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CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓSGRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
ALEX SANDRO C. SANT’ANA
O CURRÍCULO AGENCIADO COM AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO
E COMUNICAÇÃO NO COTIDIANO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR
VITÓRIA
2008
1
ALEX SANDRO C. SANT’ANA
O CURRÍCULO AGENCIADO COM AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO
E COMUNICAÇÃO NO COTIDIANO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR
VITÓRIA
2008
2
S231 Sant’Ana, Alex Sandro C.
O Currículo Agenciado com as Tecnologias da Informação e
Comunicação no Cotidiano da Educação Escolar / Alex Sandro C. Sant’Ana.
– 2008.
159 f.
Orientadora: Janete Magalhães Carvalho
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro de Educação.
1. Educação. 2. Currículo. 3. Novas Tecnologias. 4. Laboratório de
Informática. I. Carvalho, Janete Magalhães. II. Universidade Federal do
Espírito Santo. Centro de Educação. III. Título.
CDU 37
3
ALEX SANDRO C. SANT’ANA
O CURRÍCULO AGENCIADO COM AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO
E COMUNICAÇÃO NO COTIDIANO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR
Aprovada em 5 de março de 2008.
COMISSÃO EXAMINADORA
____________________________________________
Prof.ª Dr.ª Janete Magalhães Carvalho
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora
____________________________________________
Prof.ª Dr.ª Regina Helena Silva Simões
Universidade Federal do Espírito Santo
____________________________________________
Prof. Dr. Carlos Eduardo Ferraço
Universidade Federal do Espírito Santo
____________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Elizabeth Barros de Barros
Universidade Federal do Espírito Santo
____________________________________________
Prof.ª Dr.ª Virgínia Kastrup
Universidade Federal do Rio de Janeiro
4
AGRADECIMENTOS
À professora Maria Elizabeth Barros de Barros, pelo encontro que me oportunizou
conhecer a filosofia da diferença, no curso de Mestrado em Educação do PPGE
UFES 1 , ao criar as condições para me iniciar, com o pensamento, as obras e a
entrevista em vídeo 2 de Gilles Deleuze, na disciplina criada por ela, denominada
“Seminário C: Deleuze”. Não tenho dúvidas de que escrevi a maior parte desta obra
com as mãos desse autor e de outros tantos.
Há uma passagem interessante (que para mim é especialmente emocionante) em
que Suely Rolnik escreve um texto 3 sobre as condições em que Deleuze escrevia,
que não poderia deixar de citar neste breve momento de agradecimentos a um
pensador que afirmou a sua vida pela escrita e fez da escrita um modo de afirmação
da vida: por uma vida nãofascista.
Deleuze tinha um enfizema que vinha se agravando, há mais de vinte e cinco
anos (nos anos setenta quando o conheci, ele já dispunha de apenas um
oitavo de pulmão funcionando). A traqueostomia ele fez há pelo menos cinco
anos atrás, quando passou a respirar através de uma máquina. Ficava
plugado a esta máquina a maior parte do tempo, sem nenhuma autonomia,
só podendo falar e escrever por um brevíssimo período de tempo a cada dia.
Me contou um amigo que nos últimos tempos ele ficava repetindo suas idéias
para lembrálas quando pudesse escrever. Relendo as cartas que ele me
escreveu desde que voltei ao Brasil, em 1979, notei que sua letra foi ficando
cada vez mais trêmula e irregular. Na última carta, no final de setembro, ele
se queixava de sua restrição, de ter que aproveitar o mínimo de energia que
lhe restava para seu trabalho, sem poder dedicarse a outras leituras. Nas
1
Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo.
2
RIEUX, Bernardo. O Abecedário de Gilles Deleuze [Versão em texto digital do vídeo “O abecedário
de Gilles Deleuze”, entrevista realizada por Claire Parnet, direção de PierreAndré Boutang, em 1988
89]. OESTRANGEIRO.NET. Disponível em:
<http://www.oestrangeiro.net/index.php?option=com_content&task=view&id=67&Itemid=51>. Acesso
em: 10 set. 2007.
3
ROLNIK, Suely. Ninguém é Deleuziano. Disponível em:
<http://www.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/SUELY/ninguem.pdf >. Acesso em: 26 abr. 2007.
5
últimas semanas, seu pulmão chegou a um tal ponto de asfixia que ele não
podia mais escrever linha alguma, nem falar; com a chegada do inverno, a
coisa iria se agravar e não havia nenhuma possibilidade de recuperação.
Enquanto ele pôde escrever e falar, mesmo no estado precário de seus
últimos anos, ele continuou a querer viver. Foi neste estado que ele escreveu
seu último livro com Guattari (O que é Filosofia?) e organizou duas
coletâneas de artigos e entrevistas (Conversações e Critique et Clinique).
Mas quando tudo se tornou definitivamente impossível, ele escolheu fazer o
que parece sempre ter feito em sua vida e que, em todo caso, sempre
defendeu em sua obra: enfrentar as diferenças que se apresentam e, por
mais insuportáveis que sejam, encaminhar a existência na direção que elas
apontam. Haverá diferença mais insuportável e que requer maior coragem de
enfrentamento do que a morte? Deleuze teve a coragem de afirmar a vida até
neste momento extremo de seu fim (ROLNIK, Acesso em: 26 abr. 2007).
Não se escreve com o seu eu, sua memória ou suas doenças. No ato de
escrever, há a tentativa de fazer da vida algo mais do que pessoal, de libertar
a vida do que a aprisiona. [...]. Não há nenhuma obra que não indique uma
abertura para a vida, que não trace um caminho entre os pavimentos.
Esta pesquisa buscou inspiração no pensamentopotência de Gilles Deleuze, Félix
Guattari e outros pensadores, procurando cartografar algumas possibilidadesoutras
(GUATTARI, 2005) de se problematizar o cotidiano da educação escolar. Nesse
sentido, o cotidiano escolar do laboratório de informática foi problematizado,
inferindose que uma instituição de ensino deve criar as condições para o
aprendizado, percebendo em sua função, como instância institucional com viés
educativo, o compromisso de servir as pessoas e não o contrário.
Não sei ao certo se me encontrei com Gilles Deleuze e Félix Guattari ou se foram
eles que vieram ao meu encontro, mas sinto que esta pesquisa foi escrita a sete
mãos: duas minhas, duas de Deleuze, duas de Guattari e Cia, e uma sétima mão,
que não é a do uno, mas a do múltiplo e da diferença que é preexistencial, como um
big bang; que me habitou, me perpassou; que se fez inerente; que se deslocou,
desgarrou e ainda se inventa no cotidiano a cada dia, a cada segundo; que sinto e
vivo e deixo de viver como uma eternidade simultaneamente efêmera, mas que em
4
"Signos e Acontecìmentos", Raymond Bellour e François Ewald entrevistam Gilles Deleuze. In:
Carlos Henrique Escobar. Dossier Deleuze. Hólon Editorial, Rio de Janeiro, 1991.
6
todo esse simulacro em que a multiplicidade e a diferença não se deixam apreender,
afirmando intensamente a vida. Obrigado, Gilles Deleuze!
Figura 1 Gilles Deleuze (19251995)
Fonte: PSIKEBA. Disponível em: <http://www.psikeba.com.ar/recursos/autores/Deleuze.jpg>. Acesso
em: 5 set. 2007.
Agradeço ainda: aos funcionários do Centro de Educação da UFES, que sustentam
e fazem manutenção de todo o aparato físico e institucional da Universidade e que
não são de forma alguma figurantes, mas atores/atrizes importantes no cotidiano
universitário.
À professora Regina Helena Silva Simões, pelas aulas significativas na disciplina de
História da Educação.
Ao professor Hiran Pinel, pelos modos múltiplos de sersendo “n” possibilidades no
mundo mediante sua subjetividade inclusiva (aceitação incondicional do outro). A
característica principal e plural desse professorpsicólogoeducadorprofessorpintor
cantor, entre muitas outras possibilidades de se referir a ele, pode ser assim
resumida: é uma pessoa admirável, cuja índole serena e a receptividade inclusiva
são marcasmarcadas em seu fazer cotidiano.
Ao professor Carlos Eduardo Ferraço, pelos discursos que foram/são extremamente
significativos e (im)pertinentes. Como meu professor e orientador no curso de
Especialização em Educação, ele instigoume, com todo a sua discursividade, a
7
pesquisar incessantemente o currículo escolar e, logo após meu encontro com o
professor Hiran Pinel, também conceber um possível currículo nãoescolar.
Em especial à Vida: às vezes tempestiva e às vezes calma, doce e bela. Ela se
distingue, ela é singular e produz rios de subjetividades quando me encontro com
ela, seja no espaçotempo do cotidiano realvivido, ou no ciberespacialvivido. Ela
transforma uma relação em uma multiplicidade, não como algo que está contido
nela, mas mediante seu “sorriso” e seus modos de sersendo bela, alegre e vibrante.
Ela faz atravessar e perpassar a todos, tanto nos momentos presentes quanto nas
ausências. O estarjunto e estardistante é pósexistente devido a uma pré
intensidade da diferença que, portanto, nos antecede; a diferença (DELEUZE, 2006)
produz uma repetição sempre vibrante nesses encontros, desencontros e não
encontros e a repetição indolente é perpassada e produzida por essa diferença pré
existencial. Não é um amor líquido 5 (BAUMAN, 2004) pela Vida de que estou
falando, mas sim de um amor cristalizável e mutável que produz e é produzido por
um relacionamento de coletividades: quando desejamos estar juntos, quando
também desejamos um ambiente, uma série de artefatos culturais, uma família, uma
fé e amigos: isso é o que denomino de um amor sólido, isso também é uma vida
nãofascista.
Com efeito, o termo “coletivo deve ser entendido aqui no sentido de uma
multiplicidade desenvolvendose para além do indivíduo, do lado do socius,
como também aquém da pessoa, do lado das intensidades préverbais,
5
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Tradução: Carlos
Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
8
relevando mais uma lógica dos afetos que uma lógica de conjuntos bem
circunscritos (GUATTARI, 1990, p. 78).
6
Sigla para designar a informática e sua potencialização com os recursos de comunicação e
processamento de informações digitais.
9
RESUMO
Pesquisa sobre a produção de redes de conhecimentos e de redes de subjetividades
compartilhadas pelos professores no cotidiano escolar do laboratório de informática
de uma escola pública do Ensino Fundamental. Apresenta e problematiza o currículo
realizado, prescrito e agenciado nesse espaçotempo de ensino, pedagógico e
educativo, com ênfase no fluxo de transformação contínua dos professores, no ato
de aprender (DELEUZE, 2006) e apreender as Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs) interligadas com a educação e na produção de um novo tipo de
currículo, conceituado como currículo agenciado. Desenvolve um novo tipo de
pesquisa em educação, aplicável também a outras áreas das ciências humanas,
denominado de método cartográfico ou pesquisa cartográfica (KASTRUP, 1999), no
qual relaciona os processos de produção de subjetividade, aprendizagem e
transformação contínua dos professores com aspectos culturais, históricos e de
apropriação de mídias e tecnologias digitais, como a informática, entre outros
artefatos culturais tecnológicos, que se constituem como agenciamentos maquínicos
de desejo e agenciamentos coletivos de enunciação (DELEUZE, 1990). Dá a ênfase
no papel ativo dos educadores como produtores dos determinantes históricos que
geram agenciamentos intensivos mediante agentes educativos que efetivamente
produzem um sistema educacional, inventando simultaneamente linhas de fuga e
um currículo agenciado mediante fluxos de transformação contínua e produções
maquínicas de redes de conhecimentos.
ABSTRACT
The paper is a research about the production of knowledge networks and of
subjectivity nets shared by teachers in the school everyday life of the computer
laboratory in an elementary public school. It presents and discusses the curriculum
made, prescribed and scheduled in this spacetime of pedagogical and educative
teaching, emphasizing the flux of continuing transformation of teachers in the act of
learning (DELEUZE, 2006) and learning the Information and Communication
Technologies (ICT) interlinked with the education and in the production of a new kind
of curriculum, conceited as assemblage curriculum. It develops a new type of
research in education, also applicable to other areas of human science, named
cartographic method or cartographic research (KASTRUP, 1999), which there is a
relation between the processes of subjectivity production, learning and continuing
transformation of teachers with cultural, historical and media appropriation and digital
technology aspects, such as computer classes, among other cultural technological
devices that are constituted as machine solicitations of desire and collective
assemblages of enunciation (DELEUZE, 1990). The work emphasizes the active role
of educators as producers of historical determinants that generate mobile and acting
assemblages as educative agents that effectively produce an educational system,
inventing simultaneously escaping lines and a assemblage curriculum through flux of
continuing transformation and machine productions of rhizomatic knowledge.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Gilles Deleuze (19251995).........................................................................6
Figura 2 – Desenho de um layout de um laboratório de informática para capacitação
de professores sugerida por um documento do ProInfo, de 14/07/1997...................24
Figura 4 – Site educacional Nova Escola Online bloqueado pelo software Websense
instalado nos servidores da PMV...............................................................................27
Figura 5 – Site da SEMEPMV...................................................................................50
Figura 6 – Desenho de uma possível organização do laboratório de informática
produzido por um aluno..............................................................................................92
Figura 7 “Nota de rodapé” na caixa de entrada e também ao visualizar qualquer e
mail no serviço de webmail Yahoo! Mail, no modo classic.......................................100
Figura 8 – O insurgimento do Currículo Agenciado.................................................108
Figura 9 – O insurgimento do Educativo..................................................................109
Figura 10 – Uma questão.........................................................................................135
13
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................16
1.1 DISPOSITIVOS PARA ACOMPANHAMENTO DOS PROCESSOS.................21
2 BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NO
BRASIL......................................................................................................................39
2.1 BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NO
ESPÍRITO SANTO.....................................................................................................45
2.2 BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NA
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE VITÓRIA/ES.................................50
2.3 BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO NA
ESCOLA PESQUISADA.............................................................................................56
3 O COTIDIANO ESCOLAR DO LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA.................61
3.2.1 Currículo Virtual: A Expectativa sobre o Software Livre...........................70
3.3 OS RECURSOS MATERIAIS, FINANCEIROS E HUMANOS...........................74
14
3.4.1 As Funções Acumuladas do Professor de Informática.............................83
3.7 O TRABALHO COLETIVO.................................................................................94
4 ALGUMAS PROBLEMATIZAÇÕES SOBRE AS REDES DE CONHECIMENTOS
E O CURRÍCULO AGENCIADO..............................................................................105
6 PÓSESCRITO...................................................................................................130
REFERÊNCIAS........................................................................................................139
APÊNDICES.............................................................................................................145
15
ANEXOS..................................................................................................................147
16
1 INTRODUÇÃO
Conforme dispõe o art. 21 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB
Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996), a educação escolar compreende por: I
– A Educação Básica, formada pela Educação Infantil, pelo Ensino Fundamental e
pelo Ensino Médio, e II – a Educação Superior. Esta pesquisa foi desenvolvida em
uma escola pública da Educação Básica, especificamente em nível do Ensino
Fundamental, e envolveu professores e alunos da 1.ª à 8.ª séries. Esse nível de
ensino da Educação Básica tem como características principais a duração mínima
de oito anos, o fato de ser obrigatório e gratuito na escola pública.
A instituição pesquisada utiliza o regime de progressão regular por série, tendo
atualmente um total de oito séries. Os alunos têm direito a pelo menos quatro horas
de trabalho efetivo em sala de aula (art. 34 da Lei n.º 9.394/96) e a uma carga
horária mínima anual de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos
dias de efetivo trabalho escolar (art. 24 da Lei n.º 9.394/96).
A pesquisa ocorreu em um contexto históricosocial no qual o Governo Municipal e o
Governo Federal eram ligados ao Partido dos Trabalhadores (PT), no caso do poder
executivo. Nesse contexto contemporâneo, o poder executivo do Governo Federal
assumiu uma postura de apoio explícito ao software livre 7 , que incidiu diretamente
nos laboratórios de informática da Rede Municipal de Ensino de Vitória, com a
adoção de tais softwares, representados principalmente pela distribuição do sistema
operacional Debian GNU/Linux em inúmeras escolas (ANEXO A). No caso da escola
pesquisada, havia uma expectativa de chegada desses softwares, como será
descrito e problematizado em um dos capítulos da dissertação, mas, no momento
em que esta pesquisa foi desenvolvida, o laboratório de informática contava
7
O termo software livre referese aos softwares fornecidos a usuários com a liberdade de executar,
estudar, modificar e repassar (com ou sem alterações) sem que, para isso, tenham que pedir
permissão ao autor do programa. Portanto, são programas de computador com o código fonte aberto,
ou seja, livre para ser reproduzido e modificado. Usa o registro de copyleft , o que assegura a
continuidade de sua livre distribuição.
17
8
Programas de computador com todos os direitos reservados ao dono do copyright. O Código fonte é
secreto e sua reprodução, bem como sua modificação, é proibida e considerada crime. Para usar
legalmente esse tipo de software é preciso pagar taxas de licenciamento.
9
A Microsoft Corporation é a maior e mais conhecida empresa de software do mundo. Foi fundada
em 1975 por Bill Gates e Paul Allen com o objetivo de desenvolver e comercializar interpretadores da
linguagem BASIC. A Microsoft produz uma grande variedade de programas, incluindo sistemas
operacionais (Microsoft Windows nas versões Windows Vista, Server 2003, XP, 2000, ME, 98, 95
entre outros); programas de escritório (pacote Office, que contém Word, Excel, Outlook, Powerpoint,
InfoPath, Project, OneNote, Visio, Access e Publisher ou Frontpage); ambientes de desenvolvimento
de programas (Visual Studio, Web Matrix, Microsoft Plataform Builder e Microsoft Target Designer) e
servidores, como o SGBD SQL Server e o servidor de correio eletrônico Exchange, entre outros. A
Microsoft também produz o navegador Internet Explorer e o sistema de comunicação instantânea
Windows Live Messenger. Também atua no mercado de serviços online (portal MSN, Hotmail) e na
produção de equipamentos periféricos. A empresa também possui um departamento dedicado ao
desenvolvimento de jogos (games), a Microsoft Games Studios.
18
educação ou não, procurando perceber a imbricação entre o nuncavisto e o jávisto
(DELEUZE, 2006); buscandose uma tessitura textual sobre as redes de
subjetividades e de redes de conhecimentos produzidas em um intercâmbio de
relacionamentos interdependentes entre os múltiplos professores (agentes
cognitivos) e alunos (agentes aprendentes), no qual o processo de ensino
aprendizagem desejante por experimentações com as tecnologias era um fator “x”
sine qua non, mas não se restringia a ela mesma, portanto, não era autônoma, mas
extremamente ligada aos engajamentos dos agentes ali envolvidos no cotidiano
escolar do laboratório de informática.
(Per)correuse em todo instante uma perspectiva processual de que os professores:
· são agentes de seu meio, ou seja, não são sujeitos, no sentido daquele
que é vítima de opressão, alienado, assujeitado, submisso e indefeso,
nem no sentido da relação bipolar sujeitoobjeto, mas são agentes
educativos junto com outros múltiplos agentes cognitivos e aprendentes;
· produzem agenciamentos e fazem parte deles, já que ‘um
agenciamento’ não é algo que lhes é exterior e que se faz necessário
burlar, como “ratos em um labirinto”; mas, sem dúvida nenhuma, há um
sistema que tenta criar formas de subjetivação capitalística cuja intenção é
a internalização de identidades que agridem as formas que o cotidiano
escolar cria para se autoafirmar como locus de produção de atividades
pedagógicas e de ensino, e também como lugar de profissionais da
educação que podem produzir o educativo; um sistema que pode estar ou
não extremamente ligado ao Capitalismo Mundial Integrado (CMI) 10 ou a
redes de relações de poder coercitivas, produzidas internamente na
escola ou na comunidade local, entre outras possibilidades, cuja resposta
de resistência e de produção de si e do mundo afirmadas pelos
professores se constituem em agenciamentos;
10
“Capitalismo Mundial Integrado” (CMI) é o nome que, já nos anos 60, Guattari propõe como
alternativa à “globalização”, termo segundo ele por demais genérico e que vela o sentido
fundamentalmente econômico, e mais precisamente capitalista e neoliberal do fenômeno da
mundialização que se instalava. Nas palavras de Guattari: “O capitalismo é mundial e integrado
porque potencialmente colonizou o conjunto do planeta, porque atualmente vive em simbiose com
países que historicamente pareciam ter escapado dele (os países do bloco soviético, a China) e
porque tende a fazer com que nenhuma atividade humana, nenhum setor de produção fique de fora
de seu controle” (GUATTARI; ROLNIK, 2005, p. 411).
19
[...] a invenção não é um processo que possa ser atribuído a um sujeito. A
invenção não [...] deve ser entendida a partir do inventor. O sujeito, bem
como o objeto, são efeitos, resultados do processo de invenção. [...]. Já nesta
época, é a ação, o fazer, a prática cognitiva que configura o sujeito e o objeto,
o si e o mundo. A transformação temporal da cognição não segue um
caminho necessário, não leva a uma seqüência de estruturas cognitivas e
estágios que seguiriam uma ordem invariante, como nas teorias do
desenvolvimento cognitivo, mas é antes uma deriva, criada a partir dos
acoplamentos com as forças do mundo (KASTRUP, Acesso em 2 jun. 2007).
A partir da processualidade das relações educacionais cotidianas com as TICs,
tendo por inspiração as oito pistas apresentadas por Kastrup (2007), trabalhouse
20
metodologicamente uma pesquisa que abordou os saberes, os fazeres e a tessitura
das redes de conhecimentos que se autofizeram (o autofazer não é uma produção
inatista, mas, sim, uma produção de todos em uma rede de colaboração) em rizoma,
e não em uma dualidade, no cotidiano. Essa metodologia está sendo denominada
de método cartográfico ou pesquisa cartográfica. Neste estudo, o método
cartográfico foi adaptado para se problematizar, além do que já foi mencionado,
também o currículo agenciado e a tessitura das redes de conhecimentos no
cotidiano escolar do laboratório de informática. Nesse sentido, seguem abaixo os
princípios interrelacionados a essa perspectiva de pesquisa sobre o cotidiano, os
quais serviram de referência durante todo o processo de pesquisa e na
problematização dos dados produzidos.
· um acompanhamento do processo;
· um coletivo de forças e desejos, projetados às vezes em uma rede de
subjetividade compartilhada, mas não significando que seja
necessariamente para grupos;
· um território existencial, fazendo com que a pesquisa não tivesse relação
com um método subjetivo; mas com um método objetivo;
· o traçado de um campo problemático, pois, ao entrar em uma pesquisa de
campo, redesenhase o problema (campo problemático): o problema é
construído no processo de pesquisar;
· a dissolução do ponto de vista do observador, negando todas as formas
de subjetivismo, buscando afirmar que a pesquisa da subjetividade não é
carregada de subjetivismo e dissolvendo o ponto de vista do observador
(subjetivismo) bem como do objeto (objetivismo);
· a atenção concentrada e aberta ao presente (atual) tecendo
considerações sobre possibilidadesoutras de existência (virtual);
· uma requisição de dispositivos para funcionar, que, no caso desta
pesquisa, foi o laboratório de informática e os artefatos culturais (técnicas
e tecnologias);
· a não separação entre pesquisa e intervenção, concebendo que pode
haver intervenção sem pesquisa, mas não é possível pesquisa sem
21
intervenção, sentido em que foram utilizados os Feeds para Diálogos
Aproximativos (FDAs) e dois níveis de intervenção:
o no grupo, na instituição e/ou nos sujeitos da pesquisa;
o na área da educação, no currículo e na informática na
educação.
A cartografia é um método formulado por G. Deleuze e F. Guattari (1995) que
visa acompanhar um processo, e não representar um objeto. Em linhas
gerais, tratase sempre de investigar um processo de produção. De saída, a
idéia de desenvolver o método cartográfico para utilização em pesquisas de
campo no estudo da subjetividade se afasta do objetivo de definir um
conjunto de regras abstratas para serem aplicadas. Não se busca estabelecer
um caminho linear para atingir um fim. A cartografia é sempre um método ad
hoc. Todavia, sua construção caso a caso não impede que se procure
estabelecer algumas pistas que têm em vista descrever, discutir e, sobretudo,
coletivizar a experiência do cartógrafo (KASTRUP, Acesso em 10 jul. 2007,
Disponível na Internet, grifo do autor).
Inferese que pode ser acrescentado aos oito princípios mencionados por Kastrup o
oitavo princípio da esquizoanálise proposta por Guattari (1988, p. 191, grifo do
autor), mas que ele afirma ser o primeiro: “toda idéia de princípio deve ser mantida
como suspeita”.
1.1 DISPOSITIVOS PARA ACOMPANHAMENTO DOS PROCESSOS
Ocorreu o registro dos discursos a partir de conversações com os agentes
educativos (professores regentes, pedagogas, coordenadores, diretora e
professores do laboratório de informática), gravadas em um MP3 Player 11 e
posteriormente transcritas. Foi utilizada uma série de pontos culminantes de um
currículo denominados de Feeds para Diálogos Aproximativos (APÊNDICE A),
especificamente elaborados e agrupados a partir dos oito platôs 12 desta pesquisa
em educação escolar, que serão mencionadas no capítulo “O Cotidiano Escolar do
Laboratório de Informática”, mas que são novamente citadas ao final deste capítulo.
Os Feeds para Diálogos Aproximativos (FDAs) têm uma possibilidadeoutra de
11
Tocador de áudio digital portátil que também podia ser utilizado como um dispositivo de
armazenamento de arquivos e gravador de voz digital.
12
Zonas de intensidade de produção do currículo agenciado.
22
oferecer subsídios de antemão para e com o currículo agenciar, pois não se nega o
ato de questionar como uma forma de intervenção: os FDAs foram organizados em
oito platôs e sua préintencionalidade é baseada na esquizoanálise, no sentido de
não impedir as formações de enunciados e produções maquínicas de desejo, mas
ficar afirmativamente na adjacência da mudança, enfim, no acompanhamento do
fluxo de transformação contínua dos professores.
[...] ver no discurso [...] um campo de regularidade para diversas posições de
subjetividade. O discurso, assim concebido [...] é um conjunto em que podem
ser determinadas a dispersão do sujeito e sua descontinuidade em relação a
si mesmo. É um espaço de exterioridade em que se desenvolve uma rede de
lugares distintos [...] (FOUCAULT, 2005, p. 61).
Outro procedimento foi as produções de problematizações do que ocorria
processualmente na prática pedagógica e de ensino e, ao acaso, na produção de
subjetividade da prática educativa, no currículo prescrito, realizado e agenciado,
mediante discursos orais, escritos, imagéticos ou audiovisuais, atentandose aos
comportamentos (simulacros 13 ) e/ou discursos de poder e desejos forjados.
Pretendeuse, assim, problematizar as interrelações dos agentes educativos tecidas
com múltiplos outros agentes no cotidiano escolar pesquisado e que estavam em um
13
Inspirome na idéia de simulacro de Gilles Deleuze que, segundo o pensador, não é uma cópia
degradada, ele encerra uma potência positiva que nega tanto o original como a cópia, tanto o modelo
como a reprodução. O simulacro, nesse sentido, é o protótipo do processo de subjetivação
(MADARASZ, 2005, p. 1.2141.215).
23
fluxo contínuo e descontínuo de experimentações. Em tal contexto, as práticas
pedagógicas e de ensino em relação ao uso das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs) na educação e o relacionamento professoralunoconteúdos
eram territorializadas, desterritorializadas e reterritorializadas, forjando, em acasos,
práticas educativas que permitiam o entrever de um possível currículo.
