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CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA
CONTEMPORÂNEA DO BRASIL CPDOC
CURSO DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM BENS
CULTURAIS E PROJETOS SOCIAIS
CINEMA NA ROÇA: CAMINHOS E DESCAMINHOS DE UMA
EXPERIÊNCIA CULTURAL EM MUNICÍPIOS FLUMINENSES
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro de Pesquisa e
Documentação de História Contemporânea do Brasil – CPDOC para a obtenção do
grau de Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais.
MARCELO ANTUNES FERREIRA
Rio de Janeiro, setembro de 2007
1
2
Resumo
O trabalho a seguir compreende a análise da descrição do projeto Cinema na
Roça, que foi desenvolvido para realizar exibições gratuitas de filmes em
localidades do interior do estado do Rio de Jeneiro, desprovidas de cinemas e
videolocadoras.
O projeto foi inciado em agosto de 2005 e o presente estudo está pautado na
observação dos acontecimentos ao longo da realização das sessões mais
significativas para o projeto.
3
Abstract
The following work represents the analisys of Cinema na Roça project’s
description. It was developed to produce free films exhibitions in small towns of the
state of Rio de Janeiro.
The project was started in the beginning of 2005 and this study is based on
the facts observation along the most significant sessions.
4
Ao meu querido tio Ademar Luciano
Ferreira, que há mais de trinta anos
realizava sessões de cinema no interior de
Minas Gerais.
5
Agradecimentos
Essa dissertação somente se tornou possível porque, ao longo dos cinco anos que
separam a idéia de iniciar o Cinema na Roça e o dia de hoje, várias pessoas doaram
um pouco de suas vidas, estendendo a mão a um sonhador. São tantas que temo
pecar por falta de zelo ao relacionálas.
Aos amigos Demian Asensi, Fernanda e Marcos Alexandre Forte, Paulo Gustavo
Mangueira e Vagner Pontes, por aceitarem o convite para dar o pontapé inicial do
projeto.
À Adriana Stoppelli e ao Daniel de Almeida e Brito pelas horas em que me
aguentaram falando, sem parar, dessa idéia de levar o cinema para lá e para cá.
Ao Luiz Claudio Pinto Anjos, que sempre esteve presente. Foi o braço forte e
incansável que inúmeras vezes ajudou na realização das sessões.
À Ester Farinha que apostou na idéia e ajudou a transformála em realidade.
À minha mãe Anajô pelo apoio incondicional e pela constante torcida. Ao meu pai
Athus pela paciência, mesmo nos dias mais difíceis.
Ao Marcos Martinelli, amigo e sócio, que esteve presente em todos os momentos,
dividindo tristezas e alegrias, sem o qual metade desse trabalho não teria
acontecido.
Apesar de eu não ficar à altura das inúmeras sugestões de enriquecimento a esse
trabalho, agradeço imensamente as sugestões das professoras Ilana Strozenberg e
Mônica Kornis, por ocasião da qualificação do projeto dessa dissertação.
À minha orientadora Verena Alberti pelo esmero, pela atenção, pela paciência, pela
enorme ajuda e, acima de tudo, pelos momentos de reflexão que me proporcionou
com seus questionamentos.
6
Sumár io
Intr odução.............................................................................................. 8
Capítulo 1 – O pr ojeto inicial .............................................................. 12
1.1 O que era idéia .............................................................................................12
1.2 Como surgiu.................................................................................................13
1.4 Pressupostos.................................................................................................17
Capítulo 2 – Uma descr ição do projeto............................................... 23
2.1 Silva Jardim..............................................................................................24
2.2 São José do Vale do Rio Preto...................................................................53
2.3 Sumidouro ................................................................................................59
2.4 Santa Maria Madalena ..............................................................................69
2.4 Casimiro de Abreu ....................................................................................79
2.5 Trajano de Moraes ....................................................................................88
Capítulo 3 As tr ansfor mações do pr ojeto......................................... 97
3.1. O critério IDH...........................................................................................98
3.2. O critério videolocadoras e cinemas ..........................................................99
3.3. Cinema e entretenimento.........................................................................101
3.4. Locais de exibição ..................................................................................103
3.5. Acervo de filmes .....................................................................................105
3.6. O nome do projeto ..................................................................................108
3.7. Desmembramento do Cinema na Roça....................................................109
3.7.1. Cinema Social .................................................................................110
3.7.2. Cinema na Escola ............................................................................111
3.8. A característica comercial .......................................................................112
Consider ações Finais ......................................................................... 116
Anexo .................................................................................................. 125
Refer ências Bibliogr áficas ................................................................. 148
7
Intr odução
Cerca de trinta anos se passaram e, um dia, ele, literalmente, acorda para a
vida. Cercado de dúvidas e incertezas, levantase da cama, caminha até a varanda,
dá uma boa olhada no mar azul à sua frente e mais uma pergunta lhe vem à mente.
Qual o significado da vida sem uma causa?
Só mais uma inquietação! Recobra os sentidos, voltase ao mundo, toma um
banho, resfria a cabeça, vestese e parte ao trabalho. Dia após dia sua vida segue,
ainda lhe falta.
Aquela manhã poderia ser apenas o início de mais um dia de inquietações.
Ao chegar ao trabalho tudo está transfigurado. Paredes perdem o colorido, ganham
definitivamente, vira adeus e chega a hora de partir.
Diferente do que parecia, este não era apenas mais um dia na vida de um
José, um Manoel, um Joaquim, ou qualquer outro cidadão. Definitivamente sua vida
estava mudada. Aquilo que o constituiu assumiria seu passado e agora surgia a
necessidade de reinventar sua própria história. O primeiro passo fora dado. E os
seguintes, como seriam?
De volta à mesma varanda que o confortara em momentos de angústia,
8
mais o mesmo indivíduo diante de uma grande questão. E agora, o que fazer para
mudar?
Neste cenário nasce a vontade de juntar coisas prazerosas às úteis, porém
uma solução repousava tranquila à espera do angustiado. Revendo seus prazeres
percebeu a importância da imagem em sua vida e das emoções que viveu assistindo
a filmes. Eis que, de repente, como uma inspiração divina, surgiu a hipótese de
dividir estes sentimentos. Entretanto, qual o sentido disso?
Esse, que o texto acima apresenta, poderia ser qualquer um, porém me
apodero da situação e apresento esta parte da minha história, com o compromisso
de tornar público meu comprometimento direto com o conteúdo exposto nesse
trabalho.
Destas inquietações surgiu o que é hoje o projeto Cinema na Roça, o qual é
parte de mim, assim como sou parte dele. Nasceu da necessidade de contribuir para
que o mundo seja um lugar mais equânime e, resguardadas as limitações, este foi
um dos primeiros passos neste sentido.
muitas vezes desprovidas de energia elétrica, de equipamentos culturais, de escolas,
de serviço médico etc. e, ao encontrálas, convidar os moradores, montar um
citadinos das metrópoles e inusitada aos municípios do interior, de assistir
gratuitamente a um filme.
Com o presente trabalho pretendo analisar a relação entre o projeto Cinema
na Roça e seu público. Através da construção dessa dissertação pretendo
assirtir a filmes nas proximidades da sua casa.
9
Na busca por essa resposta pretendo apoiarme nas refleões estimuladas pela
leitura de alguns autores que serão apresentados nas páginas seguintes. No entanto,
vale ressaltar, nesse momento, duas dicas de Cliffort Geertz, em A interpretação
pela armadilha de tentar extrair do todo apenas os aspectos aparentemente
alegação de que essas são apenas as partes que interessam à pesquisa, pode levála à
surperficialidade.
A outra dica importante é estar atendo ao fluxo dos comportamentos, pois,
segundo Geertz, é “através do fluxo do comportamento – ou, mais precisamente, da
ação social – que as formas culturais encontram articulação”. 1
Nesse contexto entendo que a falta de coerência no desenrolar da estória
“não pode ser o principal teste de validade de uma descrição cultural” 2 e o
entendimento dessas questões é importante para pontuar a dificuldade que encontrei
durante a confecção do presente trabalho.
que, ao longo do tempo, foi se adequando às suas limitações. A tentativa idealista
de estimular a transformação social através desse equipamento cultural foi extinta.
Atualmente o projeto visa suprir a demanda por entretenimento nessas localidades.
A transformação do Cinema na Roça não seguiu uma trajetória linear,
forçandoo a ser modificado algumas vezes até que assumisse seu papel atual.
Durante esse processo de transformação, várias questões foram se formando e para
1
GEERTZ, Clifford. 1989, p. 12
2
GEERTZ, Clifford., 1989, p. 13
10
seguir pretende preencher algumas dessas lacunas, como, por exemplo: o que
realmente significa essa experiência para as pessoas que têm a oportunidade rara,
quiçá única, de vivenciar a experiência de assistir a um filme ao ar livre com uma
estrutura semelhante à de um cinema? Será que a experiência tem alguma
relevância para essas pessoas? Se tem, qual? Será que a vivência se traduz em
utilidade para essas pessoas?
das reflexões geradas por essa dissertação, pretendo enfrentar o desafio de realizar
uma avaliação da importância do projeto para decidir por sua continuidade ou sua
interrupção.
contribuíram para a realização das sessões. Para alcançar esse objetivo revisitarei as
anotações do meu caderno de campo, com o intuito de construir uma descrição do
Cinema na Roça, abordando desde a sua concepção até as transformações que
sofreu ao londo tempo para, a partir de então, estabelecer as reflexões.
11
Capítulo 1 – O pr ojeto inicial
1.1 O que era idéia
que realiza exibições gratuitas de filmes nacionais, em propriedades privadas de
reúnem os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH’s 3 ) do estado do
Rio de Janeiro e que distem pelo menos 80 km da capital. Possui característica
itinerante, se configura pelo uso doméstico da imagem – principalmente pela
gratuitade das sessões e por serem realizadas em locais privados – e conta com uma
estrutura montada a partir de um veículo de médio porte, no qual é fixada a tela e
ser realizadas ao ar livre, sempre à noite e, inicialmente, eu pretendia percorrer os
municípios em um ano, em uma viagem ininterrupta e com exibições diárias.
explorando a experiência vivida pelos personagens dos filmes, através da criação de
debates ao término de cada sessão. Outro objetivo era tornar esse equipamento
3
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano. Denominação dada ao indicador criado pelo
economista paquistanês Mahbub ul Haq e utilizado pelo PNUD/ONU para mensurar o nível de
desenvolvimento humano mundial. Consultado em http://www.pnud.org.br/idh/ em 07/07/2007.
4
“Equipamento cultural” é a designação dada pelo IBGE ao aparato e/ou infraestrutura
disponibilizadora de acesso às atividades culturais. O estudo do IBGE sobre o qual se apóia este
trabalho avalia 17 tipos distintos de equipamentos culturais: bibliotecas públicas, estádios ou
ginásios, clubes e associações recreativas, videolocadoras, lojas de discos, CDs e fitas, bandas de
música, livrarias, rádio FM, provedor de internet, rádio AM, unidades de ensino superior, teatros,
museus, cinemas, geradora de TV, shopping center e orquestra. Ver MUNIC 2001, p. 138.
12
realidades rural 5 e urbana, através de filmes que tinham a desigualdade social
brasileira ou a dicotomia campo versus cidade como pano de fundo ou em suas
temáticas centrais.
Um quarto objetivo visava resolver uma necessidade de registrar o Cinema
na Roça através de imagens e viabilizar uma parceria com o projeto Cinemaneiro 6 –
que é um projeto social que atua na formação profissional de jovens de
com isso, preparar material suficiente para a realização de uma exposição
fotográfica e videográfica ao final do primeiro ano do projeto.
Sempre gostei de assistir a filmes e de usálos para estimular debates sobre
os temas que apresentavam. Sendo assim, a idéia do Cinema na Roça – não com
esse nome e formato – surgiu em algum momento entre os anos de 1999 e 2002,
quando eu era gerente de treinamento de uma empresa de telecomunicações e
residia em Macaé.
existente no município àquela época, comecei a convidar alguns amigos para as
sessões de cinema que organizava em minha casa. Paralelamente às sessões, surgiu
minha inquietação, associada à dos amigos Demian Asensi e Vagner Pontes, em
assistenciais no município – como a distribuição de alimentos à população de rua e
5
Para esse trabalho seguimos o mesmo critério utilizado na classificação das populações urbana e
rural. Ver PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2003, p.16.
6
Para mais detalhes ver www.cinemaneiro.com.br.
13
a associação ao Amigos da Escola 7 – e, procurando somar mais efetivamente e
através de uma atividade prazerosa, comecei a pensar uma proposta que me
permitisse estimular a discussão sobre questões sociais com a comunidade.
criarmos um grupo de palhaços para alcançarmos o objetivo proposto acima. No
entanto, após tomar conhecimento da carência de oferta de equipamentos culturais
no Brasil e da ausência do cinema em 92% dos municípios brasileiros através do
Municipais de 2001 publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
encontrar uma forma de sensibilizar as pessoas para a discussão que eu propunha.
Vislumbrava a possibilidade de valerme do que seria uma novidade para estimular
a discussão de temas que eu julgava pertinentes.
Outro fator importante para o surgimento do Cinema na Roça foi o prazer de
viajar e, entre esses mesmos três anos, tive a oportunidade de percorrer 25.000 km
essas viagens percebi o fascínio dos jovens com a vida nas metrópoles e o interesse
julguei importante procurar dissuadilos dessa decisão, estimulálos a repensarem a
dificuldades de colocação no mercado de trabalho dos grandes centros.
Em 2002, quando saí de Macaé e voltei a morar no Rio de Janeiro, havia
apenas uma idéia, e foi nesse ano que, na comunhão de três coisas que me geravam
14
que julgava importante – promover discussões sobre uma realidade social brasileira,
surgiu a idéia de projetar filmes para pessoas que não tivessem acesso ao cinema.
1.3 Cr itérios de definição do projeto
Uma vez concebida a idéia de levar o cinema para as pessoas que não
questões. A primeira delas era saber a quem levar o cinema e, como um dos
pressupostos era levar o cinema a quem não tivesse acesso, eu precisava descobrir
onde viviam essas pessoas. Considerando os dados da MUNIC 2001 – a presença
de cinemas em apenas 8% do total de 5.560 municípios no Brasil –, haveria 5.115
possibilidades, e eu precisava estabelecer um recorte para a atuação da iniciativa
que viria a ser criada.
justificativa para priorizar uma localidade em detrimento de outra, visto que a
carência de cinemas atingia quase todo o país. Para restringir o foco de atuação,
fazendo com que esse número caísse para 64% dos municípios brasileiros 8 . Porém,
mais à frente percebi que essa restrição ainda mantinha o espectro de municípios
muito grande. Resolvi então aliar ao critério de inexistência de videolocadoras o
vontade de participação no desenvolvimento social e concluí que, ao pautar a
decisão no IDH, atenderia a esse anseio.
8
Ver Munic 2001.
15
A terceira a ser respondida era como levar a estrutura de cinema para essas
localidades, visto que grande parte das elencadas se situava em locais de difícil
criar uma pequena estrutura que pudesse ser transportada facilmente.
contempladas. Estipulei um raio mínimo de 80 Km de distância em relação à cidade
do Rio de Janeiro, com a intenção de retirar do foco do projeto municípios que,
mesmo tendo um baixo IDH, estivessem mais claramente sob a área de influência
da metrópole do estado.
Assim, os municípios escolhidos para o Cinema na Roça foram VarreSai, São
Francisco de Itabapoana, Cardoso Moreira, Laje do Muriaé, Sumidouro, Duas
Barras, São José de Ubá, São José do Vale do Rio Preto, São João da Barra, São
Sebastião do Alto, Trajano de Moraes, Italva, Porciúncula, Silva Jardim, Quissamã,
ressaltar que, como o período escolhido para a análise do IDH foi compreendido
entre 1991 e 2000, o município de Quissamã, apesar de estar contemplado pelo
Cinema na Roça, destoa dos demais face ao crescimento econômico atual.
Inicialmente o nome Cinema na Roça foi escolhido por causa da caraterística
rural das comunidades que seriam contempladas pelo projeto, que baseiam sua
economia na atividade agrícola e pelo motivo de eu identificar a palavra roça como
16
1.4 – Pr essupostos
a) Distribuição dos equipamentos culturais
culturais brasileiros era um dificultador para o desenvolvimento social ordenado e,
ao longo do tempo, encontrei respaldo para essa crença a partir da leitura do
Relatório do Desenvolvimento Humano 2004, publicação do Programa das Nações
econômico como importante difusor cultural mundial.
Segundo o relatório, devemos entender liberdade cultural como a capacidade
que todas as pessoas devem ter de perceber a sua identidade, escolher a maneira
pela qual querem viver e decidir quem desejam ser, sem perder o respeito dos
outros e seus direitos por essas escolhas. 9
Eu considerava também que o predomínio da difusão de filmes norte
americanos era um fator de inibição da liberdade cultural. Somente no ano de 2000,
os EUA geraram excedentes da ordem de 8,1 mil milhões de dólares no comércio
de audiovisual com a União Européia. Em 2003, na indústria cinematográfica, as
produções norteamericanas representavam cerca de 85% das audiências de cinemas
de todo o mundo 10 .
9
Ver PNUD, 2004, p.1.
10
Mishra, Pankaj. 2003. “Hurray for Bollywood.” The New York
Times. In PNUD, 2004, p.86.
17
Sendo assim, concluí que, uma vez que desenvolvimento cultural e
nacionais, estaria difundindo a cultura brasileira e, consequentemente, contribuindo
para o processo de desenvolvimento social.
b) A relação entre baixo IDH e ausência de cinema
A escolha dos municípios para a exibição dos filmes seguiu o critério do IDH
ausência de equipamentos culturais. De acordo com os dados da MUNIC 2001, “a
distribuição dos equipamentos culturais pelo País segue a lógica de ocupação
desigual do território e expressa as suas desigualdades socioeconômicas” 11 , fazendo
com que os municípios mais populosos e com melhores condições de renda – entre
outros – apresentem a mais ampla infraestrutura de atividades culturais. Ao me
deparar com esses dados, considerei a possibilidade de direcionar o projeto aos
estados do Maranhão e do Piauí, devido à concentração dos baixos IDHs desses
estados entre os 20 menores índices do país. Porém, além das limitações
orçamentárias, verifiquei que o Rio de Janeiro reunia localidades com o mesmo
nível de carência e que permanecer no estado viabilizaria o início e atenderia aos
propósitos do projeto.
c) Direito constitucional
11
Ver MUNIC 2001. p 151.
18
Além dos motivos elencados acima, há o direito constitucional do cidadão
brasileiro, pois a Constituição Federal de 1988, na seção II, artigo 215, prevê que é
dever do Estado garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às
fontes de cultura nacional, devendo apoiar e incentivar a valorização e a difusão das
realidade é bastante diferente. Como podemos comprovar a partir das informações
contidas na MUNIC 2001, há uma grande disparidade na distribuição dos
litorâneas. Rio de Janeiro, Ceará e Pernambuco aparecem como estados que
constituem uma exceção e “apresentam maior infraestrutura do que a esperada” 13 ,
indicador de renda avaliado” 14 na pesquisa.
d) A migração em direção aos grandes centros
percebi a predisposição dos jovens para abandonarem suas cidades com destino aos
grandes centros, e a principal justificativa que encontrei para a emigração foi a falta
de oportunidades de trabalho. Porém, ao comparar a justificativa com dados
apresentados por Marcio Pochmann 15 em seu artigo “A exclusão social no Brasil e
no mundo” (Pochmann, 2004), em que apresenta um “crescimento médio anual
12
Para mais detalhes ver http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm
13
Ver Munic 2001. p 151.
14
Idem.
15
O autor é professor livredocente do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos
Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas. Até 2004 foi
secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do Município de São Paulo.
19
pífio” da renda per capita no Brasil entre os anos 1980 e 2000 e o movimento de
metropolização da probreza, percebi que essa vontade poderia significar um
percepção dos jovens nessas localidades, Marcio Pochmann aponta ainda nesse seu
artigo que os grandes centros, apesar de ainda representarem um destino do
movimento migratório, “assumiram o papel mais recente de centros de desemprego,
poluição, enchentes e violência” 16 .
1.5 Operacionalização do projeto
No ano de 2003, o projeto Cinema na Roça estava praticamente concebido.
captação de recursos.
Nesse período, o terceiro setor – que é considerado como uma organização
da sociedade civil em setor da economia não governamental e não lucrativo 17 –
vivia um momento de euforia com a possibilidade de estabelecimento de termos de
parceria, que são como contratos de prestação de serviços, porém para fins sociais,
firmados entre o poder público e entidades sem fins lucrativos – e por conseguinte
com o aporte de montantes do erário para atividades desenvolvidas por
organizações dessa natureza.
que tornálo um projeto de uma entidade sem fins lucrativos traria maior respaldo
para a iniciativa e encurtaria algumas etapas no processo de captação de recursos,
16
Ver POCHMANN. p. 161.
17
Ver Rede de Informações para oTerceiro Setor. www.rits.org.br
20
motivei um grupo de cinco amigos e fundamos uma organização não governamental
(ONG) chamada Associação Civil Conhecimento Solidário, doravante denominada
Conhesol. Porém, os planos iniciais não se confirmaram, pois, para o
estabelecimento dos termos de parceria se fazia necessário o cumprimento de uma
série de exigências – sendo a principal adquirir o título de Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) –, que demandavam tempo e recursos
de que não dispúnhamos.
Outro ponto importante a ser ressaltado era a própria fundação da ONG,
pois seu processo fora iniciado ao revés. Normalmente uma ONG é fundada para
concatenar ações em andamento ou idéias que atendam a uma determinada causa.
No nosso caso, imagináramos que a Conhesol serviria apenas para atender as
porém, conforme acordado durante o processo de fundação da ONG, além de mim
apenas o Marcos Martinelli participou das exibições.
Em 2006, já descrente dos benefícios que a Conhesol poderia nos
proporcionar, devido à morosidade do processo de obtenção do título, à burocracia
muito extensa e ao fato de não termos tempo suficiente e nem recursos financeiros
necessários para cumprir todas as exigências para o pleito ao título de OSCIP,
resolvi reunir as minhas atividades profissionais às sociais e, juntamente com o
Paulo Gustavo Moraes Mangueira, um dos fundadores da ONG, constituímos a
Brasil Social, uma empresa privada que tem o objetivo de desenvolver e financiar
projetos sociais.
Com a fundação da Brasil Social, paralisamos as atividades da Conhesol,
transferimos para a empresa algumas atividades realizadas pela ONG e o Cinema na
Roça passou a ser o principal projeto financiado. Além disso, deixou de ser
21
realizado apenas voluntarimente e, depois de incorporado ao portifólio de atividades
da Brasil Social, passou a ser oferecido comercialmente para as prefeituras e
empresas interessadas em vincular suas marcas ao projeto.
22
Capítulo 2 – Uma descr ição do projeto
O que inicialmente parecia ser uma idéia simples não transcorreu dessa
forma. O primeiro comentário que retirei do meu caderno de campo dizia: “começar
o projeto é mais difícil do que se imagina”. Foram três anos entre o advento da idéia
data da primeira exibição e o presente momento foram realizadas 43 sessões,
reunindo, em média, 60 espectadores cada vez. No total foram percorridos em torno
de 7.000 Km pelo do estado do Rio de Janeiro – o que equivale à distância de quase
toda a costa brasileira.
As projeções foram realizadas nas localidades de Aldeia Velha, Gaviões,
Cesário Alvim, Mato Alto, Bananeiras, Cambucaes e Lagoa de Juturnaíba, em Silva
Jardim, e nas localidades de Soledade I, Soledade II, Soledade III, Porteira Verde e
Campinas, em Sumidouro. Em São José do Vale do Rio Preto exibimos em Pouso
Alegre e participamos da Calçada da Cultura, um evento público semanal que reúne
diversas manifestações culturais. Em Santa Maria Madalena realizamos sessões em
Sossego do Imbé, Triunfo e em Ribeirão Santíssimo. No município de Trajano de
Moraes, as sessões foram em Ponte de Zinco, Dr. Elias ou Monte Café, Tirol, na
Tapera e na sede do município. Já em Casimiro de Abreu foram em Palmital, Rio
Dourado e Professor Souza.
