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AVENA MJ ET AL.

Artigo Original

AVALIAÇÃO DA MECÂNICA RESPIRATÓRIA E DA OXIGENAÇÃO PRÉ


RESPIRATÓRIA
E PÓS-ASPIRAÇÃO DE SECREÇÃO EM CRIANÇAS SUBMETID AS
SUBMETIDAS
À VENTILAÇÃO PULMONAR MECÂNICA
MARTA J. AVENA, W ERTHER B RUNOW DE CARVALHO , OSWALDO S HIGUEOMI BEPPU
Trabalho realizado na Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos do Hospital São Paulo -
Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP.

RESUMO – OBJETIVO. O objetivo deste estudo foi avaliar as altera- expiratória final positiva (PEEP) e pressão expiratória final positiva
ções de oxigenação, ventilação e mecânica respiratória em crianças intrínseca (PEEPi); com parâmetros ventilatórios mantidos
submetidas a ventilação pulmonar mecânica, pré e pós-aspiração de inalterados, crianças sedadas e curarizadas. Foram efetuadas qua-
secreções intratraqueais e identificar através de parâmetros de tro medidas de mecânica respiratória e duas de gases sangüíneos.
mecânica respiratória e/ou oxigenação o momento correto da RESULTADOS. A análise dos resultados demonstrou elevação
aspiração de secreções intratraqueais significante e prolongada no índice de CO2 arterial; declínio na
MÉTODOS. O estudo foi realizado na UCI Pediátrica do Hospital saturação de oxigênio imediatamente após o procedimento e dimi-
São Paulo-Unifesp, e participaram do estudo, 13 crianças com faixa nuição na complacência dinâmica torácica e pulmonar.
etária de lactente até cinco anos, ambos os sexos, com patologias Conclusões: A aspiração de secreções intratraqueal é responsá-
clínica e cirúrgica. vel por retenção da PaCO2, queda SpO2 e diminuição da complacên-
Os parâmetros analisados foram: freqüência cardíaca (FC), cia torácica e pulmonar. Por ser um procedimento de risco para o
saturação de oxigênio por oximetria de pulso (Sp02), pH arterial; paciente deve ser aplicada após avaliação e indicação individual,
pressão arterial de oxigênio (Pa02); pressão arterial de gás tendo necessidade de padronizações em manobras para prevenção
carbônico (PaC02); saturação arterial de oxigênio (Sa02), volume de hipoxemia, hipoventilação e de atelectasias.
corrente inspirado (VC insp.) e expirado (VC exp.), volume minuto
(V min), complacência pulmonar (C), resistência inspiratória das UNITERMOS: Mecânica respiratória. Aspiração. Intubação endotraqueal.
vias aéreas (R insp), pressão média das vias aéreas (PmVA), pressão Trocas gasosas.

