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Manu Scriptum - XX (Parte 1)
Manu Scriptum - XX (Parte 1)
- XX -
PA RT E 1
- 1930 a 1943 -
PA RT E 1
- 1930 a 1943 -
1.ª Edição: O u t u b r o 2 0 0 9
Fernando Pessoa
MANUSCRIPTUM XX | | 10 | |PARTE 1
MANUSCRIPTUM XX | | 11 | |PARTE 1
01- “…atrevo-me a confessar-lhe a minha forma de viver…”
MANUSCRIPTUM XX | | 12 | |PARTE 1
02- “…pois quando tu escreveres escreve bem a palavra Caxias…”
O remetente:
De António Pereira Graça
Soldado n.o11 da 1o Bataria do Regimento de Artelharia da Costa n.o 1
Caxias
O destinatário:
Ex.Ma Sen.ra
Alda Peres Morais
Fábrica Santos Barosa
Marinha Grande
O conteúdo:
MANUSCRIPTUM XX | | 13 | |PARTE 1
MANUSCRIPTUM XX | | 14 | |PARTE 1
03- “…não to havia de dizer mas ele assim premite …”
O destinatário:
Ex.º Sr.º
António Pereira Graça
Soldado n.º11 da 1.ª Bataria do Regimento de Artelharia da Costa n.º 1
Reduto Sul
Caxias
O conteúdo:
“Parede – 21-10-1931
Querido António
Cá recebi a tua tão amável carta que para mim fui uma algria. Estimo que estas
simples palavras te vão encontrar de saúde que é o que eu mais estimo que eu fico bem.
Desculpa em eu te não ter escrito no mesmo dia porque não tive ocasião não penses
que é por eu não me lembrar de ti não. Olha não se passa um momento que eu não me
lembre de ti trago-te sempre na minha edeia
Peço-te para cá vires no Domingo sem falta que háde estar tão longe de ti tanto
tempo sempre vais para Setúbal, tive pouca sorte não é assim amor.
MANUSCRIPTUM XX | | 15 | |PARTE 1
Olha na terça-feira quando a minha patroa me em tregou as cartas disse-me que
era a sorte grande que vinha lá dentro. Não podes por na tua edeia o amor que eu te
tenho não to havia de dizer mas ele assim premite soute sincera para contigo e sarei até
há hora da morte.
Agora Com isto determino porque são horas de me deitar estou com muito sono.
Maria do Carmo
MANUSCRIPTUM XX | | 16 | |PARTE 1
04- “Não pesses que eu que sou alguma mulher da vida…”
O destinatário:
Ex.º Sr.º
António Pereira Graça
Soldado n.º11 da 1.ª Bataria do Regimento de Artelharia da Costa n.º 1
Linda-a-Velha
O conteúdo:
“Parede – 24-12-1931
Meu querido António
António muito estimo que está minha carta te vá encontrar gozando um perfeita e
feliz saude, que eu fico com muitas saudades tuas cada vez são mais
Amor teis um jénio que me faz sofre muito, teis a coragem de estar já há 8 dias, sei
me, veres e nem sequer 2 letras parece. Parece que nem teis dinheiro para uma folha de
papel e um sêlo. Desculpa de eu te não escrever não é por me não lembra de ti ninguei
senão o teu amor. António quem há-te ter coragem e força para trabalhar sei tu me
escreveres sequer 2 letras já que não queres vir cá antes de eu ir para o Estoril, vou no
Domingo, vê se me escreves antes de eu ir, quero saber se estas de saude ou não, já que tu
não queres saber de mim. António podes aranjar quei te ame mas tanto como o meu amor
não arranjas; é eterno. Já não me dás aquelas doces falas que tinhas para comigo que me
fizão ganhar assim um amor tão porfundo por ti. Amor peço-te que me escrevas ainda
antes de eu ir para o Estoril para saber o que ei-de fazer mas se tu podesses cá vir melhor
era , queria falar contigo apreceito só assim poderia alegrar a minha dôr peço-te que não
te esqueças de que eu nunca me esqueço de ti amor, manda-me dizer se teis ai passado
muito frio lembra-me tanto o que tu por ai passaras porque tu amorzinho só me
esquecerás quando eu der o ultimo suspiro, só então, poderás dizer, já não pessa em mim,
já não sonha comingo, que não se passa uma só noite, que eu não sonho contigo. Mas tu
já te não lembras de mi, de quei, tanto te ama e queria ver, só assim poderia aleirar o meu
coração que só pensa em ti amorzinho?
