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Uma História Difícil
Uma História Difícil
Por
Ton Moz
Copyright 2010
FBN: 4587-6
1. INT. TEATRO-ESCOLA (DIA)
O professor THOMAS está sentado na beira do palco italiano
com uma LANTERNA na BOCA analisando papéis. Conforme o
NARRADOR fala vamos nos aproximando dele.
NARRADOR
Este é Thomas. Um pacato
professor de teatro da cidade de
Piranópolis da Batatinha do Sul.
Ele é casado com a linda Torres e
tem como amantes Gabi e Gianni
seus amigos celebridades do
showtime da tv. Mas não se
enganem meus amigos, ele é uma
boa pessoa, para entendermos seu
comportamento temos que nos
aproximar de seu coração, temos
que nos aproximar de sua mente...
Batemos na cabeça de Thomas que se assusta e coloca a mão
na cabeça esfregando-a.
THOMAS
Porra!
NARRADOR
Foi mal...
Nos afastamos rapidamente de Thomas. Por trás de Thomas
aparece CAPRIO com seus cabelos loiros levemente compridos
olhando seriamente para ele. Thomas toma outro susto.
THOMAS
Cacete! O que você está fazendo
aí?
CAPRIO
Nada, só vendo esta cena de
exposição ridícula.
THOMAS
É hoje...
Caprio num movimento lentíssimo, balança seus cabelos ao
vento sensualmente, jogando-os de um lado para o outro:
CAPRIO
A minha voz continua a mesma, mas
meus cabelos, aaaahhhhh...
Perucas Caprio, tá?
2.
PORTA TEATRO
Os alunos começam a chegar. Vão descendo o corredor do
teatro e se acomodando nas poltronas. DINIZ e CAMERON
sobem ao palco e começam a recitar algum trecho da peça
Romeu e Julieta de Shakespeare.
CAMERON
Quisera eu ser seu passarinho...
DINIZ
O mesmo eu queria, mas de tanto
te acariciar acabaria por te
matar.
Conversas paralelas acontecem. O barulho no ambiente
começa a ficar insuportável.
PALCO
THOMAS
Aí galerinha, vamos fazer
silêncio para começar a aula?
Ninguém responde. As conversas continuam.
THOMAS
Ok, ok. Mais cinco minutinhos
para vocês se acomodarem.
RELÓGIO
PLATÉIA
PALCO
PLATÉIA
Thomas suspira.
PALCO/PLATÉIA
CAPRIO
Mas professa, o curso não é de
teatro? Como vamos fazer um
filme?
THOMAS
Teatro, cinema, tv, publicidade,
tudo a mesma merda, quero dizer,
coisa...
Thomas resmunga um "merda" baixinho.
THOMAS
E ainda de quebra se vencermos o
festival isso iria contar no
currículo de vocês.
(CONTINUED)
CONTINUED: 4.
DINIZ
Putz, boa idéia hein? Por mim
está fechado! Rumo a Hollywood!
THOMAS
Então que tal começar a história,
hein?
MOORE, um aluno gordinho, de barba mal-feita e de boné se
levanta e pede a palavra.
MOORE
Professor, será que eu podia
filmar o processo de criação?
Fazer um making of?
CAPRIO
Ué? Porque sou o mais bonito
desta joça aqui...
CAMERON
Isso é verdade! Concordo
plenamente. Nem precisa saber
atuar, o lance é ser bonito.
Assim fica mais fácil de arranjar
dinheiro para a produção.
Chovem CÉDULAS de DINHEIRO.
(CONTINUED)
CONTINUED: 5.
CAPRIO
Tá dizendo que não sei atuar?
Como acha que estou me formando
nesta porra?
THOMAS
Ô! Vamos parar por aí. Cameron,
ninguém vai precisar arranjar
dinheiro nenhum. A escola vai
bancar tudo.
CAMERON
Cambada de caipiras. Nunca vão
chegar a Hollywood...
CAPRIO
Caipira é você ô mané!
CAMERON
Você que é mané!
CAPRIO
E você é um bobão!
CAMERON
Cara de boi!
CAPRIO
Cara de boi é a sua mãe!
CAMERON
Cara de queijo!
CAPRIO
Cara de queijo é quem chama, abre
a porta e cai na cama!
CAMERON
Debaixo da sua cama tem um bicho
que te ama!
CAPRIO
Cara de paçoca torta!
CAMERON
Paçoca torta é quem se importa e
o rabo da porca entorta!
CAPRIO
Cara de queijo!
CAMERON
Cara de queijo já falou mané!
CAPRIO
Ah é? Então levanta o rabo do
gato e dá um beijo!
(CONTINUED)
CONTINUED: 6.
TORNADO
A história tinha que se passar
num quilombo.
THOMAS
Como assim?
TORNADO
Quilombo porra! Sabe o que é não
ô branquelo?
