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de gotas líquidas clássicas de vários tamanhos. Nelas, também as densidades são con-
stantes e as energias de vaporização são proporcionais às suas massas. Com base nessa
analogia, muitas vezes se chama a fórmula semi-empírica de massa de modelo da gota
líquida. Essa analogia, porém, deve ser tomada com o devido cuidado uma vez que,
nas gotas clássicas, o movimento das moléculas constituintes é governado por leis da
mecânica clássica, enquanto que nos núcleos a dinâmica dos prótons e nêutrons segue
as leis da mecânica quântica.
A m de melhorar a concordância da fórmula semi-empírica de massa de Weiszäcker
e Bethe com os valores medidos, foram acrescentados mais tarde à expressão original
termos adicionais, como o termo de emparelhamento (pairing), o de energia de assime-
tria e de efeitos de camada (correções quânticas), estes foram introduzidos por W. D.
Myers e W. J. Swiatecki e, independentemente, por V M.. Strutinsky [1].
Figura 4.1: A fração de ligação em função do número de massa, as linhas cheias apenas ligam os
pontos, que provêm de dados empíricos. Alguns elementos estão indicados, note que o Ferro é o
nuclideo mais estável.
Figura 4.3: Esquema pictórico da distribuiçào de prótons e nêutrons em níveis de energia discre-
tos.
Z Z Z
EZ = Z"0 + 8" 1 + 2 + 3 + + 1 = Z"0 + 8" 1 : (4.2)
2 2 2
1
Em vez de simplesmente usar ", adotamos o valor 4" porque esta escolha leva a um resultado facilmente
identi cável com o termo de assimetria da fórmula de massa.
Daí vê-se que, para A xo, a expressão para a massa (4.5) é quadrática em Z e exibe
um mínimo para Z0 = C2 = (2C3 (A)) (que é uma função de A), e a curva, em função
de Z, é uma parábola com a concavidade voltada para baixo. Deste resultado conclui-se
que, para A xo, o valor inteiro mais próximo àquele valor mínimo de Z0 corresponde
ao número atômico de um núcleo estável. A seqüência destes valores de Z0 assim
obtidos, para os diferentes valores do número de massa A, está associada à linha de
estabilidade dos núcleos da tabela de nuclídeos, cujas massas são dadas por
2
(C2 )
Mest (A; Z0 ) = C1 (A) : (4.6)
4C3 (A)
Pode-se observar a distribuição dos nuclídeos no plano N Z na Figura 4.4, onde a
linha reta tracejada representa a equação N = Z, e a linha encurvada para cima é a
linha de estabilidade, que corresponde aos valores de Z0 . Nessa mesma gura podem-
se traçar linhas perpendiculares à linha tracejada, os nuclídeos encontrados sobre uma
mesma linha são isóbaros, A constante.
De forma mais quantitativa, dados A e Z, e usando a fórmula de massa (4.1), é
possível obter o número atômico Zest do isóbaro mais estável calculando-se
@M (A; Z)
= 0,
@Z A
o que dá para o ponto de mínimo
2 M M1 H
3
A 1 + 4an assim
Z00 = 4 5 < A;
ac 2=3
2 1 + 4aassim A 2
de estab
4 :jpg
Figura 4.4: A distribuição dos nuclídeos conhecidos no plano de nêutrons vs prótons. Os quadra-
dos mais escuros denotam os nuclídeos estáveis e os demais pontos representam os radionu-
clídeos. A linha traçejada encurvada para cima é a linha de estabilidade, ela é a representação
grá ca da Eq. (4.7).
táveis por emissão estão grosseiramente distribuídos entre esses dois tipos de núcleos
e a parábola de estabilidade é única, já que = 0 nesse caso, e tem, de maneira geral, a
forma como mostrada na Figura 4.5. Os núcleos à direita de Z0 têm um excesso de pró-
tons e massa maior do que o núcleo com Z0 , portanto eles decaem para o isóbaro estável
através de transições + , enquanto que os núcleos à esquerda também têm massa maior
e decaem para o isóbaro estável através de transições . Desta forma, os isóbaros com
Z0 2 decaem primeiro para aqueles com Z0 1 que decaem então para o isóbaro
estável Z0 , na forma de uma sequência de emissões , com meias vidas próprias.
