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VI SEMEAD ESTUDO DE CASO

RECURSOS HUMANOS

ENTENDENDO A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO NO


CONTEXTO DE UMA ESCOLA DE IDIOMAS

Autores:
Andréa Yumi Sugishita Kanikadan
Mestranda em Administração - FEA-USP
Graduada em Administração pela FEA-USP
Endereço: R. Monte Caseros, 313 apto 41 – Vila Gomes - São Paulo-SP cep 05590-130
Tel.: (011) 9631-7053
e-mail: a_kanikadan@yahoo.com

Ana Cristina Limongi-França


Professora Livre docente da FEA-USP
Endereço: Av. Mercedes, 1018 Lapa São Paulo-SP cep 05081-060
Tel: (011) 3091-5908
Fax: (011) 3833-0573
e-mail: climongi@usp.br

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ENTENDENDO A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO NO
CONTEXTO DE UMA ESCOLA DE IDIOMAS

Resumo
Este trabalho de caráter preliminar e exploratório analisa as questões relacionadas a
Qualidade de Vida no Trabalho em uma escola de idiomas, sob o ponto de vista da gestão da
empresa. O principal objetivo do estudo foi destacar a existência do tema proposto mesmo
quando não se aborde diretamente Qualidade de Vida no Trabalho, mas através dos critérios
existentes na abordagem biopsicossocial relacionados com as políticas de Recursos Humanos. O
método de pesquisa foi estudo de caso, através do modelo de variáveis independentes,
representando as ações que a empresa adota. Os dados foram coletados através de entrevista
pessoal e estrutural na própria escola situada na cidade de São Paulo.
Os resultados descrevem a existência de alguns indicadores de Qualidade de Vida no
Trabalho atuando nas diversas áreas representadas pelo enfoque biopsicossocial analisados dentro
das práticas de Recursos Humanos vigente, considerando o mercado de trabalho em que a
organização se insere.

1. Introdução
O fenômeno da globalização e a conseqüente entrada de empresas estrangeiras no Brasil
têm levado muitas pessoas a buscarem um segundo idioma como forma de comunicar-se
internacionalmente. A predominância do idioma inglês como língua estrangeira originou-se
“devido ao grande poderio econômico da Inglaterra no século 19, alavancado pela Revolução
Industrial, e a conseqüente expansão do colonialismo britânico, o qual chegou a alcançar uma
vasta abrangência geográfica e uma igualmente vasta disseminação da língua inglesa, (...) devido
ao poderio político-militar dos EUA a partir da segunda guerra mundial, e à marcante influência
econômica e cultural resultante, que acabou por deslocar o francês dos meios diplomáticos e
solidificar o inglês na posição de padrão das comunicações internacionais” (Schütz, 2002).
O mundo tem percebido essa necessidade nos diversos campos de atuação, seja
econômico, cultural, social ou político.
Destaca-se a dificuldade que as pessoas em geral têm em aprender uma língua estrangeira,
pelo nível insuficiente na formação básica, proporcionando uma diversidade de métodos e cursos
livres que a cada ano se proliferam pelo país. Hoje, montar um curso de inglês ou abrir uma
franquia é investir no próprio negócio. A estrutura organizacional apresenta-se simples, pois a
existência de 3 pessoas já viabiliza a abertura de um estabelecimento (Andrade, 1993). Com isso,
vê-se um investimento muito pesado em marketing, fazendo com que os interessados em
aprender o inglês seduzam-se com promessas que nem sempre se tornam verdadeiras.
Observa-se nos discursos publicitários sempre a existência de qualidade no ensino dos
mais variados cursos livres de idiomas, e grande parte deles destacam seus Recursos Humanos
como indicador de qualidade:
“Com uma equipe de professores experientes, a Cultura Inglesa disponibiliza a melhor
infra-estrutura para seu aprendizado: material didático apropriado (...)” (Cultura Inglesa).
“(...) saiba que o Berlitz está sempre procurando candidatos qualificados para nossos
programas de idiomas e cross-cultural, e para cargos em nossa sede administrativa.” (Berlitz)
“(...) nossos professores são uma história a parte. Animados e dinâmicos usam uma
linguagem natural, seguindo os padrões de entonação...” (CNA)
Mas o que se tem feito a respeito dos profissionais que se dispõem a ensinar uma língua
estrangeira nas questões relativas à Gestão de Pessoas?