É importante estar pronto para acolher cada momento do discurso em sua
irrupção de acontecimentos, nessa pontualidade em que aparece e nessa
dispersão temporal que lhe permite ser repetido, sabido, esquecido,
transformado [...] (FOUCAULT, 2005, p. 28).
A pesquisa foi desenvolvida no espaçotempo do cotidiano escolar do laboratório de
informática que tem um total de vinte e um computadores com software proprietário,
vinte dos quais estão efetivamente funcionando. O laboratório de informática
contava com as seguintes características e equipamentos:
· A configuração básica dos computadores era: processador AMD 14 Athlon, 256
MB, 40 HD, leitores de CDROMs, caixas de som, teclados, mouses scroll e
ópticos, e monitores de 15 polegadas, CRT, configurados na resolução
800x600;
· softwares: Microsoft Windows XP Professional Edition, Microsoft Office 2003 e
XP, Symantec 15 Antivirus, Microsoft Internet Explorer 6.0;
· quatorze fones de ouvidos;
· um “quadro de avisos e informações importantes” (esse era o nome do
quadro, mas estava desatualizado);
14
AMD (Advanced Micro Devices) Empresa americana fabricante de circuitos integrados,
especialmente processadores.
15
A Symantec foi fundada em 1982. Suas atividades se concentram em segurança da internet e em
redes para usuários domésticos e corporações, suas soluções são baseadas em software e
aplicativos proprietários, com proteção de antivírus, análise de vulnerabilidades, detecção de intrusos,
filtragem de conteúdo e de email. É a Symantec que produz a linha de produtos Norton.
24
· caixa de interruptores de energia elétrica;
· oito pares de lâmpadas largas (tubo) fluorescentes (forneciam boa
iluminação);
· quadro acrílico para uso de pincel atômico;
· impressora multifuncional;
· dois aparelhos de arcondicionados (apenas um funcionava, mas ao finalizar
a pesquisa um novo aparelho foi comprado e instalado);
· um armário metálico;
· um switch para a distribuição da internet;
· um gravador de CDROM, disponível no único computador conectado à
impressora (os computadores não estão em rede nem a impressora);
· um relógio de parede (tipo ponteiro);
· teto de madeira envernizada;
· as paredes tinham marcas da reforma referentes ao arcondicionado e fitas
adesivas usadas em cartazes. Não havia grandes cartazes, mas havia “mini
cartazes” sobre limpeza;
Laboratório de informática Proposta 3
( sala c/ 6m x 6,30)
Prof.
P ro f.
Servidor de rede e
mesa do professor
Estação de trabalho
6,30 m
(alunos)
Impressora
Armário
DG de força e "hub
"Quadro branco"
6,00 m
Figura 2 Desenho de um layout de um laboratório de informática para capacitação de professores
sugerida por um documento do ProInfo, de 14/07/1997: No caso da escola pesquisada, a organização
dos computadores, das bancadas e das cadeiras lembra a imagem de um quadrado, faltando apenas
uma das extremidades que é ocupada por uma mesa e três cadeiras, com o centro totalmente livre, o
que facilitava a movimentação dos alunos e professores.
Fonte: PROINFO. Disponível em: <http://www.proinfo.mec.gov.br/upload/biblioteca/216.zip>. Acesso
em: 8 maio 2007.
25
Figura 3 Imagem ilustrativa, elaborada pelo pesquisador, da organização do laboratório de
informática da escola pesquisada. O desenho foi criado a partir do layout do laboratório de informática
para capacitação de professores do ProInfo, cujo documento é datado de 14/07/1997.
Segundo a professora de Informática, existem dois tipos de contas de usuário 16
registrados nos computadores:
· administrador: utilizado pela professora de Informática para instalar e
desinstalar programas, alterar as configurações, entre outras tarefas;
· aluno (matutino, vespertino e Programa Escola Aberta 17 ): apenas para o uso
dos programas.
A professora de Informática, cujo locus de trabalho é o laboratório de informática,
era quem, na maioria das vezes, procurava os softwares a serem instalados e
16
Uma conta de usuário é um conjunto de nomes de acesso e de uma senha que possibilitam que o
usuário acesse a sua área do sistema. No caso dos computadores da escola pesquisada, o nome de
usuário e senha permitia um acesso à área de administração do computador, que possibilitava, entre
várias coisas, a instalação e desinstalação de programas; no caso da conta de usuário “aluno”,
permitia unicamente o uso dos programas.
17
O Programa Escola Aberta foi criado a partir de um acordo de cooperação técnica entre o
Ministério da Educação e a UNESCO e afirma o objetivo de contribuir para a melhoria da qualidade
da educação, a inclusão social e a construção de uma cultura de paz, por meio da ampliação das
relações entre escola e comunidade e do aumento das oportunidades de acesso à formação para a
cidadania, de maneira a reduzir a violência na comunidade escolar. Promove, em parceria com
sessenta e oito secretarias de educação municipais e cinco estaduais e com a Secretaria de
Educação do DF, a abertura de escolas públicas de Ensino Fundamental e Médio localizadas em
regiões urbanas de risco e vulnerabilidade social, aos finais de semana, para toda a comunidade.
26
utilizados nas aulas e escrevia os projetos de ensino de acordo com a demanda dos
professores regentes 18 . Eles agendavam o laboratório de informática para uma
determinada quantidade de aulas; ao mesmo tempo, ou em um segundo momento,
a professora de Informática, junto com o professor regente, articulava os conteúdos
e as tecnologias que seriam utilizadas. Nesse sentido, o professor de Informática
atua como um mediador entre os conteúdos programáticos que estão sendo
trabalhados pelos professores regentes em sala de aula e as TICs, especificamente
e especialmente a informática.
“A professora de Informática falou que quem terminou de fazer os jogos do quebra
cabeça pode explorar o site, vai abrindo outras coisas, joga lá o “fauna em extinção”,
“ééé”... Alguma coisa sobre área rural, que tinham outras opções. Só que teve um
aluno, um aluno desses “test drive” que fez acesso a jogos eróticos. É, e a
prefeitura, uma coisa também que deixa a gente, atualmente, bem de cabelo em pé,
é que era mais eficiente a questão do bloqueio em relação à pornografia, em relação
a alguns sites desses, né? Acessos que não deveriam ser feitos em escolas, e que
no caso, o aluno praticamente não soube usar o que deveria, mas conseguiu
acessar tal site [...] (Professora de Geografia de 5.ª a 8.ª séries do Ensino
Fundamental)”.
Quando os professores regentes agendavam o laboratório de informática para um
total de quarenta alunos, por exemplo, o uso dos computadores era organizado para
18
O professor regente é o responsável por uma disciplina ou um conjunto delas (caso dos
professores de 1.ª a 4.ª séries). Exemplos: professor de Língua Portuguesa, professor de Matemática,
etc.
19
Sistema de segurança Web formado por um conjunto de softwares que filtra conteúdos e impede o
acesso a determinados sites definidos pela instituição ou empresa. Esse software permite uma
fiscalização automática de quem tem acesso a uma determinada informação, como ela pode ser
usada e para onde pode ser enviada.
27
duplas de alunos e, ocasionalmente, para trios (por exemplo, quando a internet
estava lenta em um computador e em outro não, os alunos deslocavamse e
reorganizavamse), e raramente em grupos (no caso de haver apenas um ou dois
exemplares de um CDROM a ser utilizado, visto que o laboratório de informática
não estava com todos os computadores em rede e alguns CDROMs não funcionam
em rede). A principal reclamação dos alunos estava relacionada principalmente à
internet lenta e aos sites bloqueados, ocasionalmente, ao fato de nem todos os
computadores estarem em rede.
“[...] a gente coloca aos professores que o laboratório de informática tá lento, e eu
vou ter que vir pra cá uma hora antes, pelo menos, pra começar a abrir os sites, né?
E, como você percebeu, existem alguns problemas operacionais, tipo: tinha um
computador que não tava abrindo de jeito nenhum, que não tava carregando,
demorando demais pra sair de um quebracabeça e passar pro outro... E numa
turma tão grande como a 6.ª série, de quarenta alunos, né? Eu tinha dificuldade de
administrar, apesar de ter começado com uma revisão... Quer dizer, poderia haver
alguns problemas, né? Paciência, né, com os meninos. Hoje em dia eles tem muita
pressa por ter acesso mais rápido em casa ou acesso rápido em lan house; eles não
têm paciência de aguardar abrir. Falam, “Ah! É muito lento!”, “Professora, eu quero
outra coisa!” (Professora de Informática de 5.ª a 8.ª séries do Ensino Fundamental)”.
Figura 4 Site educacional Nova Escola Online bloqueado pelo software Websense instalado nos
servidores da PMV. É contraditória a categoria que o programa definiu para ser filtrada (bloqueada):
“materiais educacionais”.
28
Podem ser apontados como principais problemas do laboratório de informática:
· as máquinas (hardware) desatualizadas;
· um computador que não está funcionando;
· softwares desatualizados ou que não estão disponíveis em CDROMs;
· excesso ou sobrecarga no recebimento de alunos, impossibilitando trabalhos
individuais;
· os computadores que não estão em rede;
· a impressora que não está compartilhada;
· ausência de um servidor de rede;
· inúmeros sites bloqueados;
· internet lenta;
· alguns CDROMs multimídia que não funcionam.
A professora de Informática relatou outro problema: que faltam mais cinco máquinas
(computadores) para suprir a demanda educacional dos alunos por computadores.
Relatou também que a pedagoga não acompanha seu trabalho e afirma que “muitos
professores simplesmente ‘entregam’ os alunos ao laboratório e somem”.
“ Pesquisador: Vocês já pensaram em participar de algum tipo de curso de
formação em informática? Já?
Coordenadora: Já, e eu já fiz.
Pesquisador: A quanto tempo?
Coordenadora: Já tem tempo. Mas a própria professora do laboratório já trouxe
essa discussão para nós, para as professoras, para os funcionários da escola, já
abriu espaço para discussão; não conseguiu ofertar o curso, mas abriu para fazer
uma discussão também para o pessoal da merenda, da limpeza, para o professor...”
Emília Ferreiro (Acesso em 2 maio 2007), em entrevista ao site Nova Escola Online,
faz um breve comentário sobre o laboratório de informática nas escolas sobre a
possibilidade de inadequação de uso.
O professor não sabe bem o que fazer com ele. Então inventouse a sala de
informática, freqüentada apenas em horários determinados. É uma maneira
de não incluir o computador na atividade cotidiana. A introdução dos
computadores na escola é mais uma manobra econômica do que uma
necessidade pedagógica sentida como tal.
cultural que pode potencializar o emergir das redes de conhecimentos, da
organização em rede e, articulado com isso, do educativo. Inserir, delimitar e
enquadrar o uso do laboratório de informática em um tempo chronos , com horários
cronometrados e em espaçostempos fragmentados e distanciados dos demais
professores e alunos, repetindo, portanto, a estrutura da escola moderna, não é uma
prática de inclusão digital que favoreça um currículo agenciado. Apenas determinar
horários para permitir aos alunos um acesso a equipamentos e softwares também
não é uma inclusão digital. A inclusão digital, que é mais uma dimensão da inclusão
social, deve vir acompanhada de um trabalho coletivo dos educadores em função da
transformação contínua de um cidadão póscrítico (SANT’ANA, 2006): é algo que
precisa estar articulado com a formação para a cidadania, o trabalho e o
lazer/recreação.
Entendase, no âmbito desta pesquisa, o conceito de educador como aquele que se
transforma continuamente nos processos de experimentações com as novas
tecnologias em um fluxo de transformação contínua de si e do mundo. É também em
um processo sistemático ou assistemático de produção de redes de conhecimentos
e de organização em rede com o coletivo da escola que ele busca criar formas de
resistência a um saberfazer estabelecido e forjar um ato de aprender mais
especializado e problematizador de fluxos de questões que são propostas por todos
como um sistema instituído no cotidiano escolar. Nesse sentido, um educador
envolvese totalmente em uma inteligência coletiva, estabelecendo processos de
comunicação bidirecional e de colaboração.
A noção de Inteligência Coletiva referese, aqui, à idéia de "potência de ação
coletiva" dos grupos, tomandose como hipótese principal que esta "potência"
depende fundamentalmente da capacidade de indivíduos e grupos
interagirem, pondose em relação e, desta forma, produzirem, trocarem e
utilizarem conhecimentos. Incrementar a Inteligência Coletiva significa, assim,
melhorar os processos de aprendizagem e criação nas coletividades locais,
bem como no interior de redes cooperativas de todo tipo, organizadas a partir
da formação de aparatos cooperativos de produção e de comunidade
(HARDT; NEGRI, apud CARVALHO, 2007).
No cotidiano escolar não há burlas porque não há um sistema exterior ao indivíduo.
É o indivíduo, em seu fazer e em seu saber, que produz um mundo, um sistema,
uma relação e “n” conhecimentos e aplicações para si mesmo. Quando um ato de
aprender é forjado, o indivíduo produz processos de uso e subjetivação com as
31
· As redes de conhecimentos são universalmente específicas. Em qualquer
âmbito escolar e para qualquer um deles, alguns tipos de conhecimentos
serão universalmente específicos à realidade, devido a algumas estruturas
prévias subjacentes a uma instituição de ensino moderna. Em relação a uma
possível escola pósmoderna, não há ainda elementos que permitam dizer em
que campos de probabilidades as redes de conhecimentos se farão insurgir e
instituir, ou estarão em permanente estado de instituição sem se cristalizar.
Alias, ainda não há aspectos subjacentes que permitam cartografar o que
seria uma escola pósmoderna e dizer inclusive, se o termo “escola” pode
continuar sendo utilizado na perspectiva das redes de conhecimentos
(conhecimentos rizomáticos).
· As redes de conhecimentos constituemse na rede e em rede; elas são
rizomáticas (DELEUZE; GUATTARI, 1996). Pensar é estar sempre “entre”;
sempre no “meio”, sem impedir as formações de enunciados e as produções
maquínicas de desejos. Nesse contexto, extremamente ligado a um ato de
aprender, as redes de conhecimentos apresentam múltiplas entradas e
saídas: elas conectamse a outros pontos e assim produzem outros
conhecimentos em rede, para além das axiomáticas mencionadas em negrito
nas proposições citadas.
33
A professora de Informática do turno vespertino expressou tal perspectiva ao
mencionar que “o laboratório de informática é um laboratório de conhecimentos”. Ela
afirmava que “enfatiza o ‘conhecer’ como um aspecto importante do ‘aprender’”.
20
Teoria proposta por Seymour Papert, que diz respeito à construção do conhecimento baseada na
realização de uma ação concreta que resulta em um produto palpável, desenvolvido com o concurso
do computador, que seja de interesse de quem o produz. A esse termo freqüentemente se associa o
adjetivo contextualizado, na perspectiva de destacar que tal produto seja um texto, uma imagem, um
mapa conceitual, uma apresentação em slides deve ter vínculo com a realidade da pessoa ou com o
local onde será produzido e utilizado. O construcionismo implica uma interação alunoobjeto, mediada
por uma linguagem de programação (linguagem Logo).
21
Devir é nunca imitar, nem fazer como, nem se conformar a um modelo, seja de justiça ou de
verdade. Não há um termo do qual se parta, nem um ao qual se chegue ou ao qual se deva chegar.
Tampouco dois termos intercambiantes. A pergunta 'o que você devém?' é particularmente estúpida.
Pois à medida que alguém se transforma, aquilo em que ele se transforma muda tanto quanto ele
próprio. Os devires não são fenômenos de imitação, nem de assimilação, mas de dupla captura, de
evolução não paralela, de núpcias entre dois reinos (DELEUZE, apud ZOURABICHVILI, 2004, p. 48).
34
O que resta de “subjetivo” neste perturbador mundo novo? Afinal, quem
somos nós sem os nossos instrumentos, as nossas máquinas, os nossos
remédios e as nossas bactérias? Essas misturas em que vivemos e que nos
constituem solicitam uma retomada em profundidade da questão da
subjetividade. São tantas as passagens que nos lançam do “subjetivo” ao
“tecnológico”, que mal sabemos hoje onde começa um e termina o outro,
quanto de maquínico encontramos no humano e viceversa. É preciso
percorrêlos como o avesso um do outro, como numa fita de Moebius. [...] soa
cada dia mais artificial pensar técnica e sujeito sem considerar a continuação
que os reinventa a cada momento (PELBART; COSTA, 2003, p. 12, grifo do
autor).
No caso da escola pesquisada, o laboratório de informática era uma ferramenta
utilizada para cooperar, principalmente e pedagogicamente, com os professores e
também, mas eventualmente e tecnicamente, para apoiar atividades da
administração e da comunidade mediante o Programa Escola Aberta22
.
O laboratório de informática, no momento da pesquisa, não tinha as regras
comumente encontradas em outros laboratórios de informática, como proibição
explícita, regulamentada internamente e fixada em algum cartaz em relação ao
acesso à sites pornográficos; aos sites de relacionamentos, também denominados
de redes sociais; a chats (batepapos); ao uso de software de comunicação
instantânea, também conhecidos como instant messengers; instalação, cópia ou
remoção de qualquer programa nos computadores; ao uso do correio eletrônico (e
mail) para fins comerciais, de interesse pessoal ou de terceiros; e até mesmo a
jogos. Mas por que não? Entre muitos motivos, porque a Prefeitura dispõe de um
programa central, já mencionado, denominado Websense, que bloqueia o acesso a
todos os conteúdos acima citados, além de outros mais, como sites de criação de
grupos de discussão e medias streaming (áudio e vídeo em tempo real).
informática; alimentarse, beber ou fazer uso de balas, chicletes, entre outras
restrições – algo que ocorria com dada freqüência; falar ao celular ou mantêlo
ligado no recinto do laboratório de informática – fato que também ocorria
ocasionalmente; “perturbar” o ambiente com brincadeiras, algazarras ou qualquer
atitude prejudicial às atividades propostas, fato que já resultaram na ocorrência de
casos de punição, como expulsão momentânea do laboratório de informática.
Os professores que foram entrevistados demonstraram ser educadores e, portanto,
agentes de seu meio: não estavam em momento algum em um estado de
“alienação”, mas sempre “entre”, sempre no “meio”, sempre tecendo em rede um
movimento, enfim, sempre em um simulacro no qual eram produzidas e
territorializadas suas técnicas de agir como educadores no mundo e
desterritorializando, por sua vez, o ato de atuar apenas como professor. Era na
reterritorialização daquilo que foi problematizado e desconstruído em seu saber
fazer docente (o seu serestando professor) que simultaneamente era gerado um
fluxo de transformação contínua de si, de seus alunos e do mundo que o circundava,
produzindo possibilidadesoutras de educação e agenciamentos de significação e
existência, enfim, um ato de aprender. Dessas interrelações com artefatos culturais
e agentes aprendentes, autofaziamse redes de colaboração, nos quais, por sua
vez, geravam redes de conhecimentos.
A inspiração no método cartográfico ocorreu no sentido de criar condições para
permitir e deixar um movimento passar; nesse sentido, um movimento não é algo a
ser seguido. O movimento é um fluxo de transformação contínua de significados
territorializados, que podem desterritorializarse e criar autopoieticamente ou não um
viés reterritorializável. O movimento é um fluxo afirmativo que pode ser
acompanhado e cartografado.
O movimento, por sua vez, implica uma pluralidade de centros, uma
superposição de perspectivas, uma imbricação de pontos de vista, uma
coexistência de momentos que deformam essencialmente a representação: já
o quadro ou uma escultura são “deformadores” que nos forçam a fazer o
movimento, isto é, a combinar uma visão rasante e uma visão mergulhante,
ou a subir e descer no espaço na medida em que se avança (DELEUZE,
2006, p. 93).
Não se pode falar de uma possível “alegria” no cotidiano escolar do laboratório de
informática, a não ser que se pense a alegria como um conceito com múltiplas
possibilidades: havia alegriasfúnebres, alegriasconhecimentos, alegrias
solidariedades, alegriascompetitividades , entre outras.
Esta pesquisa inseriuse em um campo de possíveis engendrado por uma escola
engajada e compromissada éticaesteticamente com a educação e que a todo
instante se constituía ou não em um espaçotempo privilegiado de produção
intensiva de redes de colaboração e de redes de conhecimentos por agenciamentos.
Tais conhecimentos eram os precursores de um plano de imanência cujas criações
de um cotidiano realvivido e/ou de um ciberespacialvivido foram instâncias
apropriáveis pelos agentes educativos como dispositivos ou ferramentas para a
invenção de possibilidadesoutras de se fazerviver outra educação.
37
Um ato de reapropriação e um autofazer das técnicas dos agentes educativos no
mundo são concebíveis no sentido de que os múltiplos modos de se apresentar ao
mundo que o professor forja não se restringem ao seu ato, não se limitam e
delimitam aos saberes e fazeres cotidianos, mas estão para além deles. Isso quer
dizer que o cotidiano compreende redes de conhecimentos e uma lógica do
aprender que o permeia: mas há outras redes, técnicas e tecnologias mais primitivas
e/ou avançadas na sociedade, que lhe permitem possibilidadesoutras de
problematizar os seus atos e práticas de ensino e pedagógica como profissional da
educação que atua no âmbito institucional escolar e objetiva um ato de aprender
educativo.
Pesquisar é criar devires, exprimir o virtual incluído em uma situação, lançar
multiplicidades que não podem ser presas nas grandes máquinas estatais,
geralmente binárias (tais como homemmulher, branconegro, adultocriança
etc.). [...]. Uma área do conhecimento é criada, aos poucos, na qual são
teorizados os dados produzidos pelos grupossujeitos das pesquisas, sendo
estes dados criações singulares, quase artísticas, inesperadas e
imprevisíveis, dos sujeitos pesquisados. Muitas vezes, os pesquisados
tornamse pesquisadores ao participar da leitura, da análise, da
experimentação e da teorização dos dados que produziram (GAUTHIER, p. 2,
Acesso em: 18 abr. 2007, grifo do autor).
moleculares – das linhas que preservam a ordem instituída. Identificar nós de
estrangulamento feitos de linhas mortíferas – que atuam precipitando a vida e
os ânimos para a estagnação e o esgotamento – e eventuais linhas de fuga
(para a vida). A cartografia, para uma das linhas da geografia
contemporânea, é uma espécie de discurso gráfico. A leitura de mapas, antes
de ser uma leitura técnica de decalques naturais, sociais e culturais, é leitura
de diagramas, formas de ver o mundo, social, cultural e historicamente
construídas [...]. “Numa cartografia, podese apenas marcar os caminhos e os
movimentos com coeficientes de chance e de perigo. É o que chamamos
‘esquizoanálise’, essa análise das linhas, dos espaços, dos devires” [...]
(BENEDETTI, 2007, p. 15).
A pesquisa então, além das observações, também partiu dos discursos (enunciados)
dos agentes educativos. A partir das formações de enunciados e dos oito platôs que
se intentava pesquisar, foram criadas as condições de intercâmbio de informações e
questões, pelo qual emergiam agenciamentos maquínicos de desejo (produções de
desejos) e também agenciamentos coletivos de enunciação (formações discursivas),
produzindo então um currículo agenciado. Esses oito platôs inferidos a partir de
Carvalho (2007) são, respectivamente, os pressupostos e movimentos educativos e
os objetivos social e político inseridos nos saberes e práticas produzidas; a seleção
e organização dos conteúdos e do espaçotempo escolar; os recursos materiais,
financeiros e humanos; a organização (a ordem e o caos) e os movimentos gerados
nesses fluxos; os relacionamentos interdependentes entre educadoresalunos
computadorconteúdos e demais agentes educativos e aprendentes; a diferença
sociocultural como potência de invenção e criação de redes de subjetividades e
conhecimentos; o trabalho coletivo; as práticas políticosociais de ensino,
pedagógica e educativa. Esses platôs serão problematizados posteriormente, no
capítulo “O Cotidiano Escolar do Laboratório de Informática”.
39
[...] partir dos enunciados pessoais de alguém e descobrir sua verdadeira
produção, que nunca é realizada por um sujeito, mas sempre por
agenciamentos maquínicos de desejo e por agenciamentos coletivos de
enunciação que o atravessam e nele circulam, escavando aqui, sendo
bloqueados ali, sempre sob a forma de multiplicidades, de bandos, de
massas com unidade de ordens diferentes que o freqüentam e o povoam
(nada a ver com uma tese tecnológica, nem com uma tese sociológica). Não
existe sujeito de enunciação, existem somente agenciamentos produtores de
enunciados (DELEUZE, 1990, p. 88).
Nessa efetuação em estado de coisas é que a história penetra e forja a
experimentação e a criação de um plano de imanência que não pertence àqueles
que estão no cotidiano, mas que é um devir não apreensível nem pela história
tradicional, nem por nenhuma forma de linguagem, porque a história tradicional e a
40
linguagem classificam e cerceiam os elementos do cotidiano dentro de idéias
limitadas e delimitadas; a experiência do cotidiano sempre vai além, sempre rompe
com essa tentativa de ser amarrada e definida, sempre produz linhas de fuga de
uma compreensão absoluta e universalizável, pois cada contexto é único e
autopoiético, possibilitando uma multiplicidade na própria língua.
Então, qual a importância da história? As narrativas e fatos que se apresentavam no
encontro 23 com o cotidiano permitiam a realização de uma arqueologia do presente,
cujos elementos aproximativos divergentes e convergentes que emergiam nos
discursos dos outros e com os outros e dos saberes e fazeres dos outros, forjavam
um devireducação no laboratório de informática, mas simultaneamente articulado
com o coletivo da escola. Nesse sentido, o devireducativo passava pela permissão
ao desejo: desejo de experimentar, de sentir, de viver e de transformar a vida
mediante o uso das TICs – a vida política e econômica, as políticas públicas e
privadas: enfim, um conjunto, uma coletividade.
Para produzir alguns fatos da história, Tajra (2000) apresenta o seguinte histórico da
informática pública no Brasil:
23
Isso é insistir mais uma vez na exterioridade (e não na exteriorização) inerente ao desejo: todo
desejo procede de um encontro. Tal enunciado é um truísmo apenas na aparência: "encontro" deve
ser entendido num sentido rigoroso (muitos "encontros" não passam de chavões que nos remetem a
Édipo...), ao passo que o desejo não espera o encontro como a ocasião para seu exercício, mas nele
se agencia e se constrói (ZOURABICHVILI, 2004, p. 23).
41
· 1971: O Ministério da Marinha, através do Grupo de Trabalho Especial (Gte) e
o Ministério do Planejamento tomam a decisão de construir um computador
com tecnologia nacional.
· 1972: As questões relacionadas com a informática no País são transferidas
para a Coordenação de Atividades de Processamento Eletrônico (CAPRE),
ligada ao Ministério do Planejamento.
· 1977: Ocorre o primeiro confronto entre o Brasil e interesses estrangeiros em
função da reserva de mercado de mini e microcomputadores – IBM e
Burroughs.
· 1979: As atividades da CAPRE são transferidas para a Secretaria Especial de
Informática (SEI), ligada ao Conselho de Segurança Nacional (CSN). A
produção brasileira de informática estava entre a dos 10 países que mais
cresciam no mundo: 60% da indústria nacional trabalhando com
equipamentos desenvolvidos no País. A SEI encaminha proposta de
viabilização de recursos para informática educativa.
· 1980: A SEI cria a Comissão Especial de Educação para colher subsídios,
visando gerar normas e diretrizes para a área de informática na educação.
· 1981: Promovese o I Seminário Nacional de Informática na Educação em
BrasíliaDF. Recomendase que as atividades de informática educativa sejam
balizadas em valores culturais, sociopolíticos e pedagógicos da realidade
brasileira. Tem início a pesquisa sobre a utilização da informática no processo
educacional.
