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Estudos NEAD 5
Hans P. Binswanger, Klaus Deininger e Gershon Feder
José Abrão
Secretário-Executivo
Sebastião Azevedo
Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
Edson Teófilo
Coordenador-Executivo do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural
Ficha Catalográfica
Ministério do Desenvolvimento Agrário
A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais / Ministério
do Desenvolvimento Agrário. Edson Teófilo (org.) et alii.
Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural / Conselho
Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável / Ministério do
Desenvolvimento Agrário, 2001.
440p.
Sumário
Apresentação
Raul Jungmann I
Notas Introdutórias
Edson Teófilo e Elvino Mendonça 7
Edição
Intertexto - Gestão da Informação, Estudos e Projetos
SCS Quadra 6 Bloco A
Edifício Presidente salas 305/307/309
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Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
Apresentação
A
s ciências sociais têm colocado a questão agrária como um elemento de
relativa centralidade em seu universo temático. O professor Manuel Cor
reia de Andrade nos lembra, por exemplo, que “o problema agrário foi
sempre um dos mais discutidos nos países subdesenvolvidos” (Agricultura &
Capitalismo, 1979, p. 31).
Isso é verdade, essa discussão existe, existiu e sempre foi muito acalorada.
Há um número relativamente grande de trabalhos que procuram entender a
dinâmica social e política da questão agrária, enquanto que, por outro lado,
vários são os estudos econômicos e agronômicos que têm se dedicado às
questões relacionadas à produção e ao comércio agropecuário e agroindustrial.
Mas não é só em número que esses estudos chamam a atenção, são obras
e autores que se destacam pela qualidade científica e em razão da influência
que tiveram na formação de mentalidades e também na orientação de ações
políticas. Somam-se ao clássico A questão agrária, do professor Caio Prado
Júnior, obras significativas, como O cativeiro da terra, de José de Souza Martins;
Quatro séculos de latifúndio, de Alberto Passos Guimarães; Coronelismo, enxada e
voto, do ministro Nunes Leal; A terra e o homem no Nordeste, de Manuel Correia de
Andrade; O que é questão agrária, de José Graziano da Silva; Gênese e desenvolvi-
mento do capitalismo no campo brasileiro, de Jacob Gorender; Reforma agrária, hoje,
de José Eli da Veiga.
Acadêmicos, pesquisadores e militantes como Maria Conceição D’Incao,
Zander Soares de Navarro, Luciana de Barros Jaccoud, Octavio Ianni, Ignacy
I
Hans P. Binswanger, Klaus Deininger e Gershon Feder
Sachs, Ivan Otero Ribeiro, Pompeu Acyoli Borges, Cândido Grzybowski, Carlos
Marighella, Leonilde Medeiros, Nelson Ribeiro, Moacir Palmeira, Juarez Brandão
Lopes, Ester Boserup, Dirceu Pessoa, José Gomes da Silva e dezenas de outros,
contribuíram sobremaneira para manter o tema da reforma agrária como ele-
mento vivo da modernidade e chave para o desenvolvimento do país.
Mas “a terra que está em causa não é uma só, homogênea. Ao contrário, é
diversa e múltipla. São diferentes formas sociais da terra, da organização das
atividades produtivas, reveladas pelas pendências e conflitos. Há núcleos
indígenas, caboclos, sitiantes, posseiros e outros que podem estar voltados
principalmente para o autoconsumo, a subsistência de seus membros. Ou-
tros ainda combinam a produção para o comércio de subsistência. Assim
como há aqueles que se dedicam totalmente à produção de mercadorias. E
são muitos os casos de produção bastante tecnificada, com base em máqui-
nas e equipamentos, fertilizantes e defensivos.” (Ianni, O.; Origens Agrárias
do Estado Brasileiro, 1984, p.181).
Essa diversidade social, econômica, geográfica, política e ecológica dá ao
tema uma dimensão e uma faceta especiais, que as várias disciplinas acadêmi-
cas têm procurado dar conta. Observa-se, porém, que o tema prevalece nas
áreas da sociologia (política e rural), geografia (econômica e humana), ciência
política, agronomia, antropologia e direito. Na economia destacam-se estudos
relacionados à história econômica e, com pouca recorrência, pesquisas no
campo de negócios e relações entre o campo e a indústria, a maioria dos estu-
dos econômicos recentes são dedicados a temas relacionados à produção e o
comércio de produtos.
A construção de novos paradigmas que orientem a ação humana em dire-
ção ao desenvolvimento sustentável e à superação da pobreza exige que não se
fixem, nem se ampliem, lacunas científicas no estudo das várias formas apre-
sentadas pela base agrária e rural do desenvolvimento dos países, essa mesma
condicionante nos apresenta o imperativo e se criar pontes sólidas de comuni-
cação e interação entre essas várias disciplinas, como já nos tem ensinado o
professor Ignacy Sachs.
Nesse sentido, é fundamental que os pesquisadores, estudiosos e
formuladores de políticas públicas tenham na ciência econômica uma aliada no
estudo e exame aprofundado das questões relacionadas ao desenvolvimento
agrário. A aridez de algumas formulações teóricas, especialmente da econometria,
podem contribuir, apesar de tudo, para a comprovação das evidências empíricas
dos fenômenos sociais, sem que isso signifique a redução da importância das
demais disciplinas.
Certamente este livro será uma importante contribuição para superar o hia-
to de poucos estudos econômicos que relacionam modelos de distribuição de
II
Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
Raul Jungmann
Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário
III
A Economia da
Reforma Agrária:
evidências internacionais
Notas Introdutórias
Edson Teófilo
Coordenador-Executivo do NEAD
Organizador do Seminário
1. Introdução
U
ma das características mais importantes que diferenciam os países
considerados desenvolvidos, daqueles que não alcançaram índices de
desenvolvimento econômico e humano compatíveis com suas
potencialidades, foi a de enfrentar as questões estruturais que inibiam ou
retardavam o próprio crescimento econômico. Uma das questões cruciais que
moldaram o desenvolvimento das nações mais ricas foi o enfrentamento da
questão agrária, no sentido de promover a justa distribuição da terra e fomentar
políticas de apoio a formas de agricultura de base familiar.
O caso do Brasil é um exemplo desse fenômeno de não enfrentamento
dessas questões. O Brasil optou por caminhos tortuosos que o levaram a uma
situação de inaceitável desigualdade social, que constitui, até os dias atuais, um
dos fatores inibidores de um processo longo de crescimento econômico. Por
isso, esse processo tem sido caracterizado como crescimento conservador. A
Edson Teófilo e Elvino de Carvalho Mendonça
1
Conforme Deininger e Squire, New Ways of Looking at Old Issues: Asset Inequality and Growth, World Bank papers, may25,
1998.
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
2
Conforme Birdsall, Nancy, Education: The People‘s Asset, apresentado no Seminário Internacional sobre Distribuição de
Ativos, Pobreza e Crescimento Econômico, Brasília, julho de 1998.
3
Stiglitz, Joseph, Distribution, Efficiency and Voice: Designing the Second Generation of Reforms , Seminário Internacional
sobre Distribuição da Riqueza, Pobreza e Crescimento Econômico, Brasília, julho de 1998.
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
e outro por meio das estâncias. No primeiro caso, a propriedade era cultivada
pelos arrendatários, enquanto que no caso das estâncias os colonos cultivavam
parte da fazenda para a sua própria subsistência, dedicando alguns dias de
trabalho gratuito à terra do latifundiário.
No entanto, quando os pequenos proprietários tinham acesso livre às
terras, os mesmos geralmente tinham mais incentivo em trabalhar por conta
própria que como assalariados. A única forma que restava para os senhorios se
apropriarem do trabalho dos camponeses ocorria por intermédio da criação de
distorções econômicas que tinham como objetivo, além gerar mão-de-obra para
os latifúndios, reduzir a competição da produção dos agricultores autônomos.
Quatro foram os mecanismos empregados: redução da terra disponível para
cultivo pelos camponeses; a imposição de tributação diferenciada; a restrição
de acesso ao mercado; e o confinamento dos bens e serviços agrícolas às
fazendas das classes dominantes.
Uma vez determinado o processo histórico da concentração da terra,
Binswanger et alii (1998) abordam o modo como algumas reformas agrárias foram
conduzidas no mundo. Segundo os autores, várias foram as tentativas, as
dificuldades e os fracassos. As reformas agrárias geralmente vieram
acompanhadas de uma série de eventos, entre eles, revoltas, como no caso da
Bolívia, revoluções, como em Cuba, e conquistas. Segundo Binswanger et alii
(1998), as reformas agrárias tiveram características bem distintas quando
realizadas em economias de mercado ou em economias socialistas.
As reformas agrárias na economia de mercado aconteceram com a
transferência de terras das propriedades do senhorio para as fazendas familiares
e com a transformação das estâncias em grandes fazendas comerciais. No
primeiro caso, a organização da produção permaneceu inalterada, tendo como
única diferença a transferência dos direitos de propriedades do latifúndio para
os colonos que já a cultivavam, ao passo que no segundo caso o desmembramento
deu origem à produção em grande escala, sendo administradas por trabalhadores
permanentes que recebiam uma casa e um quintal, bem como por trabalhadores
externos, contratados em base diária ou sazonal.
Em algumas economias de mercado, as estâncias foram convertidas
em sistemas comunais de fazendas familiares. Nesse caso, os beneficiários
ganhavam direito ao usufruto hereditário, muito embora as limitações sobre
a venda ou aluguel de terras com freqüência impedissem o uso da mesma
como colateral para o crédito. O exemplo mais característico desse caso foi
o sistema ejido no México.
Nas reformas ocorridas nas economias socialistas, as grandes
propriedades de terra foram convertidas em fazendas familiares, como foi
o caso da União Soviética e da China, a exemplo das economias de mercado.
Entretanto, as terras produtivas redistribuídas anos após a revolução se
consolidaram em unidades com gerência centralizada, nas quais a terra
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
terras aumenta, fazendo com que o número de vendedores seja menor do que o
número de compradores. De forma inversa, se as safras são ruins acontece o
oposto. Em ambos os casos, o mercado de venda de terras não se equilibra.
Nesse sentido, o risco moral, a covariância de rendas originadas das safras
e o valor de garantia da terra implicam na ausência de mercado de seguros e de
crédito perfeitos. Nesses ambientes, os mercados de venda de terras estão
aptos a se transformarem em meios para que os grandes proprietários acumulem
ainda mais terras.
Segundo Binswanger et alii (1998), os fracassos dos mercados de venda de
terras também podem ser intensificados com as distorções de políticas, de tal
forma que esses mercados não sejam capazes de distribuir a terra de maneira
ótima. As distorções podem acontecer por meio do resultado do aumento da
população e da crescente demanda urbana por terras, como também pela
instabilidade macroeconômica. Aspectos como subsídios ao crédito e isenção
de imposto de renda da receita agrícola também podem ser encarados como
fatores de distorção de política. Em todos esses casos, o resultado é a valorização
excessiva da terra, o que faz como que o mercado de venda seja incapaz de as
distribuir de forma ótima.
Na terceira e última parte, Binswanger et alii (1998) apresentam os
instrumentos necessários para uma política fundiária. Segundo os autores, vários
são os arranjos institucionais presentes nos mercados de terras. Pelo lado das
partes contratantes, as tentativas feitas são no sentido de superar os problemas
de informação assimétrica, risco moral e covariância de risco, enquanto que os
arranjos institucionais adotados pelo governo e pela comunidade são elaborados
com o intuito de produzir resultados que guardem mais coerência com os
objetivos de eqüidade que a eficiência.
Segundo Binswanger et alii (1998), existem seis instrumentos de política
fundiária: a titulação e o registro de terras; imposto territorial; regulações limitativas
das vendas de terras; a limitação da fragmentação das propriedades; restrições
aos aluguéis de terras e reforma agrária redistributiva.
A titularidade e o registro das terras é fundamental para o desenvolvimento
agrícola, uma vez que possibilita a redução das assimetrias de informação que
podem levar ao problema de “risco moral”4. A utilização da terra como garantia
na obtenção de financiamentos no mercado de crédito tem que estar associada
com os direitos de posse do tomador, em caso contrário, os empréstimos tornam-
se limitados, resultando em mercados de crédito menos eficientes.
No entanto, a participação do governo no processo de registro e
titulação tem, em geral, efeitos neutros sobre a eqüidade. Esse fato acontece
porque os indivíduos mais bem relacionados e com maior poder aquisitivo
podem lançar mão de suas vantagens de informação para reivindicar terras
sobre as quais outros indivíduos menos informados detenham direitos
4
Moral hazard
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
produção é mais elevada que no estado ruim. Entretanto, a cada estado está
associada uma probabilidade que, por sua vez, é resultado do nível de
esforço aplicado pelo colono.
Uma outra hipótese utilizada por Banerjee et alii (1998) é que as estratégias
adotadas pelos agentes independem da história, ou seja, os níveis de produção
anteriores associados com os colonos não afetam a decisão de escolha do
proprietário. Nesse sentido, os colonos são selecionados de forma aleatória.
Sendo assim, o contrato em cada período somente precisa especificar o
pagamento efetuado pelo proprietário de terra ao colono e as probabilidades de
permanecer no negócio em cada período.
Baseado nessas hipóteses, Banerjee et alii (1998) resolveram o modelo
para três situações específicas: uma primeira, onde a ação de despejo por parte
do proprietário de terra é impossível; uma segunda, onde a ação de despejo é
possível e uma terceira onde existe o incentivo aos investimentos e as ameaças
de despejo são possíveis.
Na situação onde a ameaça de despejo é impossível, Banerjee et alii
(1998), por meio da maximização do problema do proprietário de terra sujeito
as restrições de encargos limitada, de participação e de compatibilidade de
incentivos, encontraram três resultados: o primeiro mostra que no
compartilhamento de safra, o arrendatário recebe uma receita que é menor
que a produtividade marginal do seu esforço e, portanto, o nível de esforço
aplicado situa-se abaixo do nível ótimo social; no segundo, os autores
mostram que na ausência de ameaças de despejo e se a opção externa não
é suficientemente atraente de tal forma que torne a restrição de participação
do arrendatário ativa, esse terá incentivos em permanecer no arrendamento
e o terceiro apresenta que à medida que o valor da opção externa torna-se
atraente, e em virtude do proprietário sempre preferir o estado bom ao estado
ruim, um aumento no valor da opção externa faz com que o proprietário
aumente o salário de sucesso e esforço.
No segundo modelo apresentado por Banerjee et alii (1998), a hipótese
de impossibilidade de despejo é relaxada e, portanto, os autores modelam a
situação num modelo de diversos períodos. Nesse caso, Banerjee et alii
(1998) estipulam valor crítico para o valor da opção externa e em cima desse
fato eles fazem conjecturas.
Segundo os autores, a grande diferença dos resultados obtidos nesse
modelo em relação àquele que considera o despejo impossível é o fato de que
para valores de opção externa menores do que o valor crítico, ou seja, acima do
qual a restrição de participação é ativa, o nível de esforço é decrescente. Para
valores maiores do que esse valor crítico, as ameaças não são usadas.
Sendo assim, Banerjee et alii (1998) encontraram três resultados: o primeiro
resultado garante que para valores da opção externa muito pequenos, o poder
de barganha do proprietário de terra é maior que o do colono e, portanto, o
5
Este artigo deveria constar do volume Estudos NEAD 2, mas por um lapso foi excluído na paginação final.
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
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6
A variável reforma agrária cumulativa é um conceito que agrega o número de reformas agrárias ocorridas em um deter-
minado estado ao longo do tempo.
7
O critério utilizado pelos autores para classificar em alto e baixo número de reformas agrárias está associado ao número
ser maior ou menor que três reformas.
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Notas introdutórias
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É muito comum ver-se essa expressão em manifestações coloquiais (“rodar um programa”, “rodar uma regressão”) o que significa:
fazer o processamento eletrônico dos dados ou de um sistema. Essa expressão vêm do tempo em que o processamento desses dados
eram feitos em computadores de grande porte que usavam fitas magnéticas em rolo, que ao seu serem processadas ficavam rodando.
9
Essas variáveis foram utilizadas como proxy para as políticas públicas e para a política tributária, com exceção da taxa de
crescimento da população.
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As variáveis políticas refletem a fração de cadeiras dos diferentes grupos políticos no Legislativo.
11
Foram utilizados como instrumentos as variáveis políticas descritas.
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
uma vez que não sabiam como deveria ser alocada a terra, para quem, como
deveria ser a propriedade administrada e por quem.
Embora as organizações camponesas tenham sofrido rachaduras em todos
os processos de reforma agrária, esses movimentos levaram a progressos
incontestáveis nas questões agrárias. A organização e a mobilização dos camponeses
foi o ingrediente essencial de todas as reformas ocorridas na América Latina.
Outros atores fundamentais no processo de reforma agrária foram os
proprietários de terras, que contribuíram enormemente para os conflitos
existentes, em face da manutenção do direito à posse da terra. Da mesma forma
que as organizações camponesas, os grandes donos de terras também não
constituíam um grupo homogêneo, tendo cada qual uma reação distinta em
cada país da América Latina.
Segundo Barraclough (1998), as divergências entre os proprietários de
terras deram ensejo à heterogeneidade. As contradições eram reveladas pela
divisão interna que existia nas organizações e associações de grandes produtores,
como foi o caso do SNA no Chile. Além disso, a explosão de urbanização tornou
cada grupo de grandes latifundiários menos influente. Esses buscaram, como
alternativa, diversificar os seus negócios entre outros setores como: indústrias,
finanças e o comércio.
Todo esse processo de divergência entre os latifundiários favoreceu a
reforma agrária, uma vez que a heterogeneidade no comportamento desses
contribuiu para o aparecimento de novas oportunidades e para a realização de
reformas agrárias que vieram a beneficiar os trabalhadores rurais sem-terra.
Os partidos políticos foram atores atuantes no processo de reforma agrária
de quase todos os países da América Latina. De acordo com Barraclough (1998),
nos locais onde existia o pluripartidarismo a busca por votos dos camponeses
e trabalhadores rurais e de outros grupos que poderiam se beneficiar de uma
redistribuição de direitos da terra, fez com que se colocasse a reforma agrária na
agenda política. Esse foi o caso, especialmente, das reformas efetuadas em
Porto Rico, Venezuela e Chile. Em muitas situações, os partidos políticos, com
auxílio dos sindicatos de base urbana, promoviam as organizações de
trabalhadores rurais com objetivos políticos. As leis referentes à reforma agrária
foram promulgadas por legislaturas eleitas após o debate aberto, sendo um bom
exemplo disso o caso do Chile nos anos 1960 e início dos anos 1970.
Nos sistemas autoritários, por outro lado, existiam limitações com relação à
disputa aberta por apoio popular. Quando os partidos genuinamente de oposição
eram cassados, estes se mantinham atuando clandestinamente, o que funcionava
como uma forma de pressão ao sistema vigente. Entretanto, dentro de muitos
regimes militares havia facções que estavam sempre em disputa e buscavam o
apoio popular, o que levou, em grande parte dos casos, a instauração de reformas
agrárias radicais, como foi o caso do Peru em 1969 e El Salvador em 1979.
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A Economia da Reforma Agrária: evidências internacionais.
Notas introdutórias
3. Conclusão
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Poder,
Distorções, Revolta
e Reforma nas Relações
de Terras Agrícolas
Hans P. Binswanger
Banco Mundial, Setor de Desenvolvimento Ambientalmente
Sustentável da Sessão da África
Klaus Deininger
Banco Mundial, Equipe de Pesquisa de Desenvolvimento
Gershon Feder
Banco Mundial, Equipe de Pesquisa Sobre Desenvolvimento
Texto elaborado para o Manual de Economia do Desenvolvimento, Volume III, Jere Behrman e T. N. Srinivasan, editores.
Os autores deste documento utilizaram, com proveito, as discussões realizadas no Banco de Desenvolvimento Asiático, no Land Tenure Center
da Universidade de Wisconsin, Universidade de Minnesota e Banco Mundial. Os comentários por escrito e as sugestões apresentadas por
A. S. P. Brandão, D. Bromley, J. Bruce, M. Carter, R. Christiansen, T. Hayami, M. Lipton, S. Migot-Adholla, K. Otsuka, M. Roth, V. Ruttan,
e T. N. Shrinivasan foram particularmente úteis.
Introdução
A
realização deste trabalho foi motivada pelas investigações acerca da
influência que a eqüidade e a eficiência exercem sobre os mercados de
venda e arrendamento das terras agrícolas no mundo em desenvolvi-
mento. A maioria dos trabalhos sobre a relação entre tamanho da propriedade e
produtividade, sugere, em boa parte que as fazendas que dependem essencialmen-
te do trabalho familiar detêm maiores níveis de produtividade que as propriedades
administradas primariamente com mão-de-obra contratada. Se isso for verdade,
por que motivo os mercados de venda e arrendamento de terras agrícolas, em geral,
não realocaram terras para os agricultores familiares? Por que persiste a distribui-
ção extraordinariamente desigual de posse e de titularidade operacional de terras,
em diversas partes do mundo? Por que a reforma agrária surge como um elemento
necessário para mudar essa distribuição de posse de terras?
O que começou a surgir deste estudo foi uma límpida sensação de que
as grandes variações entre as relações de posse de terra existentes no mundo,
com o passar do tempo, não podem ser entendidas como inseridas em um
único paradigma de direitos de propriedade e de mercados. A Seção 2 explicita
a seqüência idealizada, sobre o surgimento e a definição dos direitos de propri-
edade, que ocorreu em apenas determinadas regiões dos países em desenvol-
vimento. De acordo com esse paradigma, o aumento da escassez de terras leva
a uma melhor definição dos direitos, que são por conseguinte comercializados
nos mercados de venda e de arrendamento, os quais são acessíveis, com igual-
dade de condições, a todos os envolvidos. O resultado seria a alocação de
terras para os usos e usuários mais eficientes. Contudo, isso não ocorreu com
freqüência, como demonstram os grandes desvios de eficiência observados.
Um exame da evolução histórica dos direitos de propriedade revela as
razões dos desvios: os direitos sobre a terra e a concentração de propriedade,
observados na maioria dos países em desenvolvimento, ao final da Segunda
Guerra Mundial, são conseqüência das relações de poder. Grupos de pro-
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Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
1
Uma expressiva literatura aprofunda o tema das implicações dos modelos espaciais de uso do solo, seguindo a tradição de
Von Thuernen para o uso ótimo do solo e os problemas ligados aos monopólios localizados (Fujita e Thiessen, 1986), planeja-
mento urbano e regional e os determinantes dos valores da terra (Randall e Castle, 1985). As fontes citadas fornecem uma
boa visão geral dessa literatura.
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Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
Di r e i t o s T e r r i t o r i a i s d e C a ç a e C o le t a
Caçadores / Coletores
Mercado Externo de
Surgimento da Agricultura Concessã o de Terra s
1
2
Hans P. Binswanger, Klaus Deininger e Gershon Feder
Sur g i me n t o d e Di r e it o s a P a r ce l a s E s p e c íf i ca s d e Te r r a
5
3
Pastagens Direito de Tributar a Terra Latifúndio
de Alqueive 5 Latifúndio
com
Fazendas Familiares com
Contrato de
Propriedade Comunal Escravidão
Trabalho
Sistemas Senhoriais
Arrendamento, Ocupa ntes, Auto-Cultivo em Fazenda Própria
4
Maiores direitos
aos cult ivadores 8
9 15
Culturas Direitos Irrestritos
de Compra e Venda Crescimento dos Direitos dos Senhore s Feudais Aboliçã o da Escravatura
Permanentes
Estudos NEAD 5
F igu ra 2
L a ti f ú n d i o
P r o p r ie d ad e d e A lu g u e l H a ci e nda A ssal ari ado
Culturas Fazenda Familiar O p e r a d a p or A r r e n d a t á r i os A r r e n da t á r i o s
Permanentes Proprieda de Comuna l e
P r op r i e t á r i o s
11
Reforma Agrária
7 12 Restrições de
Arrendamento
10
Direitos
Irrestritos de Junker
Ve nda 12 Ope rada pelo Dono
47
Hans P. Binswanger, Klaus Deininger e Gershon Feder
48 Estudos NEAD 5
Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
1985; Downs e Teyns, 1988). O aluguel e a venda da terra em geral ocorre dentro
dos limites da comunidade, particularmente entre os parentes mais próximos.
Em que pesem as regras e estruturas internas desses sistemas exibirem
uma surpreendente variedade, todos os sistemas comunais possuem uma coi-
sa em comum: as vendas de terras para forasteiros ou são proibidas ou são
sujeitas à aprovação de toda a comunidade.
Os direitos de venda são freqüentemente proibidos por leis que deter-
minam que a propriedade final da terra é do Estado, ou por leis que regulam o
domínio das terras das comunidades tribais ou indígenas. As autoridades colo-
niais em geral legislavam por meio de um sistema uniforme de titularidade
comunal, aplicado a toda a terra em mãos das populações indígenas (embora as
sociedades tribais freqüentemente burlassem a proibição formal de venda de
terras; Noronha, 1985). No sistema de domínio comunal, as glebas familiares
só podem ser usadas como fiança nos mercados informais de crédito, mas não
como garantia nos mercados formais.
50 Estudos NEAD 5
Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
4
Mesailloux mostra também que esses sistemas de escravidão mercantil dependiam dos sistemas de escravidão aristocrática, os quais
se engajavam na reprodução da população escrava por meio de conflitos armados e de ataques de surpresa às populações dispersas
de camponeses. Domar, 1970, correlaciona os direitos de propriedade de pessoas – escravidão e servidão – à abundância de terras,
o que torna impossível a coleta de receitas residuais da terra. O que ele não distinguiu é que a escravidão, a compra da força de
trabalho, requer altos níveis de capital, que só pode ser financiado se houver um mercado, ao passo que a servidão implica na
cobrança de um tributo, não envolvendo uma transação de compra, portanto, não é necessário um mercado.
5
Para uma discussão sobre a transição da escravatura para a servidão, ver Messailoux, 1991.
6
As zonas temperadas das Américas (Canadá, Nordeste dos Estados Unidos, Sul do Brasil e Argentina) escaparam da escravatura
porque os seus produtos não tinham condições de serem exportados, competitivamente, para a Europa, também na zona temperada,
até o advento do navio a vapor e das linhas de ferro, tempo em que a escravatura já tinha saído de moda. As culturas tropicais e
subtropicais de açúcar, algodão e tabaco não enfrentavam qualquer tipo de competição nos mercados europeus.
52 Estudos NEAD 5
Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
Distorções econômicas
Quando se tornou impossível, ou insuficiente exercer a coação, os gru-
pos dominantes conseguiram provocar a intervenção dos governos para criar
distorções econômicas, destinadas a gerar oferta de trabalho para as suas
fazendas. Aqui a densidade populacional já era alta o suficiente para que a
agricultura de longo alqueive substituísse a caça e coleta de alimentos e com
isso, os camponeses tiveram condição de estabelecer administrações agrícolas
independentes, em áreas sem escravidão ou servidão. Com tecnologia idêntica
e um mercado competitivo para a produção, o cultivo da fazenda familiar com
trabalho assalariado não seria competitivo para as fazendas-sede, por causa
das desvantagens de incentivos e dos custos de fiscalização do trabalho.
Conseguir que os camponeses autônomos se mudassem para o latifún-
dio exigia a diminuição da utilidade esperada, ou dos lucros no setor de campo-
neses autônomos – utilidade esperada do cultivo familiar, incluindo os atribu-
tos de risco do fluxo de renda correspondente – ou alterar a sua curva de oferta
de trabalho para a direita. Isso foi obtido com o uso de quatro mecanismos:
• redução da terra disponível para cultivo pelos camponeses pela alocação de
direitos a terras “desocupadas” de modo que estas fossem concedidas somen-
te aos membros da classe dominante, confinando, desta forma, o cultivo dos
camponeses a áreas não-férteis ou remotas, com pouca infra-estrutura e de
difícil acesso ao mercado (a Tabela 1 apresenta uma lista de diversos casos, em
todos os continentes, onde o acesso a terras de alta qualidade era restrito).
Assim, os lucros das fazendas ou a utilidade sobre as terras dos camponeses
autônomos ficavam reduzidos pelo aumento dos requisitos de trabalho, ne-
cessários para a produção de uma unidade de produto em terras ruins, pelo
aumento dos custos de transporte e comercialização, e pelo aumento dos pre-
ços dos bens de consumo importados à região;
• imposição de tributação diferenciada com a exigência de pagamento de
tributos individuais, e impostos territoriais e prediais dos camponeses (em
dinheiro, espécie ou serviço braçal), isentando de impostos os arrendatários ou
trabalhadores empregados nos latifúndios, ou impondo a estes uma taxação
com alíquotas bem inferiores. Esses sistemas eram amplamente utilizados na
Europa Ocidental durante o período feudal, no Japão antigo, na China, Índia, e
no Império Otomano, bem como por todos os poderes coloniais (Tabela 1). Os
sistemas tributários da Europa Oriental e do Japão sobreviveram até a segunda
metade do século XIX. Conquanto que os camponeses autônomos pudessem
pagar as contribuições ou impostos em espécie ou em dinheiro, e tivessem
igual acesso aos mercados de produção, à tributação, por si só, não era sufici-
ente para produzir uma oferta de trabalhadores ou arrendatários. Inventaram-
se, assim, outros complementos à tributação;
• restrição de acesso ao mercado, com o estabelecimento generalizado de esque-
mas de mercado cooperativos ou monopolistas, que compravam apenas a produ-
ção oriunda das propriedades da classe dominante. O sistema de prazo em
Moçambique combinava direitos ao trabalho e tributos dos camponeses com mo-
nopólios dos insumos e produto. No Quênia, a produção de café pelos nativos
africanos era proibida terminantemente, até a década de 50. Os monopólios euro-
peus sobre as vendas de tabaco no Zimbábue e Malawi foram transferidos direta-
mente para grandes fazendas, depois que esses países ganharam a independência;
• confinamento dos bens e serviços agrícolas (estradas, extensão, crédito) às
fazendas das classes dominantes, ou concessão de subsídios diretos a essas propri-
edades foi também um meio de aumentar a sua produtividade, em detrimento
das fazendas dos colonos.7
Tabela 1: Intervenções para estabelecer e apoiar grandes fazendas
7
No Zimbábue, os africanos foram incentivados a cultivar milho, por meio do “Programa Master Farmer”, no final dos anos 20,
quando os fazendeiros europeus descobriram que era mais lucrativo plantar tabaco e algodão. Quando esses mercados
desmoronaram, introduziu-se o monopólio da comercialização e o sistema dual de preços, e o “Programa Master Farmer” foi
abandonado. Na época, os responsáveis pelo programa declararam publicamente que nunca tiveram a intenção de “ensinar
aos nativos” a produzir milho, para competir com os fazendeiros europeus.
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Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
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utilidade para a agricultura de subsistência nos matagais ou nas áreas de onde eles
foram forçados a emigrar. Na Europa, a leste do Rio Elba, esses termos em geral incluíam
a concessão de direitos hereditários de usufruto. No início, boa parte do trabalho de
corvéia era dedicado à construção e manutenção de infra-estrutura.
Conquanto que as densidades populacionais fossem baixas, as exigências
de corvéia tinham que ser reguladas e impostas pelo Estado. Todavia, à medida que
o crescimento da densidade populacional e o aumento da escassez de terras redu-
ziram a mobilidade dos camponeses, tornou-se possível aumentar a quantidade de
tributos cobrados e transformá-los, de forma crescente, numa obrigação de traba-
lhar na fazenda-sede do senhor feudal. As exigências de que se trabalhasse nessas
fazendas durante dois ou três dias na semana na Europa feudal, na Rússia do
século XIX, no Quênia, em 1918, e nas Américas do Sul e Central, começaram a
aumentar com o aumento da escassez de terras. No Quênia, a exigência de corvéia
para os grileiros e suas famílias aumentou para cinco dias por semana ao final do
Período Colonial (Lei do Trabalho Residencial, Quênia, 1939).
Este simples modelo demográfico econômico não explica, entretanto, por-
que as regiões européias reagiram de maneira tão diferente ao declínio populacional
causado pela peste do século XIV. A queda de arrecadação tributária associada à
redução da população contribuiu para a erosão da servidão na Europa Ocidental,
mas levou à sua imposição na Europa Oriental. Nos debates sobre o desapareci-
mento do feudalismo na Europa, Brenner (1976, 1982) estabelece claramente que
os fatores econômicos, tais como a densidade populacional e o acesso ao merca-
do, sozinhos, não são suficientes para determinar a distribuição de renda entre
camponeses e senhores no latifúndio. Na melhor das hipóteses, eles determinam
não a quantidade real de tributos ou de excedente que poderia ser cobrada dos
camponeses, mas a quantidade potencial máxima. O êxito dos senhores feudais de
extrair tributos dependia do seu poder político sobre a terra, do poder de monopo-
lizar os mercados e controlar a movimentação dos camponeses, em relação ao
poder dos camponeses de resistirem a esses esforços.
58 Estudos NEAD 5
Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
coagidas, incluindo aqui os instrumentos usados para fazer cumprir essas relações.
Aqui se inclui a habilidade do senhor feudal de impor restrições sobre a mobilidade dos
camponeses e sobre os mercados de produção, sobre os amplos termos dos aluguéis
legítimos (usufruto hereditário, aluguéis de longo prazo, aluguéis de curto prazo), sobre
as formas disponíveis de pagamento de aluguéis (em dinheiro, em espécie, em serviço
braçal, aluguel fixo, compartilhamento da safra) e sobre as sanções (expulsão, castigo
físico, multas), ou os instrumentos que podem ser usados para o cumprimento dessas
mudanças. O outro é a determinação da combinação ótima e o nível de utilização de
cada instrumento, para maximizar a coleta do excedente, adotando as alternativas
disponíveis. Embora essa questão seja mais receptiva à análise econômica do que o
problema do conjunto aceitável de instrumentos, há poucos exemplos de modelagem
deste problema, até mesmo em cenários sem coação (ver, por exemplo, Carter e Kalyfan,
1990; Carter e Zimmerman, 1992; e Sadoulet, 1992). 8
Este segundo problema pode ser entendido como um processo de regateio
entre o proprietário e os potenciais arrendatários. O senhor feudal que maximiza a sua
receita ou utilidade à limitação da reserva de utilidade do arrendatário, determina os
termos do arrendamento, o tamanho da gleba do arrendatário, e o tamanho de sua
própria fazenda-sede, de acordo com as seguintes considerações: ele pode estabele-
cer a carga tributária total do trabalhador. Ele pode repartir o aluguel em corvéia,
pagamentos fixos de aluguel em dinheiro ou espécie e em compartilhamento da safra,
cada um destes com o seu próprio problema de incentivo. Ele pode escolher a quan-
tidade de terra a ser alocada à sede da fazenda, conhecendo quais incentivos serão
necessários para motivar o trabalho e sabendo também que a fiscalização é cara. Ele
pode escolher o tamanho do lote destinado ao arrendatário, sabendo que as fazen-
das familiares oferecem altos incentivos à produção, mas podem levar os colonos a
concentrarem-se em seus próprios lotes, e não prover esforço de trabalho suficiente
ao cultivo da fazenda-sede.