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O presente estudo pretende responder uma parte dessa pergunta, visto que pouca atenção
tem sido dada às profissões relacionadas ao ensino. Será dada uma grande ênfase às questões
relacionadas à Qualidade de Vida no Trabalho dos profissionais de ensino de idiomas, com
particular atenção aos cursos livres.
Através de uma primeira entrevista com uma pessoa responsável pelo quadro de
colaboradores de uma renomada instituição de ensino de idiomas, com ênfase nos cursos de
inglês, foi possível estruturar o trabalho. Foram necessários, outros contatos para detalhamento de
informações, que ocorreram através da Internet e telefone, num total de aproximadamente 8
horas. O esquema resume as etapas do trabalho:
Introdução

Fundamentação
Teórica

O Caso
Metodologia Estudado

Discussão dos
Resultados

Conclusões

Bibliografia

2. Fundamentação Teórica

2.1. Qualidade de Vida no Trabalho


No contexto organizacional, a Gestão de Qualidade de Vida no Trabalho depende muito
da cultura existente em cada empresa. Diversos autores conceituaram Qualidade de Vida no
Trabalho (QVT), com enfoques variados, destacados no Quadro 1.

Quadro 1 - Conceitos em Qualidade de Vida no Trabalho (QVT)

Definição Ênfase
Avaliação qualitativa da qualidade relativa das condições Responsabilidade social da empresa
de vida, incluindo-se atenção aos agentes poluidores, nos movimentos sociais, culturais e
barulho, estética, complexidade etc. (Drucker, 1981) políticos.
Atendimento de necessidades e aspirações humanas, Humanização e responsabilidade
calcado na idéia de humanização e responsabilidade social social, com foco no poder da
da empresa. (Walton, 1973) empresa.
Conjunto de fatores que, quando presentes numa situação Humanização do cargo.
de trabalho, tornam os cargos mais satisfatórios e
produtivos, incluindo atendimento de necessidades e
aspirações humanas. (Fernandes, 1992)
Esforços para melhorar a qualidade de vida, procurando Valorização dos cargos, mediante
tornar os cargos mais produtivos e satisfatórios (Werther análise de elementos organizacionais,
& Davis, 1983.) ambientais e comportamentais.

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Definição Ênfase
Maneira de pensar a respeito das pessoas, participação na Visão humanista no ambiente de
resolução de problemas, enriquecimento do trabalho, trabalho.
melhoria no ambiente de trabalho. (Nadler e Lawler,
1983)
Atendimento das expectativas quanto a se pensar a Visão holística
respeito das pessoas, trabalho e organização, de forma
simultânea e abrangente. (Neri, A.M., 1992)
Oportunidade para o indivíduo satisfazer a grande Trabalho, crescimento pessoal,
variedade de necessidades pessoais (Lippitt, 1978). tarefas completas, sistemas abertos.
Melhorar as condições de trabalho, de modo a Condições de vida e cargos mais
proporcionar aos indivíduos melhores condições de vida e satisfatórios.
cargos mais satisfatórios para a própria pessoa, com
reflexos na produtividade. (Berlanger, 1992)
Experiências de humanização do trabalho sob dois Posto individual de trabalho e
aspectos: reestruturação do emprego e grupos semi- processo decisório.
autônomos. (Ginzberg et alii, 1979)
Aplicação concreta de uma filosofia humanista pela Mudança e participação com foco
introdução de métodos participativos. (Bergeron, 1982) sociotécnico.
Classificação de programas: orientação familiar, saúde, Foco motivacional: sobrevivência
ambiente, contato e convívio, evolução/desenvolvimento, com dignidade, segurança,
cultura e desligamento. (Camacho, 1995) participação, auto-realização e
perspectiva de futuro.
Gerência pela Qualidade Total – GQT: Utilização de 5s, Foco: promoção da saúde: controle
diagrama de causa e efeito e procedimentos da Qualidade do colesterol, capacidade física e
Total nos programas de saúde. (Dantas, 1996) aeróbica, doenças coronárias.
QVT é o conjunto de ações de uma empresa no sentido de Visão holística
implantar melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas
e estruturais no ambiente de trabalho. (Limongi-França,
1996)
Fonte: adaptado de Indicadores Empresariais de Qualidade de Vida no Trabalho, Limongi França, 1996

