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Golpe na Costa do Marfim

Pio Penna Filho*

Mais um país africano está passando pelo teste da democracia e as


perspectivas não são das melhores. O resultado das eleições na Costa do Marfim
indicaram a vitória de um dos setores da oposição, liderado por Alassane Ouattara. O
atual presidente, Laurent Gbagbo, é rival antigo de Ouattara e não quer aceitar o
resultado das eleições. Aliás, por influência direta de Gbagbo e em comunicado
oficial, o presidente do Conselho Constitucional do país, Paul Yao N’dré, já declarou
que o pleito foi oficialmente considerado inválido.
A Costa do Marfim é um ex-colônia francesa que obteve a independência em
1960, no contexto do processo de descolonização. Se destacou durante a maior parte
de sua existência como país soberano pela estabilidade política e relativo sucesso
econômico no difícil cenário africano.
No plano regional tinha uma das economias mais dinâmicas e era candidato a
líder, rivalizando com a outra potência regional, a Nigéria. Ambos participam de um
bloco econômico, a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental
(ECOWAS, em inglês).
A economia da Costa do Marfim segue o padrão geral dos Estados africanos,
ou seja, é predominantemente primário-exportadora, com grande concentração nas
atividades agrícolas, setor que emprega em torno de 60 a 70% da mão de obra do país.
Dentre os seus produtos de exportação destacam-se cacau, café, borracha, milho,
arroz e frutas tropicais. Também possui petróleo e ouro. Em termos de indústria, esta
é ainda incipiente e com pouca diversificação, com ênfase na indústria alimentícia e
têxtil.
Desde o Golpe de Estado ocorrido em 1999, o quadro politico do país se
complicou. A partir daí grupos políticos lutaram violentamente pelo controle do
Estado e não conseguiram estabelecer um modus vivendi democrático e baseado no
diálogo. Registre-se que o processo foi extremamente violento, levando à morte
milhares de pessoas e deixando um país dividido entre o norte e o sul.

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Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e
Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com
Outra consequência da instabilidade política que se seguiu ao Golpe de 1999
foi a intervenção estrangeira, uma vez que capacetes azuis das Nações Unidas e tropas
francesas foram enviadas à Costa do Marfim, as quais até hoje permanecem no país.
A crise política e o clima de guerra civil teve um importante impacto
negativo na economia marfinense, fragilizando ainda mais a sua precária condição
econômica. Mesmo com a retomada das atividades econômicas nos últimos anos, o
crescimento tem sido modesto. Em 2008 o crescimento do PIB foi de apenas 2,3%,
uma taxa baixa para o padrão de crescimento africano verificado na última década.
A atual crise, que pode levar a uma nova guerra civil, é um complicador a
mais para a Costa do Marfim. Se o atual presidente insistir em desrespeitar a
constituição e levar adiante o seu Golpe de Estado, ele certamente será o principal
responsável pela catástrofe que provavelmente virá. O Golpe não é ruim apenas para a
Costa do Marfim, uma vez que ajuda a arranhar a imagem de um continente inteiro
que luta justamente para demonstrar ao mundo que está mudando e tem um
compromisso com a democracia.

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