Com os colonos livres para partir, a principal limitação enfrentada pelo
senhor feudal é a de que ele não poderá trazer a utilidade recebida pelos seus
arrendatários abaixo de sua reserva de utilidade – o que eles poderiam receber por
trabalho fora da propriedade, ou no mercado de trabalho urbano. O colono, por sua
vez, pode variar na quantidade de esforço dedicado à sua própria fazenda, ou partir
para áreas de fronteira, reservas indígenas, ou para os mercados de trabalho urba-
no. Assim, mesmo sem a coação ou a capacidade de afetar a reserva de utilidade, o
proprietário parece contar com uma abundância de instrumentos para trazer o
colono à sua reserva de utilidade. Sem restrições adicionais no problema do rega-
teio, a sua solução pode ser indeterminada.
8
Carter e Kalyfan (1990) mostram que a combinação das restrições de fiscalização do trabalho e a limitação do capital de giro
podem resultar no surgimento de contratos de trabalho amarrados. Carter e Zimmerman (1992) apresentam uma extensão
dinâmica deste modelo que demonstra que o surgimento de inúmeras características marcantes das sociedades agrárias duais
é uma conseqüência de problemas de crédito e fiscalização do trabalho. Sadoulet (1992) explica que o surgimento do
arrendamento de mão-de-obra é um instrumento adotado pelo proprietário para atingir nível ótimo de seguro contra fracas-
sos do arrendatário, no caso de perda da safra. A covariância de safras entre a fazenda-sede do proprietário e os lotes dos
arrendatários é, no entanto, ignorada. Porém, nos anos de perda de safra o trabalho dos arrendatários também não tem valor
na fazenda-sede, e forçar o arrendatário a provê-lo apenas implica no aumento dos custos de fiscalização. Portanto, a
explicação de Sadoulet não é boa.
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Poder, distorções, revolta e reforma nas relações de terras agrícolas
Conclusão
A grande questão nas relações de terras, portanto, é a evolução das rela-
ções entre camponeses e senhores ao longo do tempo. A literatura mais
aprofundada sobre este tema relaciona o latifúndio, a corvéia, e a servidão ao
surgimento do capitalismo na Europa. Dobb, 1976, interpreta o surgimento da
agricultura capitalista e a perda dos direitos de cobrar tributos como resultado
único do aumento da densidade populacional, enquanto que Sweeney, 1976,
enfatiza o papel do acesso crescente aos mercados. Brenner, 1985, mostra que
essas explicações sozinhas são inadequadas, argumentando sobre a necessida-
de de se introduzir a coesão dos dois grupos e a força das coalizões que estes
podem formar com reis ou grupos urbanos. Holton, 1977, também se aprofundou
nessas questões, bem como as teorias não-econômicas mais amplas. Em parti-
cular, Brenner aponta para a importância da coesão no seio da comunidade cam-
ponesa, no sentido de resistir às tentativas dos senhores de aumentar os instru-
mentos disponíveis, ou aumentar a intensidade de seu uso.
9
Horowitz, 1993, modela a reforma agrária como o resultado de uma negociação regateada entre dois agentes, represen-
tando as elites abastadas e os pobres. Cada parte pode ou concordar com uma proposta de reforma ou dar início a uma
“revolta”, definida como uma loteria com três resultados: “vitória dos ricos”, “vitória dos pobres” e “manutenção do status
quo”. A estrutura de poder que, em caso revolta, determina as probabilidades de acontecer cada um desses eventos é
considerada exógena e invariável no tempo. Isto leva à definição de um plano de reforma seguro, como a evolução da posse de
terras ao longo do tempo, que constitui um equilíbrio Nash, no jogo de regateio entre senhores e camponeses o qual, em
qualquer ponto no tempo provê, para cada uma das partes, um nível de utilidade pelo menos igual ao seu nível esperado, em
caso de revolta. Horowitz demonstra que, no caso da neutralidade de risco (i) existe um único plano de reforma seguro para
toda a distribuição inicial de propriedade de terra, o que pode acarretar ou a redistribuição dos ricos para os pobres, ou a
acumulação de terras pelos ricos; (ii) para qualquer estrutura de poder, a extensão da transferência de terras é maior do mais
alto do desequilíbrio inicial de posse de terra; (iii) à exceção de casos especiais o plano de reforma seguro é um processo
prolongado, que consiste de uma seqüência de eventos individuais de reforma, em vez de uma redistribuição feita de uma só
vez. Esse enfoque é o primeiro modelo formal no qual a dependência do equilíbrio do padrão de propriedade de terra na
estrutura de poder está claramente detalhada. Os determinantes do poder, como as coalizões com terceiros, e a coesão
interna não são modelados, no entanto, mas pelo tipo, fica claro que as mudanças na estrutura de poder (tais como as
mudanças que ocorreram em muitas partes do mundo após 1945), e os instrumentos em mãos dos latifundiários, que reduzem
a reserva de utilidade dos camponeses, guardam fortes implicações para uma distribuição de terras “estável”.
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* Nota do tradutor: Zollvereign = uma união alfandegária formada pelos Estados alemães.
** Nota do tradutor: Ejido: no México, a terra agrícola comunal de um vilarejo, em geral alocada em pequenas frações aos
camponeses, para serem cultivadas dentro de um sistema de domínio comum, financiado pelo governo federal
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açúcar, a cana tem que ser plantada em épocas diferentes do ano, mesmo
quando a produção de açúcar não estiver em seu ponto máximo. Os agriculto-
res independentes não se sujeitariam a plantar cana nessas épocas, sem uma
compensação. Uma maneira de contornar este problema seria as fábricas de
açúcar possuírem as suas próprias plantações, com um único administrador
que decida sobre os trade-offs entre colher a cana na época sub ótima e deixar os
equipamentos ociosos. Outra maneira seria a agricultura contratada (Hayami,
1992; Glover, 1990). A contratação de pequenos agricultores é muito difundida
na Índia, na Tailândia e em outros lugares onde a cana-de-açúcar foi introduzida
em um sistema existente de pequenas propriedades.
A produção de bananas é outro exemplo de problema de coordenação.
As bananas maduras devem ser armazenadas num barco refrigerado no míni-
mo 24 horas após a colheita, um desafio imenso para a plantação e para a
companhia de transporte. A coordenação é necessária para assegurar que o
barco estará no porto no momento em que as bananas estiverem prontas para
serem transportadas e que o barco poderá ser carregado ao chegar – por esta
razão, algumas das maiores operações do mundo são as companhias que ven-
dem bananas, cujos domínios incluem dezenas de plantações administradas
por gerentes e trabalhadores contratados. Na América Central, onde a legisla-
ção dificultou a propriedade de plantações por conglomerados multinacionais,
as grandes companhias produtoras de banana aumentaram sua oferta com-
prando o estoque de fazendas contratadas. Tipicamente, essas fazendas pos-
suem centenas de hectares e seus contratos são tão rigorosos que terminam
sendo virtualmente controlados pelas multinacionais (Ellis, 1985).
Da mesma forma, a rápida deterioração da safra colhida, junto com as
economias de escala do processamento, é o fator principal que leva à conti-
nuação do cultivo de chá e palmeiras oleaginosas em plantações. Assim, a
superioridade da plantação depende de uma combinação de economias de escala do
processamento com um problema de coordenação. As plantações não surgem – ou
não sobrevivem após a abolição da coação da mão-de-obra – a menos que
existam ambas as condições. As bananas destinadas aos mercados locais e
nacionais, que são supridos por caminhões individuais e que exigem pouca
coordenação, são fornecidas por fazendas familiares em todo o mundo. Do
mesmo modo, os tipos tradicionais de açúcar não-refinado - como o açúcar
mascavo da América Central, onde o processamento não implicou em econo-
mias de escala - foram produzidos por fazendas familiares, até mesmo em
economias dominadas pelas plantações de açúcar. Em muitos países, o café
e a borracha são também cultivados em sistemas de pequenas propriedades.
Essas propriedades apresentam menores exigências de capital para o
processamento do que a cana-de-açúcar, o chá ou as palmeiras oleaginosas
e, portanto, possuem uma menor área cultivada ótima associada a uma única
unidade de processamento. Apesar de sua demanda de mão- de-obra unifor-
me durante o ano, o modo de produção da plantação declinou, entretanto,
agudamente, às custas da produção das pequenas propriedades.
Insumos básicos
Os animais de tração para a aragem da terra foram os primeiros insumos
básicos na agricultura. Diante da dificuldade enfrentada pela agricultura em
utilizar animais alugados (Binswanger e Rosenzweig, 1984), os pequenos agri-
cultores, que perdem seus animais com freqüência, alugam suas terras até
poderem adquirir novos animais (Jodha, 1984). Máquinas Agrícolas –
debulhadeiras, tratores, ceifeiras – são muito mais eficientes do que os ani-
mais de tração. Os tratores e as ceifeiras alcançam seu custo operacional
mais baixo por unidade de área, numa escala muito maior do que os animais
de tração, portanto o tamanho operacional ótimo de uma fazenda aumenta
com a introdução das máquinas. Karl Marx e seus seguidores acreditavam
que as economias de escala associadas à mecanização da agricultura eram
tão grandes que tornariam a fazenda familiar obsoleta. Mesmo assim, os pe-
quenos proprietários podem alugar suas terras para grandes operadores
(consolidantes) em vez de vendê-las, como muitas vezes fizeram os ejidatários
nas áreas irrigadas do México. Portanto, a economia de escala inicial associ-
ada à maquinaria não implica que uma reforma agrária ao inverso seja neces-
sária em áreas detentoras de muitas propriedades pequenas.
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14
Como foi explicado por Binswanger e Rosenzweig , 1986, eles não podem prover seguro para os pequenos agricultores porque
a covariância de renda exigiria um alto volume de reservas, de modo a poder oferecer contratos com credibilidade.
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15
Tanto as vendas por necessidade urgente (Bhagwati e Chakravarty, 1969) quanto os padrões diferenciados de investimentos
(Sem, 1964) poderiam explicar, teoricamente, porque os pequenos produtores conseguiam, sistematicamente, ficar com as
terras de mais alta produtividade num determinado vilarejo. Existem poucos estudos empíricos, a um nível suficientemente
desagregado por vilarejo, que confirmem essa associação. Para seis vilarejos na região semi-árida da Índia, Walker e Ryan,
1990, rejeitam a existência de uma associação sistemática entre o tamanho da fazenda e a qualidade da terra.
16
Para seis países latino-americanos Lau e Yotopoulos, 1971e 1979; Barraclough e Collarte, 1973; para o Nordeste do Brasil Kutcher
e Scandizzo, 1981; para quinze países da África, Ásia e América Latina, Cornia, 1985; para o Punjab indiano, Sem, 1981; para a índia
e Bengala Ocidental, Carter, 1984; e para a Índia, desagregada em 78 zonas agroclimáticas, Bhalla e Roy, 1988; Dyer, 1991, descreve
a variedade de instrumentos usados pelos grandes produtores no Egito para aumentar sua competitividade com os pequenos
agricultores, demonstrando que os grandes produtores podem fazer lobbies bem-sucedidos em favor de medidas destinadas a
neutralizar a relação inversa entre o tamanho da fazenda e a produtividade. A necessidade desse rent-seeking (favorecimento
político) implica na continuação da validade dessa relação, embora Dyer interprete como sendo o contrário.
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17
Apenas alguns poucos estudos testaram explicitamente a separabilidade do trabalho familiar e o trabalho contratado. Pitt e
Rosenzweig, 1986, mostram, numa amostra de agricultores da Indonésia, que os lucros independem do estado de saúde a curto prazo
do chefe do domicílio, mas, uma vez que enfermidades passageiras não interferem com a fiscalização, os resultados dizem pouco
sobre se o trabalho assalariado pode complementar a mão-de-obra familiar, em bases permanentes. Deolalikar e Vijverberg, 1987,
rejeitam a hipótese da substituibilidade perfeita entre o trabalho assalariado e o familiar, baseada em amostragens realizadas na
Índia e na Malásia. Porém, como eles estimaram uma função de produção usando dados cruzados por setores, alguns problemas
estatísticos viciaram seus resultados. Benjamin, 1992, fez uma estimativa de uma função de demanda para serviços de trabalho
agregados. Ele rejeita a hipótese da não separabilidade para os plantadores de arroz da Indonésia, com base na falta de significância
das variáveis demográficas. Já que esse modelo inclui a área colhida como uma variável dependente, ele não dá margem a ajustes
das áreas operadas (via aluguel) como resposta ao tamanho da família. Na verdade, portanto, o modelo mede apenas o impacto
condicional das variáveis demográficas, dada a área operacional, sobre a demanda por trabalho contratado. O fato de que a área
plantada (que tem influência significativa sobre a demanda de trabalho) tem correlação com a composição familiar sugere que uma
forte limitação ligada à fiscalização pode ser encontrada se fosse considerado o efeito incondicional.
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Figura 3
Coeficientes de lucro e riqueza e variabilidade climática, por riqueza e classe
34
29
24
19
14
09
9.6 11.6 13.6 15.6 17.6 19.6 21.6 23.6
Nota: Das oito características pluviométricas, a data inicial da estação chuvosa foi a característica individual mais
forte, para determinar o valor bruto do produto agrícola.
Conclusão
A maior parte do trabalho empírico sobre as relações entre tamanho da
propriedade e a produtividade foi prejudicada por deficiências metodológicas
e não tratou, adequadamente, das complexidades das questões existentes.
Os estudos que contornaram algumas dessas deficiências e utilizaram uma
medida mais refinada de qualidade da terra e uma variável de produtividade,
em vez da simples produção, descobriram que até mesmo em regiões relativa-
mente mecanizadas e avançadas tecnologicamente, como a região do rio Muda
na Malásia ou a região agreste do Nordeste brasileiro, as pequenas proprieda-
des detêm uma vantagem de produtividade sobre as grandes fazendas. Isso
sugere que os mercados de aluguéis podem substituir, até um determinado
patamar, a indivisibilidade das máquinas e determinadas habilidades gerenciais.
Os estudos metodologicamente mais bem elaborados, baseados nos dados
ICRISAT, confirmam tanto os mecanismos que conduzem a um diferencial de
desempenho por escala e à superioridade das fazendas menores, num ambi-
ente com pouca mecanização e lenta evolução tecnológica. Ao passo que há
evidência de relação negativa entre o tamanho da propriedade e a produção,
é preciso se aprofundar mais o trabalho sobre este tema. Este trabalho deve-
ria seguir as linhas esboçadas na equação 1, utilizando dados recentes em
nível de propriedade, para as regiões de países em desenvolvimento com
condições agroclimáticas e edáficas de alta qualidade, considerável mecani-
zação e evolução tecnológica dinâmica.
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86 Estudos NEAD 5
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rem terras sem reduzir seu consumo para um nível abaixo do ganho potencial
que seria auferido no mercado de trabalho.
19
Embora as supervalorizações oriundas de percepções errôneas - bolhas - levariam a equivalentes previsões, o compor-
tamento míope por parte dos compradores de terra parece ser uma explicação mais razoável. Sobre as possibilidades de
bolhas nacionais, ver Asako, 1991, e Diba e Grossman, 1988. Evidências empíricas e experimentais sobre bolhas são apresen-
tadas por DeLong e Shleifer, 1991, Smith e associados, 1988, e Evans, 1986.
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78, traduziu-se em preços maiores da terra, ao passo que os aumentos das receitas
agrícolas tiveram impacto muito menor. 20 Mesmo não havendo grandes subsídios
ao crédito, os grandes proprietários têm vantagens sobre os custos da transação,
ao assegurarem o crédito, o qual é capitalizado em valores da terra, e podem até
bloquear, inteiramente, o acesso ao crédito para os pequenos tomadores.
• Muitos países isentam a receita agrícola do imposto de renda, e mesmo
nos lugares onde não há isenção geral, a receita agrícola é de fato sujeita a alíquotas
menores. Esses favorecimentos serão parcialmente ou inteiramente capitaliza-
dos em valores da terra. Já que os pobres não pagam impostos e, desta forma, não
se beneficiam das isenções tributárias, eles não recebem o correspondente fluxo
de renda. Qualquer outro subsídio ou imposto preferencial para as grandes pro-
priedades, aumenta as dificuldades enfrentadas pelos pobres em comprar terras.
Nos lugares onde quaisquer desses fatores empurram o preço da terra
acima do preço justificado pelos fundamentos dos lucros agrícolas espera-
dos – na ausência de distorções associadas ao tamanho da fazenda – os
pobres têm dificuldades de comprar terras. Mesmo se eles tiverem acesso ao
crédito, em termos de mercado, essa dificuldade persiste, a menos que a sua
vantagem de produtividade, advinda de custos de supervisão mais baixos,
seja muito grande. Dentre esses fatores, foram investigados empiricamente a
demanda não-agrícola, a inflação, as limitações de crédito e os subsídios ao
crédito. Não foram investigadas as isenções de imposto de renda na agricul-
tura. A maior parte dos estudos empíricos concentra-se nos Estados Unidos,
já que a escassez de transações de terras nos países em desenvolvimento
torna a pesquisa difícil (Melichar; quatro outros estudos; Hallan et al; Barhema).
É preciso realizar mais trabalhos.
20
Ao passo que este fato demonstra o significado do ambiente político e institucional nos modelos agregados, as evidências
microeconômicas sobre a importância do racionamento do crédito são limitadas. Carter, 1989, Carter e Kalyfan, 1989, e
Carter e Wiebe, 1990, utilizam um modelo toscamente calibrado para determinar o preço reserva de terra, como função do
tamanho da propriedade, e obtiveram uma curva em forma de U. Por causa da imperfeição de seus dados, os resultados
indicam ordens de magnitude em vez de números exatos, mas estão certamente no caminho certo.
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94 Estudos NEAD 5
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tos agrícolas. Num arcabouço estático isto vem sendo modelado tornando a
produção uma função do esforço de trabalho dos colonos e a provisão de
habilidades gerenciais, por parte do proprietário (Eswaran e Kotwal, 1985). Em-
bora as evidências quantitativas sejam limitadas, Reid (1973) argumenta que
esta função de arrendamento desempenhou um papel importante na região sul
dos Estados Unidos, após a abolição da escravatura. Lehman, 1986, chamou
atenção para a importância do arrendamento em facilitar a acumulação de capi-
tal, nas transferências entre gerações, da posse das terras no Equador. Seria de
se esperar que o arrendamento facilitasse a acumulação de capital, nos lugares
onde a terra é abundante em relação ao trabalho e onde os aluguéis ou a
participação dos proprietários é baixa. Estudos longitudinais de mudanças nos
padrões de arrendamento e acumulação de capital ao longo do ciclo de vida
dos arrendatários ajudariam a colocar uma luz sobre a importância relativa
deste fenômeno em ambientes diferentes.
Conclusão
Face às vantagens de produtividade das pequenas fazendas sobre as
grandes, é mais lucrativo para os grandes proprietários alugar suas terras em
regime de contratos de aluguel fixo, do que utilizar o trabalho contratado, se os
mercados e as informações forem perfeitos. Se o esforço não for observável e
o crédito for racionado, ou os mercados de seguros forem imperfeitos, e os
arrendatários avessos aos riscos, o primeiro melhor contrato de arrendamento,
a uma taxa fixa, talvez não possa ser feito, e um segundo melhor contrato seria
adotado em seu lugar.
As investigações empíricas mostram que os arranjos de arrendamen-
to compartilhado, sob uma ampla variedade de condições, são um instru-
mento altamente flexível para se ajustar a essas restrições, com perdas
relativamente bem modestas. Já que o esforço de trabalho não é completa-
mente fiscalizável, e até mesmo o controle limitado estará sujeito a determi-
nado custo, a adoção de contratos de arrendamento compartilhado (ou
trabalho assalariado) ainda estariam associados a algum tipo de perda de
eficiência. A eliminação das condições que instigam o surgimento do arren-
damento compartilhado, provavelmente levará a ganhos de eficiência mo-
destos, e será mais efetiva do que a proibição legal de contratos desta
natureza (ver Parte III). Ganhos maiores de eficiência podem estar associa-
dos à eliminação das distorções que levam à adoção e perpetuação dos
contratos de trabalho assalariado, e das grandes fazendas comerciais, em
vez dos contratos de aluguel fixo ou contratos de compartilhamento.
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23
Se a decisão de adquirir o título for endógena, o cálculo dos efeitos da titulação, utilizando dados interseccionais ficará
sujeito a um viés de simultaneidade (Boldt, 1989; Stanfield, 1990).
8. Imposto Territorial
As questões
Na maioria dos países em desenvolvimento os impostos territoriais
evoluíram dos tributos pagos aos senhores feudais, ou ao poder colonial. Em
razão do fato de que esses impostos iam direto para os cofres dos governos
centrais, a disponibilidade local de pagá-los dependia de um controle severo,
comandado pelos coletores de tributos que compartilhavam das receitas. A
inflação e as dificuldades da coleta centralizada, eventualmente levou à ero-
são ou ao desaparecimento completo desses impostos. Atualmente, a ques-
tão de política é a de restabelecer os impostos sobre as terras e talvez usá-los
para financiar investimentos e serviços nas jurisdições locais, como foi feito
com êxito nos Estados Unidos. Em tese, um imposto sobre a terra possui três
grandes vantagens sobre os impostos que incidem sobre a produção ou ex-
portação agrícolas: (1) se um imposto sobre a terra for baseado no produto
monetário potencial de uma determinada gleba, em condições normais, esse
imposto tem efeitos de desincentivos desprezíveis; (2) esse imposto facilita a
taxação do setor agrícola doméstico, sendo muito menos regressivo do que
os impostos individuais (impostos por cabeça); e (3) se a base tributária for
mudada com pouca freqüência, um imposto territorial não desestimula os
investimentos em melhorias da terra.
Se os riscos forem altos e os mercados de seguros forem imperfeitos
ou inexistentes, a introdução de um imposto sobre a terra (baseado nas recei-
tas médias), pode levar ao aumento da concentração de terras, conforme foi
demonstrado por Hamid, 1983, na Índia. Nessas condições, um imposto
baseado na produção real, o qual atua como um mecanismo de seguro da
mesma maneira que atua o compartilhamento de safra, pode ser mais desejá-
vel do que um imposto único sobre a terra, pago de uma só vez (Hoff, 1991).
No entanto, é possível demonstrar que, para valores realistas de aversão a
riscos, de variação de renda e de impostos de exportação, os produtores
tenderão a preferir um imposto sobre a terra, equilibrado por uma equivalente
redução das taxas de exportação (Skinner, 1991).
Implicações de políticas
Nos lugares onde as exigências administrativas – um cadastro atualiza-
do mais uma organização administrativa – estão ausentes, impostos territoriais
simples ou ligeiramente progressivos, baseados na classificação bruta das pro-
priedades, pode ainda ser útil para levantar receita e prover algum incentivo
para que os proprietários vendam as terras subutilizadas. Os Estados Unidos
tiveram êxito, transferindo a administração dos impostos territoriais às autori-
dades locais e “carimbando” os recursos oriundos das receitas tributárias para
a infra-estrutura e serviços de governo locais. Ao aumentar a visibilidade local
dos benefícios financiados com as receitas tributárias, este enfoque pode au-
Implicações de políticas
Depender do mercado para eliminar a fragmentação provavelmente en-
volverá altos custos de transação, para coordenar as transferências entre gran-
des números de proprietários. Os custos de transação são muito mais baixos
em programas governamentais, os quais em geral são coercitivos e incluem
uma variedade de outras iniciativas de desenvolvimento, e os retornos podem
ser altos – Simons, 1987, encontrou retornos de 40% na França. Entretanto, se
25
Em situações de extrema pobreza, a redistribuição de terras pode também aumentar a eficiência ao melhorar o bem-estar
nutricional, com o conseqüente aumento da capacidade produtiva da população (Dasgupta e Ray, 1986 e 1987; Moene, 1992).
Implicações de políticas
Antes de introduzir qualquer programa de redistribuição de terras, as
distorções implícitas e explícitas que levam os preços da terra acima do valor
capitalizado dos lucros da agricultura precisam ser eliminadas. Do contrário, os
pequenos agricultores continuarão a ser incentivados a venderem suas terras para
os grandes proprietários, já que o ambiente favorece a posse de grandes proprieda-
des. No Brasil, o surgimento de uma estrutura agrícola dominada por grandes
propriedades, deve-se muito a políticas em favor das grandes fazendas (Binswanger,
1987). Aos pobres deve ser concedido ou a terra ou uma dotação para ajudá-los a
comprá-la, de modo a compensar por sua falta de capital. O crédito para os
beneficiários da compra de terras desempenha apenas um papel subsidiário.26 Os
ambientes macroeconômicos e político também afetam fortemente o resultado das
políticas de reforma agrária. No Chile, houve aumentos substanciais de produção
em conseqüência da desapropriação e redistribuição de quase 20% de toda a terra
agrícola no período 1964-70, muito do qual devido ao aumento do investimento
induzido por condições macroeconômicas e políticas favoráveis (Jarvis, 1985, 1989).
Em contraste, a produção não conseguiu aumentar significativamente durante a
26
Organizações como a Fundação Penny, na Guatemala, conseguiram comprar terras de fazendeiros e distribuí-las entre os
pequenos agricultores, com poucos subsídios governamentais (Forster, 1992). Esses casos em geral envolvem doações ou
subsídios ao crédito fornecidos aos pequenos proprietários, ou a compra da terra abaixo do preço de mercado, por conta de
dívidas do antigo proprietário a instituições do governo, ou aos trabalhadores, as quais são perdoadas, como parte do negócio.
fato de que os contratos de parceria nessas plantações são praticados com êxito
em muitas partes do mundo em desenvolvimento, indica que, converter as planta-
ções em contratos de parceria é viável. Com efeito, Hayami, Quisumbing e Adriano
descrevem a conversão bem sucedida até de uma plantação de banana num siste-
ma de contrato de parceria nas Filipinas, e defendem ardorosamente a reintrodução
de mais conversões, mediante um imposto progressivo sobre a terra. No entanto,
os ganhos de eficiência advindos dos custos de fiscalização mais baixos, associa-
dos a esses esquemas, serão provavelmente contrabalançados, devido às econo-
mias de escala reais existentes nas safras dessas plantações.
As tentativas de se substituir as plantações por contratos coletivos ou
contratos de parceria não vêm tendo êxito. No Peru, o fracasso das plantações
de cana-de-açúcar coletivas em investir, e a progressiva exploração de trabalha-
dores externos que não tinham direitos à sociedade, deu origem a greves pelos
sócios coletivos, que foram sufocadas por intervenções militares. As perdas
que se acumulavam – devido à queda mundial dos preços do açúcar – provo-
cou uma gradual intervenção governamental, e a transformação efetiva das
coletivas em fazendas do Estado (Kay, 1982). Na Malásia, as plantações de
borracha, que haviam sido estabelecidas em bases coletivas, foram divididas e
alocadas a agricultores individuais, na maturação, de modo a assegurar uma
extração adequada (Pickett, 1988).
13. Descoletivização
O fraco desempenho das fazendas coletivas e das fazendas do Esta-
do mundo afora é tão óbvio, que as questões que se colocam para as eco-
nomias liberalizadas da Europa Oriental e da Comunidade de Estados Inde-
pendentes não se referem à privatização, mas à rapidez e à forma como será
efetuada essa privatização – transformando-as em grandes fazendas co-
merciais ou fazendas familiares.
Implicações de políticas
As discussões contidas neste documento implicam que quatro ques-
tões sobrepõem-se em importância na determinação da escolha de política:
• A opção pela fazenda pequena é viável apenas onde houver mercados
competitivos de insumos e de produção. De outra forma, a receita da terra e os
ganhos empresariais da agricultura seriam captados pelos mercadores
monopolistas e pelos provedores de insumos, em vez de ficarem com os novos
proprietários. É preciso também que os mecanismos de difusão de riscos este-
jam funcionando adequadamente, para que a covariância de clima ou choques
de preços, não forcem as vendas de emergência pelos novos proprietários, os
quais não possuem outros ativos, ou outras fontes de renda. Portanto, é preci-
so envidar esforços no sentido de se criar mercados de insumos e de produção
28
Brenner, 1975/1985, argumenta que, sob o feudalismo, os aluguéis coletados dos camponeses pelas elites abastadas eram
quase que completamente dissipados e que o resultante fracasso dos camponeses e senhores em reinvestir em melhorias da
terra, e em animais de tração foi responsável pela extensão da agricultura arável às terras marginais e à produtividade
decrescente, associada ao crescimento populacional na agricultura européia feudal. Portanto, foi o próprio rent-seeking que
levou à crise de subsistência Neo-Malthusiana ou Ricardiana dos séculos XII e XIII, em vez das seqüências de Boserup positivas,
induzidas pela população. Seqüências essas de investimento, mudança, tecnologia, aumento da divisão de trabalho e cres-
cimento da produtividade agrícola. Essa explicação de uma produtididade estagnada ou em declínio assemelha-se àquela
documentada por Krueger, Schiff e Valdes, 1992, para explicar a recente estagnação da agricultura e limitada evolução
tecnológica em boa parte da África, como conseqüência da tributação extraordinariamente alta da agricultura em muitos
países africanos por Estados urbanos.
Anexo 1
Intervenções para estabelecer e apoiar as grandes propriedades
A literatura sobre o surgimento e evolução dos latifúndios e das rela-
ções de produção que prevaleciam nessas propriedades, focalizou-se em exem-
plos da Europa (principalmente a Grã- Bretanha, a França, a Alemanha e a Euro-
pa Oriental). Este Anexo, que explica a Tabela 1 deste texto, apresenta a evidên-
cia do estabelecimento e da evolução dos sistemas de grandes propriedades,
num quadro mais amplo, cobrindo um período maior.
Todos os exemplos aqui discutidos sugerem que, nem o estabeleci-
mento nem a persistência da existência de grandes fazendas, deveu-se à
superioridade de sua eficiência econômica, e/ou à presença de economias
de escala na produção agrícola. A formação de grandes fazendas deveu-se
às intervenções governamentais em favor dos grandes latifundiários, medi-
ante a doação de terras e taxação diferenciada. A retirada desses privilégios
levou ou à sua desintegração em latifúndios menores, ou a uma mudança
em direção ao favorecimento político, ou outras formas mais sutis de ampa-
ro às grandes fazendas.
Ásia
Índia (Norte)
Intervenções no Mercado de Terras. O sistema de estâncias já havia sido
descrito na Arthshastra do século IV a.C. No século I, as doações de terra,
abrangendo dez ou mais vilarejos cada uma, foram concedidas a clérigos e
a uns poucos membros das famílias dominantes e altos funcionários do
governo (Sharma, 1965). Este processo de doação de terras “culminou nos
séculos XI e XII, quando o Norte da Índia foi parcelado em diversas unidades
políticas, boa parte das quais em mãos de donatários civis ou religiosos,
que desfrutavam dos vilarejos presenteados como algo um pouco melhor
do que os latifúndios.” (Sharma, 1965:273).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. A corvéia surgiu no sécu-
lo II e prevaleceu até o século X. Entre os séculos V e X, quando a densidade
populacional já havia atingido um patamar suficiente, como em Gujarat,
Rajasthan e Maharastra, os agricultores permanentes foram reduzidos a
colonos voluntários. Nas regiões onde a densidade populacional era baixa,
os colonos e artesãos eram agrilhoados à terra da mesma maneira que eram
os vassalos na Europa medieval (Sharma, 1965),
China (Sul)
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. O sistema de alocação igua-
litária de terra, introduzido por volta do ano 600, em condições de abundância
Japão
Intervenções nos Mercados de Terras. Para prover os incentivos necessários
para a transformação de terras incultas em campos de arroz, a Lei de Recuperação
de Terras, de 723, transformou essas terras em propriedade hereditária pessoal
do incorporador. Este dispositivo deu origem ao surgimento de uma categoria
especial de terra particular, que era isenta de impostos, e excluída do sistema de
domínio, pelo qual, a cada seis anos, a terra era redistribuída entre os membros
da comunidade (Takekoshi, 1967).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Em troca dessa alocação
de terras, os agricultores tinham que pagar imposto em espécie, bem como
conceder serviços especiais, que chegaram a 140 dias por ano (Takekoshi,
1967). As terras desmatadas, as terras dos templos religiosos, bem como as
terras pertencentes à nobreza, eram isentas de todos os impostos. De modo
a obter imunidade tributária, muitos proprietários transferiam suas terras
para os templos, ou para membros da nobreza. Ao passo que eles tinham
que abrir mão dos direitos hereditários à terra, os proprietários originais, na
maioria dos casos continuavam a administrar suas terras, e o cultivo das
fazendas-sede permaneceu mínimo. Os oficiais superiores podiam acumu-
lar propriedades enormes, mas, por sua vez, tinham que transferir as propri-
edades para indivíduos mais graduados, de modo a proteger a imunidade de
seus domínios dos rigores tributários, dando origem a uma hierarquia de
domínio bastante complexa, nas quais as participações das herdades e os
direitos associados às receitas da terra eram comercializados no mercado
(Sato, 1977). Já pelo final do século XIV, a crescente escassez de terras,
conforme está evidenciada pela fragmentação física dos campos, devido às
transferências entre gerações, levaram a uma conversão gradual em latifún-
dios (Keirstead, 1985), que perdurou até os séculos XIX e XX.