Através desses conceitos é possível analisar a QVT do ponto de vista da Gestão de


Pessoas, sem existir a necessidade de se adotar apenas uma para realizar o estudo. É necessário
que se considere o mercado em que está inserido um curso de idiomas, pois se deve analisar o
estágio em que se encontram suas práticas internas.

2.2. A visão biopsicossocial


A construção da QVT ocorre a partir do momento em que se olham as pessoas como um
todo, o que chamamos de enfoque biopsicossocial. Um ser biopsicossocial divide-se em
potenciais biológicos (características físicas herdadas ou adquiridas: metabolismo, resistências,
vulnerabilidade dos órgãos e sistemas), psicológicos (processos afetivos, emocionais, e de
raciocínio; conscientes ou inconscientes); e sociais (valores; crenças; papel na família, no
trabalho e em todos os grupos a que a pessoa pertence ou participa; meio-ambiente; localização
geográfica) os quais respondem de maneira variada às condições de vida.

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2.3. Variáveis Biopsicossociais
As variáveis biopsicossociais podem ser independentes e dependentes, sendo agrupadas
de acordo com a visão biopsicossocial, com a finalidade de conduzir o estudo dentro de uma
situação proposta. No caso em questão será utilizada a variável independente, pois o processo
concentra-se na gestão da empresa. O quadro 2 descreve as ações específicas que a empresa pode
tomar, enquanto instituição de ensino de idiomas.

Quadro 2 - Variáveis independentes: ações da empresa

Área de Descrição Programas específicos indicadores


Investigação
Organizacional Ações que valorizam a imagem, - Endomarketing
estrutura, produto e - Comitês executivos e decisoriais
relacionamento da empresa com - Comunicação interna
os empregados. - Imagem externa
Biológica Ações que promovam a saúde, - Mapa de riscos
que controlem os riscos - Refeições
ambientais e atendam às - Serviço Médico – interno e contratado
necessidades físicas. - Melhorias ergonômicas
- Treinamentos específicos
Psicológica Ações que promovam a auto- - Processos de seleção e avaliação de
estima e o desenvolvimento de desempenho
capacidades pessoais e - Carreira
profissionais. - Remuneração
- Programas participativos
Social Ações que ofereçam benefícios - Serviço Social
sociais obrigatórios e espontâneos - Grêmio esportivo
e criem oportunidades de lazer e - Fundações específicas
cultura. - Recursos Humanos

2.4. A língua inglesa no Brasil


O período monárquico marcou a introdução do ensino de “línguas vivas” nas escolas com
a vinda da Família Real para o Brasil, em 1808 (Platero, 2000).
Em 1855, regulamentou-se o ensino de línguas modernas no nível secundário, assim, o
francês, o inglês e o alemão passaram a ser obrigatórios durante três anos, juntamente com outras
línguas que já eram oferecidas, latim e grego durante um ano, além do italiano durante um ano,
facultativamente (Ferro apud Platero, 2000).
A necessidade de se aprender uma língua estrangeira já era sentida nos cursos superiores
de Direito, que além do latim, pedia-se o francês e o inglês. O curso de Medicina cobrava o latim,
o francês ou o inglês e o alemão (Piletti apud Platero, 1999).
O tempo de estudo de uma língua estrangeira era de quatro a cinco horas no ensino
secundário, mas reduziu-se pela metade no fim do Império devido ao poder de decisão
centralizado pelas congregações dos colégios (Platero, 2000).
No período republicano, com a determinação de um padrão único de ensino para línguas
clássicas e modernas, seguida da falta de seriedade nas avaliações, diminuiu-se a carga semanal

