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NOCBES DE ESPACO E TEMPO NO ENSINO DE HISTORIA Como todos os conceitos historicos, os de espago e tempo se modificaram historicamente. Se constituiram como produto das sociedades em que foram gerados, estando pois subordinados & todas condicionantes historicas daquelas so- ciedades. A aplicag’®o desses conceitos no ensino de primeiro grau deve ser, segundo esse mesmo raciocinio, pautada por estar igualmente inserida no tempo e espaso histericas do educando, considerando todas as implicasées deles decorren— tes, as necessidades, as aspirates, o desenvolvimento cog~ nitive e psicolégico do educando e o quadro histérico em que ele est4 inserido. 0 estagio primario do desenvolvimento da percepgao de espaco e tempo pode ser estabelecido como sendo o das so~ ciedades primitivas, antes e durante o inicio da sedentari— zag%o, quando o homem compreendia o tempo através das mais elementares manifestastes naturais e ciclicas: os periodos lunares, a florescéncia, as estagées, a sucess&o dia-noite e onde o homem se limitava espacialmente ao seu territorio de caga, aos limites terrestres de seu alcance visual, as dis~ tancias que poderia percorrer durante sua vida. Trata~se de uma nogio de espaso e tempo objetiva, totalmente desprovida de abstracyo @ iminentemente pratica, derivada elementarmen— te de suas necessidades de sobrevivéncia e procriag&o (TRAGTEMBERG 1968). Q estagie contemporaneo dos conceitos de tempo espaso estao, no campo das ci@ncias especulativas, conside- rando inclusive a fusto destes elementos. As teorias de Einstein sobre a relatividade destrutram, até mesmo no campo das ciencias chamadas exatas, a linearidade temporal e a contigtidade espacial. Entre tais limites, o do concretismo absoluto das sociedades primitivas e o da abstracdo completa da relativi-~ dade eisteiniana, situa-se uma continuamente mutavel nogao fisica de espacgo e tempo, que aqui devemos ultrapassar para compreender historicamente estes conceitos. Para os egipcios o tempo se referia aos periodos das cheias do Nile e o espaso se prendia as dimengtes da su- perficie entre os reinos. Qs gregos mediam com a clepsidra da durasao das elocugties na Agora e demarcavam suas propriedades em esta- dios. Hoje temos nosso compromissos determinados pela preciste infinitesimal do relégio atemico e as dimeng6es do elétron quantificadas numericamente. Cada um dos trés exemplos corresponde as necessi- dades de uma sociedade, ao seu aperfeigoamento tecnolégico @ as referencias que ela adota. No imutabilismo da civilizagao egipcia, que significado teria a bilhonésima parte da dura~ cio do dia ou do gréo de areia? Para os gregos a justiga de~ pendia inclusive da duras%o do discurso de alguém em detesa de sua tese, portanto, havia a necessidade de que aquela du~ ragdo fosse mais ou menos homogenia para garantir a isono~ mia. Hoje avaliamos a rapidez com que um computador apera em frages minimas de tempo, dada a necessidade de que que tais aparelhos executem um numero muito grande de operagbe: do por conseguinte a necessidade de medidas muito mais cisas. Todos esses conceitos de tempo e espago s%o quan~ tificaveis. Sao conceitos fisicos que se modificam segundo a necessidade tecnologica. A nogio de tempo e de espago para a Histéria ja n&o compreende somente o tempo fisico © linear ou © espaso contigue, geograficamente limitado, embora essas acepstes tenham encontrado na Historia um ancoradouro seguro até o século passado. Tais conceitos tiveram na Ciencia da Histé- ria um desenvolvimento paralelo ao daquela cieéncia, servindo até de direcionamento para rumos que seguia a propria nogao de Historia. Dessa forma, nas sociedades primitivas, cujo on~ tem, o hoje eo amanh& se confundiam, inexistia a idéia de historia. Nas sociedades classicas, com sua estrutura crono~ ldégica e espacial primitivas, a Historia se limitava ao ar- rolamento dos fatos passados. A Historia @ hoje a ci@ncia em processo, a ciéncia da mutag6es, a ciéncia das multi-rela~ sdes pelas formas miltiplas-como compreendemos o tempo e 0 espaso e sua constante subordinagao aos elementos sociais e humanos que os determinam historicamente. © desenvolvimento dos conceitos de tempo na Histo~ ria passa pelas diferentes formas pelas quais os historiada~ res dividem a Histéria. Dessa forma a doutrina das tres ida~ des - eixo da historiografia tradicional ~ teve suas raizes nos escritos de um franciscano morto no séc. XIII e se di-~ fundiu entre nés por intermédio de Turgot, Condercet e Vol- tair, estando vinculada a idéia de progresso, & de evolugso e outras equivalentes em voga durante o enciclopedisma. A doutrina das trés idades compreende a