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Direito Humanitário

20/04/2023
Dra. Ruth Cabral
Direitos humanos e cidadania
Aula Introdutória- Direito Humanitário

O que é e para que serve o Direito Humanitário?


Como funciona na prática?
Quem os Estados visam proteger?

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• Introdução ao direito humanitário.
Quando se aplica?

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Desde os primórdios da humanidade já podemos vislumbrar os primeiros
prenúncios do Direito Humanitário – No Código de Hamurabi, com as
palavras “decreto estas leis a fim de evitar que o forte oprima o fraco”, e em
vários outros documentos posteriores, podemos identificar a ideia de
limitação ao uso da força. Na Grécia Antiga, como observa Cinelli, “nas
guerras entre as cidades-estados gregas os combatentes eram considerados
possuidores de direitos iguais e havia respeito pela vida e pela dignidade das
vítimas da guerra como princípio fundamental”

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▣ Nas origens da humanidade, e por muito tempo e em vários momentos de sua
história, a guerra caracterizava-se pela ausência de qualquer regra para além da
lei do mais forte ou do mais desleal - Vae victis, vencer ou morrer
implacavelmente.   

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▣ Diante de tantas atrocidades, especialmente diante das duas grandes guerras mundiais
que provaram ao mundo a capacidade de auto aniquilação do homem, tem-se, junto
ao desenvolvimento dos Direitos Humanos – criação da Liga das nações em 1919, da
Organização das Nações Unidas em 1945, a Declaração Universal dos Direitos
a construção de um sistema baseado na
Humanos em 1948 –
ideia contrapor à noção de que tudo seria permitido
contra o inimigo, estabelecendo limitações, regras e
princípios, na forma de um direito internacional dos
conflitos armados – o Direito.

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▣ Sob a rubrica de Direitos Humanos, em especial quanto à proteção
Internacional da pessoa humana, pode-se observar a construção de três grandes
categorias ou âmbitos de proteção, que por mais que se interconectem e
correlacionem, possuem características próprias:

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1. o Direito Internacional dos Direitos Humanos (que se desenvolve buscando
criar um sistema internacional – global e regional – de proteção universal da
pessoa humana),
2. o Direito Internacional dos Refugiados (o qual, para muitos, seria na
verdade uma subdivisão, uma área mais específica do Direito Internacional
dos Direitos Humanos),
3. e o Direito Humanitário Internacional, também conhecido como Direito
Humanitário internacional nos/dos conflitos armados. 

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▣ “direito” o conjunto de normas obrigatórias sancionadas
com um sistema de implementação e de
execução.
▣ “humanitário” costuma sereferir mais a um sistema de regras de conduta
baseadas em uma escala de valores éticos
reconhecidos por preferências ideológicas, sem,
portanto, dar-lhes um caráter obrigatório para o
comportamento social.

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Direito Humanitário:
▣ Representa um conjunto de princípios e regras que norteiam e limitam o
uso da violência em conflitos armados, tendo como objetivos precípuos:
(i) proteger a pessoa humana, especialmente aquelas que não participam
diretamente do evento hostil, e (ii) limitar os efeitos da violência nos
combates desbravados para atingir os propósitos do conflito. 

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Conflito armado

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1.
introdução

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▣ O Direito Internacional Humanitário (DIH) é um conjunto de normas que
busca, por motivos humanitários, limitar os efeitos dos conflitos armados.
▣ Protege as pessoas que não participam ou já não participam direta ou
ativamente das hostilidades e impõe limites aos meios e métodos de guerra.
▣ O DIH também é conhecido como "o direito da guerra" ou "o direito dos
conflitos armados".

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▣ O Direito Internacional Humanitário (DIH) ou Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA) faz parte
do Direito Internacional e é considerado um sistema de direito
universal – afinal,  dos 193 países aglutinados à ONU, 185
 estão de acordo com as regras e princípios desse ramo.

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“el conjunto de normas internacionales, de
origen convencional o consuetudinario, que
restringen por razones humanitarias el derecho
de las partes en un conflicto armado,
internacional o no, a utilizar medios de guerra y
protegen a las personas y bienes (que podrían
ser) afectados por el mismo” (1997, p. 985).