· 1982: Acontece o II Seminário Nacional de Informática Educativa em
SalvadorBA. Recomendase que núcleos de estudos sejam vinculados às
universidades, com caráter interdisciplinar, priorizando o ensino médio, que
os computadores sejam um meio auxiliar no processo educacional, devendo
submeterse aos fins da educação e que a tecnologia utilizada seja de origem
nacional (software).
· 1983: Criase a Comissão Especial de Informática na Educação (Ceie), ligada
à SEI, à CSN e à Presidência da República, com a missão de desenvolver
discussões e implementar ações para levar os computadores às escolas
públicas. Implantase o projeto Educação com Computadores (EDUCOM),
primeira opção concreta para levar computadores às escolas públicas.
42
Valente e Almeida (Acesso em 14 abr. 2007) escrevem que, no Brasil, assim como
em outros países, o uso do computador na educação teve início com algumas
experiências em universidades, no princípio da década de 1970. Na UFRJ, em 1973,
o Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde e o Centro LatinoAmericano de
Tecnologia Educacional (NUTES/CLATES) usaram o computador no ensino de
Química, através de simulações. Na UFRGS, nesse mesmo ano, realizaramse
algumas experiências mediante simulação de fenômenos de Física com alunos de
graduação. O Centro de Processamento de Dados desenvolveu o software SISCAI
para avaliação de alunos de pósgraduação em Educação. Na UNICAMP, em 1974,
foi desenvolvido um software, tipo CAI, para o ensino dos fundamentos de
programação da linguagem BASIC, para os alunos de pósgraduação em Educação,
produzido pelo Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação,
coordenado pelo Prof. Ubiratan D'Ambrósio e financiado pela Organização dos
Estados Americanos. Em 1975, foi produzido o documento "Introdução de
Computadores no Ensino do 2.° Grau", financiado pelo Programa de Reformulação
do Ensino (PREMEN/MEC). Nesse mesmo ano, aconteceu a primeira visita de
Seymour Papert e Marvin Minsky ao País, os quais lançaram as primeiras sementes
das idéias do Logo.
Entretanto, a implantação do Programa de Informática na Educação no Brasil inicia
se com o primeiro e segundo Seminário Nacional de Informática em Educação, que,
segundo Valente e Almeida (Acesso em 14 abr. 2007), foram realizados
respectivamente na Universidade de Brasília, em 1981, e na Universidade Federal
da Bahia, em 1982. Esses seminários estabeleceram um programa de atuação que
originou o EDUCOM e uma sistemática de trabalho diferente de quaisquer outros
programas educacionais iniciados pelo MEC. No caso da Informática na Educação,
as decisões e as propostas não foram totalmente centralizadas no MEC. Era fruto de
discussões e propostas feitas pela comunidade de técnicos e pesquisadores da
44
área. A função do MEC era a de acompanhar, viabilizar e implementar essas
decisões.
Sintetizando, Valente e Almeida (Acesso em 14 abr. 2007) apresentam as
características da informática na educação da França e dos Estados Unidos, em
relação às do Brasil:
· Modelo americano: Nos Estados Unidos da América não existe uma política
governamental estabelecida. O modelo é descentralizado e ditado pelas
pressões do mercado. O início deuse ainda na década de 50 e tem evoluído
ao longo do tempo. Entretanto, o modelo americano não visa à alteração da
prática pedagógica existente, e sim o ensino de conceitos de informática e
“automação da instrução”.
· Modelo francês: Ao contrário do que aconteceu nos Estados Unidos da
América, o modelo francês foi totalmente planejado e executado pelo Estado.
Contudo, o objetivo do modelo francês não se direcionava para alteração da
prática pedagógica, mas, sim, para o domínio e disseminação da informática
entre seus cidadãos.
· Modelo brasileiro: O modelo brasileiro, apesar de ter sido influenciado de
certo modo pelos modelos anteriores, desenvolveuse de forma independente
e foi sempre fundamentado em pesquisas realizadas entre as universidades e
as escolas da rede pública. Na proposta brasileira, o papel do computador é
provocar mudanças pedagógicas profundas, e não simplesmente
“automatizar o ensino”. Mas os resultados obtidos até agora ainda não foram
suficientes para sensibilizar ou alterar o sistema educacional como um todo.
Tal fato está constatado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(Ideb), do ano de 2005 24 .
Tabela 1 IDEB 2005 e Projeções para a Rede Municipal – VITÓRIA
24
O Ideb é um indicador de qualidade educacional que combina informações de desempenho dos
estudantes em exames padronizados ao final das etapas de ensino (4.ª e 8.ª séries do Ensino
Fundamental e 3.ª série do Ensino Médio) com informações sobre rendimento escolar.
45
Anos Finais 3,5 3,5 3,6 3,9 4,3 4,7 4,9 5,2 5,5
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006. Disponível em: <http://ideb.inep.gov.br/Site/>.
Acesso em: 4 set. 2007.
Os autores ainda apontam mais duas diferenças do Programa Brasileiro de
Informática na Educação em relação aos outros países, como França e Estados
Unidos:
· No Brasil as políticas de implantação e desenvolvimento não são produtos
somente de decisões governamentais.
· As políticas a serem implantadas deveriam ser sempre fundamentadas em
pesquisas pautadas em experiências concretas, usando a escola pública,
prioritariamente o ensino de 2.° grau. Essas foram as bases do Projeto
EDUCOM.
Na pesquisa realizada, inferese que, em relação ao primeiro item apontado por
Valente e Almeida, não se aplica a informática na educação na contemporaneidade,
visto que o Governo Federal, mediante programas de inclusão social, como o
Computador para Todos, incentivos fiscais às empresas produtoras de hardware e
também ao software livre, tem constituído políticas públicas pontuais, impactantes e
determinantes em relação à implantação e desenvolvimento da informática na Brasil
e acesso a computadores, com intervenções visíveis no campo da educação,
especialmente na Educação Básica da cidade de Vitória. Um problema que atinge
todo o setor público, com muita freqüência, é a falta de transparência nas licitações
referentes à aquisição e manutenção de tais equipamentos e softwares . Já em
relação ao segundo item, foram realmente coerentes com a realidade do estado do
Espírito Santo. Mas ressaltase que, nos últimos nove anos, tomando como base a
escola pesquisada, ocorreu uma reorientação de investimentos direcionados ao
Ensino Fundamental.
Segundo Lombardi (1992), no período de 1986 a 1990 foram realizadas atividades,
visando à implantação do Centro de Informática Educativa da Secretaria de
Educação do Estado do Espírito Santo (SEDU).
Para que se efetivasse sua criação, o Programa Nacional de Informática
Educativa exigia a elaboração de um projeto de informática educativa para a
escola pública do Estado. Prevendo a ausência de pessoal competente na
área, por se tratar de um assunto novo, o PRONINFE propôs, para todos os
CIEDs em via de implantação, um curso de 360 horas de Capacitação de
Professor da Rede Estadual de Ensino em Informática, realizado através do
projeto FORMAR na UNICAMP – São Paulo (LOMBARDI, 1992, p. 38).
Ainda segundo Lombardi (1992), a SEDU enviou para esse curso um professor
selecionado através de teste psicotécnico. No seu entorno, esse professor elaborou
o projeto exigido, e que foi aprovado pelo MEC, efetivandose assim, a criação do
CIED/ED, em 1987.
[...] só em dezembro de 89 [1989], montouse o Laboratório de Informática
Educativa da SEDU/ED, com os seguintes equipamentos enviados em regime
de comodato pelo MEC: 13 microcomputadores sendo 9 TK 3000, 4 MSX e
duas impressoras. Nesse período deuse o afastamento do professor formado
para tal fim, de forma que, tinhase um laboratório montado e não existia
pessoal preparado para trabalhar nele (LOMBARDI, 1992, p. 3839).
Finalmente, em 1991, Lombardi (1992) afirma que o CIED contou com mais de 34
microcomputadores, adquiridos pela SEDU, podendo assim estender o seu
atendimento a mais duas escolas [além da EPSG “Desembargador Carlos Xavier
Paes Barreto” e ESG “Arnulpho Mattos” contempladas no ano de 1991] “[...] o
número de alunos aumentou. Totalizouse, durante o ano, um número de 974 alunos
atendidos, sendo 806 do 1º grau, 96 do 2º grau, 65 da comunidade e 7 da educação
especial” (LOMBARDI, 1992, p. 40).
Em classe de educação especial, atenderseia um aluno por computador e
cinco para cada professor/mediador.
Em classe de 2º a 8º série, dois alunos por computador e 5 computadores
por mediador.
Em classe de 2º grau, dois alunos por computador e oito computadores por
professor/mediador.
Para uma carga horária de 25 horas semanais, o professor teria 10 horas
reservadas para encontros semanais, divididas em horas de estudo, reuniões
47
Fazendo um paralelo entre os critérios adotados na organização do trabalho do
professor [de informática] e no atendimento do aluno no ano de 1991 com os de
2007 (ano desta pesquisa), podese inferir que o item que aponta “dois alunos por
computador” permanece extremamente atual, tendo relação direta com o que foi
constatado no laboratório de informática pesquisado. Já no caso da carga horária do
professor de Informática, ocorreu uma perda do tempo reservado para planejamento
em relação ao do ano de 1991, uma vez que esse professor foi enquadrado dentro
da perspectiva dos demais professores regentes, passando a dispor, atualmente, de
um total de cinco horas reservadas ao planejamento em relação às vinte horas
trabalhadas com os alunos, totalizando vinte e cinco horas semanais de trabalho.
Finalmente, em relação ao item que cita a “elaboração de um relatório bimestral,
relatando e analisando o desenvolvimento dos alunos”, inferese que ocorreu uma
situação contemporânea negativa para o processo de avaliação do aluno no
laboratório de informática: o professor de Informática não possui nenhum
instrumento em processo para a avaliação, tais como um diário de classe, nem tem
a obrigação de elaborar um relatório, visto que o espaçotempo do laboratório está
reservado para ser utilizado nas aulas dos professores regentes. Assim, como a aula
pertence ao professor regente de uma determinada disciplina, tal avaliação do uso
das tecnologias só pode ocorrer caso haja consentimento da parte dele, em caráter
nãoobrigatório e em conjunto ou não com o professor de Informática.
Ainda no âmbito do estado do Espírito Santo, no final da década de 1990, foi
implantado o Programa Estadual de Informática na Educação (ProInfoES), que foi
uma iniciativa da Secretaria de Educação a Distância (SEED/MEC), desenvolvido
em parceria com os estados e municípios. Este Programa teve como objetivo
disseminar o uso pedagógico das tecnologias da telemática nas escolas públicas de
Ensino Fundamental e Médio, pertencentes às redes estadual e municipal de ensino.
GABINETE DO MINISTRO Portaria n.º 522, de 09 de abril de 1997. O
MINISTRO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, no uso de suas atribuições
legais, resolve:
48
Art. 1º Fica criado o Programa Nacional de Informática na Educação
ProInfo, com a finalidade de disseminar o uso pedagógico das tecnologias de
informática e telecomunicações nas escolas públicas de ensino fundamental
e médio pertencentes às redes estadual e municipal.
Parágrafo Único As ações do ProInfo serão desenvolvidas sob
responsabilidade da Secretaria de Educação a Distância deste Ministério, em
articulação com as Secretarias de Educação do Distrito Federal, dos Estados
e dos Municípios.
Art. 2º Os dados estatísticos necessários para planejamento e alocação de
recursos do ProInfo, inclusive as estimativas de matrícula, terão como base o
censo escolar realizado anualmente pelo Ministério da Educação e do
Desporto e publicado no Diário Oficial da União.
Art. 3º O Secretário de Educação a Distância expedirá normas e diretrizes,
fixará critérios de operacionalização e adotará as demais providências
necessárias à execução do Programa de que trata esta Portaria.
Art. 4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
(BRASIL, 1997, Disponível na Internet, Acesso em: 14 set. 2007.)
O ProInfo foi um dos geradores da concepção atual do trabalho do profissional
professor de Informática na Rede Municipal de Ensino de Vitória/ES, evidenciado na
pesquisa como sendo um mediador entre os objetivos dos professores regentes e os
conteúdos programáticos de suas respectivas disciplinas, interrelacionandoos à
informática. De acordo com o ProInfo cada laboratório implantado contaria com três
professores efetivos da rede pública de ensino, regentes de classe, com habilitação
em curso superior e formação em informática educativa oferecido pelo Núcleo de
Tecnologia Educacional (NTE). Esses professores atuariam como mediadores ou
facilitadores no laboratório de informática da escola, planejando, juntamente com
professores de diferentes disciplinas, os projetos pedagógicos a serem
desenvolvidos com os alunos. Os laboratórios estariam então integrados
pedagogicamente ao NTE de sua respectiva região. Os NTEs foram criados pelo
Governo do Estado do Espírito Santo, mediante a Lei Complementar n.º 121,
publicada no Diário Oficial de 2 de setembro de 1998.
Art. 2º. Os NTE são estruturas permanentes de suporte ao uso da informática,
orientadas exclusivamente para a Educação, voltadas para incorporação da
tecnologia da informação e comunicação e da tecnologia da imagem no
processo de ensinoaprendizagem das escolas públicas estaduais do Espírito
Santo, auxiliando tanto no processo de incorporação e planejamento, quanto
no suporte técnico, capacitação dos professores e equipes administrativas e
avaliação do processo de informatização das escolas. (ESPÍRITO SANTO
(Estado), 1998, Disponível na Internet, Acesso em: 14 set. 2007)
Por fim, pelo ProInfo seria de responsabilidade das escolas a coordenação
administrativa e funcional do pessoal dos laboratórios.
49
Em seguida, no Decreto n.º 4.537 N, de 31 de dezembro de 1999, em seu art. 8º, §
2º, o Governo do Estado do Espírito Santo fixou as regras para seleção de
professores do laboratório de informática, que foram algumas das bases para o
último concurso público para professores na Rede Municipal de Ensino de Vitória,
iniciado no segundo semestre do ano de 2005 e finalizado no primeiro semestre do
ano de 2006. Tal concurso, promovido pela PMV, baseouse nas alíneas C e E,
citadas logo abaixo, como prérequisitos para inscrição. Ressaltase o fato de ter
sido excluída parte da alínea E, que requeria do candidato a participação em um
curso de capacitação em informática educativa oferecido especificamente pelo NTE;
tal curso, de oitenta horas, foi requerido, mas poderia ser ofertado por outras
instituições.
§ 2º A seleção dos professores será feita obedecendo os seguintes critérios:
a. serem efetivos ou celetistas na escola onde está localizado o laboratório de
informática;
b. estarem em regência de classe;
c. possuírem formação para o exercício do magistério em nível médio ou
superior;
d. comparecerem às etapas da seleção (ficha de inscrição e entrevista)
desenvolvidas pelo NTE;
e. participar de curso de capacitação em informática educativa de 80 (oitenta)
horas, oferecido pelo NTE.
Segundo Teixeira (2006, p. 103), o ProInfoES sofreu reformulações profundas no
final de 2004 e no primeiro semestre de 2005, sistematizadas no documento
intitulado “Programa Estadual de Informática na Educação: Acesso ao Futuro”,
lançado oficialmente em 7 de junho de 2005. Enquanto no município de Vitória foram
contratados primeiramente estagiários, que, posteriormente, foram substituídos por
professores com licenciatura plena, a autora aponta que, no caso da Rede Estadual
de Ensino, a política representou um retrocesso, porquanto a grande mudança,
implantada pelo documento supracitado, foi a retirada dos professores/mediadores
dos laboratórios e a sua substituição por estagiários.
O ProInfoES, instituído nacionalmente em abril/1997, conforme Portaria do MEC n.º
522 de 9 de abril de 1997, entre cujas diretrizes constava a nomeação de
professores para o laboratório de informática, que possuíssem licenciatura plena e
mais um curso adicional de oitenta horas em informática educativa, foi o precursor
dos critérios de seleção do concurso público do magistério de Vitória/ES, ocorrido no
50
ano de 20052006 cujos professores foram nomeados no primeiro semestre de
2006.
Inferese assim, a partir dos dados produzidos, que “a história não é a
experimentação, ela é apenas o conjunto das condições quase negativas que
possibilitam a experimentação de algo que escapa à história” (DELEUZE;
GUATTARI, 1992, p. 210) sendo esse “algo que escapa” constatado no
acompanhamento do processo de produção do currículo agenciado.
Ao visitar o site da PMV e acessar o link da SEME, observouse a inexistência de
Diretrizes Curriculares disponíveis online, especificamente para o uso do laboratório
de informática no cotidiano escolar das escolas de Ensino Fundamental e de
Educação Infantil.
Figura 5 – Site da SEMEPMV: Não constam Diretrizes Curriculares referentes especificamente ao
Laboratório de Informática para o Ensino Fundamental no site da PMV, mais especificamente no link
da SEME.
Fonte: Site da SEMEPMV. Disponível em:
<http://www.vitoria.es.gov.br/secretarias/educacao/diretrizes.asp>. Acesso em: 17 out. 2007.
51
Ainda em relação ao site, o número de computadores e de laboratórios de
informática que consta no link “Seme em números” (ANEXO B), estavam
desatualizados em relação ao ano desta pesquisa (2007) e não registrara ainda o
ano de sua última atualização. Existe o argumento recorrente no cotidiano escolar e
nos discursos, nos dias de formação do professor de Informática 25 (ANEXO C),
promovidos pela SEME, de que a informática não é uma disciplina e talvez por isso
não haja diretrizes, mas, nos documentos na GTESEME, constatase algumas
idéias recorrentes, iniciadas e propagadas pelo ProInfo, da concepção do professor
de Informática como mediador, entre outras questões que são propagadas
oralmente no cotidiano e que constavam em um documento entre os dois que foram
recebidos via email da própria GTESEME.
Após solicitar e receber via email o documento “Função do Professor de Informática
Educativa da Rede Municipal de Ensino de Vitória”, percebese que o documento
não se restringe somente à função do professor de Informática: ele faz referência
também à função do laboratório de informática na escola.
O Laboratório de Informática constituise em mais um espaço educativo na
escola e tem como objetivo desenvolver um trabalho de integração entre os
conteúdos escolares e as novas tendências tecnológicas do mundo
globalizado. Nesse sentido, o trabalho desenvolvido nos diferentes tempos e
espaços escolares, deverá ter um caráter colaborativo, potencializando a
execução de projetos e atividades afins, associadas ao desenvolvimento
social, afetivo e cognitivo de nossos alunos, partindose do pressuposto de
que a atuação desse profissional não se restringe ao espaço do laboratório
de informática. (GTESEME, Acesso em 19 abr. 2007).
Assim, nesse primeiro parágrafo, constatase que, além de o laboratório de
informática ser considerado mais um espaço educativo, apresentase um brevíssimo
embasamento teórico para o atributo de mediador ao professor de Informática, ao
ser citado o caráter colaborativo desse locus. Há ainda o caráter demasiadamente
extenso da especificidade do trabalho do mediador, ocorrendo sempre como
populações (DELEUZE; PARNET, 1996, p. 40), e essa política expressase no
trabalho do professor no cotidiano escolar, o qual, por sua vez, já tem um legado
25
Todos os professores e pedagogos da SEME têm um dia de formação continuada, que costuma
ser agendado mensalmente e comunicado à escola previamente, mediante ofício. No caso do
profissional professor de informática, foram programados apenas três dias de formação para todo o
ano de letivo de 2007.
52
Após esse primeiro parágrafo, o documento cita dez atribuições para o professor de
Informática, que nesse momento é denominado de “professor de Informática
educativa”. Destacase que no concurso público de provas e títulos de 20052006,
ocorreu apenas a menção “professor de Informática”, não sendo mencionado se era
de “informática educativa” e/ou “professor mediador”, embora o documento enviado
pelo GTESEME faça tais menções. Seguem abaixo as dez atribuições
apresentadas no documento para esse profissional.
• Sensibilizar a comunidade escolar sobre a importância de uso dos recursos
existentes no laboratório para a melhoria na qualidade da educação e no
desenvolvimento de atitudes colaborativas;
• Criar um ambiente motivacional de alfabetização, socialização e
comunicação, colocando cartazes, reportagens e outros recursos que
facilitem a troca de conhecimento e informação;
• Cuidar da organização do laboratório de informática e da manutenção dos
computadores;
• Assessorar o uso pedagógico das TIC nos outros espaços pedagógicos da
escola (bibliotecas, salas de aula, secretaria, etc);
• Auxiliar o aluno e demais pessoas interessadas a utilizar os computadores,
adquirindo habilidade de manuseio das máquinas e seus programas, a
realizar pesquisas na internet e buscar informações necessárias para a
realização de seus trabalhos;
• Orientar professores e alunos sobre o uso dos softwares disponíveis, de
acordo com o conteúdo das disciplinas e o objetivo das aulas;
• Incentivar projetos colaborativos envolvendo professores, alunos, escolas e
comunidade ( ex.: Projovem, Escola Aberta), utilizando recursos variados (TV,
vídeo, livros, internet, visitas monitoradas, visitas de estudo, entrevistas, etc);
• Planejar as aulas no laboratório de informática junto com o pedagogo e/ou
os professores da escola;
• Incentivar a formação continuada individual e coletiva de professores no uso
das novas tecnologias na educação;
• Organizar com o CTA da escola momentos de planejamento, visando
integrar as diferentes áreas de conhecimento. (GTESEME, Acesso em 19
abr. 2007.)
Os dois primeiros itens são demasiadamente genéricos, mencionando termos como
“sensibilizar” e “criar um ambiente motivacional”, que são expressões que se
intentam descritivas, mas bastante centradas no ensino e não na aprendizagem.
53
Destacase o terceiro item, em sua parte final, “cuidar [...] da manutenção dos
computadores”, devido a seu efeito subliminar que pode passar despercebido.
Constatouse, no cotidiano escolar do laboratório de informática, que há falta de
apoio técnico regular a tal espaço educativo, forçando o professor de Informática a
exercer também a função de técnico de informática, que a princípio não faria parte
de suas atribuições, uma vez que o termo “professor” está mencionado em sua
função. Em escolas particulares de informática na contemporaneidade, o professor
costuma exercer essa função de técnico também, mesmo que tal função não conste
em seu contrato de trabalho. Possivelmente essa relação permeie o imaginário das
políticas públicas ligado a esse setor, forçando o professor a exercer funções que
não são de sua atribuição na nomenclatura: seria como um professor de Matemática
ter que fazer a manutenção de mesas, cadeiras e quadrosdegiz quebrados. Assim
como a manutenção de objetos quebrados de uma sala de aula não é uma função
atribuída aos professores regentes, fazer a manutenção de equipamentos do
laboratório de informática não é ou não deveria ser a função do professor de
Informática, até mesmo porque ele não dispõe de um horário específico para exercer
tal função nem tem uma formação específica para isso, visto que se especializou no
uso pedagógico do laboratório de informática e não na sua manutenção técnica.
Quando faz isso, como aconteceu com a professora de Informática da escola
pesquisada, tal fato se caracteriza como uma prestação de serviço gratuita.
Em seu quarto item, “assessorar o uso pedagógico das TIC nos outros espaços
pedagógicos da escola”, mencionamse os espaços educativos “bibliotecas, salas de
aula, secretaria”, remetendose, portanto, ao profissional “faztudo”, deixando em
aberto a possibilidade de exercer as funções de professor regente, secretário,
técnico, consultor e/ou assessor, atribuições para as quais não está concursado ou
contratado, com exceção da função de professor regente, pois não ocorreu a
menção, em concurso público, à atribuição de “mediador”, termo recorrente nos
discursos orais tanto da SEME quanto dos profissionais das escolas.
No quinto item, “auxiliar o aluno e demais pessoas”, a menção a “demais pessoas”
deixa em aberto o trabalho do professor de Informática para ser exercido também
com a comunidade e funcionários, ampliando ainda mais as suas atribuições.
54
No sexto item, então, é citado um conteúdo que oportuniza um embasamento para a
função de professor mediador de Informática: “orientar [...] de acordo com o
conteúdo das disciplinas e o objetivo das aulas”. Interpretase o termo “orientar”
como uma referência ao trabalho do professor de Informática de mediação com os
professores regentes e os conteúdos que estes estão lecionando, lecionaram ou
lecionarão.
No sétimo item, ao ser citado que o professor de Informática deverá incentivar
projetos colaborativos, são mencionados os “recursos variados”, aos quais o
professor de Informática deverá dar assistência: “TV, vídeo, livros, internet, visitas
monitoradas, visitas de estudo, entrevistas, etc”. Nesse item, o documento parece
perder cada vez mais seu foco, deixando as atribuições do professor de Informática
demasiadamente em aberto, por estar designado para abordar as mais diferentes
tecnologias e procedimentos de ensino.
O item oitavo oferece novamente embasamento para a atuação do professor como
mediador, citando o planejamento em conjunto com o professor regente e o
pedagogo. Já no item nono, atribuise uma função de “incentivador” de formações
continuadas no uso das TICs, e, no décimo item, que ele organize momentos de
planejamento com o CTA, visando à integração das diversas áreas de
conhecimento, ou seja, à interdisciplinaridade.
Após nove meses do recebimento do documento “Função do Professor de
Informática Educativa da Rede Municipal de Ensino de Vitória”, foi publicado o
Decreto Municipal n.º 13.615, no Diário Oficial de Vitória de 7 de dezembro de 2007,
com "a descrição das atribuições dos cargos do Plano de Cargos, Carreira e
Vencimento dos Funcionários do Município de Vitória". O Decreto define o professor
de Informática, primeiramente, como "PROFESSOR DE EDUCAÇÃO BÁSICA III –
PEB III" (classificação que é referente a todos os professores regentes). Vale
lembrar que a Educação Básica, de acordo com a Lei n.º 9.394/96 (LDB) engloba a
Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio. Nesse sentido, esse
profissional estaria habilitado para atuar nessas três instâncias. Esse Decreto
Municipal, portanto, gera uma ambigüidade, visto que diversos professores de
Informática não possuem habilitação para atuar na educação infantil ou no ensino
55
Em seguida, no item 2.1, o Decreto Municipal n.º 13.615/2007 apresenta as diversas
áreas de atuação para os professores (PROFESSOR DE EDUCAÇÃO BÁSICA III –
PEB III), e, na segunda área apresentada, denominada de "ENSINO
FUNDAMENTAL, NOS AMBIENTES QUE OFERTAM A INFORMÁTICA
EDUCATIVA", é exposta uma série de atribuições ao profissional professor de
Informática:
· Participar da avaliação das metas do projeto político pedagógico ao final
de cada ano letivo.
· Executar outras atividades que estejam relacionadas à sua área de
atuação, discutidas e indicadas no coletivo da Unidade de Ensino.
Essas (novas) atribuições ampliam ainda mais as atribuições para o profissional
professor de Informática. No primeiro item, por exemplo, o Decreto Municipal n.º
13.615/2007 afirma que o professor de Informática deverá “auxiliar o aluno e demais
pessoas interessadas a utilizar os computadores” (tal item repete o quinto item do
documento “Função do Professor de Informática Educativa da Rede Municipal de
Ensino de Vitória” recebido via email). Mas quem seriam essas “demais pessoas
interessadas”? Qualquer um que se apresente na escola como um interessado na
utilização dos recursos do laboratório de informática? Tal fato possivelmente
acarretará sobrecarga no uso e problemas de organização do laboratório de
informática, caso não haja foco no públicoalvo da escola. Como afirma o Decreto
Municipal, em seu item quatorze, o profissional professor de Informática deverá
“priorizar o atendimento ao aluno”. Esse primeiro item reafirma o item cinco do
documento “Função do Professor de Informática Educativa da Rede Municipal de
Ensino de Vitória”.
De maneira geral, o professor e o laboratório de informática atuam no reforço do
conteúdo das respectivas disciplinas da grade curricular da escola, seja como um
complemento e/ou extensão das atividades desenvolvidas em sala de aula seja
como um espaço educativo interdisciplinar para os professores regentes integrarem
os conteúdos das diferentes áreas de conhecimento em que atuam com as novas
tecnologias.