Durante esse período, o Cinema na Roça foi objeto de reportagem nos
jornais Jornal da Cidade (Silva Jardim), em setembro de 2005; Folha da Terra
(Região dos Lagos), em 5 de novembro de 2005; Foco (Sumidouro), em 17 de
fevereiro de 2006; O Globo (Globo Tijuca), em 25 de maio de 2006. Também foi
assunto na Rádio Costa do Sol (Região dos Lagos), em 27 de agosto de 2005; do
23
programa Fim de Tarde 101, na rádio FM 101 (Macaé), em maio de 2007, e no
programa Sem Censura da TVE, em 6 de junho de 2006. Em outubro de 2006, a
revista 4x4 & Cia fez uma reportagem sobre o Cinema na Roça e, em novembro de
trabalho realizado com o Cinema na Roça na Adventure Sports Fair, em São Paulo
– feira anual que reúne as novidades em aventura, esportes radicais e atividades
Macaé, que consiste num dos maiores eventos brasileiros voltados para a indústria
do petróleo.
realização das exibições nas localidades mais significativas a esse trabalho. Me
deterei nos trâmites para a realização das sessões, no relacionamento com as
pessoas das localidades que se envolveram com o Cinema na Roça e na reação dos
aspectos que julguei interessantes nesses dois anos de realização do projeto.
2.1 Silva Jardim
(0,731) 18 . Dista cerca de 110 km da cidade do Rio de Janeiro, em direção ao norte
do estado. Faz divisa com os municípios fluminenses de Rio Bonito, Araruama,
Casimiro de Abreu, Nova Friburgo e Cachoeiras de Macacu. Atualmente, o prefeito
18
Para mais detalhes ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 e Atlas do
desenvolvimento humano.
24
é Augusto Tinoco, filiado ao extinto Partido da Frente Liberal (PFL), atual
Democratas (Dem), reeleito em 2004 com 4.831 votos. A Câmara Municipal é
formada por nove Vereadores. 19
compreende a zona urbana de Silva Jardim, os povoados de Cesário Alvim e de
Imbaú. O segundo distrito é composto pelo povoado de Bananeiras; o terceiro, por
Gaviões, e o quarto, por Aldeia Velha.
No município de Silva Jardim foram realizadas 18 sessões entre os meses de
julho e outubro de 2005, nas localidades de Aldeia Velha, Gaviões, Bananeiras,
Mato Alto, Vargem Grande, Juturnaíba, Cesário Alvim, Cambucaes e Silva Jardim
(sede). Aldeia Velha, Gaviões, Vargem Grande e Bananeiras são localidades que
ficam à esquerda – sentido norte – da rodovia BR 101, que atravessa o município.
São afastadas do centro de Silva Jardim e, para alcançálas – exceto Aldeia Velha –,
percorremse cerca de 50 km por estradas de terra de difícil acesso, principalmente
nos períodos chuvosos. Já Juturnaíba, Cesário Alvim, Cambucaes e Mato Alto
ficam à direita da rodovia – sentido norte – e são de fácil acesso. Chegase a
Cesário Alvim por estrada asfaltada. Mato Alto é uma localidade que se encontra a
pouco mais de 4 km do centro. Para acessar Juturnaíba são 12 km de estrada de
terra, que se inicia próximo ao centro de Silva Jardim. Cambucaes – também à
direita da rodovia BR101 – teve sua origem em um assentamento de agricultores e
fica a cerca de 10 km da margem da estrada que liga a sede do município à BR101.
A escolha de Silva Jardim como primeiro município decorreu de sua
proximidade com a cidade do Rio de Janeiro e da facilidade contato. Na época, eu
19
Para mais detalhes ver www.tse.gov.br.
20
Para mais detalhes ver http://www.silvajardim.rj.gov.br/lei1999.html.
25
integrava um grupo chamado Caminhos da Solidariedade – formado por amigos que
não têm relação alguma com o Cinema na Roça – e nos dispúnhamos a realizar
locais desprovidos de postos de saúde ou de médicos de determinadas
especialidades, doação de roupas, alimentos e material escolar, entre outros.
Em um desses encontros conheci uma representante do Conselho Tutelar da
cidade, a Rose, a quem apresentei a idéia de realizar sessões de cinema abertas ao
proposta também poderia interessála.
Minha primeira visita ao município com o intuito de viabilizar o projeto foi
em março de 2005. Nessa ocasião houve uma reunião com a secretária Taísa
Magdalena, na qual apresentei o projeto e os custos envolvidos nas projeções, pois
imaginávamos poder contar com algum apoio do município no tocante aos gastos
com combustível, alimentação, hospedagem e licenças para exibição dos filmes que
não fizessem parte do nosso acervo. Apesar de Taísa Magdalena demonstrar
interesse pela idéia, essa reunião não rendeu muitos resultados no âmbito da
Secretaria de Turismo, mas permitiu que eu conhecesse Rosilane Brum, que
participou da reunião a convite de Taísa e que, à época, era diretora da Casa de
Cultura de Silva Jardim. Vale ressaltar que o município não possui Secretaria de
Cultura e, assim como muitos outros do estado do Rio de Janeiro, possui um órgão
vinculado à Secretaria de Educação e seu gestor tem status de secretário, apesar de
não ser.
Ao tomar ciência dos propósitos do projeto, Rosilane Brum começou a se
engajar na viabilização do Cinema na Roça. O primeiro passo foi sensibilizar o
26
secretário de Educação para a importância que ela julgava que o projeto tinha para o
secretário de Educação Jorge Alves dos Santos alegou não ter orçamento para o
custeio. Com isso, Rosilane Brum iniciou as negociações com outras secretarias, a
fim de levantar recursos que possibilitassem a realização do Cinema na Roça em
Silva Jardim. Com a Secretaria de Obras conseguiu o combustível e, com a de
Turismo, parte da hospedagem. Os gastos com alimentação e a outra parte da
hospedagem foram patrocinados pela Casa da Cultura, e os demais custos cobertos
por nós.
Embora pareça simples para um município de 23.000 habitantes possuir
procedimentos e recursos para custear uma atividade como o Cinema na Roça,
nossa passsagem por Silva Jardim não demonstrou isso. Segundo as conversas
informais que tive com Rosilane Brum, foram vários os sacrifícios para a realização
do projeto no município. O primeiro empecilho que enfrentou foi a negociação com
nossa alimentação e hospedagem eram pagas com as reservas financeiras da Casa
de Cultura destinadas ao pagamento de pequenas despesas, porém, como o depósito
dessa verba permanecia em constante atraso, algumas vezes Rosilane foi obrigada a
abastecer o caixa com verba pessoal para garantir a continuidade do projeto,
conforme me confidenciou após o término das exibições no município.
Aurélio foi o funcionário lotado na Casa de Cultura designado a nos
representando o poder público local sempre que Rosilane Brum não estava
alguns aspectos levantados por Clifford Geertz em “Uma descrição densa: por uma
27
teoria interpretativa da cultura” (GEERTZ, 1989). Nesse texto, Geertz chama a
atenção para vários pontos interessantes, e eu gostaria de ressaltar dois, nesse
coisas. 21
Durante as primeiras visitas ao município, Aurélio se mostrou muito
interessado em nos acompanhar em todas as localidades e apresentarse como um
dos integrantes da equipe. Quando nos acompanhou na Secretaria de Obras referia
se aos demais funcionários da prefeitura com frases como “esses estão comigo”.
Fazia questão de nos apresentar a todos os representantes do poder público, ou seja,
eu percebia que, ao abordar as pessoas, havia muito interesse em demonstrar que ele
era um dos responsáveis pela presença do Cinema na Roça no município. Em
princípio achamos o comportamento inusitado, mas não demos muita atenção ao
festa da cidade – colocoume em uma situação constrangedora ao interromper um
momento de lazer do secretário de Meio Ambiente para solicitar brindes da
Secretaria em nome do Cinema na Roça.
inicialmente pensamos que fosse por conta do ocorrido na festa. Participar do
Cinema na Roça representava poder, pois ele acreditava que, por ser designado o
representante do município, teria condições de decidir sobre os locais de exibição,
priorizando os seus interesses. Antes de irmos ao município pela última vez, ele já
não fazia mais parte da equipe da Casa de Cultura e, ao que me consta, foi em
decorrência de disputas de poder.
21
GEERTZ, Clifford, 1989, p. 18.
28
Aproveitando a citação feita por Geertz 22 do pensamento de Goodenough e
no conjunto de códigos e comportamentos que um indivíduo deve conhecer para ter
a possibilidade integrarse a determinado grupo. Esse entendimento é o responsável
pelo norteamento desse indivíduo, em relação ao que se espera dele. Geertz também
aponta duas questões importantes no entendimento da cultura. A primeira delas, que
é um erro acreditar que a cultura é um organismo desenvolvido com propósitos
definidos e com finalidade em si mesma. Por outro lado, é necessário entender que
é um “fenômeno” que surge e se transforma do comportamento e do relacionamento
das pessoas em sociedade. Como cita Geertz, a cultura está presente no “coração e
na mente” das pessoas, sendo um conjunto de apreensões construídas e
transformadas ao longo do tempo.
Assim, o valor bruto atribuído aos acontecimentos de determinada cultura é
pesquisador ou etnógrafo encontrará suas respostas. Para isso se faz necessário que
que elas têm, e às nuanças que podem descortinar. É fundamental que o pesquisador
consiga estabelecer relações entre os acontecimentos e seus significados para que
consiga interpretar a mensagem que tais acontecimentos podem revelar.
Especificamente em relação a esse ponto levantados por Geertz, de estar
atento à investigação da importância não aparente das coisas, gostaria de ressaltar a
minha ignorância nesse sentido. Ao chegar em Silva Jardim, apesar de alimentar
uma grande expectativa em relação aos resultados do Cinema na Roça, em
momento algum atentei para o fato de que o projeto fosse despertar o tipo de
22
GEERTZ, Clifford, 1989, p. 8
29
comportamento apresentado por Aurélio, ou seja, ao iniciar o projeto, não tinha
consciência de que ele representaria um instrumento de disputa de poder nas
localidades.
Esse episódio vale uma consideração para a fase “teóricointelectual” de um
segundo o autor, durante essa etapa, há um distanciamento entre o conhecer teórico
e a vivência com o grupo e, aos olhos do estudante, o grupo, tribo ou as teias de
relações apresentadas por Cliffort Geertz 23 aparecem em forma de diagramas
aparecem de forma mais explícita do que na pesquisa de campo e, com uma fase
“teórico intelectual” bem elaborada, esse tipo de relação poderia ter sido previsto.
Nossa primeira exibição no município ocorreu em Aldeia Velha, que fica na
divisa entre Silva Jardim e Casimiro de Abreu, distante cerca 40 km da sede do
município, 8 km dos quais em estradas de terra. Aldeia Velha é um lugarejo tido
como refúgio turístico, fundado por imigrantes suíços e alemães, 24 onde, segundo o
censo do IBGE de 2000, vivem 1.068 pessoas 25 . Na localidade há um centro com
cerca de dez pequenas ruas que se cruzam, nas quais existem pequenos comércios,
uma igreja e algumas casas. As demais áreas do distrito são ocupadas por sítios e
propriedades com até 480 hectares. Durante os finais de semana – período em que
realizamos a exibição –, o povoado tem acréscimo populacional em função dos
turistas oriundos de diversos municípios, mas principalmente dos municípios do
Norte do estado do Rio de Janeiro.
Essa exibição teve, para nós, a conotação de teste dos equipamentos e da
receptividade dos locais às projeções, pois era a primeira vez que usávamos os
23
Para mais detalhes ver GEERTZ, Clifford. p. 4.
24
Ver http://mail.tce.rj.gov.br/sitenovo/develop/estupesq/gc04/2005/silvajardim.pdf
25
Para mais detalhes ver TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. p 12.
30
equipamentos para exibir um filme aberto ao público. Por esse motivo, realizamos a
sessão sem a divulgação prévia, ou seja, sem a fixação de faixas, a distribuição de
filipetas e o anúncio com carro de som. Mas Aldeia Velha foi escolhida por ser um
pequeno vilarejo e pela facilidade de reunir as pessoas.
Da exibição de Aldeia Velha que aconteceu no dia 23 de julho de 2005,
participamos eu, Marcos Martinelli, Adriana Stoppelli Borges de Almeida e Luiz
Cláudio Pinto Anjos – que são meus amigos e voluntários no projeto – e, como
representante de Silva Jardim, Rosilane Brum. Nós quatro chegamos a Aldeia Velha
na parte da manhã do dia 23 de julho de 2005 e Rosilane à tarde. Ao chegarmos
conhecemos dois moradores, Lury e Fernando, que, ao saberem da nossa idéia, nos
falaram de um espaço, a pizzaria Bicho do Mato, de propriedade de Luiz Nelson e
Ana Paula, sua esposa, que imaginavam ser um bom local para realizarmos a sessão
de cinema.
Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Fazenda Bom Retiro 26 e funcionário da
Secretaria de Meio Ambiente de Casimiro de Abreu, que prontamente – ao saber
dos nossos propósitos – cedeu seu estabelecimento para que realizássemos a sessão.
Por conta da sessão de cinema, Luiz Nelson e Ana Paula interromperam a venda de
produtos na pizzaria até que finalizássemos a sessão. Para o mesmo dia 23 de julho
de 2005, também na pizzaria, estava programada a apresentação de um grupo de
forró chamado Filhos D’Aldeia – do qual Fernando era vocalista. Assim, após o
término da sessão e a saída de todos os espectadores, rearrumamos a pizzaria para,
então, permitir a entrada das pessoas que assistiriam ao show de forró.
26
Ver www.rppnfazendabomretiro.com.br.
31
Apesar de termos conseguido reunir cerca de 50 espectadores para a sessão
de cinema, a tarefa não foi muito fácil, pois grande parte dos espectadores insistiu
em questionar várias vezes o porquê de estarmos realizando o cinema de graça
dentro da pizzaria e parecia que viam o caráter voluntário da iniciativa com
perplexidade. Pareceme que acharam estranho um evento gratuito e aberto ao
público acontecer dentro de uma pizzaria, que costuma cobrar pelos eventos que
realiza. Mas acho que estranharam também porque não nos conheciam e nunca
haviam visto uma tela montada em cima de um carro, dentro de uma pizzaria.
registrada no muncípio de Silva Jardim, parte dela se estende por Casimiro de
Partido Verde. Ao citarmos, em Silva Jardim, o nosso interesse em realizar a
primeira exibição em Aldeia Velha, percebi o constrangimento – que não interferiu
em seu apoio na realização da sessão – por parte da Rosilane Brum. Mais tarde vim
a descobrir que, no passado, Luiz Nelson havia tido participação politica ativa e
contundente em Silva Jardim e que, por conta de divergências em relação à postura
de preservação ambiental do município, aliouse ao município de Casimiro de
Abreu.
Dias depois vim a entender que a preocupação de Rosilane Brum, referente
à participação do Luiz Nelson na exibição não retratava divergências pessoais, mas
que, na verdade, ocultava a sua preocupação com a repercussão que uma iniciativa
envolvimento de um oposicionista ao governo local.
32
O desenrolar dessa passagem não causou inconveniente algum para o
relacionamento do Cinema na Roça com o município de Silva Jardim e muito
menos para a Rosilane Brum. Pelo contrário, serviu de aproximação entre Rosilane
e Luiz Nelson, pois antes do projeto sair do município presenciei negociações entre
os dois para a extensão das atividades educativas que Luiz Nelson realiza nas
dependências de sua propriedade, visando a preservação da Mata Atlântica, aos
alunos do município de Silva Jardim. Além disso, reforçou a minha percepção em
relação aos conceitos de Geertz sobre cultura, quando escreve que acredita, assim
“como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que
ele mesmo teceu”. 27
Voltando à dinâmica da sessão, de modo geral, nas cidades do interior por
onde passamos com o Cinema na Roça, é comum haver eventos gratuitos. Porém,
espaço público e/ou haver divulgação prévia. Acredito que a perplexidade tenha se
dado pelo fato de o Cinema na Roça não atender a nenhum desses quesitos.
O público presente à sessão reunia pessoas entre, aproximadamente, 6 e 60
anos. Pelo que pude perceber, a maioria das pessoas chegou à pizzaria caminhando,
pois o único veículo que havia estacionado nas proximidades era o do Luiz Nelson.
Toyota Hilux – aparentemente ano de fabricação 2005 – se aproximou do local de
exibição, seus ocupantes perguntaram do que se tratava, foram convidados a
particpar, mas não demonstraram interesse.
A grande parte do público era formada de crianças acompanhadas pelas
mães; algumas sozinhas e outras com os pais também. Havia cerca de cinco casais –
27
GEERTZ, Clifford. P. 4
33
aparentemente, de namorados – e alguns idosos acompanhando netos ou filhos.
Caso não contássemos com o envolvimento de Luiz Nelson, Ana Paula, Lury e
Fernando, possivelmente teríamos conseguido muito poucas pessoas para assistir ao
filme.
A montagem da estrutura levou cerca de 40 minutos. Nessa época, a tela
ficava fixada sobre o teto do veículo que servia de local de armazenamento dos
equipamentos eletrônicos, exceto do projetor, e fonte geradora de energia elétrica.
Essa montagem foi um pouco conturbada, pois, apesar de já termos testado os
seqüência de montagem e a reponsabilidade das ações. Eu havia idealizado que os
cabos e fios elétricos deveriam permancer enterrados – para evitar acidentes – e,
para isso, contávamos com um enxadão como ferramenta. Porém, o solo estava
assistiram ao trabalho prévio de preparação do espaço. A presença delas, por um
ponto de vista, era motivante, no entanto, por outro, dispersava a nossa atenção.
Após a montagem da estrutura, que terminou por volta das 16 horas,
utilizamos o nosso equipamento de sonorização para convidar as pessoas para a
sessão que seria iniciada às 18 horas. Na ocasião contávamos com apenas quatro
das imagens – que isenta o exibidor dos pagamentos referentes aos direitos autorais
e se configura, basicamente, pela gratuidade, pela forma de divulgação e pelo local
de exibição –, por exigência de um dos patrocinadores, necessitávamos da cessão de
34
direitos – emitida pelos produtores e/ou distribuidores – para a exibição dos títulos,
que, à época, eram: Central do Brasil, Tainá, O Caminho das Nuvens e Fala Tu.
Como previa o projeto, a escolha dos filmes deveria ser feita pelos
espectadores através de uma votação direta, que aconteceu de forma muito simples.
Eu lia a sinopse e, após a leitura, repetia o nome dos filmes e as pessoas levantavam
mãos levantadas para cada filme e o que recebesse o maior número de votos era
exibido. Em Aldeia Velha, o filme escolhido foi Central do Brasil 28 .
Com o microfone em punho, agradeci a presença de todos, perguntei se
estavam animados com a sessão de cinema, quantos já haviam ido ao cinema – em
geral, nessa e em outras sessões, menos de 10% respondem que já foram, mas é
comum encontrar quem já tenha assistido a filmes em DVD – e expliquei que o
propósito de estarmos exibindo filmes gratuitamente naquela localidade era uma
consequência da realização do projeto Cinema na Roça, que tinha o desafio de levar
o cinema a localidades de municípios do estado do Rio de Janeiro que não possuíam
cinema e/ou videolocadoras. Que Silva Jardim, assim como quase cinco mil dos
5.561 municípios brasileiros, não possuía cinema e, por isso, estávamos lá. Por fim,
desejeilhes uma boa sessão e, em seguida, às 18:30 aproximadamente, iniciamos a
sessão. Durante a sessão os espectadores permaneceram sentados nos bancos e nas
cadeiras da pizzaria. Cerca de dez pessoas ficaram em pé, junto ao portão de acesso
à pizzaria, enquanto algumas pessoas chegavam, assistiam ao filme paradas na rua
por alguns instantes – em frente ao estabelecimento – e depois iam embora.
28
Origem: Brasil; gênero: Drama; lançamento no Brasil: 1995; estúdio: Videofilmes; direção:
Walter Salles. Para mais detalhes ver www.centraldobrasil.com.br.
35
organizaram a distribuição de pipocas, que não estava prevista para essa sessão e
que foi realizada por todos nós, inclusive pelo Luiz Nelson.
Ao término da sessão, mais uma vez agradeci a presença dos espectadores,
agradeci a gentileza de Luiz Nelson e de Ana Paula, a parceria com a Casa de
Cultura de Silva Jardim, em nome de Rosilane Brum e com a Secretaria de
Turismo, em nome de Taísa. Expliquei novamente os propósitos do projeto e
finalizei as atividades desejando boa noite aos presentes. Nesse momento houve
uma salva de palmas à iniciativa e as pessoas começaram a deixar o local. Entre
oito e dez espectadores permaneceram no local – alguns pois desejavam obter um
pouco mais de informações a respeito do projeto, e outros, pois tinham curiosidade
de ver como funcionavam a estrutura e os equipamentos.
armazenamos todos os equipamentos dentro do veículo. Em seguida o retiramos de
dentro da pizzaria e reorganizamos as mesas e cadeiras do estabelecimento. Ao final
da desmontagem, Rosilane Brum despediuse e voltou a Silva Jardim enquanto nos
preparávamos para assistir ao show da banda Filhos d’Aldeia, que – provavelmente
por ser pago – reuniu um público inferior ao do cinema, com aproximadamente 40
pessoas, formado principalmente de solteiros (aparentemente), na faixa dos 20 anos
de idade. Além dos envolvidos na realização da sessão de cinema, poucas pessoas
permaneceram para a assistir ao show.
Essa primeira exibição em Aldeia Velha foi importante não apenas por
marcar o início do projeto e o sucesso da funcionalidade da estrutura – como era o
objetivo principal. Na verdade, essa sessão ocultava aspectos fundamentais que
nortearam as demais exibições. O primeiro aspecto que gostaria de ressaltar é a
36
importância do envolvimento de pessoas residentes nas localidades para o sucesso
das sessões. Vejamos o caso de Luiz Nelson, Ana Paula, Lury e Fernando.
Para Roberto da Matta existem três fases ou planos no cotidiano de uma
contato direto com o público a ser pesquisado. Para Roberto da Matta essa é a fase
na qual o estudante se debruça sobre a teoria e se nutre de informações sobre seu
objeto de estudo. No caso do Cinema na Roça, por desconhecer essa literatura, a
me dei conta da importância do significado dessa participação. Ao concebêlo,
considerei importante incluir esse tipo de participação na realização das sessões,
mas não considerava que o engajamento de algumas pessoas residentes nas
localidades seria um fator determinante para a presença de espectadores. Durante a
concepção do Cinema na Roça considerei que a novidade trazida pela presença do
projeto fosse suficiente para atrair as pessoas para as sessões.
Outro aspecto relevante é o significado para pessoas como Rosilane Brum e
Aurélio, pois, como pude verificar, o Cinema na Roça significou uma forma de
demonstração de status e disputa por poder. Esse aspecto foi importante para
sinalizar que a presença do projeto assume um significado que vai além da exibição
de filmes.
Adriana Stoppelli, Marcos Martinelli e Luiz Claudio Pinto Anjos, que aceitaram o
convite de participar da organização da sessão, pois estariam ajudando um amigo a
realizar um sonho. No entanto, ao término do final de semana de exibição em
29
MATTA, Roberto da. P 24.
37
Aldeia Velha, se diziam “com a alma renovada” e que a experiência tinha sido mais
importante para eles do que para os espectadores pela oportunidade de proporcionar
a emoção que perceberam nos olhares das pessoas que assistiam às sessões.
Outro ponto que gostaria de ressaltar foi a motivação espontânea de
Adriana, Rosilane e Ana Paula, de se lançarem no vilarejo à procura de milho de
pipoca e demais ingredientes, a fim de proporcionarem um atrativo a mais aos
espectadores. Essa manifestação foi a primeira demonstração de que a realização do
aos espectadores.