MANUSCRIPTUM XX | | 17 | |PARTE 1
Já não te esquece e por ti há-de morrer. António a semana passada todos os dias
foi para o Estoril não se passou um dia que não chorasse por tua causa por mais ninguei
o meu amor é tão porfundo por ti para tu assim o fazeres andar a sofrer tanto.
Amorzinho põe bem mão na tua edeia penssa bem como este coração há-de andar
triste não é assim. Não pesses que eu que sou alguma mulher da vida que não sou; lá por
ter a trizte sorte ainda me sei qulucar. O meu coração só penssa em ti em mais ninguei.
Eu não fasso como algumas que tu bem deves de pensar que o meu amor e só para ti.
Já são 2 vezes que o Lucas cá vei e ti teis a coragem nem de me mandares saudades
sequer. Já me perdes-te o amor que parecias ter para comigo, era falsso, pois o meu é
sincero. Lembra-te de mim não te esquessas de quei te ama tanto e nunca se esquece de ti.
De quei não tem
Recebe as mais ternas saudades muitos beijos e um abraço desta que fica anciousa
por te ver.
M. D. C.
MANUSCRIPTUM XX | | 18 | |PARTE 1
05- “…escreve-me na volta do correio só duas linhas…”
O destinatário:
Ex.º Sr.º
António Pereira Graça
Fábrica Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
“Estoril – 15-02-1932
António
Peço-lhe que me mande dizer se a carta que me mandou é a sério ou não? Porque
nunca pessei que me fize-se sofrer tanto. Escrevia-lhe e não me respondeu; sempre
penssei que fosse por carnaval. António se vos você ses queria a creditar-se em ordinários
não viesse fala comingo você já sabia mouto bem a minha infliz sorte; e então não viesse
desgrassar-me mais. Tanta vez te disse António que me deijasses e tu que me dizias
parecia que me metias no coração para agoura no fim de eu te amar tanto de eu te trazer
só no meu coração de eu sofrer tanto por ti e vou sofrendo. Escreves-me aquelas letras
que para mim são de morte. Lembra-te que se eu não fosse tão sincera tão amável tão
inliz não me fazias sofrer.
Amor só te peço que me escrevas na volta do correio para este coração ficar mais
aleviado que tanto pulssa por ti e o teu não é sincero para ele só estava bem era junto
dele e está tão longe. Mas breve irá para perto dele antes quero que tu me mates que me
fassas sofrer assim sequer ao menos já não te vejo já não lei as tuas cartas que tanto me
fazei sofre e já não pesso em ti vou para o descansso.
MANUSCRIPTUM XX | | 19 | |PARTE 1
Meu amor? Meu adorado?
Lembra-te de quei tanto sofre e vai sofrendo escreve-lhe sequer só duas letras
manda-me dizer quando veis que te quero ir visitar já que tu não gostas de me vir ver
pois eu só estava hei sempre bei sempre contigo ao pé de mim.
Pois podes querer que este coração morrerá só por ti por mais ninguei. Amor só me
sinto bei quando estou sozinha para ler as tuas cartas para dezabafar há vontade assim
como agoura que já são 2 horas e eu sei sono nenhum só em pensar em ti Amor. Não se
passa uma hora no dia que eu não chore só se não posso mas o meus olhos o dizei falão
como gente endicão o coração.
Sempre trizte roubas-te-lhe o resto da alegria por isso não o deixes sofre mais
escreve-me na volta do correio só duas linhas e manda-me dizer quando veis. Quando
será o dia que eu então posso dezabafar há vontade que possa falar contigo que te possa
abraçar para te ver para me dizeres o que acabas-te de saber.
António manda-me dizer se estás de saude que tanto deseijo de saber e tu de mim
não te emportas. Mas Amor vê bei que eu que te amo e amarei até morrer só então se
acabará tudo. Adeus Adeus até há vistas sim?
Mais uma vêz te pesso desculpa de eu te não ter mandado a quilo que tu sabes e
perdão perdoa-me sim Amorzinho do meu coração teem dó de mim não tenhas o coração
tão douro. Não te esquessas de quei cá fica sofrendo tanto.
Recebe mil beijos e um saudosso abraço muito apertado desta que te ama sempre
Maria do Carmo
Adeus”
MANUSCRIPTUM XX | | 20 | |PARTE 1
06- “…ele que não diga nada a ninguém do que é passado.”
O destinatário:
Exº. Snr.
