TERMO DE APROVAÇÃO
Orientadora
Profa. Dra. Marilene Calderaro da Silva Munguba
Artigo Científico apresentado como requisito para obtenção do título de Especialista, tendo
sido aprovado pela Banca Examinadora composta pelos professores:
Banca Examinadora:
_________________________________________
Prof. Ms. Marcos Paulo Miranda Leão
(Co-orientador)
_________________________________________
Prof. Ms. Gabriel Nunes Lopes Ferreira
_________________________________________
Prof. MT. Dorilene Mendes de Morais Farias
FORTALEZA-CE
2016
GAME “TOC TUM” PARA A MEDIAÇÃO DA EXPRESSÃO CRIATIVA MUSICAL:
UM ESTUDO MUSICOTERÁPICO COM CRIANÇAS SURDAS
RESUMO: O game musical “Toc Tum” foi desenvolvido na Universidade de Fortaleza com
a finalidade de mediar a aprendizagem da teoria musical por crianças surdas a partir de um
aporte terapêutico ocupacional. Este artigo apresenta a continuidade de uma pesquisa com
crianças surdas, em que tiveram experiência com o game musical “Toc Tum”. Este trabalho
aplicou atividades de musicoterapia para proporcionar uma vivência musical mais rica, e uma
apreciação sensorial mais ampla. Objetivou-se analisar o uso complementar do game “Toc
Tum” e de atividades musicoterápicas para mediação da expressão criativa musical da criança
surda. Trata-se de uma pesquisa intervencionista, longitudinal com abordagens qualitativa e
quantitativa. As atividades foram aplicadas em 8 crianças de 8 a 13 anos. Foi realizada no
período de outubro a novembro de 2015 na escola bilíngue especializada em educação para
surdos Filippo Smaldone, em Fortaleza, Ceará. Aplicou-se observação direta das atividades, a
ficha musicoterápica e diário de campo na coleta de informações. Identificou-se que apesar de
75% (n=6) não fazer uso de prótese auditiva, todas relataram vivência musical prévia, 62%
(n=5) fizeram menção ao game e 87% (n=7) disseram gostar de criar sons. A flauta e o
tambor, inclusos no game, foram os instrumentos referidos com maior exploração prévia, 36%
(n=4) e 46% (n=5), respectivamente. Percebeu-se uma relação direta entre o conhecimento
musical agregado pelo game e a aplicação das atividades musicoterápicas, onde este pode ser
uma ferramenta adicional ao trabalho do musicoterapeuta.
1
Graduado em Terapia Ocupacional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR); aluno do Curso de
Pós-Graduação em Musicoterapia da Faculdade Padre Dourado (FACPED) e aluno do Curso de
Graduação em Licenciatura em Música da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
bragapbdea@gmail.com
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INTRODUÇÃO
Dessa forma, o game foi aplicado em um grupo de crianças surdas, onde foram
desenvolvidas em um segundo momento, estratégias musicoterápicas que permitam um
estreitamento com o conteúdo musical, bem como despertar da criação musical e
improvisação.
O estudo tem como objetivo geral analisar o uso do game Toc Tum e de
atividades musicoterápicas para mediação da expressão criativa musical da criança surda.
Como objetivos específicos, avaliar o game Toc Tum como ferramenta de mediação da
compreensão da música pelas crianças surdas; aplicar estratégias analógicas musicoterápicas
para o desenvolvimento da expressão criativa musical da criança surda; conhecer a percepção
das crianças surdas sobre o uso complementar do game Toc Tum e as atividades analógicas
musicoterápicas na mediação da sua expressão criativa musical.
REFERENCIAL TEÓRICO
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identidade (GÓES, 2000). Essa identidade, para a criança surda filha de ouvintes está
dificultada, pois a mesma não está inserida diretamente em sua cultura, mas na cultura do
ouvinte. Dizeu e Caporali (2005) citam que a língua de sinais é a língua natural dos surdos,
pois a criança adquire de forma espontânea sem que seja preciso treinamento específico.
Nesta perspectiva, a cultura lúdica deve ser considerada, que Brougère (2003;
1998) ressalta ser compreendida quando um conjunto das regras de jogo disponíveis para os
participantes numa determinada sociedade compõe a cultura lúdica dessa sociedade e as
regras que um indivíduo conhece compõem sua própria cultura lúdica.
Caparica (2007) apud Rabassi e Calsa (2009) fala que o ritmo está presente na
vida humana desde a fecundação nos batimentos cardíacos, onde o corpo humano é
naturalmente sonoro e rítmico e, por conta disso, sua capacidade de captar ritmos é uma
referência sempre presente para a divisão regular do tempo.
Assim, a música é vivenciada pela criança até seu nascimento quando é cantado
músicas para dormir, como cantigas de ninar, desenvolvendo uma identidade sonora. Galeffi
(2009) apud Zanini (2013), afirma que essa identidade é uma percepção memorial, que faz
parte do acervo existencial do homem, onde todos os seres humanos possuem memória
auditiva em graus mais ou menos acentuados ou minuciosos.
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música. Como resultado, observou que em pessoas surdas, o córtex auditivo era ativado.
