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AS BASES DA SOCIEDADE PÓS-MODERNA E A SUSTENTABILIDADE

THE FOUNDATIONS OF POST-MODERN SOCIETY AND SUSTAINABILITY

Anderson Gomes Bastos¹

¹Graduando em Ciências Biológicas, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, biobastos@yahoo.com.br

Resumo

A doente humanidade se apóia em cancerígenos pilares para se


desenvolver e conduzir seu incerto futuro. Diante disto, uma intensa
degradação dos meios naturais e uma população que sofre com a
desigualdade e carece de meios para perceber a dimensão da problemática
mundial. Ao longo da história, pensadores libertários criticaram a organização
da máquina social e deixaram importantes contribuições para a importante e
atual crítica à nossa sociedade. Este artigo procura relacionar a
sustentabilidade com o comportamento do homem pós-moderno. A religião, a
propriedade, o governo e o consumismo são alguns dos aspectos abordados.

Palavras-chave: sustentabilidade; pós-modernidade; governo; propriedade;


cristianismo; consumismo; anarquia; primitivismo; anarco-primitivismo

Abstract

The sickness humanity is based in carcinogenic pillars to develop and


lead its future uncertain. Considering this, an intense degradation of natural
resources and a population that suffers from the uneven and lacks the means to
realize the magnitude of the problem worldwide. Throughout history, thinkers
libertarians criticized the organization of the social machine and left important
contributions to the important and critical to our current society. This article
seeks to link sustainability with the behavior of post-modern man. The religion,
property, government and consumerism are some of the points raised.

Keywords: sustainability, post-modernity, government, property, Christianity,


consumerism, anarchy, primitivism, Anarcho-primitivism
INTRODUÇÃO

O que é sustentabilidade? A definição de desenvolvimento sustentável


surgiu na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, a Eco-92. Tal progresso busca o
equilíbrio entre a proteção ecológica e o avanço econômico.
O capitalismo global gerou duas tensões fundamentais [...], a
estagnação dos níveis de miséria e pobreza – e o agravamento na
concentração de renda - [...] uma crise ambiental sem precedentes, provocada
pelo próprio modelo econômico “sucateador” de produtos e “esbanjador” de
energia (Dupas, 2008).
A miséria embrutece o homem e, para destruir a miséria, é preciso que
os homens possuam a consciência e a vontade. A escravidão ensina os
homens a serem servis, e para se libertar da escravidão é preciso homens que
aspirem à liberdade. A ignorância faz com que os homens não conheçam as
causas de seus males e não saibam remediar esta situação; para destruir a
ignorância, seria necessário que os homens tivessem tempo e meios de se
instruírem (Malatesta, 1903).
Quando se fala em desigualdade e problemáticas do sistema, se está
incluindo além do sistema econômico, características culturais já interiorizadas
e provavelmente ignoradas a primeiras vista. A propriedade privada, a religião,
o governo, são apenas prelúdios das principais influências da organização
sócio-cultural.
Já em 1762 Russeau questionava a legitimidade da convenção social
pré estabelecida. “O homem nasceu livre, e em toda parte se encontra sob
ferros. De tal modo acredita-se o senhor dos outros, que não deixa de ser mais
escravo que eles. Como é feita essa mudança? Ignoro-o. Que é que a torna
legítima?”. Trata-se de uma discussão que vai além do sistema escravocrata e
a organização social. O que é que torna o governo e a herança dos milênios
passados dignos de destituírem a nossa liberdade inerte? Quem deliberou que
tantos homens pudessem possuir tanto, e tantos outros nada?
Bakunin afirma a influência absurda do cristianismo no sistema de
dominação. “Que a crença em Deus, criador, ordenador, juiz, senhor,
amaldiçoador, salvador e benfeitor do mundo, tenha se conservado no povo, e
sobretudo nas populações rurais, muito mais do que no proletariado das
cidades, nada mais natural. O povo, infelizmente, é ainda muito ignorante e
mantido na ignorância pelos esforços sistemáticos de todos os governos que
consideram isso, com muita razão, como uma das condições essenciais de seu
próprio poder.”
A noção de sustentabilidade implica, portanto, uma inter-relação
necessária de justiça social, qualidade de vida, equilíbrio ambiental e a ruptura
com o atual padrão de desenvolvimento (Jacobi, 1997).
Que tem a ver todas essas esferas com a problemática ambiental?
Todas as coisas. Tal relação quando ignorada torna a crítica ingênua. As
características aqui citadas não são apenas os moldes nas nossas relações
sociais, é principalmente o que conduz nossas atitudes, nossa aceitação e,
logicamente, o modelo insustentável, fadado a total destruição, que vivemos
neste século XXI.

