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18.

SÃO BARTOLOMEU APÓSTOLO


Festa

– O encontro com Jesus.

– O elogio do Senhor. A virtude da sinceridade.

– Sinceridade com Deus, na direcção espiritual, no convívio com os outros. A virtude da


simplicidade.

Bartolomeu – ou Natanael, como às vezes o chama o Santo Evangelho – foi um dos doze  
Apóstolos. Era natural de Caná da Galiléia e amigo do Apóstolo Filipe. O Senhor fez­lhe este  
grande elogio: Eis um verdadeiro israelita em quem não há dolo. Segundo a Tradição, pregou o  
Evangelho na Arábia e na Arménia, onde morreu mártir.

I. A TRADIÇÃO IDENTIFICA o Apóstolo Bartolomeu com Natanael, aquele a 
quem o seu amigo Filipe comunicou cheio de alegria ter encontrado o Messias: 
Encontramos aquele de quem escreveram Moisés na lei e os profetas: Jesus  
de Nazaré, filho de José1. Natanael, como todo o bom israelita, sabia que o 
Messias   devia   vir   de   Belém,   do   povo   de   Davi 2.   Assim   fora   anunciado   pelo 
profeta Miquéias: E tu, Belém Efrata, tu és a menor entre as principais cidades  
de Judá; mas de ti há de sair aquele que reinará em Israel 3. Talvez tenha sido 
por   isso   que   o   futuro   Apóstolo   respondeu   num   certo   tom   depreciativo:  De  
Nazaré pode porventura sair coisa que seja boa?  E Filipe, sem confiar muito 
nas suas próprias explicações, convidou­o a conhecer pessoalmente o Mestre: 
Vem e vê.

Filipe sabia muito bem, como nós, que Cristo não decepciona ninguém. Foi o 
próprio Jesus que “chamou Natanael por meio de Filipe, como chamou Pedro 
por meio do seu irmão André. Essa é a maneira de agir da Providência, que 
nos chama e nos conduz por meio de outros. Deus não quer trabalhar sozinho; 
a sua sabedoria e a sua bondade querem que também nós participemos da 
criação e ordenação das coisas”4. Quantas vezes nós mesmos não seremos 
instrumentos para que os nossos amigos ou familiares recebam a chamada do 
Senhor! Quantas vezes, como Filipe, não diremos: Vem e vê.

Natanael,   homem   sincero,   acompanhou   Filipe   até   Jesus...   e   ficou 


deslumbrado.   O   Mestre   conquistou   a   sua   fidelidade   para   sempre.   Ao   vê­lo 
chegar   acompanhado   do   amigo,   disse­lhe:  Eis   um   verdadeiro   israelita,   em  
quem   não   há   dolo.   Que   grande   elogio!   Natanael   ficou   surpreendido   e 
perguntou:  Donde   me   conheces?  E   o   Senhor   respondeu­lhe   com   umas 
palavras que são misteriosas para nós, mas que devem ter sido muito claras e 
luminosas para ele:  Antes que Filipe te chamasse, eu te vi, quando estavas  
debaixo da figueira.

Ao   ouvir   Jesus,   Natanael   entendeu   claramente.   As   palavras   do   Senhor 


recordaram­lhe   algum   acontecimento   íntimo,   talvez   a   resolução   de   um 
propósito firme, e impeliram­no a fazer uma emocionada confissão explícita de 
fé em Jesus como Messias e Filho de Deus: Mestre, tu és o Filho de Deus, tu  
és o  Rei de Israel. E  o Senhor  prometeu­lhe:  Porque  eu  te  disse  que  te  vi  
debaixo da figueira, crês? Verás coisas maiores que estas. E evocou com certa 
solenidade   um   texto   do   profeta  Daniel5  para   confirmar   e   dar   maior   peso   às 
palavras que o novo discípulo acabara de pronunciar: Em verdade, em verdade  
vos digo que vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre  
o Filho do homem.

II.  NO   ELOGIO   DE   JESUS  a   Natanael,   descobre­se   a   atracão   que   uma 


pessoa   sincera   exerce   sobre   o   coração   de   Cristo.   O   Mestre   diz   do   novo 
discípulo que nele não há dolo nem engano: é um homem sem falsidades. Não 
tem como que “dois corações e duas pregas no coração, uma para a verdade e 
outra para a mentira”6.

