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O Tibete e a China

Pio Penna Filho*

O Tibete é hoje uma província chinesa. A recente ocupação do território pelos


chineses ocorreu no início da década de 1950, sob o regime revolucionário de Mao Tsé
Tung. Mas a cobiça chinesa sobre o território conhecido como o “teto do mundo” (por suas
elevadas altitudes) remonta a um período histórico bem anterior, ainda no século XVII,
quando os chineses da dinastia Ming incorporaram o Tibete ao seu império. Desde então há
resistências contra a presença chinesa na região.
Um dos aspectos mais importantes a se destacar no atual estágio da ocupação chinesa
é a pressão internacional que o regime de Beijing (Pequim) vem recebendo, com acirradas
críticas que colocam em questão a legitimidade da ocupação chinesa. No fundo, esta é vista
como uma usurpação do direito dos tibetanos à autodeterminação.
Em parte isso é resultado do nacionalismo tibetano, que soube sensibilizar a opinião
pública mundial contra a agressão do governo chinês. Nesse sentido, a figura do Dalai
Lama (líder religioso e político do Tibete) assumiu uma enorme importância para a
campanha internacional contra a dominação chinesa do Estado tibetano, de tradições
milenares assentadas em bases religiosas. Vale lembrar que o Estado chinês é, por
definição, ateísta (embora na prática isso não queira dizer que os chineses sejam ateus).
Na perspectiva da geopolítica chinesa sua ocupação do Tibete é legítima e não há o
que se discutir sobre a vinculação daquela região ao seu território. Aliás, os chineses
alegam que libertaram os tibetanos de práticas feudais praticadas pelo Estado teocrático que
existia no Tibete antes de sua anexação. Além disso, ao longo de várias décadas os chineses
promoveram políticas de migração direcionadas para o território tibetano e transformaram o
panorama demográfico do território. Hoje em dia, por exemplo, em Lhasa, capital do
Tibete, cerca de 75% da população é de origem chinesa. Ou seja, menos de 25% dos seus
habitantes são de fato tibetanos. Naturalmente que aspectos como esse têm uma implicação
política importante.

*
Professor da UFMT, Doutor em História das Relações Internacionais pela UnB e Pesquisador do
CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com
Para a ocupação do Tibete os aspectos econômicos não são tão importantes. Trata-se
de um caso bem diferente, por exemplo, do Iraque, cobiçado pelo seu petróleo. No Tibete, a
riqueza mais importante é o seu patrimônio religioso e cultural, verdadeiro patrimônio da
humanidade. Nesse sentido, as ações do governo chinês foram criminosas, sobretudo se
considerarmos a estimativa de que ao longo da sua dominação mais de um milhão de
tibetanos foram mortos e muito do seu patrimônio histórico foi destruído.
O fato de que os próximos jogos olímpicos ocorrerão na China se tornou num
poderoso elemento de propaganda para a causa dos nacionalistas tibetanos, uma vez que os
olhos do mundo inteiro se voltam para a China. Assim, há uma campanha internacional
intensa contra a dominação chinesa na região. Mas é possível que os chineses consigam
contornar essa pressão. O fato é que muito dificilmente, por mais legítima que seja a causa
dos tibetanos, o governo chinês se dobrará às pressões internacionais que advogam pela
soberania do território.

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