A segunda localidade de Silva Jardim onde realizamos sessões de cinema foi
Cambucaes. Tratase de uma localidade originada a partir da assinatura do decreto
presidencial de 27 de dezembro de 1993, desapropriando a Fazenda Cambucaes
rural. Compreende uma área de 1.636 hectares 30 , atualmente ocupada por pequenas
propriedades rurais que reúnem 106 famílias 31 , algumas delas voltadas para a
agricultura familiar. Essa exibição foi agendada previamente e, através da Casa de
proximidades do local de projeção. Além disso, foram produzidas filipetas e
entregues aos professores da escola municipal de Cambucaes, para que
distribuíssem aos alunos informando a data e horário da sessão. Com dois dias de
antecedência foi feita a divulgação local através de uma moto de som – que consiste
em uma moto equipada com sistema de sonorização, muito comum nessas
localidades para a divulgação de eventos –, que percorreu as cercanias de
Cambucaes convidando os moradores.
30
Ver http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/DNN/Anterior%20a%202000/1993/Dnn1990.htm.
31
Ver http://www.iadb.org/idbamerica/index.cfm?thisid=3467.
38
Nessa exibição já haviamos firmado a parceria com o Cinemaneiro e
chegamos – eu, Marcos Martinelli, Luiz Claudio Pinto Anjos e Ícaro Fernandes
(representante do Cinemaneiro) – no município na manhã de sextafeira, de 26 de
agosto de 2005. De lá fomos para a Casa de Cultura de Silva Jardim, onde
encontramos Rosilane Brum e os demais integrantes de sua equipe. Após um breve
período de conversa sobre o projeto, nossas expectativas e a apresentação das partes
– Ícaro Fernandes e Rosilane Brum ainda não se conheciam – fomos abastecer o
veículo.
Conforme mencionado anteriormente, no caso de Silva Jardim a doação do
diesel foi feita pela Secretaria de Obras. Precisávamos fazer uma única retirada de
100 litros por final de semana de exibição, e o abastecimento não poderia ser feito
diretamente no veículo, porque apenas veículos oficiais podiam ser abastecidos nas
bombas de combustível. Precisávmos encher cinco galões com capacidade de 20
litros cada e posteriormente, fora dos limites da Secretaria de Obras, verter o diesel
no tanque de combustível do nosso veículo. O abastecimento era importante, pois o
veículo era a fonte de energia elétrica durante as sessões e precisavva ser mantido
em funcionamento durante todo tempo. O processo de abastecimento como um todo
consumia cerca de uma hora a uma hora e trinta minutos e acontecia entre o pátio
da Secretaria – coleta do diesel – e um terreno baldio – abastecimento do veículo –
ao lado da Casa de Cultura. Uma vez reabastecido o veículo, guardávamos o diesel
excedente num galpão nos fundos da Casa de Cultura – para um futuro
abastecimento se repetiu em todas as exibições de Silva Jardim.
Eu sempre preferi ir cedo, ainda na parte da manhã, para as localidades de
projeção, mas isso nem sempre era possível devido à falta de locais para a nossa
39
alimentação. E como esse quesito era de responsabilidade de Casa de Cultura, e
seus convênios para a prestação de serviços de alimentação se restringiam aos
estabelecimentos da sede, tinhamos duas opções: uma delas era arcarmos com as
despesas de alimentação e a outra era irmos para os locais de exibição após o
almoço.
Exceto no caso de Aldeia Velha, as manhãs das sextasfeiras em Silva
Jardim eram tomadas com o abastecimento do veículo, o almoço e alguns contatos
com representantes do poder público, com representantes da imprensa local, com
manifestações culturais etc. Enfim, em compasso de espera ocupávamos nosso
tempo com alguma atividade na sede do município.
Após o almoço e com o veículo abastecido, percorremos os 11 km de
estrada de asfalto e cerca de 4 km em estrada de terra que separam Cambucaes da
sede do município e, por volta das 14:30, chegamos nas dependências do sítio da
Srª. Otília e do Sr. Fortunato, pais de Regina, diretora da escola municipal da
localidade, que se situa em frente à propriedade deles, onde a sessão foi realizadae
que a pedido de Rosilane Brum, o espaço foi gentilmente cedido para a realização
da sessão. As cadeiras que utilizamos foram cedidas pela diretora da escola e nosso
trabalho nesse sentido foi o de reunilas e atravessar a rua para dispôlas em frente à
tela.
O Sr. Fortunato é um senhor negro, com menos de 1,60 metro de altura,
aproximadamente 70 anos, um pouco tímido e não muito dado a conversas. No dia
em que estivemos com ele tentei registrar algumas de suas palavras com a câmera
de vídeo, mas ele se comunicava por frases tão curtas que desisti da idéia. Não me
pareceu muito interessado na conversa, muito menos na sessão de cinema que
40
costumo conversar com as pessoas sobre a vida na localidade, a paz e a
tranquilidade do local, se já moraram ou se gostariam de viver em alguma cidade
grande, sobre a natureza, se já foram ao cinema e vários outros assuntos. Com o Sr.
Fortunato não foi diferente, mas a conversa não evoluía muito e ele sempre
respondia às perguntas com respostas fechadas ou poucas palavras.
A Srª Otília, por outro lado, foi muito expansiva. Também é negra, de
estatura e idade próximas às do Sr. Fortunato e assim que chegamos saiu de casa
para nos receber e em poucos minutos nos convidou para um cafezinho. Fez
questão de nos contar a história da propriedade, da localidade, mostrar as plantas
era da tranquilidade daquela vida, mas que, nos tempos atuais, tudo estava mais
difícil. Que da lavoura quase não se conseguia sobreviver, que a roça não rende
mais como antigamente etc. Assim que viu a filmadora nas mãos do Ícaro achou
engraçado, mas não se intimidou ao falar em frente à câmera. Já Sr. Fortunato
pareceu ficar ainda mais retraído.
Depois do João Vitor – neto do casal –, a mais empolgada da família com a
sessão era a sua mãe Regina. Ela contou que aguardava ansiosamente pela sessão e
que já havia feito bastante propaganda na escola municipal de Cambucaes, achava
que a sessão reuniria muitas pessoas. Ainda segundo Regina, a expectativa era
grande entre as crianças da escola e ela pretendia usar passagens do filme em sala
de aula.
transformando o veículo do projeto em carro de som e realizamos mais uma
divulgação da sessão. Essa divulgação levou cerca de duas horas e percorremos
quase todas as residências do vilarejo – que, de forma geral, eram construções
41
modestas, porém em alvenaria –, reforçando o convite e a gratuidade da exibição.
Como as propriedades em Cambucaes são formadas, basicamente, por sítios, não
tivemos muito contato com as pessoas durante a divulgação.
Vale a pena ressaltar que não há um script prédefinido para a divulgação. À
medida que andamos com o carro, vou inventando brincadeiras para fazer com as
pessoas das localidades. Por exemplo, quando estão na lavoura, pergunto como está
a colheita; quando saem da escola, pergunto se a aula foi boa e se tinha merenda;
pergunto se já têm programação para aquela noite e, em meio às brincadeiras,
divulgo a sessão de cinema. Em Cambucaes, algumas pessoas respondiam ao
convite da voz que saía do carro. Como os vidros do veículo são escurecidos, ficava
difícil ver quem estava dentro, salvo quando parávamos para conversar. Nas demais
localidades a dinâmica foi similar e as pessoas também responderam às perguntas,
dizendo se iriam à sessão, ou que não poderiam, por exemplo, porque estariam na
igreja, ou que decidiriam junto com a família etc.
No percurso, nos deparamos com um acampamento do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e os componentes do movimento também
foram convidados para a sessão. Ao chegarmos ao acampamento, por volta das 15
horas, havia apenas um homem presente, que se apresentou como o responsável
pelo acampamento. Era um homem branco de chapéu, de estatura mediana,
aparentando 50 anos, que nos recebeu com um misto de reserva e curiosidade. Ao
explicarmos que o propósito da visita ao acampamento era convidálos para
assistirem a uma sessão gratuita de cinema, organizada por um ONG em parceria
com a Casa de Cultura de Silva Jardim, se mostrou um pouco mais à vontade.
Mesmo assim, apesar de – por intermédio da Rosilane Brum – conseguirmos uma
kombi da Secretaria de Educação para oferecer transporte de ida e volta às pessoas
42
que moravam em locais mais afastados do sítio do Sr. Forturnato e aos integrantes
do MST, nenhum representante do acampamento compareceu.
Ao final da divulgação, voltamos ao sítio do Sr. Fortunato e iniciamos a
montagem da estrutura, que, mais uma vez, consumiu cerca de 40 minutos. O
menino João Vitor, com aproximadamente seis anos, voluntariouse a ajudar na
conexão dos cabos, na ligação dos equipamentos e nas demais atividades que sua
idade e porte físico permitiam.
A escolha dos filmes seguiu a mesma dinâmica de Aldeia Velha, porém em
Cambucaes foram exibidos os filmes Tainá: uma aventura na amazônia 32 , com 52
espectadores, e Central do Brasil, com 60. Em geral, nem todos permanecem
assistindo aos filmes nas duas sessões. A diferença no número de espectadores se
deve ao fato de algumas pessoas chegarem atrasadas e outras irem embora mais
cedo. Durante a sessão em Cambucaes houve falta de energia, pois, como o vento
levava a fumaça do carro na direção das pessoas, achei por bem desligálo para
evitar o incômodo da fuligem do diesel queimado sendo lançada sobre os
quase totalmente consumida, fazendo com que os equipamentos desligassem. Com
isso, tivemos que interromper a sessão por aproximadamente 10 minutos para
reestabelercer o sistema, o que me deixou muito preocupado com a reação dos
espectadores. No entanto, algumas pessoas lamentaram a falta de luz, a maioria
aguardou pacientemente o restabelecimento e uma pequena parcela foi embora.
Apesar de contarmos com as cadeiras da escola, não as conseguimos em
número suficiente e algumas pessoas assistiram aos filmes em pé, enquanto outras
32
Origem: Brasil; gênero: Aventura; lançamento no Brasil: 2001; estúdio: Tietê Produções
Cinematográficas; direção: Tânia Lamarca e Sergio Bloch. Para mais detalhes ver
www.taina.com.br.
43
se apoiaram na cerca, no poste, na mourama, permanceram sentados em suas motos
ou sobre uma lona plástica de 16m² que esticamos no chão. A presença de
motocicletas como meio de transporte é muito comum em todas as localidades
percorridas pelo projeto. Ao que tudo indica, elas foram ocupando o lugar dos
cavalos nas regiões do interior.
Em 27 de agosto de 2005 foi o dia de exibições em Cesário Alvim, que
começou com uma visita à feira do agricultor e com a participação no programa de
rádio do prefeito Augusto Tinoco, que é uma espécie de espaço para que ele
responda às críticas geradas pela oposição e efetua propagandas de suas realizações.
Também foi dia de entrevista ao jornal local sobre as exibições do Cinema na Roça.
fácil acesso que dista cerca de 2 km, por estrada de asfalto, da BR101. Fica situado
nas proximidades do município de Rio Bonito. É um distrito de característica
realizamos a sessão em bairros ou vilarejos de Cesário Alvim onde não há
Chegamos ao segundo distrito por volta das 15 horas e iniciamos a
Sara – por volta dos cinco anos de idade – queriam ajudar na montagem. Alguns
adultos também se aproximaram, mas nenhum deles se ofereceu para ajudar.
Montamos a estrutura e em cerca de meia hora estava tudo pronto para a sessão.
enquanto o Ícaro Fernandes, que seria o responsável pela geração de imagens, não
me parecia muito produtivo – segundo meus apontamentos, em princípio pensei que
ele não tivesse conhecimento para fazer as imagens, ou que a falta de um roteiro
44
prévio estivesse dificultando o seu trabalho. Porém identificava que aquela
experiência estava sendo importante para ele, pois demonstrava felicidade e supresa
a cada novidade, como, por exemplo, a vida no campo, o contato com os animais,
com pessoas do meio rural etc. Eu esperava que essa experiência também fosse
importante para os demais do Cinemaneiro.
escolhido – através do mesmo procedimento – foi Tainá. Ao final da sessão, não
consegui realizar o debate que pretendia, o que também tinha acontecido em Aldeia
Velha e Cambucaes. Essa era uma idéia inicial do projeto, mas, ao final das quatro
sessões, percebi que seria uma tarefa muito mais difícil do que imaginava, pois
lidava com muita timidez dos espectadores para falarem ao micofone, em frente de
pessoas conhecidas.
primeira deleas é que parece nítido que o uso do microfone seria um inibidor da
participação, uma vez que é hábito de poucas pessoas utilizálo no diaadia. Outro
aspecto interessante é que o uso do microfone torna a dinâmica do debate mais lenta
pela logística de passar o equipamento de mão em mão para que a pessoa se
pronuncie. O aspecto mais inibidor, ao meu ver, é o simbolismo de estar falando ao
microfone, pela diferença de exposição gerada pela situação, bastante diferente de
uma conversa informal.
Por outro lado abriuse uma lacuna que permaneceu sem resposta por muito
tempo: como fazer para que 50 pessoas consigam debater ou conversar juntas a
respeito do filme a que assitiram sem o auxílio de um aparelho de sonorização?
encontrei foi tentar desenvolver uma conversa com quem eu queria estimular ao
45
debate. Enquanto os créditos iam subindo na tela e o Marcos Martinelli ou outro
voluntário preparava o equipamento para uma nova sessão ou para tocar alguma
música, com o ambiente ainda um pouco escuro, me aproximava de alguma pessoa
munido do microfone sem fio, sentava ao seu lado – quando possível – e começava
a perguntar o nome, se era da localidade, se tinha gostado do filme, do que mais
tinha gostado, do que não tinha gostado, pedia que me contasse como tinha sido a
experiência de assistir a um filme numa tela “grandona”, ao ar livre e perto de casa
etc.
Eu perguntava ao microfone para que os demais ouvissem, o que foi uma
alternativa para diminuir a exposição das pessoas, pois os entrevistados começavam
a falar com o ambiente ainda escuro e as demais pessoas não conseguiam saber
exatamente quem estava falando. A idéia era que, quando as luzes começassem a
acender, já estivéssemos conversando e a pessoa não se sentisse tão inibida.
Nas exibições nas localidades de Mato Alto e Juturnaíba, que aconteceram
nos dias 3 e 4 de setembro de 2005, respectivamente, estávamos presentes eu,
Marcos Martinelli, Ícaro Fernandes, Luiz Claudio Pinto Anjos e Rosilane Brum. As
observações mais interessantes que essas exibições trouxeram foi a importância do
segmento religioso da comunidade, pois em Mato Alto conseguimos a cessão do
pátio externo da igreja Batista para realizar a exibição e, por conta disso, percebi o
afastamento dos seguidores dos demais credos, por não haver – nos locais por onde
passei – o hábito de frequentarem templos que não sejam das suas religiões. Ouvi
muitos comentários de que, quando o evento acontece em determinado espaço
religioso, as pessoas só comparecem se forem seguidoras daquela religião ou se não
forem seguidoras de nenhuma. Porém, por outro lado, o apoio da igreja resolveu o
problema logístico das cadeiras, devido ao empréstimo dos bancos.
46
Em Juturnaíba realizamos a sessão num dia chuvoso e tivemos que alterar o
local de exibição momentos antes da projeção. Juturnaíba pertence ao primeiro
distrito de Silva Jardim, reúne no máximo 60 famílias no entorno do vilarejo que
fica às margens da lagoa homônima. A principal atividade de Juturnaíba é o turismo
– ainda incipiente – da pesca. Após a construção da barragem que represa o rio São
João, na tentativa de repovoamento da lagoa foi introduzido o peixe Tucunaré.
pescaria comercial ou desportiva.
Havíamos planejado realizar a exibição em frente a uma estação de trem
desativada, atualmente transformada em uma venda, mas por conta da chuva
tivemos que mudar de local. Com a mudança de local tivemos que improvisar a
montagem da tela retirandoa do veículo e fixandoa no interior do bar do Bal, que
aconteceu em Aldeia Velha, o proprietário do bar interrompeu a comercialização de
produtos durante a sessão e resolveu o problema de espaço para a exibição. Por
outro lado, alguns moradores da localidade não compareceram para assistir aos
filmes por causa de divergências políticas. Verificamos que o fato de o proprietário
do local da exibição ser de oposição ou apoiar o governo municipal é relevante para
devem – ou não – apoiar determinada iniciativa, como, por exemplo, o Cinema na
Roça. Por isso, ao realizarmos uma sessão na propriedade de um habitante
marcadamente partidário da situação, corremos seriamente o risco de afastar os
oposicionistas e viceversa.
47
Outra localidade de Silva Jardim em que estivemos foi Gaviões, que, como
já foi dito, é bem isolada. Quando estivemos lá, para chegar à localidade era preciso
percorrer cerca de 50 km – a partir da sede do município – por estradas de terra mal
conservadas e de difícil acesso no período das chuvas. Devido a minha ligação
anterior com Gaviões – por causa do trabalho junto ao grupo Caminhos da
Solidariedade – e a sua característica geográfica, decidi realizar duas exibições no
distrito.
Gaviões corresponde ao terceiro distrito de Silva Jardim e teve origem no
desmembramento de uma fazenda de mesmo nome. Tratase de uma comunidade
bastante espalhada, formada, em grande parte, por pequenas propriedades distantes
entre si. A principais atividades do distrito são a pecuária extensiva e a agricultura
de subsistência. Grande parcela da população trabalha como colonos das fazendas
ou na agricultura familiar.
As projeções aconteceram nos dias 16 e 17 de setembro de 2005 e foram as
mais complexas em termos de infraestrutura e deslocamento. Um dos motivos foi a
inexistência de locais de hospedagem em Gaviões, o que nos forçava a percorrer
mais de 100 km por estradas de terra, por dia de exibição – o que equivale a mais de
quatro horas diárias de deslocamento. Um outro motivo foi a dificuldade para reunir
as pessoas, por causa da distância que separava suas residências. Ainda um terceiro
mesmo motivo.
desprovidas de energia elétrica e havia um considerável contraste de infraestrutura
entre as grandes propriedades da região e a maioria dos sítios. Existiam três escolas
no distrito, sendo que uma delas em estado muito precário. O centro do vilarejo
48
reunia cerca de 30 casas, um campo de futebol, duas vendas e uma dessas escolas.
Mas, como as projeções aconteceram em locais mais remotos para o segundo dia
conseguimos, por intermédio da Rosilane Brum, um ônibus para levar e buscar os
espectadores em casa.
Ao chegarmos em Silva Jardim no dia 16 de setembro – dessa vez éramos
eu, Ícaro Fernandes e Josinaldo Medeiros (o segundo jovem do Cinemaneiro) –,
fomos surpreendidos pelo pedido de Cristina, responsável pelo Centro de Ação
pessoas da terceira idade, para realizarmos uma sessão extra para um grupo de 80
idosos. Mas a projeção precisava acontecer naquele dia, pois estavam todos
reunidos por conta de uma comemoração no local. Cristina soube da nossa presença
em conversa com a Rosilane Brum e pediu a ela que intermediasse a negociação.
A realização da sessão no Centro de Ação Social envolveu uma logística
mais complexa do que imaginávamos. O pé direito do centro era muito baixo e,
mesmo desmontando a tela do veículo, não conseguíamos fixála de modo
satisfatório. O salão reservado para a sessão era muito claro e, ao fechálo com
tecido a fim de escurecêlo, outro problema surgiu: o calor. A solução para a tela foi
projetar a imagem diretamente na parede – de cor bege – que distorcia um pouco as
cores originais do filme. Para o calor causado pelo fechamento das janelas lateriais
não houve outra saída senão suportálo, pois nem com o recuros dos ventiladores o
problema foi resolvido.
Mesmo assim, percebi que, para os espectadores do Centro de Ação Social,
era uma grande novidade. O público reunia 80 pessoas acima de 60 anos, sendo o
mais idoso o Sr. Sebastião, com 95 anos de idade. Para mais de 90% dos
especatodores havia sido a primeira experiência com o cinema. A idéia inicial era
49
projetar apenas um filme, porém, ao término de Central do Brasil, decidiram assistir
a Tainá. Entre 60% e 70% dos espectadores fizeram questão de agradecer
pessoalmente a experiência. Havia lágrimas de emoção nos rostos de alguns com
cenas do filme Central do Brasil e longas risadas com as cenas da indiazinha Tainá.
Mas nem todos os espectadores mantiveramse atentos ao filme. Algumas senhoras
conversavam sobre assuntos diversos durante as sessões – e às vezes eram
repreendidas pelos demais – e vi cerca de quatro pessoas dormindo durante os
filmes.
Saímos de Silva Jardim e fomos diretamente para Gaviões. Chegamos junto
com Rosilane Brum às 18 horas, horário em que deveríamos iniciar a sessão.
Porém, nesse dia a divulgação falhou. Poucas pessoas estavam avisadas, a moto de
som não havia percorrido a localidade informando o local e o horário da sessão etc.
Além disso, o tempo não estava muito bom. Algumas nuvens se formavam no céu,
um indicativo de que choveria durante a noite.
A projeção foi realizada na propriedade do Dr. Paulo Márcio, sitiante não
residente na localidade, engajado com a preservação do meio ambiente e cultivador
de palmito de Pupunha – uma alternativa ao quase extinto exemplar da mata
atlântica, palmito de Jussara –, que, apesar de não estar presente, cedeu a sua
propriedade para a realização da atividade para a comunidade. Nesse dia exibimos
apenas Tainá – por causa da chuva – e havia no máximo 30 espectadores presentes.
No dia seguinte, 17 de setembro de 2005, voltamos a Gaviões. Dessa vez o
dia já amanheceu chuvoso. O caminho até a localidade foi bastante difícil e
demorado, mas chegamos cedo, por volta das 12 horas. Nesse dia, Marcos
Martinelli, sua esposa Sandra Félix Brandão e sua filha Júlia Martinelli nos
acompanharam. Ao chegarmos a Gaviões tivemos que encontrar outro local para a
50
exibição, pois temíamos que não houvesse espectadores por conta da chuva
com o administrador de uma fazenda próxima ao local original de exibição a cessão
de um galpão coberto no qual eram guardados os tratores e, depois de
realização da sessão.
Rosilane Brum havia conseguido o secretário de Educação disponibilizasse
um ônibus. Mesmo assim, apenas 25 pessoas – que moravam nas proximidades da
oferecido. As pessoas que moravam mais distante não apareceram nos locais onde o
ônibus as pegaria, provavelmente por causa da chuva, pois é possível que não
contassem que haveria sessão mesmo chovendo. Como não havia cadeiras ou
bancos, mais uma vez esticamos a lona plástica no chão e as pessoas se
acomodaram sobre ela. A maioria do público, nesse dia, foi formada por crianças de
até 11 anos.
município. Mas esse dia de Cinema na Roça parece não ter empolgado muito os
presentes. Diferente dos demais locais, as pessoas somente se aproximaram quando
todos os equipamentos já estavam montados. Nenhuma criança se aproximou com o
intuito de participar da montagem, mesmo com a presença da Júlia – 8 anos na
época –, que poderia ser um estímulo às demais, não houve aproximação
espontânea das crianças. Somente após começarmos a exibição de algo na tela que
as pessoas começaram a aparecer de lanterna em punho.
51
As exibições de Gaviões reuniram poucos espectadores – menos de 60, no
total – e acredito que teríamos mobilizado mais pessoas se tivéssemos atentos à
reunião de dois fatores: a falha na divulgação e o tempo chuvoso.
As últimas sessões em Silva Jardim aconteceram nos dias 23 e 24 de
setembro de 2005, nas localidades de Bananeiras e Vargem Grande. Nelas
estávamos presentes eu, Ícaro Fernandes, Josinaldo Medeiros, Rosilane Brum, Taísa
(secretária de Turismo) e Rose (Conselho Tutelar). Houve uma média de 70 pessoas
presentes em cada exibição. Em ambas localidades pensávamos em exibir apenas
um filme, mas o interesse do público por uma sessão dupla nos motivou a projetar
dois filmes seguidos.