Java e Sumatra
Intervenções nos Mercados de Terras. A Lei da Reforma Agrária, de 1870, decla-
rou toda as terras incultas como de propriedade inalienável do Estado, e as
alugou a companhias européias que ali fundaram plantações de grande escala.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Essas plantações eram
operadas quase que exclusivamente com a utilização de trabalho servil
Filipinas
Intervenções nos Mercados de Terras. As terras foram concedidas a indivíduos
e a ordens religiosas a partir de 1571 (Roth, 1977) e já em 1700, todas a melho-
res terras estavam sob controle de grandes latifúndios (Cushner, 1976).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. As Filipinas, como al-
guns países da América Latina, tinha tanto a encomienda – direito de
tributar em trabalho braçal, dinheiro, ou espécie, de uma determinada
região – e o repartimiento – que distribuía os trabalhadores em obras
públicas e negócios privados dos espanhóis. Esses sistemas, no entanto,
eram diferentes daqueles usados na América Latina, onde o direito a servi-
ços braçais era hereditário, e freqüentemente incluía vilarejos inteiros. Os
trabalhadores das estâncias em mãos dos europeus ficavam isentos de
impostos e do trabalho pesado nas obras públicas, o que tornava o em-
prego nas estâncias altamente atraente. Apesar desta vantagem, a falta de
economias de escala levou à quase imediata desintegração das fazendas
cultivadoras de arroz, que se transformaram em latifúndios. Ademais, já
no século XIX, a produção e o processamento do açúcar eram controlados
também pelos arrendatários (Roth, 1977).
Sri Lanka
Intervenções nos Mercados de Terras. As terras altas, onde se praticava o cul-
tivo em matas de queimada, foram declaradas terras da Coroa, em 1840
(Sandarage, 1983), e vendidas a cultivadores privados, a maioria dos quais
ingleses, que lá estabeleceram plantações de café.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. O trabalho de corvéia foi
abolido das terras públicas em 1818 e substituído por um imposto em grãos,
totalizando 10% da produção bruta. A agricultura de exportação – bem como
toda a terra dedicada à plantação de café, algodão, açúcar, índigo, ópio e seda –
eram isentas de impostos (Bandarage, 1983).
Ao passo que os interesses das classes abastadas conseguiram se
opor, com sucesso, à imposição de uma lei tributária geral, a oportunidade
de se auferir receitas com o cultivo do café, juntamente com a ausência de
uma casta de trabalhadores sem-terra, limitou severamente a disposição
das populações locais de suprir mão-de-obra para as propriedades. Assim,
quase a totalidade da mão-de-obra agrícola das plantações de café teve que
ser importada. Estimativas do Censo indicam que em 1871 e 1881, 97% dos
cerca de 200.000 trabalhadores nas plantações eram de origem tâmil, prin-
cipalmente da Índia. Os 3% de trabalhadores das plantações, de origem
local, eram em sua maioria artesãos, a quem eram pagos salários competiti-
vos, e que usavam sua posição para acumular capital para sua própria aqui-
sição de terras (Bandarage, 1983).
Europa
Prússia
Intervenções nos Mercados de Terras. As doações de terras na Prússia
começaram no século III, e eram concedidas aos fidalgos e nobres, que
tinham a missão de colonizar esse vasto território pouco populoso, e
fornecer serviço militar ao rei. No início, a densidade populacional era tão
baixa, que eram precisos termos bastantes favoráveis para atrair os cam-
poneses. Os camponeses recebiam o direito de usufruto hereditário a
cerca de 32 hectares cada um. Os nobres cavaleiros operavam domínios
de tamanho modesto, de cerca de duas ou três vezes o tamanho das
glebas designadas aos assentados (Hagen, 1985), para complementar os
aluguéis que eles recebiam dos camponeses. Eles eram “não os senhores,
mas os vizinhos” do agricultor, e em termos econômicos, tinham desem-
penho pior do que os camponeses (Lütge 1979). A queda de população,
causada pela Peste Negra, aumentou a quantidade de terra disponível
para a nobreza, que tornou-se “rica em terras, mas pobre em mão-de-
obra”. O uso produtivo dessa terra só poderia ser mantido com a busca e
com o assentamento de novos agricultores, freqüentemente em termos
bastante favoráveis para os assentados.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Ao passo que os agriculto-
res assentados tinham o direito legal de partir, sem o consentimento dos se-
nhores, até 1484 (Hagen, 1985), a Landesverordnung, de 1526, já não mais
mencionava o direito do agricultor de acionar legalmente o senhorio que não
lhe permitisse partir (Abel, 1978), o que indicava o crescente poder de barganha
dos senhores da terra (devido à densidade populacional mais alta). Essas restri-
ções à mobilidade dos camponeses facilitou a adoção, muito difundida do
aluguel de mão-de-obra, e um aumento das exigências trabalhistas que em
1560, eram dois dias de serviço por semana, para os camponeses, até chegar a
três dias, por volta de 1600 (Hagen, 1985). Mesmo assim, os nobres tinham que
recorrer aos trabalhadores contratados, em complemento aos serviços braçais
obrigatórios. As propriedades eram relativamente pequenas: em 1624, os do-
mínios junker perfaziam apenas 18% da terra cultivada (Hagen, 1985). O maior
benefício dos serviços braçais, auferido pelos senhores, era a obrigação dos
camponeses de prover um par de bois ou cavalos, e um condutor destes, em
lugar da contribuição feita pelos agricultores de tempo parcial (nicht spannfähige
Bauern) ao cultivo dos domínios.
Embora tenham os nobres cavaleiros aumentado o tamanho de seus
domínios, com o acréscimo das terras pertencentes às famílias que morreram
durante os anos da peste negra do século XIV, ou aquelas que morreram na
Guerra dos Trinta Anos de 1618-48, as grandes fazendas começaram a predo-
minar na Prússia somente depois da reforma agrária efetuada no período 1807-
50 (Lütge, 1979). Três aspectos dessa reforma contribuíram para o surgimento
das grandes fazendas: os termos de separação, que exigiam que os agricultores
detentores de aluguéis perenes, hereditários ou não, cedessem entre um terço
e a metade de suas terras aos junkers, em troca da liberdade; a limitação inicial
dos benefícios da reforma aos “camponeses de tempo integral”, e sua posterior
extensão para os outros camponeses, não detentores de contratos de longo
prazo, apenas em 1850 quando, a maioria concorda, já “era muito tarde” (Dickler,
1975); e a rejeição das leis de proteção do inquilinato, que existiam desde
1750. Esses fatores permitiram aos junkers ampliar em muito os seus domíni-
os, e a contar com uma combinação de trabalho assalariado. O estilo típico de
cultivo dos junkers, com trabalhadores permanentes, residentes em lotes com
casa, surgiu como forma predominante de organização da produção (Lütge,
1979). Depois que os colonos adquiriram a liberdade de migrar em 1863, e
passaram a mover-se em direção ao ocidente (Wunderlich, 1961), eles foram
gradativamente substituídos por trabalhadores assalariados, nômades e sazo-
nais, oriundos principalmente da Polônia, onde a densidade populacional era
alta e havia muita gente sem terra (Dickler, 1975).
Intervenções nos Mercados de Produção e de Insumos. Desde o início da era
dos assentamentos, os fidalgos detinham certos direitos de jurisdição e
monopólio sobre a moagem e sobre a fabricação e venda de álcool. Entre-
tanto, o fato de que eles estavam dispostos a ceder uma boa parte de seus
privilégios ligados ao comércio, a empreendedores engajados no
desmatamento de terras, atraindo desbravadores do ocidente, ilustra o quan-
to a escassez de mão-de-obra era premente.
Rússia
Intervenções nos Mercados de Terras. No século XIV, os príncipes, consideran-
do toda a terra de seus principados como seu patrimônio (votchina), doaram
terras aos nobres que podiam fornecer a mão-de-obra necessária para cultivar
a terra e pagar os impostos. Esses senhores, por sua vez, tinham que atrair
camponeses, com termos muito vantajosos. O pagamento em espécie (obrok)
passou a ser o tipo predominante de obrigação do camponês e, devido a limita-
da capacidade de impor aluguéis (barshchina), o cultivo da fazenda-sede era
quase inexistente (Blum, 1961).
Em 1565, Ivan IV confiscou a propriedade (votchina) de quase todos os
antigos principados, e as converteu em terras do estado (oprichnina), usando-
as, então, como doação, em recompensa aos seus soldados. Esses soldados
não receberam a titulação plena, adquirindo apenas os direitos de usufruto sob
domínio de serviço (pomestye), que tornou-se a forma dominante de domínio
laico nobiliárquico. Como resultado, “a posse pessoal das propriedades imobi-
liárias tornou-se o monopólio de uma única classe da sociedade russa – os
soldados do Czar” (Blum, 1961;169). Uma vez que os direitos da terra podiam
ser retomados, a bel prazer pelo Czar, a continuidade da posse da terra ficava
condicionada ao desempenho dos serviços para o Estado. Com efeito, os se-
nhores que não conseguiam pagar, em serviço ou dinheiro, eram despejados, e
essa classe de servidores ficou sujeita a uma grande flutuação. A competição
por trabalho era violenta, e o cultivo das fazendas familiares permaneceu muito
limitado. A situação econômica do servidor era freqüentemente precária, até
que a posse tornou-se gradativamente hereditária no século XVII (Blum, 1961).
Restrições à Mobilidade do Trabalho e Taxação Diferenciada. O grau de escassez
de mão-de-obra é ilustrado pelas restrições cada vez mais severas à mobilidade
dos camponeses agricultores. Entre os anos de 1400 e 1450, o direito dos
colonos de terminar os seus contratos e partir para os domínios de um outro
senhorio, se restringia a duas semanas por ano. Até mesmo os camponeses
eram obrigados a pagar “taxas de saída” exorbitantes (equivalente a 300 alqueires
de aveia ou 120 alqueires de trigo; Blum, 1961), antes de partir. Os proprietários
competiam ferozmente por mão-de-obra e recorriam à “pirataria de mão-de-
obra”, isto é, atraíam trabalhadores de outras propriedades, com promessas de
melhores condições. Na verdade, essa pirataria de mão-de-obra tornou-se “o
principal meio legal pelo qual os colonos se transferiam de um senhor para o
outro”, embora também se lançasse mão de outros meios ilegais (Elum, 1961).
A introdução, em 1588, dos “anos proibidos”, durante os quais o direito dos
agricultores de se movimentar foi suspenso temporariamente, não impediu a
pirataria de mão-de-obra, porque era difícil fazer cumprir a lei. Decretos expedi-
dos em 1597 e posteriormente em 1607, confinaram todos os camponeses aos
lugares onde eles residiam à época do censo de 1592, o que facilitou o cumpri-
mento da lei. O Código de Assembléia, de 1649, que vigorou até cerca de 1850,
aboliu os estatutos de limitação sobre o retorno de camponeses fugitivos para
o seu patrão original. O Código também transformou a servidão em condição
hereditária, ao proibir a mobilidade dos cônjuges e da prole dos camponeses.
Após 1661, as multas impostas sobre o aliciamento de colonos tinham que ser
pagas “em servos”. Para cada trabalhador ilegal flagrado em propriedades dos
senhores, este senhor tinha que ceder uma das famílias de criados residente
América Latina
Chile
Intervenções nos Mercados de Terra. Em meados do século XVI, as câmaras
municipais, livres da fiscalização central de um vice-rei ou governador, que era
comum no México e no Peru, distribuíam terras para os colonos “com a maior
generosidade e (...) a despeito da existência de legislação da coroa dispondo em
contrário” (Bauer, 1980:4). Em contraste com outros países latino-americanos,
onde o direito de cobrar tributo distinguia-se legalmente da doação de terras, e
onde a proteção de fato das terras comunais indígenas era cumprida pelas auto-
ridades centrais, os encomenderos do Chile receberam dotações de terras no meio
de “suas” terras indígenas comunais. Assim, os encomenderos dispunham de
mão-de-obra abundante e barata, de modo que “na altura do ano de 1650, a
El Salvador
Intervenções nos Mercados de Terra. A partir de 1857, as terras públicas eram
doadas a qualquer um que nelas plantasse café, em pelo menos dois terços da
gleba (Lindo Fuentes, 1990). Um amplo programa de titulação de terras, iniciado
em 1882, com o objetivo de acelerar o crescimento da plantação de café, afetou
diretamente cerca de 40% do território do país (Lindo Fuentes, 1990), e deu
Guatemala
Intervenções no Mercado de Terras. Embora os espanhóis tivessem efetuado
algumas doações de terras na Guatemala, no século XVI, a sua principal inter-
venção no mercado de terras foi o reassentamento da população indígena em
vilarejos centralizados, de modo a facilitar a administração tributária e a conver-
são dos índios ao cristianismo. Eles limitavam as suas atividades à pecuária,
para a qual não era necessária a titulação das terras (MacLeod, 1973). Os títulos
que foram emitidos para os espanhóis, mediante doações de terras, tornaram-
se importantes apenas no período 1590-1630, após um redirecionamento para
o cultivo do índigo.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. No início, os espanhóis
tinham pouco interesse no estabelecimento de uma agricultura intensiva,
preferindo cobrar tributo (esse tributo cobrado aos índios contribuiu com
mais de 80% das receitas da Coroa; Brockett, 1990). A partir de 1540, os
tributos passaram a ser cobrados em dinheiro, e a necessidade de uma
renda em dinheiro tornou-se uma força importante, que induziu os índios,
habitantes das terras altas, a migrarem para as áreas das plantações (MacLeod,
1973). Por volta das décadas de 1560 e 1570, os índios que haviam migrado
dos planaltos, constituíam a maioria da população indígena costeira.
A partir de 1600, passou-se a exigir que os chefes das tribos supris-
sem contingentes de trabalhadores (mandamiento) – que podia atingir até um
México
Intervenções no Mercado de Terras. O reassentamento de índios que teve
início em 1540, privou-os de suas terras tradicionais e os colocou em
domínios menores e menos produtivos. Embora a intenção do programa
de reassentamento fosse, primordialmente, levantar dinheiro para a Co-
roa, a venda das terras dos nativos aos europeus, a desapropriação redu-
ziu significativamente a base produtiva da economia agrícola indígena
(Gibson, 1965; Taylor, 1988).
As terras comunais foram expropriadas por volta de 1850 e à medida
que a terra tornava-se gradativamente escassa, abriam-se cada vez menos opor-
tunidades alternativas para potenciais colonos. A desapropriação dos vilarejos
comunais deu origem a duas tendências conflitantes. Por um lado, a mão-de-
obra barata e temporária tornou-se mais prontamente disponível do que antes.
Com isso, do ponto de vista econômico, a dependência no trabalho forçado
tornou-se, aos poucos, desnecessária, nas estâncias da região central do Méxi-
co. Por outro lado, à medida que as estâncias adquiriam cada vez mais terras,
muitas das quais de qualidade medíocre, elas passaram a dar preferência ao
compartilhamento de safras e ao arrendamento. As condições em que viviam
esses assentados eram tão precárias que, muitos deles (...) inevitavelmente
contraíram dívidas, as quais não podiam pagar” (Katz, 1974:41).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Os colonizadores es-
panhóis receberam, após 1490, encomiendas, isto é, direitos sobre
Vice-Reinado do Peru
(atualmente Peru, Bolívia e Equador)
Intervenções no Mercado de Terra. A partir de 1540, tornaram-se comuns as
doações de terras nesta região, com concessões de 120 a 800 hectares, obti-
das com relativa facilidade. Os principais beneficiários eram os encomenderos,
isto é, senhores espanhóis que haviam recebido direitos a serviços braçais de
vilarejos inteiros (ver a seguir), uma vez que sem mão-de-obra para trabalhar a
terra, esta não tinha, virtualmente, nenhum valor. Quando toda a terra reservada
para esse propósito se exauriu, por volta de 1557, as terras indígenas “particu-
lares” foram expropriadas e distribuídas entre fidalgos espanhóis (González,
1985; Davies, 1984).
Nas áreas costeiras, o reassentamento efetuado sob o vice-reinado de
Toledo, em 1570, transferiu os índios para vilas recém instaladas, onde eles
ganharam terras agrícolas, geralmente de qualidade inferior. Em 1589, foram
introduzidos programas destinados a rever a titulação de terras concedidas aos
espanhóis, pelos quais “os espanhóis podiam adquirir legalmente as terras que
haviam usurpado dos índios, mediante o pagamento de uma taxa à Coroa”
(González, 1985:15). Em 1641, o mesmo esquema foi empregado, desta vez
com mais rigor, para melhorar a posição financeira da Coroa Espanhola: houve
expropriações em larga escala de terras indígenas, e toda a terra excedente foi
vendida aos europeus. Os índios “sofreram uma redução considerável de seus
domínios; passaram a possuir as piores terras agrícolas do vale” (Davies,
1984:130). No Vale do Arequipa, os homens adultos casados recebiam terras
cuja área não ultrapassava meio hectare.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Por volta de 1530, asencomiendas
conferiram aos europeus que substituíram os senhores locais, direitos de extrair
tributos (em trabalho braçal, dinheiro ou espécie) de determinadas regiões. Os
detentores desses privilégios (encomenderos) não tinham, pelo menos no início, ne-
nhum tipo de regulação com relação ao volume ou à forma de cobrança desses
tributos (Ramirez, 1986). Ao passo que muitos usavam o tributo pago em trabalho
braçal, para o cultivo das grandes propriedades, o cálculo do tributo em dinheiro
forçou os índios a tomarem dinheiro emprestado, ou a venderem terras abandona-
das para honrarem suas dívidas (Davies, 1984). O direito usufruído individualmen-
te pelos encomenderos, ao uso exclusivo do trabalho braçal dos nativos para serviços
pessoais, foi abolido em 1550 devido, principalmente, à necessidade de mão-de-
obra gratuita nas obras públicas e nas minas. No entanto, permaneceram os de-
mais benefícios das encomiendas.
Com a abolição da encomienda, os espanhóis transformaram a mita, uma
instituição Inca de recrutamento de mão-de-obra para trabalhar em obras públi-
cas, num arranjo permanente de recrutamento de mão-de-obra para o trabalho
nas minas. Além de pagar o tributo ao encomendero, cada vilarejo tinha que suprir
um percentual de sua força de trabalho para “obras públicas”, o que significava,
na verdade, trabalho nas minas. Já que o trabalho nas estâncias espanholas era
isento de mita e de exigências tributárias, muitos trabalhadores do altiplano
passaram a aceitar trabalhar nessas estâncias. Surgiu assim, a classe dos
yanaconas, que residia nas estâncias e havia abandonado totalmente a sua iden-
tidade cultural (Pearse, 1975).
A escravatura foi difundida, a partir de 1580, nos vales costeiros de
cultivo de cana-de-açúcar, algodão e vinho (Davies, 1984). Quando a escra-
vatura foi abolida, as plantações de cana-de-açúcar passaram a contar com
África
Argélia
Intervenções no Mercado de Terra. Com a ocupação francesa, todas as ter-
ras de grupos religiosos e tribais passaram a ser propriedade do Estado. As
terras incultas ou ociosas ficavam sujeitas à titulação, o que permitiu aos
colonizadores adquirirem terras a um valor ínfimo, “que chegava à beira do
roubo” (Ageron, 1991). Em alguns casos, essa titulação deixou os muçulma-
nos com pouco mais de 5% de área de terra, e boa parte da terra declarada
ociosa incluiu as terras de pastagens utilizadas pelos nômades em suas pere-
grinações. Já que o número de assentados permaneceu limitado, diversos
tipos de assentamento (inclusive o estabelecimento de vilarejos nativos) fo-
ram experimentados, para tornar a colônia economicamente viável.
O desejo de impor o domínio francês na Argélia, depois da rebelião
de 1870/71, deu origem ao início de um amplo programa de colonização e
assentamento, entre 1871 e 1872. A um custo altíssimo para o governo,
os colonos ganharam terra e infra-estrutura gratuitas, porém ou venderam
ou cultivaram suas terras com o auxílio de arranjos de compartilhamento
de safra contratados com os nativos (Ageron, 1991). A auto-intitulada “lei
dos colonizadores”, de 1873, permitiu aos europeus adquirir os direitos
sobre vastas áreas de terras das comunidades, com a compra de peque-
nas frações, o que levou ao acúmulo de grandes propriedades, a um custo
baixo (Ageron, 1991).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. A partir de 1849, todos
os árabes foram obrigados a pagar impostos individuais, exceto aqueles
que trabalhavam como compartilhadores de safras ou trabalhadores assa-
lariados, nas fazendas em mãos de europeus (Bennoune, 1988). Ainda as-
sim, embora “eles estivessem sempre dispostos a cultivar para os france-
ses, na qualidade de khammes, ou compartilhadores de colheita”, no começo
do século XX apenas 12% dos árabes trabalhavam como colonos em fazen-
das. Os viticultores franceses dependiam da mão-de-obra estrangeira, em
geral trabalhadores imigrantes dos países mediterrâneos. A provisão dife-
renciada de crédito aos europeus levou a um acelerado crescimento do
cultivo do vinho. As flutuações do mercado, juntamente com mais doações
de terras para os novos e ricos colonizadores resultou na consolidação de
grandes propriedades de cerca de 4.000 e 5.000 hectares.
Angola
Intervenções no Mercado de Terra. Em 1838, e, posteriormente, em 1865,
toda a terra “desocupada” poderia ser doada a europeus, na forma de con-
cessões. “Os colonizadores receberam terras, sementes, implementos e es-
cravos, do governo, e medidas foram tomadas para assegurar a
comercialização de sua produção” (Clarence-Smith, 1979:15). Entre 1907 e
1932, 98 milhas quadradas foram demarcadas como reservas nativas, 4 mi-
lhas quadradas foram doadas aos africanos, juntamente com os títulos, e
cerca de 1.800 milhas quadradas de terras da mais alta qualidade foram doa-
das aos colonizadores portugueses e outros estrangeiros (Bender, 1978).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Mesmo após a abolição
da escravatura interna em 1875, a escravidão persistiu em diversas formas,
mas devido a uma formidável demanda de mão-de-obra para as plantações
de coco em São Tomé, os preços dos escravos subiram rapidamente, tor-
nando mais lucrativo exportar escravos do que usá-los nas ineficientes
propriedades dos colonizadores (Clarence-Smith, 1979). As leis contra va-
diagem, sancionadas em 1875, sujeitaram todos os africanos “improduti-
vos” a contratos de trabalho não-remunerado (Bender, 1978). As leis foram
substituídas, em 1926, por leis nativas, que restauraram os salários, mas
mantiveram o dispositivo que determinava que todos os africanos eram
obrigados a trabalhar para patrões europeus, ou poderiam ser contratados
pelo Estado (Henderson, 1980).
Egito
Intervenções no Mercado de Terras. As doações de terra efetuadas na década
de 1840, concederam cerca de 40% da terra para senhores turcos e egípcios, e
facilitaram a formação de vastas propriedades (Richards, 1982). A expropriação
de terras comunais, ocorrida entre 1850 e 1870 fortaleceu esta tendência. Em
1856, os impostos territoriais (por alqueire), que incidiam sobre as pequenas
propriedades, eram entre quatro a seis vezes maiores do que para as grandes
propriedades (Richards, 1982) e, em muitos casos, os grandes proprietários
sequer pagavam impostos (Owen, 1986).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Contrariando a prática usual,
os otomanos do século XVI não distribuíram as terras egípcias para os chefes
militares, mas coletavam imposto coletivo. Eles tentavam evitar a interrupção da
produção agrícola no Egito, “o celeiro do Império Otomano” (Richards, 1983:7).
Trabalhadores em regime corvéia foram recrutados, inicialmente para obras pú-
blicas, para construir um extenso sistema de irrigação e, mais tarde, para a produ-
ção de algodão nas fazendas-sede dos patrões. Seguindo-se às doações de ter-
ras efetuadas na década de 1840, “os grandes proprietários passaram a empregar
trabalhadores em regime corvéia em suas propriedade, ao mesmo tempo em que
conseguiram isentar os seus colonos desse mesmo regime (Richards, 1982:23),
assemelhando-se aos eventos das estâncias latino-americanas.
Quênia29
Intervenções no Mercado de Terra. Com a chegada dos europeus, toda a terra
desocupada foi declarada como terra da Coroa e vendida aos colonizadores
europeus, em condições extremamente favoráveis. Boa parte da terra conti-
nuou a ser cultivada por colonos africanos, que eram chamados de grileiros
(Mosley, 1983). Os direitos dos africanos sobre a terra ficaram limitados às
reservas, e uma proibição formal de transações de terras, por africanos, fora
dessas reservas, foi decretada em 1926.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Os britânicos impuseram
inúmeros impostos domiciliares e individuais, de modo a “aumentar o custo de
vida dos nativos” (Berman, 1990:509). Inicialmente, os africanos não buscaram
trabalho assalariado, para pagar esses impostos. Em vez disso, aumentaram a
produção, basicamente em terras arrendadas. Apesar dos insistentes pedidos,
por parte dos colonizadores, em favor da concessão de isenção de impostos
para os africanos que se dispusessem a trabalhar nas propriedades dos euro-
peus, eles não foram atendidos. Assim, as grandes propriedades, baseadas no
trabalho assalariado, permaneceram relativamente pouco lucrativas, em com-
paração com o arrendamento.
Uma lei promulgada em 1918 determinou que os colonos teriam que
prover pelo menos 180 dias por ano de serviços braçais a seus senhores, com
um salário que não podia exceder dois terços do salário da mão-de-obra
desqualificada. Esse dispositivo legal foi sujeito a duas revisões (em 1926 e
1939), em ambos os casos para aumentar a quantidade mínima de serviço
braçal (que aumentou para 270 dias por ano, em 1939). A lei também limitou a
área destinada ao cultivo pelos colonos e tornou mais fácil o despejo. Os
passes de trabalho, que haviam sido introduzidos em 1908, limitavam a mobi-
lidade dos africanos. Partir, sem o consentimento do patrão, era considerado
crime (Berman, 1990).
Intervenções nos Mercados de Insumos e Produção. Um sistema dual de pre-
ços, adotado nos anos trinta, reduziu os lucros que os agricultores africa-
29
Para maiores detalhes sobre o Quênia, África do Sul e Zimbábue, ver Deininger e Binswanger, 1992.
nos poderiam auferir pelo mesmo produto ofertado pelos agricultores euro-
peus e, além disso, descarregou a maior parte do risco de preço nos africa-
nos (Mosley, 1983).
Para as culturas mais importantes, formaram-se associações de
plantadores, que excluíam os africanos. As altas taxas de licenciamento manti-
veram os africanos fora da produção de piretro. Eles eram também terminante-
mente proibidos de plantar café (Berman, 1990). Durante a Segunda Guerra, os
fazendeiros europeus receberam subsídios diretos para mecanizarem suas ter-
ras (Cone e Lipscomb, 1972).
Califado de Sokotho
(Atualmente Burkina Faso, Camarões, Níger e Norte da Nigéria)
Intervenções no Mercado de Terra. A partir de 1804, a terra foi doada aos
colonizadores pelo governo do califado, nas áreas em torno dos centros de
defesa. A quantidade de terra dependia da quantidade de escravos que o se-
nhorio possuía. Assim, “qualquer pessoa que possuísse escravos poderia ga-
nhar terra e dar início a uma plantação” (Lovejoy, 1980). Havia entre 100 e 200
escravos por plantação, embora alguns registos apontem a existência de pro-
priedades com mais de 1.000 escravos (Lovejoy, 1978).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. O padrão de escravidão nessa
área, habitada por Hauçás e Fulanis, não era diferente do padrão encontrado em
muitos pontos da África no século XIX (Lovejoy, 1980)30 . Os escravos, que perfazi-
am entre 50% e 75% da população local, eram adquiridos por meio de conflitos
armados, captura direta, ou tributo, pago por tribos subjugadas. O limitado merca-
do de exportação e o preço relativamente baixo dos escravos (os senhores podiam
repor seu estoque de mão-de-obra cativa mediante ataques de surpresa (reides)
Lovejoy, 1980), permitia um tratamento relativamente brando para com os escra-
vos, que desfrutavam, inclusive, de mais direitos do que os escravos comprados
para as plantações nas Américas. Esses direitos incluíam, por exemplo, a posse de
lotes hereditários (Hogendorn, 1977), e o direito à auto-alforria, resgatada com
recursos acumulados com o cultivo de terras excedentes (Hill, 1978). No entanto,
a ausência de economias de escala impunha que os donos de escravos tomassem
providências para impedir que os escravos fugissem, e estabelecessem os seus
próprios domínios (Hogendorn, 1977). Eventualmente, esses fatores levaram ao
desaparecimento dessas grandes propriedades (Hopkins, 1973).
Malawi
Intervenções no Mercado de Terras. Em 1894, os europeus ganharam mais de
1,5 milhão de hectares, ou seja, 15% do total das terras agricultáveis.
30
A literatura apresenta algumas discussões sobre a nomenclatura apropriada para esse sistema, que combina elementos de
escravidão e servidão.
Moçambique
Intervenções no Mercado de Terras. No início do século XIX, foram conce-
didos direitos exclusivos sobre terras, e um poder quase de governo, a
arrendatários (em geral companhias), por um período de três gerações, sob
o regime de prazo. O detentor do prazo era obrigado a fornecer um mínimo de
serviços públicos, cultivar parte da propriedade, pagar um dízimo, mas po-
dia cobrar tributos (em dinheiro, espécie ou trabalho) da população local e
(ver a seguir) tinha o completo monopólio sobre todo o comércio, dentro e
fora da área (Vail e White, 1980).
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Os impostos sobre os domi-
cílios foram estabelecidos em 1854. A partir de 1880, pelo menos a metade dos
impostos tinha que ser paga ao detentor do prazo na forma de serviços braçais
(Vail e White, 1980).
Pela Lei contra a Vadiagem, todos os africanos do sexo masculino entre
catorze e sessenta anos eram legalmente obrigados a trabalhar. A área das
lavouras a serem cultivadas, ou o trabalho assalariado exigido para preencher
essa obrigação, podiam ser mudados segundo a vontade dos senhores, o que
lhes deu muitos instrumentos para aumentar o suprimento de mão-de-obra.
Contingentes de mão-de-obra itinerante eram “vendidos” com freqüência para
outras áreas (como a África do Sul), onde a mão-de-obra era relativamente
escassa (Vail e White, 1980). As leis de vadiagem foram abolidas em 1926 –
mais ou menos à época da expiração dos prazos – e o uso de trabalho forçado
para “objetivos particulares” (isto é, produção sem quota) foi proibido. A lei
trabalhista de 1942 instituiu uma exigência de trabalho de seis meses para
todos os africanos do sexo masculino.
Intervenções nos Mercados de Insumos e de Produção. Em 1892, foi abolido todo
o comércio itinerante dentro dos prazos, o que conferiu o monopólio aos deten-
tores dos prazos sobre todo o comércio (Vail e White, 1980:132). Os prazos
transformaram-se numa espécie de mini-estado, cada qual com sua economia
fechada própria. Os detentores dessas áreas tinham liberdade ilimitada para
determinar os termos do comércio, e privaram os comerciantes de prover uma
saída para seus produtos “que tinha tornado a produção camponesa tão atra-
ente para a população local”. Os africanos se afastaram quase que completa-
mente da produção agrícola e os prazos transformaram-se em “ilhas particulares
de mão-de-obra, as quais as companhias, por força direta ou pela manipulação
indireta da economia, podiam compelir a bel prazer” (Vail e White, 1980:132).
Após a sua expiração em 1930, os prazos foram substituídos por um “sistema
de concessão”. Os concessionários recebiam direito de monopólio para com-
prar algodão e arroz, a preços baixos, administrados pelo Estado, de plantadores
africanos, em troca do cumprimento das obrigações de trabalho dos africanos,
além de fornecerem insumos para a fiscalização (Isaacman, 1992). Embora a
cobrança de impostos dos africanos continuasse rigorosa (forçada), toda a
produção, à exceção do açúcar, reverteu para as fazendas de menor escala, em
vez das grandes fazendas.
África do Sul
Intervenções no Mercado de Terras. As reservas nativas já estavam firmemen-
te estabelecidas no final do século XIX, embora só tenham sido legalmente
definidas em 1912. Por exemplo, no Transvaal, em 1870, a área alocada para as
reservas africanas perfaziam apenas um centésimo da área concedida aos bran-
cos (Bundy, 1985). Dentro das reservas, a Lei Glen Grey (1894) restringiu a
posse de terra a lotes que não podiam exceder três hectares e instituiu uma
forma perversa de “arrendamento comunal”, que proibia a venda, o aluguel e a
subdivisão da terra, de modo a evitar o surgimento de uma classe de pequenos
proprietários africanos independentes (Hendricks, 1990). A incapacidade de
vender terras nas reservas, que persiste até hoje, é reconhecida como sendo
um dos grandes motivos da baixa produtividade da agricultura nas terras an-
cestrais (Lyne e Nieuwodt, 1991).
Os inúmeros dispositivos legais, que foram preparados com o intuito de
desencorajar o arrendamento das propriedades em mãos de europeus, tais
como a imposição de limites sobre a quantidade de colonos por fazenda (1895)
e a instituição de taxas de licenciamento para os colonos (1896), não conduziu
aos resultados esperados. A Lei de Terras Nativas, 1912, circunscreveu a exten-
são das reservas africanas e declarou o arrendamento ilegal, nas fazendas dos
europeus, forçando todos os colonos africanos a tornarem-se ou trabalhado-
res assalariados ou retornarem às suas reservas.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Antes da intervenção do
Estado em seu favor, uma quantidade muito pequena da produção de mercado
dos agricultores europeus se baseava no trabalho escravo, ou (após a abolição
da escravatura em 1834) em trabalho servil.
A Lei dos Patrões e dos Servos e a Lei das Minas e Mineiros, 1911,
restringiram a mobilidade ocupacional dos africanos e os excluíram das profis-
sões especializadas, em todos os setores, com exceção da agricultura (Lipton,
Zimbábue
Intervenções no Mercado de Terras. Em 1896, foram estabelecidas as reservas
para os povos africanos, em áreas remotas, de baixa fertilidade, embora as
fronteiras dessas reservas tenham sofrido alterações até 1931 (Palmer, 1977),
quando as transações de terras fora das reservas, e as “Áreas de Compra para
Africanos” foram declaradas ilegais.
Tributação Diferenciada e Impostos Trabalhistas. Embora todos os africanos
fossem obrigados a pagar impostos individual e domiciliar, a partir de 1909,
impostos específicos passaram a impor discriminação sobre o aluguel em di-
nheiro e o compartilhamento do arrendamento (Palmer, 1979). A expectativa de
se aliviar (temporariamente) a carga tributária, resultou numa migração maciça
de africanos em direção às reservas, onde os preços das commodities era extre-
mamente baixo, no início dos anos vinte (Arrigi, 1970).