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Marco histórico

Embora o ano de 1864, data da criação do primeiro instrumento multilateral do


Direito
Internacional Humanitário – Primeira Convenção
de Genebra –, costume ser considerado como a
data de nascimento deste direito, é óbvio que as
normas daquele direito existiam com muita
anterioridade.
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Jean Henri Dunant

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--Jean-Henri Dunant nasceu em 8 de maio de 1828 em Genebra. Origem religiosa Calvinista.
--Filho de empresários que incentivavam uma formação solidária e com preocupação com a coletividade.
--Ao presenciar o sofrimento na frente de combate na Batalha de Solferino em 1859, Dunant organizou de
imediato um serviço de primeiros socorros.
-- Desta sua experiência resultou o livro Un souvenir de Solferino, publicado em 1862, onde sugeria a
criação de grupos nacionais de ajuda para apoiar os feridos em situações de guerra, e propunha a
criação de uma organização internacional que permitisse melhorar as condições de vida e prestar
auxílio às vítimas da guerra

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-- Nos primeiros anos da maturidade encontrou vazão para suas energias aliando-se a vários
movimentos ou causas e engajando-se em atividades caridosas e religiosas. Tornou-se
membro de uma organização em Genebra conhecida como Liga dos Donativos, cuja proposta
era levar conforto espiritual e auxílio material para os pobres, enfermos e amargurados.

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Sobre aquilo que vivenciou, Dunant redigiu, em 1862, “Uma Recordação de
Solferino” (Un Souvenir de Solférino), livro no qual formula um duplo
desejo: que cada país constituísse, em tempos de paz, uma sociedade
voluntária de socorro (assistência humanitária não governamental), e que os
Estados ratificassem um princípio internacional convencional (tratado
internacional) que assegurasse uma proteção jurídica aos serviços
sanitários. escrito (convencionado e formalmente reconhecido pelos países)
– a construção tangente de um Direito Internacional, dentro do qual se
consolidará o Direito Humanitário. 

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Este foi o prenuncio da origem e criação do Comitê Internacional da Cruz
Vermelha (CICV), instituição humanitária fundada em 1863 em Genebra,
Suíça, por Dunant e mais cinco membros, com o objetivo de proteger a vida
e a dignidade de vítimas de conflitos internacionais e internos. 

Este foi um dos grandes marcos do Direito Internacional Humanitário,


revolucionando a conduta da guerra, pois nunca antes na história os Estados
haviam entrado em acordo para limitar o seu poder em benefício da pessoa
humana. Foi a abertura de espaço para o desenvolvimento de um direito
geral (universal) e

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Marcos históricos
Em 22 de agosto de 1864, em Genebra, foi adotada a “Convenção sobre o socorro aos
feridos nos campos de batalha” (também conhecida como “Convenção da Cruz
Vermelha de 1864”), que inaugura o direito convencional internacional humanitário.
Trata-se de um conjunto das leis e costumes da guerra, visando minorar o sofrimento
de soldados doentes e feridos, bem como de populações civis atingidas por um conflito
bélico. É considerada como a primeira introdução dos direitos humanos na esfera
convencional internacional. 

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A doutrina, geralmente, costuma classificar o Direito Internacional Humanitário em dois
ramos: o Direito de Haia e o Direito de Genebra.

DIREITO DE HAIA-
DIREITO DE GENEBRA
Direito dos Conflitos Armados, regula a
O segundo, também conhecido por
condução das hostilidades e a imposição
Direito Humanitário Bélico centra
de limites aos meios de fazer a
sua atenção nas vítimas dos
guerra.Suas normas se vinculam às
conflitos armados e se baseia no
ideias de necessidade, interesse militar e
homem e nos princípios de
conservação do Estado.
humanidade.

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DIREITO Da haia
• O direito de Haia, nascido do campo de batalha, visava, antes de mais nada, estruturar
formas de proteger as pessoas em zonas de combate.
• Perspectiva de restrição dos direitos dos combatentes.
• A Primeira Conferência de Haia foi justamente a expressão de se realizar um
pacifismo ativo, voltado para uma ação sobre os meios de obter a paz, com
estímulo à solução pacífica de controvérsias, construindo um sistema de medidas
preventivas para evitar a guerra, bem como com o desenvolvimento de estratégias de
desarmamento para afastar a possibilidade ou potencialidade do combate.

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DIREITO Da haia
• Teve início com a criação da Cruz Vermelha (1863) e a assinatura da Convenção de
Genebra (“Convenção sobre o socorro aos feridos nos campos de batalha”, de 1864) -, 
por meio de normas que regulassem a conduta das hostilidades, de modo a evitar
sofrimentos inúteis, limitando  as formas de ataque aceitas, para reduzir ao máximo o
número de vítimas, protegendo, especialmente, os não envolvidos diretamente nas
hostilidades. 

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DIREITO Da haia
• A Primeira Conferência da Paz realizada em Haia, no período de 18 de maio a 19 de julho de 1899, teve como
resultados (constantes da Ata Final, datada de 29 de julho de 1899): (1) Convenção para a solução pacífica de
conflitos internacionais; (2) Convenção concernente às leis e usos da guerra terrestre; (3) Convenção para a
aplicação à guerra marítima dos princípios da Convenção de Genebra de 22 de agosto de 1864. Também
integravam a Ata Final três Declarações concernentes a (1) Proibição de lançamento de projéteis e explosivos,
dos balões ou por outros novos meios semelhantes; (2) Proibição do emprego de projéteis que tivessem por fim
único espalhar gases asfixiantes ou deletérios e (3) Proibição do emprego de balas que se dilatam ou se
achatam facilmente dentro do corpo humano (balas dum-dum).

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DIREITO de genebra

• As Convenções de Genebra12-13 (I – IV), também conhecidas como


“Convecções da Cruz Vermelha”, foram adotadas em 12 de agosto de 1949 pela
Conferência Diplomática destinada a Elaborar as Convenções Internacionais para a
Proteção das Vítimas da Guerra, que se reuniu em Genebra de 21 de abril a 12 de
agosto de 1949. Todas tiveram início de vigência na ordem internacional em
21/10/1950, e tem como base dos seus sistemas o princípio de que aquele que não é
diretamente envolvido na guerra deve ser tratado com humanidade.

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DIREITO de genebra
• Distinção entre combatentes e civis (não envolvidos diretamente nas hostilidades).
Estende-se a proteção à todas as vítimas de guerra – feridos e enfermos envolvidos na
guerra terrestre, feridos, enfermos e náufragos engajados em hostilidades no mar, os
prisioneiros de guerra e os civis. 

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I. Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos e doentes das forças armadas em
campanha (Convenção I) – trata especialmente dos feridos e enfermos em terra, deixando claro
que os membros das forças armadas e milícias organizadas (vide art. 13) serão respeitados e
protegidos em todas as circunstâncias;
II. Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos, doentes e náufragos das forças
armadas no mar (Convenção II) – aborda a situação dos feridos, enfermos e náufragos das Forças
Armadas no Mar;
III. Convenção de Genebra relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra (Convenção III) – versa
sobre os prisioneiros de guerra, construindo um código abrangente fundamentado no tratamento
humanitário em todas as circunstâncias;
IV. Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra (Convenção IV) –
trata da proteção dos civis em tempo de guerra. Conforme esclarece o art. 4º: “São protegidas
pela Convenção as pessoas que, num dado momento e de qualquer forma, se encontrem, em caso
de conflito ou ocupação, em poder de uma Parte no conflito ou de uma Potência ocupante de que
não sejam súditas (cidadãos)”.

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I. Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos e doentes das forças armadas em
campanha (Convenção I) – trata especialmente dos feridos e enfermos em terra, deixando claro
que os membros das forças armadas e milícias organizadas (vide art. 13) serão respeitados e
protegidos em todas as circunstâncias;
II. Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos, doentes e náufragos das forças
armadas no mar (Convenção II) – aborda a situação dos feridos, enfermos e náufragos das Forças
Armadas no Mar;
III. Convenção de Genebra relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra (Convenção III) – versa
sobre os prisioneiros de guerra, construindo um código abrangente fundamentado no tratamento
humanitário em todas as circunstâncias;
IV. Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra (Convenção IV) –
trata da proteção dos civis em tempo de guerra. Conforme esclarece o art. 4º: “São protegidas
pela Convenção as pessoas que, num dado momento e de qualquer forma, se encontrem, em caso
de conflito ou ocupação, em poder de uma Parte no conflito ou de uma Potência ocupante de que
não sejam súditas (cidadãos)”.

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DIREITO de nova york
O Direito de Nova York é assim chamado por se referir as ações de proteção dos direitos humanos em
períodos de conflitos armados desenvolvidas sob os auspícios da Organização das Nações Unidas
(ONU), no âmbito do Direito Humanitário. 
Se suma relevância, e, portanto, merecedor de menção aqui, a Resolução 2444 (XXIII), adotada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1968, de título “Respeito dos direitos humanos em
período de conflito armado”, trata-se um marco no histórico da ONU, como um verdadeiro sinal
de mudança da posição da organização em matéria de Direito Humanitário.  

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DIREITO de nova york
  
Desde a criação da ONU, em 1945, seu propósito e objetivo maior é o de manutenção da paz mundial,
assim, por muitos anos o direito humanitário não figurou dentro das áreas de preocupação da
organização, sob a justificativa de que, trabalhar sobre um direito dos conflitos seria uma
admissão de falta de confiança em manter a paz. A resolução de 1968 inaugura, assim, uma
nova perspectiva. Desde então, a Organização das Nações Unidas tem desenvolvido
grandes trabalhos sobre o tem, tanto do ponto de vista convencional, contribuindo
com tratados internacionais relevantes, como também na atuação prática, dentro de
seus vários órgãos de atuação internacional, que tem desempenhado importantes
ações humanitárias. 

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▣ Existem também acordos que proíbem o uso de certas armas e
táticas militares, entre as quais:
▣ as Convenções de Haia de 1907,
▣ a Convenção das Armas Bacteriológicas (Biológicas) de
1972,
▣ a Convenção das Armas Convencionais (1980)
▣ e a Convenção das Armas Químicas (1993).

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▣ Existem também acordos que proíbem o uso de certas armas e
táticas militares, entre as quais:
▣ as Convenções de Haia de 1907,
▣ a Convenção das Armas Bacteriológicas (Biológicas) de
1972,
▣ a Convenção das Armas Convencionais (1980)
▣ e a Convenção das Armas Químicas (1993).

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De maneira geral, o DIH estabelece:
▣ a proteção as pessoas que não participam no combate, os civis bem como aqueles que foram
feridos, naufragaram, que estão doentes ou que foram feitos prisioneiros de guerra;
▣ que as pessoas protegidas não devem ser atacadas, sofrerem maus-tratos físicos ou
tratamentos degradantes;
▣ os feridos e doentes devem ser recolhidos e tratados;
▣ aos indivíduos que foram feitos prisioneiros ou que forem detidos devem ser assegurados
a provisão de alimentação adequada, abrigo e garantias jurídicas;
▣ certos locais e objetos, tais como hospitais e ambulâncias estão igualmente protegidos e não
devem ser atacados;

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Outras vertentes de atuação do Direito Humanitário
▣ Além de proteger civis, enfermos, feridos, náufragos, prisioneiros de guerra e até objetos
civis, o DIH também menciona grupos específicos de proteção entre os civis, tais como:
▣ as mulheres, que são protegidas contra o abuso sexual;
▣ as crianças, cujas necessidades especiais devem ser consideradas pelos combatentes;
▣ os refugiados, deslocados internos e aqueles que desapareceram como resultado de
conflito armado; e,
▣ os trabalhadores humanitários, como as equipe da Cruz Vermelha e do Crescente
Vermelho;

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Exceções

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Existem exceções proibição do recurso à
força. Assim, admite-se a legalidade do conflito
bélico nas seguintes situações:
a guerra de legítima defesa a guerra de libertação nacional que as medidas de segurança coletiva
reconhecida cumpra previstas
como o direito de um Estado as condições de um enfrentamento nos mecanismos do capítulo VII da
se defender armado, Carta
contra um ataque armado, em conformidade com as regras das Nações que podem ser decididas
consagrado no art. 51 da Carta interpretativas das modalidades do contra
das Nações Unidas; exercício um Estado representando uma ameaça
do princípio de autodeterminação para a
dos povos; paz e a segurança internacionais

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Princípios do Direito
Humanitário

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Reconhecendo a importância dos princípios no Direito
Internacional Público, e percebendo a lacuna legislativa
no que diz respeito à definição dos princípios gerais de
Direito Internacional, a Assembleia Geral das Nações
Unidas adotou em 1970 a “Declaração Relativa aos
Princípios do Direito Internacional Regendo as Relações
Amistosas e Cooperação entre os Estados Conforme a
Carta da ONU”, com consenso com relação aos
seguintes princípios:

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(a) Proibição do uso ameaça da força;
(b) Solução pacífica de controvérsias;
(c) Não intervenção nos assuntos internos dos Estados;
(d) Dever de cooperação internacional;
(e) Igualdade de Direitos e Autodeterminação dos Povos;
(f) Igualdade soberana dos Estados;
(g) Boa-fé no cumprimento das obrigações internacionais.

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Referencial Bibliográfico
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 1982. 
CANOTILHO, J. J. Gomes. Fundamentos e limites da argumentação jurídica: uma reflexão sobre o direito e a ju
Ars Ivdicandi: estudos em Homenagem ao Prof. Doutor António Castanheira Neves. Jorge de Figueiredo Dias, J
Joaquim Gomes Canotilho e José de Faria Costa (orgs.). Coimbra: Coimbra Editora, 2008.
CHEREM, Mônica Teresa Costa Sousa. Direito internacional humanitário. 2. tir. Curitiba: Juruá, 2003.
CICV – Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Glossário de direito internacional humanitário (DIH) para
profissionais da mídia. Genebra, 2019. 

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