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no ensino de línguas. Restou apenas o latim, o francês e o inglês ou alemão no ensino secundário
(Ferro apud Platero, 2000).
Por volta de 1931, após a criação do Ministério de Educação e Saúde Pública, ao diminuir
a carga horária do latim, deu-se uma maior ênfase ao ensino de línguas modernas (Platero, 2000).
Algumas leis, juntamente com fatores econômicos e comodismo por parte das direções de
escolas, modificaram o espaço ocupado pelas línguas estrangeiras, e somente uma língua
estrangeira passou a ter caráter obrigatório no segundo grau (Totis apud Platero, 2000).
A LDB (Lei de Diretrizes Básicas) traz no artigo 26, § 5°, a inclusão obrigatória de pelo
menos uma língua estrangeira a partir da 5a série, ficando a cargo da comunidade escolar,
escolher essa língua.

2.5. Cursos Livres de Idiomas


Os cursos de idiomas são caracterizados como livres pois seus certificados não são
reconhecidos pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Com isso, não existe um órgão que
regulamente a abertura dos mesmos, permitindo que a cada dia novos cursos e metodologias
apareçam.
A grande maioria das escolas de idiomas que existe no mercado, contrata seus professores
como profissionais autônomos, não lhes dando nenhuma garantia, como: número definido de
horas trabalhadas, férias remuneradas, décimo-terceiro salário, fundo de garantia por tempo de
serviço (FGTS), entre outros. Nesses cursos, os profissionais são remunerados por hora-aula
dada.
A cada semestre, essas escolas de idiomas renovam seu quadro de professores, muito mais
por desistência dos professores do que por vontade da escola possuindo, em muitos casos,
somente a posição de um coordenador que atua a mais tempo na organização e se beneficia ao
menos, daquilo que é legalmente determinado. São poucos os professores que permanecem por
mais de um ano na mesma instituição.
Um curso de idiomas movimenta diversos mercados. Dentre eles, pode-se citar as editoras
que publicam os livros que são utilizados pelas escolas e alunos. O quadro 3 informa as
categorias de alunos existentes e o número estimado de alunos em cada uma.

Quadro 3 – Número estimado de alunos por categoria

Categoria de alunos No. Estimado de alunos


Alunos utilizando livros importados no setor privado: 60%1.800.000
em institutos de línguas e 40% em escolas (particularmente
no sul do Brasil)
Total estimado de livros didáticos importados vendidos por3.000.000
ano (muitos alunos compram mais de um livro por curso e/ou
utilizam mais de um livro por ano)
Alunos que estudam com livros didáticos nacionais -5.000.000
compram seus próprios livros
Alunos que estudam com livros didáticos nacionais - livros5.000.000
fornecidos pelo MEC (existe um atraso nessas categorias,
devido ao MEC levar algum tempo até chegar às escolas,
assim alguns alunos compram seus livros antecipadamente).
Alunos estudando com cópias preparadas em800.000 – 900.000
escolas/universidades (cópias ilegais incluídas)

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Alunos sem nenhum livro (ou ocasionalmente com cópias) -23.000.000
isto envolveria alunos copiando dos quadros negros
Alunos estudando em escolas franqueadas, com materiais1.000.000
preparados pela própria franquia
No. Total de alunos de inglês em escolas brasileiras, 5a. Série44.584.000
até o final do segundo grau
Fonte: informação fornecida por Jose Manuel Vicente, Managing Director of SBS-Special Book Services e Maria Cristina Herrero,
Managing Director of Macmillan do Brasi)

Essa necessidade constante do idioma é um negócio atrativo não só no Brasil. No México,


com o North American Free Trade Agreement (NAFTA), têm sido dada grande importância a se
saber inglês, tornando-se um negócio lucrativo (Dieusaert, 2002).