Nessa época, o Cinema na Roça contava com 10 filmes em seu acervo:
Central do Brasil, O Caminho das Nuvens 33 , Tainá, Neguinho e Kika 34 , O Jeito
Brasileiro de Ser Português 35 , Fala Tu 36 , Tudo Sobre Rodas 37 , Olho da Rua 38 ,
Minicine Tupy 39 e Burro sem Rabo 40 . A escolha dos filmes se deu através da
votação direta – como nas demais exibições – e o primeiro filme escolhido em
ambas foi O Caminho das Nuvens.
No primeiro balanço do projeto, ao final das projeções em Silva Jardim,
parecia que o Cinema na Roça tinha alcançado parte dos seus objetivos. Se, por um
lado, ainda não havíamos conseguido organizar debate algum, por outro, a
33
Origem: Brasil; gênero: Drama; lançamento no Brasil: 2003; estúdio: L C Barreto;
direção: Vicente Amorim. Para mais detalhes ver www.lcbarreto.com.br.
34
Origem: Brasil; gênero: Drama; lançamento no Brasil: desconhecida; estúdio: Nós do
Morro; direção: desconhecida.
35
Idem.
36
Origem: Brasil; gênero: Documentário; lançamento no Brasil: 2003; estúdio: Videofilmes;
direção: Guilherme Coelho. Para mais detalhes ver
http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/falatu/falatu.asp.
37
Origem: Brasil; gênero: Documentário; lançamento no Brasil: desconhecida; estúdio: Abbas
Filmes; direção: Sérgio Bloch.
38
Idem.
39
Idem.
40
Idem.
52
manifestação dos espectadores nos indicava que o Cinema na Roça estava
contribuindo para que aquelas pessoas tivessem acesso a uma – pequena, que fosse
– parcela do que era produzido no cinema nacional.
Aparentemente a presença do Cinema na Roça estava sendo positiva para o
município. Tanto que nos convidaram a voltar no dia 5 de novembro de 2005, pois a
Secretaria de Cultura, através da Casa de Cultura de Silva Jardim, realizaria um
evento em homenagem ao Dia da Cultura, e seus representantes queriam que o
Cinema na Roça participasse e fosse homenageado por suas realizações no
município.
Pelo fato de percebermos que os munícipes não tinham o hábito de circular
pelo município e que desconheciam várias localidades de Silva Jardim, para a
ocasião do Dia da Cultura foi preparado um vídeo específico sobre a região,
marcando a despedida do Cinema na Roça. O encerramento simbólico do Cinema
houve a presença de aproximadamente 200 jovens, com os quais conversamos sobre
responsabilidade social, a concepção do Cinema na Roça e as nossas percepções a
respeito do projeto no município.
2.2 São José do Vale do Rio Preto
São José do Vale do Rio Preto é um o município de 21.375 habitantes,
ocupa uma área de 240 km², segundo o IBGE, 41 e 269 km², segundo a página oficial
41
Para mais detalhes ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1.
53
do município na internet. 42 Seu IDH é (0,720) 43 . Dista cerca de 150 km da cidade
do Rio de Janeiro, em direção ao oeste do estado e faz divisa com os municípios de
Petrópolis, Teresópolis, Sapucaia e Três Rios.
maior produtor de hortifrutigranjeiros do estado do Rio de Janeiro 44 e a “população
filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e eleito em 2004
com 7.074 votos. A Câmara Municipal é composta por nove vereadores. 46
época sercretário de Meio Ambiente de São José do Vale do Rio Preto, de passagem
pelo Rio de Janeiro, viu o veículo do projeto estacionado em uma rua da cidade e se
interessou pela idéia. Ao retornar ao município entrou em contato comigo para
darmos continuidade ao processo. Todos os detalhes – hospedagem, alimentação e
combustível necessários – foram acertados por telefone e/ou meio eletrônico. Sendo
assim, em 15 de outubro de 2005 chegamos – eu, Ícaro Fernandes e Josinaldo
Medeiros – em São José do Vale do Rio Preto.
Atendendo ao pedido de Marco Aurélio Fróes, consideramos a possibilidade
de exibir o filme A Visão do Paraíso 47 , cujo tema é a preservação da Mata
Atlântica. O filme é protagonizado por Tom Jobim, que era um ilustre cidadão do
município. Para tanto faziase necessário que os representantes do município
42
Ver http://www.sjvriopreto.rj.gov.br/acidade/acidade.htm#Supericie.
43
Fonte: Atlas do desenvolvimento humano.
44
Ver http://www.sjvriopreto.rj.gov.br/acidade/acidade.htm#Economia.
45
Informação presente na página oficial do município
46
Para mais detalhes ver www.tse.gov.br.
47
Origem: Brasil; gênero: Documentário; lançamento no Brasil: desconhecida; estúdio:
desconhecido; direção: desconhecida.
54
Jobim no Rio de Janeiro. Com a demora do processo de obtenção da autorização,
nossa partida foi retardada em um dia, a fim de que conseguíssemos levar o título.
Ao chegarmos no município na manhã do dia 15 de outubro de 2005, fomos
apresentando os propósitos do Cinema na Roça. Além dos já citados estava presente
na reunião a secretária de Educação. Após essa reunião fomos ao gabinete do
prefeito para uma breve apresentação.
Em São José realizamos duas exibições. A primeira, no centro da cidade,
localidades. Essa participação na Calçada da Cultura fugiu um pouco aos propósitos
do projeto porque no centro de São José havia videolocadoras e exibir filmes nesse
evento não atenderia os objetivos do projeto. Porém, como havia sido combinado
antes que faríamos a exibição nesse evento, não havia como buscar outra alternativa
naquele momento.
predisposição de São José em aceitar o Cinema na Roça pelo fato de existir uma
política cultural no município. O segundo é descobrir até que ponto o projeto terá
que alterar as suas características originais para atender aos anseios do poder
público local, a fim de ser aceito e estimulado pelas autoridades.
Em relação ao primeiro aspecto a consequência foi a crença de que o projeto
faria parte das atividades do município e que seria fácil motiválos a tornar o
Cinema na Roça um projeto permanente por lá. Talvez essa postura tenha refletido
de maneira inversa, como será abordado mais à frente, pelo fato de termos
55
município. Por outro lado, ainda referente ao mesmo aspecto, vale lembrar o
ocorrido em Silva Jardim, onde o projeto demonstrou a sua faceta ligada à disputa
de poder.
Temos que considerar que a passagem do Cinema na Roça pode ter servido
apenas para reforço para a imagem política dos representantes do município,
envolvidos com a realização da Calçada da Cultura, ou seja, acredito na
possibilidade de o projeto ter sido usado, ardilosa e exclusivamente, para atender
aos anseios temporários na supressão das necessidades de agenda do evento cultural
da cidade.
Nossa passagem por São José do Vale do Rio Preto foi muito rápida, mas
alguns aspectos precisam ser ressaltados. No dia 16 de outubro de 2005 realizamos
mas reúne grande quantidade de produtores rurais e é uma localidade onde há
concentração de pessoas de baixa renda. Apesar do intenso interesse do secretário
de Meio Ambiente na projeção do filme A Visão do Paraíso, em Pouso Alegre
seguimos o mesmo procedimento para a escolha dos títulos e, na segunda exibição
dessa noite, o mais votado foi o filme com Tom Jobim. Porém, a narrativa do
documentário não agradou aos espectadores e, em menos de meia hora, várias
pessoas já tinham abandonado o local de exibição. Nessa noite, antes do final do
anos – chegou a atirar pequenas pedras na tela.
Enquanto na primeira sessão, em que projetamos um dos filmes de nosso
repertório, havia cerca de 100 pessoas presentes, com apenas 40 minutos do
segundo filme, esse número já havia sido reduzido a 15 espectadores. Na primeira
sessão houve distribuição de pipoca – patrocinada pela Secretaria de Meio
56
Ambiente – e se formou uma fila com mais de 30 pessoas para recebêla. Mas
percebi que, enquanto as pessoas aguardavam para receber o saco de pipoca,
mantinhamse atentas ao filme projetado.
O outro aspecto foi a resistência de parte da população da sede ao nome do
projeto. Na noite de sábado – dia 16 de outubro de 2005 –, após a exibição em
Pouso Alegre, em frente à praça principal da sede do município, havia entre quatro
e seis mulheres na faixa de 27 anos de idade sentadas à mesa de um bar
conversando a respeito do nome do projeto. Ao me aproximar e demonstrar
que São José não possuía ligação com a roça. Para elas, aceitar um projeto com esse
nome seria denegrir a imagem da cidade, mesmo sabendo que a economia do
município girava, em grande parte, em torno da agricultura.
Ao sair de São José do Vale do Rio Preto – e ainda durante muito tempo –
não consegui compreender o distanciamento entre o significado do nome do projeto
para mim e para esse grupo que manifestou seu descontentamento. Durante a fase
“teóricointelectual” do Cinema na Roça, acreditava que o nome era ideal para
caracterizar uma iniciativa que levava o cinema para os moradores da zona rural e
não percebia como esse – em princípio – detalhe poderia causar algum tipo de mal
estar entre o projeto e os habitantes das localidades.
Mas foi durante a preparação do presente trabalho, ao ter contato com os
textos de Roberto da Matta (Matta, 1978) e de Cliffort Geertz (Geertz, 1989), que
passei a compreender que, durante a concepção do Cinema na Roça, eu estava preso
às minhas “teias” e não consegui perceber que a palavra roça – apesar da conotação
idílica atribuída por mim – poderia causar algum tipo de constrangimento aos
demais.
57
Uma explicação para a falta de atenção a esse quesito está no fato de que
durante a concepção do projeto não houve a preocupação com a fase “teórico
intelectual” de Roberto da Matta, pois eu não possuía o conhecimento sobre as fases
e nem o anseio de um trabalho etnográfico.
Quando saímos de São José do Vale do Rio Preto, tanto a Secretaria de
Educação e Cultura, quanto a de Meio Ambiente demonstraram muito interesse em
transformar o Cinema na Roça em algo permanente no município. Uma questão
instigante é entender os motivos que os levaram ao desinteresse repentino. Depois
de retornar ao Rio de Janeiro, tentei retomar o contato com Marco Aurélio Fróes,
Secretaria de Educação, pois, pelo que entendi na época, a verba destinada ao
financiamento do projeto seria oriunda do orçamento da Educação e talvez a
secretária não tenha demonstrado muito interesse em patrocinar a iniciativa.
desinteresse: uma delas é uma possível decepção com a estrutura do Cinema na
Roça, apesar de não demonstrarem isso durante a nossa passagem pelo município.
Outra possibilidade é a necessidade de suprimento imediato de um atrativo para a
Calçada da Cultura, ou seja, é possível que não tivessem interesse – em momento
algum – de tornar o Cinema na Roça uma atividade regular no município, mas que
veio a atender a uma necessidade momentânea de oferecer uma atração ao evento
projeto pode ter sido um indício da má repercussão e repulsa da população à
iniciativa. Por fim gostaria de ressaltar a minha possível falta de persistência no
avanço das negociações.
58
2.3 Sumidouro
16.062 habitantes 48 e tem o IDH (0,712) 49 . Está localizado na região serrana
fluminense e dista aproximadamente 175 km 50 do Rio de Janeiro. Faz divisa com os
municípios de Nova Friburgo, Teresópolis, Carmo, São José do Vale do Rio Preto,
Sapucaia e Duas Barras. O município está dividido em quatro distritos denominados
Sumidouro (1º), Campinas (2º), Dona Mariana (3º) e Soledade (4º). Atualmente seu
prefeito é Manoel José de Araújo, filiado ao Partido Progressista (PP), que foi eleito
em 2004 com 5.329 votos 51 . A principal atividade econômica do município é a
agricultura e cerca de 73% da população de Sumidouro vive na área rural.
O nome Sumidouro foi dado ao município “em conseqüência de curioso
acidente geográfico verificado em suas terras, com o rio Paquequer desaparecendo
sob lajes de pedra por uma extensão de 300 metros” 52 .
acordo prévio com o poder público local. Saímos do Rio de Janeiro – eu e Josinaldo
Medeiros – com a intenção de viabilizar as negociações a partir da nossa chegada.
Eu já havia tentado contatos anteriores, porém todos sem sucesso. Por isso resolvi ir
realizar as projeções.
48
Ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1.
49
Fonte: Atlas do desenvolvimento humano.
50
Ver www.sumidouro.rj.gov.br.
51
Ver http://www.tse.gov.br/internet/index.html.
52
Para mais detalhes ver documentação territorial do Brasil em http://biblioteca.ibge.gov.br/
59
Chegamos por volta das 13 horas da terçafeira, dia 14 de fevereiro de 2006,
e fomos diretamente para a Secretaria de Educação e Cultura onde, após esperar
cerca de 40 minutos, conhecemos Cirene Ramos, secretária de Educação e Cultura,
que nos passou a Yohana Esteves, chefe do Setor de Cultura do município. Após
combustível necessários para percorrermos o município e realizarmos as sessões.
Uma questão intrigante a entender é o porquê de não conseguirmos avançar
nas negociações através de emails e telefonemas, ao passo que pessoalmente os
negociação não tenha avançado por três razões principais. A primeira delas é devido
às inúmeras ofertas de projetos que os municípios recebem e pela dificuldade de
definir quais são os mais interessantes para o momento. Vale ressaltar que a
dificuldade na definição pode se dar em consequência da falta de esmero na forma
de apresentação dos projetos, que, em muitos casos – como pode ter sido o nosso –,
não são explícitos o suficiente nos própositos e na operacionalização ou são
por parte de quem os avalia.
atividades das Secretarias, que não devem ter considerado o projeto prioritário, pois
não retornavam as ligações telefônicas, diziam que os responsáveis estavam sempre
em reunião ou viajando e não tomavam decisão alguma. O único retorno que recebi
estudando a possibilidade de realizalo. A meu ver pareceu falta de interesse ou
procrastinação na decisão.
60
Para a terceira, percebo o componente emocional, pois uma coisa – que
pode ser evasiva – é a apresentação de um projeto por escrito e outra, bem distinta,
receber uma resposta negativa de imediato, de não ser atendido por não ter
agendado a visita etc., aliada à motivação da presença do proponente, munido dos
equipamentos, disposto a iniciar os trabalhos imediatamente. Entendo que o detalhe
da possibilidade imediata de realização do projeto tenha sido o maior motivador
para a realização do Cinema na Roça em Sumidouro.
Segundo Geertz os sistemas culturais são chamados assim por apresentarem
“um grau mínimo de coerência”, 53 ou, do contrário, não seriam reconhecidos como
sistemas. No entanto, não se pode esperar que todas as “peças do quebracabeças”
surjam na ordem de montagem do mosaico. Não há espaço para esse tipo de rigidez
e, no meu entender, esse acontecimento reforça a tese de Geertz ao dizer que o
pesquisador precisa lidar com a falta de coerência.
Quem nos acompanhou no município foi Kelvin Schwenk Morezini, um
jovem de 17 anos e estudante do curso de formação de professores, filho de Paulo
Cesar Morezini, funcionário público lotado na Companhia de Águas e Esgoto do
Rio de Janeiro (CEDAE) em Sumidouro e da auxiliar de odontologia Edna
Schwenk Morezini. Ele fazia parte de um grupo de voluntários para ações da
Secretaria de Educação e foi designado a nos levar às localidades do município.
A primeira exibição de Sumidouro aconteceu no dia 15 de fevereiro de
2006, na localidade de Porteira Verde, pertencente ao primeiro distrito, de fácil
acesso, pequena e que reúne aproximadamente 600 pessoas. Ao chegarmos – por
orientação do Kelvin – procuramos a Circe, dona de um restaurante – em obras –
53
GEERTZ, Clifford. P. 13
61
que usualmente era utilizado como ponto de encontro na localidade, no qual, antes
da reforma, frequentemente, eram realizados bailes e festas. Kelvin sugeriu esse
local pelo fato de as pessoas já o vincularem à realização de eventos e porque
teríamos pouco tempo para a divulgação. Por ser conhecido, acreditávamos que
fosse contribuir para atrair mais pessoas para a sessão de cinema.
Ao abordarmos a Circe que, juntamente com seu filho Felipe, lavava o piso
do salão principal recémpintado, expliquei que o motivo da nossa visita era
verificar a possibilidade de cessão do restaurante para a realização de uma sessão de
cinema aberta ao público. No primeiro momento ela ficou empolgada com a idéia,
porém ficou temerosa pelo fato de a obra ainda não ter sido concluída e porque não
teria condições de garantir o conforto das pessoas. Assim que esclareci que a
ela precisaria apenas emprestar as cadeiras do local, tornouse mais uma aliada da
avisando as pessoas das sessão de cinema.
Circe é uma mulher de pele clara, que tem por volta de 47 anos de idade, e
muito falante. Além de se envolver com a preparação do espaço para a realização da
sessão, se prontificou a preparar uma “galinhada” – frango cozido em pequenos
pedaços com molho – com cerveja, cachorro quente e pipoca para comemorar a
atração.
Vale lembrar que era período de férias escolares e talvez por isso quase não
tenha sido necessário fazer divulgação, pois a notícia se espalhou rapidamente e em
poucas horas havia mais de 20 pessoas – na maioria crianças – nas proximidades do
restaurante.
62
Cerca de uma hora antes de inciarmos a sessão, armouse um temporal sobre
inclusive, a montagem dos equipamentos. Com quase uma hora de atraso em
relação ao horário previsto para o início da sessão, quando muitos não acreditavam
mais na realização do cinema, conseguimos montar a estrutura. As pessoas
permaneceram na varanda traseira do restaurante enquanto a tela permeneceu na
chuva. Apesar do temporal, cerca de 50 pessoas estiveram presentes e o público era
formado basicamente de adolescentes. Havia alguns adultos e as crianças não
somavam 15 pessoas.
A dinâmica de escolha dos filmes seguiu a mesma rotina das demais
localidades e dessa vez não houve tentativa de debate por dois motivos: o primeiro
tivemos como posicionar o receptor do microfone no teto do carro, e o segundo foi
a dispersão do espectadores devido à disposição das pessoas nos dois andares da
varanda do restaurante.
No segundo dia de projeções fomos à localidade de Soledade III,
pertencente ao 4º distrito. Soledade III é composta de sítios e o centro do vilarejo
reúne aproximadamente 15 casas espaçadas ao longo da estrada de terra, uma igreja
em frente ao campo de futebol e uma venda nas proximidades das casas. A projeção
aconteceu no dia 16 de fevereiro de 2006, porém nossa primeira visita ao vilarejo
aconteceu no dia anterior. A localidade dista cerca de 40 km da sede do município
e seu acesso se dá por estrada de terra. No caminho há várias lavouras de hortaliças
como de bertalha e couveflor. Numa dessas conhecemos Silvia, Adail e o pai deste.
Os dois cuidavam da colheita da bertalha, enquanto o sogro de Silvia cuidava
sozinho da couveflor. Os três moravam nas proximidades de Soledade III e foram
63
convidados a comparecer à sessão de cinema que realizaríamos no vilarejo. Eles nos
sugeriram que realizássemos a sessão no campo de futebol, pela facilidade de reunir
as pessoas. No entanto, me disseram que não iriam assistir porque tinham o hábito
de dormir muito cedo – por volta das 19 horas – porque a lida na roça começava
antes das cinco da manhã.
Ao chegarmos em Soledade III conhecemos o Sr. José Monteiro, de
aproximadamente 60 anos, aparentando ser de origem nordestina e residente há
mais de 40 anos na localidade. Como o campo de futebol estava infestado de
carrapatos, nos cedeu um terreno entre a sua casa e a igreja para a realização da
sessão.
pessoas da redondeza. Mas, como iria naquele dia ao município vizinho de Duas
Barras, se prontificou a ajudar na divulgação, avisando às pessoas que cruzassem
seu caminho e pediria aos “garotos” da redondeza para correr as casas.
Em poucos minutos de conversa nos convidou para entrarmos em sua casa e
nos ofereceu café. Sua filha, com idade por volta dos 12 anos, se interessou pelo
respondeume que nunca havia ido ao cinema.
Uma preocupação do Sr. José Monteiro era saber se o filme teria palavrões,
cenas de sexo e/ou violência. Vale ressaltar que, entre todas as localidades por onde
passamos, ele foi o único a falar francamente sobre essa preocupação.
Nesse dia que antecedeu a exibição em Soledade III realizamos uma breve
com a maior dificuldade para convencer a população de que o cinema era realmente
gratuito. Muitas pessoas perguntavam se realmente não precisavam pagar nada e,
64
por vezes, fui abordado por pessoas que me diziam que, se fosse para pagar mesmo
que um real, não teriam condições de comparecer. Até mesmo a família do Sr. José
Monteiro – sua filha e esposa – perguntaram mais de uma vez se realmente seria de
graça. Com o passar do tempo entendemos que o problema estava em parte na
forma de divulgação, pois teríamos que dizer que as projeções eram “de graça”, em
vez de dizer que eram “gratuitas”. Pode ser uma coincidência, ou que minha
exibições.
Na tarde do dia 16 de fevereiro de 2006 voltamos, como previsto, para
realizar a sessão de Soledade III. Havia pouco mais de 50 pessoas presentes e, para
essa sessão, não conseguimos cadeira alguma. O público era composto em sua
maioria de adultos. Havia menos de dez crianças e cerca de oito pessoas acima dos
60 anos. Os filmes escolhidos foram Tainá e Olho da Rua.
Das 50 pessoas presente à sessão, cerca de 80% permaneceu sentada sobre a
cerca do campo de futebol, em frente ao local de projeção. Cerca de seis idosos
conseguiram cadeiras e assistiram à sessão sentados. Durante a exibição dos filmes,
tanto em Sumidouro como em outros municípios, é comum ver as pessoas
dialogando com o filme. Dos filmes do acervo do projeto, a cena inicial de O
Caminho das Nuvens é uma das que causa as reações mais fortes nas pessoas,
porque retrata um momento de quase atropelamento de um bebê, filho de Romão,
personagem de Wagner Moura, e de Rose, personagem de Claudia Abreu. Nesse dia
em Soledade III, as senhoras sentadas nas cadeiras chegaram a cobrir o rosto com as
mãos para não ver a cena. Também é comum ver pessoas torcendo para um bom
desfecho dos enredos, como, por exemplo, em Central do Brasil, quando Dora,
65
personagem de Fenanda Montenegro, encontra os familiares de Josué, personagem
de Vinícius de Oliveira. Ou então indignandose com alguma passagem dos filmes,
como, por exemplo, em Tainá, quando Shoba, personagem de Alexandre Zachia,
aceita vender um exemplar de determinada espécie de macaco amazônico à
pesquisadora estrangeira Miss Meg, personagem de Betty Erthal.
A exibição do dia 18 de fevereiro de 2006 foi no centro de Sumidouro, que é
bastante pacato, reúne cerca de 2.500 habitantes, possui comércios variados e uma
pequena indústria de brocas de perfuração. Apesar de não ser um local foco do
Cinema na Roça, por conter videolocadoras e pessoas que têm mais acesso a
pedido de Yohana Esteves, realizamos uma sessão no pátio da igreja matriz, junto à
sessão, muitas das quais não atentas ao filme e sim ao acontecimento. O público era
formado basicamente de crianças, acompanhadas de seus familiares. A cerca de 50
metros do local de exibição – junto a um quiosque – reuniamse mais cerca de 40
pessoas que acompanhavam de longe a sessão.
Essa exibição em Sumidouro serviu para demonstrar que a aceitação ao
projeto é semelhante tanto nas sedes dos municípios quanto nas zonas rurais ou
povoados distantes, considerando algumas adaptações, é claro. Apesar da diferença
de comportamento entre as pessoas do meio rural e o das sedes, que basicamente se
resume ao fato de que no meio rural as pessoas ficam mais atentas ao filmes, é a
Tanto nos pequenos povoados quanto nos centros, o principal fator que
influencia o ato de assistir aos filmes na rua ou em casa é o tamanho da estrutura.