Intervenções nos Mercados de Insumos e de Produção. A volatilidade e a que-
da dos mercados de produção foram suavizadas por intervenções governa-
mentais, tais como o aumento de empréstimos bancários para a compra de
terras, e a moratória da dívida (principalmente durante a depressão, em
1930). Um intenso lobby, efetuado pelos produtores europeus, levou ao
estabelecimento de conselhos de monopólios comerciais (para o tabaco,
laticínios, suínos e algodão) em lavouras selecionadas, e à criação de subsí-
dios à exportação.
Os produtores de milho e pecuaristas africanos foram discriminados
pelos sistemas de preços duais. As pressões dos mineiros europeus, que ti-
nham interesse no suprimento de milho barato, limitaram o grau de discrimina-
ção contra os produtores africanos. As exigências de quarentena sobre as
vendas de gado africano, inicialmente levaram ao acúmulo de grandes reba-
nhos, e a degradação do solo nas reservas. Para resolver o problema, foi decre-
tada uma queima de estoque em 1939. Os preços pagos pelo gado africano
situavam-se entre um terço e um sexto dos preços cobrados por estoques
europeus equivalentes (Mosley, 1983).
Anexo 2
Como as imperfeições de mercado afetam o tamanho da fazenda –
uma relação de produtividade.
F/A →∞
Com N trabalhadores contratados por alqueire agricultado e um total de
F membros do domicílio, o insumo efetivo de trabalho é dado por
L = F . ê + A . N . e (F/A). (2)
31
Este anexo baseia-se em Feder (1985).
ψ/ A . A = 0 (7b)
. . (8a)
(8b)
. θ (9a)
(9b)
(10)
(12)
Glossário
Independente de suas origens culturais ou ideológicas, os termos abaixo
são usados, neste texto, com a definição dada a seguir:
Fazenda coletiva: uma fazenda de propriedade conjunta e operada
por uma administração única, para o benefício de, e com o insumo de trabalho
dos proprietários do coletivo.
Sistema de propriedade comunal: um sistema de propriedade de terra
pelo qual determinadas frações de terra são alocadas, temporariamente ou perma-
nentemente aos membros para o cultivo familiar, enquanto que outras áreas são
mantidas em comum, para pastagem, florestas, colheita de plantas silvestres e
caça. Os lotes individuais podem ou não ser hereditários ou comercializáveis nos
mercados internos de venda ou arrendamento. Todavia, a venda para não-mem-
bros é sempre proibida ou sujeita à aprovação da comunidade.
Safra negociada: um contrato entre o fazendeiro e um comprador, em
antecipação ao plantio, pela quantidade específica, qualidade e data de entrega
de uma safra agrícola, a um preço ou fórmula de preço antecipadamente acerta-
do. O contrato fornece ao agricultor uma venda garantida da safra e, por vezes,
inclui assistência técnica, crédito, serviços ou insumos pelo comprador.
Corvéia: trabalho não-remunerado e, eventualmente o serviço de ani-
mais de tração fornecido por colonos, arrendatários ou detentores de direitos
de usufruto ao proprietário do latifúndio.
Dívida de peonagem, serviços por trabalhos não-realizados: um
pagamento de tributos ou serviço braçal originário de dívidas não-honradas.
Fazenda familiar: uma fazenda que opera, primariamente, por meio de
trabalho familiar, com algum nível de contratação. Os sistemas de fazendas
familiares podem ser estratificados socialmente, com uma ampla dispersão
nos tamanhos das glebas e nos níveis tecnológicos.
Estância: um latifúndio no qual parte da propriedade é cultivada como
própria do seu dono, e outra parte é cultivada na forma de fazendas familiares
de serviçais, detentores de direitos de usufruto ou arrendatários.
Fazenda-sede: aquela parte do latifúndio ou grande propriedade culti-
vada pelo senhorio, arrendatário ou proprietário, sob sua própria administra-
ção, que utiliza corvéia e, às vezes, trabalho parcialmente remunerado.
Propriedade do senhorio: um latifúndio onde toda a terra é cultivada pelos
arrendatários ou pelos detentores dos direitos de usufruto.
Propriedades junker*: uma grande propriedade, que produz um con-
junto diversificado de bens, operada sob uma administração única, com traba-
* Nota do Tradutor: Junker: (Hist.) Na Alemanha, um junker era um membro da classe privilegiada, militarista, latifundiária;
aristocrata prussiano.
lho contratado. Os trabalhadores não recebem uma fração de terra para seu
próprio cultivo, como parte de sua remuneração, à exceção, talvez, de uma
casa com um quintal.
Grande fazenda comercial: uma grande propriedade que produz uma
variedade de produtos, operada por uma única administração, com alto grau de
mecanização, utilizando a contratação de poucos trabalhadores de longo pra-
zo, os quais podem residir na fazenda, ou trabalhadores sazonais que não têm
residência fixa permanente no local.
Latifúndio: uma área de terra alocada temporariamente ou perma-
nentemente como de propriedade permanente a um senhor feudal, que
detém os direitos de cobrar tributos, ou pagamentos em dinheiro, em
espécie ou em corvéia, dos colonos que vivem na propriedade. Neste
documento, o termo é usado tanto para os colonos que lá trabalham por
livre escolha, quanto para aqueles que estão ali retidos por restrições à
sua mobilidade. Os latifúndios podem ser organizados como proprieda-
des do senhorio ou como estâncias.
O termo rent (receita, aluguel) é utilizado de diferentes formas:
• Receita residual: o pagamento residual por um fator de produção em
oferta não-elástica, após a remuneração de todos os fatores a suas respectivas
taxas de mercado, com o mercado competitivo ou não.
• Receita rent-seeking: a recompensa adicional recebida como resultado de
regulações e restrições, que aumentam o nível da receita acima de seu nível não-
distorcido. Proceder à medição dessa receita em mercados fracos e pouco com-
petitivos pode ser bem difícil.*
• Aluguel da terra: O pagamento feito pelo arrendatário ao proprietário,
em relação contratual voluntária. O aluguel pode ser pago como pagamento
fixo ou proporcional, em espécie ou trabalho físico. Pode ou não ser igual à
receita residual. Se a reserva de utilidade dos arrendatários for reduzida por
distorções ligadas ao rent-seeking, a receita da terra incluirá um componente de
favorecimento político
Reserva de utilidade ou reserva de salário: o nível de utilidade
(incluindo os atributos de risco), ou o salário que está disponível fora do lati-
fúndio, para um potencial arrendatário ou trabalhador do latifúndio.
Contrato de parceria: um contrato de aluguel pelo qual o agricultor
paga uma parte ou a totalidade de seu aluguel com a entrega de determinada
proporção da produção, a parte da safra, ao proprietário.
* Nota do tradutor: O termo rent-seeking, também chamado de political parasitism – parasitismo político, foi cunhado (ou, pelo
menos, popularizado na economia política moderna) pelo economista Gordon Tullock, para designar a troca de favores entre
políticos, latifundiários e empresários, para se beneficiarem mutuamente de vantagens advindas de regulações de seu
interesse, e da criação de tributos e taxas indevidas. Rent-seeking rent pode ser traduzido como receita de favorecimento
político ou receita de conchavo.
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Pranab Bardhan
Universidade da California, Berkeley
Samuel Bowles
Herbert Gintis
Universidade de Massachusetts, Amherst
Agradecimentos a Jean Marie Baland, Roland Bénabou, Timothy Besley, Michael Carter, Gregory Dow, François Bourguignon, Karla Hoff
e Eric Vehoogen pelos subsíduos na elaboração desse artigo. Nós gostaríamos de agradecer Jeffrey Dayton-Johnson* e Yongmei Zhou pela sua
assistência de pesquisa e ao financiamento concedido por MacArthur Foundation.
Os ingleses estão imbuídos daquela doutrina, que é pelo menos questionável,
de que as grandes propriedades são necessárias para o melhoramento da
agricultura, e eles parecem estar convencidos de que a extrema desigualdade
de riqueza é a ordem natural das coisas.
1. Introdução
S
abe-se que se os contratos executáveis sem custo regulassem todas as
ações dos agentes econômicos no sentido do bem-estar dos demais,
os equilíbrios competitivos seriam equilíbrios eficientes de Pareto não
obstante a distribuição de riqueza. Todavia, onde as ações tais como tomada
de risco e trabalho árduo não estão sujeitas a tais contratos, a atribuição de
reivindicação residual sobre o fluxo de rendas e o controle sobre os ativos
afetarão a viabilidade, o custo e a efetividade das provisões contratuais e dos
outros dispositivos de incentivo que podem ser usados, entre outras coisas,
para abrandar os problemas que surgem do fato de os contratos serem incom-
pletos e não exeqüíveis. Nesse sentido, como será apresentado nesse artigo,
algumas distribuições de ativos dão sustentação a alocações eficientes ou
quase eficientes, enquanto outras impedem uma organização contratual indutora
de eficiência. O difundido uso dos contratos de propriedade residencial e agrí-
cola são alguns exemplos do que veremos mais adiante. Dessa forma, merca-
dos onde os contratos são incompletos ou não executáveis, como acontece
nos mercados de trabalho e de crédito, a distribuição de riqueza tem um impor-
tante papel para a eficiência alocativa.
Os contratos incompletos e não executáveis surgem quando os agentes
econômicos têm informação que ou é privada ou é inadmissível do ponto de
vista do procedimento judicial e, portanto, não pode ser usada para se fazer
cumprir os contratos. Um contrato incompleto também pode surgir nos casos
onde as instituições judiciais são deficientes, como no caso da dívida soberana
2
Apresentamos estudos recentes que sugerem que algumas classes de redistribuições igualitárias podem ter efeitos positivos
de eficiência. Veja além dos trabalhos citados acima Legros and Newman (1997), Moene (1992), Manning (1992), Mookerjee
(forthcoming) e Bénabou (1997). O argumento exposto tem sido modelado por muitos autores utilizando as recentes teorias
de salário eficiência baseadas na nutrição.
3
Assumimos nesse artigo que “o nível de risco socialmente ótimo” para um projeto individual é aquele que maximiza o retorno
esperado. Isso é estritamente verdadeiro somente se existem muitos projetos individuais e os retornos a esses projetos são
não correlacionados, ou se são correlacionados existe algum mecanismo macroeconômico para suavizar os retornos entre
os períodos a custo zero.
4
Bénabou (1996) encaminha esse problema por meio do desenvolvimento de uma medida de “eficiência econômica que
incorpora os efeitos do investimento, os efeitos da oferta de trabalho e os efeitos do seguro, mas não involve quaisquer
comparações de utilidade”. (p.13). Ele conclui isso fazendo a distinção entre a elasticidade intertemporal de substituição
dos indivíduos (a qual é incorporada na sua medida, juntamente com a aversão ao risco) e a estimação igualitária da
elasticidade de substituição interpessoal da sociedade, que ele trata separadamente como uma medida normativa (mas
não eficientemente relacionada).
5
Para a primeira relação ver Alesina and Perotti (1996), Barro (1996), Keefer and Knack (1995), Perotti (1992) e Perotti (1993) e
para a segunda relação todas as referências anteriores mais Svensson (1993) e Venieris and Gupta (1986). Todavia, a esses resultados
em corte transversal podem fornecer pouca compreensão a respeito da relação no tempo dentro dos países. Este fato é verificado
devido à falha na medida de desigualdade, na verdade obteve-se coeficiente predito negativo no modelo de efeitos fixos em um país
ao predizer investimento (Benhabib and Speigel, 1997). Na realidade seu coeficiente é positivo e significante.
6
Robinson (1996) resenha as interações entre as distribuições de riqueza e equilíbrio político afetando as políticas macroeconômicas,
a redistribuição explícita, políticas em direção aos sindicatos trabalhistas a distribuição de direitos políticos.
7
Nós nos referimos a literatura empírica relevante como um todo. Lazear (1996) estudou uma mudança da remuneração horária
para a remuneração por peça em uma grande companhia dos Estados Unidos da América e encontrou efeitos de produtividade
extremamente amplos. Semelhantemente, um estudo dos efeitos da mudança na gerência assalariada para a gerência por um
reivindicante residual (bem como mudanças em outra direção) numa grande cadeia de restaurantes norte americanos revelou
fortes efeitos de reivindicação residual (Shelton, 1957).
8
Ver Stiglitz (1974), Gintis (1989), Banerjee and Newman (1993), Rosensweig and Wolpin (1993), Galor and Zeira (1993), Bowles
and Gintis (1994), Barham, Boadway, Marchand and Pestieau (1995), Hoff and Lyon (1995), Hoff (1996b), Legros and Newman
(em andamento), Aghion and Bolton (em andamento), Bénabou (1996), Piketty (em andamento).
9
Ver também Evans e Leighton (1989).
Retorno B
Esperado αβφ (p)
opt *
0 p P 1 p
Probabilidade de falha
Benefícios
e custos
marginais 0 c
− (1 − )(1 + r)
αk
c
-- (1-- -------)(1+r)
β αk
φ `(p )
k φ′
11
Isto é verdade porque se diferenciando totalmente a equação de iso-lucro
Probabilidade de falha
C
B
A
Função melhor
resposta do
produtor
Curvas de p*=p*(r)
iso-lucro do
produtor
Taxa de juros
1 αk − c
p* = + (1 + r ) .
2 2αβ
12
A prova desse e dos teoremas subseqüentes não estão incluídas no artigo, no entanto, estão disponíveis com os
autores.
Projeto
Projeto de
de
tamanho
Tamanho
grande
grande
p
Função de
Probabilidade melhor
de falha P(r; α,β,c)
resposta
Projetos de alta
qualidade ou
grande lucro
r
0
Taxa de juros
p * (r) + ρ ,
r= (5)
1 − p * (r)
O ponto B na Figura 4 ilustra tal equilíbrio. Esta figura se sobrepõe às curvas de
iso-retorno esperado do concessor de empréstimos sob parte da Figura 2.
p (r; , , )
p*
B Função de melhor resposta
para o produtor
opt
A
p
opt
p=p
r* taxa de juros r
Teorema 2. Existem projetos produtivos que não podem ser totalmente financiados.
A razão por trás do Teorema 2 é que uma vez que a melhor resposta para
o produtor é selecionar p > p opt , o fato de o projeto ser produtivo, isto é, que
βφ ( p opt ) > k (1 + ρ ) , não assegura que o retorno esperado para o concessor
de empréstimos se iguale ou exceda (1 + ρ ) quando p*(r) é escolhido pelo
produtor ao invés de p opt . Assim, a função de melhor resposta de um produtor
desprovido de riqueza com um projeto produtivo não necessariamente inter-
cepta a curva de iso-retorno do concessor de empréstimos. Nesse sentido, tais
produtores não serão financiados. Existem, desse modo, projetos produtivos
que não podem ser totalmente financiados.
Estamos particularmente interessados naqueles casos onde os projetos
não podem ser totalmente financiados. Nesta situação, existirão três tipos de
produtores com projetos de qualidade equivalente. Um grupo, que chamare-
mos restrito por crédito, que será incapaz de financiar até mesmo o projeto de
tamanho mínimo, indiferente ao valor de λ. Um segundo, o chamado irrestrito,
tem riqueza suficiente para financiar projetos acima do tamanho mínimo. Eles
selecionam o tamanho do projeto, dada a sua riqueza, para implementar a taxa
ótima de alavancagem λ = 1 − c αk . Um terceiro grupo, o restrito por
*
a) para ω < ω , não existe um empréstimo garantido pelo capital factível, então
o produtor não pode financiar o projeto;
b) para ω ≥ ω
(i) existe um empréstimo garantido por capital factível, o produtor contribui
com um montante próprio de riqueza c=ω e o projeto é empreendido;
(ii) a probabilidade de falha p escolhida pelo produtor excede popt, então a
escolha do risco não é eficiente de Pareto;
−−
c) para ω ≤ ω < ω os produtores são restritos por tamanho e
(i) o risco declina e a eficiência do projeto aumenta com o crescimento da
riqueza do produtor;
(ii) a taxa de retorno sobre a riqueza do produtor, αβφ / ω, aumenta com o
crescimento da sua riqueza;
−−
d) para ω ≥ ω os produtores são irrestritos, logo o nível de risco escolhido e a taxa
de retorno são independentes da riqueza, e o tamanho do projeto aumenta com
a riqueza do produtor. Portanto, o retorno total do projeto aumenta com a
riqueza do produtor.
A parte (a) é uma extensão imediata do Teorema 2: se os produtores
com riqueza zero são restritos por crédito, o mesmo será verdade para
aqueles produtores com qualquer nível de riqueza insuficiente para produ-
zir uma função de melhor resposta que intercepte a curva de iso-retorno do
concessor de empréstimos.
Os dois limites da riqueza podem ser interpretados como segue. O limite
inferior é aquele onde o nível de riqueza para o qual a função de melhor resposta
do produtor é tangente a curva de iso-retorno do concessor de empréstimos
competitivo. O limite superior é o nível de riqueza para o qual o tamanho mínimo
do projeto implementa o grau ótimo de alavancagem, dada a riqueza do produtor
−−
(isto é,ω = kλ∗ ).
Para ver porque o concessor de empréstimos contribui com tanto capital
quanto possível para o projeto (parte b(i) do teorema), note que dada a condição
de equilíbrio do mercado de crédito competitivo (5), a função objetivo do produ-
tor pode ser escrita como:
Teorema 4. Para qualquer ω > 0, existe um nível de qualidade β _ (ω) tal que o projeto
do produtor será financiado quando β ≥ β _ (ω). O nível mínimo de riqueza ω para o qual
o projeto do produtor pode ser financiado decresce à medida que a qualidade β desse projeto
aumenta. Para uma dada riqueza do produtor ω, o tamanho do projeto ótimo α (ω) é uma
função crescente da sua qualidade β para β ≥ β _ (ω).
Os Teoremas 3 e 4 estão ilustrados na Figura 5. O segmento de reta AA′
separa as regiões do projeto factível (ao noroeste e à direita de α = 1) e do projeto
não-factível (sudeste) para o produtor de riqueza ω0, projetos maiores são capa-
zes de serem convertidos em ativos se eles são de qualidade superior. O seg-
mento de reta CC′ refere-se ao produtor mais rico. É fácil verificar que dos dois
agentes com projetos de mesma qualidade β _ (ω0), o agente mais rico pode ter
um projeto maior (de tamanho α (ω1) no ponto B) do que o agente menos rico
(tamanho α (ω0) no ponto A). Além disso, o agente mais rico pode financiar um
projeto de qualidade menor (qualidade β _ (ω1) no ponto C) do que a qualidade
mínima que pode ser financiada por um agente menos rico (que é de qualidade
_ (ω0) no ponto A).
β
Tamanho Mínimo A′
do Projeto Factível
Qualidade = 0
C′
do Projeto
A = >
( ) 1 0
− 0
B
( )
− 1
C
=1 >1
( 0 ) ( 1 )
Tamanho do Projeto
Figura 5: A riqueza elevada permite que projetos de alta e baixa qualidade sejam
financiados.
Taxa
de
juros
Retorno
v
+ρ
ω
ω−
ϖω Riquezaω
Teorema 5. Suponha que todos os projetos sejam da mesma qualidade. Se alguns produ-
tores são restritos por crédito, uma redistribuição da riqueza dos concessores de empréstimos
para os tais produtores será indutora de eficência. Se alguns produtores são restritos por
tamanho enquanto outros são irrestritos, a transferência de ativos de um produtor restrito por
tamanho para um produtor irrestrito mais rico pode ser indutora de eficiência.
A primeira parte do teorema vem do fato de que os concessor de emprés-
timos recebem um retorno esperado αk (1 + ρ ) sobre o investimento de αk ,
enquanto que o produtor restrito por crédito recebe um retorno esperado
αβφ ( p ) > αk (1 + ρ ) sobre o seu investimento. A segunda parte do teorema
segue do resultado de que os agentes irrestritos selecionam níveis de risco
menores (e, portanto, são Pareto superiores). Suponha que a transferência seja
grande o suficiente para converter o produtor restrito por tamanho a condição
de não produtor restrito por crédito. Então o efeito da transferência é simples-
mente expandir um projeto que será operado de uma maneira menos excessiva-
mente arriscada, uma vez que o projeto que é executado de maneira muito
arriscada foi eliminado.14
Nós agora relaxaremos duas hipóteses simplificadoras. Suponha primei-
ro que a qualidade do projeto β varie entre os produtores. Nós sabemos, do
Teorema 4, que em situações onde tanto a qualidade do projeto e quanto a
riqueza do produtor diferem, poderão existir projetos superiores que não sejam
viáveis devido a insuficiência de riqueza do produtor, enquanto que projetos
inferiores são financiados. Esta conclusão motiva um resultado importante que
é consistente com nossa pretensão de que a redistribuições igualitárias de ati-
vos indutoras de eficiência são possíveis.
Teorema 6. Suponha que os indivíduos tenham projetos que difiram em qualidade e, que
alguns projetos produtivos sejam restritos por crédito enquanto outros sejam restritos por
tamanho. Sendo assim, pode existir uma transferência de ativos indutora de eficiência dos
produtores mais ricos para aqueles restritos por crédito.
13
Zimmerman e Carter (1997) calibraram um modelo de escolha de portfólio dinâmico desse processo, usando dados de três
regiões de Burkina Faro. Birdsall, Pinckney e Sabot (1996) desenvolveram um modelo de incentivos a poupança para famílias
pobres restritas por crédito.
14
Note que as trocas voluntárias não ocasionarão esta mudança indutora de eficiência desigual, uma vez que o agente mais rico
não deseja tomar emprestado nem mesmo a taxa de juros livre de risco.
α [1 – s ( α ) ] b f ( p ) , (7)
onde s(1) = 0, s’(α) > 0 para α ≥ 1, e s(α) ≥ 1 para α suficientemente grande.
Nesse sentido, nós temos:
que aqueles agentes com maior riqueza. Aqueles agentes com riqueza suficiente
para assumir a reivindicação residual total – abandonando a tomada de emprés-
timos – adotam o nível de esforço e fazem a escolha do risco que é Pareto
eficiente. Quando as redistribuições de ativos afetam a redistribuição de reivin-
dicação residual, conforme foi visto, elas podem atenuar ou eliminar as distorções
alocativas apresentadas acima.
3. Contratos da terra
15
Ver, por exemplo, Berry e Cline (1979) e Prosterman e Riedinger (1979), capítulo 2. Para uma resenha mais recente da
evidência e das fraquezas metodológicas dos estudos empíricos, ver Binswanger, Deininger e Feder (1995). Existem muitas
razões para essa regularidade, entre elas está a análise dos problemas de agência que nós abordaremos acima (Shaban 1987,
Laffont e Matoussi 1995).
16
Mookherjee (em andamento) desenvolveu um modelo de assimetria de informação onde o fato de o esforço do fornecedor não
ser observado gerou ganhos de informação para esse último. Este modelo fornece razões adicionais de porque existe folga para
as vendas de terra mutuamente lucrativas dos proprietários de terra para os arrendatários.
d’ (e*) = H – L (8)
subjeito a
(PC) eh + (1 − e )l − d (e) ≥ m,
(ICC) e ∈ arg max e~ ~
e h + (1 − ~
e )l − d (~
e ),
(LLC) l +ω ≥ 0 .
A restrição (ICC) tem sempre que valer com igualdade, então ela pode
ser substituída pela condição de primeira ordem correspondente, mais pre-
cisamente
h – l = d’ (e ) (9)
sujeito a
λ + µ =1 (12)
λ (l + ω ) = 0 (13)
π = ω + L + e* (H – L – d’(e* )).
Comparando-se (8) e (15), nós verificamos que d’(e* ) < d’(e* ), então a convexidade
de d (e ) implica em e* < e* . Nós concluímos que o nível de esforço do arrendatário
com baixa riqueza é menor do que o nível ótimo de Pareto – que é aquele que
maximiza o excedente conjunto.
Suponha, por contraste, que λ = 0, então a restrição LLC não é ativa.
Nesse caso µ = 1, e a restrição PC vale com igualdade (o arrendatário recebe seu
valor de reserva). Então (11) implica em H – L = d’(e) , logo o nível de esforço é o
e* , como em (8), onde o esforço é totalmente observado e o excedente conjunto
maximizado. Nós observamos que em virtude da restrição PC ser satisfeita com
igualdade (usando (14)), a renda do arrendatário no caso de baixa produção é
agora dada por:
l = m – e* d’(e*) + d(e*),
e satisfaz a restrição LLC, de tal forma que tenhamos
ω ≥ ω* ≡ e*d’(e*) – d(e*) – m
18
Isto acontece porque, dadas as duas restrições, a escolha do proprietário de terra não pode melhorar os seus resultados
em relação às alternativas que apresentam apenas uma restrição, que estão disponíveis para ele fora do intervalo [ω ∗ , ω ∗ ].
19
Para verificar que h aumenta, nós diferenciamos d’(e0 (ω)) – ω com respeito a ω , obtendo d”e’0 – 1 = 1 / e0 – 1 > 0.
Faixa da PC
Faixa da LLC
Participação do proprietário
de terra no produto
Excedente
conjunto Posição de
reserva do
arrendatário
m
Participação do arrendatário no produto
Riqueza do
arrendatário
A razão, que pode ser confirmada pela inspeção da equação (18), é que
acima desse intervalo de riqueza a utilidade esperada do arrendatário é igual a
m +ω e, portanto, acréscimos na riqueza do arrendatário o beneficiam direta-
mente, enquanto que o induzido crescimento no seu esforço (isto é,
de/dω = 1/ed” (e)) beneficia o proprietário de terra, compensando parcialmente
o custo de transferência.
Existe um nível de riqueza ωmax para o qual a terra em questão será
valorizada mais pelo arrendatário do que pelo proprietário de terra, levando-
se em conta o crédito disponível e outras considerações discutidas no
princípio. Como dono, o arrendatário implementará o nível de esforço da
maximização do excedente.
É possível, geralmente em muitos casos, que a posição m de reserva do
arrendatário não seja independente da sua riqueza – como no caso, por exem-
plo, onde a riqueza do arrendatário é representada na forma de coisas sem valor.
Se m varia com ω, e se o nível de riqueza ω∗ é definido como m = m(ω) onde
m’ > 0 , a quota do arrendatário no produto aumentará com a sua riqueza para
ω >ω∗ , com a participação do proprietário caindo de forma não ambigüa para
ω >ω∗ e com o efeito do aumento da riqueza do arrendatário sobre a quota do
proprietário de terra sendo incerto no intervalo ω∗ , ω∗ , e o sinal dependerá do
vigor da relação m(ω).
No modelo até o momento discutido nós consideramos
somente um jogo de um período. No entanto, no modelo multi-período existem
dimensões extras interessantes dos efeitos dos incentivos sobre o arrendamen-
to. O proprietário de terra pode aliviar o problema de subaplicação dos insumos
não-contratáveis usando a ameaça de despejo quando o produto for baixo.20
A ameaça pode ser efetiva em nosso modelo com encargos limitados, dado que
para ω >ω∗ os arrendatários ganham algum renda excedente e acima de sua
renda de reserva m, que eles perderiam se fossem despejados. No modelo de
multiperíodo, afora o esforço do trabalho (e a escolha de outros insumos
correntes), o incentivo para investir pode também ser afetado pela ameaça
de despejo. Tal ameaça pode desencorajar as melhorias de longo prazo
sobre a terra (que freqüentemente são não-contratáveis).21 A possibilidade
de remoção dessa ameaça (digo, por meio do programa de reforma da terra
que forneça segurança para o direito de posse) pode também aumentar o
poder de barganha do arrendatário, e o investimento pode ser encorajado,
uma vez que o arrendatário tem a esperança de conseguir uma maior quota
do produto adicional gerado pelo seu investimento.
Mas, como Banerjee e Ghatak (1996) indicaram, existem duas maneiras
pelas quais a ameaça de despejo pode também ter efeitos positivos sobre os
20
Esta observação se remete a Johnson (1950) e foi formalizada por Bardhan (1984) e Dutta, Ray e Sengupta (1989).
21
Os economistas clássicos enfatizaram esse efeito adverso da insegurança relativa ao direito de posse sobre o investimento. John
Stuart Mill, por exemplo, considerava este como sendo o maior defeito do arrendamento na França. Este efeito é formalizado por
Bardhan (1984) e Banerjee e Ghatak (1996).
Há casos onde não é possível fazer valer contratos completos para servi-
ços de produção (por exemplo: gerentes, trabalhadores ou fazendeiros) determi-
nando reivindicação residual para os produtores para melhorar os incentivos de
produção e, portanto, aumentar a eficiência alocativa. Para que os incentivos
tenham os efeitos desejáveis, a determinação da reivindicação residual para os
produtores deve estar também vinculada a especificação de direitos de proprie-
dade sobre os ativos relevantes. Como argumentamos anteriormente, no caso
onde os produtores possuem riqueza, direitos relevantes nas transações de
mercado garantirão uma atribuição eficiente de direitos. Desta forma, os
beneficiários das transferências dos ativos indutoras de eficiência, por meio de
intervenções de políticas de política econômica, são geralmente aqueles agen-
tes desprovidos de riqueza e, portanto, agentes mais avesos ao risco. Como
22
Se alguns membros de uma população são aversos ao risco e não podem ser segurados totalmente de forma eficinete contra
variações em seus retornos, e se o seu bem-estar tem peso positivo na função de bem-estar social agregada, o nível de risco
socialmente ótimo é menor do que aquele que maximizaria os retornos esperados. Nós assumimos que as escolhas de risco
tomadas a gente pobre em ativos serão menos arriscadas do que o nível socialmente ótimo.
de suas casas, devido às flutuações de médio para longo prazo dos preços
médios das casas na região. Nenhum seguro para tais flutuações está disponí-
vel, mas Shiller sugere que este e outros mercados de seguro similares podem
ser ativados por meio de intervenções financeiras apropriadas.
Por outro lado, muitas tentativas de preservar o pequeno produtor inde-
pendente por meio da disponibilidade de crédito e seguro de safras, fracassaram
(Carter e Coles 1997), essas falhas podem ser devido às formas de seguro que não
são compatíveis com incentivos (Newbery 1989). Por exemplo, segurar safras
individuais reintroduz os mesmos problemas de agência que os observados no
caso do meeiro e no trabalho assalariado. Em contrapartida, como nós mostrare-
mos abaixo, permitir aos produtores que comprem seguro para cobrir alguma
condição geral que esteja correlacionada com o risco da safra individual mas que
não afete os incentivos de produção individual, pode ser eficaz na indução da
tomada de risco por parte dos agentes desprovidos de riqueza sem incorrer em
perdas de eficiência. Um programa de seguro de safras na Índia, por exemplo,
baseou os pagamentos na produção média da safra em regiões agroclimáticas
homogêneas (Dandekar 1985). Ou pagamentos de seguros podem ser baseados
em fontes exógenas de risco em si, se elas são mensuráveis. Um exemplo disso é
o seguro contra enxurradas, onde o produtor paga um prêmio fixo e recebe uma
lista de retornos dependendo da chuva média na região ao longo da estação.23
Semelhantemente, benefícios de seguro desemprego individual estão
às vezes associados à fase do ciclo de negócios ou ao local das taxas de
desemprego.
Seguindo a mesma linha, mostramos abaixo que sob condições razoá-
veis, a redução de exposição dos agentes desprovidos de riqueza a flutuações
estocásticas independentes das suas atividades produtivas pode levar ao
aumento da tomadas de risco na produção e, portanto, pode, de uma outra
maneira, ajudar a sustentar redistribuições de ativos insustentáveis. Platteau,
Murickan, Palatty e Delbar (1980), Sanderatne (1986), e Ravallion, Datt e
Chaudhuri (1993) provêm alguma evidência para este fenômeno.
O modelo desenvolvido abaixo mostra que, a exposição ao risco associ-
ada com a reivindicação residual, produtores pobres em ativos
• podem evitar comprar projetos mesmo quando eles são financeira-
mente capazes de fazê-lo, podem vender ao invés de operar projetos
que são transferidos para eles, e escolher níveis subótimos de risco
para o projeto que eles mantêm ou operam;
• existe uma classe de redistribuições igualitárias de ativos indutoras de
produtividade que não ocorrerão por meio das trocas de mercado; esta
classe de redistribuições igualitárias indutoras de produtividade pode
23
Semelhantemente, a taxação dos lucros agrícolas pode ser baseada em condições de crescimento gerais ao invés daquelas
medidas pelo produto da fazenda, assim combinando seguro e metas de receita-produção.
π (σ ) = σz + φ (σ ) − ρk − m − ω (19)
onde z é uma variável aleatória com média zero e desvio padrão unitário,
ρ é a taxa de juros livre de risco, e φ (σ) é côncava e tem um máximo em
algum σ * > 0.24
O empregador, que é neutro ao risco, maximiza Eπ (σ), que é o valor
esperado dos lucros, dando a condição de primeira ordem
(Eπ)σ = φ’ ( σ ) = 0, (20)
determinando o nível de risco que maximiza o lucro σ∗ . Nós assumimos que o
projeto é parte de um sistema competitivo com livre entrada, então o lucro tem
que ser zero em equilíbrio. Assim, desde que o empregador seja neutro ao risco,
a taxa salarial de equilíbrio ω∗ será dada por
ω * = φ (σ * ) − ρk − m (21)
Suponha que o ganhador do salário considera tornar-se um produtor
independente alugando capital e empreendendo a produção. Para abstrair dos
problemas de disponibilidade de crédito, que nós tratamos anteriormente, nós
assumimos para esse caso que os empréstimos estão livremente disponíveis a
24
Apresentamos argumentos sustentando o formato da função φ (.) na seção 2. Note que no modelo corrente, os produtores
operam do lado esquerdo ao invés do lado direito do máximo de φ (.), desde que nós assumamos a condição de aversão ao risco,
os agentes são não restritos por crédito.
uma taxa de juros ρ, e os juros ρ k são pagos com certeza. O payoff líquido do
produtor independente é então dado por
y(σ ) = σz + φ (σ ) − ρk , (22)
desde que ele seja um autônomo (por conta própria), o produtor não paga salário
nem incorre em custos de monitoramento. Na verdade, o fato de que o produtor
não incorre em custos de monitoramento captura nossa hipótese de que a
eficiência produtiva melhora quando o produtor deixa de ser um assalariado e
passa a ser um reivindicante residual.