Isso é o que deve poder dizer­se de cada um de nós, por sermos homens e 
mulheres íntegros, que procuramos viver com coerência a fé que professamos. 
O mentiroso, aquele que tem um espírito duplo, aquele que actua com pouca 
clareza, soa sempre a sino rachado: “Lias naquele dicionário os sinónimos de 
insincero: «ambíguo, ladino, dissimulado, matreiro, astuto»... – Fechaste o livro, 
enquanto   pedias   ao   Senhor   que   nunca   pudessem   aplicar­se   a   ti   esses 
qualificativos, e te propuseste aprimorar ainda mais esta virtude sobrenatural e 
humana da sinceridade”7.

Trata­se   de   uma   virtude   fundamental   para   seguir   o   Senhor,   pois   Ele   é   a 


verdade divina8 e aborrece toda a mentira. Até os inimigos de Cristo terão de 
reconhecer   o   seu   amor   pela   verdade:  Mestre  –   dir­lhe­ão   numa   ocasião   –, 
sabemos que és sincero e que ensinas o caminho de Deus segundo a verdade,  
sem   te   prenderes   a   ninguém,   porque   não   fazes   acepção   de   pessoas9.   E 
ensina­nos que as manifestações das nossas ideias ou pensamentos devem 
ser feitas conforme a verdade: Seja o vosso falar: Sim, sim; não, não; porque  
tudo o que passa disto procede do mal10. O demónio, pelo contrário, é o pai da 
mentira11, pois tenta constantemente levar os homens ao maior de todos os 
enganos,   que   é   o   pecado.   O   próprio   Jesus,   que   sempre   se   mostra 
compreensivo   e   misericordioso   com   todas   as   fraquezas   humanas,   lança 
duríssimas  condenações  contra  a hipocrisia  dos fariseus.  Por isso  podemos 
imaginar a alegria que lhe causou o encontro com Natanael.

A verdade abre­nos a porta para a autêntica liberdade, conforme nos diz o 
Evangelho12. “Jesus Cristo vai ao encontro do homem de todas as épocas – 
incluída   a   nossa   –   com   as   mesmas   palavras   que   pronunciou   certa   vez: 
Conhecereis a verdade, e a verdade vos fará livres. Estas palavras encerram 
uma verdade fundamental e ao mesmo tempo uma advertência: a exigência de 
uma   relação   honesta   com   a   verdade,   como   condição   de   uma   autêntica 
liberdade”13.   É   a   liberdade   interior   que   nos   permite   agir   sempre   com   a 
desenvoltura e a alegria próprias dos filhos de Deus.

Não tenhamos nunca medo à verdade, ainda que por vezes pareça que essa 
atitude   nos   acarreta   um   mal   que   poderíamos   evitar   com   uma   mentira.   Da 
verdade só pode nascer o bem. Nunca vale a pena mentir: nem para obtermos 
um   grande  benefício   económico,   nem   para   nos   livrarmos  de   um   castigo   ou 
sairmos de uma situação difícil.

III.  TEMOS   DE   SER  verazes   e   sinceros   na   vida   corrente,   nas   nossas 


relações   com   os   outros:   sem   essa   virtude,   a   convivência   torna­se   difícil   ou 
mesmo   impossível14.   “Fora   da   verdade,   a   existência   do   homem   acaba   por 
obscurecer­se e, quase insensivelmente, deixa­se invadir pelas trevas do erro, 
que podem chegar a falsear toda a vida”15.

De   modo   particular,   devemos   ser   verazes   e   sinceros   no   trato  com   Deus, 


dirigindo­nos a Ele “sem anonimato”, sem querer ocultar­nos, com a alegria e a 
confiança   com   que   um   bom   filho   se   comporta   diante   do   melhor   dos   pais. 
Temos   também   de   aprender   a   dar   a   conhecer   a   intimidade   da   nossa   alma 
àqueles que, em nome do Senhor, nos ajudam a orientar os nossos passos 
para o Céu.