UMA SOCIEDADE QUE INCOMODA

O consumismo é a principal característica da sociedade atual. As bases


ideológicas do mundo se abalaram completamente após a revolução industrial,
enquanto que a produção em larga escala mudou significativamente o
comportamento das indústrias, da mídia e principalmente das massas. O
resultado para este „boom‟ na produção repercutiu ideologicamente em todos
os segmentos da sociedade.
Comprar indefinidamente e produzir equipamentos necessários ou não
para a população são duas ferramentas que sustentam o consumo. Além disso,
a indústria midiática que também lucra neste processo induz diariamente o
público a modernizar-se, comprando muito, fazendo o capital girar. Espalhar „a
riqueza [...] assim você encoraja a esperança e a oportunidade‟ (Bush, 2006).
Ligue a TV e verá uma tentativa de equilibrar o consumo e o meio
ambiente. O consumo consciente, conceito que aponta para a sustentabilidade.
Como então, tenta se adequar os problemas ambientais aos moldes do
sistema? Não é mais sensato inverter esta lógica? É como um animal ferido,
que tenta convencer seu predador a não devorá-lo. O capitalismo está sim em
sua decadência, a nova crise e os conflitos geopolíticos (oriente e ocidente)
evidenciam uma época tensa.
Segundo Unabomber (1995) “a Revolução Industrial e suas
conseqüências foram um desastre para a raça humana. Aumentou
enormemente a expectativa de vida daqueles que vivem em países
<<avançados>>, mas desestabilizou a sociedade, tornou a vida um inferno,
submeteu seres humanos a indignidades, provocou sofrimento psicológico (no
terceiro mundo sofrimento físico) e infringiu um dano severo ao mundo natural”.
Kaczynski (Unabomber) ainda teoriza que o contínuo desenvolvimento piorará
a situação, trazendo estilhaços até mesmo para os países desenvolvidos.
A linha de pensamento de Unabomber nos leva a uma discussão
revolucionária. É necessário se ter alguma perspectiva a respeito das possíveis
soluções para uma sociedade que está ruindo e levando consigo todo meio
natural.
Antes de mais nada, o capitalismo não será destruído enquanto os
trabalhadores, tendo se livrado do governo, não tiverem se apoderado de toda
a riqueza social e organizado, eles próprios, a produção e o consumo, no
interesse de todos, sem esperar que a iniciativa venha do governo, que, de
resto, é incapaz de fazê-lo (Malatesta, 1903).
Unabomber (1995) contrasta com a idéia de Malatesta, de certa forma
indo no cerne do consumo. Afirma que “tudo que podemos fazer é delinear de
uma forma geral as medidas que aqueles que odeiam o sistema industrial
deveriam tomar para preparar o caminho para uma revolução contra esta forma
de sociedade. Não deve ser uma revolução POLÍTICA. Seu objeto não será
derrubar governos, mas as bases econômicas e tecnológicas da sociedade
atual”.
Tem-se então que o capitalismo, o consumismo e o governo agem em
conjunto para sustentar as bases econômicas. Em contrapartida, o proletariado
não tem preparação ideológica para assumir uma humanidade com bases mais
libertárias. "O melhor governo é o que absolutamente não governa , e quando
os homens estiverem preparados para ele, tal será o tipo de governo que terão.
Na melhor das hipóteses, o governo não é mais do que uma conveniência,
embora a maior parte deles seja, normalmente, inconveniente − e, por vezes,
todos os governos o são”(Thoreau, 1849).
A MODERNIDADE E SUA HERANÇA
Os pilares da modernidade criaram valores como a crença na verdade,
alcançável pela razão, e na linearidade histórica rumo ao progresso. Foi
também ela convencionou o mecanicismo como a maneira de se „ler‟ o mundo.
Não é por nada que por tanto tempo se ignorou as conseqüências do avanço
tecnológico. O mundo era visto como uma máquina e o natural como algo a
parte.
Unabomber percebe as condições anormais que „caracterizam as
sociedade industriais modernas‟, “a excessiva densidade populacional, o
isolamento do homem da natureza, o excesso de rapidez nas mutações
socieais e o desaparecimento das pequenas comunidades naturais, como o
clã, a aldeia ou a tribo”. A sociedade moderna aglomerou então as pessoas,
homogeneizando seus comportamentos e trazendo o desenvolvimento a frente
das necessidades e anseios individuais.
Giddens (1991) ao estudar Marx, Durkheim e Weber conclui que o
trabalho industrial da modernidade era considerado por ambos como
degradante. Entretanto, não foi previsto que existia um potencial destrutivo
imenso em relação ao meio ambiente.
Além disso, o totalitarismo, freqüente nos estados-nações modernos
emergentes, aliava-se ao militarismo e construiu um ambiente mais que hostil,
associado a degradação e a exploração das reservas naturais. “O tirano não
opõe a liberdade do homem à sua necessidade, mas sim a liberdade do
homem ao constrangimento, à passividade (Rotenberg, 2000)”. Uma nação que
utiliza da tirania, do armamento e das disputas armadas, além do alto custo do
desenvolvimento rápido „custo o que custar‟, está fadada a uma degradação e,
condicionando de certa forma a população a acreditar que esta é a maneira
que se deve conduzir uma sociedade „evoluída‟.