Nós assumimos que o produtor exibe medida de aversão ao risco abso-
luta decrescente (isto é, a medida de aversão ao risco de Arrow-Pratt é decres-
cente na riqueza). Nós mostramos em Bowles e Gintis (1997) que a função de
utilidade do produtor pode se expressa como25
u ( y (σ )) = v(σ , µ ( y(σ ))) (23)
onde
25
É sabido a bastante tempo que esta representação é suficiente para representar o comportamento de maximização de
utilidade esperada sobre (σ, µ ) se z é normalmente distribuído. Entretanto, Kolm (1969) e Rothschild e Stiglitz (1970), seguindo
Hardy, Littlewood e Polya (1934), mostram que tal representação é geralmente válida somente se o agente tem uma função
de utilidade quadrática – na verdade um caso altamente restrito. O problema desaparece, no entanto, se as variáveis
aleatórias envolvidas formam uma classe linear no sentido de que todas são funções lineares de uma simples variável aleatória
z. As propriedades básicas da classe linear foram estabelecidas por Meyer (1987) e Sinn (1990) e estão devidamente estendidas
para nossas necessidades em Bowles e Gintis (1997).
que indica que a taxa marginal de transformação do risco nos lucros esperados,
φ`(σ), tem que ser igual à taxa marginal de substituição entre o risco e o resulta-
do esperado, s(σ, µ). O problema do produtor como um reivindicante residual é
descrito na Figura 8. Nesse caso, o produtor escolhe a curva de indiferença mais
alta de v(σ, µ) que satisfaça a restrição (24), que é simplesmente o ponto de
tangência em σ 0 . A aversão ao risco do produtor implica que s(σ, µ) > 0, que por
(25) requer que σ 0 > σ ∗, então o produtor independente escolhe um nível de
risco mais baixo do que aquele escolhido pelo empregador neutro ao risco.
m0
m(s)
σ0 σ
m
m
m( s) = f ( s) − r k
A
w* w*
m
σ σ
(a) σ0 σ* (b) σ0 σ*
26
Os níveis de utilidade correspondendo às curvas de indiferença representados por linhas pontilhadas e sólidas não são,
obviamente, as mesmas. Em particular, a curva de indiferença pontilhada que passa pelo ponto (0, ω ∗ ) corresponde a um nível
de utilidade menor do que a curva de indiferença sólida que passa pelo ponto (0,ω ∗ ), desde que no último caso o agente possua
uma maior riqueza.
Pré-Transferência
m
Pós-Transferência
A
B
w*
σ
σ0 σ*
Figura 10: Exemplo de Redistribuição de um Ativo com Acréscimo de Produ-
tividade.
m v = v0
D
C
F
A
v = vk
w*
B
σ
σ*
Figura 11: A escolha entre os ganhos no retorno esperado e as perdas em
tomar o risco subótimo.
Teorema 12. Uma redução no risco exógeno leva um produtor cauteloso a aumentar o nível
de risco da produção.
A intuição por trás desse resultado é obvia: uma redução no “motivo” do
risco defrontado pelo produtor independente diminui o “custo marginal” da
tomada de risco na produção. Um pouco mais formalmente, nós mostramos em
Bowles e Gintis (1997) que na presença de risco exógeno, podemos descreve o
produtor como sendo um agente que está otimizando no espaço σ – µ, e as
27
Alguns modelos de monitoramento mútuo são apresentados em Varian (1990), Kandel e Lazear (1992), Wissing e
Ostrom (1991), Dong e Dow (1993b), Dong e Dow (1993 a), e Banerjee, Besley e Guinnane (1994). Outros modelos de
incentivos em equipes incluem Hölmstrom (1982), McAfee e McMillan (1991), Legros e Matthews (1993), Besley e
Coate (1995) e Rotemburg (1994).
30
Dong e Dow (1993b), Legros e Matthews (1993) assumem que a equipe pode impor coletivamente sanções materiais sobre os
membros que não cumprem com as suas obrigações. Nós evitamos essa solução porque ela não é clara uma vez que isso não pode
ser simplesmente copiado pelo proprietário de uma firma tradicional. Dong e Dow (1993a) assumem que a "vadiagem" pode ser
controlada por ameaças aos trabalhadores não vádios de saída da equipe. Nós evitamos essa solução porque a ameaça de demissão
somente é crível se os membros da equipe têm posições de reserva muito sólidas (no modelo de Dong e Dow isso toma a forma de
produção independente).
31
Coleman (1988) desenvolve o ponto paralelo que o efeito "carona" em rede pode ser evitado se os membros da rede provêem
recompensa para cooperação. Kandel e Lazear (1992) desenvolveu um modelo similar ao nosso, mas eles fazem hipóteses especiais
que os leva a concluir que os benefícios do monitoramento mútuo necessariamente declina com o tamanho crescente da equipe.
32
A habitual rejeição observada de ofertas positivas substanciais nos jogos experimentais de ultimato (Camerer e Thaler, 1995) é
consistente com essa interpretação, mas é menos diretamente análoga no caso da produção da equipe.
33
Para um exemplo claro, ver Blount (1995). Fehr e Schmidt (1997) apresentam um levantamento das taxas de rejeição
em jogos de ultimato.
Q = (n + 1) (1 –σ)q ,
onde é a probabilidade que um membro vadie. O payoff de cada membro é
αQ
y + -------------- = y + (1 –σ)αq,
n+1
34
Note que, diferentemente de participação de um membro na receita líquida de uma firma, o ganho subjetivo de punição
não declina com o tamanho da equipe. Nós motivamos essa hipótese e discutimos os efeitos do tamanho da equipe abaixo.
35
Por simplicidade, assumimos que a propensão a punir de um agente, ρ i , não é afetada pelas propensões a punir ou as taxas
observadas de punição de outros membros da equipe. Substituindo esse fato pela hipótese de que as propensões a punir são
positivamente relacionadas, abre a possibilidade de equilíbrios múltiplos, alguns envolvendo altos níveis de punição e outros
baixos. Nós não exploramos essa alternativa.
Es = ∑ pi µi si , (26)
1
αq
b – ––––– – Es. (27)
n+1
αq
b – –––––– = Es. (29)
(n + 1)
ci
σ = ––––––– (30)
pi ρ i (α)
b – αq/(n + 1)
µ = –––––––––––––– ; (32)
nps
Teorema 15. Suponha que existe um inteiro k ≥ 1 tal que quando o tamanho da equipe
n ≥ k aumenta, cada membro vê exatamente os k outros membros da equipe. Então as
asserções do Teorema 14 se verificam, com k substituindo n no denominador de (32).
Na seção 2 nós resenhamos as vantagens de estabelecer-se a reivindica-
ção residual e, portanto, a posse dos ativos para os agentes tomadores de
decisões não-contratáveis relacionadas com a produção, com a prescrição de
eficiência alocativa resultante, onde todos os agentes são avessos ao risco,
aqueles que controlam as ações não-contratáveis devem também possuir os
resultados das suas ações, exigindo assim, que os produtores mantivessem os
seus ativos relevantes. Nessa seção nós perguntamos sob que condições a
lógica dessa prescrição pode se estendida do caso de produtores individu-
ais para produtores em equipe. Encontramos que o mecanismo de imparci-
alidade recíproca pode operar mesmo em grandes equipes, de tal forma que
mesmo em equipes numerosas o caso de eficiência alocativa para a reivin-
dicação residual e, portanto, a manutenção de ativos pelos membros da
equipe, não seja necessariamente enfraquecida.
Nós vimos na seção 2 que os produtores desprovidos de riqueza
podem ser impedidos de adquirir a propriedade de ativos produtivos e isso
obviamente impede que membros não ricos de equipes produtivas adqui-
ram a propriedade necessária para pagar um monitoramento mútuo eficaz.
Poderíamos perguntar se a atribuição de reivindicação residual competiti-
vamente determinada e o controle são ineficientes no sentido de que a
redistribuição indutora de produtividade dos ativos do tipo definido na
introdução pode ser possível. Esta questão não pode ser adequadamente
analisada sem se eliminar a hipótese geral de neutralidade ao risco.
Nós temos assim que levar em consideração o fato de que aqueles agen-
tes com riqueza limitada são provavelmente avessos ao risco, e a conseqüência
de que as melhoras alocacionais que podem ser facilitadas por uma redistribuição
igualitária de ativos, pode ser compensada pelas distorções alocacionais ocasi-
onadas pela aversão ao risco dos agentes desprovidos de riqueza. Veremos que
isso é realmente o caso para uma grande classe de problemas.
36
Chan, Mestelman, Moir e Muller (1996) salientam que quando o modelo de Bergstrom-Blume-Varian é testado em labora-
tório, ele corretamente prediz a direção (não a magnitude) da mudança nas contribuições do grupo quando a renda é
redistribuída em direção ao contribuidor positivo. O trabalho não tem uma boa predição do comportamento individual:
indivíduos com baixa renda contribuem em excesso para o bem público, e indivíduos de alta renda contribuem pouco.
ki
φ= kf i
––––––
k1 + k2
para k1 + k2 ≤ F.
A intuição diz que se a captura total for menor do que F, os pescadores
poderão pescar até o limite de sua capacidade, em caso contrário, os pescado-
res compartilharão F na proporção das respectivas capacidades que eles empre-
gam para explorar o lago.
Entre a primavera e o outono, a quantidade de peixes cresce a uma taxa
g > 0, de tal modo que no período 2 a oferta de peixe é (1 + g)(F – φ1 – φ2 ).37
Assumimos que não existam descontos futuros, de tal modo que a utilidade
de cada pescador seja simplesmente o total de peixes que ele captura. Nesse
sentido, pode-se observar que para qualquer resultado eficiente não ocorrerá
pesca no período 1.
No segundo período, cada pescador i tem que novamente empregar
parte de sua riqueza ωi para explorar o lago. Dessa forma, nós elaboramos a
seguinte hipótese:
ω = ωi + ω2 > (1 + g) F (35)
37
Se g fosse negativo, não haveria nenhum dilema. O depauperamento do estoque no primeiro período seria um equi-
líbrio ótimo.
Teorema 16. A estratégia {0,0} na qual nenhum pescador pesca no primeiro período
é um ótimo de Pareto.
Nós chamamos essa situação de um primeiro melhor.
A meta de conservação das indústrias de pescado é reduzir a pesca para
algum nível de tal forma que o estoque remanescente no final de todo o período
seja suficiente para garantir a sobrevivência da população de peixe. Em nosso
modelo simples, em que o nível é normalizado para zero no primeiro período.
O segundo período prolonga-se para o final dos horizontes econômicos rele-
vantes dos pescadores.38
O seguinte teorema aponta as condições sob as quais o resultado menos
eficiente é um equilíbrio de Nash.39
g
Teorema 17. Se ωi > −−−−−− F para i = 1,2, então {ω1, ω2 } {isto é sangria completa
1+g
de recursos} é um equilíbrio de Nash.
Se a desigualdade no Teorema 17 se verifica, cada pescador tem capaci-
dade suficiente de tal forma que se um outro pescador pescar na primavera,
reduzindo, portanto, a quantidade de pescado no outono, a melhor resposta
para ele é também pescar na primavera, repartindo o excedente ainda não pesca-
do. Note, em particular, que o Teorema 17 se verifica quando ωi > F para
i = 1,2, então cada pescador pode unilateralmente pescar o lago todo. Quando é
que a conservação total é um equilíbrio de Nash?
38
Nesse modelo nós nos abstraímos do problema das taxas de desconto com o objetivo de focar mais claramente sobre os incentivos
necessários para conservar um recurso. Formalmente, a taxa de desconto seria subtraída de g, a taxa de regeneração do recurso.
Se a taxa de desconto é maior do que g, a sangria da indústria de pescado é ótima e a conservação não é economicamente racional.
Além do mais, como vimos acima, é razoável supor que cada taxa de desconto do pescador é uma função decrescente da sua riqueza.
Nesse caso, quanto mais desigual a distribuição de dotações, mais difícil será a sustentação da conservação universal do recurso.
Levando em conta que a alta taxa de preferência no tempo do pescador pobre é equivalente a situação na qual o pescador pobre
se defronta com uma baixa taxa de crescimento do estoque e, portanto, tem pouco incentivo a conservar.
39
Para ver a prova desse teorema e dos subseqüentes nessa seção, ver Dayton-Johnson e Bardhan (1997).
Corolário 18.1. Se (ω1`, ω 2`) é uma spread médio de preservação de (ω1, ω 2), então
a conservação total é um equilíbrio com riqueza inicial (ω1`, ω 2`) somente se ela for um
equilíbrio com riqueza inicial (ω1, ω 2). Também, para todo (ω1, ω 2)∈∆ (ω) existe um
spread médio de preservação (ω1`, ω 2`) tal que a conservação total não é um equilíbrio com
riqueza inicial (ω1`, ω 2`).
A hipótese de Olson de que a desigualdade aumenta a perspectiva da
ação coletiva pode ser interpretada como uma análise de estática comparativa:
aumentar a desigualdade para um dado nível agregado de riqueza faz com que
a conservação total seja mais provável. O corolário acima sugere que isso não
acontece. A segunda parte do corolário afirma que, començando de qualquer
distribuição de riqueza, existe uma distribuição de riqueza menos igual tal que
a conservação não é um equilíbrio. Em particular, se a conservação total é um
equilíbrio sobre a distribuição inicial, então nós sabemos do Teorema 18
que ωi ≥ ω/(1+ g) para i = 1,2. Então a riqueza pode ser tomada de um
pescador até ωi < ω/(1+g) para aquele pescador. Portanto, a conservação
total não é um equilíbrio.
O corolário do Teorema 18 mostra que o aumento na desigualdade não
necessariamente leva a conservação do equilíbrio. O Teorema 19 mostra que
sob desigualdade máxima – isto é, quando um pescador se apodera de toda a
riqueza – a conservação é um equilíbrio.
Teorema 20. Defina F * (ω1, ω 2) como o montante mínimo de pesca do primeiro período
entre todos os equilíbrios de Nash do jogo quando a distribuição de dotações é (ω1, ω 2).
Sempre que ω >(1+g)F, existe ( ^ ω 1, ω
^ 2 )∈∆ (ω), tal que para todo spread médio de
rará uma parte suficientemente grande dos retornos da conservação que ele
conservará unilateralmente. Em particular, existe um equilíbrio no qual o maior
pescador conserva, o menor pescador não, e qualquer spread médio de preserva-
ção aumenta a eficiência. Se fosse verdade que a dotação do pescador i fosse
maior do que ω /(1+g), então pelo Teorema 18, o pescador i sempre iria conservar
se o pescado j também conservasse. Se fosse verdade que a dotação fosse maior
do que ω /(1+g), então pelo Teorema 18, i sempre conservaria se o pescador j
também o fizesse. Assim, qualquer spread médio de preservação
de (ω^1, ω
^2 ), pela redução da capacidade do pescador i, aumentará a eficiência, desde
que o pescador j jogue zero e mais pescaria seja adiada até o segundo período. Isso,
então, está de comum acordo com a hipótese de bens públicos de Olson.
Esta situação é sumarizada na Figura 12, a qual mostra (assumindo que
g > 1, que é claramente necessário para o equilíbrio cooperativo no caso de dois
jogadores, conforme examinado) que quando a participação do pescador 2 au-
menta de 1/2, a eficiência total é mantida até sua participação alcançar g/(1+g),
neste ponto o pescador 1 falha, reduzindo a pescaria total. Então quando a
participação do pescador 2 continua a aumentar, a eficiência do sistema aumen-
ta rapidamente, desde que o pescador 1 seja capaz de pescar uma fração decres-
cente do estoque de pescado no período 1. Quando o pescador 2 possui toda a
riqueza, a eficiência total é restaurada.40
Pescaria total
F(1+g)
F(1+g)-Fw1g
w2
1/2 g/(1+g) 1 w
Figura 12: Desigualdade e a eficiência da cooperação.
40
Esta figura é devida a J. M. Baland, comunicação pessoal.
41
Para muitos exemplos de saída por utilizadores grandes e pequenos, ver Baland e Platteau (1997).
g*ω 2
s < ----
1+g*
42
Em sintonia com as nossas seções passadas de produção da terra e em equipe, nós estamos assumindo que as imperfeições
do mercado de crédito inibem a operação de um mercado de barcos e outros ativos no atingimento dos resultados
primeiro melhor .
43
Grande parte da literatura econômica concentra-se sobre os problemas de repartição de custos nos dilemas de ação coletiva.
Elster (1989) argumenta que problemas de repartição de benefícios podem freqüentemente levar à quebra da ação coletiva. O
último problema é geralmente de desigualdade de renda ao invés de desigualdade de riqueza, embora distribuições desiguais
de ativos iniciais estejam provavelmente exacerbando esse problema.
7. Conclusão
Referências bibliográficas
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Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS) 223
Pranab Bardhan, Samuel Bowles e Herbert Gintis
Paul J. Gertler
Universidade da Califórnia, Berkeley
Maitreesh Ghatak
Departamento de Economia da Universidade de Chicago
Partes deste documento baseiam-se na tese de doutorado de Maitreesh Ghatak (1996), que havia circulado anteriormente como um documento
de trabalho intitulado “Qualificação e Eficiência: a economia da reforma dos arrendamentos” (Banerjee e Ghatak, 1996). Temos uma
profunda dívida de gratidão com M. G., sem cujo estímulo e apoio, em todas as fases e, especialmente na condução do levantamento, este
trabalho não teria sido possível. Agradecemos também a D. Bandyopadhyay, Nripen Bandyopadhyay, Amiya Bragchi, P. Bardhan, Anne
Case, Angus Deaton, Semanti Ghosh, J. Moduch, Ilya Segal, S. Sengupta, T. Sjostrm e T. Van Zandt pelos comentários úteis e discussões nos
diversos estágios. Agradecemos especialmente a Debra Jay pelas conversas estimulantes, que foram muitas, durante a fase inicial. Recebemos
comentários importantes dos participantes dos seminários em Berkeley, Chicago, Faculdade de Economia de Nova Delhi, Harvard, MIT, LSE,
Princeton, Rochester, Stanford e Yale. Agradecemos a A. Bhowmik, Lipi Ghatak, Arun Ghosh, Nahas Khalil, Amar Mitra, Prabir Niyogi,
Swapan Saha e Nga Vuong pela ajuda durante o processo de coleta, tratamento e análise dos dados.
1. Introdução
U
m governo de esquerda tomou subitamente o poder em 1977 no Estado
indiano de Bengala Ocidental e levou a cabo uma extensa reforma dos direitos
de propriedade na agricultura. 1 Como governo estadual, o partido de lideran-
ça comunista Left Front (LF) (Frente de Esquerda) não detinha o poder constitucional
para realizar o tipo de reforma radical de redistribuição de terras que os seus eleitores,
predominantemente os pobres das áreas rurais, nesta área com escassez de terras e
predominantemente agrícola, esperavam que ele fizesse. Como resultado, o governo
empenhou-se num programa de reforma do sistema de arrendamento, como o seu
maior instrumento para a realização de uma reforma agrária redistributiva. O ponto
central desta reforma foi o cadastramento dos colonos. Sob a lei de arrendamento de
terras vigente na Índia, se os colonos se cadastrassem junto à burocracia de registros
de terras, eles teriam direito ao domínio permanente e hereditário sobre a terra que
arrendavam, conquanto que pagassem ao senhorio uma fração de 25% da produção,
a título de aluguel. Entretanto, até então a lei tinha tido um impacto muito limitado,
seja porque continha muitas brechas, ou porque muito pouco havia sido feito para
facilitar o registro dos agricultores.2 Como resultado, o número dos cadastrados em
Bengala Ocidental não passava de 23% e muitos observadores relatam que o arren-
damento das safras situava-se num patamar significativamente abaixo do mínimo
legal (em torno de 50%), e o arrendamento era considerado como sendo altamente
inseguro.3
Um dos primeiros atos do novo governo foi efetuar emendas à legisla-
ção existente, de modo a facilitar sua implementação e lançar um programa
maciço de cadastramento dos colonos. Sob este programa, chamado Operação
Barga (OB), legiões de funcionários do governo percorreram os vilarejos, organi-
1
Sua vitória foi atribuída principalmente a uma onda nacional contra a permanência do Partido do Congresso, de centro, que
detinha o poder na maioria dos Estados, ininterruptamente, desde a independência, porque aquele partido havia suspendido
o processo democrático, ao declarar Emergência Nacional, em meados dos anos setenta.
2
A falta de vontade política e a falta de iniciativa burocrática são citadas freqüentemente como os principais motivos. Ver
Appu, 1975.
3
Ver Bardhan e Rudra, 1980.
4
Barga é o termo local usado para designar colono.
5
Consultar The Economist (31 de julho de 1993), que traz um artigo sobre a bem sucedida reforma rural da Frente de Esquerda
em Bengala Ocidental, intitulado “Left Gets it Right” ou A Esquerda faz Direito.
6
Há uma exceção, que é o trabalho de Lin, 1992, sobre os efeitos da descoletivização da agricultura chinesa ao final da década
de setenta.
7
Ver Besley, 1995.
insumos, apresentada na seção 3, mostra que o efeito global pode ser desdo-
brado em dois efeitos principais – um efeito de poder de barganha e um efeito
de segurança de domínio da terra. O poder de barganha, ou efeito empowerment
advém do fato de que a lei muda a relação de disputa entre o proprietário e o
arrendatário com relação ao pagamento e aos contratos – na verdade, o arren-
datário poderia, a partir de então, tratar o contrato legal como a sua “opção
externa”. Isto se refletiu no aumento observado no compartilhamento de safra
em favor do arrendatário, com os contratos renegociados após o jogo da refor-
ma, entre estes e os arrendatários. O efeito de segurança de domínio opera de
duas maneiras diferentes, que tomam direções opostas. Por um lado, em algu-
mas situações o proprietário pode usar a ameaça de despejo, quando a produ-
ção for baixa, induzindo o arrendatário a trabalhar com mais empenho.8 Desta
forma, mantidas todas as outras condições inalteradas, a proibição de despejo
restringiu o leque de contratos que o proprietário tinha a oferecer ao arrendatá-
rio e assim, poderia reduzir a eficiência. Ao mesmo tempo, uma maior seguran-
ça de domínio também provocou um efeito positivo, incentivando o arrendatá-
rio a investir, porque ele tem mais certeza de sua permanência na terra para
desfrutar os resultados de seu investimento, e também porque a mudança no
poder de barganha significa que ele agora espera obter uma porção maior da
produção adicional.
Na seção 4, utilizamos dados sobre contratos no período pré e pós-
reforma, de um levantamento de 480 agricultores, conduzido em 1995, para
avaliar nossos resultados teóricos. Em particular, os dados sugerem fortemen-
te que houve um aumento na quota da produção que cabe ao arrendatário,
resultado da reforma e, além disso, houve um aumento substancial na seguran-
ça do domínio. Também apresentamos evidências que sugerem que os efeitos
negativos das restrições sobre os contratos não foram significativos e que,
portanto, o efeito global parece ter sido positivo.
Na seção 5, estimamos o efeito da reforma do arrendamento sobre a
produtividade agrícola, usando dados de série histórica em nível de distrito
para Bengala Ocidental. Nossa especificação baseia-se na teoria de que, uma
vez que se tornam disponíveis as oportunidades de se cadastrar, a produtivida-
de será afetada, porque os contratos e, conseqüentemente os incentivos mu-
darão. Usamos a taxa de cadastramento distrital como uma medida das oportu-
nidades de cadastramento. Argumentamos que o modelo identifica-se pela
natureza burocrática do processo de implementação e diversos atritos no lado
da oferta, o que implicou que a disponibilidade efetiva de oportunidades de
cadastramento evoluiu lentamente nos vilarejos dentro dos distritos, e em ve-
locidade diferente entre os distritos. Para conferir a sensibilidade de nossas
estimativas, também as refizemos utilizando as taxas de cadastramento passa-
das como instrumento. Nossas estimativas indicam que a Operação Barga teve
8
Esta observação remete a Johnson, 1950. Ver Stiglitz e Weiss, 1983, Bardhan, 1984, e Dutta, Ray e Sengupta, 1989, para uma
análise formal.
2. O cenário institucional
O arrendamento com compartilhamento de safra é a forma de arranjo
dominante em Bengala Ocidental, refletindo a distribuição desigual de terras e
a sua escassez relativa, com relação à mão-de-obra.10 Na época da reforma,
estimava-se que um terço do total de terras cultivadas estavam sob arrenda-
mento com compartilhamento de safra, enquanto que o número de domicílios
engajados nesse arranjo era de cerca de 2,3 milhões, mais de um quarto de todos
os domicílios rurais em Bengala Ocidental.11 Os colonos compartilhadores de
safra pertencem ao segmento mais pobre dos camponeses da Índia, e suas reivin-
dicações sempre foram uma plataforma política para os partidos de esquerda,
resultando, às vezes em movimentos militantes exigindo parte maior da produ-
ção e segurança de domínio.12
Após a independência, o governo da Índia buscou melhorar as condi-
ções dos colonos compartilhadores de safra, por meio da reforma do arrenda-
mento e redistribuição limitada de terras. A Lei de Arrendamento da Índia, com
relação aos colonos possui duas cláusulas principais.13 14
L1. Os compartilhadores de safra terão direito de domínio permanente, here-
ditário, embora não transferível sobre a terra que estiver registrada em seu nome,
conquanto paguem ao proprietário a fração estipulada por lei, não deixem a
terra sem cultivo, não a cultivem pessoalmente ou a menos que o proprietário
deseje reaver a terra para o cultivo pessoal.
9
Outros exemplos de estratégias que poderiam conferir poderes aos colonos são as leis de usura, leis de salário mínimo,
programas de geração de emprego e oferta de crédito subsidiado.
10
Ver Sharma, 1994, sobre a distribuição de terras em Bengala Ocidental. Distribuição de Domínios de Terras na Índia Rural,
EPW, setembro 24.
11
Ver Datta, 1981, Boyce, 1987, e Gazdar e Sengupta, 1997.
12
Ver Bose, 1987, para uma análise dos movimentos camponeses liderados por partidos políticos de esquerda, que foca-
lizavam explicitamente os direitos dos colonos arrendatários da Índia pré-independência, e, para o período subseqüente,
ver Desai, A. R., 1986, “Conflitos Agrários na Índia após a Independência”, OUP, Delhi.
13
Ver a Lei de Reforma Agrária de 1955, do governo da Índia, e as sucessivas emendas em 1965, 1966, 1969, 1970 e 1972.
14
As leis de arrendamento, em geral prescrevem tanto o aluguel máximo e a garantia da segurança de domínio. Isto porque,
se a lei simplesmente regular o aluguel, sem estabelecer seu teto máximo, então o proprietário poderia esquivar-se de
cumpri-la, ameaçando o colono de despejo, caso ele insista em não pagar um centavo a mais do que o aluguel estabelecido
em lei. Da mesma forma, se a lei estipula que o colono não pode ser despejado, conquanto que pague o aluguel, mas não
estabelece o teto a ser cobrado, o proprietário cobrará um aluguel tão alto que o colono abandonará a terra voluntari-
amente, prevendo que será despejado por força da lei, por não ter condições de pagar o aluguel estipulado. Assim, a menos
que ambas as cláusulas estejam presentes, juntas na lei de arrendamento, estas provavelmente se tornarão ineficazes e
impossíveis de ser cumpridas.
15
No caso em que proprietário arca com os custos de todos os insumos não trabalhistas, a lei amplia a sua parte para 50%.
Todavia, diversos estudos demonstraram que (ver Bardhan e Rudra, 1980, por exemplo) nunca se observou um caso assim,
sendo a norma o compartilhamento dos custos dos insumos específicos em diversas proporções. Assim, esta cláusula não
se aplicou, em geral.
16
Ver P. S. Appu , 1975, e Kohli, 1987.
17
Não havia muita pressão oficial vinda de cima, no sentido de se implementar as leis de arrendamento existentes, já que
o Partido do Congresso, que dominava a política, dependia do apoio político dos proprietários nas zonas rurais.
18
Houve diversas emendas à Lei de Reforma Agrária de Bengala Ocidental, de 1955. Todavia, o proprietário ainda podia
despejar um colono cadastrado, se este não cultivasse a terra, se a sublocasse, ou não pagasse o aluguel.
19
Ademais, as duas pessoas escolhidas para tocar o programa, o Ministro da Reforma Agrária, sr. B. Chowdhurry, e o recém-
nomeado Comissário de Reforma Agrária, sr. D. Bandyopadhyay, eram pessoas amplamente respeitadas nos círculos polí-
ticos por sua integridade e eficiência.
20
Entrevista pessoal com D. Bandyopadhyay , 1997.
21
Um colono podia se cadastrar mesmo depois que esses acampamentos temporários encerraram suas atividades, inscreven-
do-se no órgão encarregado e após verificação de seu status.
22
Ver Datta, 1981, para conhecer dados sobre o número de colonos compartilhadores de safra em Bengala Ocidental.
23
Ver Saha e Swaminathan, 1994, e Sawant e Achuthan, 1995.
24
Existem modelos de compartilhamento de safra baseados no risco moral que não usam a hipótese da limited liability (ver
Stiglitz, 1974, e Eswaran e Kotwal, 1985). Nós a utilizamos porque ela provê uma maneira simples, analiticamente, de gerar
receita para os colonos (o que é necessário, para que as ameaças de despejo ganhem significado), bem como a ineficiência
estática ligada ao arrendamento. Ver Shetty, 1988, Dutta, Ray e Sengupta, 1989, e Mookherjee, 1994, para modelos alterna-
tivos de compartilhamento de safra baseados em limited liability .
25
Formalmente, nós estamos tratando de um equilíbrio Markov, onde a variável é a identidade do atual arrendatário. Ver
Fudenberg e Tirole, 1991.
26
Vale notar que nós poderíamos, em vez disso, ter conduzido nossa análise em termos de um contrato linear sY – r, onde s
denota a fração compartilhada da produção de arrendatário e r um componente de aluguel fixo, com s = h – l, e r = – l. Isto
é porque, já que a produção assume apenas dois valores neste modelo, todos os contratos podem ser expressos como contratos lineares.
29
Ver Braverman e Stiglitz, 1996, para uma análise geral das escolhas tecnológicas nos arrendamentos.
30
Em particular, considerando que pxt é uma pura transferência do arrendatário para o proprietário, que deve aparecer na
limitação da responsabilidade limitada, ao se definir h’= h – pxt e l’= l – pxt a análise anterior irá se realizar.
32
Normalmente, ao se envolver uma terceira pessoa, o problema pode ser atenuado (p. ex. o tribunal do vilarejo), conquanto
que não haja possibilidade de conluio, mas isto é improvável no contexto presente, dada a dominância do proprietário sobre
o vilarejo.
33
Ver Bardhan, 1984, para conhecer a análise formal do jogo com dois períodos.
34
Ver Banerjee e Ghatak, 1998, para uma análise detalhada dessas e outras questões, num modelo mais geral.
35
Para uma análise mais detalhada deste caso, ver Mookherjee, 1996.
36
A lógica é semelhante a dos modelos de salário eficiente (por exemplo, Shapiro e Stiglitz, 1984): Se os salários afetam os
incentivos ao trabalho então eles também não abrirão o mercado. Isto implioca que o desemprego pode existir no equilíbrio
competitivo e a ameaça de demissão pode ser usada como um dispositivo de incentivo.
37
Alternativamente, se a mudança implica em um custo, ou se a produção de um colono contiver alguma informação
sobre o seu tipo, ser despejado será dispendioso para o colono e assim, isso poderia dar condições para o proprietário
usar ameaças de despejo como um dispositivo de incentivo. Novamente, este custo será mais baixo para os colonos mais
ricos e mais capacitados.
38
Insumos contratáveis, tais como sementes e fertilizantes também são providos pelo proprietário, em muitos casos, mas a
lei de Barga prevê, explicitamente uma fração maior para o proprietário, no caso de este prover todos esses insumos.
39
Isto presume que o proprietário não tem limitação de dinheiro, mas parece razoável, já que ele possui terras.
40
Este é o equilíbrio que foi estudado por Dutta, Ray e Sengupta, 1989, em seu trabalho, já mencionado anteriormente.
41
Poder-se-ia argumentar que se a incapacidade de se utilizar a ameaça de despejo como dispositivo de incentivo reduz
sensivelmente a eficiência, então as duas partes deveriam continuar a usá-la, com o proprietário pagando ao colono por
fora, refletindo o aumento de seu poder de barganha. Mas a duradoura presença da reforma do arrendamento e a chance
que os colonos tinham de se cadastrar e usar a lei em proveito próprio, criariam sérios problemas de compromisso, para
ambas as partes, em usar esse tipo de arranjo. Por exemplo, um colono pode não ter condições de comprometer-se num
contrato desse tipo, porque, quando a safra for ruim, e o senhorio lhe pede para partir, ele pode ficar tentado a tomar
proveito da lei do arrendamento e assim evitar o despejo. Afinal de contas, a lei do arrendamento apenas aumenta as
receitas auferidas pelos colonos.
42
Ver Banerjee e Ghatak, 1998, para uma discussão mais detalhada desse levantamento.
43
A lei previa a possibilidade de despejo preventivo pelo proprietário. Ao mesmo tempo, foi estipulado que a terra seria
imediatamente devolvida ao colono, com indenização pelo período durante o qual ele não teve acesso à terra, caso ele tivesse
sido ilegalmente despejado, contanto que ele se candidatasse ao registro num período não superior a dois anos após o despejo
(e o proprietário não conseguisse provar que a pessoa não cultivou a terra que lhe pertencia por pelo menos um ano) Ver S19B,
a Emenda à Lei de Reforma Agrária de Bengala Ocidental, 1980.
44
Outras pesquisas de campo realizadas por Kohl, 1987, e Chadha e Blaumik, 1992, baseadas em amostras menores também
relatam um aumento significativo na quota da safra dos colonos, após a reforma.
45
Vale notar que nem todos os arrendatários reivindicavam a sua quota legal de 75%. Essa heterogeneidade de resultados
pode ser explicada pelo fato de que, ao passo que o contrato legal era, na verdade a mesma opção padrão para todos os colonos
após a reforma, nem todos iriam realizar o mesmo aumento efetivo do poder de barganha. O fato de um colono arrendatário
ter condições de não depender do patrão no processo produtivo (digamos, em termos de compartilhamento dos custos de
insumos adquiridos) dependia de seus próprios recursos, e isto ditava o quanto da quota da safra iria aumentar. Ver Banerjee
e Ghatak, 1998, para uma análise formal.
j j
sd A λd Ar +(1 – λd)Au – A
onde πd = ----------- -------n + ln(1 – sd) Ao e δ = ----------------------------------------------
1 − sd Ao λd Ao
Σ
sd
ln ydt = πd + ψt + δ --------- b dt + βj ln χjt + γ rdt + εdt (6)
1– sd j
47
Todos os modelos que utilizaram a amostragem de Bengala Ocidental foram também estimados usando uma amostra
restrita ao período 1978-1988, quando ocorreu a maior mudança no cadastramento. Os resultados foram bastante seme-
lhantes a aqueles relatados aqui e, portanto, não foram incluídos. Estão, no entanto, disponíveis para consulta.