As práticas de incorporação e/ou recusas da informática nos ambientes
educacionais, sem dúvida nenhuma, provocam mudanças, e essas, por sua vez,
representam impactos dos mais variados tipos nas técnicas de atuação do
professor, nas atribuições oneradas à escola, nas idiossincrasias dos alunos e no
57
desenvolvimento ou não da sociedade. Questões como “qual é o papel da escola
diante dessa realidade?” e “qual é o perfil do profissional e cidadão que queremos
formar?” emergem nos mais variados momentos dos saberes e fazeres dos
educadores na escola e de diversos outros segmentos da população em geral.
Inferese, a partir do cotidiano observado, que o profissional e cidadão
contemporâneo é e será cada vez mais independente, mas simultaneamente inter
dependente, agirá mais ativamente e autonomamente. Ao mesmo tempo continuará
havendo um coletivo nos espaçostempos vividos no plano de imanência e também
no ciberespaço, que gerará feedback sobre suas ações: ele se comunicará de forma
mais abrangente, terá uma visão local e global numa perspectiva mais ampliada e
será cada vez mais autodidata.
Foram sistematizadas algumas das idéias recorrentes no cotidiano escolar do
laboratório de informática pesquisado. Nesse sentido, cartografouse a perspectiva
de que um indivíduo é um agente de sua aprendizagem caso, além de consumir
informações, ele se torne também um protagonista de sua aprendizagem; seja um
produtor de redes de conhecimentos e também alguém que assuma politicamente
58
suas relações de poder e de desejos numa inteligência coletiva que está sendo a
todo o momento tecida; tenha ainda as condições de se fazer passar por essa redes
colaborativas em um fluxo de transformação contínua de si e do mundo. Nesse
sentido, a educação é um processo inventado por protagonistas e não por
expectadores, numa forçaativa que permite os fluxos e caos, algo como um “big
bang” ativo; algo como um devirprodução intensivo. Nesses fluxos organizacionais
caóticos (in)surgem os simulacros, que são uma atualização do protagonismo dos
agentes educativos e aprendentes em possibilidadesoutras de formações de
enunciados e produções maquínicas de desejos envolvendo a razão e a produção
de subjetividade.
A escola recebeu uma doação de computadores dos Correios no ano de 2001, mas
demasiadamente desatualizados, usando, por exemplo, disquetes 5 ¼ polegadas.
Em 2002, o laboratório de informática foi atualizado, com a configuração que tem
hoje. Logo que começou a funcionar, foi interditado devido a mau cheiro. Após esse
incidente, a SEMEPMV enviava estagiários, pagandolhes duzentos e cinqüenta
reais, mas eles logo desistiam da função, quando lhes surgia uma melhor
oportunidade de trabalho e renda. Na época, a professora de Informática do turno
matutino era professora regente na escola e presenciou todo o processo de
instituição do laboratório de informática.
“A princípio, o primeiro problema foi a instalação elétrica pois teve que ser refeita,
visto que tudo (disjuntores) desarmavam freqüentemente. Aí, depois disso, o que
aconteceu foi a falta de gente para trabalhar no laboratório porque a rotatividade de
estagiários era grande demais. Essa escola teve sorte porque passou mais ou
menos um ano e meio com duas estagiarias muito boas, de manha e de tarde. Se eu
for pegar, por exemplo, o salário de nível superior hoje de estágio na Prefeitura deve
tá ganhando R$ 250,00. Se for pegar nível médio, que era o caso delas, R$ 150,00.
Então elas estavam ganhando, mais ou menos, nessa faixa de R$ 150. Uma delas
era exaluna da escola e a outra morava aqui no bairro, mas as duas eram muito
boas. Aí ficou bom, mas elas faziam assim: pegavam e ficavam aqui ou na
secretaria, mas no começo ficavam aqui. A direção ia vendo que não estava tendo
procura [utilização do laboratório pelos professores] então ai elas se deslocavam
para a secretaria para ajudar a digitar textos. Aí tínhamos [professores] que ir lá na
59
secretaria chamar as meninas [estagiárias] para ficar aqui no laboratório. Elas
faziam o papel delas, ligavam tudo e deixavam a sala [laboratório] funcionando. Para
gente era muito bom porque antes tínhamos que trazer a turma, ligar tudo e pedir
para os alunos esperarem para colocar a senha (Professora de Informática de 5.ª a
8.ª séries do Ensino Fundamental).”
No final do ano de 2005 (a professora de Informática havia transferido sua cadeira
de professora regente para o locus do laboratório de informática no ano de 2004) o
laboratório de informática não tinha mouse pad nem gravador de CD. Ela relatou que
também trabalhou na formação de professores no Núcleo de Processamento de
Dados (NTE) da SEME, atualmente chamado de GTE.
“Pesquisador: E você sabe assim... para você, qual é a função do professor de
Informática? Você sabe qual seria a função dele?
Coordenadora: Eu acredito que sim.
Pesquisador: Qual é?
Coordenadora: É trabalhar a matéria, né? Dentro da área de informática. Ele dá...
Ele ajuda o professor na sala de informática. Informática é mais um... É uma, uma
ferramenta... É um atrativo. É uma aula... como é que se diz... é uma linguagem. Ele
vai através da informática ensinar e aprender, vai aprendendo também através da
informática”.
A questão que perpassou esta pesquisa cartográfica foi a de como os papéis
(simulacros) desempenhados, recusados, assumidos e forjados pelos professores
no cotidiano escolar do laboratório de informática influenciam e permitem conceituar
o processo da tessitura das redes de conhecimentos. Dentro dessa problemática
geral, pretendese considerar como o ato dos professores de se apropriarem e,
simultaneamente, recusarem o uso das tecnologias está perpassando
freqüentemente a produção de subjetividades, produzindo processualmente um
currículo agenciado, e forjando fluxos de transformação contínua de si e do mundo.
61
3 O COTIDIANO ESCOLAR DO LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA
Ao iniciar um capítulo sobre o cotidiano escolar pesquisado, nesse caso o do
laboratório de informática, ressaltase que etimologicamente, no século VIII, havia a
forma cotidião, em português e que “cotidiano” vem do latim quotidianus , derivado
de quotidie (cada dia), de quotus, “quão numeroso” “porque conteria a idéia de que
viver um dia após o outro tende a ser angustiante. Essa idéia repercute em vários
níveis” (Revista Língua Portuguesa, 2006, p. 18, grifo do autor). Mas concebese
que, contemporaneamente, tal cotidiano incorporou outras lógicas (diferença,
multiplicidade, efemeridade, dinamismo, imprevisibilidade, conectividade, etc) que se
constituem como um momento e movimento de possibilidadesoutras de se
produzirem existências e/ou outros modos de vida: no caso do cotidiano pesquisado,
um processo de produção de vida socioeducativa com as tecnologias. Segundo
Guattari (1990, p. 45, grifo do autor)
Devemse manter as produções semióticas das mídias, da informática, da
telemática, da robótica etc. fora da subjetividade psicológica? Não concebo.
Do mesmo modo que as máquinas sociais podem ser colocadas sob a rubrica
geral dos Equipamentos Coletivos, as máquinas tecnológicas de informação e
de comunicação operam no coração da subjetividade humana, não somente
no seio de suas memórias, de sua inteligência, mas também de sua
sensibilidade, de seus afetos, de seus fantasmas inconscientes. A apreciação
destes componentes maquínicos de subjetivação levanos a insistir, em
nossa redefinição, sobre a heterogeneidade dos componentes que concorrem
para a produção de subjetividade. Estes comportam dimensões semióticas a
significantes, escapando às axiomáticas propriamente lingüísticas. Foi um
grave erro, da parte da corrente estruturalista, pretender restaurar tudo o que
concerne à psique sob o único cajado do significante lingüístico! As
transformações maquínicas da subjetividade nos obrigam a levar em conta,
antes que uma homogeneização universalizante e reducionista da
subjetividade, uma heterogênese desta. É assim que a “assistência por
computador” conduz à produção de imagens ou ainda à resolução de
problemas matemáticos que teriam sido, há alguns decênios, propriamente
inimagináveis. [...]. As evoluções tecnológicas, conjugadas a
experimentações sociais destes novos domínios, são talvez suscetíveis de
nos fazer sair do período opressivo atual e de nos fazer entrar em uma era
pósmídia, caracterizada por uma reapropriação e uma resingularização da
utilização das mídias. (Acessos aos bancos de dados, às videotecas,
interatividade entre os protagonistas etc.)
O cotidiano escolar do laboratório de informática na Rede Municipal de Ensino da
Prefeitura de Vitória é um espaçotempo cujo responsável principal (dimensão molar:
instituído pela SEME) é o professor de Informática. Esse profissional tem como
característica principal a formação em um curso de graduação em licenciatura plena
62
e mais o acréscimo de um curso de informática educativa (não é obrigatório que seja
lato sensu, mas que tenha, no mínino, oitenta horas). Ao professor de Informática
cabem muitas atribuições, prescritas em documentos, como já foi mencionado
anteriormente, mas, no cotidiano escolar, ele é chamado de “professor mediador”
pois realiza, em termos práticos, um processo de planejamento e de articulação
entre os conteúdos trabalhados pelos professores regentes em sala de aula e a
informática e/ou TICs. Ressaltase que, em termos de nomenclatura, nos concursos
públicos realizados pela prefeitura de Vitória, a citação sobre o cargo é apenas
“professor de Informática”, sem mencionar o termo “mediador” que enfatizaria a
perspectiva brasileira de uso da informática na educação escolar, como já foi
mencionado anteriormente. No caso do turno matutino da escola pesquisada,
compunham a formação da professora de Informática:
· graduação em um curso de licenciatura plena;
· pósgraduação lato sensu na mesma área/habilitação de seu curso de
licenciatura plena;
· pósgraduação lato sensu em NTICs e Educação;
· cursos livres de informática: Microsoft Office e Windows, Montagem e
Manutenção e Redes;
· cursos de Análise de Software Educacional, capacitação em Informática na
Educação (com duração de um ano) pela SEME/PMV e capacitação em
Softwares Pedagógicos;
A professora de Informática comentou que poderia ter feito mais cursos, mas que
preferia praticar primeiro o que aprendeu para somente então ingressar em um novo
curso. Além de lecionar na escola pesquisada, ela também atuava em uma escola
da rede particular de ensino de Vitória, na disciplina em que estava habilitada por
seu curso de graduação.
o fato de tais platôs estarem intrinsecamente interligados. Logo abaixo são
mencionados os oito platôs, inferidos a partir de Carvalho (2007).
1. os pressupostos e movimentos educativos e os objetivos social e político
inseridos nos saberes e práticas produzidas;
2. a seleção e organização dos conteúdos e do espaçotempo escolar;
3. os recursos materiais, financeiros e humanos;
4. a organização (a ordem e o caos) e os movimentos gerados nesses fluxos;
5. os relacionamentos interdependentes entre educadoresalunoscomputador
conteúdos e demais agentes educativos e aprendentes;
6. a diferença sociocultural como potência de invenção e criação de redes de
subjetividades e conhecimentos;
7. o trabalho coletivo;
8. as práticas políticosociais de ensino, pedagógica e educativa.
A seguir será abordado cada um dos platôs com suas respectivas problematizações
a partir dos dados produzidos na pesquisa.
Segundo a professora de Informática, não houve referência no primeiro Projeto
Político Pedagógico (PPP) ao laboratório de informática porque, na época (1998),
esse espaçotempo ainda estava em fase de implantação. Sendo assim, inferese, a
partir da pesquisa realizada, que o pressuposto básico do laboratório de informática
é o de uso em conjunto com as áreas de conhecimentos das respectivas disciplinas,
sendo o objetivo social e político o de melhorar o aprendizado dos alunos nos
conteúdos programáticos das disciplinas, interrelacionandoas com o domínio dos
recursos da informática.
Esse foi o caso de uma aula de Língua Portuguesa no laboratório de informática,
processo cujo acompanhamento será descrito, de forma resumida, nos próximos
parágrafos.
64
Na aula, os alunos estavam realizando uma atividade cuja proposta era escolher
uma história, um artigo e uma carta utilizandose de um livro digital contido no CD
ROM “Interpretando Textos”, criado pela empresa Positivo Informática. Nesse
sentido, o livro digital trazia os textos prontos e algumas questões que, em seguida,
deveriam ser respondidas.
Após inserir a resposta e clicar no link “verificar”, o aluno acertou a resposta, mas o
feedback que o programa deu consistia em um ícone no formato de “V”, na cor azul,
mas com um pequeno “x” na cor vermelha. Esse aluno perguntou ao outro: “Ué, está
‘meio’ certo?”. Daí ele escolheu a opção errada e clicou novamente em “verificar”.
Apareceu um enorme “X” vermelho. Na verdade, o “meio” certo consistia no fato de
que o aluno não havia respondido a todas as questões da atividade proposta pelo
software.
A criança que começa a manusear um livro por imitação, sem saber ler,
nunca se engana: ela o põe sempre de cabeça para baixo, como se o
estendesse a outrem, termo real de sua atividade, ao mesmo tempo em que
ela própria apreende o livro invertido como foco virtual de sua paixão, de sua
contemplação aprofundada (DELEUZE, 2006, p. 149).
Manusear um livro digital também é um processo de imitação e é nas inversões do
feedback do software que uma dada parte do conhecimento é tecida. Nesse sentido,
um processo educacional de intervenções contínuas é plenamente plausível nesse
contexto.
Uma das duplas de alunas, com o auxílio da professora de Língua Portuguesa, abriu
o editor de textos Microsoft Word e foi orientada a desenvolver um diálogo com base
em uma das histórias lidas (ANEXO E).
A professora de Língua Portuguesa escreveu a proposta de atividade no quadro de
acrílico: “1.º Escolher um texto para transformar em diálogo; 2.º Abrir o Word para
digitar o texto”.
Em seguida, a professora de Informática desenhou no quadro o procedimento para
abrir o software Microsoft Word no sistema operacional Microsoft Windows XP
Professional: “Menu Iniciar > Programas > Microsoft Office > Microsoft Word”. Ela
65
então explicou a todos: “não precisam ficar olhando o texto novamente para fazer o
diálogo: devem tentar se lembrar apenas de alguns elementos do texto lido”.
Um fato curioso foi que dois alunos não conheciam a palavra “estéril” [na forma
escrita], mas sabiam que seu significado estava relacionado a alguém que não podia
ter filhos [eles associam especificamente à figura da mulher]. Ao digitar, escreveram
“estria” e pediram ajuda à professora de Língua Portuguesa que se aproximou e
explicou aos alunos acerca da questão.
3.2 A SELEÇÃO E ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS E DO ESPAÇOTEMPO
ESCOLAR
Na Figura 3 foi apresentado um desenho de layout meramente ilustrativo da
organização física do laboratório de informática. Além do que foi ilustrado, houve a
necessidade de acrescentar mais algumas informações relevantes, que seguem nos
parágrafos a seguir.
Como os computadores do laboratório de informática pesquisado não estavam em
rede, cada computador, em tese, precisava de um CDROM para funcionar, gerando
situações em que os alunos às vezes se aglomeravam em um único computador
para visualizar os conteúdos, pois, em alguns casos, não havia CDROM para cada
um dos computadores. Outra alternativa muito utilizada pela professora de
Informática era copiar para cada um dos computadores o conteúdo do CDROM, às
vezes utilizandose também de um Pen Drive 26 contendo o conteúdo do CDROM, a
26
Memória USB Flash Drive, alguns modelos são chamados de Pen Drive. É um dispositivo de
armazenamento constituído por uma memória flash e um adaptador USB para interface com o
computador. Alguns modelos podem ter a capacidade de 128MB até 8GB de memória portátil e alta
66
fim de agilizar a tarefa e, freqüentemente, realizando o procedimento em dois
computadores ao mesmo tempo.
Ao abordar a professora de Informática sobre o uso de CDROMs, ela afirmou que
acredita que pelo menos metade deles foi utilizada em um ano de atividades
escolares. Segundo ela, não havia softwares livres instalados; havia apenas os
“free” (ela referiase aos freewares 27 ). Ela também me apresentou um CDROM
contendo uma grande quantidade de jogos em Adobe Flash 28 coletados em diversos
sites da internet e que às vezes eram utilizados nas aulas.
A professora de Informática afirmou que não queria que todos os sites fossem
bloqueados (ela referiase ao sistema Websense, conforme a Figura 4) e que
gostaria de ter liberdade para poder liberar ou bloquear sites, de acordo com o
contexto escolar ou nãoescolar que surgisse, pois o acesso a determinados sites
que são considerados impróprios para o objetivo de uma determinada aula podem
ser considerados adequados para outra. Ainda em relação à indisciplina, de maneira
velocidade na leitura e gravação de dados, 16MB/seg e 12MB/seg. Geralmente possui formato
compacto para facilitar o seu transporte.
27
Freeware é um programa de computador (software) franqueado ao público, ou seja, não é preciso
pagar para utilizálo. Geralmente são de código fechado e têm a comercialização proibida.
28
O Adobe Flash é um programa gráfico vetorial utilizado para se criarem animações interativas,
desenvolvido e comercializado pela empresa Adobe (empresa especializada em desenvolver
programas que auxiliam o processo de criação de páginas web e editoração gráfica). Os arquivos
executáveis gerados pelo Flash, chamados de "SWF" (Small Web File), podem ser visualizados em
uma página web usandose um navegador web, ou utilizandose o Adobe Flash Player.
67
geral o laboratório de informática não estava sendo um espaçotempo com
problemáticas de indisciplina dos alunos, como pode ser constatado na conversação
abaixo:
Já em relação ao laboratório, a professora de Informática acredita que ele não é
uma sala ambiente porque passou por reformas devido o maucheiro de pombos e
defeitos na parte elétrica, visto que a energia caía de repente. Apesar de ela negar o
laboratório de informática como uma sala ambiente, esse espaçotempo tinha todas
as características apontadas por Menezes e Santos (2002), pois era uma sala de
aula na qual se dispunha de recursos didáticopedagógicos que atendiam a um fim
educacional específico. Outra característica era a de fazer o aluno interagir com uma
maior diversidade de recursos e materiais pedagógicos ligados à tecnologia e ter
mais condições de estabelecer uma relação entre o conhecimento escolar, a sua
vida e o mundo social e do trabalho. Além disso, o conceito de sala ambiente
considera que o quadrodegiz não é único recurso válido no processo de ensino
aprendizagem na forma presencial. Ressaltase o fato de o laboratório de
informática não estar com uma boa aparência estética ou “design contemporâneo”:
não havia cartazes, quadros ou imagens, as paredes estavam com manchas da
última reforma e o quadro de avisos estava desatualizado. Nesse sentido, ainda
faltava um cuidado estéticoexpressivo com esse espaçotempo.
68
Ela informou que está aguardando uma nova reforma no laboratório (há somente um
arcondicionado funcionando) e uma pintura também, para somente então atualizar
o mural.
Em uma dada aula, a professora de Informática foi combinando o uso de um Pen
Drive e um CDROM para copiar as atividades para todos os vinte computadores
que estavam em funcionamento. Como não havia rede (intranet), ela precisou
deslocar se entre os computadores para copiar todas as atividades.
[Horário de Planejamento] A professora de Informática acrescentou que o laboratório
foi projetado para ser laboratório de informática mesmo. Segunda ela, “não foi uma
sala simplesmente ocupada”. Mas tal espaçotempo tem um “encalço” cuja função é
difícil de imaginar: “talvez para colocar o servidor em cima?”, especulou ela. Nos
desenhos de layout dos documentos do ProInfo não havia menção alguma a essa
estrutura.
Ela relatou que a escola da rede particular de ensino onde leciona lhe oferece muito
apoio: são ofertadas oportunidades de cursar pósgraduação, recursos
(emprestaramlhe um notebook 29 para um evento), financiaram a criação de um
29
Computador portátil que traz como principal característica a integração e miniaturização da maior
parte dos componentes de um computador de mesa (desktop), tornandoo mais leve geralmente.
69
banner, etc. O problema é que há “um capitalismo selvagem nas relações e
instabilidade no emprego”, afirmou ela.
As questões de segurança no laboratório de informática são apontadas como
positivas; o professor de Informática tem liberdade para disponibilizar a pasta de
trabalho dos alunos na aula certa. Nessa escola privada, ela é professora regente e
fez esse comentário sobre o trabalho do professor de Informática dessa instituição
particular de ensino.
“Pesquisador: Ééé... Você acha que os professores entendem o uso ou
especificidade do laboratório de informática? Você trabalha aqui há muitos anos, né?
Há quantos anos?
Coordenadora: Eu trabalho aqui nessa escola tem treze anos.
Pesquisador: E como você percebe a relação dos professores com a informática?
Eles costumam agendar o laboratório de informática com freqüência?
Coordenadora: Eles levam os alunos! Ela [a professora de Informática] tem a
agenda cheia!
Pesquisador: E você costuma fazer algum tipo de controle sobre esses
deslocamentos da sala de aula para o laboratório de informática?
Coordenadora: Eu controlo também, porque, vira e mexe, eu tenho que saber:
“cadê fulano?, tá na informática”, tenho que saber...”
Em um outro momento a professora de Informática tentou instalar o Google Earth
nos computadores que ainda não o têm. Ela disse que os alunos estão gostando
muito, mas que pretende deixar todos os computadores abertos com esse programa
antes de a turma da professora de Geografia chegar.
Ela afirmou que pretendia colocar todos os computadores em rede (intranet), em
uma semana em que estivesse mais livre no seu horário de aulas. Constatase que,
na verdade, essa é uma função técnica sendo desempenhada por um professor.
A professora de Informática ainda afirmou que ia conversar com a diretora da escola
sobre a adoção do GNU/Linux (software livre), mas ela gostaria que a implantação
ocorresse somente nas férias.
70
3.2.1 Currículo Virtual: A Expectativa sobre o Software Livre
Em relação à expectativa de chegada do software livre para os computadores do
laboratório de informática da escola, inferese que o currículo virtual aqui se faz
presente: ele é um momento de expectativa sobre algo que há de advir, que pode vir
a acontecer; ele referese tanto a uma expectativa nãoplanejada ligada a um
currículo prescrito que está prestes a se efetuar quanto a um currículo praticado que
está em vias de ser efetuado. O currículo virtual é um momento e movimento
subjetivo e virtual que perpassa os agentes educativos e/ou aprendentes como uma
dimensão de possibilidadesoutras de alguma coisa que está em vias de se
atualizar. Nesse sentido apresentase a expectativa da professora de Informática do
turno matutino sobre a possibilidade de implantação do software livre, generalizado
às vezes na menção ao sistema operacional GNU/Linux, mas que, na verdade, há
outros softwares livres incluídos para a implantação de tal sistema. Não se
considerou, portanto, que a possibilidade de inserção do software livre no laboratório
de informática fosse um currículo prescrito, pois não há nada efetivamente
apresentado à escola; não há nada efetuado em relação a tal proposta no cotidiano
escolar da escola pesquisada; também não é um currículo praticado, pois ainda não
está ocorrendo um uso prático desses artefatos culturais e tecnológicos no ensino; o
que há é um movimento sobre essa questão, que pode possibilitar ou impossibilitar
tal implantação e é isso que é denominado de currículo virtual.
O currículo virtual está no âmbito do “possível”. Não é o currículo prescrito, porque
não consegue ou não se deixa apresentar em um projeto de ensino, ou pedagógico,
que freqüentemente precisa utilizar verbos de ação no infinitivo. Ele está na
exclusão daquilo que não se encaixa ou não é permitido em um projeto. Ele é a
expectativa em movimento: algo como ‘eu “expecto” que...’ ou “eu ouvi dizer que...”;
Ele é o “desenvolvimento do aumento da alta autoestima” que freqüentemente é
excluído dos projetos escolares. Ele é o nãoalcançável em termos concretos ou em
termos daquilo que poderá efetivamente ser demonstrado ou provado ao final da
execução do projeto. Ele está, portanto, no duplo jogo de palavras (in)tenção e
(in)tentar: numa tentativa “in”, no sentido de uma subjetividade inclusiva (PINEL;
71
Assim, o currículo virtual é algo que está em vias de se atualizar em um currículo
prescrito, praticado, ou até mesmo em algo nãoinstitucional, algo como um
movimento molecular, mas ainda assim, com uma instância educativa ou
deseducativa (no sentido de desconstrução de saberes e fazeres).
Qual seria então a diferença entre o currículo virtual, o currículo prescrito, o currículo
praticado e o currículo agenciado? Inferese uma nãopossibilidade de fragmentação
dos múltiplos currículos, visto que são engendrados nas relações entre o virtual e
atual. Segundo Carvalho (2005, p. 96), “importa assim pensar o currículo escolar a
partir dos processos e produtos em circulação nas práticas discursivas engendradas
no trato da questão da diferença na prática escolar curricular”.
Talvez algumas pistas sobre os múltiplos currículos tenham sido lançadas ao acaso
ao longo da dissertação e muitas outras tenham sido negligenciadas ou
desconsideradas. Podese afirmar que o objetivo foi o de problematizar
(in)tensamente todos os acontecimentos e simulacros que eram produzidos
maquinicamente no cotidiano escolar do laboratório de informática e que se infere
possibilitaram um pensarproblematizador dos conceitos mencionados na questão
acima citada. Na perspectiva desse pensarproblematizador, e segundo Carvalho
(2005, p. 106), “o social e o psíquico produzemse e são produzidos continuamente
por meio das teias e redes de interações que estabelecem” e “envolvem
72
intensamente a dimensão autopoiética que deve expressar a autonomia do ser vivo
em se autoproduzir”.
Segundo a professora de Informática do turno matutino, há uma proposta da
SEME/PMV para a implantação de software livre no laboratório de informática da
escola, que até agora não chegou a ser efetivada. A professora de Informática dava
“graças à Deus” por ali não haver o software livre, porque ficou sabendo que em
“uma outra escola da rede, o laboratório saiu do Windows, foi para o Linux, e agora
está novamente retornando para o Windows por insatisfação da comunidade
escolar”.
Segundo a professora, ocorreu um curso de formação em software livre pela SEME,
mas de apenas uma semana, do qual ela não participou. Afirmou já ter procurado
um curso de GNU/Linux, mas que é muito caro e ela não têm condições de arcar
com os custos (o custo é equivalente a sessenta por cento de seu salário mensal). A
professora de Informática reclamava da falta de capacitação em GNU/Linux e dizia
que não havia grandes investimentos nesse sentido em formação continuada para
os professores de Informática nessa gestão.
A professora de Informática saiu do laboratório por alguns minutos e disse que havia
ligado para a SEME. Ficou sabendo que as escolas que já tinham GNU/Linux
receberiam uma atualização e, posteriormente, as escolas com Windows adotariam
o GNU/Linux como padrão (ANEXO A). A pesquisa foi realizada no início do ano
letivo de 2007 e o cronograma de implantação/instalação da distribuição
Debian/Linux chegou à escola apenas em dezembro, conforme a data do ANEXO A.
Ela comentou que pretendia conversar com a diretora para saber o que ela poderia
fazer para impedir a implantação do GNU/Linux. Temia que diversos projetos em
andamento talvez não tivessem prosseguimento devido a possível estranhamento
que os professores e os alunos teriam com o novo sistema, inclusive o Programa
Escola Aberta e seus monitores.
A professora de Informática, em outro dia, conversou com a diretora sobre o
GNU/Linux. Ela [a diretora] pretendia redigir um ofício, solicitando que a implantação
do GNU/Linux só ocorresse nas férias. A professora considerou que “a diretora não
73
aceitaria a entrada deles (dos técnicos) aqui, hoje, por exemplo, para implantar o
GNU/Linux, porque comprometeria os trabalhos, projetos e atividades em curso”.
