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Sobre o Mandamento do Sábado

Quanto a questão do Sábado, sabemos que ele é o quarto mandamento (Ex 20.8). O
problema foi que os judeus, pelo menos no passado, deturparam o propósito do Sábado e de
outros mandamentos transformando-os em uma lista de regras para oprimir, controlar, julgar e
condenar os homens. Até Jesus foi acusado pelos religiosos de seu tempo de violar a lei do
Sábado (Mt 12.1-8). Embora Jesus tenha cumprido toda a Lei de Deus, ele não a cumpriu
segundo o entendimento legalista da tradição judaica, mas, sim, segundo o espírito da própria
lei divina. No Sermão da Montanha, Jesus reinterpreta a lei mosaica de modo a deixar os
fariseus numa situação embaraçosa, pois, segundo Jesus, os bem-aventurados são os pobres
de espírito e não os orgulhosos observadores da lei; são os limpos de coração e não os crentes
de fachada; são os que oram e dão esmolas discretamente e não os exibicionistas, e por aí vai!
Jesus disse que Ele é o Senhor do Sábado e afirmou que era lícito colher espigas, curar e
trabalhar para fazer o bem no dia de Sábado (Mt 12-1-8)!

O Apóstolo Paulo também foi enfático ao dizer que não estamos obrigados obedecer
aos mandamentos relacionados a comida, guarda do sábado e dia de festas como se pode ler
em Colossenses 2.12-23: "Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de
festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de
vir; porém o corpo é de Cristo. Ninguém se faça árbitro contra vós outros, pretextando
humildade e culto dos anjos, baseando-se em visões, enfatuado, sem motivo algum, na sua
mente carnal, e não retendo a cabeça, da qual todo o corpo, suprido e bem vinculado por suas
juntas e ligamentos, cresce o crescimento que procede de Deus. Se morrestes com Cristo
para os rudimentos do mundo, por que, como se vivêsseis no mundo, vos sujeitais a
ordenanças: não manuseies isto, não proves aquilo, não toques aquiloutro, segundo os
preceitos e doutrinas dos homens? Pois que todas estas coisas, com o uso, se destroem. Tais
coisas, com efeito, têm aparência de sabedoria, como culto de si mesmo, e de falsa humildade,
e de rigor ascético; todavia, não têm valor algum contra a sensualidade".

O legalismo se instala no meio cristão sob o pretexto de santidade e piedade (Cl


2.23). Rudimentos humanos, usos e costumes, tradições denominacionais têm sido pregadas
de tal forma que os que não se enquadram e não assumem tais contornos são taxados de
“mundanos”, “carnais” e “não crentes”. A mensagem destes é cheia de regras e proibições,
está carregada da palavra “não”. João Huss e Lutero promoveram a grande Reforma,
buscando restaurar a mensagem pura do Evangelho. O legalismo farisaico e hipócrita foi
duramente combatido por Jesus (Mt 23), pois tal mensagem constrói apenas sepulcros
caiados, conduzindo os ouvintes à uma religiosidade aparente. Leva-os à hipocrisia, pois que
constantemente “coam um mosquito e engolem um camelo”(Mt 23.24). Conduz à fofoca, à
maledicência, onde os irmãos passam à julgarem-se mutuamente. Está muito mais preocupada
com a forma do que com o conteúdo. O legalismo é a religião do “eu”, é o “culto de si mesmo”
(Cl 2.23); sendo completamente oposta a graça, que gera o amor. Tais ensinos afugentam
muitas pessoas, principalmente os jovens. O legalismo serve de um forte impedimento, pois
que também acaba produzindo “alienígenas”, pessoas completamente desvinculadas da
realidade, do mundo presente, verdadeiros “E.T.s”. Como ensinou Jesus: “Atam fardos
pesados e difíceis de carregar e os põem sobre os ombros dos homens, entretanto eles
mesmos nem com o dedo querem movê-los.” (Mt. 23.4). E ainda: “ai de vós, escribas e
fariseus, hipócritas! porque fechais o reino dos céus para os homens; vós não entrais e nem
deixais entrar os que estão entrando.” (Mt. 23.13). Tais preceitos e doutrinas “têm aparência de
sabedoria, como culto de si mesmo, e falsa humildade, e rigor ascético; todavia, não têm valor
algum contra a sensualidade” (Cl 2.23). Portanto, não devemos nos sujeitar a tais ordenanças
(Cl 2.20) e nem ficarmos intimidados por aqueles que nos julgam (Cl 2.16), nem mesmo
devemos permitir que alguém se faça árbitro contra nós (2.18). Pois Cristo, “tendo cancelado o
escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial,
removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz” (2.14). Devemos tomar muito “cuidado que
ninguém nos venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos
homens, conforme os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo” (Cl 2.8).

Tudo que temos dito acima se aplica também perfeitamente aos Adventistas do
Sétimo Dia, principalmente no que diz respeito a guarda do sábado e a proibição de comer
carne de porco.

Sobre a questão do sábado, lemos no Antigo Testamento, Oséias 2.11: “Farei


cessar… os seus sábados…”, tal profecia cumpriu-se em Cristo, como visto claramente em
Colossenses 2.14-17.
Em Romanos 10.4, Paulo afirma: “o fim da lei é Cristo”. Cristo é o fim da lei no sentido
que, com Ele, a velha ordem, da qual a lei fazia parte, foi eliminada, para ser substituída pela
nova ordem do Espírito, onde a vida e a justiça são acessíveis mediante a fé em Cristo;
portanto, ninguém precisa tentar obter essas bênçãos por meio da lei (Rm 3.19-20,27-28; 4.14-
16; 6.4; 8.2-4; Fp 3.9; Cl 2.14).

Mas não estamos sem lei, pois estamos, agora, debaixo da lei do Espírito da vida em
Cristo (Rm 8.2; 13.8-10; 2 Co 3.17; 1 Jo 3.22-24; Gl 5.6, 13-18; 6.2). Somos exortados a fazer
discípulos ensinando-os a observarem tudo o que Cristo ordenou (Mt 28.20). O Sábado, por
exemplo, consta da lei de Moisés, mas não é uma ordenança de Cristo para a Igreja (At 15.28-
29; Cl 2.13-14). Em Atos 15, lemos o relato do Concílio de Jerusalém que tratou do tema: “Os
cristãos gentios estão obrigados a guardarem a lei judaica?”. A resposta deste concílio está nos
versículos 28 e 29, e, lá, nada lemos sobre a necessidade do cristão de guardar o sábado.
Nenhuma passagem do Novo Testamento ordena a observância do quarto mandamento, mas,
pelo contrário, somos exortados a não nos submetermos a isto (Cl 2.14-17; Gl 4.9-11).

Então, observa-se que Jesus nunca mandou guardar o sábado, e, pelo que consta nos
Evangelhos, ele foi perseguido pelos judeus por causa do apego legalistas deles ao sábado (Mt
12.1-5; Jo 5.16-18; 9.16). Em Romanos 7.1-6, Paulo também ensina que os cristãos não estão
debaixo da obrigação de cumprir a lei mosaica, neste caso, ele usa a analogia do casamento:
“Ora, a mulher casada está ligada pela lei ao marido, enquanto ele vive: mas se o mesmo
morrer, desobrigada ficará da lei conjugal. De sorte que será considerada adúltera se, vivendo
ainda o marido, unir-se com outro homem; porém, se morrer o marido, estará livre da lei, e não
será adultera se contrair novas núpcias. Assim, meus irmãos, também vós morrestes
relativamente à lei, por meio do corpo de Cristo, para pertencerdes a outro, a saber, aquele que
ressuscitou dentre os mortos, e deste modo frutifiquemos para Deus... Agora, porém, libertados
da lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em
novidade de espírito e não na caducidade da letra.” E “visto que ninguém será justificado diante
dEle por obras da lei, em razão de que pela lei vem o pleno conhecimento do pecado... sendo
justificados gratuitamente por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus” (Rm
3.20, 24). E ainda, Romanos 6.14: “Porque o pecado não terá domínio sobre vós; pois não
estais debaixo da lei, e, sim, da graça”.
Baseados em Êxodo 31.16,17, os Adventistas dizem que somos obrigados a guardar o
sábado pois trata-se de um estatuto perpétuo. Mas, se somos obrigados a guardar o sábado
por ser denominado um concerto perpétuo, então também somos obrigados, pelo mesmo
motivo, a guardar: a) a páscoa judaica (Ex. 12.14); b) o lavar as mãos e os pés (Ex. 30.21); c)
celebrar as festas judaicas (Lv 23.31), coisas que os próprios adventistas admitem que foram
abolidas para os cristãos.

O Novo Testamento ensina que a lei, a circuncisão e outros ensinos do Antigo Testamento
foram sombras da realidade que se encontram em Cristo e Sua Igreja (Cl 2.16-17; Hb 8.5; 10.1;
Ef 1.22,23).