2.6. O professor de inglês


Diversos fatores, tais como institucionais, metodológicos e pessoais, determinam o papel
desempenhado pelo professor. Cada escola e cada professor apresentam características
individuais, fazendo com que apenas os fatores metodológicos sejam mais previsíveis “mantendo
alguma relação de coerência com as teorias que inspiram” (Platero, 2000).
O professor é responsável por facilitar o processo de
comunicação entre todos os participantes da aula
juntamente com as atividades em classe. Além disso, ele é
um participante independente dentro do grupo, pois
organiza os recursos, conduz os procedimentos e atividades
em aula e atua como pesquisador e aprendiz contribuindo
para a aprendizagem através de habilidades, conhecimentos
e experiências próprias. Nota-se que, nos dias de hoje, o
Márcio Baraldi (baraldi@cidadesdaserra.jor.br
professor de inglês, em geral, é jovem e carismático, não
guardando nenhuma semelhança com o profissional do
passado (Tippee, 2002).

3. Metodologia
Este trabalho pode ser caracterizado como um estudo exploratório, método recomendado
“no caso de problemas em que o conhecimento é muito reduzido” (Selltiz et al, 1974, 60), visto
que busca a descoberta de idéias e geração de hipóteses. Foi utilizada a metodologia do estudo do
caso, que busca a compreensão tanto do que é comum quanto do que é particular sobre o caso
estudado, chamando a atenção para a consideração do que especificamente pode ser aprendido a
partir de um único caso (Stake, 1994).
Para o estudo sobre QVT foi escolhida uma organização que se dedica ao ensino de
idiomas. O levantamento de dados foi realizado em duas etapas:
(1) Dados secundários: Revisão bibliográfica sobre QVT, e cursos de inglês no Brasil, incluindo
artigos, teses e livros além da própria vivência do autor e contatos informais com
profissionais da área.
(2) Dados primários: Entrevista com Coordenador de Recursos Humanos de instituição de ensino
de idiomas através de contatos pessoais e contatos por e-mail. Utilizou-se um esquema onde a
pessoa entrevistada teve a oportunidade de descrever todos os aspectos referentes à Gestão de
Pessoas, através de um roteiro que lhe foi enviado previamente. Para a análise de dados
apresentadas no próximo item, extraiu-se aspectos que a empresa apresenta que podem ser

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caracterizados como indicadores de QVT, não estando apresentado, portanto, todo o conteúdo
da entrevista.
É importante ressaltar as principais limitações deste estudo. Há uma certa dificuldade em
se obter informações das escolas de idiomas. Possivelmente, devido aos poucos estudos que
geralmente essas instituições são submetidas. A pesquisa sobre temas das ciências humanas é
limitada pelo viés do pesquisador. A própria escolha do método de pesquisa já é um viés, entre
outros inevitáveis, como a análise das idéias conforme a percepção da realidade, visão de mundo
existente e escolha dos casos a serem estudados. Além disso, o estudo de um único caso não
possibilita comprovação e generalização. No entanto, a contribuição científica buscada será a
ampliação da visão do conceito de qualidade de vida, especialmente na cultura organizacional das
escolas de idiomas.

4. O Caso Estudado

4.1. A Escola de Idiomas


O estudo foi realizado em uma instituição cuja identidade permanecerá omitida por
motivos éticos. A escola em questão atua no mercado brasileiro há cerca de 35 anos. É uma
Holding, composta de 23 sociedades, com aproximadamente 80 sócios (pessoas físicas). Toda a
estrutura abriga 23 gerentes, 60 coordenadores principais e auxiliares de coordenação. Entre
docentes e administrativos são cerca de 700 funcionários, dos quais 10% atuam em funções de
nível executivo.
Sua missão é proporcionar o rápido aprendizado de um novo idioma, contribuindo para
ampliar os canais de comunicação entre as pessoas. Dessa forma, participam do
desenvolvimento e do crescimento de seus alunos, colaborando para que eles possam evoluir da
era da informação para uma outra ainda mais importante: a era do entendimento.
A organização atua no ensino de inglês, espanhol, francês, alemão e português para
estrangeiros, tendo o inglês como idioma principal. São características desses cursos:
matrículas continuamente abertas; preços cobrados na base das aulas efetivamente ministradas;
turmas com, no máximo, 10 alunos; cursos organizados em caráter intensivo; ênfase no
desenvolvimento de aspectos comunicativos; atenção especial à comunicação oral; atendimento
personalizado; uso intensivo e regular de laboratório de línguas, do tipo audio-ativo-
comparativo; organização de tapotecas (gravação + texto) como recurso complementar; uso
didático de vídeo-cassete em programas de reforço e complementação; uso de laboratório de
informática; softwares especiais; treinamento centralizado e aperfeiçoamento de pessoal
docente e técnico; enfoque nos aspectos culturais relacionados aos idiomas.