48
Os outros coeficientes estimados são consistentes com as expectativas. Em todos os modelos, os efeitos fixos dos distritos
e os efeitos fixos anuais são ambos conjuntamente bem diferentes de zero ao nível de 1%. A irrigação e as estradas são
associadas positivamente à produção. A precipitação é associada negativamente à produção. Isto reflete o fato de que a
principal safra é a tradicional variedade de arroz de monção, que em geral sofre mais com os efeitos das enchentes ou
problemas de drenagem do que de problemas de falta de chuva (o que é o caso das safras da estação seca do inverno). E
o efeito de flutuações muito agudas da precipitação, tais como uma grande enchente ou uma seca severa, sempre afetaram
toda a região oriental da Índia.
49
A maioria das estimativas oficiais e não oficiais do total da área cultivada sob arrendamento em Bengala Ocidental no
início dos anos setenta situa-se entre 18 – 40%. Ver Bandyopadhyay, 1997, Banerjee, 1973, e Bardhan, 1970. Acredita-se
que a estimativa mais baixa (18%), obtida pelo Levantamento Amostral Nacional (NSS) para 1971 esteja subestimada,
devido a problemas relacionados à definição de arrendamento (p. ex., os arrendatários que trabalhavam sob contratos de
longo prazo foram considerados proprietários), e à ocultação da real situação, para esquivar-se das leis de arrendamento
(ver Bardhan, 1970). Esta conclusão é corroborada pela descoberta de outros estudos de nível micro, sobre domínio de
terras, num dos vilarejos mais cuidadosamente estudados na Índia, Palanpur, no Estado de Uttar Pradesh. Sharma e Dreze
(1996) encontraram uma proporção de terras sob arrendamento como sendo 28%, ao passo que Bliss e Stern (1982)
chegaram ao número de 22%, diferente da estimativa de 18%. Nós utilizamos a estimativa de 30% do Censo de 1951, que
também está no meio do intervalo das outras estimativas.
6. Conclusão
Concluímos que, embora na teoria a reforma do arrendamento possa ter
efeito positivo ou negativo sobre a produtividade, as evidências de Bengala
Ocidental sugerem que a reforma desempenhou um papel importante no cres-
cimento da produtividade agrícola, por meio do aumento das quotas da safra
em mãos dos arrendatários e uma maior segurança do domínio da terra. No
entanto, o tipo de dado agregado que nós usamos aqui, para analisar os efeitos
da reforma do arrendamento sobre a produtividade agrícola, é claramente ina-
dequado para uma total compreensão da opção contratual e de seus efeitos
sobre a produtividade a nível micro. Trabalhos futuros, baseados em dados em
nível de propriedade, sobre escolha de insumos e a produtividade dos arrenda-
tários, tanto sobre a terra própria ou alugada, e sobre os contratos sob os quais
eles trabalham, incluindo a escolha por se cadastrar, são necessários para a
compreensão dessas questões importantes.
7. Anexo
h ≥ − (1 + w), l ≥ − w (8)
v = eh + (1 – e) l – ½ ce² ≥ m (9)
Observe-se que o contrato de incentivo ótimo (h,l) tem que Ter h > l, porque se
h for menor ou igual a l, teremos do ICC, e = 0 e o proprietário receberá – l, ao
passo que para o mesmo l se ele estabelecer 1 menor ou igual a h > l ele obterá
e{1 – (h – l)} – l menor ou igual a –l. Isso implica também que uma das duas
restrições de responsabilidade limitada, h, menor ou igual a –(1 + w) não podem
ser vinculantes. O excedente total esperado, gerado por um projeto é:
S = e – ce²/2
Ao longo do texto nós assumimos que c > 1, para que o excedente total seja
maximizado no interior quando
e = 1/c ≡ e
1
S = ----------- ≡ S
2c
É fácil verificar que nós nunca poderemos ter h – l > c num contrato ótimo.
Suponhamos que (h0, l0) seja um contrato ótimo, de modo que h0, l0 > c. Então
e0 = 1 da ICC , e as remunerações respectivas serão π = 1 – h 0 e
v = (h0 – 1) + 1 – ½ c. Agora vamos considerar o contrato (h1, l1), de modo que
h1– l1 = 1. Então, e = e = 1/c e π = – l1 e v = l1 + max e {e – 1/2ce2}. Ao
estabelecer l1 < h0 – 1 o patrão estará em melhor situação e considerando que
max e∈[0,1] {e – 1/2ce2} > 1 – 1/2c por definição o arrendatário também estará em
melhor situação. Isso implica que o ICC poderá ser reescrito como:
sujeito a:
l≥ –w
(h – l)²
------------------ + l ≥ m
2c
1 2 1
-----c----- – ----c- (h – l) + µ -----c--- (h – l) = 0 (11)
1 2 1
– --------- + ---------- (h – l) – 1 + λ – µ ------ (h – l) + µ = 0 (12)
c c c
λ+µ= 1 (13)
Isto demonstra que, num contrato ótimo (h,l), pelo menos uma das duas
restrições, a LLC e a PC tem que ser vinculante.
e= 2 (m + w) .
c
Nesse contrato o excedente total esperado é 2 (m + w) – (m + w).
c
Observe-se que para m + w = 1/2c, a solução neste caso coincide com o caso
anterior. Além do mais, tanto o excedente de esforço quanto o excedente social
são crescentes e funções côncavas de (m + w) para 0 < m + w < 1/2c. Assim,
para m + w < 1/2c, o esforço e o excedente estão abaixo do primeiro melhor.
Nesse contrato, PC é vinculante, portanto a remuneração esperada do arrendatário
será m, e a do proprietário será o valor remanescente de excedente esperado.
Por último, se PC não for vinculante num contrato ótimo, nós obte-
mos l = – w do LLC,h = ½ – w da equação (11) e e = 1/2c do ICC. Neste caso, o
excedente social total será 3/8c. Observe-se que para m + w = 1/8c, a solução
neste caso coincide com o caso anterior. Por outro lado, considerando que
tanto o esforço quanto o excedente são crescentes em (m + w) para 0 < m + w
< 1/2c, ocorre que eles são maiores neste caso, quando m + w < 1/8c, ao
compararmos com o caso anterior, onde PC é vinculante. Neste caso o PC não
é mais vinculante e assim a remuneração do arrendatário é obtida na avaliação
de sua remuneração esperada sob este contrato, que é de 1/8c. A remuneração
do proprietário é, portanto, 1/4c.
Para resumir, quando temos m + w maior ou igual a 1/2c, um contrato
de renda fixa é viável e nós obteremos o primeiro melhor nível de esforço.
Assim, neste caso, mudanças no w não terão nenhum efeito sobre o contrato
ou sobre as remunerações. Do mesmo modo, os aumentos de m são acomoda-
dos ao se aumentar as remunerações pelo sucesso e fracasso na mesma pro-
porção, de modo a manter o esforço constante e assim, neste caso, a fronteira
possibilidade-utilidade será uma linha de 45 graus.
Caso m + w < 1/2c, então um contrato eficiente de renda fixa, como o
descrito no parágrafo anterior será viável, porém não mais maximizará os lucros
esperados do proprietário. O motivo é, conquanto que LLC não seja vinculante,
o arrendatário possui riqueza suficiente que pode ser utilizada para realizar
pagamentos por fora e, portanto, as partes irão maximizar o excedente total
esperado independentemente do poder de barganha. Contudo, se w for pequeno,
pode não convir ao proprietário exigir muito do arrendatário, principalmente se
m for baixo, e a fatia do bolo do proprietário for muito grande. Isto leva o
proprietário a tomar dinheiro do estado, onde for viável, ou seja, quando a
produção é alta. Neste caso, o arrendatário ganha menos do que a sua produção
marginal e isso reduz o incentivo de empreender mais esforço, reduzindo assim
o excedente total esperado, se comparado ao primeiro melhor nível, mas o
proprietário está em melhor situação. Também, neste caso, o excedente de
esforço e o excedente social são crescentes em m e w. Um aumento na riqueza
do arrendatário w relaxa a restrição de responsabilidade limitada, fonte de
ineficiência neste modelo, e assim aumenta e. Da mesma forma, contanto que o
arrendatário receba menos do que o produto marginal inteiro, ou seja, 1 > h – l,
o proprietário irá preferir o êxito ao fracasso, ou 1– h > – l. Assim, à medida
que cresce o m, já que, de qualquer modo o proprietário terá que pagar ao
arrendatário uma quantidade extra de dinheiro, ele ficará em melhor situação se
fizer o pagamento na forma de aumento na remuneração pelo êxito. Isto provoca
um aumento em e.50
Entretanto, há um ponto além do qual o benefício marginal obtido
pelo proprietário ao reduzir h, aumentando o valor do aluguel, é contraposto
pelo seu efeito de reduzir a chance de receber esse aluguel mais alto, ou seja, o
esforço. Em particular, para m + w <1/8c, o proprietário fica em melhores
condições se oferecer h = ½ – w, o que resulta num esforço de e = 1/2c do que
tentar segurar o arrendatário em sua remuneração de reserva m. Neste caso o
arrendatário ganha rendimentos porque a PC não vincula e por pressuposição,
a sua remuneração 1/8c > m + w > m. 51
50
Em outro texto, (Banerjee e Ghatak, 1998) nós mostramos que quando o arrendatário é avesso a riscos este raciocínio em
geral não se aplica, mas, quando a LCC é vinculante ele se comprova.
51
Observe-se que, contanto que a restrição de participação vincule, um arrendatário que possua maior riqueza terá que
pagar ao patrão um valor mais alto de aluguel fixo, mas ele obtém participação maior na produção e seu esforço também é
maior. Esses efeitos se eliminam já que a sua remuneração líquida é m, a mesma de outra pessoa com menos posses. Todavia,
se a restrição de participação não for vinculante, então um arrendatário com muito poucas posses receberá 1/8c, ao passo
que um arrendatário com muitas posses receberá m, porque, para ele a restrição de participação seria vinculante e assim os
inquilinos mais ricos seriam incentivados a esconder sua riqueza.
(
V0 = Max{e ∈[0,1]} eh+ δ [ ϕe + (1 – e) ψ] (V – M) + δM – (1 – e)w – (½)ce² )
Levando em conta a hipótese de Markov, a utilidade esperada a partir do
próximo período, V , é independente da escolha atual de e. Isto produz uma
restrição de incentivo/compatibilidade:
h + w + d( V – M)(j – y ) = ce (14)
h + w + d(V – M) = ce (15)
A restrição de participação do arrendatário é:
V0 ≥ M
Ao contrário da simulação de um tempo, aqui o arrendatário tem visão
prospectiva e, portanto, preocupa-se com a expectativa de utilidade em vez da
utilidade do período atual. Como veremos, num equilíbrio com despejo a restri-
ção de participação não é vinculante – se fosse, as ameaças de despejo não
teriam nenhuma força. Num equilíbrio estático, V0 =
≥ V nós obtemos:
V – M = eh – (1 – e)w – ½ ce² – m
(16)
1 – de
V – M = ½ ce² – w – m (17)
Em seguida demonstramos que as ameaças de despejo são usadas so-
mente quando PC não é vinculante no modelo de um período, ou seja, m < m.
Observe-se que a PC (em termos de utilidade esperada) é vinculante neste
modelo se V – M = 0 , o que implica e = 2 (m + w) da equação (17), o valor
c
do esforço do equilíbrio para a gama de parâmetros para os quais PC é vinculante
no modelo de um período. Lembre-se que m = 1/8c – w é o valor de m no
modelo de um tempo, de modo que para m < m a restrição de participação não
é vinculante e para m maior ou igual a m PC é vinculante. Ao substituirmos m =
m na equação (17) e e = 2 (m + w) observamos que V – M é de fato igual a
c
zero. Assim, se V – M = 0 então PC é vinculante no modelo de um período. Da
mesma forma, se V – M = 0 , a ICC deste problema também se torna idêntica
a aquela do modelo de um período e, portanto, os resultados daquele
modelo se aplicam.
Estamos agora prontos para provar o seguinte: Quando m é menor que
m, as ameaças de despejo serão usadas como instrumento de incentivo adici-
onal e o valor de e será maior do que quando os despejos não são possíveis,
embora abaixo do primeiro melhor nível. À medida que m aumenta em direção a
m, o valor de e diminui e a utilidade esperada do arrendatário, V é mais baixa
quando as ameaças de despejo são usadas, quando comparadas com o mode-
lo estático. Pelo fato de haver um equilíbrio de Markov e de não existir poupan-
ça ou investimento no modelo, o problema do proprietário neste caso continua
sendo uma maximização estática. A única diferença com o caso analisado na seção
anterior advém da possibilidade de usar ameaças de despejo da terra como um
instrumento de incentivo. A chave dessa possibilidade está no fato, observado acima,
de que, no equilíbrio estático, um arrendatário que tem responsabilidade limitada poderá
ganhar receita. Como resultado, o arrendatário preferirá não perder o seu emprego. Por
outro lado, há disponibilidade de todos os tipos de inquilinos (em termos de riqueza) e,
portanto, não fará diferença para o proprietário reter ou despejar determinado colono. É,
portanto esperado que ele despeje um arrendatário cuja produção seja baixa e mantenha
o arrendatário que apresente alta produção. Assim, podemos presumir que o proprietário
pode comprometer-se a uma função de despejo que especifique a probabilidade de
despejo para cada safra. O problema da escolha ótima do contrato é:
Max{e,h,l} e(1 – h) – (1 – e)l
sujeito às restrições de participação, compatibilidade de incentivo e
responsabilidade limitada, ou seja, V – M maior ou igual a zero (13) e l maior ou
igual a –w. Já que apenas as duas últimas restrições são vinculantes num equi-
líbrio de despejo, podemos reescrever a função objetivo do proprietário como:
{e}
(18)
h= ½ – d ½ (V – M) – w < ½ – w
Portanto, h é mais baixo no equilíbrio de despejo, quando comparamos
com o equilíbrio sem despejo. Aliado ao maior esforço, a utilidade do arrendatário
por período (v = eh – (1 – e) w – ½ce2) tem que ser inferior. Observe-se que v = m no
equilíbrio sem despejo e, portanto a utilidade esperada do arrendatário é m/1– δ,
que é maior do que a do equilíbrio de despejo, v/1– δe, ambos porque a utilidade
do arrendatário por período é inferior e a taxa efetiva de desconto é mais baixa .
l≥ –w
p(e,x)h+(1 – p(e,x ))l – c(e) ≥ m
A equação de Lagrange é:
Vamos agora supor que x ∈ [0,1] seja um insumo contratável e que p(e,x)
satisfaça as propriedades padrão de uma clássica função neoclássica côncava
de dois insumos, incluindo as condições Inada. Suponhamos que o custo por
unidade desse insumo seja uma constante. Pela teoria envelope, temos:
¶p = ¶ L
¶ x ¶x
= p(e,x)
x – (1 – m)p(e,x)(h
x – l) + γp(e,x)(h
ex – l)
= p(e,x)
x [ e
c
1 + 1 – µ p(e,x) {p (e,x) p(e,x)p(e,x)
ex
p(e,x) – 1
e x
}]
p(e,x) c das condições de
usando os fatores g = l p(e,x) , l = 1 - m e (h – l) = p(e,x )
e e
primeira ordem. A classe de função de produção na qual as elasticidades
de cada um dos dois insumos não dependem do nível do outro insumo é
representada por p(e,x) = f(e)g(x), onde f(.) e g(.) são funções crescentes e
côncavas. Assim:
¶p = p(e,x) = f(e)g’(x)
x
¶x
se x é endógena, então o proprietário escolherá o seu nível de modo a
¶p
estabelecer ao seu custo marginal, p. Já que o retorno marginal de x é
¶x
crescente em e, o qual por sua vez é crescente em m, esses tipos de insumos
têm mais probabilidades de serem fornecidos após a reforma.
Referências Bibliográficas
SINGH, Inderjit [1990]: A grande Subida – Os Pobres das Zonas Rurais na Ásia.
Gráfica da Universidade de Johns Hopkins.
STIGLITZ, J.E. [1974]: “Incentivos e compartilhamento de riscos em safras
comparftilhadas”. Review of Economic Studies, 41.
Banco Mundial [1994]: O Milagre da Ásia Oriental – Crescimento Econômico e Políticas
Públicas. Relatório do Banco Mundial sobre Pesquisas Políticas. Gráfica da
Universidade de Oxford.
Das pessoas que admitiram sofrer ameaças de despejo, o principal motivo foi:
Baixa produção 49,0% 41,6%
Divergências na partilha 23,1% 9,6%
O colono se recusou a trabalhar de graça 20,0% 3,2%
O colono pediu compartilhamento do custo 0,00% 1,6%
O colono não arou a terra do proprietário primeiro 0,00% 2,4%
O colono não obedeceu instruções 13,9% 18,4%
Retomada da terra para auto cultivo 4,1% 23,2%
Número de entrevistados 478 473
Média
Geral - 1.543,01 0 120.632,3 687,53 2.312,05
Desvio
Padrão
(global) - 318,36 0 77.458,53 238,83 872,31
Desvio
Padrão
(interno) - 235,45 0 44.992,23 114,24 467,02
Média
em 1979 - 1.281,99 0 78.334,55 583,02 2.210,00
Média
em 1993 - 1.853,23 0 169.710,10 809,26 2.663,31
% de
mudança
79-93 - 44,54 0 116,64 38,80 20,51
Taxa de
cresci-
mento
anual - 2,79 0 5,75 5,14 -0,12
Nota: Os números relatados são médias anuais computadas de dados em nível de distrito. A última linha de cada tabela revela
a taxa percentual de crescimento anual computada ao se adaptar a tendência exponencial da fórmula in (y) = a + bt
*Para Bangladesh os dados por distrito relativos a estradas só estão disponíveis a partir de 1984. Assim, o ponto inicial da
série de dados rodoviários inicia-se a partir de 1984, e não a partir de 1979.
282
Modelos de Produção Utilizando Taxa de Cadastramento Não-Ponderada; Coeficientes Estimados e Estatísticas T.
Amostra de Bengala Ocidental Amostra Combinada de Bengala Ocidental
e Bangladesh
Taxa de Cadastramento 0.287 0.476 0.270 0.459 0.471 0.547 0.247 0.438
Abhjit V. Banerjee, Paul J. Gertler e Maitreesh Ghatak
Tamanho da Amostra 210 210 210 210 428 428 357 357
Estudos NEAD 5
Tabela 5:
Modelos de Produção Utilizando Taxa de Cadastramento Não-Ponderada; Coeficientes Estimados e Estatísticas T.
Taxa de Cadastramento 0.439 0.789 0.505 0.837 0.883 1.099 0.665 1.03
(1.22) (2.06) (1.31) (2.04) (5.74) (6.27) (1.97) (2.03)
Tamanho da Amostra 210 210 210 210 428 428 357 357
Transferência de poderes e eficiência: uma análise econômica
de um programa de reforma de arrendamento de terras da Índia
283
Tabela 6:
284
Efeitos Estimados do Cadastramento sobre os Modelos de Produção Usando a Taxa de Cadastramento Não-Ponderada.
Amostra de Bengala Ocidental Amostra Combinada de Bengala Ocidental
e Bangladesh
∆ % de toda a produção agrícola 12.1% 20.0% 11.3% 19.3% 19.8% 23.0% 10.4% 18.4%
Abhjit V. Banerjee, Paul J. Gertler e Maitreesh Ghatak
% do total ∆ na produção 17.4% 28.8% 16.8% 28,7% 29.5%, 34.3% 15.5% 27.4%
% ∆ na produção compartilhada 40.2% 66.6% 37.8% 64,3% 65.9% 76.6% 34.6% 61.3%
Tabela 7:
Efeito Estimado do Cadastramento sobre os Modelos de Produção, Usando a Taxa de Cadastramento Ponderada.
Amostra de Bengala Ocidental Amostra Combinada de Bengala Ocidental
e Bangladesh
∆ % de toda a produção agrícola 7.9% 14.2% 9.1% 15.1% 15.9% 19.8% 12.0% 18.5%
% do total ∆ na produção 11.4% 20.5% 13.6% 22.5% 23.6% 29.5% 17.9% 27.6%
% ∆ na produção compartilhada 26.3% 47.3% 30.3% 50.2% 53.0% 65.9% 39.9% 61.8%
Estudos NEAD 5
Transferência de poderes e eficiência: uma análise econômica
de um programa de reforma de arrendamento de terras da Índia
0.70
0.60
Produção de Registro
0.50
0.40
0.30
0.20
0.10
0.00
Ano
180
160
140
Produção de todas as safras
120
100
80
60
40
20
0
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
Ano
2500
2000
Produção de arroz
1500
1000
500
0
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
Ano
Figura 2: Produção de todas as safras (Base: 1971 = 100) e Rice (K. G.s/
hectare) em West Bengal (1977-1993).
1 C D
1 A B
2c
0 1 1 m
m= -w m= -w
8e 2c
1 C D
c
A
1 B
2c
0 1 1 m
m= -w m= -w
8c 2c
100%
90%
80%
70%
Pré-Reforma
60%
Pós-Reforma
50%
40%
30%
20%
10%
0%
0.25 to 0.5 0.5 to 0.75 to Fixed
0.5 0.75 1 Rent
18
16
14
12
10
Distrito 13
Distrito 09
Distrito 05
Distrito 01
Distrito 14
Distrito 10
Distrito 06
Distrito 02
289
Reforma Agrária,
Redução da Pobreza
e Crescimento:
evidências da Índia
Timothy Besley
Robin Burgess
Departamento de Economia e STICERD - London School of Economics
Resumo
1. Introdução
2. Antecedentes e dados
1
Existiam, apesar disso, algumas falhas no desenho das reformas, mais notadamente no que se refere à falha para limitar
o tamanho das fazendas dos zamindares ou proteger os arrendatários no curto prazo.
2
Como Warriner (1969) comentou no Congresso “munido tanto da motivação para a reforma agrária quanto da oposição
a ela, como se fosse uma cabeça socialista sobre um corpo conservador”.
3
O Plano Qüinquenal deu uma franca contribuição da situação que está diretamente em linha com o pensamento de
Bardhan (1970): “Uma larga contribuição do programa da reforma agrária adotado desde a Independência foi a de que as
leis para a abolição da posse intermediária foi razoavelmente implementada com eficiência, enquanto que no campo das
reformas de arrendamento e tetos sobre a propriedade da terra, legislação falhou na obtenção dos objetivos, e a
implementação das leis foi inadequada. Desprovida de objetivos claros a implementação das leis ordenadas tem sido
inadequadas (Plano Qüinquenal, 1974-79, 2:43).
Estados baixo reforma agrária.4 As reformas agrárias parecem ter tido um impacto
sobre a distribuição da terra, embora o que mais chama a atenção é o fato de que
as altas desigualdades na terra têm persistido ao longo do tempo. Isso sugere
que quaisquer impactos das reformas agrárias sobre a pobreza podem ter vindo
em parte por meio de mecanismos os quais não envolvem a redistribuição física
da terra. Se esse é o caso, então controlar a implementação das reformas agrárias
olhando apenas a área média em acres redistribuída é menos prioritário.
Nossos resultados de pobreza vêm de um novo e consistente conjunto de
quadros para as áreas rural e urbana dos dezesseis maiores Estados indianos no
período de 1958 a 1992 compilados por Ozler, Datt e Ravallion (1996).5 As medidas
são baseadas na distribuição de consumo das 21 séries da Pesquisa Nacional por
Amostragem (NSS) cobrindo esse período. A linha de pobreza é baseada na norma
nutricional de 2.400 calorias por dia e é definida como o nível de dispêndio médio
total per capita ao qual essa norma é tipicamente atendida. Duas medidas de pobreza
são consideradas: o índice de contagem de per capita (H) e a medida de lacuna de
pobreza (PG). Uma vez que as pesquisas da NSS não são anuais, a interpolação
ponderada foi usada para obter valores entre as pesquisas.6
Os valores reais do produto agrícola per capita do Estado, não-agrícola do
Estado e combinado foram usados para examinar os determinantes do
crescimento. O produto doméstico agrícola do Estado foi deflacionado usando-
se o Índice de Preços ao Consumidor para os Trabalhadores Agrícolas, enquanto
que o Índice de Preços ao Consumidor para os Trabalhadores da Indústria foi
usado para deflacionar o produto doméstico não-agrícola do Estado. Também
construímos uma variável para medir o produto agrícola. Essa foi definida como
o produto real agrícola doméstico dividido pela área não cultivada. Isso
grosseiramente captura as mudanças tecnológicas na agricultura.
Os dados de finanças públicas em nível de Estado foram também coletados.
Pelo lado dos dispêndios, a principal classificação disponível para o nosso período de
dados está nos gastos com desenvolvimento e nos gastos não relacionados a questões
do desenvolvimento. Embora os dispêndios com desenvolvimento não incluam as
despesas com serviços econômicos e sociais, não existe uma conecção particular entre
essa categoria e os esforços do governo para desenvolver a população ou a infra-
estrutura nos seus Estados.7 Gastos com desenvolvimento são, portanto, desagregados
em dispêndios de saúde e dispêndios de educação, os quais nós podemos esperar ter
apreciáveis impactos sobre a pobreza. Colocamos isso em termos reais e os medimos
4
Para os Estados classificados em alto reforma agrária, o Gini da terra cai de 0.686 em 1953/54 para 0.669 em 1982 (uma
queda de 0.017) enquanto que a queda para os Estados classificados em baixo reforma agrária é de 0.653 para 0.643 (uma
queda de 0.010). Para os Estados alto de reforma agrária a queda média na proporção de famílias sem terra é de 14.97%
para 12.03% (uma queda de 2.94%) enquanto que para os Estados com baixo reforma agrária a queda é de 12.40% para
10.91 (uma queda de 1.49%).
5
Nossos agradecimentos a Martin Ravallion por nos prover com esses dados.
6
Abaixo, nós checamos que os nossos resultados são robustos por meio da inclusão somente daqueles anos onde existia
uma série da pesquisa NSS.
7
Os serviços econômicos incluem agricultura e atividades afins, desenvolvimento rural, programas de área especial,
irrigação e controle de cheias, energia, indústria e minerais, transporte e comunicações, ciência, tecnologia e ambi-
ente. Serviços sociais incluem educação, saúde médica e pública, bem-estar da família, oferta de água e sanitária,
moradia, desenvolvimento urbano, trabalho e bem-estar no trabalho, seguridade social e bem-estar, nutrição e assis-
tência contra calamidades naturais.
em termos per capita. Nós também coletamos impostos totais do Estado como uma
fração do Estado no PIB como uma medida bruta de tamanho dos governos do Estado
e a redistribuição dos impostos de Estado per capita 8 para capturar o esforço dos
Andra 1004 0.021 0.041 49.40 1.528 0.020 0.097 101.0 0.069
Pradesh (260) (0.071) (0.005) (10.68) (0.506) (0.002) (0.032) (60.46) (0.047)
Assam 903 0.026 0.152 46.73 2.000 0.025 0.076 95.21 0.046
(196) (0.071) (0.017) (8.77) (1.069) (0.004) (0.016) (42.70) (0.042)
Bihar 633 0.007 0.037 63.25 4.305 0.020 0.087 52.37 0.068
(110) (0.102) (0.005) (6.17) (1.924) (0.001) (0.028) (31.25) (0.031)
Gujarat 1176 0.019 0.044 52.36 3.056 0.023 0.089 110.3 0
(272) (0.135) (0.008) (9.13) (1.264) (0.003) (0.026) (63.91)
Haryana - - - 30.38 0 0.025 0 - 0
(7.32) (0.001)
Jammu 1021 0.013 0.621 32.54 1.333 0.026 0.088 203.6 0
Kashmir (228) (0.101) (0.058) (7.35) (0.717) (0.001) (0.040) (81.06)
Kamataka 1037 0.018 0.045 52.66 2.833 0.021 0.098 99.71 0.014
(216) (0.066) (0.004) (7.82) (1.384) (0.002) (0.035) (52.31) (0.007)
Kerala 864 0.019 0.160 56.59 5.444 0.018 0.109 97.66 0.337
(182) (0.063) (0.017) (13.88) (3.376) (0.004) (0.034) (42.06) (0.135)
Madhya 843 0.013 0.022 56.14 2.806 0.024 0.088 80.18 0
Pradesh (190) (0.106) (0.003) (7.08) (0.710) (0.001) ( 0.027) (43.93)
Maharastra 1288 0.019 0.018 57.30 1.861 0.023 0.091 106.73 0.078
(331) (0.70) (0.002) (7.45) (0.424) (0.001) (0.020) (59.66) (0.038)
Orissa
873 0.015 0.070 56.55 5.056 0.019 0.078 91.13 0.036
Punjab (186) (0.128) (0.014) (9.04) (3.116) (0.002) (0.029) (42.30) (0.021)
2862 0.034 0.189 26.72 0.583 0.020 0.053 134.6 0.082
Rejasthan (775) (0.060) (0.029) (8.12) (0.500) (0.001) (0.007) (70.04) (0.035)
785 0.014 0.027 51,37 0.944 0.026 0.084 79.20 0.011
Tamil (136) (0.144) (0.003) (7.37) (0.232) (0.002) (0.026) (38.39) (0.010)
Nadu 1015 0.020 0.052 54.45 4.917 0.016 0.110 110.4 0.042
(272) (0.101) (0.008) (7.84) (2.545) (0.003) (0.034) (69.73) (0.027)
Uttar
Pradesh 874 0.011 0.025 47.86 3.750 0.021 0.080 66.79 0.023
(140) (0.081) (0.002) (7.20) (1.251) (0.003) (0.026) (38.10) (0.009)
West
Bengal 1173 0.011 0.074 46.88 6.139 0.023 0.078 85.92 0.455
(191) (0.064) (0.007) (10.31) (.5.581) (0.002) (0.021) (41.55) (0.256)
8
Essas incluem o imposto da terra, o imposto da renda da agricultura e o imposto de propriedade os quais estão todos sob
o controle dos governos do Estado.
1954 -Lei de Abolição dos Inams -Abolições dos inams (com poucas exceções). 2
Encraves (absorvidos)
1957 -Lei de abolição dos Inams -Abolição dos inams (com poucas exceções) , 2
cunhada pelo Supremo Tribunal
em 1970.
Códigos de Classificação:
(1) Reformas de arrendamento
(2) Abolição de intermediários
(3) Tetos sobre as propriedades de terra
(4) Consolidação das propriedades de terra
1961 -Lei de Reformas Agrárias -Prove estabilidade de posse para os (1), (3)
. (em vigor.. proprietários de terra para retornar ½
apartir de 65) . da área arrendada; os arrendatários
foram privilegiados com o direito
opcional de compra através do paga-
mento de 15-20 vezes o aluguel
líquido; imposição do tetos sobre as
propriedades de terra.
1974 -Lei das Reformas Agrárias -Imposição de tetos sobre as proprie- (1), (3)
(emenda). dades da terra de 4.05-21.85 hectares
(depois de 19720; remoção de todas
as isenções daquelas referentes a
legislação do arrendamento.
1969 -Lei de Refomas Agrárias -Confere plenos poderes aos arrenda- (1), (2), (3)
. (em vigor .
(Emenda) tários; 2.5 milhões de arrendatários
apartir de 1970) . tornaram-se proprietários de terra;
emenda em 1979 . expira o direito de retomada; embora
escrita no papel, a lei “não conduziu a
uma justiça social”, por causa do
arrendamento encoberto; a imposição
de tetos sobre a propriedade da terra
de 6.07-15.18 hectares (1960-1972) e
de 4.86-6.07 hectares (depois de 1972);
abolição dos direitos intermediários.
1960 -Lei de Imposição dos Tetos -Imposição dos tetos sobre as pro- 3
. (em vigor. sobre as Propriedades Terra priedades de terra de 16.19-32.37
.a partir 61). hectares (1960-1972) e de 7.30-18.25
hectares (depois de 1972).
1953 -Lei de Aquisição de Propri- -Os proprietários de terras limitaram (1), (2)
edades o teto; proveu a abolição de todas as
posses intermediárias.
9
Defasando a nossa variável reforma agrária, nos ajuda a evitar problemas de simultaneidade e esse procedimento é adotado
em toda a parte.
Efeitos anuais Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim
Número de
observações 506 300 506 506 507 507 507 507
*
Todas as regressões são registradas com desvio padrão robusto.
10
Usando a taxa de contagem per capita no lugar da lacuna de pobreza, não afeta significativamente qualquer dos nossos
resultados sobre a reforma agrária e pobreza.
3.2 Robustez
11
Isso é o dispêndio total excluindo saúde e educação.
12
Desagregações pequenas dos itens de dispêndio não afetaram os resultados.
13
Os resultados de dispêndio são interessantes dada a prioridade desejada, em debates correntes, para a expansão do
dispêndio em educação e saúde como um aspecto chave da redução da pobreza (ver Dreze e Sen, 1995). Todavia, é possível
que nós necessitemos medidas mais estreitas das formas nas quais programas particulares sejam priorizados para fazer
progresso nessa direção.
14
Nós experimentamos com regressões incluindo um grande conjunto de variáveis de finanças públicas pertencendo a áreas
específicas relevantes para a determinação da pobreza. Em todos os casos o impacto negativo e significante da reforma
agrária sobre a pobreza rural permaneceu intacta.
Número de
observações 416 416 416 416 416 416
* Todas as regressões são registradas com desvio padrão robusto.