Segundo a professora de Informática, a SEME não dá apoio pedagógico ao
laboratório de informática e considera que a forma que quer implantar o GNU/Linux
não é a correta. Segundo ela, “a SEME não estaria oportunizando para a escola
momentos de discussão e debate sobre a adoção do software livre, que está sendo
praticamente uma imposição”. Percebese que as idéias e características político
sociais que permeiam o software livre e suas vantagens em relação ao software
proprietário ainda não penetraram na cultura organizacional da escola. Essas
características, denominadas pela Free Software Foundation 30 (FSF) como
liberdades, dizem respeito à liberdade de executar o software, para qualquer
propósito; à liberdade de estudar como o software funciona e adaptálo para as suas
necessidades mediante o acesso gratuito ao códigofonte; à liberdade de redistribuir
cópias gratuitas dele; e à liberdade de aperfeiçoar o software e liberar esse
aperfeiçoamento, de modo que toda uma comunidade se beneficie dele. Mas
percebese, simultaneamente, uma “abertura” dos professores para entender e
problematizar a implantação e uso de tais softwares bem como de tomar
conhecimento das implicações deles decorrentes mediante processos de formação
continuada.
Segundo a professora de Informática, as propostas de utilização do laboratório estão
partindo das escolas: cada professor de Informática tem uma concepção e não há
uma proposta da SEME, algo como “diretrizes” em relação à questão, afirmou ela.
Tal fato foi problematizado, neste estudo, conforme a Figura 5.
Ainda segundo ela, “a SEME temse ausentado da promoção de discussões sobre a
especificidade do trabalho do professor de Informática (que é predefinido como
mediador) e suas atribuições. Ele acaba sendo um técnico, secretário e professor
[regente]”, e é assim permeado por populações (DELEUZE; PARNET, 1996, p. 40).
30
Organização sem fins lucrativos, fundada em 1985 por Richard Stallman e que se dedica à
eliminação de restrições sobre a cópia, redistribuição, entendimento e modificação de programas de
computadores – bandeiras do movimento do software livre, em essência.
74
[...] os inconvenientes do Autor são o de constituir um ponto de partida ou de
origem, o de formar um sujeito de enunciação do qual dependem todos os
enunciados produzidos, o de fazerse reconhecer e identificar numa ordem de
significações dominantes ou de poderes estabelecidos: <<Eu enquanto...>>
Muito diferentes são as funções criativas, usos não conformes do tipo rizoma
e já não árvore, que procedem por intersecções, cruzamentos de linhas,
pontos de encontro no meio: não há um sujeito, mas agenciamentos coletivos
de enunciação; não há especificidades, mas populações [...] (DELEUZE;
PARNET, 1996, p. 3940).
A professora de Informática acredita que também não há uma proposta
regulamentada e difundida sobre a implantação do software livre, sua manutenção
(atualizações periódicas planejadas para esse sistema) e nem cursos de
capacitação para os professores regentes e de informática no uso do sistema, o que
tem gerado “estranhamentos” em outras escolas que o adotaram.
Em outro momento, a professora de Informática apontou uma possível vantagem na
implantação do GNU/Linux, quando afirmou que, “em relação ao hardware, o
GNU/Linux, a princípio, não exige tanto da máquina”. Ela também reconheceu que o
uso do laboratório de informática já está “tomando corpo” (freqüência) e seu medo é
o de que o sistema operacional GNU/Linux desfaça isso.
Para a professora de Informática do turno vespertino “não adianta colocar o
GNU/Linux aqui sem dar capacitação”, ela não tem afinidade com tal sistema
operacional. Ocorreu uma capacitação, mas segundo ela “muito fraca”: curso de
“futucar” [ela referiase ao curso de uma semana, citado pela outra professora]. Mas
entendia que tudo que era feito no sistema operacional Windows, poderia ser feito
no GNU/Linux.
Ainda sobre o GNU/Linux, a professora de Informática pretende levar a questão para
os professores da escola; caso ocorra a implantação, ela afirma que pretende fazer
um debate com os demais professores regentes. Ela acredita que o GNU/Linux pode
permitir uma abertura maior à criatividade. Faltam oficinas sobre software livre, caso
a SEME queira efetivamente a implantação do GNU/Linux. Antes (2005), segundo
ela, havia textos a serem lidos e cursos sobre os softwares.
3.3 OS RECURSOS MATERIAIS, FINANCEIROS E HUMANOS
75
Segundo a professora de Informática a escola não arca com os recursos materiais,
humanos e financeiros do laboratório (por exemplo, com provedor de internet,
manutenção dos computadores, aquisição de softwares, pagamento de professores,
etc), mas há uma ressalva quanto a disponibilizar papel para a impressora, adquirir
CDROMs e disquetes, enfim, materiais de baixo custo. Constatouse que a própria
SEME é quem tem exercido a função de subsidiar os materiais de alto custo para o
laboratório.
O laboratório de informática dispõe de alguns CDROMs, enviados pela SEME no
ano 1998, na época da implantação do laboratório:
· Nossa Língua Portuguesa, com o professor Pasquale;
· Interpretando Textos, da Rede Particular Positivo de Ensino;
· Dicionário Luft – Português;
· Zoi Blocks;
· Eco XXI;
· Casa Maluca;
· Viagem Virtual;
· Tabuada;
· Descobrindo a Matemática.
Percebese, entre o acervo, poucos CDROMs e apenas alguns deles direcionados
às turmas de 1.ª à 4.ª do Ensino Fundamental. Todos os CDROMs foram
construídos para funcionar no sistema operacional proprietário Microsoft Windows e
estarão inutilizados quando o laboratório de informática migrar para a plataforma de
softwares livres (ANEXO A).
Houve um período em que a escola arcou com os custos mensais do provedor de
internet disponível para o laboratório de informática. Posteriormente, a PMV enviou
uma verba para pagar esse encargo. Atualmente, o link do provedor de internet, que
é muito lento para um total de vinte computadores em funcionamento, está sendo
disponibilizado pela empresa de telecomunicações Embratel via contrato com a
PMV, mas há uma tentativa politicamente em curso, de se retornar para o serviço do
76
provedor de internet Velox 31 , da empresa Oi Telemar 32 . Em seguida, PMV pretende,
junto com outros órgãos, fazer uma migração definitiva para a Rede Metropolitana
de Alta Velocidade de Vitória (Rede Metrovix) 33 (ANEXO D).
Um dos problemas de a internet ser lenta é o fato de o switch da biblioteca ser quem
distribui a internet para o laboratório de informática. Nesse próprio processo de
distribuição, em virtude da grande distância da biblioteca até o laboratório de
informática, a velocidade da internet diminuiria consideravelmente seu fluxo. A
professora de Informática não sabe qual é a velocidade da internet, mas acha que,
se mudar para o provedor Oi Velox será melhor. Durante a pesquisa, foi realizado
um teste, em alguns dos vinte computadores em funcionamento, para averiguar a
velocidade de conexão utilizandose o site Abeltrônica Telecom 34 .
Confira abaixo o resultado de uma das medições que constata efetivamente a baixa
velocidade da internet, visto que a velocidade de download e upload está distribuída
para cada um dos vinte computadores. A professora regente de Geografia afirmou,
em uma dada aula, que a internet era “banda lerda”. Tal discurso ocorreu em um
momento de insatisfação na utilização por seus alunos, do software Google Earth,
que demanda uma boa velocidade de internet.
Tabela 2 Velocidade da Internet na terçafeira, 20 de março de 2007.
DOWNLOAD UPLOAD
109,16 Kbps 41,68 Kbps
Fonte: Site da Abeltrônica Telecom. Disponível em:
<http://www.abeltronica.com/velocimetro/pt/?idioma=br&newlang=br>. Acesso em: 20 mar. 2007.
31
Provedor de internet banda larga que utiliza um modem de tecnologia Asymmetric Digital
Subscriber Line (ADSL), que permite, entre outras coisas, manter a Internet digital vinte e quatro
horas por dia e com a linha de telefone livre. O provedor Velox oferece atualmente conexões nas
velocidades de 256 kbps a 1 MB.
32
Companhia telefônica de celular e telefonia fixa, que oferece também serviços de internet banda
larga. Sua área de atuação concentrase nas regiões Sudeste, Nordeste e Norte.
33
A Rede Metropolitana de Alta Velocidade de Vitória (Rede Metrovix) foi lançada oficialmente no dia
27 de agosto de 2007. O projeto pretende interligar diversas instituições públicas por meio de uma
infraestrutura óptica, com comunicação em alta velocidade e em tempo real, com vistas a agilizar,
modernizar e permitir maior qualidade nos serviços prestados à população da cidade de Vitória. O
objetivo é estender a rede para toda a região metropolitana e, posteriormente, ao interior do Estado.
(INFORMA, 3 set. 2007, p. 1)
34
Disponível em: <http://www.abeltronica.com>. Acesso em: 20 mar. 2007.
77
Segundo a professora de Informática, “não tem ninguém da SEME para se
disponibilizar a vir ao laboratório de informática para ver a demanda pedagógica do
professor de Informática; as capacitações têmse restringido à troca de
experiências”. Ela “gostaria que tivesse um portal educacional, já que a PMV não
quer comprar mais softwares educacionais”.
A professora relatou que, em 2005, a Subsecretária de Educação da SEME
comentou sobre os altos custos de manutenção dos laboratórios de informática e
questionou sobre qual seria a função do professor de Informática (“o porquê do
professor mediador”), se poderiam colocar estagiários. Foi nesse contexto discursivo
que a professora de Informática reclamou da falta de capacitação em GNU/Linux e
afirmou que não havia investimentos, porque a SEME tinha uma visão do laboratório
como “custo” e não como “investimento”.
Certo dia, os técnicos da GTESEME estiveram no laboratório de informática: eram
três técnicos ou, aliás, estagiários estudantes de cursos relacionados à informática.
Eles não trouxeram os três drives de CDROM que haviam sido solicitados pela
professora de Informática com uma semana de antecedência.
A professora de Informática solicitou então que eles verificassem o computador que
não estava funcionando. De repente, ocorreu um pique de energia (o segundo do
dia) e nove computadores desligaram e reiniciaram. A professora de Informática me
entregou ao pesquisador uma cópia da chamada técnica (ANEXO F).
“Pesquisador: Você está com uma expectativa de que os funcionários responsáveis
pela manutenção técnica do laboratório de informática venham hoje? Qual é a sua
expectativa?
Professora: Ah! Pra você ter idéia, a minha expectativa tá tão grande que eu só
lembrei que eles viriam quando você me lembrou, assim... porque pelo que... do jeito
que a diretora falou, não sei se eles vão vir não... eu nem liguei porque realmente eu
não estou esperando não. Se eles vierem vai ser, vão ser muito bemvindos, né?
Mas, pelo que eu conheço, eu vou fazer assim, vou fazer de estar ligando e
perguntando [...] aí ela vai falar a mesma coisa [...] “se vocês quiserem vir eles vêm”,
78
[...] entendeu? Aí eu já vou pedir pra ver se eles vêm amanhã, vão ver se... se vai
ser... se vai ser... se eu vou ser atendida, né?”
Em outro dia, a professora de Informática ligou para o GTESEME (com seu celular
particular) para saber quando ocorreria uma visita técnica ao laboratório de
informática. Ela ficou sabendo que eles viriam, mas achava que eles não haviam se
planejado. Após uns dez minutos, chegou o secretário da escola e perguntou se ela
tinha ligado para o GTESEME. Ela disse que sim, e ele informou que eles ligaram
para avisar que só poderão vir à tarde por causa do computador que eles teriam que
trazer. No laboratório de informática do turno vespertino, ficou constatado que a
visita não ocorreu.
Inferese que os (des)encontros são processos produtivos recursivos. Eles podem
produzir tanto uma existência quanto uma literal desistência em relação à vida,
inclusive a vida escolar. Nesse sentido, fazse necessário avançar para além das
previsões e planejamentos e promover uma ética nos relacionamentos com o outro,
a fim de que possíveis trabalhos colaborativos ocorram e, ainda nessa perspectiva,
que os recursos disponíveis sejam mais bem utilizados.
A professora de Informática chegou e informou que teve problemas com a chave do
laboratório de informática em sua casa (não conseguiu encontrála), por isso pediu
79
que a coordenadora do Programa Escola Aberta, que é um membro da comunidade
externa e mora próximo à escola, trouxesse a chave que possui. A escola
pesquisada não tinha uma cópia da chave.
Depois que a coordenadora da “Escola Aberta” trouxe a chave, a professora de
Informática abriu o laboratório e devolveulhe a chave. Após um questionamento
sobre o fato de a escola não ter a chave, a professora disse “achar estranho”, e
julgou que seria porque “a escola não quer que os demais funcionários tenham
acesso ao laboratório de informática sem restrições”. Ficou constatado, não só pela
formação de enunciados da professora, mas também pelo que era agenciado no
cotidiano escolar, que nessa escola, o laboratório de informática somente é utilizado
caso haja o profissional “professor de Informática” disponível no horário escolar
regular (de segundafeira a sextafeira, das 7 às 18 horas). Mas, no caso do
Programa Escola Aberta, há uma exceção que rompe com esse paradigma, visto
que são oficineiros sem contrato de trabalho, sem carteira assinada e sem os pré
requisitos para lecionar na Educação Básica que lecionam nos finais de semana,
utilizando o espaço físico do laboratório de informática.
Em outro dia, a professora de Informática comentou que iria “tapar buraco” 35 : a
professora regente da 4.ª série fez uso de seu prêmio incentivo 36 e por isso faltou.
Ela tentou conversar com a professora regente na quartafeira para planejar a aula,
mas a professora recusouse por ser seu “dia livre” e disse que não queria se
preocupar com tal questão. Ela ainda sugeriu que passasse “qualquer coisa”.
Segundo a professora de Informática, ela propôs a mesma coisa à estagiária37
.
Nesse dia, a professora de Informática estava com três planejamentos programados
(as três primeiras aulas), mas, com a falta da professora regente, ela foi “encaixada”
no terceiro horário, reduzindo seu tempo de planejamento.
35
“Tapar buraco” é o termo utilizado pela professora de Informática para se referir ao fato de, quando
solicitada pela direção da escola, assumir a turma de alunos de professores que faltavam ao trabalho.
36
São cinco dias de folga anuais concedidos aos servidores que durante o ano de trabalho anterior
não faltaram sequer um dia.
37
Havia estagiárias na escola que atuavam com os professores regentes de 1.ª a 4.ª séries e também
uma que atuava com a professora de educação especial, trabalhando especialmente com um aluno
com deficiência mental.
80
“[...] a respeito dos conteúdos... eu estava trabalhando é... revolução tecnológica, a
primeira Revolução Industrial, a Segunda e a Terceira; então levei os alunos pra
fazerem pesquisa sobre os avanços tecnológicos, pegando esse objeto, mas o livro
sugeria vários, mas percebi que eles poderiam fazer outros, como, por exemplo,
pegar o aparelho de mp3 e ver quem o descobriu, em que época foi construído...,
ahah...,peraí, o aparelho de mp3..., [...] uma linha do tempo da vitrola até o mp3 e
talvez com..., já com lançamentos de mp4... mp10, até brinquei sobre isso. De fazer
uma linha do tempo com produtos. Então o objetivo era pesquisar um dia, realizar
essa pesquisa de um produto; noutro dia, uma pesquisa de outro produto, que era
para fechar ontem e fomos procurar as multinacionais que têm domínio sobre elas...
de algumas marcas mundialmente conhecidas. Então sugeri meios de transportes,
vestuário, itens de alimentação, higiene, limpeza; que eles procurassem ver a
história dos produtos qualquer que fosse e depois pesquisassem as multinacionais.
[...] Pra minha tristeza, a Internet estava lenta, alguns demoraram mais tempo pra
conseguir achar o endereço eletrônico... mas, com o tempo, conseguiram se
superar, inclusive lançando mão de acessos em outros ambientes que não era a
escola” (Professora de Geografia de 5.ª a 8.ª séries do Ensino Fundamental).
Em uma aula de Geografia no laboratório de informática surgiu uma organização
caótica devido, dentro outras coisas, à falta de planejamento tanto da professora
regente quanto da professora de Informática em relação à organização dos alunos
para o desenvolvimento da atividade. Segue abaixo um resumo de uma tentativa de
acompanhamento desse acontecimento.
Alunos organizamse em duplas. Percebem que cinco computadores não estão
funcionando. (Re)organizamse em trios. Muitos alunos não se sentam. A professora
de Geografia diz “olha o cronômetro aí e troquem de computadores” [o cronômetro
significa que quando um aluno terminar de jogar, deve passar a vez para o outro]. A
professora sai do laboratório de informática junto com alguns alunos para pegar
mais cadeiras.
Os acasos surgidos nesse contexto, provocados pela organização caótica no
cotidiano escolar, geraram momentos de insatisfação, insegurança e incerteza nas
relações que eram tecidas com a informáticainternetcontéudosprofessoralunos.
81
Concebese que a organização em rede pode se tornar, eventualmente, uma
organização caótica, com a produção de múltiplos acasos nãoeducacionais.
Poucos alunos iniciam a atividade. “Arrastam e soltam”, com o uso do mouse, os
ícones que correspondem aos Estados do Brasil, países da América do Sul e Mapa
múndi. Alguns alunos não conseguem jogar porque o mesmo tem que carregar via
Internet (que está lenta). Alguns alunos dizem que fizeram “x” pontos, vibrando.
Professora de Geografia diz “vamos lá, tentem de novo!”.
A professora de Geografia diz “observe como o colega faz para aprender”. O jogo
estimula que o aluno relacione o nome e o formato do Estado com a área
geográfica. Alunos terminam de montar os mapas, mas continuam clicando, não
tendo consciência de que o mapa já está pronto e, portanto, a atividade está
encerrada. Professora de Geografia diz “Está tudo errado! Nota: 0!”. Alunos
reclamam da internet lenta. Um deles pede para ir ao banheiro e a professora de
Geografia diz “banheiro depois do recreio, não!”.
Alunos trocam de lugar uns com os outros. Comentam que querem acessar o site
Fliperama (site de jogos online). Professora de Geografia pede que ergam o dedo
quem já jogou (a atividade): três jogaram o mapamúndi, oito o do Brasil e cinco o da
América do Sul. Quem já jogou todos os jogos, não podem acessar outros, porque
“tem que dar a vez ao colega”. A internet continua lenta, só exibindo uma tela branca
no navegador Microsoft Internet Explorer 6. A aluna da 7.ª série chega ao laboratório
de informática para dar uma notícia sobre a formação e eleição dos membros do
Conselho de Escola. Após a saída da aluna, e repentinamente, um aluno é
repreendido por acessar um site proibido (Paparazzo), que contém material erótico.
Ele é retirado do laboratório de informática e o destino dele foi a sala de aula
tradicional.
82
Os alunos demonstram cansaço com a atividade e os professores não alteram o que
foi planejado, pois não planejaram uma alternativa para a atividade programada. A
professora de Geografia pergunta novamente quantos alunos jogaram: dois
respondem que não jogaram. A professora de Informática autoriza os alunos que já
terminaram a acessar outros jogos. A professora de Geografia diz que podem. A
professora de Informática afirma que os jogos a serem acessados devem estar na
própria página do IBGE e não de terceiros. A professora de Geografia sugere o site
do IBGE para que os alunos acessem em casa. A aula termina. Após a saída de
todos os alunos, um aluno retornou ao laboratório de informática para anotar o site
do IBGE.
Em outra aula a mesma professora de Geografia retorna ao laboratório de
informática e diz que “a aula da 6.ª série foi uma droga”. Ela tenta fazer a chamada e
ao mesmo tempo tenta orientar os alunos sobre a formatação do trabalho. “O
trabalho será em forma de cartaz, na próxima aula”, enfatiza ela.
Os alunos acessam o site de pesquisa Google. Demonstram dificuldades em
escrever as palavraschaves na grafia correta e de forma objetiva em relação ao
trabalho proposto. Exemplo: Uma aluna quer pesquisar a história dos óculos e sua
evolução, mas digita apenas o termo “óculos”, que é muito genérico. Diferentemente
da 6.ª série, a 8.ª série pode ir ao banheiro mediante um crachá entregue pela
professora de Geografia.
A pesquisa é, de maneira geral, sobre a história de uma tecnologia ou mídia: a
escolha ficou sob a responsabilidade do aluno. Eles selecionaram temas como rádio,
novela, computador, moeda, indústrias multinacionais, óculos, telegrama, barbie,
etc. A professora de Geografia incentivava os alunos a pesquisarem algo de que
gostem e sugere os temas esporte, uniformes, etc. Os alunos então se organizaram
para pesquisar a história de um objeto e com o objetivo de apresentálo em forma de
painel. A internet estava novamente lenta. Os alunos aguardavam a abertura do site,
mas se sentiam estressados com a situação.
83
Havia freqüentemente uma sensação de “felicidade” associada às visitas ao
laboratório de informática por parte dos alunos, algo somente comparável ao
comparecimento às aulas de Educação Física. Quase não ocorriam “problemas”
disciplinares, devido o encantamento pelo uso da informática. Por outro lado, havia
momentos de censura do Websense, que podava excelentes ambientes disponíveis
na internet e que continham objetos de aprendizagem apropriados para
determinadas aulas.
3.4.1 As Funções Acumuladas do Professor de Informática
Inferese, a partir de todas as observações realizadas, das formações discursivas
dos agentes educativos e aprendentes bem como dos agenciamentos que ocorriam
no cotidiano escolar, que a professora de Informática acumulava quatro funções: a
de secretária, quando digitava eventualmente documentos no editor de textos 38
para a CTA e outros, e elaborava tabelas e planilhas em um editor de planilhas 39 ,
entre outros serviços, como envio de email e impressões para fins institucionais; a
de técnica, quando resolvia problemas que ocorriam tanto nas máquinas do
laboratório de informática quanto em outros computadores da escola, como o
computador da secretaria, da sala dos professores e da biblioteca; a de consultora,
quando era consultada sobre questões particulares de compra, venda e manutenção
de computadores pelos professores, alunos, funcionários e, eventualmente, pelos
membros da comunidade, sobre questões domésticas, sem relação com as
questões da escola; a de professora, em parceria com os outros professores,
atuando então tanto como um professor mediador, quanto como uma professora
de Informática, quando ficava eventualmente sozinha com os alunos no laboratório,
enquanto o professor regente se ausentava desse locus para fazer de seu horário de
trabalho, nesse espaçotempo, mais um momento de planejamento ou simplesmente
um “momento livre”. Ocorria ainda o fato de que, quando os professores regentes
faltavam, sem motivo ou com justa causa (atestado médico, prêmio incentivo, dia de
formação na SEME, etc.) ela era eventualmente convocada a assumir as turmas,
tornando se um híbrido de professor regente, de informática e mediador .
38
Era utilizado o software proprietário Microsoft Word.
39
Era utilizado o software proprietário Microsoft Excel.
84
Ao longo dos processos de produção do ensino e da aprendizagem na escola, ficou
constatado que o professor de Informática é requisitado, ocasionalmente, como um
digitador de recados/textos diversos para a pedagoga, isto é, quando tem
disponibilidade no sentido de não tem aulas a lecionar, mesmo estando em horário
de planejamento atuando, portanto, como um secretário escolar.
Há pedagogas que querem que a professora de Informática faça digitações, como é
o caso da pedagoga mencionada, mas a professora de Informática afirma que
recusa essa visão da escola. No passado, segundo ela, ocorreram muitos “usos” dos
estagiários nos laboratórios de informática, como “fazedores de tudo” – na cantina,
na secretaria, na biblioteca –, e os discursos que produziram esses “usos” estão
tendo incidências diretas no currículo praticado pelos professores de Informática.
De maneira geral, os professores regentes e os da CTA acreditam que, quando há
problemas nos computadores da escola, é o professor de Informática quem seria o
responsável por resolver tal questão. Nesse momento e perspectiva, ele então atua
como um técnico em informática.
85
Segundo a professora de Informática, os técnicos do GTESEME só visitam a escola
quando são solicitados e somente se for em dia de quintafeira. Ela não abre
máquinas porque pode trazerlhe problemas [processo administrativo], mas já abriu
para consertar. Contou ela que, certa vez, um CDROM explodiu dentro do drive de
CDROM e ela abriu o computador para consertálo.
Um dos computadores do laboratório de informática estava apitando e a professora
acreditava que fosse problema de memória RAM 41 , que “pode estar suja ou
estragada”. A professora de Informática abriu a máquina para limpar a memória e
testar. Passou uma borracha branca e soprou. Limpou o cooler 42 com álcool
(grosso). Ressaltase que “soprar” não é um procedimento tecnicamente correto,
40
Um componente existente em aplicações com interface gráfica, como nos pacotes Office, da
Microsoft . Esse componente consiste em um conjunto de botões dispostos em linhas ou colunas que
disponibilizam funções do programa de uma maneira rápida e prática, apenas pelo pressionamento
do botão esquerdo do mouse.
41
Memória RAM (Random Access Memory) é um tipo de memória de computador. É a memória de
trabalho, na qual são carregados todos os programas e dados usados pelo utilizador. Esta é uma
memória volátil, o que significa que será perdido o seu conteúdo uma vez que a máquina seja
desligada.
42
Cooler (refrigerador em inglês) na informática é o conjunto de dissipação térmica instalado sobre o
processador, que é responsável pela diminuição do calor.
86
pois produz a emissão de umidade advinda da saliva, além da dissipação da sujeira
para outros setores do equipamento.
Em outro momento, ocorreu o seguinte: a professora de Informática atendia um
aluno para orientálo sobre a compra de um computador ou sobre a manutenção de
hardware e software do computador dele. Em outro dia, um funcionário que atuava
na cozinha da escola pediu explicações sobre a compra ou não de um celular usado.
De forma atenciosa a professora de Informática recebeu a ambos em seu horário de
planejamento, atuando assim como um consultor de informática. Essa é, portanto,
mais uma função acumulada, pois esse horário deveria ser utilizado para o
planejamento de aulas (e não para consultoria), totalmente direcionadas aos alunos
matriculados (e não a funcionários).
a) Como professor regente ocorreu o seguinte processo.
O fato seguinte pode ilustrar esse papel: Havia professores regentes reunidos em
um Conselho de Classe 43 que demandava, segundo a pedagoga, a participação de
outro professor regente que estava em sala de aula. A pedagoga informou tal fato à
coordenadora, que percebeu que a professora de Informática estava em um horário
de planejamento. Sabia também que ela não tinha Diário de Classe 44 (os
professores, no cotidiano escolar, denominam tal documento de “pauta”). Ela dirigiu
se então à professora de Informática e apresentoulhe duas possibilidades: uma
primeira seria a de ela assumir a sala de aula do professor regente para que ele
participar da reunião; a segunda opção foi a de ela pegar com o professor regente o
Diário de Classe e fosse informando, à medida que fosse solicitada, as notas e faltas
dos alunos na respectiva disciplina. Não lhe foi dada uma terceira opção, que seria a
de ela simplesmente acompanhar todo o Conselho de Classe a fim de ficar sabendo,
43
É um órgão colegiado de natureza consultiva e deliberativa em assuntos didáticopedagógicos,
com o objetivo de avaliar a apropriação dos conteúdos curriculares pelos alunos bimestralmente e ao
final do ano letivo. Também é concebido, conceitualmente, como um espaço de reflexão pedagógica,
onde todos os sujeitos do processo educativo, de forma coletiva, discutem alternativas e propõem
ações educativas eficazes que possam vir a sanar necessidades apontadas no processo de ensino
aprendizagem.