4.2. Os Alunos
Os alunos da instituição apresentam faixas etárias variadas, ou seja, a escola atende
adultos, adolescentes, crianças, pessoas que buscam cursos no exterior, inglês para
profissionais, atendimento a empresas (testes de diagnóstico, departamento de traduções,
consultoria de negócios, cursos In Company), além dos Exames e Certificados, cursos In
school e assessoria pedagógica.

4.3. A Gestão de Pessoas


A Gestão de Pessoas traduz-se em esforços direcionados às práticas de Recursos
Humanos, as quais são refletidas nas expectativas de bem-estar e satisfação dos funcionários.

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O processo de Recrutamento e Seleção é feito de acordo com o nível de educação e
formação dos candidatos. Em geral, os profissionais que se candidatam às oportunidades em
aberto possuem formação em diversas áreas; dá-se preferência aos candidatos com formação
em Letras, que possuem Certificados Internacionais e experiência anterior em escolas
congêneres. Prioriza-se o Recrutamento Interno para as funções de Assistente de Coordenação,
Coordenação, Gerente e Diretoria. O Recrutamento Externo é utilizado na contratação de
professores e funções administrativas/operacionais. A seleção é feita através da triagem
preliminar de currículos, a seguir, os candidatos selecionados passam por exames escritos,
dinâmicas de grupo, momento onde o candidato mostra suas habilidades e o ajuste à
metodologia. O programa de estagiárias aplica-se à área de recepção, em parceria com o Centro
de Integração Escola-Empresa (CIEE).
São realizados treinamentos, que acontecem em JAN/FEV/JUL/AGO, para novos
professores e alguns treinamentos emergenciais, sempre que houver necessidade. Os
professores efetivos participam também de Palestras e Workshops e treinamentos internos. As
funções administrativas passam por treinamentos iniciais e de como abordar novos produtos. E
pelo menos duas vezes por ano realizam treinamentos técnicos/operacionais e atitudinais.
Quanto às relações de trabalho, os colaboradores trabalham de acordo com a
Consolidação das Leis de Trabalho (CLT). Para os colaboradores que exercem a função de
docente, existe um contrato de trabalho de aproximadamente 10 a 15 horas semanais, com
dissídio salarial em março. Demais colaboradores trabalham tanto em regime integral quanto
meio-período. Existem as duas possibilidades.
A empresa oferece os benefícios legais, tais como o convênio médico, transporte, vale-
refeição, seguro de vida. Existe uma organização terceirizada que presta serviços visando suprir
as ações de ênfase biológica, ou seja, é uma empresa que se propõe a intermediar o
relacionamento com a empresa de seguros e convênio médico e, ainda, oferece campanhas de
apoio à QVT, como as campanhas anti-tabagismo, anti-drogas, alcoolismo, importância de
exercícios físicos, terapias alternativas...
A Administração de Salários segue a Política de Cargos e Salários da empresa, que é
transparente ao funcionário. Como mencionado anteriormente, existem negociações sindicais,
onde algumas diretrizes são definidas. Os funcionários são avaliados quanto ao nível
educacional, tempo de empresa, busca de qualificação e vai galgando diferentes níveis no plano
de carreira.
Aos colaboradores que possuem filhos, existe um atendimento em creche, berçário,
escola, etc. Há uma creche a disposição de funcionárias e eventualmente um auxílio creche.
São fornecidas cestas básicas aos cargos administrativos/operacionais.
A instituição financia projetos educacionais (faculdade, idiomas, cursos técnicos, cursos
profissionalizantes, etc) entre 20 e 25 %, aplicável a qualquer funcionário.
A Avaliação de Desempenho é feita através de uma avaliação semestral onde os
coordenadores assistem aulas, e em reuniões individuais fornecem feedback sobre necessidades
de melhorias de atuação. Observações são feitas tanto quanto a aspectos positivos quanto a
aspectos que devem ser melhorados e metas para o período seguinte.
Existe também uma avaliação anual que é feita com cada professor e está alinhada ao
número de número de alunos que cada professor teve matriculado, número de alunos
aprovados, quantos dão continuidade a seus cursos, assim como a quantidade de cursos feitos
pelo professor, interesse e colaboração para com a organização. A cada avaliação é necessário
que o professor apresente um novo certificado. Essa avaliação mede o quanto, os professores
estão envolvidos nos cursos, através de registros de freqüências nos cursos e workshops. É
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importante para a avaliação a quantidade de cursos ministrados por um professor, dentre a
variedade de produtos e serviços que a escola oferece. A colaboração do professor é um item
que recebe atenção na avaliação anual, ou seja: o professor está aberto? Disponível? Quantas
substituições o professor pode fazer? Como atender alunos com dificuldades (orientações
individuais, participações em reuniões, workshops, etc)?
Ainda, a cada 2 anos, existe uma avaliação para promoção. Significa que a cada dois anos
receberão bônus (que passa a integrar o salário) por tempo de empresa. Nos últimos dois anos o
turn over caiu drasticamente. De forma geral nunca passou de 15% ao ano.
O Marketing Interno é feito através de uma publicação voltada aos alunos e
funcionários. É distribuída através de todas as unidades da escola e também veiculada pela
Internet. Contém informações sobre a comunidade na qual a instituição pertence.
Quanto à Gestão do Clima Organizacional prioriza-se uma atmosfera de trabalho
agradável através de um canal aberto com os coordenadores. A atmosfera não é competitiva,
atestando-se a isso o espírito de colaboração e companheirismo entre professores e funcionários.
Além disso, existe uma assessoria que faz a ponte entre as atividades pedagógicas e
administrativas.
A escola preocupa-se em tornar os funcionários cada vez melhores, possibilitando a
carreira na organização. Os profissionais mais destacados de seus quadros são valorizados, tendo
a oportunidade de integrarem os quadros societários e de ocuparem funções executivas de caráter
pedagógico ou administrativo.
Existe ainda, a participação em comitês visando: qualificar professores através de
cursos e desenvolver o idioma, ambos supervisionados pela Universidade de Cambridge; busca
de certificação; fornecer certificação como Certificate for Overseas Teachers of English
(COTE)/Certificate in English Language Teaching to Adults (CELTA) através de tutores
certificados por Cambridge.
O lado social tem parceria com Projeto Aprendiz que consiste em levar alunos e pessoas
em geral para conhecer o projeto. A empresa caminha em direção a projetos que viabilizem a
alfabetização de Adultos em parceria com o CIEE, além da retomada de contrato de estagiários
para as funções administrativas.

