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O texto de Bakhtin propõe o estudo dos enunciados, unidades concretas utilizadas pelos

falantes para a expressão oral ou escrita. Estes enunciados podem ser classificados de acordo
com a esfera de utilização da língua, cada esfera possui tipos relativamente estáveis de
enunciados, que podem ser caracterizados como gêneros do discurso. Há inúmeros gêneros
possíveis, Bakhtin preocupa-se com a classificação geral entre gêneros primários (simples),
caracterizados por uma relação direta entre a realidade e os enunciados e os gêneros
secundários, que aparecem em circunstâncias de uma comunicação mais elaborada e
absorvem e transmutam, durante seu processo de composição, os gêneros primários.

Bakhtin critica todo estudo sobre estética que ignora a importância dos gêneros do discurso e
da noção de enunciado para realizar sua análise. Ignorar a noção de enunciado significa ignorar
fatores de primeira importância para a compreensão real das expressões linguísticas,
principalmente o papel do outro na comunicação e a adequação do discurso ao gênero
utilizado na comunicação.

O papel do outro é de fundamental importância na constituição do enunciado. Segundo


Bakhtin, todo enunciado provoca uma resposta ativa por parte do interlocutor (que pode ser a
compreensão, a réplica, a execução de uma ordem etc.), diferenciando-se esta da visão
tradicional adotada pelos linguistas, que consideram o emissor com função puramente ativa e
o receptor com função puramente passiva. O enunciado é caracterizado por seus limites,
determinados de acordo com a alternância entre os enunciados durante o processo de
comunicação verbal. Essa alternância também destaca a importância do outro na constituição
do enunciado, a própria consciência que o locutor possui em relação ao receptor (ou possíveis
receptores) do enunciado determina a forma e a seleção do gênero do discurso.

A comunicação verbal só pode então ser corretamente estudada através da análise dos
enunciados. Uma simples análise de palavras ou orações desprovidas de seu contexto (gênero
de discurso a qual pertencem, intenção do autor, relação do emissor com o receptor)
corresponde a uma interpretação falsa, baseada em um sistema de comunicação que não
corresponde à realidade. A análise estilística deveria então levar em consideração todos estes
aspectos envolvidos na produção dos enunciados concretos, e não considerar simplesmente o
objeto do discurso e os recursos linguísticos empregados pelo autor.

Todas as palavras e orações são consideradas como naturalmente desprovidas de sentido


unívoco e expressividade. Somente quando utilizadas num enunciado elas adquirem estas
características, sendo que este sentido varia de acordo com o autor e com o gênero de
discurso empregado. As pessoas têm contato com as palavras e orações através de
enunciados (orais e escritos) concretos, assimilando o sentido e forma de utilização de acordo
com cada gênero. Durante a comunicação, além da utilização inconsciente do sistema
gramatical, também é operada uma seleção do gênero adequado para aquela comunicação.

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