INTRODUÇÃO ração de secreções deva ser iniciada em res- monares e da mecânica respiratória permite
Em pacientes submetidos à ventilação pul- posta a sinais clínicos e sintomas como piora do identificar a presença de hiperdistensão
monar mecânica (VPM), a aspiração de secre- desconforto respiratório, presença de secre- alveolar podendo prevenir a ocorrência de
ções intratraqueais para manutenção da ção no interior da cânula, agitação e queda de barotrauma/volutrauma ou hipodistensão
permeabilidade da cânula tornou-se uma ro- saturação pela oximetria de pulso. provocando atelectasias, e pela correlação
tina dentro das unidades de cuidados intensi- Em crianças, o procedimento de aspiração entre os dados sangüíneos e da oximetria de
vos pediátricas devido ao risco de obstrução de secreções traqueais está associado a várias pulso a avaliação da oxigenação e ventilação
por rolha de secreções. complicações, como hipoxemia2,3,4,5,, bradi- pulmonar14.
Geralmente, estabelece-se horários fixos cardia2, atelectasias5,7, trauma de mucosa3,8,9, A aspiração de secreção intratraqueal roti-
para o procedimento de aspiração, não se aumento da pressão intracraniana5,10, bacte- neira e com horário preestabelecido não tem
considerando sua real necessidade e seus pos- remia, pneumotórax3,11,12 e até parada cardía- eficácia comprovada. É um procedimento
síveis efeitos deletérios na oxigenação, pressão ca e óbito5. A simples inserção do cateter de agressivo que provoca desconforto e dor, pois
arterial, fluxo cerebral e pressão intracraniana, aspiração, a interrupção do fornecimento de freqüentemente é aplicado sem o preparo do
não havendo adequação do momento, fre- oxigênio e a remoção de gás pela aplicação de paciente utilizando–se sedação e analgesia efe-
qüência das aspirações, manobras preventivas pressão negativa pode reduzir a complacência tiva e, na maioria das vezes, com uma obser-
e cuidados antes, durante e após o procedi- pulmonar, a pressão intrapulmonar e determi- vação insuficiente e inadequada das respostas
mento. A American Association for Respi- nam uma queda na PaO2 13 . fisiológicas do paciente. Há necessidade em se
ratory Care (AARC)1, recomenda que a aspi- A hipoxemia pode adicionar várias compli- estabelecer quando e como aplicar a aspiração
cações ao paciente que já está em estado grave de secreções; qual o intervalo entre os proce-
como: acidose metabólica, hipoglicemia, lesão dimentos e quais cuidados devem ser tomados
*Correspondência: no sistema nervoso central, lesão isquêmica antes, durante e após o procedimento.
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Vila Clementino – CEP 04024-003 – São Paulo – SP
gastrintestinal e renal. Existe padronização da técnica para aspira-
Fone/Fax: 5579 5140 A monitorização das trocas gasosas pul- ção de secreções estabelecida pela AARC1,