DISCUTINDO CONVENÇÕES

O que é este governo americano senão uma tradição, embora recente,


que se empenha em passar inalterada à posteridade, mas que perde a cada
instante algo de sua integridade? Não possui a vitalidade e a força de um único
homem vivo, pois pode dobrar−se à vontade deste homem. É uma espécie de
arma de brinquedo para o povo, mas nem por isso menos necessária, pois o
povo precisa ter algum tipo de maquinaria complicada, e ouvir sua algazarra,
para satisfazer sua idéia de governo. Assim, os governos demonstram até que
ponto os homens podem ser enganados, ou enganar a si mesmos, para seu
próprio benefício. Isto é excelente, devemos todos concordar. E no entanto,
este governo, por si só, nunca apoiou qualquer empreendimento, a não ser
pela rapidez com que lhe saiu do caminho. Ele não mantém o país livre. Ele
não povoa o Oeste. Ele não educa. O caráter inerente ao povo americano é
que fez tudo o que foi realizado, e teria feito ainda mais se o governo não
houvesse às vezes se colocado em seu caminho. Pois o governo é uma
conveniência pela qual os homens conseguem, de bom grado, deixar−se em
paz uns aos outros, e, como já se disse, quanto mais conveniente ele for, tanto
mais deixará em paz seus governados. Se não fossem feitos de borracha, o
comércio e o tráfico em geral jamais conseguiriam superar os obstáculos que
os legisladores continuamente colocam em seu caminho. E se tivéssemos que
julgar estes homens inteiramente pelos efeitos de seus atos, e não, em parte,
por suas intenções, eles mereceriam ser punidos tanto quanto aquelas pessoas
nocivas que obstruem as ferrovias (Thoreau, 1849).
Thoreau enxergou como ninguém o problema de um pensamento
estabelecido, um órgão consolidado, e a total falta de questionamento e inércia.
Não é porque existe uma sociedade organizada, com caminhos traçados e
cargos a serem preenchidos, para se dar continuidade à maquinaria social, que
se deve imaginar que esta maneira pré-estabelecida deve ser obedecida e
tornar indissociável e imutável nossa maneira de habitar e conduzir o planeta.
Muito facilmente se indica como Utopia, tudo aquilo que parece ser
inalcançável e virtualmente inconveniente para a humanidade. Abalar todas as
bases e costumes da sociedade é uma tarefa realmente complicada e
desafiadora, pois invade as ideologias e dogmas mais profundos. Todavia,
numa situação sem precedentes de decadência social e ambiental, é
necessária uma profunda reavaliação das condutas das massas.
Para se chegar a sustentabilidade é necessário não apenas a avaliação
da trajetória da humanidade que conduziu-a a este lamentável quadro
irrecuperável. É necessário começar novamente, destruindo os pilares mais