66
Percebi que, no primeiro momento, o maior atrativo para a reunião de pessoas para
as sessões é o tamanho da tela e que, quanto maior, mais atraente se torna.
A diferença entre exibir filmes nas localidades mais afastadas e nas sedes
dos municípios reside apenas na variedade de filmes, pois, quando há a presença de
videolocadoras nas sedes, o acervo que atende às espectativas dos moradores dos
centros é bastante menor do que o dos habitantes dos povoados.
Gostaria de registrar que durante a concepção do Cinema na Roça não
considerei a possibilidade de exibir filmes nas sedes dos municípios por alguns
motivos que já foram explorados e outros que ainda serão abordados ao longo desse
trabalho, porém, nesse momento gostaria de destacar o fato de que foi devido às
limitações orçamentárias do projeto, que tomei a decisão de priorizar apenas as
localidades mais carentes de equipamentos culturais, ao passo que eu gostaria de
levar a todas as localidades e, por isso, não considerei a hipótese de realizar sessões
nos centros. Essa demanda surgiu por solicitação dos representantes do poder
viabilização do projeto, como no caso de Sumidouro, com Yohana, e de São José do
Vale do Rio Preto, com Marco Aurélio.
Nesse dia, Yohana estava muito preocupada com a presença de um
jornalista da região, devido, segundo ela, às críticas que ele fazia às ações do poder
público e, por isso, pediume que exibíssemos um “filme de verdade”, ou seja, que
não projetássemos um dos curta metragens do acervo. Para a sua felicidade, o filme
escolhido pelas crianças foi Tainá.
Para organizar o quarto e último dia de exibições, que aconteceu em 19 de
fevereiro de 2006, fomos até o distrito de Campinas na véspera, que é
essencialmente agrícola e tem sua sede formada por uma rua principal, aonde existe
67
uma igreja católica, um campo de futebol de dimensões oficiais, um posto de
aproximadamente 50 minutos por estradas de terra. Ao chegarmos em Campinas
perguntamos onde havia um local adequado para realizarmos a projeção e um dos
moradores me orientou a seguir por mais alguns quilômetros e procurar o vice
prefeito – conhecido na região como Sérgio do Dino – no vilarejo de Caramandu.
Seu nome verdadeiro é Sergio Paulo da Silva. Ele e Idali, sua esposa, foram
muito acessíveis e receptivos. Assim que chegamos, Sérgio estava na plantação e a
Idali pediu que esperássemos, pois ele já deveria estar chegando. Enquanto isso nos
ofereceu café com biscoitos e expliquei a ela o propósito do Cinema na Roça.
Quando Sergio chegou nem foi preciso explicar muito do que se tratava.
Idali gostaram tanto da idéia e devido ao envolvimento repentino deles na
organização da projeção, adiamos nossa partida do município e permancemos em
Sumidouro por mais um dia para a sessão em Campinas.
A idéia inicial era montar a estrutura dentro do campo de futebol do distrito,
mas como não havia como entrar com o carro no campo, mais uma vez realizamos a
sessão num terreno entre uma igreja e um campo de futebol. Essa sessão reuniu um
número de pessoas abaixo do esperado – no máximo 40 pessoas – e o público
essencialmente adolescente. Além da família de Sergio e Idali, havia outras três
sentadas no gramado. Os demais espectadores sentaramse no calçamento da igreja,
enquanto alguns peramenceram em pé nas proximidades da tela. Durante a exibição
68
havia quatro meninas adolescentes comentando que a idéia era boa, mas que a
Friburgo e que, por isso, havia poucas pessoas no local.
2.4 Santa Maria Madalena
É um município que ocupa uma área de 816 km² e tem aproximadamente
10.200 habitantes, dos quais 5.692 vivem na área rural 54 . O IDH de Santa Maria
Madalena é (0,734) 55 e o município dista – pela BR 101 – 250 km da capital do
estado. Faz divisa ao norte com São Fidelis e São Sebastião do Alto; ao sul, com
São Sebastião do Alto 56 . O município é dividido nos distritos de Santa Maria
Madalena, Triunfo, Santo Antônio do Imbé, Dr. Loreti, Renascença e Sossego. Seu
prefeito chamase Clementino da Conceição, filiado ao PMDB e eleito com 3.883
votos 57 .
Estivemos duas vezes em Santa Maria Madalena. A primeira vez foi em
março de 2006 e fomos eu, Marcos Martinelli e Luiz Claudio Pinto Anjos. Porém,
essa nossa passagem coincidiu com a data de comemorações políticas de apoio a
Sergio Cabral, então candidato a governador do estado do Rio de Janeiro e, por isso,
realizamos apenas uma sessão. Nessa ocasião, enquanto aguardávamos para sermos
atendidos pelo secretário de Educação e viceprefeito da cidade, conhecemos uma
senhora chamada Consuelo, que nos relatou que no passado promoveu no muicípio
54
Ver http://www.pmsmm.rj.gov.br/dados_gerais.htm.
55
Fonte: Atlas do desenvolvimento humano.
56
Ver http://www.pmsmm.rj.gov.br/dados_gerais.htm.
57
Para mais detalhes ver www.tse.gov.br.
69
uma atividade bastante parecida. Posteriormente vim a saber que ela havia sido
secretária de Educação de Santa Maria Madalena.
sede, pois naquele dia haveria um aniversário de 15 anos na localidade. Seguimos
para Santo Antônio do Imbé, mas, como não conseguimos mobilizar as pessoas
para uma exibição no próprio dia, decidimos seguir por mais cerca de 50 km e
realizar o Cinema na Roça em Sossego do Imbé, vilarejo situado ao pé do Parque
do Desengano no qual moram cerca de 100 pessoas. Chegamos por volta das 14
horas e circulamos pelo vilarejo até que apareceu um curioso e começamos a falar
sobre a idéia.
Há duas coisas que se repetem e acho impressionantes porque, ao conceber
o projeto, não tinha idéia de que isso aconteceria. A primeira delas, a importância
que as pessoas têm dado a uma sessão do Cinema na Roça. Há um contraste muito
grande na maneira como as pessoas se preparam para ir a uma sessão de cinema na
cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, e nessas localidades. Em todoas as sessões
do projeto, vejo famílias inteiras reunidas. As pessoas vestemse com roupas que
usam normalmente para ir à igreja ou a uma festa. A segunda é acuriosidade pela
gratuidade da projeção. Algumas vezes é mais fácil encontrar o local e montar toda
Em Sossego achamos que o local ideal seria um terreno em frente à venda
de uma senhora chamada Rosa, mas, como a cerca de 50 metros havia outra venda e
envolvidas com a política local, fomos convidar os donos do outro estabelecimento
70
para tentar evitar o ocorrido no bar do Bal em Juturnaíba, quando algumas pessoas
não compareceram por conta das divergências políticas.
Nesse dia almoçamos na pensão da Dona Ana e do Sr. Cristóvão, de 71
anos. Muito simpático, contador de “causos”. Trabalhou a vida inteira como
motorista, contou histórias de quando a Rodovia Presidente Dutra (RioSão Paulo)
estava em construção, das suas aventuras “puxando 58 ” Praianinha, falou da época
que se comprava carro por fotografia, da dificuldade de parar os caminhões com
freio mecânico, do seu carinho por JK, dos motoristas que hoje em dia não sabem
dirigir no barro e que nunca tinha ido ao cinema. Dona Ana, igualmente simpática,
porém mais recatada demonstrou mais interesse na sessão de cinema que iria
acontecer. Perguntou sobre o horário e sobre o título que iríamos exibir. Disseme
que tinha preferência por filmes românticos como o Titanic, 59 que assistiu na
televisão, que não gostava de filmes tristes e que não se recordava a última vez que
tinha ido ao cinema. No horário da sessão o Sr. Cristóvão não compareceu, mas
Dona Ana sim e, pelo que pude perceber pelo seu comportamento, aprovou a idéia,
pois a vi com os olhos “vidrados” na tela durante a sessão.
Nessa mesma tarde fomos convidados para um cafezinho na casa da tia do
Leonardo, um jovem que estava passando uns dias na localidade e que conhecemos
lá e que foi à sessão com a sua namorada.
Foi em Sossego do Imbé que atentei para a inibição causada pelo microfone
quando usado pelos espectadores. Cheguei à conclusão de que ouvir a própria voz
saindo, em alto volume, das caixas de som os inibe muito, ao ponto de não
58
Essa é uma expressão coloquial que grande parte dos caminhoneiros usa ao se referir à atividade
de transportar carga.
59
Gênero: drama/romance; ano de Lançamento (EUA): 1997; estúdio: 20th Century Fox /
Paramount Pictures / Lightstorm Entertainment; direção: James Cameron. Para mais detalhes ver
http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/titanic/titanic.asp.
71
quererem falar, ao passo que, longe do aparelho de som, falam sobre todos os
assuntos.
Nosso retorno a Santa Maria Madalena foi em maio de 2007 e aconteceu de
forma diferente da primeira. Dessa vez chegamos ao município representando a
Brasil Social, com os compromissos todos agendados e com a nova estrutura do
Cinema na Roça: a nova tela, inflável, com 300 polegadas de área de projeção.
faríamos três projeções entre sextafeira e domingo e que, na segundafeira seguinte
às exibições, teríamos uma reunião com os representantes do município para
realizarmos um balanço das projeções.
Chegamos em Santa Maria Madalena no dia 18 de maio de 2007 e
estávamos – eu e o Marcos – acompanhados do nosso amigo e voluntário Joelmo
Ribeiro, morador de Conceição de Macabu, um município vizinho. Nossa rotina
inicial foi muito parecida com a primeira vez em Madalena, mas dessa vez
chegamos na cidade próximo ao horário do almoço e fomos recepcionados por
Silvio José Arruda Valente, assessor do viceprefeito e secretário de Educação.
Mais tarde o vice e secretário de Educação, Marcelo Freixo de Lima, juntouse a
nós para o almoço, com mais alguns assessores, entre os quais Consuelo, que
havíamos conhecido durante a nossa primeira visita ao município. Dessa vez
teríamos o Silvio como nosso cicerone; ele nos acompanharia nos demais dias em
que permaceríamos no município.
A primeira localidade de projeção foi Ribeirão Santíssimo, uma localidade
pequena, resumida a um campo de futebol, uma venda e algumas casas afastadas.
Para chegar a Ribeirão percorremos cerca de dez quilômetros por estada de terra, o
que consumiu aproximadamente 20 minutos. Ribeirão, apesar de ficar relativamente
72
próximo ao centro, é um lugar bastante ermo. Lá chegando, fiquei surpreso, pois, de
tão pequena, pensei que fosse uma sessão para no máximo 30 pessoas. Tudo que eu
avistava era um campo de futebol com alguns carneiros pastando e uma venda em
frente ao campo.
Para essa exibição necessitaríamos de um suporte de energia, pois a nova
tela consome mais energia do que o sistema do veículo pode prover. Por esse
motivo precisamos ligar um fio de extensão diretamente da venda até o local de
terra, uma vez que a localidade era muito pacata e quase não passavam veículos na
estrada. Vale ressaltar que, além de gentilmente ceder a energia elétrica para a
nossas despesas.
Levamos por volta de uma hora para montar toda a estrutura, pois como era
a primeira vez que montávamos a tela inflável em um local de exibição, tivemos
que atentar para vários detalhes ainda desapercebidos. A ajuda de Joelmo e Silvio
foi fundamental. Diferentemente da maioria das localidades, dessa vez a única ajuda
local com a qual contamos foi a do dono da venda.
Em Madalena, a Secretaria de Educação disponibilizou o transporte escolar
para buscar as pessoas em casa e essa ajuda foi fundamental para que mais pessoas
tivessem condições de comparecer ao evento. Diferente do que eu imaginava, em
oriundas de localidades próximas, como Gordura e Barra Linda, que somente
tiveram condições de ir graças ao transporte escolar que foi disponibilizado para o
evento.
73
Em Ribeirão Santíssimo exibimos dois filmes. O primeiro foi Carros 60 e
teve boa aceitação entre adultos e crianças. O segundo foi Se Eu Fosse Você 61 , não
tão aceito, começou com cerca de 70 espectadores e terminou com menos de 10.
primeira delas é que as pessoas chegaram antes da hora – em função do transporte
escolar – e permanceram sentadas nos bancos até o início da sessão às 18 horas.
Normalmente temos que atrasar a sessão por 15 ou 20 minutos, por conta das
pessoas que chegam atrasadas, mas em Ribeirão pudemos iniciar a sessão
pontualmente no horário. Assim como nos demais locais, cerca de 90% dos
presentes nunca havia ido ao cinema e em Ribeirão todos disseram nunca ter
assistido aos filmes que propusemos. O fato que mais chamou a minha atenção foi
que normalmente, antes das sessões, brinco um pouco com os presentes fazendo
uma série de perguntas, para as quais devem responder dizendo “eu”. São perguntas
como: quem quer assistir ao filme, quem quer pipoca, quem está feliz hoje etc. e a
última pergunta é quem está com cecê. Em todas as localidades algumas pessoas,
deastentamente, respondem. Em Ribeirão Santíssimo ninguém respondeu.
O segundo dia de projeções foi na localidade de Triunfo, que fica a uma
distância de 40 quilômetros da sede do município, porém todo o caminho é feito por
estrada de asfalto. Para chegar a Triunfo é necessário voltar para a estrada que dá
acesso a Santa Maria Madalena, em direção a Conceição de Macabu. A bem da
verdade, Triunfo está mais perto de Conceição do que de Madalena. É uma
localidade à beira da estrada e um local de passagem. Dificilmente as pessoas saem
de suas localidades para irem a Triunfo ou a Rio Dourado em busca de diversão.
60
Origem: EUA; gênero: Animação; lançamento no Brasil: 2006; estúdio: Disney/Pixar; direção:
John Lasseter. Para mais detalhes ver http://www.disney.com.br/cinema/carros/.
61
Origem: Brasil; gênero: Comédia; lançamento no Brasil: 2007; estúdio: Total
Entertainment/Lereby/Globo Filmes/ Fox Film do Brasil; direção: Daniel Filho.
74
Quando saem à procura de “algo para fazer”, vão para Rio das Ostras e Conceição
de Macabu.
Inicialmente a proposta era realizar a sessão em frente à creche do distrito.
No entanto, decidimos realizála ao lado da Escola Estaual Municipalizada Corrégio
de Castro por conta de um evento que aconteceria no local, para arrecadação de
donativos para a festa da igreja. Nesse dia Silvio não pode nos acompanhar e
Joelmo teria que voltar a Conceição logo após a exibição do filme. Na parte da
tarde nos encontramos com o prefeito acompanhando uma obra na cooperativa
agropecuária – próxima à sua fazenda – em Triunfo e nos disse que compareceria à
sessão. Mas não compareceu.
chuva. Como em Triunfo não tínhamos outra alternativa de local para exibição, pois
o ginásio poliesportivo tem a acústica muito prejudicada, decidimos montar tela a
céu aberto mesmo e correr o risco de realizar a sessão embaixo de chuva. Foi
todo momento, demonstrando a intenção de cancelar a exibição por conta da chuva.
Se não fosse a nossa insistência em montar a estrutura, mesmo correndo o risco do
não comparecimento dos espectadores, não teriam acontecido as sessões de Triunfo.
Um pouco antes do início da sessão caiu uma chuva fina e de forma
improvisada conseguimos montar uma pequena tenda e as crianças se posicionaram
abaixo dela. Algumas pessoas permanceram dentro da escola e começaram a assistir
ao filme sobre o muro.
Com cerca de dez minutos de iniciada a sessão, a chuva parou. Com isso,
várias pessoas se aproximaram e chegamos a ter mais de 60 pessoas em cada
75
sessão. Nesse dia exibimos os filmes Carros e Quarteto Fantástico 62 . Uma
curiosidade dessa exibição é que o público se alternou entre os filmes. Durante a
exibição de Carros, a maioria dos espectadores era formada de crianças. À medida
assistiram ao filme. Até então isso não havia acontecido. Normalmente algumas
pessoas se alternam, mas em Triunfo houve uma mudança radical de público.
Nossa última exibição em Madalena aconteceu em Sossego do Imbé e
marcava aproximadamente dez meses da nossa primeira passagem por lá. O dia
estava chuvoso e, como disse anteriormente, chegar em Sossgo do Imbé é uma
longa viagem. Dessa vez levamos quase duas horas para chegar e, ao chegarmos,
fomos diretamente para a casa de um vereador e morador da localidade. Grande
incentivador das exibições em Sossego, Edmar Farah Ramos, vulgo Mazinho, nos
Mazinho.
Decidimos montar o cinema no centro comunitário – que é uma construção
pública equipada com pias, bancos e banheiros, usada para a realização de
aniversários, celebração de casamentos, entre outros – e isso significava que não
conseguiríamos montar a tela inflável, que possui quase sete metros de altura,
enquanto o pé direito do centro comunitário tinha cerca de três. Além disso, eu
estava temeroso em relação à presença do público, pois – assim como aconteceu em
Gaviões – havia muito tempo que chovia ininterruptamente.
Sossego do Imbé tem se mostrado surpreendente. Desde a primeira vez que
estivemos lá, fiquei supreso com o interesse das pessoas. O primeiro filme a ser
62
Gênero: aventura; ano de Lançamento (EUA): 2005; estúdio: 20th Century Fox / Marvel
Enterprises / 1492 Pictures / Constantin Film Produktion GmbH; direção: Tim Story para mais
detalhes ver http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/quartetofantastico/quarteto
fantastico.asp.
76
projetado foi Meu Tio Matou um Cara e o segundo foi Carros. Durante a enquete
para a escolha dos filmes, pediram que fosse de aventura, terror ou de brigas.
Apesar de ninguém manifestar o interesse por comédia, ao escolherem os filmes,
deram preferência à comédia e nacional.
Nessa exibição em Sossego do Imbé tivemos alguns contratempos. Além da
chuva e do frio, no meio da sessão faltou luz na localidade, porém todos
aguardaram pacientemente por volta de 15 minutos até que ligássemos o sistema de
alimentação do veículo. Outra manifestação interessante é que todos permaneceram
nas duas sessões e ainda se lembravam do filme que havíamos projetado quase um
ano antes. A professora Viviane, presente à sessão, disse aos alunos que trabalharia
o tema dos filmes em sala de aula e em dois anos de Cinema na Roça ela foi a
primeira professora que manifestou explicitamente esse interesse.
Vale a pena ressaltar que em todas as projeções de Madalena houve
distribuição gratuita de pipoca e refresco e que a ajuda da Secretaria de Educação,
fornecendo o transporte gratuito em todas as projeções foi um diferencial do
município. Em Sossego do Imbé o público se manteve concentrado durante as duas
ficou nítido, em algumas localidades, que a exibição de dois filmes excedia a
capacidade de concentração e o interesse dos espectadores. Em Ribeirão Santíssimo
encontramos muita dificuldade para conseguir os depoimentos das pessoas, mas
uma menina presente foi bastante sincera ao dizer que não prestou atenção no filme
e que usou o momento para rever as amigas e conversar.
reunião com os representantes de Santa Maria Madalena. Estavam presentes o vice
prefeito Marcelo Freixo de Lima, Silvio Valente e Consuelo – assessores do vice
77
prefeito – e a coordenadora pedagógica da Secretaria de Educação. Durante a
município e uma proposta de levarmos o Cinema na Roça para as escolas –
resultado das mudanças ocorridas no projeto e que serão abordadas no capítulo 3 do
presente trabalho. Após apresentarmos nossa proposta, Marcelo Freixo pediu que
Sílvio apresentasse um relato com suas considerações sobre as exibições, visto que
citando que as pessoas haviam ficado maravilhadas com o cinema, que viu muitas
pessoas que nunca tinham ido ao cinema e que ficaram emocionadas, elogiou os
equipamentos e a qualidade do som, falou que as projeções reuniram muitas pessoas
e que a que ele mais gostou foi a de Ribeirão Santíssimo porque reuniu as pessoas
mais humildes e com menos acesso às coisas que acontecem no município, por ser
um local carente e distante. Ressaltou que, apesar da nossa predisposição de realizar
várias sessões em uma mesma noite, na maioria das localidades de Madalena não
conseguiríamos porque as pessoas não teriam resistência física para assistir a filmes
seguidos e finalizou dizendo que, para o município, seria uma coisa muito
importante porque as pessoas são carentes de atrações.
Ao final da apresentação das considerações do Silvio iniciamos uma
discussão a respeito da viabilidade e da aplicabilidade da proposta para o município,
regular em Santa Maria Madalena. Mas até o momento do término do presente
em Madalena. Em seguida, o viceprefeito referendou as considerações do Silvio e
78
disse que apresentaria a proposta ao prefeito, pois não achava o custo de realização
alto, mas que precisava verificar de onde teriam que descolacar a verba.
2.4 Casimiro de Abreu
É um município de aproximadamente 26.978 habitantes, ocupa uma área de
461 km² e tem o IDH (0,781). 63 Dista cerca de 160 km da cidade do Rio de Janeiro,
em direção ao norte do estado. Faz divisa com os municípios fluminenses de Rio
das Ostras, Nova Friburgo, Silva Jardim, Macaé e Cabo Frio. Atualmente, o prefeito
é Paulo Cezar Dames de Castro, filiado PMDB, eleito em 2004 com 9.036 votos 64 .
O município é dividido nos distritos de Casimiro de Abreu, Barra de São João,
Professor Souza, e Rio Dourado 65 .
Entre as exibições de Sumidouro e as de Casimiro ocorreram algumas
mudanças no projeto. Essa mudanças serão abordadas detalhadamente no terceiro
capítulo do presente trabalho. Por ora vale ressaltar que, durante essas exibições, já
independente do IDH e da presença de cinemas, pois chegamos à conclusão de que
esse critério não representava mais um indicador justificável. Nessa época já
contávamos com a nova estrutura de tela inflável e bastava, apenas, que os
projeto. Casimiro também possui uma sala pública de exibição e nossa proposta foi
63
Para mais detalhes ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 e Atlas do
desenvolvimento humano.
64
Para mais detalhes ver www.tse.gov.br.
65
http://www.casimiro.rj.gov.br/info_municipio.php.
79
a de manter a realização das sessões em localidades distantes do centro, onde está
localizada a sala.
Chegamos a Casimiro por intermédio do Luiz Nelson e com três projeções
agendadas. A primeira delas, em Palmital; a segunda, em Rio Dourado, e a terceira,
em Professor Souza. Na segundafeira posterior às projeções – assim como em
Madalena – tinhamos o compromisso de fazer uma apresentação formal do projeto
cinema para as escolas da rede municipal. Em Casimiro fomos recebidos por
Soninha, diretora da Fundação Cultural Casimiro de Abreu e pelo seu assessor
Vaninho, que nos acompanhou em quase todas as localidades.
Palmital, que é uma localidade preterida e disputada ao mesmo tempo pelos
poderes públicos, fica dentro dos limites do distrito de Barra de São João e, por ter
uma localização limítrofe entre Casimiro e Rio das Ostras, há uma ambiguidade de
Palmital é desejada pelos dois municípios para fins de censo e esquecida no tocante
oficiais dos dois municícios em Palmital e chegase ao ponto curioso de a coleta de
lixo de dois lados de uma mesma rua ficar a cargo de duas prefeituras diferentes ou
de nenhuma. Enquanto estávamos lá ouvi de alguns moradores que ambas
prefeituras se preocupam muito com a localidade apenas na época das eleições e no
momento de cobrança de impostos.
A projeção em Palmital aconteceu na Praça do Pesque e Leve. A praça é o
resultado de um litígio gerado por conta do não pagamento do Imposto Predial
Territorial Urbano (IPTU). De acordo com as pessoas do local, um habitante da
região, para findar o litígio, que havia anos tramitava na Justiça, propôs um acordo,
80
pelo qual o poder público tornou o espaço inalienável. Desse acordo resultou a
construção da praça a cargo do proprietário do terreno. A praça do Pesque e Leve é
uma área de pesca comunitária, na qual os moradores podem pescar gratuitamente
durante os finais de semana e levar o pescado para ser consumido em suas casas.