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OXIGENAÇÃO E MECÂNICA RESPIRATÓRIA EM CRIANÇAS

que inclui manobras como: hiperoxigenação, Os parâmetros analisados foram: freqüên- ximo de 60 - 80 mmHg para neonatos e 80 -
hiperinsuflação e hiperventilação prévia e cia cardíaca (FC), saturação de oxigênio por 100 mmHg para crianças maiores .
posterior ao procedimento. As pesquisas com oximetria de pulso (Sp02), pH arterial; pressão A primeira medida de mecânica respirató-
pacientes pediátricos ainda são escassas para arterial de oxigênio (Pa02); pressão arterial de ria era obtida imediatamente antes da aspira-
avaliarmos na prática a aplicação destas gás carbônico (PaC02); saturação arterial de ção intratraqueal; a segunda imediatamente
recomendações. oxigênio (Sa02), volume corrente inspirado após; uma terceira, dez minutos após o pro-
Objetivos (VC insp.) e expirado (VC exp.), volume minu- cedimento e uma quarta e última, 20 minutos
to (V min), complacência pulmonar (C), resis- após a aspiração. O valor de cada mensuração
O objetivo deste estudo foi identificar, tência inspiratória das vias aéreas (R insp), foi obtido pela média aritmética de três medi-
através de parâmetros de mecânica respirató- pressão média das vias aéreas (PmVA), pressão das consecutivas. A primeira medida dos gases
ria e/ou oxigenação, o momento correto da expiratória final positiva (PEEP) e pressão sangüíneos arterial foi obtida imediatamente
aspiração de secreções intratraqueais e avaliar expiratória final positiva intrínseca (PEEPi). antes do procedimento de aspiração intratra-
as alterações de oxigenação, ventilação e de Os valores de freqüência cardíaca e satu- queal e a segunda e última medida após 20
mecânica respiratória em crianças submetidas ração de oxigênio foram obtidos através de minutos da aspiração. Essa análise foi padroni-
a VPM, pré e pós-aspiração de secreções uma única medida fornecida pelos monitores zada em somente duas coletas pela dificuldade
intratraqueais sem a utilização de manobras cardíacos marca Teb ® ou Anamed ® modelo de se obter material sangüíneo arterial em
preventivas para se evitar a hipoxemia e/ou a Vitalwave (ECG) e de saturometria da crianças muito pequenas. Os valores dos gases
hipercapnia. Ohmeda ® modelo 7400. sangüíneos foram analisados a partir de uma
Frente à necessidade de aspiração única amostra sangüínea arterial. Cada amos-
MÉTODOS traqueal, conectava-se o sensor de fluxo do tra era enviada imediatamente ao laboratório
Após aprovação da Comissão de Ética, foi aparelho, fazia-se a sedação e curarização da em recipiente de isopor com gelo para manu-
realizada a pesquisa na UCI Pediátrica, em um criança com midazolam (Dormonid®) na dose tenção de uma temperatura em torno de 4o C.
hospital de ensino público que atende crianças de 0,15 mg/Kg intravenoso e atracurio As variáveis quantitativas foram ex-
com até 17 anos e 11 meses de idade, prove- (Tracrium®) na dose de 0,5 mg/Kg intravenoso pressas em média e desvio padrão (DP). A
nientes de diversas especialidades, clínicas e e após cinco minutos, constatando-se ausência comparação entre os valores das variáveis
cirúrgicas, durante o período de janeiro a ou- de movimentos respiratórios espontâneos da quantitativas nas avaliações pré e 20’ pós-
tubro de 1997. criança através do monitor de mecânica, aspiração (PaCO 2) foram feitas pela prova
Foram avaliados, prospectivamente, 13 iniciava-se o procedimento. de Wilcoxon para amostras relacionadas
pacientes em VPM, na faixa etária de lactente Para aspiração intratraqueal, foram utiliza- (z). As variáveis avaliadas em quatro mo-
até cinco anos, e que foram submetidos à das sondas específicas para o procedimento, mentos, pré, pós-imediato, 10’ pós e 20’
aspiração intratraqueal de secreções, na forma contendo orifício lateral e final e diâmetro pós-aspiração, (SpO 2; C dinâmica) foram
de uma rotina descrita adiante, independente- externo da sonda com no máximo a metade analisadas pela prova de Friedman para
mente de sexo, patologia clínica ou cirúrgica e do diâmetro interno da cânula intratraqueal mais de duas amostras relacionadas (c²).
desde que a condição hemodinâmica da utilizada. O procedimento era realizado por Adotou-se o nível de significância de 0,05
criança fosse estável. duas enfermeiras, respeitando-se o tempo (a = 5%). Níveis descritivos (p) inferiores a
Os aparelhos de ventilação pulmonar me- máximo de 15 segundos, desde a introdução esse valor foram considerados significantes e
cânica utilizados foram o Sechrist IV 100-B ®; da sonda até sua retirada. representados por *.
Inter III ®; e o Servo Siemmens 900 – C ®. Os parâmetros ventilatórios, fluxo (F);
Para monitorização da mecânica respira- fração inspirada de oxigênio (FiO2); freqüência RESULTADOS
tória, foi utilizado o sistema Ventrak respiratória do aparelho (Frap.); pressão A idade dos pacientes variou entre 47 dias
(Novametrix®), monitor de perfil respiratório inspiratória (Pinsp); pressão expiratória final e 5 anos (2 anos ± 1a 10m) e o peso entre 2,5
com capacidade de análise das curvas de pres- positiva (PEEP); tempo inspiratório (Tins); e quilos e 16 quilos (9,2 quilos ± 4,4). Foram
são, fluxo e volume através de um pneumo- relação inspiração/expiração (Rel.I:E) foram estudadas seis crianças do sexo feminino e sete
tacógrafo de obstrução fixa. O transdutor de mantidos fixos pré e após a aspiração intratra- do sexo masculino.
fluxo foi colocado entre a cânula intratraqueal queal. O procedimento era aplicado uma úni- Das 13 crianças incluídas no estudo, dez
e o Y do circuito respiratório, e utilizados dois ca vez e quando se verificava que ainda havia eram pacientes clínicos e três cirúrgicos. Os
transdutores, o neonatal para cânulas intratra- secreção em grande quantidade, realizava-se pacientes foram divididos, para fins de análise
queais com diâmetro interno até 4,0mm e o de uma segunda manobra. de acordo com o diagnóstico clínico, em: 1)
adulto para cânulas com diâmetro interno su- Na presença de secreção muito espessa na patologias pulmonares restritivas (cinco pa-
perior. primeira aspiração, era instilada solução fisio- cientes), 2) patologias pulmonares obstrutivas
As crianças permaneceram em posição lógica 0,9% na cânula intratraqueal (0,3 a 0,5 + restritivas ( três pacientes) e 3) sem classifi-
supina e intubadas, com balonete insuflado ml), seguida da repetição do procedimento de cação (cinco pacientes).
somente durante o procedimento para a ob- aspiração. A pressão negativa utilizada para a Os aparelhos de ventilação pulmonar me-
tenção dos dados de mecânica respiratória. aspiração ficou padronizada em um valor má- cânica utilizados foram: Sechrist IV 100 B® 10