Deve ser notado também que, para os isóbaros com excesso de prótons, a busca pela
estabilidade pode se dar pelo processo de captura de elétrons como descoberto em 1938
por Luiz Alvarez (PNF-1968). Esta captura ocorre dominantemente em núcleos pesa-
dos, uma vez que os orbitais mais internos dos elétrons nestes casos são mais próximos
dos núcleos, e são os elétrons da camada K que têm maior probabilidade de captura.
Como já mencionado anteriormente, a captura nuclear de um tal elétron produz uma
vacância que induz, por sua vez, uma cascata de elétrons de níveis mais altos de energia
para os níveis inferiores com a conseqüente emissão de raios X característicos. Do
ponto de vista energético, aquele processo é permitido se
Figura 4.6: Curvas de estabilidade para os núcleos isóbaros A-par. Na ordenada temos as massas
dos nuclídeos e na abcissa o número atômico. As setas indicam as direções dos decaimentos.
Como em uma mesma parábola os valores de Z diferem por duas unidades, pode
ocorrer de se encontrar alguns isóbaros estáveis – até três deles – para núcleos N -par
e Z-par (parábola inferior). Isto pode ser entendido, do ponto de vista energético, se
considerarmos que as transições de núcleos com Z0 2 para os núcleos com Z0 1
são proibidas. Por outro lado, um processo de decaimento beta duplo, associado a uma
transição direta do isóbaro com Z0 2 para aquele com Z0 tem baixa probabilidade de
ocorrência. Já os isóbaros Z-ímpar, na parábola superior, têm um isóbaro contíguo na
parábola inferior com diferença de cargas 1 e podem decair. Isto nos leva a conjecturar
que todos os núcleos com N -ímpar e Z-ímpar serão instáveis. Porém, há umas poucas
5 B e 7 N . Para estes, as parábolas de
exceções que são os nuclídeos naturais 21 H, 63 Li, 10 14
estabilidade são tais que aquela com Z-ímpar tem o seu ponto de mínimo associado ao
Z0 estável. Estes casos estão representados na Figura 4.7.
poucas propriedades dominantes da força nuclear. É então importante lembrar que as-
pectos mais sutis da força devem também ser relevantes em situações em que a difer-
ença entre o número de prótons e de nêutrons seja bem acentuada. Núcleos com essas
características têm meias vidas curtas e não existem em quantidades signi cativas na
natureza. Eles são chamados núcleos exóticos, sendo sintetizados em alguns processos
estelares, e também podem ser produzidos arti cialmente a partir de colisões de núcleos
pesados com o uso de aceleradores de íons. Eles se caracterizam pelo excesso de pró-
tons ou de nêutrons e o seu estudo é muito importante para se compreender melhor a
natureza da força nuclear.
2. O segundo ponto, que tem ligação direta com o primeiro, diz respeito à restrição
do uso da fórmula semi-empírica de massa (4.1) para os núcleos exóticos. De fato, há a
necessidade da inclusão de mais detalhes da força nuclear e as teorias sobre a estrutura
nuclear devem também ser re nadas de forma a permitir um tratamento mais realístico
daqueles núcleos exóticos.
3. Do ponto de vista energético há uma relação entre excesso de prótons ou nêutrons
– que se manifesta nos excessos de massa3 – e instabilidade. Alguns núcleos, assim que
formados, decairão imediatamente em uma sequência de emissões até se transfor-
marem em núcleos estáveis. Desta forma, olhando para em uma tabela de nuclídeos,
pode-se caracterizar as linhas que determinam os limites para um dado valor de A: o
número máximo de prótons quanto os de nêutrons que podem existir em um núcleo,
delimitando assim o número de nuclídeos que podem existir na natureza. Essas linhas
limítrofes são também conhecidas como drip lines.
