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CENAS DA VIDA DE UM PROFESSOR

(Texto para teatro. Não se sabe bem se será uma comédia ou uma tragédia.
Qualquer semelhança com a realidade poderá não ser pura coincidência.)

Personagens: Sinto-me
- Professor um pouco
- Filho louco.
- Esposa
- Mãe
- Irmão
- Amante
- Barbeiro
- Dono do restaurante
- Padre
- Psiquiatra
- Santo António
CENA 1
(O professor passa apressado em frente à barbearia. O barbeiro, que está à porta, interpela-o.)

BARBEIRO Olha, o senhor professor!


Essa barba por fazer...
O cabelo desgrenhado...
Desculpe ter de o dizer:
Devia ter mais cuidado.
Já não vem ao seu barbeiro!
Dispensou o meu serviço?
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PROFESSOR Um professor a tempo inteiro
Já não tem tempo para isso.

CENA 2
(O professor está em casa a preparar aulas. Ouve o telefone e atende. É a mãe.)

MÃE Que filho desnaturado!


Não ligas à tua mãe!
E andei-te eu a criar!...

PROFESSOR Tenho andado cansado.


Já não ligo a ninguém.
Passo a vida a trabalhar.

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CENA 3
(O professor está a sair de uma reunião, quando o telemóvel toca. Atende. É a amante.)

AMANTE Eu sempre fui tua amante,


Sem tua mulher saber.
Vês-me, passas adiante.
Finges não me conhecer.
X
PROFESSOR Sou um homem ocupado.
Não posso aí aparecer.
O trabalho é sagrado.
Não há tempo para o prazer.

CENA 4
(O professor está em casa a corrigir testes. Tocam à campainha. Ele abre a porta. É o irmão.)

IRMÃO Olá, mano. Como vais?


Há tempos que te não via.

X
Já não telefonas, não sais...
Como eras... quem diria...

PROFESSOR Divertir-me já não posso.


Já nem janto nem almoço.
Sabes que esta vida é dura.

IRMÃO Isso não é profissão.


Mais parece uma prisão.
Voltaste à ditadura.

CENA 5
(O professor passa apressado em frente de um restaurante. O dono vem à porta, cumprimentá-lo.)

DONO REST. Então, que é feito de si?!


Que antes comia aqui
Cabidela e feijoada?...
X
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PROFESSOR Nem para comer tenho tempo.
Dentro do meu pensamento.
Só há trabalho e mais nada.

CENA 6
(O professor está no quarto com a esposa.)

ESPOSA Que se passa, meu amor?


Já não sinto em ti calor.
Ponho roupa provocante,
Mas tu pareces distante.
Olhas triste para a janela...

PROFESSOR Sei que é ideia sinistra,


Mas só penso na Ministra,
Já só me excito com ela.

CENA 7
(O professor está em casa, de volta dos livros. Numa das paredes, está um altar com um Santo
António. O Santo sai do altar e dirige-se ao professor.)

SANTO ANTÓNIO Por onde andas, meu filho?


Que já não falas comigo... Menino Jesus,
livra-te de ires
Perdeste a devoção? para professor!
Sou santo conhecedor.
Sinto tua angústia e dor
Dentro do teu coração.

PROFESSOR Ó meu rico Santo António!


Belos tempos que lá vão!...
Dirigia-te oração,
Era teu adorador.
Mas com esta profissão,
Já não tenho tempo, não.
É vida de professor...

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CENA 8
(O professor está no quarto, a colocar roupa numa mala de viagem. O filho entra.)

FILHO Porque levas tua roupa?


Estás a pensar dar à sola?
Deixas-me a mim e à mamã?

PROFESSOR Tenho a cabeça louca!


Vou viver para a minha escola.
Já lá fico para amanhã.

CENA 9
(O professor vai à igreja confessar-se ao padre.)

PROFESSOR Senhor padre, eu pequei.


Foi culpa da diarreia.
É que ontem mal trabalhei,
A defecar a tarde inteira.

PADRE Pois se pecaste, meu filho,


A Deus Pai pede perdão.
Compensa o tempo perdido.
Regressa à tua missão.

CENA 10
(O professor vai a uma consulta de psiquiatria. O psiquiatra abana a cabeça.)

PSIQUIATRA Vou ser curto e directo:


Se isto continua assim,
Vou ter de o internar.

PROFESSOR Deus me livre! Vade Retro!


O que seria de mim
Sem poder ir trabalhar?!

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CENA 11
(O professor está já morto e enterrado. Vê-se a lápide. Ouve-se voz narrando o que aí está escrito.)

VOZ Aqui jaz homem honrado.


De virtudes um modelo.
Ao trabalho consagrado.
Tomara qualquer um sê-lo.

Todos os papéis preenchia. Ficarás


Nas reuniões sempre presente. sempre no
meu
Para o trabalho vivia,
coração
Mesmo estando já doente.
Ministra da
Educação
Sofrendo do coração,
Trôpego, de idade avançada,
Faleceu de exaustão,
No meio da papelada.

Abençoado sejas.

Ficarás sempre no meu coração.

Ministra da Educação.

Elaborado por Sara M V Repolho


(filha de uma professora à beira de um ataque de nervos)

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