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Tabela I – Parâmetros analisados que não apresentaram variação estatística significante antes e após aspirações de secreções
Imediatamente antes Imediatamente após 10´após 20´após
Média ± D.P Média ± D.P Média ± D.P Média ± D.P
PH 7,34 ± 0,07 7,33 ± 0,09

PaO2 (mm Hg) 85,65 ± 35,52 89,25 ± 55,59

SatO2 (%) 91,30 ± 11,29 90,22 ± 10,15

FC (bpm) 135,85 ± 35,43 146,61 ± 31,98 141,23 ± 30,07 136,61 ± 31,40

Rinsp cm/H2O/L/s 94,33 ± 64 98,05 ± 67,42 94,56 ± 63,30 95,52 ± 64,39

PmVA (cm/H2O) 8,64 ± 3,17 8,75 ± 3,45 9,04 ± 3,77 9,11 ± 3,71

VC insp. (ml) 82,24 ± 47,87 76,56 ± 45,49 82,07 ± 45,98 81,96 ± 46,64

V min (Lpm) 2,15 ± 1,01 2,01 ± 1,09 2,12 ± 1,03 2,14 ± 1,06

VC exp (ml) 110,93 ± 90 99,00 ± 77,33 91,36 ± 52,59 92,64 ± 53,23

PEEP (cm/H2O) 4,51 ± 2,23 4,48 ± 2,13 4,53 ± 2,14 4,53 ± 2,13

PEEP i (cm/H2O) 4,04 ± 3,36 4,13 ± 3,64 4,17 ± 3,67 4,36 ± 3,85

Tabela 2 – PaCO2 (mmHg) arterial; SpO2 (%) e C dinâmica (ml/cm/H20) antes e após aspiração de secreções
Imediatamente antes Imediatamente após 10´após 20´após
Média ± D.P Média ± D.P Média ± D.P Média ± D.P
PaCO2 (mmHg) 41,40 ± 9,82 48,42 ±17,07
z = 1,78 p = 0,0447* Pré = Pós 10’ = Pós 20’) ¹ Pós-imediato
SpO2 (%) 91,85 ± 11,11 86,92 ± 13,22 90,50 ± 10,18 90,46 ± 9,08
χ² = 10,82 p = 0,0127 * Pré = Pós 10’ = Pós 20’) ¹ Pós-imediato

C dinâmica (ml/cm/H20) 8,02 ± 5,90 6,92 ± 5,40 7,19 ± 5,32 7,37 ± 5,38
χ² = 10,87 p = 0,0124 * Pré ¹ Pós-imediato ¹ (Pós 10’ = Pós 20’)