Segundo Miranda (2010) essas descobertas sugerem que a percepção das vibrações musicais
pelos surdos é equivalente as percepções sonoras pelos ouvintes por serem processados na
mesma região do cérebro. "As descobertas sugerem que a experiência que os surdos têm
quando „sentem‟ a música é similar à experiência de ouvir música para outras pessoas sem
essa condição” (CAS RJ, 2013, p. 1).
Dessa forma, Haguiara-Cervellini (2003, p.12) fala que “[...] a criança surda,
independentemente de seu grau de perda auditiva, é sensível à música, gosta dela e deseja-a,
manifestando-se, tocando, dançando e cantando espontaneamente”.
Paul Nordoff e Clive Robbins relatam que as essências musicais, muitas vezes
bloqueadas pela deficiência da criança, ganha corpo musical e se torna música. Assim, eles
desenvolveram uma abordagem, que consideram sua prática musicoterápica como
musicoterapia criativa, onde ela opera no aqui e no agora, ou seja, no estar “na música”, onde
musicalidade e humanidade seguem integradas (PIAZZETA, 2010).
Cada vez mais pesquisadores e professores têm procurado refletir sobre as práticas
desenvolvidas nos diversos espaços educacionais, buscando ver, por meio da
pluralidade de interesses dos vários sujeitos e de suas diferentes formas de interagir,
modos de construção de conhecimentos e constituição da intersubjetividade, para
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melhor compreender a riqueza do funcionamento humano e as dinâmicas que
ocorrem nesse contexto (LACERDA, 2000, p.70).
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METODOLOGIA
Tipo de estudo
Local e período
Sujeitos da pesquisa
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Participaram do projeto oito crianças surdas de oito a dez anos, por caracterizar
uma idade hábil e propensa a aprendizagem, de todos os gêneros, com interesse em vivenciar
a música. O estudo contemplou crianças protetizadas ou não, com grau de surdez de leve a
profunda, constituindo-se as mesmas crianças que vivenciaram o game Toc Tum. Como
critério de exclusão, não participaram crianças com surdo-cegueira ou outra deficiência
associada.
Preceitos éticos
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para identificação das crianças, foi utilizado as primeiras letras do alfabeto para
facilitar a compreensão: A, B, C, D, E, F, G, H.
Mediante uma visita a escola, no primeiro encontro, foi acordado junto com os
supervisores para que pudéssemos aplicar as atividades musicoterápicas com as mesmas
crianças que vivenciaram o game Toc Tum. Mediante esse contato, pode-se perceber a
abertura da escola em relação as atividades com música, bem como o aparato musical que nos
foi apresentado.
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...perante a um surdo, o musicoterapeuta se encontra diante de um grande desafio – a
ausência do sistema auditivo – entretanto é preciso entender que eles possuem outros
sistemas capazes de perceber o som. São eles: o sistema de percepção interna, o
sistema tátil e o sistema visual (BENENZON, 2011 apud RODRIGUES, 2015, p.
11)
11
Violão em
Casa
25%
Vivência
musical prévia
0%
Violão
9%
Bateria
9%
Tambor
46%
Flauta
36%
Quanto a criação de sons ou barulhos, todos referiram criar, onde um deles (H) não
gosta.
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O quarto encontro foi dedicado a exploração sonora. Dispomos os instrumentos no
chão (tambor, pandeirola, baquetas, pandeiro, afoxé, coco, sino, flauta doce, agogô, violão) e
conforme eles iam chegando, deixamos bem a vontade para que pudessem explorar conforme
o gosto e interesse.
Na exploração livre dos instrumentos, foi percebido de perto o quanto elas eram ou
estavam tolerantes aos sons, quais elas demonstravam mais ou menos interesse, bem como
observar que tipo de som elas faziam. Deixamos a vontade para que eles pegassem qualquer
um e fossem experimentando. Inicialmente todos foram pegando o primeiro instrumento que
viam e demonstraram bastante interesse. Aos poucos cada um foi experimentando conforme
sua preferência, (A, B, H) lembraram da flauta que foi usada no game. (G) despertou grande
interesse pelo pandeiro, onde (C e H) também quiseram compartilhar e trocaram experiências.
(A e C) pegaram a pandeirola, onde depois (A) foi para flauta. (F) insistiu na flauta onde
cantarolava ao invés de soprar. (B) pegou o tambor e as baquetas e se afastou do grupo
afirmando que o barulho principalmente da pandeirola estava lhe incomodando. (G) explorou
pouco o sino e logo após pediu para tocar o violão onde não queria mais soltar e relatou sentir
a vibração, logo após a (C) pediu para tocar. (E) não despertou interesse por nada e não quis
participar, apresentando-se no dia bem diferente dos dias anteriores, quando foi apresentado o
game. A fig. 3 apresenta os instrumentos explorados.
Afoxé Sino
9% 9%
Violão
9%
Tambor
18%
Pandeiro
19%
Flauta
18%
Pandeirola
18%
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Segundo Rodrigues (2015) o som pode ser sentido através de vibrações, portanto,
o surdo pode compreender as intenções musicais pelas vibrações sentidas no seu corpo.