Na   Confissão,   a   sinceridade   é   tão   importante   que,   se   o   penitente   não 


reconhece a sua culpa, não pode receber a graça: não é, pois, apenas uma 
atitude   perante   uma   pessoa,   o   confessor,   mas   perante   o   próprio   Deus.   A 
atitude contrária – o silêncio, a dissimulação, a mentira – seria tão estéril em 
relação   aos   frutos   que   desejamos   obter,   como   a   daquele   que,   no   dizer   de 
Santo   Agostinho,   “indo   ao   médico   para   ser   curado,   perdesse   o   juízo   e   a 
consciência e mostrasse os membros sadios, ocultando os enfermos. Deus é 
quem deve vendar as feridas, não tu; porque se, por vergonha, queres ocultá­
las com ligaduras, o médico não te curará. Deves deixar que seja o médico 
quem   te   cure   e   pense   as   feridas,   porque   ele   as   cobre   com   medicamentos. 
Enquanto com as ligaduras do médico as chagas se curam, com as ligaduras 
do doente ocultam­se. E a quem pretendes ocultá­las? Àquele que conhece 
todas   as   coisas”16.   Se   formos   sinceros,   os   nossos   próprios   pecados   serão 
motivo para que nos unamos mais intimamente a Deus.

Há outra virtude estreitamente relacionada com a sinceridade, e que hoje 
podemos   admirar   em   São   Bartolomeu:   a   simplicidade,   que   é   consequência 
necessária   de   um   coração   que   busca   a   Deus.   Opõem­se   a   esta   virtude   a 
afectação no falar e no agir, o desejo de chamar a atenção, o pedantismo, os 
ares de suficiência, a jactância..., defeitos que dificultam a união com Cristo e 
que criam barreiras, às vezes intransponíveis, ao esforço por ajudar os outros a 
aproximar­se   de   Jesus.   A   alma   simples   não   se   enreda   nem   se   complica 
inutilmente por dentro: dirige­se em linha recta para Deus, através de todos os 
acontecimentos   –   bons   ou   maus   –   que   sucedem   à   sua   volta.   A   par   da 
sinceridade,   a   naturalidade   e   a   simplicidade   constituem   outras   “duas 
maravilhosas   virtudes   humanas,   que   tornam   o   homem   capaz   de   receber   a 
mensagem de Cristo. Em contrapartida, tudo o que é emaranhado, complicado, 
as voltas e mais voltas em torno de nós mesmos, tudo isso constrói um muro 
que com frequência impede de ouvir a voz do Senhor”17.

Peçamos hoje a São Bartolomeu que nos alcance do Senhor essas virtudes, 
que   tanto   lhe   agradam   e   que   são   tão   necessárias   para   a   oração,   para   a 
convivência   e   para  o   apostolado.   Peçamos   a   Nossa   Senhora   que   andemos 
pela vida sem duplicidade, com um coração sincero e simples: “«Tota pulchra 
es Maria, et macula originalis non est in te!» – És toda formosa, Maria, e não há 
em   ti   mancha   original!,   canta   alvoroçada   a   liturgia:   não   há   n’Ela   a   menor 
sombra de duplicidade. Peço diariamente à nossa Mãe que saibamos abrir a 
alma   na   direcção   espiritual,   para   que   a   luz   da   graça   ilumine   toda   a   nossa 
conduta!

“– Se assim  lhe suplicarmos, Maria  nos  obterá  a valentia  da  sinceridade, 


para que nos cheguemos mais à Trindade Santíssima”18. São Bartolomeu será 
hoje o nosso principal intercessor diante de Nossa Senhora.

(1) Jo 1, 45; (2) cfr. São João Crisóstomo, Homilias sobre o Evangelho de São João, 20, 1: (3) 
Miq 5, 2; (4) O. Hophan, Los Apóstoles, pág. 176: (5) Dan 7, 13; (6) Santo Agostinho, 
Comentários ao Evangelho de São João, 78, 7, 16; (7) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 337; (8) cfr. 
Jo 14, 6; (9) Mt 22, 16; (10) Mt 5, 37; (11) cfr. Jo 8, 44; (12) cfr. Conferência Episcopal 
Espanhola, Inst. Past. A verdade vos libertará, 20­XI­1990, n. 38; (13) João Paulo II, Enc. 
Redemptor hominis, 4­III­1979, 12; (14) cfr. São Tomás, Sobre os sacramentos; (15) 
Conferência Episcopal Espanhola, op. cit., n. 37; (16) Santo Agostinho, Comentário ao Salmo  
31; (17) Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 90; (18) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 339.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal)

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