Nossa chegada em Palmital marcou a semana de inauguração da praça e
tudo ainda estava muito novo e com sinais de pouco uso. Ao começarmos a montar
a estrutura do cinema, muitas crianças se juntaram a nós e se voluntariaram para
ajudar na montagem. Como a tela inflável lembra um “pulapula”, as crianças se
divertiram durante a montagem tentando descobrir do que ser tratava exatamente.
Nessa projeção conseguimos reunir cerca de 250 pessoas, sendo que muitas
ambiente de festa, e não a fim de assistir ao filme. Algumas características da
quatro meninos na faixa dos 11 anos, que insistiram em assistir ao filme por trás da
tela, com a imagem invertida. Como o pano de projeção é translúcido, conseguese
assistir ao filme dessa forma. A curiosidade desses meninos parecia estar mais
ligada ao diferente, às suas relações com o equipamento do que ao filme
propriamente dito. Outro aspecto curioso foi que, ao término do primeiro filme, as
pessoas se levantaram e deixaram a praça sem esperar para saber se haveria mais
uma sessão, pois no início da projeção havíamos anunciado a possibilidade de
projetarmos dois filmes. Em Palmital não foi muito difícil encontrar pessoas que
quisessem dar seus depoimentos sobre o filme, mas aconteceu de forma muito
pontual e sem profundidade. Apesar do cinema reunir muitas pessoas na praça,
alguns garotos continuaram a jogar futebol em uma quadra pública próxima à praça,
como se nada de novo estivesse acontecendo. Por fim, tão logo terminou o filme,
81
com um número reduzido de pessoas, a praça foi tomada pelo ritmo do funk vindo
de um carro estacionado no local.
características muito similares a Triunfo, em Santa Maria Madalena, e, apesar de
percorrermos a localidade divulgando as sessões, de a noite estar agradável e sem
chuva, ter um bom espaço para as pessoas assistirem aos filmes sentadas, no
momento de início havia muito poucas pessoas. Chegamos a ter cerca de 30
havia uma pequena festa em uma igreja da localidade, mas não acredito que esse
tenha sido o motivo de tão baixa frequência, pois tomamos o cuidado de evitar o
horário conflitante. Rio Dourado é uma localidade que se estende ao longo do trilho
do trem e é cortada por uma estrada que faz a ligação entre a Rodovia Amaral
Peixoto, nas proximidades de Rio das Ostras, e a BR101.
interessantes. A primeira delas foi a participação das crianças na montagem da tela
e a curiosidade de alguns adultos que acompanhavam de longe e hesitavam em se
aproximar. Outra questão intrigante foi que em Rio Dourado algumas pessoas se
aproximaram e assistiram ao filme Coronel e o Lobisomen quase todo e, a menos de
15 minutos para o final, se ausentaram do local. Antes da projeção havíamos sido
alertados por Vaninho, Soninha e Luiz Nelson que a comunidade de Rio Dourado
muitas pessoas.
Rio Dourado é muito próximo a Rio das Ostras e há um constante fluxo de
carros fazendo a ligação entre a BR101 e a Rodovia Amaral Peixoto, que dá acesso
tanto a Rio das Ostras quanto a Búzios e, mais à frente, a Cabo Frio. Acredito que o
82
acesso facilitado a esses municípios com mais atrativos culturais motiva os
moradores de Rio Dourado a valorizarem mais os acontecimentos de outros
municípios. Alguns aspectos me levam a essa crença. Em primeiro lugar, está a
distância geográfica, pois Rio Dourado dista cerca de 20 km de Rio das Ostras e
aproximadamente 50 km de Búzios, enquanto que a sede de Casimiro e Rio
Dourado estão afastadas por cerca de 40 km. Um segundo aspecto é a frequência de
eventos disponíveis nos outros municípios, que os torna, sempre, a primeira opção
em relação a Rio Dourado. Por último gostaria de ressaltar o valor atribuído pelas
pessoas dessas localidades ao fato de o evento reunir pessoas de outras localidades,
havendo a possibilidade de “conhecer gente nova”, ou seja, pessoas que não
residam em suas localidades, o que é muito valorizado pelos moradores dos locais
por onde passamos com o Cinema na Roça.
como feito em Triunfo – e agregar outros atrativos ao Cinema para que consigamos
reunir muitas pessoas em localidades com as características de Rio Dourado e
Triunfo. No caso de Rio Dourado, confirmando as expectativas, ao final da sessão
havia apenas um espectador presente – um policial militar que lamentava o fato de
as pessoas não prestigiarem a exibição.
Sobre a evasão ocorrida nessa exibição de Rio Dourado, gostaria de
estabelecer uma relação com o texto de Mauro Wilton de Sousa, publicado em
Sujeito, lado oculto do receptor , e gostaria de fixarme, primeiramente, no papel do
receptor. É bem verdade que, ao pensarmos o processo de comunicação e elevarmos
uma das partes ao título de emissor, enquanto a outra se restringe ao papel de
participação passiva no processo.
83
Podese notar que, na verdade, a despeito das aparências de uma relação de
poder do emissor sobre o receptor, o fluxo da comunicação, não necessariamente,
segue essa lógica. Sobre este ponto, Mauro Wilton chama a atenção, em seu
trabalho, mostrando que não existe uma relação direta, linear, unívoca e necessária
do emissor ao receptor. Segundo o autor devemos desconstruir essa idéia de que o
supérfluos.
uma rede de veículos de comunicação complexa e abrangente, essa não será a
garantia de que quem ocupa a outra ponta do processo de comunicação – aqui
denominado receptor – irá assimilar as intenções do emissor e, muito menos, agir
linearmente ao encontro dos anseios da mensagem. De forma bastante simplória,
vale a afirmação de que, por mais que o emissor detenha algum tipo de poder sobre
o receptor, esse poder não será a garantia de que o receptor consumirá aquilo que
não deseja.
Isso impacta diretamente a exibição pública de filmes porque a permanência
dos espectadores – salvo em locais habitualmente frequentados por outros motivos
– está relacionada à escolha dos filmes, pois, como o ambiente é livre, não é
constrangedor para o público do Cinema na Roça abandonar a sessão a qualquer
tempo. Com isso, o espectador consome o que quer e não há relação de poder entre
“nós” dois. Há uma relação de encantamento, que não dura uma hora e meia caso o
filme não agrade. Não agradar pode significar estar além da leitura que pretende, ter
uma narrativa lenta demais para o seu momento, muito intelectualizado ou
simplesmente ultrapassado para as suas necessidades. Por exemplo, a idéia de
veicular imagens sobre as realizações da gestão municipal antes da projeção dos
84
filmes, como forma de atrair o poder público ao custeio das sessões, pode sair como
um “tiro pela culatra”, por simbolizar que haja vínculo direto entre as ações da
prefeitura e o projeto.
Outro exemplo disso pode residir no fato de que o espectador assiste muito
mais às novelas do que aos programas educativos. Enquanto os índices
apontam, por exemplo, que a novela Paraíso Tropical, da Rede Globo, chegou a
45% de audiência no período compreendido entre os dias 27 de agosto de 2007 e 2
de setembro do mesmo ano, os programas educativos não chegaram a mais de 1%.
É provável que isso aconteça porque a novela alimenta o espectador com algo que
ele quer consumir. O texto de Roseli Azambuja, “A decodificação do discurso
retratar a relevância da televisão na formação dos indivíduos. A autora aborda o
aspecto da companhia que a televisão faz às pessoas – principalmente crianças e
jovens – no seu diaadia e apresenta a identificação dos jovens com os artitstas de
televisão. Seu trabalho pode ser uma dica para a aceitação pelo público dos filmes
que têm a estética parecida com os programas de televisão, como é o caso de
Central do Brasil.
Sobre a importância da televisão na vida do brasileiro, ao compararmos a
jovem, a televisão ocupou rapidamente um lugar de destaque. Segundo Esther
crescimento. Outro aspecto relevante são os momentos econômicos. A autora cita
66
Para mais detalhes ver www.almanaqueibope.com.br. Em 16/09/2007.
85
Luís Carlos Mendonça de Barros e Lídia Goldstein, em O novo capitalismo
brasileiro , ao afirmar que, tanto na época do milagre econômico quanto durante o
vendidos”. Segundo Esther, entre os anos de 1960 – dez anos após a inauguração da
TV no Brasil – e 1991, o percetual de residências com televisores passou de 4,6%
para 71%.
foi muito precisa. Por mais que tenha havido várias tentativas de determinar que
foi muito bem determinada e o público atingido muito bem definido. O que
pretendo dizer com isso é que, apesar dos esforços de direcionamento da mensagem
pretendida com a programação e com os comerciais, sempre houve uma gama de
espectadores não comtemplados nos planos e, com isso, o público “antenado” na
programação televisiva extrapola o planejamento das emissoras.
Para o Cinema na Roça esses pontos são importantes, pois ilustram que não
necessariamente os filmes que abordam questões sociais irão motivar os
espectadores a ações que reduzam as diferenças e as mazelas sociais. Ou seja, a
exibição de filmes não garante nem a presença das pessoas, muito menos que irão
se sensibilizar com alguma causa por conta do filme a que assistiram. Podemos
considerar que pode até haver relações entre o filme e a reação ao filme, mas não há
como antever quais serão.
A última projeção em Casimiro aconteceu na localidade de Professor Souza,
onde se reuniram em volta da praça mais de 100 pessoas. Vale ressaltar que a praça
é um ponto de encontro das pessoas, que têm o costume de se reunirem nos
arredores aos domingos. A dinâmica de montagem seguiu a mesma lógica dos
86
locais em que usamos a tela inflável e, dessa vez, decidimos montar a tela junto aos
trilhos do trem, por não encontrarmos uma opção melhor. As pessoas ficaram
sentadas nos bancos e no meiofio da praça. Ao redor havia alguns bares nos quais
alguns espectadores se acomodaram. Em Professor Souza exibimos os filmes
Carros e A Dona da História e, mais uma vez, alguns espectadores assistiram ao
filme por trás da tela, sendo que dessa vez atribuo a decisão à comodidade, pois por
trás dos equipamentos havia um quiosque com cadeira e visão privilegiada da tela,
porém com a imgem invertida.
Uma consideração sobre Casimiro precisa ser registrada. O município, assim
como Madalena, possui, em sua sede, uma sala pública de cinema e que – também
como em Madalena – é pouco frequentada pelos moradores da cidade.
Da reunião de segundafeira – que aconteceu no interior da sala pública de
cinema –, posterior às projeções, participaram, além de mim e de Marcos
Martinelli; Soninha, diretora da Fundação Cultural Casimiro de Abreu; Luiz
assessores de Soninha, mas a secretária de Educação que foi convidada não pôde
comparecer. Em cerca de meia hora – tempo que nos disponibilizaram –
apresentamos a proposta de exibir os filmes e de leválos também para as escolas.
Luiz Nelson foi quem demonstrou maior interesse pela proposta. Soninha, por sua
vez, se disse interessada, porém que sua Secretaria estava sem verbas para o ano de
2007 e que quem poderia se interessar em custear o projeto – mas que não estava
pesente – era a secretária de Educação. De toda a reunião uma pergunta me pareceu
muito pertinente à localidade: queriam saber quais eram as chances de alterarmos o
nome do projeto.
87
2.5 Trajano de Moraes
É um município que ocupa uma área de 589 km² e de aproximadamente
9.583 habitantes 67 , e tem o IDH (0,723) 68 . Dista cerca de 240 km da cidade do Rio
de Janeiro, em direção ao norte do estado. Faz divisa com os municípios
fluminenses de Nova Friburgo, Cordeiro, Bom Jardim, Macaé, Macuco, São
Sebastião do Alto, Santa Maria Madalena e Conceição de Macabu. Atualmente, o
prefeito é Sérgio Eduardo Gomes de Melo, eleito em 2004 com 2.567 votos 69 . O
Município é dividido nos distritos de Trajano de Moraes, Visconde de Imbé,
Sodrelândia, Tapera e Maria Mendonça.
coincidiu com um final de semana do dia dos pais de 2006. A primeira exibição
aconteceu de forma totalmente voluntária, atendendo ao convite do principal
incentivador, grande amigo e morador da cidad e Felipe Matoso. Conheci Felipe –
que é trajanense e proprietário da única casa lotérica do município – quando ainda
morava em Macaé, pois trabalhávamos na mesma empresa. Depois que voltei ao
Rio mantivemos a amizade e um dia falamos da possibilidade de levarmos o
Cinema na Roça para Trajano.
Ele que organizou os detalhes para a nossa ida ao município. Contactou as
pessoas, identificou os locais e conseguiu hotel. Enfim, foi fundamental. A pedido
de Felipe, os custos de nossa estadia foram patrocinados por Angela, proprietária do
67
Ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1.
68
Para mais detalhes ver http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 e Atlas do
desenvolvimento humano.
69
Para mais detalhes ver www.tse.gov.br.
88
hotel Trajano de Moraes e outra incentivadora dos acontecimentos do município.
Os demais custos, como alimentação e combustível, ficaram por nossa conta. Como
em Sumidouro, saímos do Rio de Janeiro sem contato algum com o poder público.
Durante essa primeira estadia em Trajano, contamos apenas com a ajuda dos
moradores de Trajano de Moraes.
Outro grande parceiro em Trajano foi o jovem Allan Almeida, de 18 anos,
estudante do curso de formação de professores, que nos acompanhou durante o
primeiro dia. Nos conhecemos em frente ao Centro Integrado de Educação Pública
(CIEP) da cidade e ele nos levou a Monte Café, onde foi a nossa primeira projeção.
No caminho conversamos sobre muitas coisas, inclusive sobre sua vontade de viver
em uma cidade grande. Assim como a maioria dos jovens, Allan também tem esse
sonho e, repetindo o que ouvimos nos demais municípios que visitamos com o
Cinema na Roça, nos contou que grande parte dos amigos pensa em abandonar o
munícipio quando chega a hora de ingressar na faculdade. Uma particularidade em
relação a Trajano é que sua população diminui a cada censo.
Assim como o Allan, muitos dizem que não há nada a fazer nos locais onde vivem,
que o emprego é escasso e que a política local – de interesses pessoais, de troca de
favores – desestimula a participação. Allan, assim como muitos dos jovens no
interior, tem plena consciência do mundo que o cerca. Ele mesmo teve algumas
oportunidades de estar no Rio de Janeiro, tem consciência dos altos índices de
violência nas cidades grandes, da baixa qualidade de vida nos grandes centros e da
dificuldade de colocarse profissionalmente nessas cidades. Por outro lado, não vê
perspectivas em sua localidade e aponta esses fatores como o principal incentivador
ao êxodo.
89
Sobre a influência da televisão no pensamento dos jovens, gostaria de citar
que Esther Hamburger, em seu livro O Brasil antenado: a sociedade da novela ,
mais acessível o aparelhamento das residências de menor poder aquisitivo com
principalmente nas novelas – era voltado ao público de classe média alta do Rio de
Janeiro. 70 Essa prática legitimou o repertório de uma pequena parcela “privilegiada
da sociedade como um idioma comum através do qual diversas classes sociais,
gerações, gêneros e regiões geográficas puderam interagir.”
Entre as inferências sugeridas pela autora, uma que julgo interessante
ressaltar referese principalmente ao papel das novelas na noção de que a inclusão
social plena poderia surgir através do consumo. Isso pelo fato de serem
direcionadas aos padrões de consumo do público de classe média e acompanhadas
por todas as classes e porque a televisão é reconhecida como veículo capaz de
informar e ensinar sobre a maneira de utilizar produtos.
poderoso para a propaganda e fazem parte de um sistema de criação, exibição e
ajuste de consumo” 71 e complementa dizendo que os mecanismos de feedback
ajudaram a educar telespectadores como consumidores.
Monte Café fica a cerca de 40 minutos por estrada asfaltada de Trajano de
Moraes, é pequenina, formada por cerca seis ruas cortadas pela estrada. Como
normalmente acontece, quando o carro chega nas localidades, as pessoas perguntam
o que é Cinema na Roça e se vai ter cinema na localidade. Ao chegarmos havia
70
HAMBURGER, Esther. p. 71 e ss.
71
HAMBURGER, Esther. p. 72
90
terminavam de sulfatar o tomate e outros se reuniam. Logo localizamos o vereador
fazer contato com a diretora da escola para que cedesse as cadeiras.
Por volta das 18:00 já estava tudo montado e um menino de nome Rodrigo,
de dez anos, foi o primeiro a chegar. De banho tomado, estava pronto para a sessão
pois iria chamar seus colegas.
Dessa vez havia bastantes jovens presentes e, ao exibirmos o filme Olho da
Rua, de Sérgio Bloch, percebi a admiração do público pelo tema e todos
permaneceram perplexos com as cenas. O filme mostra a maneira como várias
pessoas ganham a vida na cidade grande. Todas a levam com dignidade, porém não
é unânime que tenham conseguido realizar seus sonhos da época em que decidiram
viver no Rio de Janeiro.
A dinâmica de escolha dos filmes também tem sido fundamental para
prender a atenção das pessoas e motiválas a falar após a projeção. No entanto,
mesmo as pessoas que manifestam o interesse de compartilhar seus sentimentos,
rapidamente vão embora ao final da última sessão.
papelaria, o proprietário nos falou da falta de opções para os jovens e da constante
emigração para os grandes centros como sendo a principal preocupação na cidade.
No dia 12 de agosto de 2006 seguimos rumo a Ponte de Zinco, pertencente
ao distrito de Maria Mendonça e que fica em um vale e é pequenina como Monte
91
Café. Nesse dia, a exibição aconteceu no campo de futebol que ficava em frente à
escola municipal, da qual pegamos as cadeiras emprestadas.
Nossa primeira passagem por Trajano foi muito interessante por vários
organização das pessoas, mesmo sem contar com o apoio do poder público.
prefeitura em relação ao que acontece e também ao que não acontece. Por exemplo,
se querem organizar uma competição esportiva, uma festa, uma ação social etc. se
dizem dependentes da prefeitura. No entanto, quando estão diante de um evento que
os motiva e julgam realmente interessante, mesmo sem o patrocínio do poder
público conseguem se organizar e realizá lo.
A outra foi a diferença dos discursos do Allan Almeida e do Felipe Matoso
antes e depois de participarem da primeira sessão. O depoimento do Allan me
chamou a atenção porque, ao chegarmos ao município, ele nos disse claramente que
tinha a intenção da abandonar o município e ir morar no Rio de Janeiro ou em outra
grande cidade. Não sei se tomado pela emoção momentânea, mas ao final da nossa
primeira passagem pelo município sua idéia já era bastante diferente e externalizou
a vontade de permancer no município e ajudálo a se tornar um local mais atraente
para se viver, além de monstrar sua vontade de participar mais ativamente do
processo de desenvolvimento socioeconômico do município.
versa configurase por um processo cognitvo e Roberto da Matta atribui tanta
importância a esse processo porque acredita que, ao pesquisador, seja necessária a
capacidade de deslocamento entre culturas, além de estar aberto ao fato de que esse
92
movimento não ocorre via intelecto e sim via experiência socializadora (MATTA,
1978).
Para Geertz, o exercício etnográfico não é um processo de assimilação de
que ele sugere é que o exercício deva contemplar a vivência. Ou seja, ele propõe
que o pesquisador entenda as teias de relações e consiga comunicarse com os
pesquisados. Segundo o autor, não se trata de “tornarnos nativos ou copiálos” 72 e
sim de conseguir estabelecer a conversa com eles, o que, no seu entender, é muito
mais difícil.
Ao depararme com a diferença do discurso do Allan, entre a minha chegada
ao município e após a sua participação no Cinema na Roça, fiquei muito animado
por acreditar na capacidade transformadora do projeto. No entanto, ao visitar a
bibliografia para a confecção dessa dissertação, cheguei à conclusão de que minha
euforia inicial era infundada, pois, ao levar em consideração o processo congntivo e
o deslocamento de culturas levantados por Roberto da Matta, cheguei à conclusão
de que o comportamento do Allan pode ter sido mais influenciado por esse processo
do que pela experiência do cinema. Atualmente acredito que a vivência de
participar do projeto tenha sido a experiência socializadora e que essa experiência
foi a responsável pela nova percepção da localidade. Enquanto isso, para mim
serviu para propiciar um deslocamento entre culturas e para a percepção dos
motivos que levam os jovens a quererem mudarse.
Outro depoimento importante do Allan que resgata as quetões levantadas
por Geertz e Matta foi em relação ao significado de andar no carro do projeto. Ele
72
GEERTZ, Clifford. P. 11
93
nos contou que, no dia em que nos conheceu, “todo o CIEP 73 estava na janela” para
vêlo entrar no carro e que ele se sentia importante por estar andando conosco. Não
apenas pelo fato de estar fazendo algo importante para o município, mas também
porque o “pessoal de Trajano – ele incluído – acha o carro maneiro”. Esse
depoimento resgata o ponto levantado por Geertz e abordado anteriormente no caso
do Aurélio, de Silva Jardim, sobre a importância não aparente das coisas. 74
Geertz estabelece uma comparação entre a inferência clínica da medicina e
da psicologia profunda para ilustrar esse pensamento e para defender que, no estudo
da cultura, diferente da medicina e da psicologia não há uma relação de
autor, no estudo da cultura, “os significantes não são sintomas ou conjunto de
sintomas, mas atos simbólicos ou conjuntos de atos simbólicos”. Sendo assim,
podese dizer que a teoria cultural não é, “pelo menos no sentido estrito da palavra,
profética”. 75
Já a reação do Felipe Matoso despertou a minha curiosidade, pois era cético
para com o cinema – além de não gostar de assistir a filmes, não acreditava que o
cinema tinha algum poder. Vale ressalar que ele foi o principal articulador do
projeto no muncípio de Trajano de Moraes e que se dedicou com afinco a uma
atividade que não lhe despertava prazer; fez contato prévio com as pessoas das
primeira projeção – não compareceu às demais devido ao seu horário de trabalho,
pois também tem uma equipe som – e além de não ter cargo político na cidade, fez
questão de não se beneficiar politicamente do seu feito. Mas ao final das sessões
diziase impressionado com a proposta do Cinema na Roça, pois achava que aquela
73
Centro Intergrado de Educação Pública.
74
GEERTZ, Clifford. p. 18.
75
GEERTZ, Clifford. P. 18
94
experiência tinha sido muito importante para as pessoas porque elas não têm quase
prestando atenção no filme, por tanto tempo.
Depois dessa nossa passagem por Trajano de Moraes voltamos ao município
mais seis vezes. A segunda – que aconteceu entre os dias 3 e 4 de novembro de
aniversário do bloco carnavalesco Curto Circuito – do qual é integrante – e para a
data haviam planejado uma série de atividades voltadas para a comunidade, como a
oferta de médicos em praça pública para consultas grátis, enfermeiros para medição
de pressão arterial, profissionais para orientação vocacional de jovens, entre outros.
Seu pedido consistia na realização de uma sessão de cinema em praça pública para
as crianças da sede do município e aproveitamos a viagem para realizarmos mais
uma sessão em outra localidade de Trajano de Moraes.
de Trajano de Morais, no próprio dia 3 de novembro. A sessão aconteceu na
um vilarejo composto por propriedades rurais dedicadas ao plantio de hortaliças e
que possui uma única escola com nove alunos. Nesse dia nos acompanhavam os
jornalistas Marta Mendonça e Zelito Fereira e o fotógrafo Eduardo Coutinho, todos
da revista Época, com o intuito de produzir a matéria citada no início do presente
trabalho. Chegamos ao Tirol por volta das 15 horas e para essa sessão não foi feita a
divugação prévia. Nesse dia chovia torrencialmente e a temperatura girava em torno
dos 16º C, o que dificultou muito a reunião das pessoas. Ao chegarmos percorremos
a localidade de cerca de 150 habitantes e realizamos a divulgação. No momento da
sessão havia pouco mais de 25 espectadores embaixo da laje de uma obra
95
inacabada, pertecente ao Sr. Ovídio, que nos cedeu o espaço para a realização da
sessão. O filme escolhido foi o Caminho das Nuvens e ao final da sessão voltamos
para a sede do município aonde estávamos hospedados.