3.2.2 Endogeneidade
onde lst é a variável reforma agrária que nós discutimos acima, αs é o efeito fixo
de Estado, b é uma variável dummy de ano, yst é um vetor de variáveis as quais
nós tratamos como exógenas, as variáveis Z st-4 são variáveis políticas refletindo
as participações de cadeiras no parlamento dos diferentes grupos políticos e se
eles tem a maioria em Vihan Sabha, cada uma defasada em quatro anos. Esses
são construídos por meio dos registros do número de cadeiras vencidos pelos
diferentes partidos políticos nacionais em cada uma das eleições de Estado
sob seis arranjos amplos. (os partidos contidos no grupo relevante são
apresentadas entre parênteses depois do nome do arranjo.) Esses são: (i) o
Partido do Congresso (Congresso Nacional da Índia), (ii) outro Congresso (+
Congresso Socialista Indiano + Congresso Nacional Indiano Urs + Organização
do Congresso Nacional Indiano), (iii) o arranjo de extrema esquerda (Partido
Comunista da Índia + Partido Comunista da Índia Marxista), (iv) o arranjo de
esquerda moderada (Partido Socialista + Partido Socialista de Praja), (v) Partidos
Hindus (Partido Bhartiya Janata + Bhartiya Jana Sangh), (vi) Partidos Janata
(Partido Janata, Partido Janata Dal + Partido Lok Dal). Nós expressamos essas
participações como uma função do total de assentos no Legislativo. Nós também
construímos uma dummy para verificar se o arranjo político agarrou uma maioria
no Vidhan Sabha no sentido da ocupação de mais que 50% dos assentos
totais. Novamente o período de quatro arranjos políticos alcançou tal maioria
(Congresso, extrema esquerda, Hindu e Janata).15 O Congresso tendeu a dominar
as assembléias no período, embora os partidos de extrema esquerda tenham
registrado maiorias em Kerala e West Bengal e partidos Janata em Bihar, Haryana,
Karnataka, Madya Pradesh, Rajastan e Uttar Pradesh. Ao longo do tempo houve
um declínio na importância do Congresso e um aumento na importância dos
partidos religiosos e regionais.
A tabela 5 apresenta as estimativas da equação (3.2) para diferentes
tipos de reformas agrárias. O quadro geral é o de que as variáveis políticas
se voltam para as reformas do arrendamento e legislação do teto da terra. As
variáveis políticas são determinantes conjuntamente significantes de ambas
as reformas agrárias. Relativamente a "outras" categorias omitidas, as quais
são compostas de uma mistura de partidos regionais e independentes, a
participação das cadeiras dos partidos moderados de esquerda, Congresso
e Partidos Janata diminuíram a probabilidade de aprovação da legislação da
reforma da terra. A esquerda ficou dividida em relação à questão da legislação
do teto da terra, enquanto a extrema esquerda teve uma participação positiva
nas cadeiras do parlamento, a esquerda moderada teve uma participação
15
O arranjo Hindu somente alcançou uma maioria em um Estado por um ano. Por essa razão, somente as dummies do
Congresso, extrema esquerda e Janata foram incluídas na análise.
defasagem (t -4)
consolidação 0.233 1.708
da terra (0.15) (0.46)
Número de
observações 410 410 410 410
medida de pobreza rural (coluna 3). A coluna (4) mostra que a reforma agrária tem
um impacto significante em termos de encurtar a lacuna de pobreza rural-urbana.
Nós também registramos os testes das nossas restrições de
superidentificação para as regressões de variáveis instrumentais. As variáveis
políticas passaram nos testes estatísticos de superidentificação e, por essa
razão, pelo menos em termos econométricos pareceriam ser instrumentos
apropriados para as reformas agrárias. A tabela (6) pode ser melhor interpretada
como uma checagem da robustez de nossos resultados, ao invés de um modelo
estrutural mais cuidadosamente pensado. A impressão geral é a de que os nossos
resultados se encaixam para esse procedimento com as reformas agrárias
continuando a ser associadas com a redução da pobreza.
Ainda que a reforma agrária ajude aos pobres, ela pode ter um custo para
o desempenho econômico. Nós tratamos agora, portanto, de explorar se a
reforma agrária tem um efeito positivo ou negativo sobre o produto per capita da
agricultura. Nesse caso, nós usamos o log do produto per capita doméstico
agrícola do Estado como uma variável no lado esquerdo da equação (3.2), com o
lado direito aumentado pelo log do produto doméstico per capita do Estado para
modelar a dinâmica numa forma muito simples e para permitir a convergência no
tempo. Nós, portanto, temos uma regressão da forma:
*
Todas as regressões são registradas com desvio padrão robusto.
por quatro anos. Nas colunas (4) e (5) mostramos que esses achados
permanecem inalterados quando as produções agrícolas ao invés da renda
per capita estão do lado esquerdo da variável.
3.4 Sumário
4. Interpretando os resultados
e
e( p ) = arg maxe = R ( e) −
p
e( p)(1 − p )
V ( p) = vT + > vT .
p
1− p 1
V `( p) = e`( p ) − e ( p) 2 . (4.2)
p p
5. Conclusão
Referências Bibliográficas
OZLER, B. DATT, G. and RAVALLION, M. (1996) "A Data Base on Poverty and
Growth in India" mimeo World Bank.
PERSSON, TORSTEN and TABELLINI, Guido, (1994), 'Is Inequality Harmful for
Growth: Theory and Evidence,' American Economic Review 48, 600-621.
RADHAKRISHNAN, P. (1990), 'Land Reforms: Rhetoric and Reality' Economic
and Political Weekly, November 24.
SHARMA, H. R. (1994): 'Distribution of Landholdings in Rural India, 1953-54 to
1981-1982: Implications for Land Reforms', Economic and Political Weekly,
September 24.
WADLEY, S.S. and DERR, B.W. (1990): "Karimpu 1925-1984: Understanding Ru-
ral India through Restudies" in Bardhan, P. (ed) Conversations between
Economists and Anthropologists (Delhi: Oxford University Press).
WARRINER, D. (1969), Land Reform in Principle and Practice (Oxford: Oxford
University press).
World Bank (1997), 'Poverty in India: 50 Years after Independence', World Bank mimeo.
Frederic Zimmerman
Universidade de Stanford (EUA)
O presente documento agrega e sintetiza alguns dos escritos dos autores. Como tal, eles expressam sua gratidão a uma longa lista de pessoas
e instituições que os apoiaram ao longo do tempo. Agradecimentos especiais são dirigidos a John D. e à Fundação Catherine T. MacArthur,
bem como ao programa de pesquisa IRIS, da Universidade de Maryland.
Introdução
quadro altamente desigual da propriedade de terras que, por muito
1
Atenção renovada a essas questões vem sendo ainda mais reforçada, pela contínua evolução da literatura sobre os custos
econômicos da desigualdade (tanto em sua encarnação microeconômica, resumida em Bowles, Bardhan e Gintis, 1998; quanto
no contexto macroeconômico, inspirado pela literatura de crescimento endógeno), e a conseqüente busca por um “Consenso
pós-Consenso de Washington” em torno da política de desenvolvimento.
3
Além do mais, os agentes desejosos de contratar trabalho têm que pagar pelo preço da busca, em termos do tempo
relacionado à quantidade de tempo que eles desejam vender. Sem esta suposição, o preço sombra do trabalho seria constante
para os domicílios que não contratam trabalho de fora. Com essa suposição, o preço sombra do trabalho, para as famílias que
não contratam trabalho, aumenta com o tamanho da gleba e diminui com o tamanho da família.
Cada regime pode ser caracterizado pelo preço sombra do trabalho, quer
dizer, o preço endógeno do valor do produto marginal do trabalho na produção. Por
exemplo, para os agentes semiproletários, que cultivam determinada gleba e forne-
cem um determinado trabalho ao mercado, as condições de primeira ordem, defini-
das em (1) acima, implicam num preço sombra do trabalho, ω, que é dado por:
ω w (M/ Ls) (1 µ)
em que ω é o preço de mercado de trabalho, µ é o preço sombra associado à
restrição de capital (3). Observe-se que o preço sombra para essa classe é o salário
marginal esperado, que poderia ser ganho no mercado de trabalho não agrícola,
aumentado pelo preço sombra do capital. O preço sombra para os outros tipos de
regime de trabalho é dado no alto das colunas da Tabela 1. Para as classes que
contratam trabalho, o salário sombra é dado pelo custo do trabalho, medido em
termos de eficiência, e também ajustado pelo preço sombra do capital.
4
Observe-se que, como Eswaran e Kotwal (1986), podemos eliminar diversos tipos de solução, inclusive aqueles que apresen-
tam famílias que, simultaneamente, contratam e vendem trabalho no mercado.
1 000
50
9 00
40
30
5000
4000
20
300
0
200 0
10
1000
ficar o consumo atual, como também terá que sacrificar uma parcela de rendi-
mentos futuros, devido ao fato de que o preço da terra excederá o valor atual
líquido da produção da terra obtida.
Portanto, essa vala, ou fosso, e as subjacentes interações entre imperfei-
ções de mercado, se interpõem como sérios obstáculos à acumulação de terras
pelos agentes mais pobres e à eliminação das desigualdades de ativos, que são
caras do ponto de vista econômico. Na melhor das hipóteses, as estratégias para
atravessar a vala, ou circunavegá-la, exigirão um tempo significativamente longo e o
sacrifício do consumo. O fato de os agentes acharem que vale à pena ou não, se
submeterem a tal sacrifício, requer uma especificação mais precisa do problema de
escolha dinâmica que abordamos a seguir.
como renda pela qual maximizam a utilidade intertemporal, por meio de suas
decisões de acumulação de ativos. Desta forma, as famílias enfrentam duas
formas de trade-offs: em suas decisões de produção, elas têm que escolher até
que margem irão investir seu dinheiro em fertilizantes ou trabalho, ou se pou-
parão o dinheiro, em troca de uma taxa de juros específica. Em sua decisão
intertemporal, as famílias decidem até que ponto da margem elas investirão
dinheiro na acumulação de terra ou na acumulação de dinheiro, ou se consumi-
rão o dinheiro pelo seu valor de utilidade corrente.
Observe-se que, como está escrito, o modelo de horizonte infinito faz
inúmeras suposições simplificadoras sobre o funcionamento dos mercados
de terras. Em particular, nós ignoramos os custos da transação no mercado
de terras, os quais, conforme as evidências (e as políticas de governo), impe-
dem que os agentes mais pobres adquiram as terras dos mais ricos (ver Carter
e Zegarra, no prelo). A especificação dinâmica tampouco impõe algum requi-
sito mínimo de subsistência, permitindo que as famílias pobres poupem, até
o limite de sua poupança que seja considerado dinamicamente racional, mes-
mo que isso implique em uma redução do consumo em níveis que, na realida-
de, são inconsistentes com a manutenção da capacidade de trabalho e da
saúde (ver Ray e Streufert, 1993). Por último, o problema dinâmico segue o
problema de produção estática, ao assumir um mundo sem riscos. O efeito
líquido de todas essas suposições é o de aumentar a probabilidade de que o
mercado de terras pode, de fato, eliminar efetivamente as desigualdades one-
rosas ao longo do tempo. O capítulo seguinte abandona essa última suposi-
ção e leva em conta o impacto das restrições impostas pelo risco e pela
subsistência sobre a acumulação de terras.
A função abaixo é a função de valor, correspondente ao problema de
horizonte infinito,
J* (Tt ’ Mt) max {u (ct) + δ J * (T t + 1, M t + 1) } (10)
5
Com efeito, quando plotadas numa superfície tridimensional, a aproximação numérica da função de valor verdadeiro é
topograficamente desinteressante, embora ela exiba algumas mudanças sutis e importantes em sua curvatura.
105
Rend a e consumo
104
Regime I
Regime III
10 3
Regime II
102
101
6
A noção da existência de produtores obstinados, porém subcapitalizados foi simbolizada por um dos principais produtores
de vinho da África do Sul, que compareceu a uma reunião ministerial sobre reforma agrária, ao final da qual presenteou o
ministro da Reforma Agrária com uma caixa de vinho, em madeira. O ministro, encantado, abriu a caixa e notou que a mesma
estava cheia de hortaliças. Ao passo que a mensagem nem tão sutil dos fabricantes de vinho, sobre os potenciais impactos
da reforma agrária, presumivelmente encerrava motivações próprias, ela simboliza a idéia de que as trajetórias subcapitalizadas
de acumulação de terras podem incorrer em custos econômicos, mesmo que eliminem a desigualdade onerosa em longo prazo.
1.9
1 02.000
Desigualdade (escala a direita)
1.8
1.000
1.7 10
Índice de produto
1.6
0.000
1.5 10
1.4
-1.000
1.3 10
-2.000
1.1 10
1.0
1 0-3.000
0 10 20 30 40 50
Tempo
Figura 3: O custo dinâmico e a persistência da desigualdade de ativos
7
Pode-se imaginar uma relação mais sutil entre o consumo (ou nutrição) e a produtividade. Uma família que esteja enfren-
tando uma queda de subsistência no ano 1, diminuiria, por exemplo, a capacidade de trabalho no ano 2. No entanto, se os ativos
da família forem tais, que no ano 1 eles caíssem para um nível de dificuldade de subsistência, então, no ano 2, com menor
capacidade de trabalho, ela correria um risco ainda maior de enfrentar uma queda de subsistência. A sua capacidade de
trabalho, portanto, seria ainda menor no ano 3. Desta forma, a família, quase que certamente, perderia a sua inteira dotação
de trabalho no decorrer de alguns anos. A formulação adotada aqui é, portanto, uma simplificação desse processo, e é uma
formulação razoável, no contexto da literatura sobre a dinâmica nutrição-produtividade.
8
Na prática, muitos ativos além de terras e grãos estão disponíveis, inclusive gado, dinheiro, equipamentos, mão-de-obra e
capital humano. Terra e grãos foram escolhidos porque se situam nos extremos da distribuição, em termos de fungibilidade,
riscos incorridos na produção e produtividade. Neste modelo, assumiu-se a taxa de retorno sobre os grãos, como zero, com
certeza. Na prática, o armazenamento de grãos está sujeito a perdas, devido a pragas ou furtos, os quais tornam os retornos
sobre os grãos estocados negativos e variáveis, mas a nossa suposição de um retorno estável zero sobre os grãos é motivada
pela habilidade das famílias em estocarem dinheiro, tanto quanto grãos.
onde J* (Tt, Mt) dá o valor de utilidade da família (em termos de valores atuais
esperados e descontados) da combinação de ativos no tempo t (Tt, Mt), onde a
família escolhe a forma ótima de padrão de consumo e acumulação de ativos
num tempo pós t. Já que a única forma de heterogeneidade origina-se da deten-
ção de ativos, a função de valor é a mesma para todas as famílias, e o sobrescrito
i indica que algumas famílias foram deixadas de lado.
9
Neste ponto os agentes não possuem renda para alocar em investimentos em ativos.
2800
Renda + 1000
2400
2200
Rend a e consumo
2000
1800
1600
Consumo
1400
1200
1000
800
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200
Tempo
Figura 4a: Renda e consumo dos agentes pobres
Renda
8000
Rend a e consumo
7000
6000
5000
4000
Consumo - 3000
3000
2000
1000
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200
Tempo
Figura 4b: Renda e consumo dos agentes ricos
10
Esses resultados dependem fortemente da presença de restrições de subsistência. Conforme argumentamos anteriormente,
tal suposição parece razoável para as regiões pobres dos países em desenvolvimento, inclusive boa parte da África e do sul
da Ásia. Entretanto, existem explicações alternativas disponíveis. Em primeiro lugar, um portfolio desse tipo, estratificado por
riqueza, poderia ter origem no fato de os pobres terem pior acesso ao seguro sobre o consumo do que os ricos, como foi sugerido
por Morduch (1994, 1995). Se tal acesso estratificado ao seguro não existisse, ele tenderia a corroborar os resultados
apresentados aqui. Ademais, o acesso diferenciado ao seguro formal ou informal está condicionado à posse de ativos, os quais,
conforme expressos aqui, surgem por meio de um processo dinamicamente endógeno de acumulação.
16000
14000
12000
10000
8000
Grão
6000
4000
2000
0 2 4 6 8 10 12 14 16
Terra
Figura 5: O limiar de Micawber e o aprofundamento da desigualdade de ativos
4. Conclusão
Assunto objeto de debates intensos há muito tempo, a evolução da
estrutura agrária nas economias desiguais da América Latina – a “questão agrá-
ria” – emerge, mais uma vez, devido a inúmeras razões, nenhuma das quais
sendo a crescente evidência que sugere que a desigualdade é economicamente
onerosa. Este documento, motivado por programas e propostas de se utilizar o
mercado de terras e as decisões individuais intertemporais de acumulação,
para compensar a desigualdade de propriedade de terras, recorreu à teoria
microeconômica de acumulação de ativos para responder à indagação, “podem
o tempo e o mercado de ativos de terras ser usados para resolver a questão
agrária na América Latina contemporânea, onde a liberalização econômica eli-
minou muitos dos obstáculos e distorções, responsáveis pela perpetuação da
desigualdade agrária?” Ao passo que a análise do novo equilíbrio dinâmico
geral, empregada para responder a essa questão não admite nenhuma resposta
simples ou única a essa indagação, diversas e bem eloqüentes lições surgiram,
com implicações diretas para a pesquisa, para as políticas e para os políticos:
Anexos
portanto, reduzimos esse espaço, buscando J* (T, M), dado a trajetória espera-
da dos preços. Economizamos nas notações, escrevendo simplesmente J* (T,
M), em vez de J* p (T, M), mas fica entendido que a função de valor depende, sim,
das expectativas de preços, e é diferente, para cada período.
utilidade. A não linearidade da equação (12), bem como o risco na equação (13),
tornam impossível a determinação analítica da função de valor verdadeiro. Por-
tanto, a função de valor verdadeiro é calculada numericamente, utilizando o
modelo iterativo comum descrito por Streufert (1990) e Zimmerman (1994).
A solução para cada otimização de domicílio, para cada período, implica na
compra e venda de ativos num mercado. Esse mercado, presume-se, compõe-se
inteiramente dos domicílios incluídos no modelo numérico, isto é, o vilarejo com 100
famílias. A interação das diversas demandas e ofertas individuais de ativos, dá origem
a um preço endógeno de ativos, que define esse mercado. As transações são, portan-
to, realizadas de acordo com esse preço de ativos, e a distribuição de ativos é, desta
forma, atualizada. Observe-se que as expectativas de futuros preços endógenos de
ativos, condiciona a demanda corrente por ativos e, por conseguinte o preço endógeno
corrente. Como foi mencionado acima, presumimos que as famílias têm expectativas
racionais, no sentido de que elas conhecem os momentos de choques e a distribui-
ção dos preços dos ativos.
Essa racionalidade é atingida mediante o método iterativo. Sempre que uma
solução numérica é encontrada para o modelo, surge um conjunto de preços
endógenos de ativos, originado da interação entre as diversas famílias. O modelo
numérico é resolvido diversas vezes, cada vez tomando a tendência de preços e o
desvio da solução anterior como um fator de previsão para os preços da solução
corrente. Quando a tendência determinada de forma endógena e o desvio reprodu-
zirem a tendência e o desvio da solução anterior (contra a qual a família já fez sua
otimização), então se considera que as expectativas racionais foram alcançadas. A
convergência é alcançada em 5-10 iterações.
Desta forma, o modelo é numericamente resolvido utilizando-se dados de
Burkina Faso, no período compreendido entre 1981 e 1985, coletados pelo
International Crop Research institute of the Semi-Arid Tropics (Icrisat) (Instituto Internacio-
nal de Pesquisa sobre Lavouras dos Trópicos Semi-Áridos). Os valores paramétricos
estão apresentados em Zimmerman e Carter (1997).
Referências Bibliográficas
Alberto Valdés
Banco Mundial
Os autores agradecem sensibilizados os comentários de Hans Binswanger, Klaus Deininger, John Heath, Yair Mundlak, Pedro Olinto, Cora
Shaw, Moshe Syrquin, Thomas Wiens e outros leitores anônimos. Expressamos agradecimentos especiais a Timothy Thomas por seus
comentários e apoio editorial, bem como a Claudia Binder, Suzanne Gnaegy e Hazel Vargas. Este artigo tirou proveito de comentários feitos
em seminários do Banco Mundial (Região América Latina) em setembro de 1997; Brasília, julho de 1998 (Brasil); e Cepal, em Santiago,
janeiro de 1998 (Chile).
1. Introdução
2
Esses estudos (López 1999 a e 1999b; López e Della Maggiora; López e Romano; López e Thomas; López e Valdés, 1999 a; Carter
e Zegarra, 1999; Valdés 1999) integram o volume Rural Poverty in Latin America: Analytics, New Empirical Evidence and Policy
(Pobreza na América Latina: Analítica, Novas Evidências Empíricas e Políticas) (López e Valdés, 1999b).
dados de série histórica. Para cada país, a análise busca medir o impacto de
diversas características demográficas familiares, ativos produtivos, tais como a
terra e o capital físico, e fatores externos ao domicílio, tais como a localização
geográfica, acesso a serviços e infra-estrutura.
Por que os pobres são pobres? Basicamente, porque possuem poucos ativos
(humanos e físicos), o que é motivado, em parte, por uma longa tradição de desenvol-
vimento desigual; e porque a produtividade dos seus ativos é baixa. Esses ativos são
escassos, não apenas em quantidade, mas também em qualidade (baixos níveis de
escolaridade, em geral estão ligados à má qualidade do ensino). A baixa produtividade
dos ativos é resultado de uma combinação entre ineficiência do governo e imperfei-
ções do mercado ou, mais simplesmente, dos mercados incompletos.
Além desses dois grandes fatores determinantes da pobreza, a dimen-
são geográfica também é particularmente relevante. Como foi demonstrado por
Krugman (1991), o crescimento econômico gera uma crescente concentração
regional de atividade econômica, à medida que cresce a importância das indús-
trias móveis (por exemplo, a manufatura e os serviços) e das economias de
escala, enquanto que os custos de transporte decrescem. A maior eficiência
gerada por esse processo, para essas indústrias, lhes permite penetrar nos
mercados rurais, expulsando muitas indústrias locais, reduzindo, por sua vez,
as oportunidades de emprego não-agrícola das populações rurais.
Em contraste, uma porção significativa da população rural permanece
relativamente estagnada, devido à baixa qualificação, à distribuição etária e, em
alguns casos, a características étnicas (barreiras de língua). Ao passo que os
indivíduos jovens e mais escolarizados têm condições de migrar em direção
aos setores dinâmicos, os relativamente estagnados permanecem nas áreas
que perderam boa parte de suas atividades mais dinâmicas. Assim, a pobreza
do meio rural está, até certo ponto, ligada à evolução natural da estrutura da
economia no processo de crescimento, que gera uma crescente concentração
geográfica das atividades mais dinâmicas.
2. Antecedentes
A América Latina tem abundância de terras e um grande número de
trabalhadores rurais sem-terra. A maior parte dos camponeses sem-terra traba-
lha como mão-de-obra contratada, refletindo uma alta concentração de terras,
na qual um número pequeno de grandes fazendas comerciais convive com um
número muito maior de fazendas pequenas, e onde o grosso da produção
agrícola é gerado nas fazendas comerciais.
A América Latina é diferente da maioria das outras regiões em processo
de desenvolvimento, devido à pequena participação dos trabalhadores rurais
no mercado de trabalho e à pequena participação que a agricultura tem na
economia. Embora algumas das economias menores (El Salvador, Guatemala,
Honduras, Paraguai e Jamaica) ainda tenham mais de 45% de suas populações
vivendo nas áreas rurais, a maioria dos países maiores tem uma participação
---
---
Am os tra
---
145 1.300
18
2.1
0.9
3.7
4.1
37
50
26
Total da
HONDURAS PARAGUAY
A gri cultores
Grupo1
---
---
---
18
3.2
1.2
3.1
4.2
15
34
17
Am ostr a
Total da
509
23
6.2
2.6
0.4
3.1
2.4
16
56
26.8
33
---
---
Agri cultores
Grupo 1
---
---
72
24
3.3
0.5
2.5
1.8
54
--- 18.4
--- 31.7
Total da
Amostra
421
4.7
2.3
1.4
4.1
4.2
71
---
---
---
---
COLÔMBIA
Trab. s em terra
Grupo1 Grupo2
284
5.4
2.9
1.6
3.9
3.6
64
---
---
---
---
---
---
---
---
---
---
---
---
195
6.1
3.3
2.2
3.4
3.2
53
Am os tr a
Total da
418
12
5.1
2.5
1.1
3.9
63
7.9
5.6
59
---
COLÔMBIA
Agri cultores
Grupo1 Grupo 2
---
243
10
3.1
1.4
3.8
3.4
56
5.4
4.4
52
187
16
6.2
3.5
1.5
3.6
3.1
56
3.4
4.4
43
---
Total da
Amostra
SALVADOR
---
---
---
---
---
---
258
5.7
3.1
2.1
1.9
39
Trab. sem terra
EL
G rupo1
---
---
---
---
---
---
111
6.4
3.9
2.8
1.8
1.9
34
Total da
Am os tra
SALVADOR
562
35
3.1
1.8
3.1
2.4
83
13
17
60
6
A gricultores
EL
Grupo1
96
36
6.7
3.6
2.5
2.2
1.7
73
20
11
45
7.3
---
---
---
Am ostr a
467 1.300
59
4.4
5.7
4.6
14
61
33
33
Total da
Pequenos agricultores
G rupo1 Grupo 2
CHILE
---
---
---
68
4.6
2.1
5.6
4.8
54
25
25
167
67
5.2
2.6
5.2
10
59
36
36
---
---
---
a Os números referem-se aos anos: Colômbia, 1993; Paraguai, 1994; Honduras, 1993; Chile, 1994; El Salvador, 1995; e Peru, 1994. Os
Grupos 1 e 2 referem-se aos quintis de renda mais baixos da Colômbia e do Chile. O Grupo 1 refere-se ao tercil de renda mais baixo em
Honduras, Paraguai e El Salvador. A amostragem completa incluiu apenas os pequenos agricultores do Chile e os pequenos, médios e
grandes agricultores em Honduras, Paraguai e El Salvador. Na Colômbia a amostra inclui apenas os agricultores que vivem nas áreas rurais,
o que impõe um viés em direção aos pequenos agricultores.
b Pessoas com menos de 19 anos no Chile e Paraguai, abaixo de 16 em Honduras e, para a Colômbia e El Salvador, são todas as crianças
que habitam o domicílio.
c Em Honduras e no Paraguai define-se o trabalhadore como os membros da família entre 11 e 69 anos de idade, e 15 e 69, respectivamente.
d Os números para o Chile referem-se à assistência prestada pelo Indap, que fornece assistência técnica e financeira.
neste estudo, são consistentes com as estimativas feitas para outras regiões.
A esse respeito, ver, por exemplo, o estudo recente de Jolliffe (1998), sobre
Gana, e de Zhao (1997), sobre a China.
Tabela 3. A participação de diversos fatores na renda per capita total.
Chile El Salvador Colômbia Peru Paraguai Honduras
Capital N S
a d
0.05 - - 0.20 0.03 -
Assistência
técnica/crédito NS Significativo NS - Significativo NS
3
Nenhum dos estudos de caso abordou as diferenças de qualidade da terra, a qual, dependendo da correlação entre o tamanho
da fazenda e a qualidade da terra, poderia impor um viés às estimativas. Particularmente, se a correlação for negativa, então
o coeficiente subestimará o efeito real exercido pela terra sobre a renda.
4
Presumindo que não há um efeito de preço da produção. Se os padrões de colheita forem diferentes, e se os agricultores
comerciais produzirem bens negociáveis e os pequenos agricultores produzirem mais “bens domésticos”, o efeito resultante
da distribuição de terras sobre o preço da produção poderia compensar parte dos ganhos da produção.
4. Conclusões
A pobreza rural é, até certo ponto, resultado do aumento da mobilidade
da indústria, causada pelo crescimento econômico, combinado com a relativa
imobilidade dos segmentos menos privilegiados da população rural. Portanto,
5. Referências Bibliográficas
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Analytics, New Evidence and Policy”, World Bank Report Nº 16792-RDV/
LAC, July 28, 1997.
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SKINNER J., 1993. If Agricultural Land Taxation is so Efficient, why it is so Rarely
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ton, D.C.
ZHAO, Yaohui, 1998. “Labor Migration and Returns to Rural Education in Chi-
na”, American Journal of Agricultural Economics Nov. 1997, vol 79, Nº 4.
1
Reforma agrária significa coisas diferentes para pessoas diferentes, em diferentes circunstâncias. Para alguns, a privatização
de terras comunais ou do Estado, para torná-las disponíveis para usos comerciais, tais como a produção de safras para
exportação, é uma reforma agrária. Muitas autoridades apresentam definições mais restritivas, semelhantes às utilizadas
aqui. Por exemplo, “A Reforma Agrária abrange (1) o confisco compulsório da terra, em geral (a) pelo Estado, (b) pelos maiores
latifundiários, e (c) com indenização parcial; e (2) o cultivo da terra, de modo a espalhar os benefícios mais amplamente do
que eram difundidos antes do confisco. O Estado pode doar, vender ou alugar essa terra para o cultivo privado, em unidades
menores do que as antes existentes (reforma distributiva); ou a terra pode ser cultivada conjuntamente e o seu usufruto
compartilhado, por meio de cooperativas, ou cultivo coletivo, ou fazendas do Estado (reforma coletiva) – Lipton, 1973. As
restrições às reformas agrárias, impostas por estruturas agrárias diversas serão discutidas ao longo deste documento. Ver
também Ghai, Khan, Lee e Radwan, 1979.
2
Esses dados não são confiáveis para os países em desenvolvimento. A proporção mais alta de crianças subnutridas na Ásia
do que na África sub Saara pode ser explicada por estatísticas ruins (South Centre, 1997).
3
Quase quatro décadas atrás, um conhecido aristocrata latino-americano, que era também um líder político, latifundiário,
industrial, financista e filantropo em seu país, me explicou que o domínio de vastas extensões de terras e a marginalização
das populações rurais eram o resultado de uma seleção darwiniana natural. Os agricultores mais capazes conseguiam ampliar
os seus domínios, enquanto que outros não conseguiam competir. Na opinião desse senhor, esta era a maneira que a natureza
escolhera para assegurar o progresso. Um exame dos processos que resultam em concentração de terras, entretanto, requer
diversas outras explicações. O domínio colonial, a exportação de commodities produzidas pelos escravos e outras formas de
trabalho forçado, e as instituições que surgiram para perpetuar esses modos de produção exploradora, certamente devem
entrar em qualquer explicação das atuais estruturas agrárias dos países em desenvolvimento.
4
Todas estas categorias de domínio de terras têm um significado diferente em contextos diferentes. Um pequeno agricultor
ou arrendatário, poderá ter direitos mais garantidos sobre a terra, bem como incentivos para investir em melhorias no Reino
Unido, por exemplo, do que o dono de uma pequena propriedade em muitos países em desenvolvimento.
5
O que se constitui uma subsistência aceitável depende do tempo e do lugar. O conceito de pobreza sempre teve uma
dimensão relativa, em contraste com a riqueza e a prosperidade. Como um mínimo, uma subsistência aceitável deve
prover suficiente alimentação, abrigo e outras necessidades básicas para a sobrevivência e a reprodução. À medida que
as comunidades rurais são incorporadas aos estados-nação, em processo de modernização, e essas nações se incorporam
ao sistema mundial, a noção de subsistência aceitável nas comunidades rurais torna-se cada vez mais influenciada por
normas nacionais e internacionais.
2.1 México
Como foi dito no início, a primeira grande reforma agrária do século XX
ocorreu no México. A reforma agrária teve início em diversos estados mexica-
nos logo após o ano de 1910, e já tinha alcance nacional ao final dos anos
trinta. Entretanto, o domínio da terra continuou a ser uma questão política
central durante o restante do século. É um exercício instrutivo examinar mais
detidamente o caso mexicano, porque ele revela a complexidade dos proces-
sos de reforma agrária.
No período que antecedeu a revolução, mais da metade das terras agrí-
colas do país estava em mãos de cerca de 6.000 latifúndios com mais de 1.000
hectares cada um. Algumas dessas propriedades tinham mais de um milhão de
hectares. Essas grandes propriedades eram controladas por apenas umas mil
famílias ou corporações. Em 1910, a população total do país era de cerca de 16
milhões de habitantes, dois terços dos quais dedicados à agricultura. Para se ter
* Nota do tradutor – Ejido: no México, é a terra agrícola comunal de um vilarejo, em geral alocada em pequenas frações aos
camponeses, para serem cultivadas dentro de um sistema de domínio comum, financiado pelo governo federal.
2.2 Bolívia
Na Bolívia, a reforma agrária assemelhou-se, em muitos aspectos, à
reforma agrária inicial instaurada no México. A revolução boliviana de 1951-
52 foi o resultado de muitas décadas de controle instável do Estado por
facções oligárquicas rivais, aliadas a diversos grupos de profissionais ou
outros grupos sociais emergentes. Quando o candidato exilado do partido
nacionalista revolucionário (MNR) recebeu uma pluralidade de votos (de um
eleitorado muito restrito, de base urbana) em 1951, a eleição foi anulada. O
MNR mobilizou o apoio do poderoso e militante sindicato dos mineiros, dos
trabalhadores urbanos, dos oficiais militares nacionalistas e de alguns seto-
res camponeses. Este movimento culminou num levante popular, que trouxe
o MNR de volta ao poder em 1952, uma década depois de haver sido forçado
a sair pelas facções mais tradicionais dos grandes latifundiários, dos donos
das minas e da oligarquia militar.
O MNR havia feito promessas um tanto vagas e populistas de conceder
terras para os camponeses e para as populações indígenas, que eram fortemen-
te reprimidas, bem como para o grupo minoritário rural dos Cholos (mestiços),
que viviam em condições um pouco melhores. Os Cholos das áreas rurais fala-
vam espanhol e haviam adotado costumes urbanos, o que facilitou o seu papel
de intermediários entre a elite urbana, de ascendência predominantemente euro-
péia, e a população indígena rural, que perfazia a maioria. A maioria dos índios
constituía-se de servos nas grandes propriedades, ou moravam em comunida-
des indígenas, que haviam perdido suas melhores terras para os latifúndios.
Desde o período colonial eles não gozavam de direitos civis e eram privados de
educação formal, como ditava a política do Estado. Em meados do século XX,
muitos deles já haviam tido contato com novas idéias e aspirações, mediante o
trabalho forçado nas minas, que eram fortemente sindicalizadas, convocações
para o serviço militar, durante a dispendiosa guerra Chaco com o Paraguai, nos
anos trinta, contatos com escolas de missionários e diversos outros canais.
Após o rompimento do poder de estado tradicional, durante a revolu-
ção, os camponeses organizados passaram a ocupar as grandes proprieda-
des e queimaram muitas sedes de fazendas nas áreas rurais. Em outras áreas,
os proprietários dessas haciendas, apavorados, simplesmente abandonavam
as suas propriedades rurais. Em 1961, por exemplo, visitei uma grande pro-
priedade abandonada perto de Cochabamba, com um antropólogo peruano
que falava quíchua. As construções da fazenda estavam todas intactas, como
também estavam os estoques de maquinaria agrícola, que permaneciam
intocadas em seus armazéns. Parte da propriedade havia sido retomada por
uma comunidade indígena vizinha, ao passo que o resto fora dividido pelos
peões da propriedade e outros arrendatários residentes em glebas pequenas
de agricultura familiar de subsistência, mantendo boa parte dos pastos para
uso comum. Esses camponeses nos disseram que nunca tinham sido visita-
dos por nenhum funcionário do governo para tratar de questões agrárias,
desde a revolução, dez anos antes.
A legislação de reforma agrária de 1953 promoveu a desapropriação de
grandes propriedades mal administradas e a desapropriação parcial de outras
grandes propriedades rurais, para redistribuí-las entre os camponeses. Sob
muitos aspectos, isto foi apenas o reconhecimento legal de um processo de
reforma agrária de fato, que já havia ocorrido ou estava em curso. A provisão de
registros legais da terra aos beneficiários da reforma agrária nem sequer havia
começado, na maioria dos lugares, até o início dos anos sessenta. Em algumas
áreas ainda não se completou. A reforma foi barata para o Estado, em termos
financeiros, porque, anteriormente os camponeses já cultivavam as mesmas
terras, nas mesmas condições que depois da reforma. Os principais benefícios
para os camponeses foram que eles não mais eram obrigados a repassar parte
de sua produção, juntamente com serviços braçais aos representantes
dos latifundiários e que, agora, eles tinham maior independência e
dignidade humana.
Durante os anos cinqüenta, as grandes propriedades, que abrangiam
mais da metade das terras agrícolas da Bolívia, localizadas, em sua maior parte
nas altas planícies e vales, foram tomadas por seus arrendatários residentes e
comunidades próximas. Mais da metade dos pobres das zonas rurais do país
receberam melhor acesso à terra. Em termos globais, a produção de alimentos
2.3 Guatemala
As reformas sociais que concederam direitos mínimos, legais e políti-
cos, às populações rurais, de maioria indígena do país, começaram com a admi-
cerca de dois terços dessas terras. Cerca de 90% das populações rurais, de
maioria indígena era sem-terra ou quase-sem-terra. A prolongada e sangrenta
guerra civil que se seguiu após 1954 deixou um saldo de 150 mil mortos e
muitos outros desaparecidos ou exilados. Esse caro conflito foi em parte devi-
do à reversão da reforma agrária instaurada na administração de Arbenz.
As militâncias camponesas desempenharam um papel bem menor na
reforma de Arbenz do que havia desempenhado no México ou na Bolívia. As
demandas latentes e os ressentimentos dos camponeses, no entanto, foram
um importante fator de convencimento dos líderes políticos de que a reforma
iria atrair o importante apoio do campo. Os intelectuais progressistas, bem
como alguns militares reformados, entre os quais estava Arbenz, tiveram muita
influência na promoção da reforma agrária. Da mesma forma, tiveram influência
os líderes sindicais e profissionais, incluindo os agrônomos e os professores.
Após o golpe militar de 1954, os setores progressistas da Igreja Católi-
ca, bem como inúmeras agências nacionais e internacionais e ONGs denunci-
aram os abusos impostos aos camponeses, a um alto custo pessoal e
institucional. No entanto, muitas dessas ONGs e agências internacionais apoi-
avam tacitamente a repressão aos protestos dos camponeses. A intervenção
do governo norte-americano foi decisiva para desfazer a reforma agrária de
Arbenz e reforçar o subseqüente regime de repressão. Bem mais tarde, em
1977, as Nações Unidas, com o apoio dos Estados Unidos, ajudaram a negoci-
ar um frágil acordo de paz, embora sem reforma agrária.
2.5 Cuba
Nos anos cinqüenta, Cuba era ainda mais dependente da exportação de
açúcar do que Porto Rico tinha sido nos anos trinta. Não apenas o controle das
terras agrícolas era amplamente monopolizado por uns poucos indivíduos ou
corporações, domésticos ou estrangeiros, mas também as válvulas de escape
almente o embargo comercial dos EUA, e foi suficiente para dar suporte a uma
economia em expansão e melhores níveis de vida para a maioria dos cubanos.
Quando o comércio e a ajuda da União Soviética cessaram após 1989, a agricul-
tura cubana e o resto da economia entraram em severa recessão. A pobreza
extrema no meio rural tinha sido virtualmente eliminada em Cuba, após a refor-
ma agrária. Todos os cidadãos tinham direito a um suprimento básico de ali-
mentos, bem como a serviços de saúde e educação de boa qualidade. Após o
colapso da URSS, entretanto, a falta de insumos importados, como ração para
o gado, combustíveis, produtos químicos e peças de reposição, causou uma
queda drástica da produção agrícola. Numa tentativa de aumentar a eficiência e
os incentivos, os mercados de agricultores passaram a ser legais em 1993. Mais
da metade das terras das fazendas estatais foi doada a cooperativas de produ-
ção menores, no que veio a ser uma nova reforma agrária. Essa e outras refor-
mas ajudaram a deter o declínio da produção, mas a situação permanecia críti-
ca, devido, em grande parte, à reduzida capacidade de importar, acentuada pelo
embargo dos EUA. A dependência de alimentos importados chegava a mais de
um terço do consumo antes da revolução. Essa dependência aumentou para
mais da metade no começo nos anos oitenta. Níveis semelhantes de depen-
dência em alimentos importados foram observados na maioria dos países insu-
lares caribenhos, nos anos setenta e oitenta. Em Cuba, em 1996, a redução do
nível de consumo de alimentos chegou perto de 40%. Esse alto nível de depen-
dência em alimentos importados não foi resultado da reforma agrária, mas o
resultado de uma estratégia de desenvolvimento que conferiu alta prioridade à
promoção da produção do açúcar e outras safras de exportação, em detrimento
da agricultura de pequeno porte. Como vimos acima, uma dependência de
alimentos importados foi também verificada em Porto Rico nos anos trinta.
O Estado e os pobres das zonas rurais foram os principais atores que
deram início à reforma agrária cubana. As políticas do partido dirigente, a URSS
e os EUA, entretanto, tiveram influência decisiva na evolução da reforma agrá-
ria. As políticas desses atores “externos”, no entanto, determinaram, em parte,
as flutuações dos padrões de vida e a produtividade dos beneficiários da refor-
ma agrária desde 1964.
2.6 Venezuela
A reforma agrária ocorrida no início dos anos sessenta foi negociada
pelo novo governo, eleito democraticamente, que substituiu a prolongada e
brutal ditadura militar. A reforma agrária havia sido precedida por protestos
generalizados das ligas camponesas, que contribuíram para a queda do
regime autoritário anterior. Um quarto dos trabalhadores rurais sem-terra
ganhou fazendas de cerca de 10 hectares cada, o que perfazia aproximada-
mente um décimo das terras agricultáveis do país. Metade da terra alocada
aos camponeses era expropriada de grandes latifúndios e outra metade era
terra de propriedade do Estado.
2.7 Chile
A política eleitoral foi um mecanismo importante que empurrou a refor-
ma agrária no Chile de um começo tímido para um clímax radical, que implicou
em modificações profundas na estrutura agrária. Uma contra-reforma realizada
depois de 1973 veio acompanhada de outras mudanças estruturais.
Grande parte do Chile rural dos anos cinqüenta ainda era dominada
por grandes latifundiários, muitos dos quais mantinham relações quase feu-
dais com seus colonos, trabalhadores e pequenos proprietários das vizi-
nhanças. Três décadas mais tarde, a maior parte da agricultura chilena era
controlada por fazendeiros capitalistas que usavam tecnologias intensivas
gais até meados dos anos sessenta. Os serviços públicos, como escolas e
postos de saúde penetraram o campo muito lentamente, em comparação com
seu rápido crescimento nas cidades e vilas. Mesmo assim, em 1950, estavam
bem disseminados em muitos vilarejos e pequenas localidades rurais, o que
significa que estava se estabelecendo uma presença crescente da burocracia
do governo central nas áreas rurais, que os latifundiários tinham dificuldade de
controlar. Greves e outras formas de conflito entre os patrões e seus traba-
lhadores, bem como com membros das comunidades de pequenos propri-
etários, surgiram mais cedo, durante a administração da frente popular do
final dos anos trinta. Isso levou eventualmente à declaração da ilegalidade
do partido comunista entre 1948 e 1958. Entretanto, a repressão não con-
seguiu sufocar as greves rurais e os conflitos, já que o partido comunista
continuava a agir clandestinamente, enquanto que outros partidos de es-
querda e sindicatos afiliados agitavam e se organizavam mais abertamente
nas áreas rurais. Além disso, no início dos anos cinqüenta, elementos pro-
gressistas da Igreja Católica também apoiavam as demandas camponesas
por melhores salários, melhores condições de trabalho e serviços sociais,
bem como um acesso mais justo à terra.
O governo Ibáñez, mais aberto, voltou a legalizar o partido comunista em
1958. O governo também introduziu a reforma eleitoral rural proposta pelos
Democratas Cristãos, com apoio dos partidos de esquerda e de centro. As elei-
ções gerais e presidencial daquele ano resultaram numa competição acirrada
entre três facções, os partidos de direita, cujo candidato mal ganhou uma
pluralidade, os candidatos Democratas Cristãos e os da frente popular de esquer-
da (FRAP). O bom desempenho da coalizão socialista-comunista nas áreas rurais
revelou que os grandes latifundiários não mais detinham o controle sobre os
votos dos seus colonos e trabalhadores. Os Democratas Cristãos e a FRAP havi-
am prometido a reforma agrária. Além disso, um candidato populista de última
hora mal obteve alguns votos da FRAP, para lhe negar a pluralidade. A eleição
deixou as classes abastadas perplexas, bem como muitos investidores estrangei-
ros e a embaixada norte-americana. A coalizão conservadora venceu a eleição
para presidente por estreita margem, em 1958. Ela conseguiu apenas um terço do
voto popular, embora os outros dois terços tivessem votado em candidatos favo-
ráveis a algum tipo de reforma agrária.
A primeira tímida legislação de reforma agrária tinha sido promulgada
em 1928, após muitos anos de manifestações camponesas e outros sinais de
inquietação social no meio rural. A agência de colonização agrícola (Caja de
Colonización Agrícola) foi estabelecida com a missão de criar assentamentos ru-
rais de pequenos agricultores, para absorver os trabalhadores rurais desempre-
gados e outros que demandavam melhor acesso à terra. A Caja foi autorizada a
adquirir propriedades colocadas à venda, para subdividi-las em unidades fami-
liares menores e vendê-las a preços vantajosos aos assentados, que tinham
acesso ao crédito e infra-estrutura, juntamente com assistência técnica e de
comercialização. A Caja também tinha autoridade legal para expropriar deter-
claros referentes à nova estrutura de domínio de terras que surgiria com essa
reforma. Como medida de transição, a maioria das propriedades desapropri-
adas era administrada conjuntamente por representantes da corporação de
reforma agrária e por comitês eleitos por seus antigos colonos e trabalhado-
res. Essas unidades administrativas, ou assentamentos, em geral coincidi-
am com as propriedades desapropriadas. Depois de um período de transi-
ção de aproximadamente cinco anos, era dada a opção aos colonos e traba-
lhadores beneficiários de receber o registro legal da terra em propriedades
cooperativas ou em domínios individuais. Nos lugares onde os trabalhado-
res e colonos eram bem organizados, com liderança dinâmica, eles
freqüentemente tinham participação importante na gestão do assentamen-
to. Em outras propriedades desapropriadas, entretanto, os funcionários da
Cora desempenhavam o papel dominante.
A coalizão Unidade Popular (UP), de comunistas, socialistas e outros
partidos de esquerda, ganhou, por pequena margem, a eleição presidencial
de 1970. Ao contrário de 1964, ambos os partidos de direita e os Democra-
tas Cristãos haviam lançado candidatos próprios. A UP angariou enorme
apoio nas áreas rurais, com suas promessas de reformas agrárias mais rápi-
das e radicais. No entanto, o governo Allende não detinha maioria no poder
legislativo, o que queria dizer que ele não conseguia promulgar leis para
implementar o programa “socialista”. O governo decidiu então explorar, ao
máximo possível, a reforma agrária e a lei trabalhista, já em curso, A coalizão
UP promoveu, vigorosamente, a mobilização política e a organização dos
trabalhadores rurais e camponeses e apoiou suas reivindicações por terra.
Em dois anos, o governo desapropriou praticamente todas as grandes pro-
priedades remanescentes. Além disso, o número de filiados aos sindicatos
rurais, que já tinha se expandido de uns poucos milhares para 140 mil no
período 1964-1970, pulou para 210 mil em 1972.
O governo Allende enfrentou o mesmo dilema de seu antecessor, de
como transferir a terra desapropriada para um campesinato socialmente dife-
renciado e parcialmente mobilizado. As propriedades desapropriadas
totalizavam cerca de 36% das terras agrícolas do país e eram responsáveis
por 30% da produção agrícola total, mas empregavam apenas cerca de um
quinto do total da mão-de-obra agrícola. Boa parte desses trabalhadores não
residia na propriedade desapropriada, mas em comunidades rurais com terra
insuficiente para seu autoprovimento. Esses trabalhadores em tempo parcial
e outros muitos pequenos proprietários perfaziam cerca de três quintos da
população agrícola. Além disso, alguns residentes das propriedades cultiva-
vam as pequenas áreas, a eles alocadas temporariamente, como pagamento
parcial por se trabalho na propriedade. Muitos outros não tinham nenhum
acesso a terra para seu próprio uso e outros compartilhavam colheitas ou
alugavam frações das terras do latifúndio para produzir especialmente para o
mercado. A maioria das propriedades tinha infra-estrutura centralizada, tais
como sistemas de irrigação, construções e maquinaria que não poderiam ser
latente, embora temerária, simpatia de um grande número dos pobres das zo-
nas rurais. Quando as coalizões de apoio ao governo, que mudavam constante-
mente, compartilhavam o poder com os partidos urbanos de esquerda, entre-
tanto, o poder político da oligarquia rural enfraqueceu-se progressivamente,
por quase cinco décadas, mesmo mantendo a posse da maior parte das terras
agrícolas. Após a reforma eleitoral de 1958, a disputa dos partidos políticos
pelo apoio dos eleitores rurais tornou-se um mecanismo importante que acele-
rou o processo de reforma agrária. Os sindicatos de base urbana e as ONGs,
tais como os grupos mais progressistas da Igreja contribuíram, em estreita
colaboração com partidos políticos. A acelerada urbanização e a expansão da
agricultura comercial de capital intensivo também desempenharam um papel
importante no enfraquecimento da posição tradicional dos latifundiários.
Intelectuais chilenos e estrangeiros contribuíram para o processo de
reforma agrária. Muitos chamavam atenção para as desigualdades dos sis-
temas de haciendas e para as pressões resultantes das reformas paralelas
ocorridas em outros lugares. Muitos colaboraram ativamente com os esfor-
ços de organizar os trabalhadores rurais, pequenos proprietários e as pou-
cas remanescentes comunidades indígenas. A sinergia entre as percepções,
pesquisas e comunicação de idéias e informação dos intelectuais, por um
lado, e a prática, por outro, é amplamente reconhecida, mas desembaraçá-
las é virtualmente impossível.
As Nações Unidas e outras organizações internacionais contribuíram
para o processo de reforma, embora o seu papel tenha sido apenas marginal, ao
se comparar com outros atores sociais internos. A Eclac publicou diversos
relatórios nos anos cinqüenta, conclamando a reforma agrária na América Lati-
na, de modo a remover um grande obstáculo ao desenvolvimento nacional. O
Comitê Interamericano de Desenvolvimento da Agricultura (Icad – em portugu-
ês Cida) publicou o relatório Tenencia de la tierra y desarollo del sector agrícola – Chile,
em 1963. Essa pesquisa foi um dos sete estudos de caso, elaborados para
países, que eu coordenei. O estudo foi realizado por pesquisadores chilenos
com apoio financeiro e suporte técnico de cinco organizações interamericanas
e das Nações Unidas (OEA, IICA, BID, Eclac e FAO). O relatório chileno recomen-
dava fortemente a reforma. Todavia, essas recomendações teriam esbarrado
em ouvidos moucos ou teriam sido suprimidas, como ocorreu na Guatemala e
em alguns outros países, se o contexto político chileno não tivesse sido recep-
tivo. No caso do Chile, o relatório foi publicado pela Cora e usado politicamente
para demonstrar o apoio internacional ao novo programa de reforma agrária.
O Instituto Chileno de Treinamento e Pesquisa em Reforma Agrária
(Icira) era apoiado por recursos financeiros e assistência técnica da FAO/
Pnud. Unesco e ILO também cooperavam. Suas atividades ilustram algumas
das oportunidades e limitações do apoio de organizações internacionais à
reforma agrária. Começou organizando cursos práticos de treinamento para
agentes de extensão do governo, funcionários agrários e líderes de organi-
2.8 Peru
Na região rural do Peru, os grandes latifúndios estabelecidos no século
XVI ainda dominavam a estrutura agrária no início dos anos sessenta, de manei-
ra muito semelhante a muitos países latino-americanos. As grandes e moder-
nas plantações irrigadas da zona costeira, produtoras de açúcar, arroz e outras
poucas safras comerciais, tinham uma longa história de organização sindical e
conflitos trabalhistas. As grandes haciendas controlavam boa parte das terras
altas. Como na Bolívia, os residentes rurais indígenas eram servos nos latifún-
dios do planalto peruano, ou haviam sido relegados a comunidades com terras
ruins. Havia conflitos contínuos entre os donos das propriedades e as comuni-
dades indígenas, que viviam em pequenas glebas de subsistência. A ocupação
das terras pelos comuneros, que retomavam territórios perdidos, tinha se tornado
freqüente. A maioria das propriedades situadas nas terras altas auferia baixos
retornos econômicos e eram atrasadas tecnologicamente. Nos vales ao leste,
descendo em direção à bacia amazônica, havia algumas poucas plantações
relativamente lucrativas de chá, café, cacau e outras safras de exportação. A
produção ilegal de coca também se expandia. Essa crescente comercialização
cio dos pobres das zonas rurais. Como foi enfatizado na introdução, isto é
quase uma obviedade. O Estado também interpôs um obstáculo à reforma
agrária antes de ela ocorrer e deformou as reformas depois de implementadas,
em benefício dos grupos não-pobres. Em cada estágio do processo de reforma
agrária de um país, o papel do Estado era diferente. Tudo dependia de um
elenco de fatores internos e externos. A estrutura agrária antes da reforma, a
natureza do Estado e de seus principais grupos de apoio, os graus de
mobilização ou organização dos camponeses e trabalhadores rurais, e a inser-
ção do país no sistema global, eram apenas alguns desses fatores. Todos esses
fatores têm que ser levados em consideração quando se tenta explicar por que
essas reformas tiveram êxito, pelo menos parcialmente e temporariamente. Da
mesma forma, eles servem para explicar por que ainda não ocorreu nenhuma
reforma agrária significativa em países como o Brasil e muitos outros países
onde a concentração de terras, a pobreza rural e a exploração dos camponeses
eram tão gritantes como nos casos resumidos acima.
No México, Bolívia, Cuba e Nicarágua, a reforma agrária acompanhou
revoluções sociais, nas quais as forças políticas insurgentes usurparam o po-
der do Estado com amplo apoio popular. Eram várias as forças sociais que
incentivaram essas revoluções. As insurreições camponesas que reivindica-
vam a restituição de terras perdidas e os protestos contra os abusos cometidos
pelos senhores (quase) feudais foram decisivos para dar início à reforma agrária
no México e na Bolívia, bem como para as reformas agrárias pós-revolucionári-
as de Cuba e da Nicarágua. Todas essas lutas camponesas por terras tinham
ligações com movimentos da classe média urbana nacionalista e antiimperialista.
Elas também eram incentivadas por disputas pelo controle do poder entre as
elites. Todavia, o elemento nacionalista era muito mais forte em Cuba, que era
relativamente desenvolvida, do que na empobrecida Bolívia, onde os ressenti-
mentos de séculos de discriminação racial foram uma força poderosa na
mobilização dos camponeses.
Estes comentários sobre reformas agrárias resultantes de revoluções
sociais são consistentes com os processos que levaram a duas das mais
importantes reformas agrárias levadas a cabo em meados do século XX: China
e Vietnã. Na China, o êxito da revolução comunista foi basicamente o resulta-
do da impotência do governo nacionalista de resistir à invasão japonesa e sua
incapacidade de responder, subseqüentementemente, às demandas dos cam-
poneses após a derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial. Os movimen-
tos camponeses foram as principais forças sociais que apoiaram o levante
comunista iniciado na década de vinte. A reforma agrária chinesa, instaurada
após o triunfo dos exércitos maoístas em 1949, foi a mais profunda e extensa
da história (Shillinglaw, 1974). No Vietnã, a reforma agrária não pode ser
explicada sem fazer referência à substituição do poder colonial francês pelo
Japão e o subseqüente retorno dos franceses. Após a derrota do exército
colonial francês, o Estado sul-vietnamita passou a ser apoiado pelos Estados
japonesas por mais de quatro décadas. A Coréia do Sul foi ocupada pelo
exército norte-americano e Taiwan pelas forças nacionalistas chinesas apoi-
adas pelos Estados Unidos.
A reforma agrária da Coréia foi inspirada, em parte, pelo temor de que os
comunistas que tomaram o poder na Coréia do Norte, com ajuda da URSS após
a derrota do Japão, conseguiriam mobilizar o apoio dos camponeses do Sul.
Além disso, o governo sul-coreano do pós-guerra era anticolonial, com poucos
laços com os grandes proprietários locais que, no passado, haviam colaborado
com os japoneses. Uma reforma agrária muito drástica foi implementada, com
a ajuda dos Estados Unidos. A terra que estava em mãos dos colonizadores
japoneses foi distribuída entre os antigos colonos e trabalhadores. Para todo o
país foi estabelecido um teto de três hectares para domínios individuais, e a
terra que excedesse esse teto foi dividida entre os antigos colonos. Para os
agricultores que não conseguiram tornar-se proprietários, foram estabelecidos
aluguéis, fixados em baixos níveis. Entretanto, embora seja freqüentemente
esquecido, havia uma longa história de mobilizações camponesas e protestos
em torno de questões agrárias durante o domínio colonial japonês. Isto facili-
tou a implementação da reforma, com apoio maciço e participação dos
beneficiários (Lee, 1979).
Em Taiwan, o governo nacionalista chinês mudou-se para a ilha em 1949,
com apoio dos Estados Unidos, após a derrota no continente. Esse governo
não tinha nenhum compromisso com os latifundiários de Taiwan, e muitos
membros desse governo atribuíam a derrota no continente ao fracasso de se
implementar uma reforma agrária na China continental. Da mesma forma, o
governo queria evitar o fortalecimento de uma classe de fazendeiros ricos em
Taiwan, que pudesse vir a ter aspirações de formar um Estado separado da
China (Pearse, 1980). Começou, então, uma reforma agrária drástica.
Sob o jugo japonês, Taiwan modernizou sua agricultura e tornou-se
um importante exportador de açúcar, arroz e outros suprimentos para o
poder colonial. Os produtores camponeses eram relativamente bem organi-
zados em cooperativas e organizações de camponeses, cujas demandas
por acesso mais equânime à terra eram freqüentemente aventadas durante
o domínio colonial (Huizer, 1980). Quando o governo nacionalista chinês
decretou a reforma agrária em Taiwan, essa reforma foi implementada com o
apoio e a participação generalizados da população do campo. A reforma
obteve importante apoio financeiro e assistência técnica dos Estados Uni-
dos. Em todo caso, como ocorreu na Coréia do Sul, essa reforma foi mais
uma reforma do domínio da terra. Ela proveu a garantia de direitos de pro-
priedade, em bases bastante igualitárias, aos antigos arrendatários e
compartilhadores de safras, estabelecendo limites muito baixos para a quan-
tidade de terra que poderia ser controlada por um proprietário individual (o
domínio máximo foi estabelecido em três hectares de campos de arroz, e o
aluguel para os demais colonos ficou limitado a 37,5% da produção).
nacionais e outras entidades que tentaram realizar reformas agrárias têm que
reconhecer este fato. Essas instituições devem ter em mente que organizações
camponesas democráticas e razoavelmente autônomas são necessárias para a
institucionalização das reformas, impedindo-as de se desviarem em benefício
de outros. Este desafio é ainda mais difícil.
braçais ou de parte de sua produção. Este processo foi bem evidente no Chile
central, na década de cinqüenta. O processo ajudou a criar condições favorá-
veis para a reforma agrária. Processos semelhantes, que deram origem a objeti-
vos conflitantes entre os grandes proprietários, foram observados em todos os
casos estudados acima. Além disso, muitos dos grandes proprietários, tinham
se convencido intelectualmente da necessidade de reforma agrária. As viagens
e os estudos às vezes levaram à apreciação dos processos históricos que
afetaram as estruturas agrárias, e que eram mais bem compreendidas pelos
proprietários progressistas, que se dispunham a abrir mão de prerrogativas
tradicionais do que pelos intelectuais urbanos.
Essas contradições entre os proprietários eram reveladas pela divisão
interna que existia nas organizações e associações de grandes produtores,
como foi o caso da SNA, no Chile. Eles raramente conseguiam apresentar uma
visão comum, quando as pressões políticas em favor da reforma agrária come-
çaram a se acumular. Além disso, à medida que crescia a urbanização e a indus-
trialização, as oligarquias de latifundiários tornaram-se relativamente menos
influentes em questões nacionais. Muitos diversificaram seus ativos e ativida-
des em outros setores como a indústria, as finanças e o comércio, mantendo,
ao mesmo tempo, um quase monopólio das terras agrícolas em uma ou em
diversas localidades. Isto os ajudava a manter o poder em nível local. Também
diluiu seu poder político no âmbito nacional, com as crescentes pressões por
reforma agrária, à medida que esses indivíduos tinham que levar em conta seus
próprios interesses e os interesses não-agrícolas de seus aliados urbanos, que
eram freqüentemente contraditórios.
Os processos associados à crescente modernização tecnológica, ao
marketing e à diferenciação social afetaram tanto as elites abastadas quanto os
pobres rurais, de maneiras bastante contraditórias. Baseado na evidência dos
casos descritos acima, esses processos aceleraram a reforma agrária em alguns
contextos e a retardaram em outros. Seria um erro concluir que a “globalização”
do final do século XX tornou a reforma agrária anacrônica. Ao contrário, em
muitos países em desenvolvimento, as questões sobre o domínio da terra es-
tão se tornando cada vez mais prementes, como resultado da crescente polari-
zação social, pobreza generalizada e falta de oportunidades alternativas de
emprego para os pobres rurais. Os inúmeros interesses divergentes entre os
pobres rurais torna difícil a sua luta pela reforma agrária. Entretanto, os interes-
ses cada vez mais divergentes das elites abastadas apresentam novas oportu-
nidades para a realização de reformas agrárias que venham a beneficiar os
trabalhadores rurais sem-terra.
Pela revisão dos casos descritos acima, não há evidência de que as
reformas agrárias podem surgir unicamente como resultado das políticas ami-
gáveis ao mercado (market friendly). O registro dos títulos das terras e a facilita-
ção de transações imobiliárias entre as partes desejosas de vender e as desejo-
sas de comprar, não mudam por si só as relações de poder em favor dos pobres
3.5 As ONGs
As organizações não-governamentais constituem-se numa variedade
extremamente diversificada de atores sociais. O seu nome sugere não o que
elas são, mas o que elas não são. Em geral, elas são consideradas como não-
estatais e sem fins lucrativos, com o objetivo de fomentar determinados inte-
resses sociais, culturais e econômicos. O que elas são e o que elas fazem na
prática depende, obviamente, das circunstâncias, da mesma forma que depen-
de o conteúdo do conceito complementar de “sociedade civil”. Na prática, as
linhas divisórias entre as ONGs e as organizações controladas ou patrocinadas
pelo Estado, bem como entre a sociedade civil e o Estado ou o mercado, ten-
dem a ser excessivamente nebulosas. Para os objetivos de avaliação dos pa-
péis desempenhados pelas ONGs nos processos de reforma agrária, nós
estamos especialmente interessados naquelas ONGs ostensivamente devota-
das à melhoria do bem-estar dos pobres rurais, ou à promoção de outros as-
pectos do desenvolvimento rural sustentado.
Em alguns contextos, as associações de camponeses, as associa-
ções de grandes proprietários, as cooperativas, os sindicatos de trabalha-
dores, as organizações religiosas e profissionais, as sociedades de consu-
midores e outros, são consideradas como ONGs, enquanto que em outros
contextos elas podem ser julgadas pelos críticos como sendo agentes do
Estado ou do mercado. Damos aqui atenção especial às autoproclamadas
instituições de caridade nacionais e internacionais, e ONGs assemelhadas,
supostamente dedicadas ao desenvolvimento social, à proteção ambiental
e a outros objetivos humanitários.
Essas ONGs foram atuantes em todas as reformas agrárias menciona-
das acima. Seu papel era mais periférico do que o papel do Estado, dos partidos
políticos e das organizações populares não-estatais, tais como as associações
de camponeses e sindicatos rurais. Entretanto, às vezes as ONGs conseguiam
desempenhar o papel de catalisadores. Elas contribuíram, por meio da advoca-
cia, bem como da assistência técnica e material, com os movimentos e organi-
zações de base popular envolvidos com a reforma agrária. A liga de agrônomos
socialistas do México deu contribuição importante ao sucesso inicial de inú-
meros ejidos coletivos, por exemplo. A experiência do Improa de transformar
terras da Igreja em cooperativas camponesas proveu um insumo importante
para a reforma agrária do governo Democrata Cristão chileno. Durante a ditadu-
ra de Pinochet, as ONGs desempenharam freqüentemente um papel vital no
Chile, ao prover assistência aos beneficiários da reforma agrária que tinham
6
Este termo é, no entanto, enganoso, pois traz em si a impressão de que ocorre um processo politicamente neutro. Na verdade,
a globalização vem se caracterizando por crescentes desigualdades de todo tipo, tanto internas quanto entre os países (Pnud,
1997; UNCTAD, 1997). O imperialismo seria uma caracterização mais precisa do que está ocorrendo, pois evoca a noção de
relações desiguais de poder. O locus do poder imperial reside atualmente em umas poucas nações, que detêm o monopólio
dos armamentos de destruição em massa, juntamente com as enormes entidades corporativas transnacionais, em sua maioria
estabelecidas nos países ricos, que detêm o monopólio sobre tecnologias avançadas, finanças globais, acesso a muitos dos
recursos naturais à mídia e à comunicação de massa (Amin, 1997).
os foram extintos legalmente, embora na prática isto não tenha sido inteira-
mente conseguido sem conflitos violentos e múltiplas exceções. O manifesto
comunista reforçou a ampla aceitação da dicotomia entre a propriedade
pública e a propriedade privada à medida que as suas qualificações de
“propriedade burguesa” e “propriedade atualmente existente” eram esque-
cidas. Nos países capitalistas, os direitos de propriedade privada da terra
estão sendo cada vez mais restritos por meio de regulações de zoneamento,
direito de eminente domínio, uso do solo e normas de proteção ambiental,
subsídios, tributação diferenciada, proteção aos direitos dos inquilinos, e
uma infinidade de outros mecanismos. A ficção de uma entidade corporativa
controlando a terra, não importando o seu tamanho, é legalmente a mesma
que uma pessoa, não importando o quanto ela seja pobre e desamparada,
entretanto, enfraquece muitas das iniciativas de fazer cumprir as obriga-
ções associadas à posse e ao uso da terra.
A reforma agrária é primordialmente uma questão de direitos humanos
básicos. Ela implica o acesso à terra e aos seus benefícios, em termos mais
justos e seguros, para todos aqueles que a cultivam e dela dependem para sua
subsistência. Nas estruturas agrárias injustas, isto implica a redistribuição dos
direitos à terra, para beneficiar os sem-terra, às custas dos grandes latifundiári-
os e outros que se apropriaram de seus benefícios antes da reforma.
Quando esses conceitos de domínio da terra e reforma agrária estão
compreendidos, torna-se mais fácil pensar nos caminhos que conduzirão à
reforma agrária. O que a reforma agrária implica, na prática, sempre depende do
contexto e das circunstâncias particulares, mas os princípios básicos perma-
necem os mesmos. Nos países em desenvolvimento, a reforma agrária em geral
envolve a expropriação de grandes propriedades e a sua redistribuição em
glebas menores familiares, ou em cooperativas administradas pelos trabalha-
dores, embora existam muitas variações, que dependem da situação. Nos luga-
res onde os regimes de propriedades consuetudinárias comuns ainda vigoram,
a reforma pode significar a garantia do domínio e a restituição de terras usurpa-
das. Em alguns casos, os objetivos da reforma agrária podem ser atingidos sem
a redistribuição da terra, mas isto é altamente improvável nos países pobres. O
fundamental é que os beneficiários participem ativamente e democraticamente
no processo, e que todos aqueles que precisam do acesso à terra para sua
subsistência sejam incluídos. Ao mesmo tempo, os direitos básicos das comu-
nidades, das gerações por vir e outros atores legítimos têm que ser protegidos.
As ONGs progressistas e as organizações internacionais engajadas
podem desempenhar papéis importantes de catalisadoras, ajudando os movi-
mentos populares dos camponeses e dos trabalhadores a organizar e pressio-
nar suas demandas por terra. Elas podem ajudar por meio da pesquisa focaliza-
da na subsistência e nos problemas de desenvolvimento sustentável dos po-
bres rurais. Elas podem prover assistência técnica valiosa, recursos materiais e
assessoria legal. Elas podem facilitar o uso das modernas tecnologias de comu-
nicações pelos camponeses e outros que batalham por reformas. Elas podem
tornar públicas as violações dos direitos humanos e socioeconômicos, a
corrupção e outros abusos sofridos pelos pobres. Elas podem avançar as refor-
mas agrárias em todos os níveis.
Todavia, o seu papel será sempre auxiliar ao que deve ser fundamental-
mente um processo político interno. Os principais atores na realização e con-
solidação de reformas agrárias genuínas devem sempre incluir os sem-terra e
os quase-sem-terra, juntamente com seus aliados políticos e o Estado. As
ONGs bem-intencionadas e as organizações internacionais podem ajudar. Elas
também podem atrapalhar, se não levarem em conta a complexa dinâmica soci-
al embutida na reforma agrária.
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