Você está na página 1de 7
Alvaro Vieira Pinto Dados internacionals de Catalogacao na Publicagao (CIP) tin Sete licoes sobre educacao de adultos 16? edicao RTEZ, Sian 5° TEMA Estudo particular do problema da educacao de adultos Arealidade social do adulto. Sua qualidade de trabalhador e © conjunto de conhecimentos basicos que pressupée Oadulto 60 membro da sociedade ao qual cabe a producto social, a diregao da sociedade e a reproducao da espécie. Existencialmente, o adulto é 0 homem na fase mais rica de sua existéncia, mais plena de possibilidades. Por isso, € 0 ser humano no qual melhor se verifica seu caréter de trabalhador. trabalho expressa e define a esséncia do homem em todas as fases de sua vida (da infancia velhice), mas é no perfodo adulto que melhor se compreende seu significado como fator constitutivo da natureza humana. Ohomem ¢ produto de seu trabalho (Sartre: 0 gargom se faz.ser garcom). Mas como este trabalho se incorpora ao trabalho social geral, que configura a etapa vigente da sociedade, reverte em forma social, quer dizer, como trabalho aplicado a construir a sociedade tal como se encontra, ao préprio executante, sob a SETELIgDES SOBRE EDUCAGAO DE ADULTOS a forma de condicionamentos sociais, de salérios, de valores, de instituigdes, de ideias dominantes etc. adulto é por conseguinte um trabalhador trabalhado. Por um lado, s6 subsiste se efetua trabalho, mas, por outro lado, 86 pode fazé-lo nas condigdes oferecidas pela sociedade onde se encontra; que determina as possibilidades e circunstancias, materiais, econdmicas, culturais de seu trabalho, ou seja, que neste sentido trabalha sobre ele Mas o segundo aspecto nao significa passividade, nao significa que o homem adulto seja “nosso objeto” da vontade social geral, difusa, impessoal. Porque essa vontade é uma soma de liberdades (de vontades livres) entre as quais se conta a do proprio trabalhador ativo, sobre o qual atua, de retorno, a vontade geral. Os adultos, a quem cabe a diregao da sociedade, exercem esta fungao como trabalho. F agao politica (no sentido sociolégi- co) porque, em tiltima analise, determina o regime de trabalho geral e suas modificagdes. A influéncia sobre a superestrutura social (0 direito, a legislacio, as instituigdes etc.) € apenas a modalidade de mediacio pela qual a parte social dirigente configura e modifica o regime geral de trabalho. ‘A participacdo cada ver mais ativa das massas — incluindo grande ntimero de analfabetos —, no processo politico de uma sociedade, expande a consciéncia do trabalhador e Ihe ensina por que ecomo—ainda que analfabeto —deve caber a ele uma participacao mais ativa na vontade geral. Nesse sentido, sua situacao de analfabeto ou de semianal- fabeto nao representa um obstéculo a consciéncia de seu papel (seu dever) social. A falta de educacao formal nao é sentida pelo trabalhador adulto como uma deficiéncia aniquiladora, quando a outra educagao — a que ¢ recebida por sua partici- pacaona realidade social, mediante o trabalho — proporciona 0s fundamentos para participagao politica, a atuagio do indi- w Awvano VIERA PTO viduo em seu meio. E a prova é que estes sao individuos que exercem importante papel como representantes da consciéncia comum em sua sociedade, chegando até a serem Ifderes de movimentos sociais. Porisso é que, na medida em quea sociedad se vai desen- volvendo, a necessidade da educacao de adultos se torna mais imperiosa. £ porque em verdade eles ja estéo atuando como educados, apenas nao em forma alfabetizada, escolarizada. A sociedade se apressa em educé-los nao para criar uma partici- pacao, jé existente, mas para permitir que esta se faca em niveis culturais mais altos e mais identificados com os estandartes da rea dirigente, cumprindo 0 que julga um dever moral, quando em verdade nao passa de uma exigéncia econdmica Como biologicamente cabe ao adulto a reproducio da espécie, 6a ele que cabe o cuidado com a prole. Tem que educé- -la, o que primordialmente significa cuidar para que seus filhos aprendam a ler e a escrever, frequentando a escola. Mas, jé sabemos que esta necessidade esta mediada pelas exigéncias materiais de subsisténcia da familia, determinadas, por sua vez, pelas condigdes de desenvolvimento da sociedade. Daf que 0 problema da educaco infantil seja visto como dependente da consciéncia dos pais, a qual por sua vez depende das circuns- tancias materiais da existéncia da familia. A educacao do adulto nao pode ser conseguida separa- da da educagao da crianga, porque o adulto nao desejaré se alfabetizar se ndo considera necessério saber a0 menos tanto quanto seus filhos. Mas, universalmente, a escolarizacao infantil ndo se pode fazer sem a simulténea campanha de alfabetizagao e educagao dos adultos. E uma tese errénea e cruel admitir que se deve condenar os adultos a condicao perpétua de iletrados e con- centrar os recursos da sociedade na alfabetizacao da crianga, mais barata e de maior rendimento futuro. Deixando de lado ETE LIgDES SOBRE FoveAGHO DE ADULEOS s © vergonhoso desprezo moral pela dignidade do homem que esta tese encerra, ela é:sociologicamente falsa, pois o adulto rende muito mais depois de alfabetizado; e pedagogicamente errdnea, pois nao se pode fazer uma correta escolarizacao da infancia ‘em um meio no qual os adultos, os chefes de familia nao com- preendem sua importéncia. Entretanto, s6 a compreenderona prética, alfabetizando-se eles mesmos. A educagio dos adultos 6, assim, uma condigao necesséria para 0 avango do processo educacional nas geragées infantis e juvenis. © menosprezo pela educagio dos adultos, a atitude de condené-los; definitivamente ao analfabetismo (de parte de sua profunda imoralidade) incide no erto sociol6gico de supor que o adulto é culpado de sua prépria ignorancia. Nao reconhece que 0 adulto nao é voluntariamente analfabeto, nao se faz analfabeto, senao que € feito como tal pela sociedade, com fundamento nas condicdes de sua existéncia ‘A educagao de adultos no é uma parte complementar, extraordinéria do esforco que a sociedade aplica em educagao (supondo-se que o dever proprio da sociedade é educar a infan- cia). E parte integrante desse esforco, parte essencial, que tem obrigatoriamente que ser executada paralelamente coma outra, pois do contrério esta tiltima nao terd o rendimento que dela se espera. Nao é um esforco marginal, residual, de educacao, mas ‘um setor necessario do desempenho pedagégico geral, ao qual a comunidade se deve lancar. O educando adulto e seu papel como membro pensante e atuante em sua comunidade © educador de adultos tem que admitir sempre que os individuos com 0s quais atua so homens normais e realmente cidadaos tteis. Tem de considerar 0 educando nao como um ser

Você também pode gostar