A sessão realizada na praça, no dia 04 de novembro de 2006, seguiu a
mesma dinâmica das demais e reuniu cerca de 70 crianças, além dos adultos
presentes na praça por conta das comemorações do aniversário do bloco. Nessa
ocasião conhecemos o prefeito de Trajano, Sérgio Gomes, que nos abordou
demonstrandose muito interessado pela inciativa e convidandonos para o café da
manhã do dia seguinte.
No horário marcado o prefeito chegou ao hotel e conversamos sobre os
propósitos do Cinema na Roça, sobre as localidades nas quais já havíamos realizado
sessões e de que as nossas percepções apontavam para a boa aceitação do projeto
pelas pessoas das localidades. Aproveitamos a ocasião para apresentar a nossa idéia
de levarmos o cinema também para as escolas.
Ao final do café da manhã era visível a empolgação de ambas as partes com
a possibilidade de realizarmos uma parceria para tornar o Cinema na Roça
permanente no município. Saímos de Trajano no dia 05 de novembro de 2006 com
o retorno agendado para apresentarmos nossa proposta de continuidade ao Cinema
na Roça.
No dia 27 de novembro de 2006 retornamos a Trajano para a reunião com o
prefeito. Nela estavam presentes o secretário de Educação, Sr. Roberto Faria; o
secretário de Turismo, Sr. Weber Peruzzi e o secretário de Cultura, Sr. Ronaldo
cinema para a escola e, ao seu final, tinhamos dado o acordo como certo, devido ao
grande interesse do prefeito e dos secretários, sendo que vale ressaltar a
96
preocupação do secretário Roberto Faria em relação às despesas com a manutenção
do projeto, pois temia que não tivessem recursos financeiros para mantêlo e temia
pela interrupção da iniciativa.
Após mais de seis meses de negociação, no dia 11 de junho de 2007
iniciamos a primeira semana de exibições para os professores da rede municipal.
Essa etapa teve o objetivo de definir – em conjunto com os professores – os temas a
serem exibidos nas escolas ao longo do ano de 2007.
No mês seguinte, no dia 11 de julho de 2007, voltamos mais uma vez a
Trajano para realizarmos uma sessão na localidade de Tapera, participando de uma
série de eventos comemorativos da inauguração de uma estrada recém asfaltada.
Nesse dia realizamos a sessão na quadra esportiva da escola municipalizada Dr.
José de Moraes Souza e estavam presentes cerca de 70 espectadores, dos quais
apenas 37 permanceram, apesar da chuva que caiu faltando aproximadamente 20
minutos para o fim da sessão.
No início do Cinema na Roça, eu acreditava que a carência de equipamentos
culturais era uma boa justificativa para a realização do projeto e apontava a
do desenvolvimento social ordenado. Mas, a partir da realização do Cinema na
Roça, pude perceber que era uma grande ingenuidade sustentar essa idéia.
Atualmente é nítido, para mim, que a questão é muito mais complexa do que a
97
colaborar para a equidade social e que eles podem ser instrumentos úteis para o
disponibilide de acesso a produções culturais é, por si só, um agente transformador.
Cinema na Roça
Conforme apresentado no início do presente trabalho, o Cinema na Roça foi
concebido para durar apenas um ano e percorrer localidades dos 20 municípios do
estado do Rio de Janeiro que apresentavam os mais baixos IDH’s. Em agosto de
2007 o projeto completa seu segundo ano, e o fato de ter ultrapassado o ano
inicialmente previsto se deve às adequações que o projeto sofreu, as quais
apresentarei ao longo deste capítulo.
A partir das tentativas frustradas dos debates e da minha insistência na
realização de atividades educativas usando o conteúdo dos filmes, tive a idéia de
desmembrar o Cinema na Roça em dois projetos: um deles chamado Cinema na
Escola e outro – em princípio – chamado Cinema Social. Sendo assim, minha
proposta é substituir o Cinema na Roça por esses dois projetos, que serão
detalhados mais à frente.
Antes de discorrer a respeito do desmembramento do Cinema na Roça,
gostaria de abordar o percurso que trilhei até concluir como as adequações citadas
na Roça, atenderiam aos meus anseios.
3.1. O critério IDH
98
A primeira adequação que gostaria de ressaltar foi o desprendimento do IDH
como critério de escolha dos municípios. Apesar de haver relação direta entre o
do cruzamento das informações apresentadas na Munic 2001, no Atlas do
presença de cinemas. Por esse motivo, pautar a decisão de levar o Cinema na Roça
apenas para os 20 municípios com os mais baixos IDH’s do estado do Rio de
Janeiro serve apenas para limitar a oferta a outros que também não possuem o
equipamento cultural.
Pelo que pude perceber, o projeto tem sido um atrativo a mais para as
localidades e uma nova forma de entretenimento para muitos dos espectadores e,
mesmo em Trajano de Moraes, onde sua abrangência chegou a exibições nas
escolas, ainda é prematuro dizer que alcançou algum resultado efetivo no sentido de
estimular discussões.
Como se pode perceber, o Cinema na Roça assumiu um papel diferente do
imaginado durante a sua concepção. Por conta disso, não faz sentido manter o IDH
como o critério de escolha dos municípios onde serão realizadas as exibições.
3.2. O critério videolocadoras e cinemas
Durante a concepção do Cinema na Roça, a ausência de videolocadoras e
cinemas foi cogitada como critério de escolha dos municípios. Em um segundo
99
momento, contudo, optei apenas pelo critério de ausência de videolocadoras, já que
os dados presentes na Munic 2001 apontavam para o fato de apenas 8% dos
municípios brasileiros possuírem cinema. Mas como o espectro de municípios ainda
continuava muito grande decidimos que, mesmo que o município estivesse entre os
20 mais baixos IDH’s, caso houvesse a presença de alguma locadora, manteríamos
videolocadora.
No passado, eu imaginava que o projeto competiria com a locação de títulos
nas localidades, mas isso não ocorreu. Atualmente percebo que a presença do
criando o hábito de assistir a filmes. Por outro lado, o aumento na locação de filmes
pode surtir um efeito contrário ao desejado com o Cinema na Roça, pois a locação
residencial desestimula o convívio em grupo no espaço público.
Um detalhe importante é que o volume de locações na maioria das cidades
por onde passei com o Cinema na Roça é pequeno. Por exemplo, Vera, proprietária
de uma das duas locadoras da sede do município de Santa Maria Madalena, disse
me que, para manter o negócio, divide o espaço de sua locadora entre as atividades
de costureira e de locação, pois apenas de filmes “teria abaixado as portas há muito
tempo”.
que a frequência com a qual o Cinema na Roça é realizado nas localidades causaria
mais benefícios, estimulando as pessoas a assitirem a filmes, do que malefícios
atrapalhando a atividade comercial de locação. Por isso, decidi descartar o critério
localidades, mesmo que tenham videolocadora.
100
3.3. Cinema e entretenimento
Percebi que, para os espectadores das sessões noturnas, não interessava
assistir a filmes com enredos muito complexos e/ou narrativas lentas, a exemplo de
A Visão do Paraíso, em São José do Vale do Rio Preto; de Coronel e o Lobisomem,
em Rio Dourado, e A Dona da História, em Professor Souza. Nessas ocasiões, as
pessoas, quando não foram embora, permaneceram desatentas ao filme. Aliado a
isso, percebi nesse público o interesse por uma forma de diversão não existente em
suas localidades e, ao contrário do que eu imaginava durante a concepção do
econômicas ou políticas nas noites, pósexibição.
O que pretendo ressaltar com o parágrafo acima é que, durante a concepção
do Cinema na Roça, mantive o principal objetivo do projeto no anseio de promover
os debates e usar o cinema como uma ferramenta para estimular a discussão sobre
questões sociais. No entanto, durante a realização do projeto, aprendi que a maioria
das pessoas não tinha o mesmo anseio que eu e que os debates significavam um
incômodo, em vez de estimular reflexões.
Por outro lado, caso estivesse atento à terceira fase de uma pesquisa
etnográfica – que se resume ao trabalho de campo e está mais ligada às lições que
podem ser apreendidas da vivência (MATTA, 1978) – denominada “pessoal ou
existencial”76
e aliado esse conhecimento ao já ressaltado no trabalho de Geertz
(GEERTZ, 1989), de que ao pesquisador é necessário desenvolver a habilidade de
76
MATTA, Roberto da. P 25.
101
internalizar o que acontece ao seu redor, para que se tenha condições de extrapolar
o valor bruto dos acontecimentos – essência da fase existencial de Roberto da Matta
teria percebido que, em vez de ficar preso aos debates, poderia estar mais atento às
relações sociais geradas por conta do projeto. Como, por exemplo, a aproximação –
em Silva Jardim – entre a Rosilane Brum e o Luiz Nelson.
Em conjunto aprendi que – apesar de não considerado durante a concepção
do projeto – o cinema poderia representar um alternativa de entretenimento para os
espaço público para o convívio social.
Um dos aspectos que me fez atentar para essa questão foi o interesse dos
espectadores, pois, considerando que as sessões sempre começam ao cair da noite,
às vezes acontecem no mesmo horário que as novelas e posso concluir com isso que
a vontade de assistir aos filmes é bastante considerável e que não há motivos para
desestimular a participação dos espectadores nas sessões de cinema por conta de
debates indesejados.
Mais um reforço ao meu entendimento do interesse das pessoas pelas
sessões do Cinema na Roça é apresentado por Esther Hambúrguer, quando ressalta
que as novelas representam tamanha significância para a sociedade que, não por
acaso, a programação da Rede Globo, principal emissora nacional, constitui até hoje
sua grade posicionando o principal telejornal da rede entre duas novelas, num
formato chamado por Esther Hamburger de “sanduíche” (HAMBURGER,2005).
limitaria a oferecer uma opção de entretenimento para as pessoas das localidades e
que passaríamos a realizar sessões em locais que reunissem o maior número de
102
pessoas, além de que deixaria de ser importante focar o projeto em um público
específico, como eram os jovens 77 , durante a concepção do projeto.
Essa função de usar o Cinema na Roça com o único objetivo de oferecer
encontrar outro ambiente para utilizar o cinema como ferramenta de reflexão.
3.4. Locais de exibição
Quando idealizei o Cinema na Roça pensava em exibir os filmes apenas em
locais de difícil acesso. Imaginava que iria levar o cinema para localidades
afastadas, que conseguiria realizar sessões em meio aos canaviais, às plantações,
nos assentamentos rurais, entre outros, pois entendia que isso corroborava para o
alcance do objetivo principal do projeto. Por esse motivo não me preocupei com a
logística de exibição de filmes em locais públicos e dediqueime à obtenção das
exigência de um dos patrocinadores.
que conseguíssemos transformar o Cinema na Roça em uma iniciativa que
redirecionar o local das exibições e iniciar a realização de sessões em locais
públicos.
77
Para este estudo, consideramos como jovens pessoas em idade entre 15 a 24 anos. Ver IBGE,
1999.
103
Nesse período decidi pela extinção da Conhesol e pela constituição da
Brasil Social – que é uma empresa privada enquadrada legalmente como exibidora
de filmes e sobre a qual falarei mais à frente – e passamos a investir na exibição em
locais públicos. Essa mudança foi motivada por quatro aspectos. O primeiro deles
foi atender a uma demanda por entrenimento e à alteração do objetivo do Cinema
na Roça, conforme citado no item acima (3.3) do presente trabalho. O segundo, foi
Brasil Social, pagamos pelo direito de exibição dos filmes, o que nos permite
agilidade na escolha e liberdade para a exibição dos títulos que nos interessam.
Essa mudança de postura – ao passarmos a exibir os filmes em locais
públicos –, por um lado, aguçou a dúvida dos espectadores quanto à isenção do
projeto em relação às ações das prefeituras; por outro, reforçou a mensagem de que
o evento é gratuito e aberto a todos, pois as sessões começaram a ser realizadas nas
ruas ou em praças públicas e se tornava mais fácil o acesso para as pessoas, pois
não havia o constrangimento de ter que entrar na propriedade de alguém para
assistir ao filme.
O terceiro aspecto foi a oportunidade de atender a uma demanda comercial
por entretenimento. Ao longo dos quase dois anos de Cinema na Roça percebemos
que havia espaço para a comercialização de exibições públicas de filmes e que essa
atividade poderia ser mais um gerador de recursos financeiros para a manutenção da
faceta voluntária do projeto. A comercialização de exibições pode ocorrer em duas
esferas. Na esfera pública, consiste em oferecer para as prefeituras o Cinema como
um atrativo a mais para a população dos municípios, assim como fazem na
contratação de shows, na organização de eventos etc. Na esfera privada, abordamos
empresas que tenham interesse em patrocinar exibições específicas. Em vez de a
104
empresa se comprometer com o patrocínio integral do projeto, essa opção permite
que a empresa “compre” quantas exibições desejar e dediqueas às comunidades de
seu interesse.
Para Roberto da Matta, ao etnógrafo cabe a sabedoria de despirse da
fantasia de superherói e o pesquisador precisa desenvolver a habilidade de migrar
do papel heróico do pesquisador ao de integrante de uma determinada cultura para
internalizála (MATTA,1978).
Assim como entender que os debates não aconteceriam, acredito que
legítima para a geração de receita foi uma maneira de atentar para as limitações da
iniciativa. A evolução do projeto tem sido um constante exercício de despirme da
fantasia de superherói, pois inicialmente o projeto foi concebido com a proposta de
“salvar o país”.
necessidade tecnológica do projeto, pois, a partir de 2007, momento em que
inserimos a nova tela de projeção – com dimensões de sete metros de altura por oito
metros de largura – tornouse mais difícil conseguirmos espaço físico para montar
todo o aparato em locais privados.
3.5. Acervo de filmes
Outra mudança que gostaria de ressaltar está relacionada aos títulos que
105
versão dublada para o português e que as cenas sejam adequadas – que não haja
cenas de sexo e violência – para exibição em espaço público, devido à vasta gama
etária dos espectadores. O tema dos filmes também tem variado muito e decidimos
que a partir de 2007 vamos exibir os filmes mais desejados entre os todos do nosso
focamos em filmes que tivessem o enredo voltado para as questões sociais, mas
essa não é mais uma preocupação.
A principal razão para adotar essa postura foi a nossa conscientização de
apenas aos filmes nacionais. Ao longo dos quase dois anos de Cinema na Roça
percebemos que as pessoas também têm o desejo de assistir a filmes estrangeiros,
principalmente aos filmes de ação.
Outro fator é que há limitações em relação aos filmes nacionais que
conseguimos exibir nessas localidades. Com o público formado de pessoas de
características variadas, como distintas classes sociais, religiões e – principalmente
– faixa etária, não podemos exibir qualquer tipo de filme. Por exemplo, há uma
rejeição muito grande aos filmes que reunem cenas de sexo ou diáolgos com
palavras de baixo calão. Somandose a esse ponto, há a dificuldade de nos
sua programação. Como só exibimos filmes a partir de mídia digital, é raro que
consigamos nos antecipar à emissora, que, na maioria das vezes, é mais ágil ao
exibilos.
78
Ver MUNIC 2001. p. 98.
106
Outro fator que nos motivou a decisão de não restringir a exibição aos
filmes nacionais foi a burocracia na liberação de alguns títulos. Por exemplo, em
2005, demoramos mais de quatro meses – até desistirmos – para conseguirmos a
liberação de um título nacional como o Cidade de Deus, enquanto em poucas horas,
por uma módica quantia, através da Motion Picture Licensing Corporation, 79
conseguimos a cessão para 52 exibições de mais de 100 títulos, entre os quais
de filmes da prefeitura do Rio de Janeiro – e para produtoras como a Abbas
atenderam ao nosso pedido de cessão de direitos.
Outro fator para exibirmos filmes estrangeiros é a oferta de filmes voltados
ao público infantil, pois, como em todas as sessões há a presença de crianças,
precisamos que o acervo do projeto atenda a esses espectadores. A oferta de filmes
estrangeiros que agradem a crianças e/ou que ainda não tenham sido exibidos na
televisão é muito maior do que de nacionais.
apenas seis títulos nacionais e, em dois anos, passamos a mais de 100, entre
nacionais e estrangeiros. Mas essa ampliação modificou nossa prática. Em função
do aumento do número de filmes, não há mais como os espectadores escolherem,
entre todos, aqueles títulos a que desejam assistir. Atualmente, ao chegarmos nas
localidades – de maneira informal – procuramos descobrir quais serão os mais
aceitos: nos locais que possuem videolocadora sondamos os títulos que têm mais
79
A Motion Pictures Licensing Corporation Brasil (MPLC Brasil) é uma empresa que comercializa
licenças que autorizam a exibição de filmes em DVD e Videocassete.
80
Produtora e cedente direitos dos filmes Tudo Sobre Rodas, Burro Sem Rabo e Olho da Rua.
81
Produtora e cedente direito do filme Fala Tu.
82
Produtora e cedente direitos do filme Ilha das Flores.
107
saída ou aqueles que a locadora ainda não possui e procuramos oferecer os títulos
que acreditamos que serão de maior agrado dos espectadores.
3.6. O nome do projeto
Assim como aconteceu nitidamente em São José do Vale do Rio Preto e em
Casimiro de Abreu, ou em Santa Maria Madalena e Trajano de Moraes, o nome
projeto, eu acreditava que o uso da palavra “roça” seria um atributo do projeto
devido à característica dos municípios, que têm a economia baseada na agricultura,
grande parte da população residindo na zona rural, entre outras. Isso,
principalmente, porque o projeto tinha o objetivo de levar o cinema para o meio
rural.
No entanto, durante a execução do Cinema na Roça e a partir da leitura de
Roberto da Matta, em “O ofício de etnólogo, ou como ter ‘Anthropological Blues’”
(MATTA, 1978), pude perceber que houve superficialidade na “fase teórico
intelectual” 83 do projeto que concebi.
Sendo assim, o nome Cinema na Roça é mais uma das mudanças que o
chamálo Cinema Social ou Cine Social. Por mais que ainda não tenhamos definido
qual será o futuro nome do projeto, é certo que ele mudará. Uma vez que tenhamos
tomado a decisão de direcionar o projeto a mais localidades, independente do IDH e
83
MATTA, Roberto da. P 24.
108
da presença de videolocadoras, precisamos adequálo à realidade de localidades que
não se identificam com a palavra roça.
Outro ponto a ser ressaltado é que atualmente levar o cinema nos parece
mais importante do que denominálo com esse ou aquele nome, ou seja, cheguei à
aliada para a disponibilização de mais uma forma de entretenimento para as
pessoas, bem como suplantar a ausência desse equipamento com uma iniciativa que
estimule com convívio social em ambiente público, tem uma dimensão muito maior
do que atribuir um nome para a iniciativa. A proposta atual é “batizar” o projeto
com o nome que mais se identifique e seja aceito pelos espectadores. Por exemplo,
se o nome Cinema na Roça não foi aceito em Casimiro, lá poderá ser chamado de
vale para quaisquer localidades.
A decisão de alterar o nome também visa atender a uma necessidade criada
pela característica comercial – citada no item 3.4 do presente trabalho e que será
mais detalhada à frente – que o projeto assumiu, pois, uma vez que haja um
patrocinador da iniciativa, o nome poderá ser adequado aos seus interesses.
3.7. Desmembramento do Cinema na Roça
com uma ambição desmedida, fruto do meu grande idealismo. Eu acreditava ser
possível, através do cinema, transformar toda uma realidade social presente há anos.
O formato do Cinema na Roça surgiu da inquietação com o crescimento
109
desordenado das grandes cidades e com a idéia de contribuir para o
desenvolvimento das localidades interioranas do estado do Rio de Janeiro.
preocupação com a abrangência de localidades perdeu prioridade para o aumento da
frequência de exibições dentro do mesmo município e ganhou um contexto escolar.
O foco do Cinema na Roça continua sendo os municípios do interior, porém não é
mais somente para a zona rural.
A partir do aprendizado proporcionado ao longo dos dois anos de execução
do projeto, decidime pelo desmembramento do Cinema na Roça em duas vertentes
que apresentarei a seguir.
3.7.1. Cinema Social
A proposta com o Cinema Social é introduzir um novo nome ao Cinema na
Roça e continuar realizando parte do que já era realizado, porém alguns dos anseios
que eu tinha com o projeto inicial não existem mais e o Cinema Social nasceu com
duas facetas: uma voluntária e outra comercial. Em princípio, o funcionamento das
duas segue a mesma dinâmica. O que as difrencia é que a vertente voluntária é
financiada pela empresa Brasil Social – que será apresentada mais detalhadamente à
frente – enquanto que a vertente comercial é patrocinada por outras empresas ou
pelo poder público.
O Cinema Social tem o objetivo de promover exibições gratuitas de filmes
nacionais e estrangeiros – como apresentado no item 3.5 do presente trabalho –, em
110
vale ressaltar que essa não é uma exigência. As sessões do Cinema Social são
realizadas somente em espaços públicos e têm o objetivo específico de proporcionar
mais uma opção de entretenimento aos moradores dessas localidades.
diferença entre as duas está no custeio e na escolha das localidades, que pode ser
compartilhada com a inciativa privada ou pretender atender a uma demanda de um
determinado município.
Como se pode perceber, o Cinema Social resumiu o aprendizado adquirido
ao longo dos quase dois anos de Cinema na Roça e abandonou anseios e
levantamentos prévios. Vale ressaltar que não há a expectativa de debates e
reflexões após as sessões, nem a aspiração de ações transformadoras O único
objetivo do Cinema Social é realizar exibições de filmes em locais públicos.
3.7.2. Cinema na Escola
O desmembramento do Cinema na Roça também deu origem a esse segundo
projeto, chamado Cinema na Escola, que acontece com o patrocínio da iniciativa
privada ou do poder público e consiste na exibição de filmes dentro do ambiente
escolar e com o intuito de servir de ferramenta para os professores trabalharem os
conteúdos da grade curricular com os alunos.
Através do Cinema na Escola realizamos projeções diurnas no interior das
escolas públicas municipais. Com essa proposta, os filmes passaram a ser
111
escolhidos em conjunto com os professores e/ou responsáveis pela coordenação
pedagógica dos municípios e visam a atender temas levantados nas escolas.
Optei pelo desmembramento porque percebi que as projeções noturnas, em
aos debates, ou seja, para a reflexão sobre a temática apresentada pelos filmes e
Por outro lado, devido ao contato com as pessoas das localidades e ao
cheguei à conclusão de que, ao levar o cinema para dentro da sala de aula, seria
possível aliar um ambiente favorável à reflexão com uma forma alternativa para os
professores trabalharem os conteúdos da grade curricular.
Um exemplo de que a iniciativa pode ser útil aos estudantes surgiu em 2007,
em Maria Mendonça, distrito de Trajano de Moraes, quando alguns professores se
interessaram bastante pela idéia de exibir filmes em sala de aula para os alunos e
disseramme que iniciariam essa prática. Quando estive em Trajano pela última vez,
que fizeram foi da data de exibição em seus distritos.
3.8. A característica comercial
Em meio a todas essas reflexões e diante das minhas propostas para o futuro
do projeto, surgiu a Brasil Social, que é uma empresa privada, fundada com o
intuito de aliar minhas atividades profissionais ao meu engajamento na área social.
112
A Brasil Social é uma sociedade que tem por objeto serviços de projeção de
filmes, realização de eventos, culturais ou não, tais como exibição de músicas,
públicas de filmes, bem como eventos relacionados a treinamentos corporativos.
projeto, independente da existência de patrocínios, mas isso não era suficiente para
fazêlo assumir maiores proporções e não o retirava do status de atividade
negócio comercialmente viável, no qual a Brasil Social realizaria exibições públicas
de filmes, desenvolveria o Cinema na Escola e outras atividades afins.
financiamento de projeto sociais – no momento, o Cinema na Roça e, em breve, o
Martinelli, que atuava como voluntário do Cinema na Roça desde a sua concepção.