histéria como um pro- cesso linear, onde o saber, a cultura, a informag’o se acu~ mulam, num processo de construs#o continua e crescente. A Historia, aqui, caminha para frente, de olhos voltados para © passado que dista do presente um determinado numero de anos ou séculos. De outra forma, a Teoria dos Ciclos, que aparece nos Upanichades, em Ovidio e em Vico, pressupse uma certa parcela de repeti¢&’o nas seqilencias dos fatos histéri~ cos, opondo-se a teoria das tres idades por n¥o compreender a histéria linear com sua periodicidade tradicional, a vin- culagso entre histéria, cronologia e processo, a vinculagao entre processo historico e razio. Ha também a "teoria da cultura", de Spengler, onde se separam os conceitos de cul~ tura e civilizagao, sendo que o primeiro se processa em qua~ tro fases: primavera, vero, putono @ inverno de uma socie~ dade, e@ o Ultimo ~ a cultura ~ @ o derradeiro estagio-e o ocaso -da civilizasio. Em Max Weber, © conceito de tempo histérico, como nos anteriores, passa também pela forma como ele divide a historia, a divisSo temdtica, que compreend a) a economia de consumo, nas sociedades primitivas; b) sociedades agrarias, das sociedades do oriente classico ate © feudalismo; c) comércio pré-capitalista, dos fenicios ate © renascimento: o capitalismo comercial, a partir do séc. XV; @ finalmente e) capitalismo industrial, a partir do séc. XVIII. De todas esas concepgbes de divis¥o da historia, @ dos subseqilentes conceitos de tempo, podemos extrair con~ tribuigtes para uma conceituag&o moderna e abrangente, que corresponda aos anseios do historiador de nossos dias por contribuir para a compreens&o dinamica da histéria em seu processo. Da Histéria linear aproveita-se o conceito de acu~ mulagXo via continuo transmitir do conhecimento (compreenda~ se continuo mas nXo ininterrupto). Da historia ciclica, tema~se 0 excesso de paral lismo @ da histéria tematica aproveite-se o tipo de formagao historico-econdmica (GDALIA 1965). Além do vincula que o canceito de tempo mantem com as formas pelas quais se periodiza a historia, ha outras concepgties complexas, que consideram tempo psicolégico, tem po fenomenologico e tempo econémico. Esse “iltimo, de maior relevancia por ser o mais caracterizador da concepsto de tempo aceita mais amplamente pela Historia hoje em dia. E a concepsio de tempo que se basea no fato econd- mica (de longa duras%o segundo BAUDEL 1965) em oposigao ao fato politico, ao fate acidental ou incidental, ao fato per~ sonalizado (de curta duragdo, idem, ibidem). Esta concepgio é miltipla, porque admite tempos concomitantes em sociedades distintas, complexa porque ad~ mite a inter-relag4o entre aquelas sociedades @ seus tempos, @ relativa porque vé o tempo da sociedade em quest&o na oti~ ca temporal do presente. Q conceito de espago, sob © ponto de vista da His~ téria, deve englobar duas dimengtes: a geografica (no senti- do da Geografia Fisica, Espacial, Urbana) e a social (no sentido da Geografia Humana, Demogréfica, Politica). Onde se compreenda espaso geagrafico como lugar fisico onde se proc~ essam os eventos e se sucedem as lutas na historia, condi~ g0es naturais peculiares a tal espaso fisico, relacbes entre © homem @ tal espago. E onde se compreenda espago social co~ mo aquele ocupado @ transformado pelo homem, genese do espa~ §0 econdmice e portanto integrante e constituinte do espaso histérico. A concepg%o espacial compreende a concepsto de tempo, pois nele esta inseriday compreende movimento plois o homem @ as sociedades se deslocan no espago geograficos com— preende mudanga, pois © homem e as sociedades estao em con tinuo processo de transformagio no espace que ocupam e com o qual se relacionam; compreende transformag’o pois o homem, da mesma forma, transforma o meio em que vive; compreende processo pois h& linhas gerais identificaveis nas modifica~ 6¥es naturais que ocorrem no espago fisicoy por fim, a con- Geps3o de espaco compreende relagao, pois hA uma continua dependéncia entre a sociedade e 0 meio fisico. Tal concepcao compreende em Wltima andlise uma inter-relag&o entre Histo ria e Geografia. Uma relacdo entre consciéncia historica e a neste de espago (ZAMBONI 1984). Se @ 0 objetivo do professor de Historia ~ como deveria ser - formar consci@ncia histérica nos seus alunos de primeiro grau, @ necessidade preemente o trabalhar bem as nogtes de tempo @ espago, desenvolver corretamente tais con- ceitos e levar as educandos a uma desejavel abstragao destas duas dimengtes to relativas do universo cognoscivel. Serdo obstaculos a tarefa do professor de propi-~ ciar ao aluno meios para desenvolver nos&o histérica de es~

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