44
Documento que permite aos professores regentes registrarem as avaliações, notas, descrições dos
conteúdos lecionados e freqüências de seus alunos.
87
b) Como professor de Informática
Para ilustrar: a professora de Informática utilizavase de um computador para simular
a criação de um email. A tela era de quinze polegadas e, apesar do esforço em
literalmente apontar com o dedo na tela, os alunos da 4.ª série não conseguiam
enxergar, com exceção dos que estavam sentados bem na frente – todos estavam
sentados no chão e o monitor estava em uma bancada. Ela continuou a sua aula,
sugerindo que o nome de usuário do email fosse “o primeiro nome do aluno”
adicionado à “abreviação do nome da escola” (sigla).
Antes de iniciar essa atividade, ela informou que aquele era “um projeto a ser
desenvolvido ao longo de todo o ano letivo”. Primeiramente eles criariam os emails;
depois o usariam para trocar mensagens entre si, em trabalhos extraclasses, por
exemplo, visto que, segundo a professora regente informou, muitos desses alunos já
têm computador em casa com acesso à internet. Após essa fase, os alunos
trocariam emails com alunos da rede (de outras escolas). Mas o que se constatou
efetivamente foi que, apesar da presença da professora regente no laboratório de
informática em todo o momento, quem única e efetivamente lecionava era a
professora de Informática; a professora regente não participava de forma integrada
orientando os alunos em relação aos respectivos conteúdos de Língua Portuguesa,
por exemplo, explicando a diferença entre a linguagem do computador (ele não
aceitava palavras com acentos e caracteres especiais em alguns campos do
cadastro) e a linguagem escrita tradicional da Língua Portuguesa em textos formais,
cujo suporte mais freqüente é o papel.
88
O professor de Informática não tem um conteúdo programático, livro didático e nem
Diários de Classe. Mas isso não incomodava a professora, pois ela possuía uma
listagem de alunos, caso precisasse realizar algum tipo de consulta, e os conteúdos
eram definidos junto com os professores regentes. Vale ressaltar que, no processo
supracitado, ocorreu uma distorção da função de professor mediador de Informática,
cujo trabalho do mesmo deveria ocorrer de forma colaborativa e com a presença
efetiva do professor regente.
Outro fato ilustrativo nesse sentido será citado abaixo.
Em uma primeira aula, cujo objetivo era realizar uma pesquisa de mapas e coleta de
dados para o projeto “As 10 maiores indústrias: produtos que vendem e história”, a
professora de Geografia, mediante um planejamento prévio com a professora de
Informática, decidiu conversar com os alunos primeiramente sobre o objetivo da aula
no laboratório de informática antes de conduzilos a tal espaçotempo. Já no
laboratório, os alunos acessaram, mediante a orientação da professora de
89
“ Coordenadora: Eles amam ir pra aula de informática, da mesma maneira que eles
amam ir pra aula de educação física, entendeu? Uma aula diferente... Não tem
problema... (Coordenadora de 5.ª a 8.ª séries do Ensino Fundamental)”.
Optouse, no caso desse platô, por enfatizar as produções de desejos e as
formações de enunciados especialmente dos agentes aprendentes (alunos). Foi a
partir de alguns Feeds para Diálogos Aproximativos (APÊNDICE A),
simultaneamente ocorrendo distanciamentos em relação a eles que os agentes
aprendentes foram incentivados a se expressarem, produzindo agenciamentos
maquínicos de desejo mediante formações de enunciados.
[...] agenciamento de desejo marca que o desejo jamais é uma determinação
“natural”, nem “espontânea”. [...] o desejo circula nesse agenciamento de
heterogêneos, nessa espécie de “simbiose”: o desejo unese a um
agenciamento determinado; há um cofuncionamento (DELEUZE, 1993, p.
17).
90
Em um dado momento da pesquisa de campo, ocorreu uma conversação com um
aluno de nove anos de idade, da terceira série, sobre quais as disciplinas e
professores que já o levaram para o laboratório de informática, sendo obtido o
seguinte feedback:
“Professores: Alba e Lilian.
Disciplinas: ficar quieto, fazer silêncio e prestar atenção no que a professora fala”.
A formação de enunciados do aluno, que foi propagada também de diferentes
maneiras nos discursos de seus colegas, expressa a predominância da aula
expositiva e as características disciplinares extremamente comuns na escola
moderna, como o controle das vozes dos alunos e a atenção focada no professor.
Mas, simultaneamente, é possível constatar que outras formas de produção
maquínica de desejos e formações de enunciados eram tecidas nesse ambiente, no
momento em que os alunos se relacionavam com um coletivo de tecnologias. Nesse
sentido, a multiplicidade forjada pela coletividade produzia outras formas de
existência diferentes daquelas que se poderiam supor devido aos resquícios de
disciplinamento modernos (ANEXO E).
Uma aluna de treze anos de idade, da 7.ª série, reclamou da realização das
pesquisas na internet, afirmando que “sempre eu ficava atrasada e não conseguia
terminar de fazer a pesquisa” e outra deseja, nesse sentido, que “a gente poderia
entrar no laboratório quando quiser para fazer pesquisas”. As formações de
91
enunciados dos alunos evidenciam uma contraposição ao tempo chronos escolar, de
horários delimitados, sendo assim um discurso de resistência aos modos
estabelecidos da educação escolar contemporânea.
Ocorreram muitas formações de enunciados sobre o laboratório de informática, por
parte de todos os alunos, das mais diferentes séries, os quais e panoramicamente
afirmavam: “O que há de ruim é a internet muita lenta”. Consideram “bom entrar na
internet para pesquisar algo ou para jogar”. A maioria dos alunos reclamou do
bloqueio no acesso aos sites de relacionamento Orkut 45 , ao programa de
mensagens instantâneas MSN 46 e ao site de compartilhamento de fotos Flogão 47 .
Duas alunas de doze anos de idade, da 6.ª série, expressaram o desejo de ver
instalados nos computadores os jogos The Sims 2 48 e GTA 49 . Já outro aluno da
mesma sexta série, mas com treze anos de idade, numa perspectiva similar a da
emissão discursa das duas alunas, produziu livremente um desenho de como seria a
organização ideal do laboratório de informática. Primeiramente ele produziu uma
formação de enunciados afirmando: “Eu não gosto de poucos computadores,
deveria ter, no mínimo, quarenta, desse jeito” e produziu um desenho numa folha:
45
Rede social com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter
relacionamentos, permitindo ainda a criação de comunidades virtuais temáticas.
46
MSN Messenger ou Windows Live Messenger é um programa de mensagens instantâneas que
permite que um usuário da Internet se relacione com outro que tenha o mesmo programa em tempo
real, podendo ter uma lista de amigos "virtuais" e acompanhar quando eles entram e saem da rede.
47
Site onde é possível facilmente pôr fotografias digitais na Internet, num formato de “diário”. Nele é
possível ver as mais recentes fotografias e navegar rapidamente, sendo possível ainda deixar
comentários em um “livro de visitas”.
48
Jogo de computador de simulação onde se pode criar e controlar as vidas de pessoas virtuais
(chamadas pelo sobrenome Sims). O jogo atraiu legiões de fãs, devido a sua simplicidade e
objetividade.
49
Grand Theft Auto (GTA) (Grand Theft Auto é o nome policial para "grande roubo de carros") é uma
série de jogos de computador e videogames que simula roubos de carros.
92
Figura 6 Desenho de uma possível organização do laboratório de informática produzido por um
aluno
É possível constatar a semelhança direta entre o desenho do aluno e a organização
dos computadores na maioria das lan houses 50 brasileiras: divisórias que produzem
um espaço individual e particular para o usuário e equipamentos multimídia, como
fone de ouvido com microfone embutido e webcam. A ludicidade e o uso individual e
livre dos computadores e da internet que é permitido nas lan houses fazemse
extremamente presentes no inconsciente maquínico do aluno, que deseja que o
espaçotempo do laboratório de informática incorpore tais características.
A diferença sociocultural na educação, como um processo de desprendimento de
representações ou mesmo de oposição às representações, constituise como uma
micropolítica no plano de imanência do cotidiano em geral e, no caso
especificamente do cotidiano escolar, é um ato de oposição àquilo que encarcera,
unificando e homogeneizando, e a favor daquilo que produz multiplicidade e
heterogeneidade, afirmando outras possibilidades de existência diferentes da
instituída ou da que tenta ser imposta como oficial e legítima. Essa micropolítica é
uma forma de resistência às sucessivas produções de subjetividades induzidas pelo
CMI, pelos aparelhos de Estado e diversas outras instituições, que freqüentemente
50
Estabelecimento comercial onde as pessoas podem pagar para utilizar um computador com acesso
à internet e a uma rede local, com o principal fim de jogar em rede.
93
intencionam colonizar a multiplicidade de um pensamento coletivo em movimento e
suas respectivas ações políticosociais.
O movimento do nadador não se assemelha ao movimento da onda; e,
precisamente, os movimentos do professor de natação, movimentos que
reproduzimos na areia, nada são em relação aos movimentos da onda,
movimentos que só aprendemos a prever quando os apreendemos
praticamente como signos. Eis por que é tão difícil dizer como alguém
aprende: há uma familiaridade prática, inata ou adquirida, com os signos, que
faz de toda educação alguma coisa amorosa, mas também mortal. Nada
aprendemos com aquele que nos diz: faça como eu. Nossos únicos mestres
são aqueles que nos dizem "faça comigo" e que, em vez de nos propor
gestos a serem reproduzidos, sabem emitir signos a serem desenvolvidos no
heterogêneo. Em outros termos, não há ideomotricidade, mas somente
sensóriomotricidade. Quando o corpo conjuga seus pontos relevantes com
os da onda, ele estabelece o princípio de uma repetição, que não é a do
Mesmo, mas que compreende o Outro, que compreende a diferença e que,
de uma onda e de um gesto a outro, transporta esta diferença pelo espaço
repetitivo assim constituído (DELEUZE, 2006, p. 48).
Nesse sentido, a diferença sociocultural na educação, como potência de invenção e
criação de redes pode ser forjada como uma tática para desestatizar o pensamento
representativo, articulando os diversos conhecimentos em produção com a arte e a
ciência e opondose ao status quo do senso comum. Nessa perspectiva, o
apreender “é constituir este espaço do encontro com signos, espaço em que os
pontos relevantes se retomam uns nos outros e em que a repetição se forma ao
mesmo tempo em que se disfarça” (DELEUZE, 2006, p. 48).
Inferese que a diferença ocorre em um processo de produção coletiva, cuja
afirmação de um movimento que “implica uma pluralidade de centros, uma
superposição de perspectivas, uma imbricação de pontos de vista, uma coexistência
de momentos que deformam essencialmente a representação” (DELEUZE, 2006, p.
93) é condição sine qua non. A diferença, segundo Deleuze (2006), é objeto de
afirmação e a própria afirmação é múltipla, sendo também criação e diferença em si
mesma.
Inferese assim, a partir de Deleuze (2006, p. 94), que é no movimento diferencial da
tessitura de redes colaborativas e de redes de conhecimentos que o fenômeno
fulgura, que se explica como signo; e que o movimento se produz como “efeito” e,
afirmativamente, como diferença.
94
3.7 O TRABALHO COLETIVO
Certo dia, o laboratório de informática não estava agendado para nenhum professor
regente, e a professora de Informática teve um “dia livre”, segundo ela, um “PL
forçado”. Ela disse não ter um “dia de PL” (dia de planejamento) específico: este
ocorre aleatoriamente.
Na PMV, no ano de 2007, todos os professores regentes da rede municipal de
ensino tinham um dia de planejamento específico, devido ao dia de formação
continuada que ocorria de forma integrada entre todos os professores de uma
mesma área de conhecimento ou disciplina. Para os professores de Informática
(professores mediadores), o dia de formação ocorria em dias aleatórios, o que
dificultava o estabelecimento de um dia de planejamento específico para esse
profissional. Mas, sem dúvida nenhuma, o maior fator dessa situação é a ausência
de um agendamento dos professores regentes em relação ao uso do laboratório de
informática. Segundo Tajra (2000, p. 42), existem dois tipos de modalidade de
aplicação da informática na educação quanto à utilização do ambiente de
informática: a sistematizada e a não sistematizada (que é a utilizada pelas escolas
da PMV). Quando a organização é sistematizada, os horários são definidos
previamente para os professores durante o planejamento de suas aulas, e o
coordenador designa o momento no ambiente de informática para cada professor
(por exemplo, o uso semanal ou quinzenal previamente definido pela coordenação).
Já a organização não sistematizada, utilizada no laboratório de informática
pesquisado, depende do interesse e necessidade do professor regente: o uso do
ambiente de informática é livre e o professor regente agenda seu horário de
utilização do ambiente conforme sua necessidade (ANEXO G).
Constatouse que o uso de CDROMs, mesmo os multimídia, tem esgotado
repentinamente em poucas aulas o seu uso tornandose, em pouco tempo,
cansativos para os alunos. A ênfase davase na produção maquínica de desejos e
formação de enunciados dos alunos e não nas mídias, no sentido de seu uso
meramente técnico ou de submissão as suas regras. A parceria entre a professora
de Informática e a professora de Artes foi destacada pela professora de Informática,
pois, segundo ela, as duas “participaram de forma colaborativa”.
Ela e a professora de Matemática tentaram criar um jornal, por iniciativa própria, mas
não conseguiram: o jornal virou um informativo sobre a Copa do Mundo de futebol
de campo e sobre a conversão de moedas. Também foi criado, em parceria com a
professora de Língua Portuguesa, um informativo político.
Ocorreram aulas sobre charges, em que os alunos deveriam escolher uma charge
na internet (formato estilo de jornal) e criar um texto sobre ela. Essa atividade foi
impressa, os trabalhos foram entregues à professora de Informática e, depois de
comentados, os alunos voltaram ao laboratório de informática para corrigir os textos
de acordo com a norma culta da Língua Portuguesa. Daí ocorreu a parceria com a
professora regentes dessa disciplina.
No início do ano letivo houve pouco uso do laboratório de informática, devido ao
carnaval, ao fim de férias, à entrada de professores regentes recémchegados e à
falta de planejamento, de maneira geral, dos professores regentes com a professora
de Informática.
da professora de Informática, os conteúdos programáticos automaticamente prontos
no computador e adaptados à sua disciplina e/ou expectativa de trabalho.
Há uma proposta (currículo virtual, como potência) de oferta de um curso sobre um
editor de planilhas 51 para a 8.ª série, em parceria com a professora de Matemática,
com duração de uma semana.
A professora de Informática falou sobre a aula seguinte, com alunos de 1.ª a 4.ª
séries. Segundo ela, “é mais vantajoso que os alunos fiquem uma hora, e sintam
vontade de ficar mais uma, do que virem e ficarem uma hora e meia [que é a
proposta da professora regente] e se saturarem”. Ela também informou que seria
usado um jogo de Tetris 52 , que vai somando conforme a indicação do problema e
clique do aluno; também um jogo de tabuada, produzido em um editor de slides 53 .
Certo dia, a professora de Informática realizou seu planejamento com uma
professora regente de 1.ª a 4.ª séries que gostaria de trabalhar atividades que
começassem do “nível básico” e tivessem um aumento gradativo no nível de
dificuldade. Nesse sentido, ela confirmou: “O que eu quero é que eles venham e
tudo dê certo”. A professora de Informática então apresentou a ela diversos jogos
educacionais 54 , que capturou da internet.
51
Microsoft Excel.
52
Jogo eletrônico muito popular cujo objetivo é encaixar tetraminós, que são peças de diversos
formatos que descem do topo de uma tela. Quando uma linha é completada, desaparece e dá pontos
extras ao jogador. O jogo termina quando as linhas incompletas se empilham até o topo da tela do
jogo.
53
Microsoft PowerPoint.
54
Produzidos com o software Adobe Flash.
97
Percebeuse, assim, que há um currículo virtual, como uma potência e
possibilidadesoutras de produção de subjetividades e invenções, no sentido de que
os professores regentes de 1.ª a 4.ª séries venham a estabelecer um vínculo
permanente com o espaçotempo do laboratório bem como uma parceria efetiva
com a professora de Informática.
A outra professora regente de Língua Portuguesa, dessa vez da 7.ª série, estava
trabalhando o conteúdo programático “análise sintática” e pediu sugestões à
professora de Informática, que propôs o uso de um CDROM. Explicou que o
interessante e mais importante era como o software mostrava a gramática. E propôs
o uso do datashow (projetor multimídia), a ser conseguido via SEME ou via
professora de Informática do turno vespertino que dispunha do projetor.
A professora regente sugeriu o site Bússola Escolar 55 . Ela tentou acessálo, mas
estava bloqueado pelo programa Websense da PMV. Em seguida, tentou outros,
que também estavam bloqueados. A professora de Informática também tentou
ajudála, mas não conseguiu. Criouse um malestar “no ar”: a impossibilidade de
acesso produziu frustrações e “ergueu barreiras” para o uso da informática na
educação escolar naquele momento. A professora regente queria integrar o
computador e a internet aos conteúdos programáticos de sua disciplina, mas achava
que, se a professora de Informática não lhe desse sugestões, ela não conseguiria.
55
O site possui diversos conteúdos das disciplinas escolares (Língua Portuguesa, Ciências,
Matemática, etc.) e também outros, agrupados de acordo com o tema (vestibular, músicas, artes
plásticas, mapas, etc).
98
Em outro dia, a professora de Informática atendeu a professora regente de 1.ª à 4.ª
séries. Já de antemão ela acreditava que as atividades propostas durariam menos
de uma hora; mas a professora regente acreditava o contrário: que as duas
atividades [tabuada e “Tetris de somar”] fariam com que a aula durasse mais de uma
hora. O dilema ficou então estabelecido.
Após alguns minutos, a professora de Informática dialogou com a professora regente
acerca das atividades. Ela explicou que, para reiniciar um jogo, era “é só dar ESC”
[apertar a tecla ESC no teclado], mas a professora regente não entendia a
linguagem utilizada e ficava paralisada. Em seguida, a professora de Informática
apertou a tecla para a professora. Este é um procedimento considerado incorreto e
gerado por uma ansiedade, pois é o usuário (no caso, a professora regente) quem
deveria manusear a máquina, mesmo cometendo erros, a fim de dominála.
A professora de Informática enfatizou que o jogo escolhido por ela apresentava
níveis de dificuldade. A professora regente encontrou um jogo em que era
literalmente reproduzida a tabuada na tela do computador e afirmou: “Ué?!, se for
para jogar isso aqui é melhor eles pegarem a tabuada e estudarem”.
A professora de Informática disse que a professora de Artes estaria no laboratório de
informática para trabalhar a noção de perspectiva e a Capela Sistina. Os temas
eram bem diferentes para serem trabalhados no mesmo dia. A professora de Artes
aceitou as propostas em um planejamento realizado por elas.
A professora de Informática orientava duas pessoas sobre os cartuchos de tinta
defeituosos da impressora multifuncional. A professora do turno matutino teve
problemas com o cartucho preto e a do vespertino, com o colorido, o que ocasionou
um desentendimento com uma professora regente no turno vespertino. Observase
que as tecnologias podem tanto aproximar, quanto afastar as pessoas; é preciso,
portanto, problematizar tais tecnologias tanto em relação às suas possibilidades,
quanto em relação às suas limitações a fim de superálas.
A professora de Ciências e Matemática de 1.ª a 4.ª séries recebeu um CDROM com
conteúdos de Matemática para conhecer em casa e se planejar, mas ela trabalhava
em dois horários (turnos) e lecionava em uma escola de outro município (Serra). Ela
afirmou que lá a Prefeitura ofertará um curso gratuito sobre um “Word moderno” e
que ela já havia feito sua inscrição. Ela saiu do laboratório sem conseguir falar com
a professora de Informática, que estava atendendo os responsáveis pela
manutenção e troca do cartucho de tinta da impressora. A professora de Ciências e
Matemática disse que iria trabalhar com a professora regente da 5.ª série para saber
o que ela estava planejando, a fim de que seus alunos chegassem capacitados para
acompanhar a série seguinte.
100
A nãoparceria: Em outro momento a professora de Informática planejou a aula que
ocorreria no laboratório de informática com a professora regente: selecionou jogos
em Adobe Flash coletados em sites e disponíveis em um CDROM; pesquisou sites
sobre o ecossistema da cidade de Vitória; tentou instalar o plugin Adobe Flash
Player. Nenhum professor regente acompanhou, nesse momento, o planejamento
da professora de Informática, nem a pedagoga, nem a coordenadora.
Outra experiência, dessa vez de trabalho que inicialmente foi bem colaborativo, mas
cuja finalização foi caótica, ocorreu com a professora de Informática e a regente ao
receber os alunos da 4.ª série para uma aula sobre criação e envio de emails
utilizando o serviço de webmail gratuito Yahoo! Mail.
Figura 7 “Nota de rodapé” na caixa de entrada e também ao visualizar qualquer email no serviço de
webmail Yahoo! Mail, no modo classic: “Nós coletamos informações pessoais nesta página”.
Fonte: Yahoo! Mail. Disponível em: <http://br.f311.mail.yahoo.com>. Acesso em: 22 jun. 2007.
Não ocorreu a problematização do fato de tal serviço online de webmail estar sob o
domínio de uma empresa norteamericana e nem as possíveis implicações da
entrega de dados pessoais, conforme a Figura 7, bem como os riscos que isso pode
representar ao usuário.
No início da aula, os alunos se sentaram diante dos computadores e foram
orientados pela professora de Informática a acessarem o site do Yahoo!, clicar no
link “email” e em seguida no link para cadastro. Ao abrir a tela para o
cadastramento, a professora sugeriu aos alunos que o nome de usuário do email
seja o primeiro nome dele e adicionando, ao final, a abreviação do nome da escola.
A professora de Informática explicou então passoapasso cada campo que deveria
ser preenchido e a possível mensagem automática do sistema sobre o já
cadastramento de um nome de usuário.
101
A professora regente acompanhou todo o processo, entrando em contato com os
alunos, mas antes disso prestando atenção nas explicações da professora de
Informática.
De maneira geral, os alunos entenderam bem a explicação da professora, com
exceção de alguns alunos que não compreenderam a função da “pergunta secreta”
e pararam nesse tópico do formulário de inscrição do email. As professoras então
atuaram juntas com freqüência, atendendo as solicitações de todos os vinte e um
alunos.
Alguns alunos estavam com dúvida em relação ao “código de ativação”: esse código
apresentava letras maiúsculas e minúsculas, além de números, sendo que alguns
alunos não demonstraram uma boa sensibilidade na diferenciação das letras e
números nesse código. Já outros poucos não sabiam habilitar no teclado as letras
maiúsculas e minúsculas.
Simultaneamente, alguns alunos ao clicarem no botão “enviar” do formulário
encontram a página 404 no Internet Explorer e a mensagem “página não
encontrada”: tal fato ocorreu devido à internet estar extremamente lenta.
Nesse contexto, alguns alunos não conseguiam criar o email. Em alguns casos o
nome de usuário já foi escolhido; em outros é o código de ativação que não é
preenchido corretamente. Em alguns casos os alunos criaram o email e bastaria
clicar no link “Meu Yahoo! Mail” para acessar a caixa de entrada do mesmo, mas
demandam uma orientação da professora de Informática.
Alguns alunos já criaram o email e têm que oportunizar a utilização do computador
ao colega, mas não sabem onde clicar para sair de sua conta e, com isso, poder
clicar novamente no botão “registrese” que está indisponível.
De repente a internet deixa de funcionar em dois computadores. Um aluno começou
a desenhar no Microsoft Paint, mas mantendo a página de email aberta. Já outro
aluno minimizou uma janela e não sabia como reabríla. Já uma aluna levantou de
sua cadeira e observou seus colegas transitando livremente durante algum tempo no
laboratório de informática.
Duas pessoas chegaram ao laboratório: um professor de História e uma
coordenadora de 1.ª à 4.ª séries, ambos com o objetivo de acessar e enviar emails .
Dois alunos se levantaram: um deu um tapa no rosto do outro e foram advertidos
pela professora regente, sendo que um pequeno grupo de alunos se aglutinou para
acompanhar o fato. Após esse momento a professora regente decidiu voltar com os
alunos para a sala de aula. Ela retornou com nove alunos, mas doze permaneceram
no laboratório de informática.
A professora de Informática disse para uma aluna, que está em pé diante dela, que
só atenderia quem está sentado. Nesse momento seu colega fechou sua página da
internet. Quando ela retornou se deu conta do que ele fez e decidiu prontamente se
ausentar do laboratório de informática.
De repente, um aluno fechou a página da internet sem anotar como ficou seu email.
Já o professor de História que entrou no laboratório de informática comentou à
professora de Informática que não conseguiu criar um email e se dirigiu a outro
computador.
professora de Informática as auxiliou nessa questão, orientandoas a clicar no botão
que enviaria as informações do cadastro para o provedor.
A professora de Informática descobriu, através do cadastro do último aluno que
permaneceu no laboratório de informática, que hoje era o aniversário dele e lhe deu
os parabéns. O email do aluno estava pronto, mas ao clicar em “enviar” surgiu a
mensagem de “página não encontrada”. Com o auxílio da professora ele retornou a
página anterior, mas as informações digitadas sumiram. Elas novamente foram
digitadas por ele e uma nova tentativa de enviálas ocorreu com sucesso. O aluno
então retornou satisfeito para a sala de aula.
Todos os conflitos que insurgiram durante a aula tinham relação direta com o fato de
a internet estar extremamente lenta. Nesse contexto, os alunos não conseguiam
produzir seu trabalho de acordo com o objetivo da aula, ficando freqüentemente
dispersos e acessando outros objetos que, digase, também produzem
aprendizagem, mas que não tinham relação direta com a aula proposta. Ocorriam
ainda pequenos casos de indisciplina que implicitamente obrigavam as professoras
a inventar formas de controle e disciplinamento dos alunos. Contudo, ocorreram
experiências de aprendizagem extremamente significativas ligadas tanto à produção
de conhecimentos quanto a formação ética do alunado e que, possivelmente,
marcaram positivamente a vida da maioria deles.
A convergência dos interesses dos professores regentes e dos alunos em realizar a
atividade proposta foi marcada por conflitos eminentemente técnicos cujas linhas de
fuga em busca de uma produção de subjetividade em favor da afirmação de uma
vida escolar com a apreensão das novas tecnologias eram forjadas pelas ações da
professora de Informática em conjunto com os demais agentes do meio. Na medida
em que ela era vista como uma especializada em apresentar aos alunos possíveis
territorializações dos usos das tecnologias, a mesma simultaneamente buscava
indicadores que permitissem a produção inventiva dos agentes aprendentes bem
como possibilidadesoutras de se trabalhar com os problemas emergentes.
Inferese que as práticas cotidianas escolares são capazes de produzir outro tipo de
currículo, aqui denominado de currículo agenciado, que se constitui como um
conceito que designa tãosomente possibilidades (DELEUZE, 2006, p. 202) e não se
apresenta como uma alternativa ao que é tecido no cotidiano, como o currículo
prescrito e praticado, mas como algo que é interdependente e uma intercessão em
relação a esses currículos e, enfim, como uma instância molecular inventiva que
emerge da molar. Posteriormente, ao tornarse multiplicidade (DELEUZE, 2006, p.
260), já não designa “uma combinação de múltiplo e de uno, mas, ao contrário, uma
organização própria do múltiplo como tal, que de modo algum tem necessidade da
unidade para formar um sistema”.
56
Segundo Zourabichvili (2004, p. 45), “distinguese uma desterritorialização relativa, que consiste
em se reterritorializar de outra forma, em mudar de território (ora, devir não é mudar, já que não há
término ou fim para o devir [...]; e uma desterritorialização absoluta, que equivale a viver sobre uma
linha abstrata ou de fuga (se devir não é mudar, em contrapartida toda mudança envolve um devir
que, apreendido como tal, nos subtrai à influência da reterritorialização [...])”.