António Pereira Graça
Fábrica de Vidros – (Melo)
MARINHA GRANDE
O conteúdo:
MANUSCRIPTUM XX | | 21 | |PARTE 1
MANUSCRIPTUM XX | | 22 | |PARTE 1
07- “Lembra-te que não tenho ninguém…”
O destinatário:
Ex.mo Sr.º
Manuel Pereira Graça
Soldado n.º11 da 1.ª Bataria do Regimento de Artelharia da Costa n.º 1
Cuartel de Linda-a-Velha
O conteúdo:
“Estoril – 19-05-1932
António
Estimo que esteijas de saude que eu voou indo.
Com respeito a Domingo é melhor vires ter hão Estoril para irmos primeiro a
Cascais e depois seguimos então para a Parede. Olha está cá ai pelas 4 horas sei falta.
Denos que vi daí não posso senão pensar em ti e de noite e de dia sou tu, é que me
fizes-te assim sofrer pelo grande amor que tenho
Não posso viver assim antes quero morrer que sofrer algum desgosto teu. o Pensa
bei no que dizeste a ultima vez que falaste comingo. Lembra-te que não tenho ninguém
que sou uma infliz se tu me deixas morro porque eu não posso viver assi o amor é tanto
que faz falar assim.
Maria Do Carmo
MANUSCRIPTUM XX | | 23 | |PARTE 1
08- “…lamento que tu não procures aprefeicuarte mais na escrita.”
O remetente:
Remetente Pedro Pereira Graça
Reduto Norte Sala n.o 11
Caxias
O destinatário:
Ex.o Sr.
António Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
“Caxias – 11-02-1939
Meus pais desejo a vossa saude e de todos os meus irmãos, eu fico bem de saúde.
Recebi a vossa carta escrita a 8 do corrente. Dizem-me que a minha filha continua na
escola; muito bem, isso satisfaz-me bastante. Eu pedia ao Vitorino para a contrular e ao mesmo
tempo obrigá-la estudar; pois que, de contrário, nunca consegue aprender nada.
Perguntam-me pelo Álvaro Cabral e pelo Manuel Bartolomeu, este está junto comigo e
o Cabral está noutra prisão, no Aljube.
Na sua carta nada me dizem se o meu cunhado Manuel já entregou o resto do dinheiro; do
mesmo modo também nada dizem quanto dinheiro aí tenho. Claro está, que ao querer saber isto, não
é por desconfiar de vos, mas sim, para saber alguma coisa da minha vida.
MANUSCRIPTUM XX | | 24 | |PARTE 1
Manuel, pedes desculpa por a tua carta vir tão mal escrita! Escusado pedir desculpa porque
ninguém é obrigado a fazer aquilo que não sabe. Contudo, devo dizer, que lamento que tu não
procures aprefeicuarte mais na escrita. Eu conheço crianças com um ano de escola que procuram
escrever melhor e mais compriencivel que as tuas cartas. Isso só revela a tua pouca atenção e o não te
quereres preocupar.
Não julgues que ao dizer isto te queira mal; pelo contrario; o que queria é o aprefeicoamento, e
tu tens tempo suficiente para te aperfeiçoar mais.
Por hoje nada mais, dêm recomendações a todos os amigos e voces e os meus irmãos recebam
um saudoso abraço igualmente dêm muitos beijos há minha filha.
Adeus”
MANUSCRIPTUM XX | | 25 | |PARTE 1
09- “Então os estragos por ai foram grandes não?”
O destinatário:
Ex.o Sr.
António Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
“Lisboa – 11-3-941
Meus pais desejo a vossa saude assim como de toda a família que eu e os meus por agora
vamos indo bem. A Alda e a Isabel tem estado doentes. Na altura em que recebi a vossa carta
com a triste notícia do que tinha havido na minha casa estavam elas bem mal. Mas agora já vão
melhor felizmente.
Mandaram dizer que já andavam em reconstrução. Peço-vos que mandem dizer quanto
gastaram e se as paredes ficaram arroinadas e se os estragos foram muito grandes.
Outro assunto: apenas mandei preguntar em que data se pagava o seguro e não para vocês o
pagarem, pois que, eria saber para lhes mandar o dinheiro.
O meu cunhado António deve entrar agora no dia 20 dêste mês com o primeiro mês de renda
da casa. O dinheiro do mês passado foi para ele pelo arranjo do pátio e a limpeza da casa e outras
despesas.
Então os estragos por aí foram grandes não? por aqui foi uma miséria mas aidiante não
vale apena lamentar nos porque não nos vale de nada.
MANUSCRIPTUM XX | | 26 | |PARTE 1
Sem mais, recomendações para todos os meus irmãos e sobrinhos e vocês recebam um grande
abraço deste vosso filho.
MANUSCRIPTUM XX | | 27 | |PARTE 1
10- “Ia custando ma foi.”