pacientes (76,9%); o Servo Siemmens 900- tiva imediatamente após a aspiração de secre- variação significativa quando os pacientes fo-
C® 02 (15,4%) e o Inter III® 01 (7,7%). ções e praticamente retornou aos valores ram classificados entre as patologias pulmona-
A Tabela I sintetiza as variáveis analisadas basais na análise de 10 e 20 minutos após o res restritivas ou mistas (restritivas e obs-
que não apresentaram variação estatística im- procedimento. A C dinâmica apresentou que- trutivas), considerando melhora >10% e
portante e apesar da existência de uma eleva- da significativa, imediatamente após o procedi- piora ou melhora ≤ 10%. (valor arbitrário), em
ção na resistência inspiratória imediatamente mento de aspiração, recuperando-se muito nenhuma das análises.
após o procedimento, esta também não foi pouco nos 10 minutos após o procedimento e
estatisticamente significativa. mantendo-se praticamente inalterada, 20 mi- DISCUSSÃO
As variáveis que apresentaram variação nutos após. Os resultados deste estudo demonstra-
estatística significativa foram a PaCO2 (mmHg); Consideramos o aumento em 10% do ram variação dos parâmetros relacionados à
a SpO2 (%) e a complacência dinâmica (ml/cm/ valor basal das variáveis estudadas e piora ou oxigenação (SpO2), ventilação (PaCO2) e me-
H20), apresentados na Tabela 2. inalterado a manutenção ou queda dos valores cânica respiratória (C dinâmica) pré e pós-
A PaCO2 arterial manteve-se elevada, basais das seguintes variáveis, não havendo aspiração de secreções intratraqueais de crian-
mesmo após 20 minutos do início do procedi- variação significativa quando os pacientes fo- ças submetidas à ventilação pulmonar mecâni-
mento. A SpO2 média obtida através da ram classificados entre as patologias pulmona- ca, sem aplicação de manobras preventivas
oximetria de pulso apresentou queda significa- res restritivas ou mistas. Também não houve que evitem a hipoxemia e/ou hipercapnia.