57
“[...] devemos introduzir uma diferença entre duas noções, a conexão e a conjugação dos fluxos,
pois se a ‘conexão’ marca a maneira pela qual os fluxos descodificados e desterritorializados são
lançados uns pelos outros, precipitam sua fuga comum e adicionam ou aquecem seus quanta, a
“conjugação” desses mesmos fluxos indica sobretudo sua parada relativa, como um ponto de
acumulação que agora obstrui ou veda as linhas de fuga, opera uma reterritorialização geral, e faz
passar os fluxos sob o domínio de um deles, capaz de sobrecodificálos” (DELEUZE; GUATTARI,
1996, p. 100, grifo do autor).
106
aparentemente “a calma posse de uma regra de soluções” (DELEUZE, 2006, p.
236), mas que se tornavam um espaçotempo de agenciamentos 58 forjados pelos
educadores e pelas educadoras, entre outros agentes, no momento e movimento em
que o aprender convinha “aos atos subjetivos operados em face da objetividade do
problema (idéia)” (DELEUZE, 2006, p. 236).
Logo, foi forjado no cotidiano escolar do laboratório de informática uma rede de
colaboração, na qual se inventavam condições para a existência da instituição
escolar numa dimensão molar (GUATTARI, 2005), mas que, por sua vez e
simultaneamente, forjava processos de singularização (GUATTARI, 2005), em
momentos e movimentos efêmeros, numa dimensão molecular (GUATTARI, 2005).
Segundo Deleuze (2006, p. 239), “devemos considerar, como um oitavo postulado
58
Segundo um primeiro eixo, horizontal, um agenciamento comporta dois segmentos, um de
conteúdo, outro de expressão. De um lado, ele é agenciamento maquínico de corpos, de ações e de
paixões, mistura corpos reagindo uns sobre os outros; de outro, agenciamento coletivo de
enunciação, de atos e de enunciados, transformações incorpóreas atribuindose aos corpos. Mas,
segundo um eixo vertical orientado, o agenciamento tem ao mesmo tempo lados territoriais ou
reterritorializados, que o estabilizam, e pontas de desterritorialização que o impelem (DELEUZE, apud
ZOURABICHVILI, 2004, p. 20, grifo do autor).
107
na imagem dogmática, o postulado do saber, postulado que apenas recapitula, que
apenas recolhe todos os outros num resultado supostamente simples”.
Os processos de territorialização das relações de poder, no caso do currículo
agenciado, produzem territórios que, segundo Carvalho (2007, p. 10), podem
desterritorializarse, ou seja, abrirse em linhas de fuga e até sair de seu curso e se
destruir. Em seguida, um processo de reterritorialização às vezes (in)surgia, em uma
“tentativa de recomposição de um território engajado num processo
desterritorializante por parte do sistema, de grupos e de indivíduos”.
Entre as relações de forças que constituem o Poder e as relações de formas
que constituem o Saber, não teremos que dizer o que já dissemos quanto às
duas formas, aos dois elementos formais do saber? Entre o poder e o saber,
há diferença de natureza, heterogeneidade; mas há também pressuposição
recíproca e capturas mútuas e há, enfim, primado de um sobre o outro.
Primeiramente diferença de natureza, já que o poder não passa por formas,
apenas por forças. O Saber diz respeito a matérias formadas (substâncias) e
as funções formalizadas, repartidas segmento a segmento sob as duas
grandes condições formais, ver e falar, luz e linguagem: ele é, pois,
estratificado, arquivado, dotado de uma segmentaridade relativamente rígida.
O poder, ao contrário, é diagramático: mobiliza matérias e funções não
estratificadas, e procede através de uma segmentaridade bastante flexível.
Com efeito, ele não passa por formas, mas por pontos, pontos singulares que
marcam, a cada vez, a aplicação de uma força, a ação ou reação de uma
força em relação às outras, isto é, um afeto como “estado de poder sempre
local e instável” (DELEUZE, 2005, p. 81, grifo do autor).
Concebese ainda, tal como Guattari (2005, p. 58), que “para que esses processos
se efetivem, eles devem criar seus próprios modos de referência, suas próprias
cartografias, devem inventar sua práxis de modo a fazer brechas no sistema de
subjetividade dominante”. Nesse sentido, tudo está interligado: o aluno no professor
e viceversa; o professor e o aluno no computador e nos conteúdos e viceversa: É
como um Corpo sem Órgãos (CsO) (DELEUZE; GUATTARI, 1996) em que não se
fazem concebíveis apenas as partes (órgãos) ou o organismo (agrupamento dos
órgãos), mas o conjunto (corpo), como um elemento coletivo, múltiplo e plural, que
não é a soma das partes mas algo inteiramente novo, cuja diferença 59 é um fator de
potencialização da tessitura de redes de colaboração que, por sua vez, geram as
59
“Penso que existem múltiplos componentes de expressão que não passam pela linguagem tal
como é fabricada pela escola, pela universidade, pela mídia e por todas as formações de poder. A
expressão do corpo, a expressão da graça, o riso, a vontade de mudar o mundo, de circular, e
codificar as coisas de outro modo, são linguagens que não se reduzem a pulsões quantitativas,
globais. Constituem a diferença (GUATTARI, apud GUATTARI; ROLNIK 2005, p. 334).
108
redes de conhecimentos.
As Figuras 7 e 8 foram inspiradas em um esquema criado por Deleuze e Guattari
(1996, p. 91) para explicar a linha de devir. O objetivo aqui é o de apresentar o
contexto dinâmico (currículo prescrito e currículo praticado), cuja interação permitia a
emergência do currículo agenciado no cotidiano escolar pesquisado, que não era a
união de ambos, mas um terceiro incluído 60 que atravessava a relação entre eles e
entrava em uma dimensão de produção maquínica de subjetividade.
Figura 8 – O insurgimento do Currículo Agenciado
Nesse sentido, problematizase que nesse cotidiano são forjados fluxos de
transformação contínua das práticas educativas dos educadores, entendendose o
educativo como um acontecimento 61 . Ou seja, é uma dimensão de processualidade
da inventividade que atravessa um entrelugar situado entre a prática de ensino e a
prática pedagógica, que potencializava um currículo agenciado. Este por sua vez, é
algo que atravessa o que foi planejado pela instituição escolar (currículo prescrito) e
o que está sendo efetivamente realizado pela escola (currículo praticado). As
problematizações atuais e efêmeras que emergem nesse contexto ocorrem com
uma coletividade pensante e atuante de agentes educativos e aprendentes.
60
A lógica do terceiro incluído é nãocontraditória, no sentido de que o axioma da nãocontradição é
perfeitamente respeitado, com a condição de que as noções de ‘verdadeiro’ e ‘falso’ sejam alargadas,
de tal modo que as regras de implicação lógica digam respeito não mais a dois termos (A e nãoA),
mas a três termos (A, nãoA e T), coexistindo no mesmo momento do tempo (NICOLESCU, 1999).
61
“Quando o punhal entra na carne, quando o alimento ou o veneno se espalha pelo corpo, quando a
gota de vinho é vertida na água, há mistura de corpos; mas os enunciados ‘o punhal corta a carne’,
‘eu como’, ‘a água se torna vermelha’, exprimem transformações incorpóreas de natureza
completamente diferente (acontecimentos)” (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 26, grifo do autor).
109
Na Figura 8, é abordado e forjado um conceito do que se apresentava como
educativo, ou seja, uma dinâmica de saberes e fazeres sempre em devir, sempre em
vias de tornarse instituída. Mas há nele, bem como no plano de imanência que
subjaz a ele, linhas de fuga que o fazem escapar da lógica formal e estar em vias de
ser um movimento molecular e de se atualizar como molar: o educativo não nega a
existência das práticas de ensino e pedagógica (dimensão molar), mas as perpassa,
entrando em uma dimensão molecular que os educadores intencionam atualizar
molarmente, mas que lhes escapam a todo instante e, assim, permanece em um
constante estado de devir.
Figura 9 – O insurgimento do Educativo
O educativo é algo como um movimento: um devireducação e um deviraprender; é
um fluxo de espaçostempos educativos, significativos e asignificativos, que está
sempre em vias de tornarse, mas nunca se cristaliza; o educativo dá vazão a um
processo maquínico de educar o outro e a si próprio. O educativo (T) é o que
perpassa o ensino (A) e o pedagógico (nãoA): é algo como um terceiro incluído e,
às vezes, excluído pelo sistema mecanicista e positivista da escola moderna, com
seu tempo chrónos62
e áreas de conhecimentos fragmentadas (dimensão molar),
mas que, simultaneamente, cria condições para a emergência de práticas de desejo
moleculares, que se constituem como dispositivos de inclusão numa teia da vida
(dimensão molecular) com cunho educacional.
O educativo passa pela permissão ao desejo: um desejo de experimentar, sentir,
viver e transformar a vida – a vida políticoeconômica (as políticas públicas de
62
“Tempo do relógio; tempo medido, contado; referente ao deus do tempo: Chrónos; tempovalor
mercantil: time is money; o justintime (estoque zero, plena oferta e demanda) da Qualidade Total;
[...]” (ASSMANN, 2004, p. 213).
110
saúde, educação, transporte, entre outras) e a afirmação de outros modos de vida;
enfim, um conjunto; um coletivo de possibilidadesoutras de existência; enfim, uma
vida nãofascista (FOUCAULT, 1993).
Não se poderia falar de um viés político, sem se referir também à dimensão ética da
formação, tanto discente quanto docente, sobre a qual Deleuze (1997, p. 157),
inspirado em Spinoza, apresentaria três elementos:
a) Os Signos ou afectos , que podem ter vários sentidos, mas são sempre um
efeito. Um efeito é, primeiramente, o vestígio de um corpo sobre outro corpo.
Nesse sentido, caberia propor questões no âmbito educacional, em uma
perspectiva de como o calor de um espaçotempo educativo pode tanto
perpassar um coletivo de agentes educativos singulares quanto provocar
ardência, caso eles não percebam que um efeito sobre sua própria ação,
como prazer, dor, alegria e/ou tristeza, para os agentes aprendentes, implica
fluxos de transformação contínua de seus saberes e fazeres. O calor, assim,
podem ser signos contextualizados na sala de aula, que implicam a produção
de subjetividades. Ainda nessa perspectiva dos signos, segundo Deleuze
(1997, p. 163), “há alguma coisa que ao mesmo tempo prepara e duplica os
conceitos”, mas que também prepara e duplica os saberes instituíveis por
uma possível escola pósmoderna (aqueles reprimidos e marginalizados, por
não se enquadrarem na lógica cientificista moderna), mas que,
simultaneamente, criam condições para a emergência de uma aprendência
molecular.
b) As Noções ou conceitos enquanto como, segundo Deleuze (1997, p. 159),
111
oposição determinante aos signos. As noções comuns são conceitos de
objetos, e os objetos são causas. A luz, considerada aqui metaforicamente
como um coletivo de agentes educativos, tornaria os corpos transparentes, ao
revelarlhes a estrutura íntima da fábrica (escola moderna). Caberia também,
nessa perspectiva, incentivar problematizações acerca de como podem então
os educadores e educadoras agir em circunstâncias de noções e conceitos
plurais, forjando possibilidadesoutras de produzir uma outra educação, uma
outra escola, fugindo, inclusive, de um modelo representacional universal,
bem como insurgindose com processos maquínicos de produção de
subjetividades que se oponham ao CMI. Assim, segundo Deleuze (1997, p.
161), “os signos ou afectos são idéias inadequadas e paixões; as noções
comuns ou conceitos são idéias adequadas das quais decorrem verdadeiras
ações”. Conceitos são criações.
c) Não mais signos ou afectos, nem os conceitos, mas as essências ou
singularidades, os perceptos. “Não mais signos de sombra nem a luz como
cor, mas a luz em si mesma e por si mesma” (DELEUZE, 1997, p. 166).
Assim, as noções comuns (conceitos) que, para pensar o universo educativo,
serão referidas aqui como, simultaneamente, os saberes e fazeres dos
agentes educativos são revelados pela luz, entendida aqui como o trabalho
coletivo da escola cujas intensidade ocorre com a diferença como potência de
invenção e produção de singularidades, que atravessam os corpos
(metaforicamente, comunidade plural e compartilhada) e os tornam
transparentes (entendase aqui, metaforicamente, como aprendentes) para os
alunos e as alunas. Os saberes e práticas, encarnados nas noções comuns
(conceitos) devem remeter, pois, a figuras ou estruturas fabris (como,
metaforicamente, a escola moderna e o CMI), tanto mais vivas quanto
transformáveis e deformáveis forem em um espaçotempo de projeção de
redes de subjetividades compartilhadas e de redes de conhecimentos.
Uma lógica do signo, uma lógica do conceito, uma lógica da essência: a
Sombra, a Cor, a Luz. Cada uma das três Éticas coexiste com as demais e se
prolonga nas demais, apesar de suas diferenças de natureza. É um único e
mesmo mundo. Cada uma estende passarelas para transpor o vazio que as
separa (DELEUZE, 1997, p. 170).
112
Nos processos de tessitura das redes de conhecimentos e do currículo agenciado no
cotidiano escolar do laboratório de informática, percebeuse uma prétensão e uma
préintenção muito próximas das máquinas revolucionárias de Guattari (1988) que,
segundo ele, “mudarão o curso do mundo, não poderão ser efetivadas, e só tomarão
uma consistência fazendoas efetivamente agir, por uma dupla condição”:
1. Que elas tenham por objeto a destruição das relações de exploração
capitalista e o fim da divisão da sociedade em classes, em castas, em raças,
etc.
2. Que elas se estabeleçam, rompendo com todos os valores fundados sobre
uma certa micropolítica do músculo, do phallus, do poder territorializado, etc...
[...] inventar "máquinas", novas sensibilidades, novas inteligências da
existência, numa nova submissão (GUATTARI, 1988, 187191).
As três instâncias que possibilitam a produção de um currículo agenciado não
educativo, deseducativo ou educativo são, respectivamente, as questões de ordem
pedagógica, as problemáticas das práticas de ensino e até mesmo a compreensão
que se pode ter de uma instância educativa: algo como um devireducação, como
diria Gilles Deleuze.
Essas três instâncias, por sua vez, apresentam algo como que “subinstâncias”, que
foram citadas acima, articuladas como uma espécie de acoplamento ao currículo
agenciado.
4.1 O PEDAGÓGICO
As questões de ordem pedagógica estão interligadas ao planejamento e ao currículo
prescrito, tendo incidências diretas no ensino, portanto, no currículo praticado. Um
exemplo disso foi um plano de aula ou um projeto de ensino articulado entre o
professor de Informática e os professores regentes. Seguem abaixo três
subinstâncias inerentes ao pedagógico.
4.1.1 O Ato Pedagógico NãoEducativo
conteúdos, e que não surtiu nenhum efeito visível e experienciável no plano de
imanência da escola.
4.1.2 O Ato Pedagógico Deseducativo
4.1.3 O Ato Pedagógico Educativo
É a subinstância em que o pedagógico se articula totalmente com o ensino e os
respectivos conteúdos das disciplinas a fim de tecer efetivamente redes de
conhecimentos, intrinsecamente conectadas a técnicas e tecnologias e
considerando ainda os processos de produção de subjetividades nesse contexto.
4.2 O ENSINO
É a subinstância em que a prática e o saber estão interligados, constituindo então o
currículo praticado. Tal subinstância é interdependente da subinstância pedagógica.
Um exemplo dessa interconexão foi uma aula expositiva que antecedeu a ida dos
alunos ao laboratório de informática, visando a um planejamento das ações que
ocorreriam.
4.2.1 O Ensino NãoEducativo
4.2.2 O Ensino Deseducativo
114
4.2.3 O Ensino Educativo
O ensino educativo ocorre quando, por sua vez, o ensino se articula totalmente com
o pedagógico e as respectivas possibilidades de planejamento educacional, a fim de
construir efetivamente redes de conhecimentos intrinsecamente ligadas às técnicas
e tecnologias. Exemplo: A produção de uma apresentação de slides ou de um painel
cujo planejamento tenha um começo, meio e fim (ou não, caso se intente trabalhar
com hiperlinks, estando, portanto, sempre “entre”) em que se problematizem alguns
artefatos culturais de empresas multinacionais estrangeiras, tal como ocorreu nas
aulas de Geografia no laboratório de informática.
4.3 O EDUCATIVO
4.3.1 [Somente] O Educativo
É uma instância ligada a um fluxo de transformação contínua, ao que se é capaz
efetivamente de fazer, de ser e de nãoser; é uma dimensão subjetiva que pode ou
não atualizarse no plano de imanência, pois é capaz de existir apenas no
inconsciente maquínico (GUATTARI, 1988) dos agentes aprendentes e cognitivos,
não se apresentando de forma consciente como verdade legitimável. O educativo,
que é tãosomente capaz de ser educativo, fazse presente na dimensão virtual e
atualizada de um plano de imanência.
4.3.1.1 Dimensão Virtual
Uma dimensão virtual do educativo está no domínio da interconexão de redes de
conhecimentos não apreensíveis pela consciência humana ou, aliás, produzidos por
115
Não há objeto puramente atual. Todo atual rodeiase de uma névoa de
imagens virtuais. Essa névoa elevase de circuitos coexistentes mais ou
menos extensos, sobre os quais se distribuem e correm as imagens virtuais.
É assim que uma partícula atual emite e absorve virtuais mais ou menos
próximos, de diferentes ordens. Eles são ditos virtuais à medida que sua
emissão e absorção, sua criação e destruição acontecem num tempo menor
do que o mínimo de tempo contínuo pensável, e à medida que essa
brevidade os mantém, conseqüentemente, sob um princípio de incerteza ou
de indeterminação. Todo atual rodeiase de círculos sempre renovados de
virtualidades, cada um deles emitindo um outro, e todos rodeando e reagindo
sobre o atual [...] (DELEUZE, apud ALLIEZ, 1996, p. 49).
4.3.1.2 Dimensão Atualizada
Já a dimensão atualizada do educativo surge como uma interconexão que
acrescenta um virtual que era preexistente, ou se torna alvo dele. Nesse sentido,
toda a atualização demanda antes uma virtualização. Nesse processo do virtual para
o atual, não excluindo necessariamente os virtuais que continuam a permear o atual,
as redes de colaboração podem ser tecidas, produzindo então agentes coletivos
singulares como um mecanismo de criação (atualização) de possibilidadesoutras de
vida.
O atual é o complemento ou o produto, o objeto da atualização, mas esta não
tem por sujeito senão o virtual. A atualização pertence ao virtual. A
atualização do virtual é a singularidade, ao passo que o próprio atual é a
individualidade constituída. O atual cai para fora do plano como fruto, ao
passo que a atualização o reporta ao plano como àquilo que reconverte o
objeto em sujeito (DELEUZE, apud ALLIEZ, 1996, p. 51).
Na perspectiva de Deleuze (1996), a relação do atual com o virtual não é a que se
pode estabelecer entre dois atuais, pois “os atuais implicam indivíduos já
constituídos, e determinações por pontos ordinários; ao passo que a relação entre o
atual e o virtual forma uma individuação em ato ou uma singularização por pontos
relevantes a serem determinados em cada caso” (DELEUZE, apud ALLIEZ, 1996, p.
56). Assim, o ensino, o pedagógico, e, por fim, o educativo em suas duas dimensões
são fatores sine qua non para a transformação contínua dos agentes aprendentes
em possíveis cidadãos póscríticos (SANT’ANA, 2006): esses cidadãos podem ser
caracterizados como cosmopolitas, com redes de conhecimentos locais e totais, que
116
subvertem, insurgem, (trans)formam e (re)inventam a si e ao mundo continuamente;
elas atuam enquanto agentes potencialmente participativos, com condições
permanentes de exercerem o poder dentro de um meio ambiente sócio
historicamente determinado mas cujos os determinantes são produzidos
coletivamente mediante os agenciamentos que são forjados.
No educativo, a virtualização é um campo de desejos; já a atualização é o desejo em
ato. O educativo é a produção em fluxo das dimensões virtual e atual em um plano
de imanência com viés educacional. A intensidade dessa produção de uma dupla
dimensão é convergente com as formações de enunciados e forjamento de práticas
pedagógicas e de ensino dos professores. O educativo é tecido em rede e na rede,
produzindo múltiplos pontos e possibilidadesoutras de processos de produção de
subjetividades que se constituem enquanto agenciamentos em relação à instância
molar da educação escolar sistematizada e institucionalizada.
Realizarse e autoafirmar como um ser biopsicossocial no mundo é, portanto,
sempre um ato coletivo que não se torna inteiramente real sincronamente, ou seja,
nem no mesmo espaçotempo, nem na mesma materialidade, mas em um processo
de produção de multiplicidades de técnicas, tecnologias e subjetividades nas
dimensões virtual e atual, sendo a atualização a potência que produz intensamente
uma diferença de natureza entre as multiplicidades que fluem simultaneamente ou
não, mas que habitam uma dimensão de virtualização. O educativo, nessa
perspectiva, passa pela utilização dessas multiplicidades como dispositivos para a
afirmação de outros modos de vida, produzindo processos de produção de
subjetividades por uma outra forma de existência que, por sua vez, não se deixe
apreender por nenhum sistema (patriarcal, capitalista, étnico, religioso, de gênero,
etc) e afirmando a vida em um processo intensivo de simulacros.
As dimensões do virtual e atual coexistem e estão interligadas, pertencendo a uma
rede simbiótica que produz constantemente um ao outro, havendo uma
indiscernibilidade entre as duas dimensões que se intercambiam reciprocamente
produzindo o educativo. Esses fluxos de transformações contínuas constituem um
movimento nos quais imagens insurgem, técnicas são inventadas e tecnologias são
apreendidas, e, por fim, sentidos e significados fluem mediante as formações de
117
O cotidiano pesquisado teve como intensidade um fluxo de transformação contínua
dos professores que faziam uso das TICs, que se aproximavam a todo instante dos
princípios do rizoma de Deleuze e Guattari. Com base nas considerações desses
pensadores sobre os princípios do rizoma, problematizamse abaixo algumas
considerações sobre esse fluxo, que foi forjado como um dispositivo de aprender
com as problemáticas do cotidiano escolar do laboratório de informática pesquisado,
para o qual os princípios do rizoma confluíam, podendose considerálo um cotidiano
inventivo em uma produção intensiva de um currículo agenciado.
Nesse sentido, como uma primeira característica do rizoma de Deleuze e Guattari
(1996) problematizase a concepção de um processo de conectividade no fluxo de
transformação contínua dos professores, tendo como propriedade a possibilidade de
qualquer ponto de culminância das atividades pedagógicas, ou de ensinos
moleculares nãoescolares ou sem planejamento escolar poder ser ou estar
conectado a qualquer outra questão de cunho educacional intencional.
unidade; não eram sujeitos nem objetos ali presentes, mas, sim, múltiplos agentes
atuantes: educadores, alunos, artefatos culturais, técnicas e tecnologias, entre
outros; enfim, uma coletividade.
Ocorriam ainda processos de ruptura asignificante que eram produzidos num
fluxo de transformação contínua que não pressupunha nenhum processo de
significação universal nem de hierarquização. Apesar de ser estratificado por linhas,
sendo, portanto, territorializado e organizado, ele estava sempre sujeito às linhas de
fuga que apontavam para novas e insuspeitas direções educacionais escolares e
nãoescolares. O cotidiano escolar rizomático funcionava maquinicamente como um
mapa de uma paisagem em mutação e, nesse sentido, estava sempre em estado de
rascunho; era um devir; era uma cartografia a ser traçada sempre e novamente, a
cada instante.
Em um processo de cartografação , o fluxo de transformação contínua podia ser
mapeado, pesquisado, cartografado, e tal cartografia mostrava que ele tinha
entradas e saídas múltiplas, isto é, ele podia ser acessado de infinitos pontos em
seu território desterritorializante e desterritorializável, havendo também nele linhas
de fuga. Ele apresentava, porém como mapa, sempre regiões insuspeitas e
marginais, uma riqueza geográfica pautada numa lógica do devir, da exploração, da
descoberta de novas facetas e possibilidadesoutras de aprendizagem.
Já em uma decalcomania desse cotidiano escolar do laboratório de informática,
concebiase que os mapas nãocristalizados podiam ser copiados e reproduzidos;
colocar um mapa de planejamento pedagógico sobre os múltiplos simulacros de ser
sendo professor possibilitava aos educadores o (in)surgimento de novos territórios,
novas multiplicidades e possibilidades educativas. Isso fazia com que o cotidiano
escolar do laboratório de informática degenerasse, florescesse, se desmanchasse
e/ou proliferasse.
O avanço da informática possibilita a criação de mecanismos que apresentam
uma imagem gráfica dos saberes existentes em um determinado momento,
num grupo que deles se utiliza. Os sujeitos passam a investir em situações de
grupo, saindo do contato um a um (que marca as práticas escolares) e
partindo para uma rede de diálogos, como um rizoma, de forma que a
alteração em um dos seus pontos modifica todo o restante. Assim, esse
120
método de conhecimento não se baseia em hierarquias, mas em conexões.
(BARROS, 2000)
Quadro 1 – Algumas Diferenças entre o Processo de Formação Continuada e o
Fluxo de Transformação Contínua
PROCESSO DE FORMAÇÃO FLUXO DE TRANSFORMAÇÃO
CONTINUADA CONTÍNUA
Integrado a um sistema. Acoplado a um ou a vários
agenciamentos .
Segue uma modalidade de Educação Segue uma modalidade de Educação
Formal: obrigação de “presencialidades”, Aberta: não há obrigatoriedade de
seja no mundo real, ou seja no “presencialidades”, pois os encontros
ciberespaço, utilizando temáticas e/ou ocorrem de múltiplas formas, inclusive
conteúdos predefinidos. com artefatos culturais (um filme, uma
música, um site na internet, etc).
É Linear: é realizado como processo É nãolinear: é assumido como um fluxo
seqüencial e seqüenciado. contínuo e descontínuo de
experimentações.
É sistematizado. É assistemático (ocorre por
agenciamentos ).
Possui um centro e é centrado: possui É descentralizado e descentrado:
um centro no sentido de estar localizado descentralizado no sentido de não estar
em um dado lugar institucionalizado localizado em um lugar institucionalizado
(realizado por uma Secretaria de a ser visitado ou referendado e
Educação, por uma escola, por uma descentrado em relação aos conteúdos
universidade...) é centrado no sentido de e temáticas que podem “fugir” dos
delimitar os conteúdos e temáticas de documentos prescritos (a LDB, os PCNs,
acordo com os interesses dos o PPP, o PDE e outros).
documentos politicamente vigentes, tais
como a LDB, os PCNs, o PPP, o PDE e
outros.
É desconectado: segue freqüentemente É conectado: apresenta múltiplas
uma desconexão com as mudanças entradas, pois está diretamente ligado às
culturais contemporâneas da sociedade, demandas do cotidiano escolar e às
121
havendo a priori uma única entrada e mudanças culturais da sociedade, com
uma saída possível como objetivo do múltiplas possibilidades de saída como
processo de formação. fluxo de transformação contínua.
É focado nos saberes e fazeres para a É focado no aprender, no pensar, em
ação imediata entendida, como forma de conceitos e na teoria como forma de
mudar uma realidade utilizando transformação de si e do mundo,
freqüentemente técnicas tradicionais da utilizando, na contemporaneidade
escola moderna, como a aula expositiva, também e cada vez mais, as TICs e
seja de forma presencial, seja utilizando buscando possibilidadesoutras de
uma nova tecnologia como a aprendizagem para além do paradigma
vídeoconferência e ambientes virtuais de de se ensinar e aprender proposto pela
aprendizagem. escola moderna.