THOMAS
Sei. Não entendi a sugestão.
TORNADO
Para mostrar o sofrimento de meu
povo durante os séculos.
THOMAS
Mas Tornado, como íamos fazer
isso?
(CONTINUED)
CONTINUED: 7.
TORNADO
Racista!
Tornado desce do palco e se encaminha a porta de saída. No
meio caminho arranca uma poltrona e a arremesa no mezanino
do teatro.
BEAUVOIR
Liguem não. Já, já ele volta.
PALCO
Os alunos sobem ao palco e sentam-se no chão formando um
círculo. Podemos ver seus rostos de bem de perto enquanto
falam.
PEREIO
Esta porra tem que ter muito
peito, bunda e buceta!
Pereio está com a língua de fora e babando.
PEREIO
Muita sacanagem! Muita putaria!
DINIZ
Eu podia fazer uma dona de bordel
que oferece chá de maconha aos
seus clientes.
PEREIO
Que dona de bordel é o caralho,
Diniz!
(CONTINUED)
CONTINUED: 8.
THOMAS
A escola não vai aceitar algo tão
explícito...
PEREIO
Repressão do caralho!!!
Puta-que-o-pariu, porra!
THOMAS
Vamos escolher a história
primeiro?
PEREIO
Sacanagem, porra. Tava doido para
ver o rabo da Diniz.
THOMAS
Mais alguma sugestão?
BEAUVOIR
Bem, eu queria aproveitar a deixa
e sugerir que tenhamos uma
personagem que tenha um lado
psicológico afetado por algum
trauma de infância. Ela poderia
ser uma orfã abandonada e quando
cresce se tornando adulta e
achando ter se livrado do
sofrimento descobre que
seu marido a quem tanto ama a
está traindo.
Os alunos estão com a boca aberta, embasbacados.
BEAUVOIR
Assim causaríamos mais comoção
nos espectadores. A tragédia
humana nos leva a compreender
melhor nossas próprias angústias
pessoais. Ajudando assim a
remendar as curáceas quebradas do
(MORE)
(CONTINUED)
CONTINUED: 9.
BEAUVOIR (cont’d)
nosso próprio eu divagante nas
mazelas existênciais do
sofrimento interperspectivo.
PEREIO
Caralho, não entendi porra
nenhuma...
CAMERON
Nem eu, mas desgraça sempre dá
ibope!
DIESEL
Que viagem!
THOMAS
Isso não ta ficando meio absurdo
não?
CAMERON
Que mané absurdo. Vai dar para
usar altos efeitos especiais.
THOMAS
Mas e o conteúdo da história? O
recheio?
CAMERON
Que mané recheio o que! Isso é um
filme ou um sanduíche?
GUERRA
Não podemos esquecer que cinema é
arte.
Guerra aparece de boina, cachecol e fumando um charuto.
Cara de intelectual francês.
(CONTINUED)
CONTINUED: 10.
NARRADOR
Guerra, guerreiro velha-guarda da
imagem movimento.
Corremos de um lado para o outro e Guerra sai de quadro.
Guerra corre atrás de nós e sempre escapamos.
GUERRA
Menos movimento! Menos movimento!
Guerra dá uma baforada em seu charuto.
GUERRA
Temos que retratar a angústia do
verdadeiro brasileiro que
atravessa o chão seco e amarelado
em busca de uma vida melhor.
CAMERON
Ih! Roubou o fumo da Diniz,
Guerra?
GUERRA
Temos que pincelar com nossa
palheta de cores a arte e a
realidade do cangaço brasileiro.
PEREIO
Isso tá me dando é vontade de dar
um cagaço.
Pereio ri sozinho. Todos olham para Pereio sem entender a
piada.
GUERRA
Nossa protagonista poderia ser a
Maria Bonita.
CAPRIO
Nossa? Como assim? Vou me vestir
de mulher?
PEREIO
Não ô burro! Tu vai ser o o
marido castrado! O
cabra-sem-bolas! Hahahaha!
GUERRA
Isso é arte. A pobreza e o
sofrimento do nordestino
brasileiro...
CAMERON
Esse papo de arte para mim é
coisa de viado.
Guerra joga seu CHARUTO no chão e parte para cima de
Cameron.
(CONTINUED)
CONTINUED: 11.
THOMAS
Porra! Briga de novo?
Thomas coloca uma das mãos por cima de suas sobrancelhas e
olha em volta.
THOMAS
Cadê o Tornado para apartar?
Cacete..
Thomas entra na briga tentando aparta-la.
CAPRIO
Deixa que eu te ajudo,professa!
Caprio entra na briga, mas ao invés de ajudar a apartar
aproveita para socar Cameron também. Os quatro rolam pelo
chão. Os alunos riem.
DIESEL
Sangue! Sangue! Quem voltar para
casa sem sangue é porque é
florzinha! Hahahaha!