O remetente:
Pedro Pereira Graça
Bairro Santa Catarina, n.o 11, 1o D.t Dafundo
Lisboa
O destinatário:
Ex.o Sr.
Manuel Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
“Lisboa 1/12/1941
Manuel antes de tudo estimo a saúdos nossos pais assim como a restante família incloindo
tu também.
Manuel já com esta é a 3.a carta que vos escrevo, sem que, me dei resposta a nenhuma. O
motivo porque vocês o têm feito e continuem a fazer não sei nem posso saber. Há momentos que
pregunto a mim mesmo se anida tenho família na terra, pois que, há 3 ou 4 longos meses que não
tenho notícias de vós, por isso não sei se são vivos ou mortos.
A que se deve esta auxência de correspondência? Pela minha parte não sei dezer. Às 3
cartas que escrevo, creio ser o suficiente para ter demonstrado que anido os não esqueci. Porem, parece-
me que da vossa parte tal se não dá, porque ainda que durante este tempo não tevesse escrito, já teriam
o dever de o ter feito a saber o que havia da minha parte e as razões porque não escrevia. Mas 3 cartas
é alguma coisa e 3 ou 4 meses também é muito tempo embora pareça que não.
Nas cartas que escrevi pedia para que, mandássem dizer o que havia quanto ás contas e
despesas da casa, isto é, tudo quanto havi, mas até agora ainda nada sei sobre o assunto. Por isso vos
peço que quando resolverem escrever digam alguma coisa sobre esta questão.
MANUSCRIPTUM XX | | 28 | |PARTE 1
Sem mais, muitos cumprimentos para toda a família, um abraço para o pai outro para mãe
e tu recebe também um assim como a Josefina e a Alda também recomendo
A minha Isabel começou agora a andar. Ia custando ma foi. Já está bem cara mas
tenho-lhe feito pela vida tudo quanto era possível a um pai.
Como vai por ai a vida? Por aqui tudo muito mau mas vamos indo enquanto Deus
quiser.
MANUSCRIPTUM XX | | 29 | |PARTE 1
11- “Tenho a dizer-vos que cheguei bem.”
O destinatário:
Ex.o Sr.
António Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
MANUSCRIPTUM XX | | 30 | |PARTE 1
12- “A ocasião é propria.”
O remetente:
Pedro Pereira Graça
Bairro Santa Catarina, n.o 11, 1o D.t Dafundo
Lisboa
O destinatário:
Ex.o Sr.
Manuel Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
MANUSCRIPTUM XX | | 31 | |PARTE 1
MANUSCRIPTUM XX | | 32 | |PARTE 1
MANUSCRIPTUM XX | | 33 | |PARTE 1
13- “…O número de telefone é 124.”
O remetente:
Remetente Pedro Pereira Graça
Bairro Santa Catarina, n.o 11 1 D.t Dafundo
Lisboa
O destinatário:
Ex.o Sr.
Manuel Pereira Graça
Fábrica de Vidros Melo
Marinha Grande
O conteúdo:
“Lisboa 13/9/43
Amigo e irmão estimo a saude de todos nós por aqui vamos todos bem. Então as melhoras do
nosso pai como vão?
Quando cheguei a Lisboa escrevi-te um postal com o número do telefone para onde devem
telefonar, em caso de urgência, aos sabados depois da uma hora da tarde e durante o domingo desde as
9 da manhã até as 9 da noite. O número de telefone é 124.
Logo que recebas esta carta vai um dia depois á estação para levantares as cestas que eu trouxe
quando vim. Vai dentro das cestas um saco que é para a Rosa encher de camisas, e umas meãs que
são da mãi e da Etelvina, vai também um pouco de bacalhau ai para casa. Segue também uma
garra-termo que se fizeres o favor entrega-la ao António Moreira.
Logo que a Maria tenha os sacos das camisas cheias fás-me favor á estação e despacha-mos
para aqui, a pagar cá.
MANUSCRIPTUM XX | | 34 | |PARTE 1
Depacha-os para Pedro Pereira Graça
Segue nesta carta a guia do caminho de ferro do depacho dos cestos e com a vai levantá-las.
Sem mais: cumprimentos para todos e tu recebe de mim um grande abraço deste teu irmão.
MANUSCRIPTUM XX | | 35 | |PARTE 1
INDÍCE
PARTE 1...............................................................................................................................................................10
01- “…atrevo-me a confessar-lhe a minha forma de viver…” ...................................................................................... 12
06- “…ele que não diga nada a ninguém do que é passado.” ..................................................................................... 21
INDÍCE .................................................................................................................................................................36
MANUSCRIPTUM XX | | 36 | |INDÍCE