder da graça de Deus, poder que se aperfeiçoa


em nossa fraqueza, em nossa humildade, em nossa submissa
rendição ao Espírito de Cristo, que caminha por entre os bailes da
vida, entre os bares, esquinas, praças.

• O Espírito que revela o amor do Filho, amor escandaloso que lhe


custou a morte de cruz, herege e subversivo como foi condenado
pela religião e pelo Estado de sua época.

• Espírito profético que faz queimar em nossos peitos a irresistível


vocação de tornar público o profético Evangelho de Cristo, a boa-
nova do Reino de Deus, a auspiciosa mensagem da graça
transformadora e recriadora de Deus.
• Os imperativos do evangelho do reino de Deus exigem um
ministério pastoral forte, criativo, discernidor dos sinais dos
tempos, mas, acima de tudo, compassivo e solidário com pobres e
pecadores.

• Ministério público, realizado como espetáculo do morrer salvador


de Cristo perante a sociedade anestesiada pelas assépticas
imagens do bemestar e da auto-realização.

• As ternas misericórdias da salvação exigem um pastorado


vibrante em seu afã de jamais se render às institucionalizações
descontextualizadas e hierárquicas;

• e adulto em sua reflexão na busca de uma práxis cristã fiel ao


conselho de Deus, práxis teimosamente construtora da
inteligência da fé nestes dias do mundo pós-moderno.
PASTOREAR

INOVADOR
SAL LUZ
AMENTE
• Ministério pastoral que ajude a Igreja a ser sal da terra e luz do
mundo.

• Que, juntamente com o Povo de Deus, experimentem, desbravem


novos caminhos para salgar este mundo insosso e nauseante em
que vivemos.

• Ensino e pastorado que conduzam a Igreja de Deus, comprada


com o sangue de Cristo, ao serviço ao mundo e no mundo. Igreja
de Deus chamada para ser sal e luz, para brilhar em meio às
trevas da exclusão, do consumo, da desumanização, da
globalização tecnológica.

• Luz, farol altaneiro que reconduza a humanidade ao porto seguro


da reconciliação com Deus.
• Sal, tempero agradável que torne sábias as palavras e ações dos
cristãos no mundo ignorante do progresso sem solidariedade e
compaixão.

• Ensino e pastoreio que ajudem a Igreja a ser espetáculo, e não a


consumir espetáculos cúlticos, doutrinários, pastorais,
teológicos, ou seja lá de que espécie forem. I

• Igreja espetáculo, mãe dos aflitos, irmã de excluídos e excluídas.

• Igreja cidadã do Reino de Deus, corajosamente peregrina com


Cristo, foral do arraial seguro da celebração e nutrição da fé, mas
por elas vocacionada e impulsionada ao mundo que Deus amor e
pelo qual entregou seu próprio filho à morte, e morte de cruz.
• Sim, irmãos e irmãs, Igreja missionária, ajuntamento solene e
feliz de ministros e ministras do Evangelho; comunidade
celebrativa e estudiosa,

• reunião de homens e mulheres que têm em Cristo os olhos fitos,


seguindo seus passos no lar, na escola, no trabalho, no lazer.

• Homens e mulheres de Deus, ordenados e não-ordenados, que


realizam a santa aventura de levar as boas novas ao mundo,

• na construção de uma nova práxis, prática, eficaz mas, sem


nenhum receio, amiga da reflexão teórica, companheira da
teologia que nasce do discernimento espiritual e ajuda o povo de
Deus a caminhar nos passos de Jesus, o amigo de publicanos,
meretrizes e pecadores.
Conclusão

• "Guardai a vós mesmos e ao rebanho sobre o qual o Espírito vos


constituiu bispos, para apascentardes a Igreja de Deus, a qual ele
comprou com o seu próprio sangue."

• A todos nós o chamado de Deus prepara um novo e vivo


caminho; seja em novos lugares, seja nos antigos e conhecidos
espaços.

• Não resistamos ao apelo do Espírito que faz novas todas as


coisas.

• Não confundamos o sopro renovador do Espírito com o errático


mover de espíritos das trevas e da ignorância.
• Não aprisionemos o Espírito criador nos velhos moldes de
nossas instituições e rotinas de vida. Guardai a vós mesmos.

• Guardemo-nos irmãos! Guardemo-nos do sucesso fácil, da


emoção recompensadora, da reflexão sem práxis.

• Guardemo-nos do ministério cômodo e tranquilo de


mantenedores do status quo.

• Guardemo-nos, acima de tudo, como humildes seguidores de


Cristo, eternos discípulos do Bom Mestre, o único que é digno
de receber a honra e a glória, a força e o poder.

• Ao rei eterno, imortal, invisível, sejam santificadas nossas vidas,


nossos corpos, nossos corações e mentes.

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