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OXIGENAÇÃO E MECÂNICA RESPIRATÓRIA EM CRIANÇAS

Kerem et al.15 e Goodnough16 demons- Utilizamos os dados da oximetria de pulso ou com o auxílio de um sistema de reanimação
traram que quando não se aplica nenhuma para a monitorização da hipoxemia durante e manual, assegura o fornecimento de um volu-
técnica que preserve as condições de oxigena- após a técnica de aspiração, pois acreditamos me corrente maior que o utilizado no paciente
ção e ventilação pré-aspiração, ocorre uma que a oximetria de pulso tenha valor importan- para uma hiperventilação efetiva.
queda significativa na PaO2. Walsh et al.17 rela- te para a monitorização fiel e contínua da A hiperoxigenação pode ser realizada atra-
taram o tempo de recuperação do estado de oxigenação durante a aspiração intratraqueal, vés do aparelho de VPM ou de um sistema de
oxigenação em neonatos a parâmetros basais mesmo sendo a SaO2 um indicador insuficiente reanimação manual, pela elevação na porcen-
em aproximadamente três a quatro minutos para avaliar a oxigenação tecidual durante a tagem da FiO2, durante alguns segundos antes
após o procedimento, relatando ainda que aspiração de secreções intratraqueais18. do procedimento de aspiração. Goodnough16
outros autores mencionam período de até Embora a literatura2,3,5,10,12,16,17,18 relate a demonstrou que a hiperoxigenação tem a ca-
sete minutos com uma queda acentuada do queda na PaO2 como a principal complicação pacidade de proteger os pacientes submetidos
teor de oxigênio arterial. pós-aspiração de secreções, isto não foi obser- à aspiração de secreções, da queda acentuada
Em nosso estudo, a PaCO2 se manteve em vado em nosso estudo. Como essa variável foi dos níveis de PaO2.
níveis mais elevados após 20 minutos. Este fato analisada somente 20 minutos após o procedi- A resistência inspiratória, contrariando a
sugere que, mesmo após um determinado mento, é possível que tenha havido queda nesse crença de que a retirada de secreções resulta-
tempo do procedimento, com a criança seda- parâmetro imediatamente após o procedimen- ria numa diminuição da resistência das vias
da e curarizada, persista um estado de hipo- to de aspiração, sem ter sido detectada, com aéreas permitindo uma ventilação adequada,
ventilação, possivelmente decorrente dos se- recuperação satisfatória durante esse período não apresentou melhora após a aspiração. As
guintes motivos: de tempo. O aumento gradual da SpO2, até possíveis microatelectasias, formadas após a
1) A criança em ventilação mandatória intermi- recuperação próxima do valor basal após 20 aplicação de pressão negativa, podem ser res-
tente (VMI) apresenta ciclos respiratórios do minutos, com queda acentuada imediatamente ponsáveis pela ausência de melhora da resis-
aparelho e próprios. Quando curarizada, per- após o procedimento, favorece essa hipótese tência. A melhora na resistência das vias aéreas
manecem somente os ciclos do aparelho, com de uma técnica continua de monitorização e em e desimpedimento do sistema para uma me-
possibilidade de uma hipoventilação. tempo real, tornando-a um instrumento valioso lhor liberação de volume de gás elevariam o
2) A hipoventilação pode ser responsável pela na detecção precoce de hipoxemia. volume corrente inspiratório e expiratório e o
hipóxia, que leva a uma vasoconstrição, refle- Na curva de dissociação da hemoglobina volume minuto, independentemente da ma-
tindo em um distúrbio na relação ventilação/ existe um segmento em que ocorre grande nutenção de uma freqüência respiratória cons-
perfusão. Aumentando a ventilação do espaço variação da saturação sem o correspondente tante. (ou fluxo constante)
morto, não há trocas gasosas suficientes com aumento da PaO2 , e a partir de uma saturação A PEEP e a PEEPi também não apresenta-
uma conseqüente retenção de CO2. próxima de 90% o inverso. Isso significa que ram variação significativa, embora se esperasse
3) As atelectasias que eventualmente surjam, em saturações próximas de 99%, por exem- uma provável queda da PEEPi decorrente da
provocadas pela pressão negativa e pela plo, a PaO2 pode tanto ser de 90 mmHg como aspiração de secreções. Nossos pacientes não
desconexão do aparelho de ventilação pulmo- de 400 mmHg. Assim sendo, se não for possí- apresentaram essa queda, possivelmente de-
nar mecânica, prejudicam as trocas gasosas, vel inferir a PaO2 com saturações acima do vido a pouca alteração da resistência da via
com retenção de CO2 e hipoxemia. ponto superior de inflexão da curva de aérea. (ou complacência)
A SaO 2 obtida através da gasometria ar- dissociação da hemoglobina, é possível consi- Associando-se a melhora pós-aspiração
terial não demonstrou variação após 20 mi- derar que abaixo desse ponto pode estar ha- acima de 10% com subdivisões diagnósticas,
nutos do procedimento, entretanto a SpO2, vendo hipoxemia. Com isso, a relação entre não houve diferença relacionada com pacien-
obtida através da oximetria de pulso, apre- SpO2 e SaO2 pode ser suficiente para detectar tes com patologias restritivas ou obstrutivas
sentou queda significativa imediatamente estados hipoxêmicos precocemente. para nenhum dos parâmetros associados
após a aspiração, retornando aos valores Considerando que a variação significativa (PaCO2, SpO2 e C pulmonar).
próximos do basal cerca de 10 minutos após na SpO2 , obtida através do oxímetro de pulso, Quanto à elevação da FiO2 para hipero-
o procedimento. decorrente de uma possível hipoxemia ime- xigenação em crianças antes da aspiração, não
Os pacientes avaliados durante o estudo diatamente após a aspiração, e a persistência há ainda recomendações específicas. A
encontravam-se estáveis hemodinâmicamen- de um estado de hipoventilação após decorri- oxigenação a 100% de O2 é a prática mais
te e não apresentavam nenhum fator que pu- dos 20 minutos do procedimento, a necessi- comum. McFadden19 recomenda essa con-
desse interferir nos valores obtidos através da dade de manobras preventivas como a centração para neonatos que estiverem sendo
saturometria como choque ou má perfusão hiperoxigenação e a hiperventilação devem ventilados com uma fração de oxigênio (FiO2)
periférica. Considerando que as condições ser consideradas como estratégia protetora da superior a 50%. Turner20, entretanto, afirma
para uma leitura fidedigna foram observadas e função pulmonar4,5,16. ser necessário fornecer uma quantidade de
que a SpO2 tem uma boa correlação com a A manobra da hiperventilação, antes e oxigênio suplementar suficiente para manter a
SaO2, a oximetria de pulso é uma técnica após o procedimento de aspiração, obtida saturação de oxigênio entre 92% – 94%, e
prática útil para avaliar alterações hipoxêmicos através do aumento da freqüência respiratória esta quantidade deve ser baseada em necessi-
durante o procedimento. do aparelho de ventilação pulmonar mecânica dade individual de cada criança.