5. Discussão dos Resultados


Observa-se que ao mencionar QVT, a organização aponta ações de caráter biológico,
dando ênfase a programas relacionados à saúde. Porém, ao considerar o mercado em que a
instituição está inserida, e dessa forma compará-la com escolas de atuação similar, é possível
verificar a existência de indicadores de QVT em diversos aspectos da empresa.
As práticas apresentadas em Recrutamento e Seleção, seguem as bases utilizadas pelas
grandes empresas, integrando-se à estratégia de negócios da empresa. Ao recorrer a uma grande
quantidade de instrumentos para preenchimento de vagas, a escola demonstra busca da qualidade
e maior precisão ao processo. O oposto ocorre com o Treinamento, que visa, principalmente, o
desenvolvimento de habilidades específicas, enfatizando necessidades presentes na estratégia do
negócio. Segundo Éboli, 2002, “é fundamental que as práticas de Treinamento e
Desenvolvimento e de educação corporativa favoreçam uma atuação profissional impregnada de
personalidade, criando condições para o desenvolvimento do conhecimento criador, do
empreendedorismo e o florescimento de líderes eficientes.”
Para um curso de inglês, a CLT, como regime de trabalho, é considerada um indicador
que reflete positivamente na QVT dos funcionários, pois esta representa a segurança que os
profissionais não encontram em outras instituições. Verifica-se nos dias de hoje um grande