Percebe-se que as crianças puderam escolher o instrumento conforme fosse sentido pela
mesma. Pode-se observar também que alguns sons podem incomodá-los, como no caso de
(B), o som estava tão forte que o incomodou.
No quinto encontro foi realizado uma atividade com tambores e baquetas, onde
iniciou com atividade de imitação, ou seja, eles deviam imitar a quantidade de vezes que seria
tocado no tambor, proporcionando a abertura para que cada um tivesse a sua vez criasse a
batida a ser imitada pelo resto do grupo.
No sexto encontro foi realizado uma brincadeira em círculo de passar a bola, onde
a bola deveria ser passada para o colega a partir do toque de um tambor grande e uma
pandeirola, definido antes do início. Inicialmente o som foi produzido no meio da roda para
que eles pudessem ver e posteriormente foi feito de forma que eles não pudessem ver.
O toque no tambor foi ritmado, onde o pulso se manteve sempre igual. Variando a
complexidade, o pulso alternou entre o toque do tambor e o toque da pandeirola, onde eles só
deveriam passar a bola quando fosse tocado o instrumento. A velocidade ia aumentando ou
diminuindo conforme fosse necessário. Por fim ouve uma tentativa de bater longe da vista das
crianças, portanto sai da roda para fazer fora. No início alguns permaneceram bastante
interessados e a atividade caminhou bem, porém (E e G) demonstraram desinteresse e
participaram a contragosto porque estavam fazendo atividade de educação física e queriam
ficar lá. A professora de educação física também participou desse momento junto com outro
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aluno porque todos os alunos dela estavam participando da nossa atividade. (F) estava mais
interessado e participativo. Quando foi realizado o toque no tambor sem que eles pudessem
ver, (A, C, E, H) não perceberam o som de imediato, onde (A e E) justificaram estar sem o
aparelho.
1 Autoconfiança
0 Responsabilidade
29/out 05/nov 12/nov 19/nov 26/nov
O item concentração foi o que se mais negativo em relação aos outros. Fig. 5
apresenta a evolução das habilidades.
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Figura 5: Evolução das habilidades
8
7
6
Ritmo
5
Memória
4
Atenção
3
Concentração
2
Percepção
1
0
29/out 05/nov 12/nov 19/nov 26/nov
É de grande relevância esclarecer que nos dias de aplicação das atividades foram
encontrados alguns obstáculos referentes aos horários. Foi necessário modificar algumas
vezes o dia e mesmo com o apoio da escola, conseguimos apenas o horário ao qual as crianças
já tinham atividade de educação física. Portanto, atribui-se o declínio repentino dos resultados
ao fato, exposto pelas próprias crianças, de que preferiam estar na aula de educação física.
Estes resultados demonstram também que é possível envolver o universo musical na cultura
surda, embora para muitos seja algo novo e que precise de um pouco mais de atenção e
cuidado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante as vivências aplicadas, constatou-se que o game Toc Tum tem grande
valia para abordar os conceitos iniciais de música bem como relacionadas as atividades de
musicoterapia, afim de reforçar e favorecer ainda mais a aplicação de técnicas específicas
musicoterápicas.
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acontecendo no mesmo momento. Isso interferiu negativamente devido a visualidade do surdo
que leva ao aumento a acuidade e apreensão visual do mundo.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAUER, M. W.; GASKELL, G. (Orgs.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som:
um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 12. ed. Petrópolis, Rj: Vozes, 2014.
BROUGÈRE, G. Jogo e educação. Tradução Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artes
Médicas, 2003.
BROUGÈRE, G. A criança e a cultura lúdica. Rev. Fac. Educ., São Paulo, v. 24, n. 2, p.113-
116, jul. 1998.
17
GÓES, M. C. R. Com quem as crianças surdas dialogam em sinais?. In: LACERDA, C. B. F.:
GÓES, M. C. R. (Org.) Surdez: processos educativos e subjetividade. São Paulo: LOVISE,
2000. p.34-46.
GUIMARÃES, P. R. B. Métodos quantitativos estatísticos. Curitiba: IESDE Brasil, 2008.
245p.
18
de Estudos Sociais Aplicados Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense,
Niterói, 2006. Disponível em:
http://www.uff.br/var/www/htdocs/pos_educacao/joomla/images/stories/Teses/nharyd2006.pd
f. Acesso em: 26 jun. 2015.
19
SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Tradução Laura Teixeira
Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
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APÊNDICE A
FICHA DE AVALIAÇÃO
(adaptação da ficha musicoterápica)
Dados Pessoais
Nome: Idade:
Escolaridade:
Naturalidade:
Grau de surdez: Faz uso de prótese: Sim ( ) Não ( )
Área Musical
1 - Você já ouviu música antes?
Sim ( ) Não ( )
Se sim, como você ouviu música?
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APÊNDICE B
Data da observação: / /
Atividade musicoterápica:
Atitude 1 2 3 4 5
Empatia
Interesse
Tolerância
Cooperação
Autoconfiança
Responsabilidade
Habilidade 1 2 3 4 5
Ritmo
Memória
Atenção
Concentração
Percepção
Comentários:
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