De uma forma direta, pode-se ver que as linhas limítrofes podem ser obtidas impondo-
se que as energias de separação Sp ou Sn se anulem ou se tornem negativas. No caso
dos prótons
Sp (A) = M1 H + M (A 1; Z 1) M (A; Z) 0;
assim o valor Zdl pode ser deduzido da equação Sp (A) = 0, que representa a situação
Z X é nula.
limite quando a energia necessária para arrancar um próton de um nuclídeo A
Analogamente, para os nêutrons calcula-se Ndl da equação
Sn (A) = Mn + M (A 1; Z) M (A; Z) = 0:
Ainda em uma outra perspectiva, pode-se também obter uma estimativada linha
limítrofe para os prótons usando a expressão (4.5) para uma linha de isóbaros, escreve-
mos a diferença de energia entre dois isóbaros vizinhos
3
O excesso de massa de um nuclídeo A Z X é a diferença entre sua massa e o seu número de massa em
unidades de massa atômica u, MA X Au. É um conceito útil para determinar se um decaimento radioativo
Z
pode ou não ocorrer e quanta energia será liberada. Um decaimento radioativo ocorre só se a soma dos
excessos de massa dos produtos do decaimento é menor do que o excesso de massa do núcleo pai.
Figura 4.8: O excesso de massa em função dos isóbaros, A = 117, note-se que os pontos exper-
imentais não coincidem exatamente com a linha sólida, que representa exatamente a parábola da
fórmula de massa. O 117 58 Xe encontra-se sobre alinha limítrofe para os prótons, enquanto que o
117
46 Pd está na linha limítrofe dos nêutrons.
~
M (A; Zdl ) c2 = E 6; 6 M eV;
t
de onde segue a expressão
6; 6 C2 + C3 (A)
Zdl = ;
2C3 (A) toma-se para o inteiro mais próximo
100 + C3 (A) 50 A
' = 0; 5 + (4.9)
2C3 (A) 92; 8 + 0; 72 A2=3
que dá uma estimativa simples para a linha limítrofe dos prótons. Se tomarmos, como
56 Ba decai por captura eletrônica
exemplo ilustrativo, A = 117, obteremos Zdl = 54 (o 117
4
Este tempo é da ordem do tempo de trânsito de uma partícula pelo diâmetro de um núcleo com v = c
(R = 10 f m).
em 100 % dos casos, com meia-vida medida de 1; 75 s), veja a Figura 4.8. Uma con-
strução análoga para a linha limítrofe dos nêutrons pode também ser levada a efeito.
A extensão imediata para o limite de estabilidade por emissão de partículas tam-
bém pode ser obtida pela expressão análoga da energia de separação
M (A; Z) = M (A 4; Z 2) + M :
Neste caso, usando a fórmula de massa, os cálculos apontam para A ' 210 como os
últimos elementos estáveis por emissão alfa, embora existam alguns poucos nuclídeos
(17 no total) com A < 210 que decaem por emissão : 144 N d (100%), 146 Sm (100%),
147
Sm (100%), 148 Sm (100%), 148 Gd (100%), 149 T b (16; 7%), 150 Gd (100%), 152 Gd
(100%), 154 Dy (100%), 174 Hf (100%), 204 P o (0; 66%), 206 P o (5; 45%), 208 P o (100%),
207
At (8; 6%), 208 At (0; 55%), 209 At (4; 1%) e 209 P o (100%). Eles se concentram,
essencialmente, em alguns poucos elementos: samário, gadolínio, polônio e astatínio.
A partir de A = 210 o número de nuclídeos que podem decair por emissão au-
menta consideravelmente; até A = 258 contam-se cerca de 80 nuclídeos. Assim, vemos
que uma abordagem ingênua, baseada em considerações empíricas, consegue fornecer
uma boa descrição quantitativa dos dados observados e medidos.
f (x + h) f (x)
f (1) (x) = ,
h
f (x + 2h) 2f (x + h) + f (x)
f (2) (x) = ,
h2
f (x + 2h) 3f (x + h) + 3f (x) f (x h)
f (3) (x) = . (4.11)
h3
2
Z2 (A 2Z)
B(A; Z) = av A asup A2=3 ac aassim a(1)
p A
1=2
; (4.12)
A1=3 A
1
G (A; Z) [B(A 2; Z) 3B(A 1; Z) + 3B(A; Z) B(A + 1; Z)] . (4.13)
3!
1 8 1 Z2 28 1
G (A; Z) = asup A2=3 ac
3! 27 A3 A1=3 27 A3
)
2
(A 2Z) 1 15 1
aassim 6 3 a(1)
p A
1=2
A A 8 A3
(
2
1 4 (A 2Z) 14 Z2
= asup A2=3 aassim ac
A3 81 A 81 A1=3
5 (1) 1=2
a A , (4.14)
16 p
função esta que é uma medida do desvio da curva empírica B(A; Z) com relação a um
polinômio de segunda ordem. Comparando a expressão entre chaves que se encontra
do lado direito da segunda igualdade em (4.14) com a energia de ligação (4.12), nota-se
a ausência do termo de energia volumétrica, por ser linear em A, enquanto os demais
termos estão presentes, cada um multiplicado por um fator menor ou igual a um, assim
essa expressão é, em módulo, menor ou da ordem da energia de ligação. Porém, essen-
cialmente percebe-se a presença do fator A 3 , portanto G (A; Z) decresce rapidamente
com o quanto maior for A, o que valida a aproximação parabólica para as linhas dos
isótopos.
4.6 Problemas
1. Fazendo uso da fórmula de massa, Eq. (4.1), calcule a energia de separação da
92 U , onde o 90 T h é o núcleo residual. Discuta o resultado.
partícula no 235 231
54 Xe é emis-
2. Fazendo uso da fórmula de massa averigüe se o núcleo radioativo 138
sor ou + .
3. Usando o modelo da gota líquida para a ssão nuclear deduz-se que a condição
para ssão espontânea (altura da barreira de ssão é nula) é Z 2 =A > 50 (a ser visto pos-
teriormente no capítulo 12). Calcule (numericamente) o número atômico Z e o número
de massa A do último nuclídeo estável (que não sofre uma ssão instantânea) usando a
expressão (4.7).
4. Use a fórmula de massa para calcular a fração de ligação para todos os nuclídeos
de número atômico Z = 4 a 10. Use a tabela de nuclídeos da Ref. [5]
6. Deduza a expressão que estima a linha limítrofe – drip line – dos nêutrons,
analogamente ao que foi feito, Eq. (4.9), para prótons.
7. Em uma aproximação bastante crua, considere que uma estrela de nêutrons tenha
sua energia de ligação descrita a partir da fórmula de massa da qual se desprezam os ter-
mos de superfície, de Coulomb e de emparelhamento. É necessário, porém, acrescentar
o termo de atração gravitacional. Assim,
3 GM 2
B(N ) = av N aassim N + ;
5 r0 N 1=3
onde N é o número de nêutrons, M é a massa da estrela, G é a constante de atração
gravitacional e r0 é a constante relacionada com o raio nuclear.
Através da imposição da condição de limite para a existência de um estado ligado,
B(N ) = 0; determine os valores típicos do número de nêutrons, do raio e da massa
dessa "estrela de nêutrons"; os valores numéricos das constantes são
G = 6; 7 10 11 J m kg 2
1 M eV = 1; 602 10 13 J
Mn = 1; 67 10 27 kg
r0 = 1; 2 10 15 m:
Compare seus resultados com os dados existentes na literatura em astrofísica
9. A partir da expressão
1
Gn (A; Z) = [B(A 2; Z) 3B(A 1; Z) + 3B(A; Z) B(A + 1; Z)] ,
6
onde
Z2 (A 2Z)2
B(A; Z) = av A asup A2=3 ac aassim ,
A1=3 A
calcule o termo mais signi cativo de Gn (A; Z) para o núcleo de 20 Ca. O que você
40
conclui?
4.7 Bibliogra a
[1] Ring P. e Schuck P., 1980, The nuclear many-body probelm, Springler-Verlag Inc.,
New York.
[3] Myers e Swiatecki, 1982, Ann. Rev. of Nucl. Part. Sci. 32, 309.