É direcionado: é um processo definido e É cartografado: é uma tentativa de
organizado previamente. acompanhar o fluxo gerado nos
relacionamentos socioeducativos
contemporâneos.
É uma construção processual: é a É uma ruptura asignificante: concebe a
reafirmação de significados e desterritorialização e a reterritorialização
significantes e de princípios e (descontrução) como uma forma de
pressupostos do sistema educacional aprender no cotidiano, cujo
vigente, com todo o seu viés comprometimento pode vir a ser político
freqüentemente políticopartidário. social.
Na maioria das vezes concebe Concebe afirmativamente o professor
intencionalmente o professor como um como um pesquisador e produtor em
receptáculo de informações e técnicas a potencial de saberes (agente cognitivo),
serem apreendidas para uso como alguém que sabe ou tem
educacional. condições de apreender procedimentos
de organização de conteúdos, de
produção de técnicas e tecnologias e
também de materiais com viés
educacional.
É préprogramada: o sistema [entendido Ocorre ondemand, ou seja, por
freqüentemente como sendo o Estado necessidade ou requisição, devido às
122
O fluxo de transformação contínua foi problemático e inventivo. Teve por base a
proposta de Kastrup (1999), como locus situacional de invenção de si e do mundo.
Tal concepção deve ser entendida como uma das interfaces nesse mesmo plano de
imanência do laboratório de informática da escola, no qual se apresentava tanto
numa dimensão molar bem como numa coexistência de uma dimensão molecular.
Os estudos da produção da subjetividade não querem mostrar que há
influência do meio ou, antes, de objetos sobre o sujeito. Tratase, aqui, ao
contrário, de uma operação muito mais radical, pois esse campo constitui
também os objetos, aí incluídos os objetos técnicos. Sujeito e objeto
emergem desse fundo, de uma rede de limites indefinidos, em constante
processo de transformação de si mesma (KASTRUP, 1999, p. 177).
Nesse sentido, esse ambiente influenciava na tessitura das redes de conhecimentos,
pois há “uma pluralidade de caminhos, na qual nenhum é privilegiado, nem
subordinado em relação a um outro. Existe uma reciprocidade entre nós e ligações
que se tornam feixes de relações, com a pressuposição da inexistência de um
percurso único e linear e de um centro de ordenação” (ALVES, 2004, p. 80), enfim e
metaforicamente, redes de conhecimentos ou conhecimentos rizomáticos.
O professor transformador, ou alguém que de um coletivo de professores deseje
exercer tal função, pode assumir alguns dos princípios da esquizoanálise
combinandoos com algumas considerações de Foucault (Acesso em 3 set. 2007),
que se refere ao livro “O AntiÉdipo”, de Deleuze e Guattari, como uma introdução a
uma vida nãofascista. Essa vida nãofascista, segundo Michel Foucault, seria uma
“arte de viver contrária a todas as formas de fascismo, quer sejam elas já instaladas
ou próximas de ser”, e “é acompanhada de certo número de princípios essenciais,
que eu resumiria da seguinte maneira”:
Liberem a ação política de toda forma de paranóia unitária e totalizante.
Façam crescer a ação, o pensamento e os desejos por proliferação,
justaposição e disjunção, e não por subdivisão e hierarquização piramidal.
Livremse das velhas categorias do Negativo (a lei, o limite, a castração, a
falta, a lacuna), que por tanto tempo o pensamento ocidental considerou
sagradas, enquanto forma de poder e modo de acesso à realidade. Prefiram
o que é positivo e múltiplo, a diferença à uniformidade, o fluxo às unidades,
124
Um fluxo de transformação contínua de professores só se faz possível numa lógica
do aprender (DELEUZE, 2006) que questione as formas e modelos de saber e fazer
modernos. É um processo de desconstrução de si e do mundo que são inventados
fascistamente pelo CMI; é um processo de reinvenção educacional, no caso de uma
instituição escolar, por uma reinvenção societal; é uma criação de formas de
resistência aos paradigmas do "como fazer" educação, de formas de resistência às
classificações que engessam o professor como um cárcere público; são formas de
125
É forjado aqui um conceito de fluxo, visto que a tessitura das redes de
conhecimentos podem ampliarse, expandirse, diluirse, territorializarse,
desterritorializarse e reterritorializarse a todo instante (e também desfazerse), num
deviraprender que não cessa sua potência de invenções de si e do mundo
contemporâneo.
Um exemplo desse currículo virtual, mas que parece demasiadamente explicitado, é
a possibilidade de algo que está em vias de chegar à escola efetivarse em um
currículo prescrito ou praticado, como é o caso do já mencionado software livre.
126
Considerando os conceitos de dinâmico, estático e movimentação, concebese que
é possível problematizar que o cotidiano é perpassado por um estado permanente
de contradições e fluxos (des)contínuos de movimentos estáticos e dinâmicos com
incidências diretas na inteligência coletiva.
Ora o caos é um imenso buraco negro, e nos esforçamos para fixar nele um
ponto frágil como centro. Ora organizamos em torno do ponto uma “pose”
(mais do que uma forma) calma e estável: o buraco negro tornouse um em
127
casa. Ora enxertamos uma escapada nessa pose, para fora do buraco negro.
Foi Paul Klee quem mostrou tão profundamente estes três aspectos e sua
ligação. Ele diz “ponto cinza”, e não buraco negro, por razões picturais. Mas,
justamente, o ponto cinza é antes o caos não dimensional, não localizável, a
força do caos, feixe enredado de linhas aberrantes. Depois o ponto “salta por
cima de si mesmo”, e irradia um espaço dimensional, com suas camadas
horizontais, seus cortes verticais, suas linhas costumeiras não escritas, toda
uma força interior terrestre (essa força aparece também, com um andamento
mais solto, na atmosfera ou na água). O ponto cinza (buraco negro) saltou
portanto de estado, e representa não mais o caos, mas a morada ou o em
casa (DELEUZE; GUATTARI, 2005, p. 117).
Com base na pesquisa realizada, podese afirmar que um fluxo de transformação
contínua, nesse contexto pósmoderno, problematiza o uso cada vez mais constante
e aperfeiçoado dos objetos com alto grau de tecnologia agregada, como, por
exemplo, o computador. Esse objeto que, a priori, foi desenvolvido para executar
cálculos, pode perpassar a aprendência (ASSMANN, 2004) dos agentes em
diferentes contextos socioculturais e cognitivos e também tem uma função intrínseca
de postergar as relações cotidianas.
A postergação de interrelações humanas pode ser provocada por artefatos culturais
como, por exemplo, o computador. Ele possui um hard disk (disco dígido), e aquilo
que deveria ser concluído de forma imediata na “era” da máquina de escrever agora
pode ser armazenado e manipulado a posteriori, bem como distribuído por mídias de
CDROM, DVDROM, Pen Drivers, disquetes, ou via internet, utilizando serviços de
email ou compartilhamento de arquivos, por exemplo. Muitas das relações sociais
que ocorrem via internet são assíncronas, isto é, o sujeito deixa uma mensagem
(texto, áudio, vídeo ou animação) em dado site e somente depois, quando outros
usuários tiverem disponibilidade de tempo, e caso desejarem, poderão acessar os
conteúdos criados por outros usuários e dar um feedback a eles e a tantos outros
que também terão acesso. Tal situação é uma evidência de que mesmo “objetos
virtuais” agem como postergadores das interrelações humanas tecidas no cotidiano
ciberespacial ou real.
Os meios são abertos no caos, que os ameaça de esgotamento ou de
intrusão. Mas o revide dos meios ao caos é o ritmo. O que há de comum ao
caos e ao ritmo é o entredois, entre dois meios, ritmocaos ou caosmo:
“Entre a noite e o dia, entre o que é construído e o que cresce naturalmente,
entre as mutações do inorgânico ao orgânico, da planta ao animal, do animal
à espécie humana, sem que esta série seja uma progressão...”. É nesse
entredois que o caos tornase ritmo, não necessariamente, mas tem uma
128
chance de tornarse ritmo. O caos não é o contrário do ritmo, é antes o meio
de todos os meios (DELEUZE; GUATTARI, 2005, p. 117, grifo do autor).
Com base em Siemens (2007), é possível inferir algumas tendências importantes em
relação à aprendizagem contemporânea, que tem e continuará tendo, com cada vez
mais intensidade, impactos nos fluxos de transformação contínua dos professores; é
possível afirmar que muitos aprendizes poderão moverse por uma variedade de
áreas diferentes, possivelmente sem relação uma com as outras, durante o curso de
suas vidas; a aprendizagem informal ou nãoescolar será um aspecto cada vez mais
significativo da experiência de aprendizagem; a aprendizagem será concebida como
um fluxo de transformação contínua, durando por toda a vida e ocorrendo em todos
os instantes; a tecnologia estará alterando (reestruturando) continuamente nossos
cérebros; a organização e o indivíduo serão ambos agentes que cada vez mais
aprenderão em conjunto; muitos dos processos anteriormente tratados pelas teorias
de aprendizagem (especialmente no processamento cognitivo de informações)
agora poderão ser “descarregados” para, ou suportados pela tecnologia; saber como
e saber o que estará sendo suplementado pelo saber onde (o conhecimento de onde
encontrar o conhecimento de que se necessita); o conhecimento será cada vez mais
tecido em rede e na rede (redes de conhecimentos).
· Aprendizagem e conhecimento apóiamse na diversidade de opiniões.
129
O campo da educação tem sido lento em reconhecer tanto o impacto das novas
ferramentas tecnológicas na aprendizagem como as mudanças socioambientais nas
quais tem significado aprender. Assim, para Siemens (2007), “o conectivismo
fornece uma percepção das habilidades e tarefas de aprendizagem necessárias
para os aprendizes florescerem na era digital” biopsicossocialmente na rede e em
rede.
130
6 PÓSESCRITO
Apesar da aparente desconexão que ocasionalmente a produção de acasos gerava
nas relações sócioeducativas durante o planejamento e/ou no uso do laboratório de
informática, inferese que é justamente nessas situações problemáticas que campos
de desejos inventivos eram forjados, advindos de uma síntese dos diversos pontos
de vista que se interrelacionavam.
Todo o agenciamento, segundo Kohan (2007, p. 54), tem quatro componentes, que
foram cartografados na pesquisa ao se problematizar o currículo agenciado. Esses
componentes são apresentados abaixo.
· Estado de coisas: a paisagem ou contexto das tecnologias presentes (e
ausentes) no cotidiano escolar do laboratório de informática, entre outros
artefatos culturais e humanos (professores, alunos, etc) e suas
conectividades, ora se cristalizavam, ora se apresentavam como devir
coletividades, em suas múltiplas movimentações como populações
(DELEUZE; PARNET, 1996), no currículo agenciado.
· Estilos de enunciação: (in)tentouse apresentar os modos de organização dos
signos que se compunham mediante os oito platôs inferidos a partir de
Carvalho (2007).
· Territórios: também se (in)tentou problematizar as especificidades dos
múltiplos territórios em mutação, em especial no capítulo “Breve Histórico das
Políticas de Informática na Educação no Brasil”, mas também em outros
múltiplos pontos dessa rede.
· Movimentos de desterritorialização e reterritorialização: inferiramse as saídas
através de linhas de fuga e reentradas em outros territórios mediante a
problematização dos fluxos de transformação contínua (capítulo 4) e das
redes de conhecimentos (capítulo 5).
Cartografouse na pesquisa o trabalho do professor de Informática como sendo um
mediador entre os objetivos dos professores regentes e os conteúdos programáticos
de suas respectivas disciplinas, interrelacionandoos à informática aplicada à
educação.
131
A função do professor de Informática varia de acordo com o País e, sem dúvida
nenhuma, também de acordo com um movimento histórico. O Estado brasileiro
adotou uma perspectiva de utilizar a informática na educação relacionandoa com as
áreas de conhecimento das respectivas disciplinas, a fim de melhorar o nível de
conhecimento dos alunos mediante a melhoria do currículo praticado pelos
professores. Portanto, a informática na educação no Brasil não se restringe somente
a um ensino técnico da informática; mas ressaltase o fato de que, ocasionalmente,
os professores mediadores de informática exerciam outras funções que, a priori, não
seriam da competência deles, já que se adota o termo “professor” para designálos;
ocasionalmente atuavam de forma similar a um secretário, técnico, consultor, além
de professor regente ou somente professor de Informática. Sua atribuição principal
seria atuar como um professor mediador, interrelacionando os conteúdos das áreas
de conhecimentos das diversas disciplinas com a informática, como já foi explicitado.
Tal fato, positiva ou negativamente, caracterizava a função do professor de
Informática muito mais como um produtor intensivo de populações em seu fazer
docente do que como um profissional restrito apenas as especificidades de suas
funções que, inferese, ainda estão em construção.
Inferese ainda que não é possível o saber ou o fazer docente, extremamente
relacionados a uma filosofia da representação 63 , estarem interligados à tessitura das
redes de conhecimentos, pois só é possível desencadear uma tessitura de
conhecimentos mediante um ato de aprender inventivo. Nesse sentido, um fluxo de
transformação contínua, e não um processo de formação continuada, só se faz
possível mediante a tessitura de interrelações de aprendência (ASSMANN, 2004)
com o cotidiano e também com o nãocotidiano da educação escolar, portanto, com
o nãoescolar, bem como com o nãosistematizado, com o nãodeterminado, com o
nãodefinido, com o nãoplanejado. Um fluxo de transformação contínua se faz
possível por outras vias e instâncias, como o ciberespaço e sua cibercultura, com
todas as suas permissões a múltiplas entradas e saídas; a nãolinearidade; os
acessos aos múltiplos nós da rede e ao uso intensivo de novas técnicas e
63
Platão, Aristóteles, Descartes, Hegel, [foram] os grandes representantes da imagem da Filosofia
como filosofia da representação, isto é, como aquela que reduz a diferença à identidade (MACHADO,
2006, p. 59).
132
tecnologias. É possível que tal fluxo de transformação contínua se desencadeie a
partir de um âmbito molar da instituição de ensino, mas, posteriormente, tal fluxo só
terá fluidez caso rompa profundamente com as amarras e com o conjunto de regras
políticoinstitucionais da modernidade. Um fluxo de transformação contínua só se faz
possível caso haja condições para formação de enunciações coletivas e processos
maquínicos de desejo, estando assim ligado a uma instância molecular e esquizo
analítica por uma vida nãofascista.
· Ensino: não é mais o ato de transferir conhecimento e informação em um
local destinado a esse fim (escola, oficina, etc.), mas um processo de
agenciamento entre as redes de conhecimentos que os alunos já teceram em
outros âmbitos, interligandoos com novas redes de conhecimentos que têm a
possibilidade de ser tecidos mediante as técnicas e tecnologias de que dispõe
o laboratório de informática e para além da escola, pois o ensino se faz
também pelos artefatos culturais.
· Aprendizagem: não é mais um processo necessariamente direcionado a um
ofício, mas um fluxo de transformação contínua que visa, além da formação
do aluno, voltado para o desenvolvimento de condições de empregabilidade,
a uma formação cidadã e de intervenção participativa e colaborativa na
133
sociedade, como um sistema em constante processo de (des)construção que
não lhe é exterior, mas produzido por agenciamentos .
· Currículo: não é mais como um caminho a percorrer, mas como uma
possibilidade de invenção de caminhos que, ao mesmo tempo em que são
criados pelos educadores e demais agentes educativos, influenciam na
transformação contínua de todos, ou seja, e metaforicamente, “o caminhante
faz o caminho e cria formas de andar, mas o caminho também cria o
caminhante e seus atos de produzir um caminhar”.
· Inclusão: não tem mais uma perspectiva integracionista, em que o aluno é
quem deveria adequarse à instituição, mas, sim, uma perspectiva de que a
escola e a sociedade precisam, junto com o aluno e sua família, se
adequarem mutuamente às especificidades de cada um, forjando redes de
conhecimentos com viés educativo, que suscitem desejos e prazeres numa
aprendizagem para a vida: trabalho, lazer e recreação, formação inicial,
continuada e transformação contínua.
· Avaliação: não se apresenta mais como verificação de competências e
instrumento punitivo, mas como algo que é processual, formativo e
transformativo, e que permite inferir, no acompanhamento do processo por
parte dos agentes cognitivos, algumas possibilidadesoutras de se avançar
rumo a um conhecimento mais especializado.
· Gestão: não é mais entendida como alguém que desempenha e concentra
toda a gerência de uma instituição de ensino por delegação políticopartidária,
mas como um processo de engajamento político participativo e colaborativo,
intentando a construção de um estado de democracia pautada por valores
políticosociais, no qual cada um tem a sua responsabilidade sobre o que ali
ocorre ou que pode vir a ocorrer, sendo coresponsáveis pela invenção de si
e do mundo (KASTRUP, 1999).
Inferese que há atualmente uma tendência ao edutainment, que é um
estrangeirismo híbrido de entertainment e education, ou seja, educar e educarse
deverá e estará cada vez mais aliando uma sistemática de educação com uma
flexibilidade de entretenimento com as tecnologias. Buscase com isso instaurar uma
seqüência de aprendizagem, vivência, experimentações e, por fim, mas
simultaneamente, produção de conteúdos, técnicas e tecnologias avançadas. Assim,
134
Mas, simultaneamente, as propostas educacionais ligadas às novas tecnologias e,
em especial, no contexto contemporâneo ao conceito de Web 2.0 apresentam
alguns riscos, que é o fato de tais novas tecnologias estarem sendo produzidas e
conduzidas por empresas estrangeiras, principalmente norteamericanas. Nesse
sentido, fazse necessário problematizar as implicações da entrega de dados
pessoais que estão ocorrendo diariamente para essas empresas e os riscos que
isso comporta tanto em termos individuais quanto em termos coletivos. Nesse
contexto, insurgem questões tais como: há algum compromisso dessas empresas
em guardar permanentemente esses dados, que é uma verdadeira produção cultural
brasileira, ou elas podem apagálas quando bem quiserem? Não seria o momento
de o Brasil pensar em soluções próprias de novas tecnologias para internet,
inclusive considerando o uso e incentivo ao software livre, visto que essas novas
tecnologias ligadas ao conceito de Web 2.0 são, em sua maioria, proprietárias?
Nesse sentido há um otimismo em relação às novas tecnologias que deveria
simultaneamente estar ligado a uma tentativa de problematização de seu uso nas
escolas. Como usálas? Mas, também, como resistir a elas? Resistência no sentido
de problematização, questionamento, discussão, engajamento políticosocial de toda
a sociedade, inclusive a escola e seus profissionais, pensando uma sociedade
culturalmente e educacionalmente independente em termos de tecnologia de
software também na internet.
Com a implantação da rede de internet em alta velocidade, denominada Rede
Metropolitana de Alta Velocidade de Vitória (Rede Metrovix), já estão ocorrendo
discursos quase que subliminares nas formações de área 64 , que questionam o termo
“professor de Informática”, apresentando um entendimento de que ele poderá ser
em um futuro muito próximo, além de um mediador entre os conhecimentos das
64
Encontro dos profissionais da educação (professores, pedagogos e coordenadores) por área de
conhecimento promovido pela Secretaria de Educação da Prefeitura Municipal de Vitória (SEME
PMV) visando estabelecer um processo de formação continuada em temáticas especificamente
definidas pela instituição.
135
Figura 10 – Uma questão: Será que se os professores conhecessem um serviço gratuito e
desbloqueado, tal como o Proxify (disponível em: <http://www.proxify.com>. Acesso em: 22 jun.
2007), que lhes permitisse acessar anonimamente sites bloqueados pelo sistema Websense, eles o
acessariam?
136
Uma educação menor é um ato de revolta e de resistência. Revolta contra os
fluxos instituídos, resistência as políticas impostas; sala de aula como
trincheira, como toca do rato, o buraco do cão. Sala de aula como espaço a
partir do qual traçamos nossas estratégias, estabelecemos nossa militância,
produzindo um presente e um futuro aquém ou para além de qualquer política
educacional. Uma educação menor é um ato de singularização e de
militância.
Se a educação maior é produzida na macropolítica, nos gabinetes e expressa
nos documentos, a educação menor está no âmbito da micropolítica, na sala
de aula, expressa nas ações cotidianas de cada um. Retomando a metáfora,
o professorprofeta é o legislador, que enxerga um mundo novo e constrói
leis, planos de diretrizes, para fazêlo acontecer, o professor militante, por sua
vez, está na sala de aula, agindo nas microrelações cotidianas, construindo
um mundo dentro do mundo, cavando trincheiras de desejo (GALLO, 2003, p.
78).
137
Por fim, inferese que a perspectiva de currículo, denominada no âmbito desta
pesquisa cartográfica de currículo agenciado, pode ser interrelacionada e acoplada
com as perspectivas de currículo como máquina desejante (KROEF, 2001, p. 4) visto
que “a configuração de um currículo remete à concepção de máquina. O termo
máquina envolve uma noção de arranjamento de multiplicidades”; e também com a
concepção de currículomapa (PARAÍSO, 2003, p. 8), porque “interroga sobre o
lugar do currículo numa paisagem pósmoderna, tendo em vista os novos mapas
culturais traçados pela emergência de uma multiplicidade de atores sociais e por um
ambiente tecnicamente modificado”.
Inferese que não é possível tecer redes de conhecimentos sem uma articulação
direta ou indireta com os processos de produção de subjetividades, que podem, por
sua vez, também constituirse em uma rede: no caso desta pesquisa, evidenciouse
uma produção maquínica de desejos em uma rede de colaboração entre os
educadores em suas práticas educativas.
Concebendo que um processo de formação continuada, entendida da forma
tradicional, só pode ocorrer considerandose os conhecimentos interligados
diretamente a saberes e práticas instituíveis, inferiuse outra processualidade em
curso no cotidiano escolar, no qual um fluxo de transformação contínua era forjado e
o conhecimento era tecido em rizoma (DELEUZE; GUATTARI, 1996); ele era
rizomático, podendo ser agenciado e, portanto, articulado com redes de colaboração
interligadas, de alguma forma, à atualização de um saber ou fazer instituível
virtualizado, mas que permanece numa intercessão entre isso e os movimentos
moleculares. Ressaltese que ainda há o fato de que o fluxo de transformação
contínua pode não ter relação alguma com um plano de imanência com viés
educacional e de formações direcionadas a um determinado fim, interessando
apenas produzir afectos e perceptos com os artefatos culturais e tecnológicos da
contemporânea sociedade pósmoderna.
aprendizagem em seu cotidiano escolar de atuação (laboratório de informática) que
é extremamente dinâmico devido às novas tecnologias que surgem e também
insurgem: esse campo educacional, portanto, demandaria um processo de pesquisa
e problematização intensiva sobre a formação inicial e continuada desses
profissionais.
139
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APÊNDICES
146
APÊNDICE A – FEEDS PARA DIÁLOGOS APROXIMATIVOS (FDA)
O relacionamento professoralunoconteúdoscomputador Os objetivos educacionais
Os conteúdos programáticos e as tecnologias O planejamento
Os problemas
Os documentos oficiais
Os recursos
O CURRÍCULO DO
LABORATÓRIO DE
INFORMÁTICA
O currículo prescrito e praticado O trabalho coletivo
Perspectivas de trabalho docente A organização
A utilização das tecnologias
Os programas (softwares)
A multiplicidade dos agentes cognitivos e aprendentes Os processos educativos gerados
147
ANEXOS
148
ANEXO A – MIGRAÇÃO PARA O SOFTWARE LIVRE
Vitória (ES) , 07 de Dezembro de 2007
Ofício 118/2007
MÁQUINAS HD SATA
EMEF Adilson da Silva Castro
EMEF Custódia Dias de Campos
Data: 20/12/2007
Nilcéa Elias Rodrigues Moreira
Ger ente de Tecnologia Educacional
150
ANEXO B – LABORATÓRIOS DE INFORMÁTICA NAS ESCOLAS DA PMV
Computadores e Laboratórios de Informática
existentes nas Escolas de Ensino Fundamental
Quantitativo de Laboratório de
Unidade de Ensino Internet
computadores Informática
Adão Benezath 1
Adevalni S. Ferreira de Azevedo 15 X X
Alberto de Almeida 23 X
Álvaro de Castro Mattos 31 X X
Alvimar Silva 22 X X
Anacleta Schneider Lucas 10 X X
Aristóbulo Barbosa Leão 25 X X
Arthur da Costa e Silva 24 X X
Castelo Branco 23 X X
Ceciliano Abel de Almeida 11 X
Éber Louzada Zippinotti 14 X X
Edna de Mattos Siqueira Gáudio 22 X X
Eliane Rodrigues dos Santos 11 X X
Elzira Vivacqua dos Santos 23 X X
Francisco Lacerda de Aguiar 25 X X
Heloísa Abreu Júdice de Mattos 24 X X
Irmã Jacinta Soares de Souza Lima 10 X X
Izaura Marques da Silva 23 X X
José Áureo Monjardim 23 X X
José Lemos de Miranda 12 X X
Juscelino Kubitschek de Oliveira 24 X X
Lions Vitória Centro 1
Marechal Mascarenhas de Moraes 23 X X
Maria José Costa Moraes 26 X X
Marieta Escobar 23 X X
Mauro Braga 24 X
Moacyr Avidos 15 X X
Neusa Nunes Gonçalves 13 X X
Orlandina D’Almeida Lucas 8 X X
Otto Ewald Junior 24 X X
Padre Anchieta 25 X X
Prezideu Amorim 23 X X
Prof. Maria Stella de Novaes 15 X X
Prof. João Bandeira 2
Prof. Vercenílio da Silva Pascoal 11 X X
Rita de Cássia Oliveira 23 X X
São Vicente de Paulo 9 X X
Suzete Cuendet 24 X X
Tancredo de Almeida Neves 22 X X
UFES 12 X X
Zilda Andrade 25 X X
Profª Regina Maria Silva 1
Paulo Roberto Vieira Gomes 1
Ronaldo Soares
Fonte: Secretaria de Educação da Prefeitura Municipal de Vitória. Disponível em:
<http://www.vitoria.es.gov.br/secretarias/educacao/numeros/complab_emef.htm>. Acesso em: <14 abr. 2007>
151
ANEXO C EXEMPLO DE UM EMAIL INFORMANDO OS PROFESSORES DE
INFORMÁTICA SOBRE O DIA E CONTEÚDO DA FORMAÇÃO CONTINUADA
Boa Tarde,
Este evento será realizado no auditório da PMV.
Abaixo segue a programação:
08:00 08:20 Abertura
09:20 10:20 Ensinando a escolher. Rádio Livre, Software livre Floriano C. de
Araújo (Romano)
10:20 10:40 Intervalo
10:40 11:40 Animação em Software Livre Johnson Sudré
11:40 13:15 Almoço Livre
13:15 13:30 Retorno as atividades
13:30 14:30 Broffice.org e Padrão ODF João Fernando Costa Júnior
14:30 15:30 Ferramentas de colaboração em Software Livre Gilberto Sudré
15:30 15:45 Intervalo
15:45 17:15 Aplicativos pedagógicos no ProLinux Ulisses Azevedo Leitão
17:15 17:30 Encerramento
Atenciosamente
ANEXO D – NOTÍCIA SOBRE A REDE METROVIX
FONTE: Ufes lança Rede Metrovix na cidade de Vitória. INFORMA: INFORMATIVO DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO, Vitória, n. 246, p. 1, set. 2007.
153
ANEXO E – ATIVIDADES DOS ALUNOS NO LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA
154
155
156
157
158
ANEXO F – DOCUMENTO DA CHAMADA TÉCNICA DA SEMEPMV
159
ANEXO G – EXEMPLO DO PROCESSO DE ORGANIZAÇÃO DOS HORÁRIOS NO
LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA