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Se desmorono ou se edifico
Se permaneço ou me desfaço
- Não sei, não sei. Não sei se fico
Ou passo.
Há quem interprete
Como sendo coisas
De outra encarnação…
Barqueiro do Douro,
Tão largo é teu rio,
Tão velho é teu barco,
Tão velho e sombrio
Teu grave canto!
Canção
Não quero
Nenhuma promessa
A flor e o ar
Do divino lugar
onde o bem da existência
é ser eternidade
e parecer ausência.
E, no fundo do mar,
a estrela, sem violência,
cumpre a sua verdade,
alheia à transparência.
Venturosa de sonhar-te,
Venturosa de sonhar-te,
à minha sombra me deito.
(Teu rosto, por toda parte,
mas, amor, só no meu peito!)
Suspiro do vento,
lágrima do mar,
este tormento
ainda pode acabar?
De dia e de noite,
meu sonho combate:
vêm sombras, vão sombras,
não há quem o mate!
Suspiro do vento,
lágrima do mar,
as armas que invento
são aromas no ar!
Mandai-me soldados
de estirpe mais forte,
com todas as armas
que levam à morte!
Suspiro do vento
lágrima do mar,
meu pensamento
não sabe matar!
Suspiro do vento
lágrima do mar,
que leve esse arcanjo meu longo
tormento,
e também a mim, para o acompanhar!
Som
Alma divina,
Por onde me andas?
Noite sozinha,
Lágrimas, tantas!
Deixa – me ainda
Pensar que voltas,
Alma divina,
Coisa remota!
(Prodigioso perfume)
O vento voa,
A noite toda se atordoa,
A folha cai.
Olival de prata,
Veludosos pinhos,
Clara madrugada,
Dourados caminhos,
Lembrai-vos da graça
Com que os meus vizinhos,
Numa cavalgada,
Com frutos e vinhos,
Lenços de escarlata,
Cestas e burrinhos,
Foram pela estrada,
Assustando os moinhos
Com suas risadas,
Pondo em fuga cabras,
Ventos, passarinhos.
Em cima, é a lua,
No meio, é a nuvem,
Em baixo, é o mar,
Sem asa nenhuma,
Sem vela nenhuma,
Para me salvar.
O trilho da terra
Para onde é que leva,
Luz do meu olhar?
Que abismo aéreos
De reinos aéreos
Para visitar!
Na beira do mundo,
Do sono do mundo
Me quero livrar.
E em cima – é a lua
No meio – é a nuvem
E em baixo – é o mar.
Rosa do deserto
Eu vi a rosa do deserto
Ainda de estrelas orvalhada:
Era a alvorada.
Eu vi a rosa do deserto:
A exacta rosa, a ígnea medida
Da humana vida.
Eu vi o mundo recoberto
Pela manhã de claridade
Da incandescente eternidade.
Caminhante
E em perguntar me resigno,
Me submeto e me convenço.
Será tardia, a cantiga?
Ou ainda não será tempo…
Idílio
Alheias e nossas
As palavras voam.
Bandos de borboletas multicolores,
As palavras voam.
Bando azul de andorinhas,
Bando de gaivotas brancas,
As palavras voam.
Voam as palavras
Como águias imensas.
Como escuros morcegos
Como negros abutres,
As palavras voam.
E às vezes pousam.
De repente, a amargura sobe
Quero solidão.
De que são feitos os dias?
De loucuras, de crimes,
De pecados, de glória
- do medo que encadeia
Todas essas mudanças.
A vida só é possível
Reinventada.
II
Suspiros montes!
Porém, agora,
Talvez não me encontrem.
Pois a alma se esconde,
Porque já nem chora.
Cantata vesperal
Sonhei um sonho
E lembrei-me do sonho
E esqueci-me do sonho
E sonhei que procurava
Em sonho aquele sonho
E pergunto se a vida
Não é um sonho que procurava um
sonho.
Apontamento
Chega e canta.
Canta e pára.
Pára e escuta:
Com os ouvidos, com os olhos, com as
pernas.
Escuta e canta.
Canta e pára.
Pára e parte.