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Dentre os dados de mecânica respirató- cedimento, têm a finalidade de prevenir a PaO2; PaCO2; SaO2; inspiratory and expiratory
ria obtidos, o único parâmetro com variação hipoxemia através do fornecimento de uma tidal volume; minute volume; dynamic
significativa foi a diminuição acentuada da fração maior de oxigênio; a hipoventilação compliance, respiratory resistance; mean airway
complacência dinâmica após a aspiração de através de aplicação de ciclos respiratórios pressure; PEEP and PEEPi., and the
secreções, provavelmente em decorrência maiores que o utilizado pelo paciente e a measurements were made immediately before
da formação de atelectasias pós-aplicação de prevenção de atelectasias pós-aplicação de suction, immediately after, ten and twenty
pressão negativa, o que sugere a importância pressão negativa com a utilização de insu- minutes after suction
de reavaliar a necessidade de hiperventilação flações através de pressão positiva imediata- RESULTS. The results showed that the
com hiperinsuflação antes, durante e após a mente após o procedimento. technique increase the CO2 arterial pressures
aspiração de secreções. Essa queda na com- Há necessidade de estudos em pacientes (PaCO2) even after 20 minutes; decrease the
placência também pode ter tido a influência pediátricos que estabeleçam: o tempo e a oxygen saturation (SpO2) immediately after the
da utilização do curare, uma vez que o porcentagem de elevação na FiO2 para a procedure with regular recuperation after 10
atracurio pode provocar diminuição da com- hiperoxigenação; o tempo mínimo e a fração minutes and decrease the lung compliance
placência torácica e vasoconstrição com alte- de aumento da freqüência respiratória para (Cdin.) immediately after with lower recu-
ração da relação ventilação/perfusão. atingir-se uma hiperinsuflação eficaz conside- peration after 10 minutes.
A hiperinsuflação, obtida através de um rando seus benefícios e riscos. CONCLUSION. We concluded that intratra-
pequeno acréscimo na pressão inspiratória e Com a finalidade de se evitar os efeitos cheal suction in front of compromise of
conseqüentemente um volume corrente mai- deletérios da aspiração de secreções oxygenation, ventilation or respiratory me-
intratraqueais: chanic, applied as minimal as possible under
or, parece ter função importante no sentido de
a) a criança só deve ser submetida ao preventive maneuvers. We need more
reverter as atelectasias após aspiração em
procedimento caso se comprove o compro- studies to establish the real need of
neonatos, porém não impede a queda dos
metimento e prejuízo da oxigenação, da ven- intratracheal suction and a practice
níveis de PaO2 quando se mantém uma mesma tilação ou da mecânica respiratória devendo
FiO2 e um volume minuto constante. Segundo guideline of intervention to avoid deleterious
ser aplicada com a menor freqüência possível; effects of that in pediatric patients.
Goodnough16, essa manobra não consegue b) deve-se hiperoxigenar e hiperventilar
compensar a interrupção e perda de oxigênio [Rev Assoc Med Bras 2003; 49(2): 156-61]
antes, durante e após o procedimento e a
e ventilação durante os 15 segundos necessá- hiperinsuflação também pode ser aplicada,
rios para a desconexão do sistema respiratório KEY WORDS: Respiratory mechanics. Suction.
com critério e cautela, devido ao risco de Endotracheal intubation.
e procedimento de aspiração. barotrauma ou volutrauma.
Não existem estudos disponíveis quanto Estudos prospectivos devem ser realiza-
ao uso da hiperinsuflação antes e após a aspira- REFERÊNCIAS
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