A briga está envolta por uma animação de nuvem de fumaça,
como nas brigas da Turma da Mônica.
Diniz acende um baseado.
PORTA TEATRO
Tornado aparece na companhia de 10 RAPPERS negros.
TORNADO
Vocês não queriam crioulo? Aqui
ó!
PALCO
(CONTINUED)
CONTINUED: 12.
TORNADO
Tá sim. Não gosto de número
ímpar. Ofereci uma garrafa de 51
para esse mendigo aí e pintei
ele. Algum problema?
THOMAS
Não.Nenhum...
Thomas suspira, leva as mãos a cabeça e faz sinal de
negativo.
DINIZ
Porque não passamos a história a
limpo?
CAMERON
Boa, deixa que eu leio.
Cameron pega um caderno e começa a ler.
O texto que é lido aparece em forma de imagens em tom de
sépia. Ao fundo vemos o rosto de Cameron transparente.
CAMERON
Maria Bonita é uma orfã
abandonada no quilombo do rei
Zulu Lampião e casada com o belo
Jack Dawson, só que descobre que
é traída por ele com uma sereia.
Enfurecida ela mata Jack com um
cajado e o empala na porta do
quilombo. O rei Zulu diz que ela
virou uma assassina mas que
entende seus motivos, porém ela
terá que abandonar o quilombo e
ir viver na cidade dos homens
brancos e que só poderia voltar
quando encontrasse outro marido.
Para ajudar na sua busca ele
daria uma poção mágica-sexual.
Maria Bonita parte então para a
cidade. Lá conhece um bando de
hippies e começa a pregar a paz
mundial.
Conhece Abdel Azis Camel por quem
se apaixona, mas Abdel não quer
nada com ela. Então Maria Bonita
toma a poção mágica dada pelo rei
Zulu em forma de baseado e
consegue o
super-poder-vaginal-magnético
onde sua vagina toma a forma de
um imã e prende o pênis de Abdel
dentro dela.
(CONTINUED)
CONTINUED: 13.
THOMAS
Inacreditável.
CAPRIO
Bom né?
THOMAS
Ô! Maravilha. E como acaba?
CAMERON
Como assim?
THOMAS
O final da história cara. Como
acaba esse festival de absurdos?
CAMERON
Final? Sei lá. Pensei nisso não.
PEREIO
Nelson Rodrigues? Vou poder comer
o rabo da Diniz?
THOMAS
Come o rabo de quem você quiser.
THOMAS
O que importa que não rola mais
este filme. Fazemos a peça e
chamamos seus pais, vocês recebem
o diploma e c’est finis.
PEREIO
Porra, mas o meu caralho
magnetizado dentro da Diniz?
DINIZ
Isso aí! O filme tá maneiro!
Vamos filmar!
(CONTINUED)
CONTINUED: 14.
THOMAS
Mas o final cacete? Não, não.
Morreu, já disse!
PEREIO
Vá passar batom no cu para
enganar caralho! Eu quero comer a
Diniz porra!
CAMERON
Final é o de menos! A gente
arranja um qualquer...
Todos entram em rebuliço. Thomas se levanta. Os alunos
também. Os alunos viram de costas para Thomas e formam um
novo círculo. Ele tenta entrar no novo círculo criado, os
rappers negros o repelem. Os alunos discutem entre si sem
dar atenção a Thomas.
PORTA TEATRO
PALCO
Os alunos abraçam Pasolini com grande alegria. O levantam
como um campeão de futebol sobre os ombros.
PEREIO
Chegou a salvação! Vou poder
comer o rabo da Diniz!
PASOLINI
Calma meus caros! Eu sou a luz e
salvação do filme!
CAMERON
Mas como você sabe que estamos
fazendo um filme?
PASOLINI
Você não leu o meu letreiro?
(CONTINUED)
CONTINUED: 15.
TODOS
Ooooooohhhhhhhhh!!!!
THOMAS
É geniozinho? Diz aí então como
acaba a história?
PASOLINI
Simples. Só precisamos de um
final escatológico...
NARRADOR
E agora meus amigos? O que
acontecerá com nosso herói? Será
que ele vai escapar das mãos dos
ardilosos alunos? Será que ele
vai...
NARRADOR
Pô, foi mal...
THOMAS
Opa! Pera lá! Que vocês vão
fazer?
PASOLINI
Arranjar um final...
Os alunos pegam Thomas e começam a puxa-lo pelos membros.
Thomas grita de dor. Thomas é decepado em várias partes.
Os alunos começam a devorar os membros decepados de
Thomas.
FADE IN:
Professor Thomas
Pereio
Caprio
Diniz
(CONTINUED)
CONTINUED: 16.
Cameron
Tornado
Beauvoir
Diesel
Guerra
Pasolini
Narrador Mala
Direção:
MOORE"
FADE OUT:
FIM