A cruz de Cristo provocou maravilhosas mudanças:

1. O Antigo Testamento foi superado pelo Novo Testamento, que é infinitamente superior
(Jr 31.31 e Hb 8.6; 12.24);
2. A lei foi superada pelo Evangelho da Graça (Rm 6.14; 10.4);
3. O sacrifício de animais foi superado pelo sangue do Cordeiro de Deus que tira o pecado
do mundo (Jo 1.29) ;
4. O Povo de Israel foi superado pela Igreja como povo de Deus que congrega em si
judeus e gentios fiéis ao Messias (Gl 6.16; Ef 2.12-16; Hb 8.8-10; 1 Co 12.13);
5. A circuncisão foi superada pelo batismo cristão (Cl 2.11; Rm 2.28-29; Fl 3.3; Rm
2.29);
6. O sacerdócio levítico foi superado pelo sumo-sacerdócio de Cristo (Hb 4.14; 6.20; 8.5;
9.9, 24; 10.9,16,19-21; 11.9-16,39,40; 12.18-24; 13.10-14) e pelo sacerdócio universal
de todos os crentes (1 Pe 2.9);
7. Doze patriarcas são suplantados pelos doze Apóstolos de Cristo (Lc 6.13; 9.1; 22.14; Ef
2.20; At 2.43; Ap 21.14);
8. A Jerusalém terrestre foi superada pela Nova Jerusalém celestial, ou seja, a terra
prometida de Canaã foi suplantada pelo céu (Ap 21.2; 3.12; 2 Co 5.1; Fp 3.19-21);
9. O templo de Jerusalém foi superado pelo Corpo de Cristo que é a Igreja (Hb 8.2; 1 Co
3.16-17; 2 Co 6.16-19; Ef 2.22; At 7.48; 17.24; Mt 18.20).
10. Moisés foi superado pelo Novo Legislador, Jesus, que do alto de um Novo Sinai traz um
Novo Mandamento (Mt 5.17-48; cf. 19.7; Jo 13.34);
11. A Páscoa judaica foi superada pela Ceia do Senhor (Mt 26.28; 1 Co 11.25, cumprindo Jr
31.31-34; 1 Co 5.7; 1 Co 5.7,8; Lc 22.15; Mt 26.2-19; Mc 14.1, 12-16; Lc 22.7-15; Jo
2.13; 13.1), e
12. E o Sábado foi superado pelo Dia do Senhor (Mc 16.9; Jo 20.1,19-23,26-29; At 2.1-4 cf.
Lv 23.15,16; At 20.6,7; 1 Co 16.1,2; 1 Coríntios 1.2)
O domingo, ou seja, o primeiro dia da semana, por ter sido o dia em que Cristo
ressuscitou, começou a ser o dia principal das reuniões de adoração dos cristãos (Mc 16.9; Jo
20.1,19-23,26-29). O Espírito Santo foi derramado sobre a Igreja no dia de Pentecostes, o que
sucedeu também no dia de Domingo. (At 2.1-4 cf. Lv 23.15,16). Os apóstolos também reuniam-
se neste dia de uma forma especial para adoração (At 20.6,7; 1 Co 16.1,2; ver também 1
Coríntios 1.2). Mas não devemos fazer do domingo um sábado judaico. O apóstolo Paulo
estava entre aqueles que não faziam diferença entre dia e dia: “Um faz diferença entre dia e
dia; outro julga iguais todos os dias...” (Rm 14.5); “Mas agora que conheceis a Deus, ou antes
sendo conhecidos por Deus, como estais voltando outra vez aos rudimentos fracos e pobres,
aos quais de novo quereis ainda escravizar-vos? Guardais dias, e meses, e tempos, e anos.
Receio de vós tenha eu trabalhado em vão para convosco” (Gl 4.9-11).

Como cristãos, adoramos e servimos a Deus todos os dias, mas aproveitamos o


domingo para adorar todos juntos, pois a grande maioria dos cristãos não trabalha neste dia.
Observamos também no Domingo o princípio da lei do descanso de um dia por semana. O
Sábado foi instituído para o bem do homem. Conservamos o espírito bondoso por trás deste
mandamento, que não visa escravizar o homem, mas, sim, libertá-lo! O sábado deveria servir
para descanso e meditação, mas acabou sendo transformado em um pesadelo de
regulamentos e listas "pode e não-pode". Jesus corrigiu este problema ensinando: "O sábado
foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Marcos 2.27).

Portanto, não estamos debaixo da lei, mas, sim, da graça. No entanto, o espírito da lei
ainda permanece válido assim como corretamente interpretado e ensinado por Jesus e seus
Apóstolos. Jesus e seus discípulos trabalharam no sábado colhendo espigas e curando os
enfermos. Jesus foi perseguido por causa Sábado e nem ele e nem seus discípulos ordenaram
os cristãos a guardarem o Sábado. Após a Ressurreição de Cristo no primeiro dia da Semana,
o Domingo passou a ser o principal dia de culto, o que permanece válido até o dia de hoje. O
princípio de descansar um dia em cada sete permanece válido também, sem o rigor legalista
da antiga tradição judaica, mas para o bem do próprio ser humano e também para que o
homem possa voltar-se para o seu Criador, reconhecendo que é dele que dependemos para
sobrevivência e não de nossas próprias mãos.
No amor do Senhor,

Bispo José Ildo Swartele de Mello

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