antigos e injustos que formaram nossas nações. Do Deus tirano ao Estado
tirano se encontram falhas ideológicas que promovem a ordem injusta e
ideologicamente engessada. Pode-se ter um governo que luta em prol dos
seus governados, pode-se ter um Deus que acolhe seus fiéis, mas tem-se a
miséria irrecuperável para tantos e o inferno, sem direito a perdão posterior,
para os pecadores, independente de seus motivos.
A liberdade, que nos é inata, aparentemente só existe no mundo das
idéias. Não se pode morar nem viajar para qualquer lugar, sem premissas
burocráticas por convenções seculares. Tornaram nossos recursos
propriedades inquestionáveis e, o desenvolvimento tecnológico e econômico
contrapõe as necessidades do povo. O mesmo, se vê fadado a sobrevivência,
impossibilitado de desenvolver-se na educação e na crítica/percepção da
problemática mundial injusta.
Também, o mesmo governo e a mesma indústria suja não irá
repentinamente mudar e revolucionar a humanidade. Entretanto, não se pode
negar, nem ignorar a possibilidade de evolução quando se há uma intensa
pressão ambiental. O regresso ao mundo natural, o freio desenvolvimentista e
finalmente o primitivismo, como precursor das primeiras sociedades humanas,
poderia ser a perspectiva que falta à nossa sociedade. Chegará um momento
que não será mais uma problemática na escolha. Em algum instante, as
pessoas não terão mais opções e, para sobreviver, se possível, ao que restou
do planeta exaurido de recursos, completamente consumido, terão que
reconstruir novamente, com outras bases, a maneira como se pensa a
sociedade e a organização da nossa, infeliz família, humanidade.

REFERÊNCIAS

BAKUNIN, Mikhail Aleksandrovich. Deus e o Estado. São Paulo: Cortez, 1988.

DUPAS, Gilberto (org). Meio Ambiente e Crescimento Econômico: tensões


estruturais. São Paulo: Editora UNESP, 2008.

GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo: Editora


da Universidade Estadual Paulista, 1991.
JACOBI, P. Cidade e meio ambiente. São Paulo: Annablume, 1999.

MALATESTA, Errico. Programa Anarquista. 1903.

PROUDHON, Pierre-Joseph. A Propriedade é um Roubo: e Outros Escritos


Anarquistas. Editora L&M Pocket. 2005.

ROTENBERG, Izrael. História da Insensatez Humana. 2000.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. 1762. Disponível em: <


www.cfh.ufsc.br/~wfil/contrato.pdf >

THOREAU, Henry David. A Desobediência Civil. Editora Martin Claret, 2005.

UNABOMBER. A Sociedade Industrial e Seu Futuro. Manifesto de


„Unabomber‟. 1995. Disponível em: <http://www.scribd.com/doc/3844781/A-
SOCIEDADE-INDUSTRIAL-E-SEU-FUTURO-Manifesto-de-Unabomber?page=9>

ZERZAN, John. Futuro Primitivo. Sabotagem, 1999.

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