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número de cursos livres que contrata seus profissionais como autônomos (Andrade, 1993). De
acordo com Nogueira, 2002, essa “nova realidade, sintetizada na figura do trabalhador hifenizado
(trabalho-parcial, trabalho-temporário, trabalho-casual, trabalho-por-conta-própria, trabalho-em-
casa etc.), vem acompanhada , em geral, da precarização e degradação das condições de trabalho
e renda.”
A avaliação de desempenho contínua e a política de remuneração definida permitem que
as pessoas cresçam dentro da empresa. Essa busca em reter os profissionais é fundamental, dado
o turn over, de aproximadamente 15% ao ano, que apesar de alto, ainda é relativamente razoável
no universo das escolas de idiomas. De acordo com Allen, 2002, estudos recentes indicam que
condições de trabalho inadequadas contribuem mais para elevar a taxa de turn over na profissão
de professor que uma baixa remuneração. Por outro lado, a QVT dos profissionais dessa escola
poderia ser melhorada com uma política de avaliação mais qualitativa do que quantitativa,
permitindo que os colaboradores sejam reconhecidos muito mais pela qualidade do trabalho
desenvolvido do que os resultados quantitativos. Talvez, recebendo um reconhecimento
antecipado, é mais fácil reter as pessoas e dessa forma diminuir o turn over. Além disso, a
exigência da instituição quanto à apresentação de um novo certificado a cada avaliação semestral,
mostra-se um pouco rigorosa, pois dada a caracterização internacional dos órgãos expedidores
dos certificados1, seu custo é muito alto, mesmo a empresa arcando com 25% do valor total.
A busca do bem estar do colaborador faz-se presente com o auxílio que é dado aos
dependentes desses profissionais. Mais do que isso, a preocupação em estabelecer a harmonia
no ambiente, através da transparência de informações faz com que os funcionários sintam
orgulho em trabalhar na instituição e dessa forma contribui de modo fundamental para o bom
andamento das atividades.

6. Conclusões
É possível destacar que o grande crescimento dos cursos de inglês deve-se a redução da
carga didática presente na formação básica brasileira.
A proliferação dos cursos de idiomas é decorrente da dominação do sistema capitalista,
que possibilita a abertura de diversos cursos livres sem nenhuma orientação e vigilância,
permitindo que a profissão de professor de inglês torne-se marginalizada, dando-se muito mais
ênfase às metodologias apresentadas do que aos profissionais propriamente ditos. O volume de
negócios que possibilita a outros setores relacionados, como editoras, é de grande relevância.
Com isso, as questões relativas à QVT ficam em segundo plano, é prioritário dar
destaque aos clientes (alunos) enquanto os professores de inglês tornam-se meramente o
chamariz em suas ações de marketing.
Ao mesmo tempo em que é possível identificar aspectos positivos de QVT no caso
estudado, fica a questão levantada por Goulart e Sampaio, 1999, onde destacam que é difícil
definir o que realmente deve constituir um programa de qualidade de vida no trabalho, pois
tudo o que foi descrito e analisado não faz parte exatamente de um “programa”, mas dado o
contexto organizacional e comparações com o mercado, os aspectos mencionados impactam
decisivamente na QVT.
Ainda existe muito espaço para pesquisas futuras relacionadas à Gestão de Pessoas em
instituições de ensino. Um detalhamento interessante seria pesquisar o ponto de vista dos
professores, enquanto colaboradores dos cursos de idiomas, verificando se as ações fornecidas
estão de acordo com as expectativas. Outra possibilidade seria analisar outras escolas de idiomas

1
US$ 110,00 para o Exame TOEFL (www.toefl.org)

11
de modo que possa ser feita uma comparação entre todas e, dessa forma, chegar à conclusões
importantes para o desenvolvimento dessas organizações.

7. Bibliografia
ANDRADE, M. M. T. Inovacao em uma rede de franchising:estudo do caso yazigi. 1993. 198 f.
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