Desde então, dividimos as responsabilidades pertinentes às ações da Brasil Social.
Invesitir na comercialização de exibições públicas de filmes foi uma
maneira de sanar um problema e atender a uma demanda. O problema era encontrar
uma maneira de custear a permanência das exibições sem depender de patrocínios
de empresas. Resolvêlo somente se tornou possível a partir do momento em que
entendi que não haveria sucesso na tentativa de motivar o público para os debates
após as exibições e consegui atentar para o fato de que a carência de equipamentos
culturais era uma oportunidade para comercializar as projeções com o poder
público.
113
Outra saída para a comercialização das exibições foi o fracionamento do
patrocínio do projeto, pois, assim, mesmo os empresários de comércios de pequeno
porte podem se tornar patrocinadores.
A partir de julho de 2007 assumimos uma postura mais assertiva de
abordagem. Agora realizamos um levantamento sobre os municípios, a fim de
identificarmos como está montada sua estrutura cultural, em que tipo de atividades
culturais investem, se têm fundações culturais, programacão cultural, agenda de
município tem predisposiçao para investir em cultura e avaliarmos nossa chances de
comercialização dos projetos.
entre a sede e os distritos, distância entre o município e a capital do estado etc. – e
efetuamos o levantamento dos nossos custos para a realização de uma exibição
estarmos no município para abordar os secretários de Cultura, de Educação,
vereadores ou mesmo o prefeito do município, ou seja, nossa estratégia é usar a
exibição voluntária para identificar aliados.
Essa mudança de estratégia surgiu a partir do momento em que aliamos dois
decidir pela contratação do projeto através de contatos telefônicos, como foi o caso
de Duas Barras, Quissamã, São Sebastião do Alto e Bom Jardim – onde não
realizamos exibições –, ou Casimiro de Abreu, Santa Maria Madalena e Sumidouro
– nos quais realizamos exibições. O segundo aprendizado veio do sucesso das
negociações in loco , como aconteceram em Trajano de Moraes e Sumidouro.
114
Desde que percebi a oportunidade de oferecer comercialmente os projetos,
atentei que, para que conseguíssemos negociar com o poder público, era necessário
demonstrar que o projeto tem a capacidade de aglomerar pessoas, pois ao poder
público interessa muito que o projeto seja também um instrumento das suas ações e
que possa demonstrar isso ao maior número de pessoas. Sendo assim, para atender a
essa necessidade, sempre que ofertamos as exibições para a zona rural, o fazemos
com auxílio de transporte para os espectadores, aliado à divulgação prévia e à
distribuição de pipoca.
115
Consider ações Finais
aprendizados, mas, nesse contexto, o curso de mestrado que demandou a presente
dissertação tem fundamental influência nesse processo de aprendizado, pois balizou
as minhas expectativas em relação aos possíveis resultados que poderiam ser
alcançados com o Cinema na Roça, bem como demonstrou a complexidade de
alguns fatores anteriormente desconhecidos.
Antes, porém, gostaria de fazer uma ressalva, atentando às duas útilmas
fases de uma pesquisa etnográfica, apontadas por Roberto da Matta em “O ofício de
etnólogo, ou como ter ‘Anthropological Blues’” (MATTA, 1978). A segunda fase –
pouco tem a ver com a magnitude acadêmica. Essa fase é representada por questões
preocupação muda subitamente das teorias mais universais para os problemas mais
banalmente concretos” 85 e resumese na preparação para a ida a campo. Nessa fase,
saúde etc.
O Cinema na Roça, apesar de não ter se constituído desde o início como
pois a logística de realização de cada sessão é muito complexa e trabalhosa, devido
à falta de recursos nas localidades e ao número reduzido de pessoas que organizam
as sessões. Por isso, a complexidade ao lidar com o “período prático” dificultou a
percepção das teias de relacionamento.
84
MATTA, Roberto da. P 24.
85
MATTA, Roberto da. P 24.
116
A terceira e última fase, denominada “pessoal ou existencial” 86 se resume ao
trabalho de campo propriamente dito. Para Roberto da Matta, enquanto a primeira
fase é essencialmente intelectual e depende basicamente da competência acadêmica
do pesquisador, a segunda é de ordem prática e inevitável em função da terceira. A
fase existencial requer extrema atenção ao desconhecido e está mais ligada às lições
que podem ser apreendidas da vivência do que à vivência em si. É nessa fase que o
pesquisador enfrenta o cansaço e o desconforto, com o compromisso de ser feliz em
suas interpretações e que a pesquisa se torna real.
permitem o entendimento de comportamentos como o de Aurélio, em Silva Jardim,
ao nos ciceronear; o de Yohana, em Sumidouro, ao demonstrar a preocupação com
o jornalista e com o filme a ser projetado no centro da cidade; o de Marco Aurélio,
de São José do Vale do Rio Preto, ao insistir na exibição do filme a Visão do
Paraíso ou na participação do Cinema na Roça na Calçada da Cultura, entre outros
citados nesse trabalho. O ponto aqui levantado é que a Antropologia Social existe
quando existe o exótico e, por sua vez, o exótico aparece em função do
distanciamento social. O papel do etnógrafo é fazer com que o exótico se torne
familiar e viceversa e Roberto da Matta lança um importante olhar para a
subjetividade, o sentimento e a emoção durante um trabalho etnográfico. Ele aponta
que esses aspectos são relevantes para o processo de entendimento das tramas
sociais, pois grande parte do que é apreendido no trabalho de campo depende da
capacidade de sentir, antes da de compreender.
86
MATTA, Roberto da. P 25.
117
Geertz levanta a questão do significado de cultura e, citando Goodenough,
aceita que “a cultura (está localizada) na mente e no coração dos homens” 87 e que a
“cultura de uma sociedade consiste no que quer que seja que alguém tem que saber
ou acreditar a fim de agir de uma forma aceita pelos seus membros” 88 . No entanto,
Geertz ressalta a importância que deve ser dada a duas questões sobre a cultura.
com forças e propósitos em si mesma” e a “outra é alegar que a cultura consiste em
um valor bruto de acontecimentos comportamentais que, de fato, observamos
ocorrer em uma ou outra comunidade identificável” 89 . Porém, o ponto mais
relacionarse com as diversas culturas.
Para Geertz, na interpretação da cultura, o pesquisador deve estar atento ao
indagar a importância do significado dos acontecimentos, “o que está sendo
transmitido com a sua ocorrência”, mesmo que ela seja, à primeira vista, um
simples detalhe. Com isso, o sucesso da presente dissertação está diretamente
significado dos pequenos atos, assim como à capacidade de afastamento do objeto e
de entendimento da subjetividade. Como, por exemplo, entender que, para o Kelvin,
de Sumidouro, e para o Allan, de Trajano de Moraes, participar do projeto
englobava o componente status, enquanto que, para o Aurélio, de Silva Jardim,
poder.
Assim como Clifford Geertz faz a introdução de seu trabalho citando o livro
Philosophy in a new key de Susanne Langer e abordando o hábito, no panorama
intelectual, de abraçar uma boa idéia e têla como solução para todas as
87
GEERTZ, Clifford. P. 8
88
GEERTZ, Clifford. P. 8
89
GEERTZ, Clifford. P. 8
118
questões/problemas fundamentais, acredito que instintivamente eu tenha passado
por esse mesmo processo ao acreditar na idéia de usar o cinema como ferramenta de
transformação social. No entanto, entender as limitações do projeto e aceitálas é
uma forma de demonstrar Anthropological Blues.90
Procurei apresentar ao longo do presente trabalho, como a maioria das idéias
valer da ausência do equipamento cultural para despertar o interesse da população
dos pequenos municípios para a discussão a respeito de suas realidades sociais e da
condição de vida e emprego nessas localidades, assumindo previamente que essa
fosse uma necessidade legítima de seus habitantes.
afora. No entanto, vale ressaltar que, ao idealizar o projeto, negligenciei alguns
pontos de cuja importância atualmente tenho consciência, mas que na ocasião
passaram incólumes.
Durante essa parte da dissertação pretendo focarme em apenas três
filme. O segundo se refere ao significado da participação das pessoas como
espectadores e como voluntários. O terceiro é sobre a continuidade do projeto.
A partir da leitura de Geertz cheguei a conclusão de que o maior trabalho do
etnógrafo é fazer uma intepretação de suas anotações, ou seja, a riqueza da
etnografia está na profundidade com que se consegue penetrar nas relações e`, para
90
Ver MATTA, Roberto da.
119
um complexo exercício de intepretação de sinais e de leitura dos códigos. A
descrição densa se diferencia da superficial pela complexidade dos detalhes que traz
à tona. Mesmo que as passagens não tenham significado imediato e que sua
relevância não salte aos olhos durante as anotações/percepções, é importante estar
atento a todas as manifestações, pois esses registros permitirão um estudo mais
aprofundado e a construção de uma etnografia densa.
dos dados. O que pretendo dizer com isso é que, durante o processo investigativo,
um dado etnográfico que, aos olhos do pesquisador, pode ser muito importante e/ou
significativo, é coletado através da observação e do “depoimento” de outras pessoas
que não lhe dão o mesmo significado e o fornecem de forma “disfarçada”,
desconexa, sem importância e/ou confusa e que esses dados somente receberão a
devida importância após uma análise mais detalhada e atenta do pesquisador.
Há um longo e complexo processo a ser seguido e que exige a sua
capacidade de captar e interpretar os dados, a fim de encontrar relevante significado
no material coletado. Em primeiro lugar entendo que a necessidade de encontrar os
porquês e uma boa formulação da questão é essencial para esse momento. A partir
dessa etapa se faz necessário desvencilharse da capacidade imaginativa, para evitar
que seja traído por conclusões prematuras e pela atribuição indevida de valores aos
códigos. Para o passo seguinte se faz necessário vivenciar e internalizar as relações
construir significados.
Esse momento é de aprendizado e deve ser dedicado ao entendimento do
que acontece ao redor do pesquisador, de identificação das relações culturais.
Analogamente, é como se o pesquisador se dedicasse ao aprendizado de um novo
120
idioma. Por fim é a etapa de significação e, para esse passo, é importante a
capacidade de relacionar e interpretar os códigos captados. É nessa etapa que devem
ser estabelecidas as relações culturais e decodificadas as tramas e teias relacionais.
Temo que a dificuldade causada pela minha falta de experiência ao
pesquisar e relatar, aliada à complexa logística de realização das sessões tenham
ocultado a riqueza das relações ao longo das sessões do Cinema na Roça. Mas,
apoiandome em mais um pensamento de Geertz ao considerar que seu trabalho
ainda não chegou “próximo do fundo de qualquer questão sobre a qual tenha
escrito” e ao reforçar as suas palavras com a tese de que “essa é uma ciência
estranha, cujas afirmativas mais marcantes são aquelas que têm a base mais
singelamente com quem se interesse pelo tema.
Em relação às minhas conclusões, acredito que tanto o evento quanto a
exibição dos filmes são muito importantes, mas cada um atua sobre o espectador em
momentos distintos. No primeiro momento, os equipamentos são o grande atrativo
do Cinema na Roça. A partir do momento em que começamos a trabalhar com a
tela inflável percebi que a motivação das pessoas para assistirem aos filmes
aumentou ainda mais e é uma constante perceber pessoas que ficam mais
impressionadas com a estrutura do que com o filme a ser projetado. Em Casimiro de
Abreu, por exemplo, várias pessoas preferiram assistir aos filmes pela parte traseira
da tela, com as imgens invertidas e, como projetamos a imagem por trás da tela,
frequentemente as pessoas ficam curiosas procurando descobrir de onde vem a
imagem.
Num segundo momento, o filme passa a ser importante, sendo que vale
121
Percebo que na maioria dos locais, principalmente nas localidades que reúnem
maior número de espectadores, é grande o número de pessoas que estão presentes
por conta do alvoroço que a exibição causa e não por conta do que se projeta na
tela. A falta de costume e a dificuldade de concentração em um filme por cerca de
duas horas ainda são os motivos mais aparentes. Em contraponto, percebo que em
exibições que reúnem menos pessoas, até 40 espectadores, a atenção ao que está
sendo exibido é muito maior e a resposta do público imediata.
narrativa e com o enredo dos filmes do que nas localidades que reúnem mais
pessoas e, caso o filme não lhes agrade, deixam o local mais facilmente. Apesar de
parecer óbvio – pois disse acima que nas exibições que reunem grande número de
espectadores a atenção aos filmes é menor e a reunião de pessoas é que os atrai –,
os espectadores permanecem por mais tempo no local de projeção. Acredito que
isso se dê por encontrarem outros atrativos além do filme projetado.
que o projeto tem um papel importante para as comunidades pelo fato de ser mais
um atrativo cultural para as pessoas, pelo fato de reunilas em determinado local e,
de certa forma, estimular o convívio. No entanto, não é o cinema que possui esse
poder. Atribuo à carência de atrativos o maior trunfo do projeto e, sendo assim,
várias iniciativas seriam aceitas pelas população.
localidades e que o equipamento também deve ser um atrativo para valorizar a
experiência. Entendo que é importante não apenas exibir os filmes, como também
compartilhar com as pessoas o funcionamento da estrutura. No entanto, com relação
à concepção inicial do Cinema na Roça, de usar o cinema como ferramenta para
122
estímulo direto de reflexões a partir dos filmes e promoção de tranformações nos
municípios, entendo que as chances são remotas.
Em relação às pessoas que participaram, considero que para Allan Almeida
– de Trajano de Moraes – ou para Rosilane Brum – de Silva Jardim – tenha tido um
significado diferente do atribuído aos demais habitantes das localidades devido à
participação intensa, mas não percebo que de forma geral a experiência tenha
estimulado alguma reação diferente do que a postura de espectador. Como pude
comprovar, da segunda vez em que estive em Sossego do Imbé – Santa Maria
Madalena –, um ano após a primeira exibição, as pessoas se recordavam do filme
que exibimos e da experiência que viveram assistindo a um filme em uma tela
retornar na escola da qual pegamos as cadeiras, e os alunos também se lembravam
com saudade da exibição dos filmes e falaram que gostaram de assistir ao filme e
que queriam que o cinema voltasse. Em Sumidouro, quando retornei em janeiro de
2007 – por outro motivo –, algumas pessoas me abordaram na rua perguntando se o
cinema voltaria. Ao final das sessões, normalmente, algumas pessoas perguntam
quando haverá outra sessão. Isso aconteceu em Palmital e Professor Souza –
Campinas – Sumidouro, entre outros.
Mas há exemplos contrários. Depois da sessão de novembro de 2006,
retornei ao Tirol – Trajano de Moraes – duas vezes. Numa delas procurei o Sr.
Ovídio, que havia cedido sua propriedade para a exibição na localidade e ele se
recordava vagamente da sessão. Da segunda, tive a oportunidade de conversar com
Ana Ely Toledo, diretora da Escola Municipalizada Fazenda do Tirol, que me disse
que as nove crianças da escola gostaram muito da experiência da sessão de cinema
123
e que ela – apesar de não estar presente à sessão – pôde trabalhar o conteúdo dos
filmes em sala.
A maior manifestação de aprovação aconteceu em Trajano de Moraes, mas
atribuo esse comportamento à maior exposição que o projeto teve no município.
Percebo que a admiração das pessoas de Trajano se dá em função do trabalho que é
realizado e não em função da exibição de filmes propriamente dita, ou seja, no meu
entender, não é o cinema e nem o filme que importa e sim a iniciativa de levar para
o município algo que antes não exisitia. Ainda não consegui identificar se a
experiência foi realmente importante, se, de alguma forma, suas vidas foram
“afetadas”. Acredito que para a maioria das pessoas tenha sido apenas mais um
evento ao qual tiveram acesso e que, com o tempo, cairá no esquecimento.
O Cinema na Roça conforme concebido já não exite há muito tempo. De
fato nunca saiu do papel. Desde que iniciei o projeto, suas características foram
capítulo 3 do presente trabalho, deu origem a mais duas iniciativas chamadas
Cinema na Escola e, em princípio, Cinema Social.
continuidade dos projetos, pois chegar à conclusão de que a experiência não é nada
além do que “projetar filmes na praça” está sendo bastante difícil e atualmente
divido meus pensamentos entre a decisão de dar continuidade às exibições, porém
com enfoque comercial, ou de interrompêlas. Enquanto isso, continuo organizando
“sessões públicas de cinema” e oferecendo o “cinema” para as escolas municipais.
124
Anexo
Listagem dos filmes 91
91
Todos esses filmes passaram a fazer parte do acervo em 2007.
125
O CAVALEIRO DIDI E A PRINCESA
BUENA VISTA 2006
LILI
O CORONEL E O LOBISOMEM FOX 2005
O DIÁRIO DE TATI UIP 2006
O VENENO DA MADRUGADA UIP 2006
SE EU FOSSE VOCÊ FOX 2006
SÓ DEUS SABE DOWNTOWN 2006
TAPETE VERMELHO PANDORA 2006
TRAIR E COÇAR É SÓ COMEÇAR FOX 2006
UM CRAQUE CHAMADO DIVINO PANDORA 2006
WOOD AND STOCK DOWNTOWN 2006
XUXA GÊMEAS FOX 2006
SONHOS E DESEJOS UIP 2006
A DONA DA HISTÓRIA BUENA VISTA 2004
A HORA MARCADA UIP 2001
ABRIL DESPEDAÇADO LUMIÈRE 2001
ACQUARIA FOX 2003
AMORES POSSÍVEIS FOX 2001
AS TRÊS MARIAS LUMIÈRE 2002
AVASSALADORAS FOX 2002
CAMINHO DOS SONHOS UIP 1999
CIDADE DE DEUS LUMIÈRE 2002
CINEGIBI, O FILME TURMA DA
UIP 2004
MÔNICA
COMO FAZER UM FILME DE AMOR LUMIÈRE 2004
CONDENADO À LIBERDADE UIP 2001
CONTOS DE LÍGIA LUMIÈRE 1999
CRISTINA QUER CASAR FOX 2003
DE PASSAGEM LUMIÈRE 2004
DOMÉSTICAS PANDORA 2001
FÁBIO FABULOSO LUMIÈRE 2004
LISBELA E O PRISIONEIRO FOX 2003
126
MADAME SATÃ LUMIÈRE 2002
MEMÓRIAS PÓSTUMAS LUMIÈRE 2001
MINHA VIDA EM SUAS MÃOS FOX 2000
NARRADORES DE JAVÉ LUMIÈRE 2004
O CAMINHO DAS NUVENS BUENA VISTA 2003
O INVASOR PANDORA 2002
O TRAPALHÃO E A LUZ AZUL LUMIÈRE 1999
O TRONCO PANDORA 1999
OLGA LUMIÈRE 2004
ONDE ANDA VOCÊ UIP 2004
OS NORMAIS LUMIÈRE 2003
PELÉ ETERNO UIP 2004
RUA SEIS SEM NÚMERO PANDORA 2003
SAMBA RIACHÃO PANDORA 2004
SEXO, AMOR E TRAIÇÃO FOX 2004
SONHOS TROPICAIS PANDORA 2002
SURF ADVENTURES LUMIÈRE 2002
TRAIÇÃO LUMIÈRE 1998
UM ANJO TRAPALHÃO FOX 2001
UMA AVENTURA DO ZICO LUMIÈRE 1999
VIVA VOZ BUENA VISTA 2004
XUXA REQUEBRA FOX 1999
2046 SEGREDOS DO AMOR PANDORA 2006
A ERA DO GELO 2 FOX 2006
A GAROTA DA VITRINE FOX 2006
A MÁQUINA BVI 2006
A MARCHA DOS PINGUINS DOWNTOWN 2006
A MENINA E O PORQUINHO PAR 2006
A PANTERA COR DE ROSA FOX 2006
A PASSAGEM FOX 2006
A PROFECIA FOX 2006
AEON FLUX UIP 2006
127
ANJOS DA VIDA MAIS BRAVOS... BVI 2006
APENAS AMIGOS PANDORA 2006
AQUAMARINE FOX 2006
ARMAÇÕES DO AMOR UIP 2006
AS CRÔNICAS DE NÁRNIA BVI 2006
AS FÉRIAS DA MINHA VIDA UIP 2006
AS TORRES GÊMEAS UIP 2006
BAMBI 2 O GRANDE PRÍNCIPE BVI 2006
BANDIDAS FOX 2006
CARROS BVI 2006
DIDI CAÇADOR DE TESOUROS BVI 2006
DOIS É BOM, TRÊS É DEMAIS FOX 2006
DOOM A PORTA DO INFERNO UIP 2006
DOZE É DEMAIS FOX 2006
E SE FOSSE VERDADE UIP 2006
ELSA E FRED UM AMOR DE PAIXÃO PANDORA 2006
EM SEU LUGAR FOX 2006
ERAGON FOX 2006
FICA COMIGO ESTA NOITE BVI 2006
FONTE DA VIDA FOX 2006
FORA DE RUMO BVI 2006
GARFIELD 2 FOX 2006
GEORGE, O CURIOSO UIP 2006
GUARDIÕES DA NOITE FOX 2006
INSTINTO SELVAGEM 2 BVI 2006
JOGOS MORTAIS 3 BVI 2006
JOHNNY E JUNE FOX 2006
KING KONG UIP 2006
MENTIRAS SINCERAS FOX 2006
MERGULHO RADICAL FOX 2006
MIAMI VICE UIP 2006
MINHA SUPER EX NAMORADA FOX 2006
128
MISSÃO IMPOSSÍVEL 3 UIP 2006
MUITO GELO E DOIS DEDOS D'ÁGUA BVI 2006
MUNIQUE UIP 2006
NANNY MCFEE A BABÁ
UIP 2006
ENCANTADA
O AMOR EM CINCO TEMPOS PANDORA 2006
O AMOR NÃO TIRA FÉRIAS UIP 2006
O ANO EM QUE MEUS PAIS SAÍRAM
BVI 2006
DE FÉRIAS
O CAVALEIRO DIDI E A PRINCESA
BVI 2006
LILI
O DIABO VESTE PRADA FOX 2006
O GALINHO CHICKEN LITTLE BVI 2006
O JARDINEIRO FIEL UIP 2006
O MATADOR PANDORA 2006
O PLANO PERFEITO UIP 2006
O SEGREDO DOS ANIMAIS UIP 2006
O SENHOR DAS ARMAS PANDORA 2006
O SOL DE CADA MANHÃ UIP 2006
O VIRGEM DE 40 ANOS UIP 2006
OBRIGADO POR FUMAR FOX 2006
ORGULHO E PRECONCEITO UIP 2006
OS SEMFLORESTA UIP 2006
PALAVRAS DE AMOR FOX 2006
PEQUENA MISS SUNSHINE FOX 2006
PIRATAS DO CARIBE 2 BVI 2006
PLANO DE VÔO BVI 2006
POR ÁGUA ABAIXO UIP 2006
PROTEJIDA POR UM ANJO UIP 2006
RESGATE ABAIXO DE ZERO BVI 2006
SE EU FOSSE VOCÊ FOX 2006
SELVAGEM BVI 2006
129
SENTINELA FOX 2006
SEPARADOS PELO CASAMENTO UIP 2006
SERES RASTEJANTES UIP 2006
SOLDADO ANÔNIMO UIP 2006
SOLTANDO OS CACHORROS BVI 2006
SORTE NO AMOR FOX 2006
SRA. HENDERSON APRESENTA BVI 2006
STAY ALIVE JOGO MORTAL UIP 2006
TAPETE VERMELHO PANDORA 2006
TODO MUNDO EM PÂNICO 4 BVI 2006
TRAIR E COÇAR É SÓ COMEÇAR FOX 2006
TUDO ACONTECE EM ELIZABETH
BVI 2006
TOWN
TUDO EM FAMÍLIA FOX 2006
TUDO POR DINHEIRO UIP 2006
UM BOM ANO FOX 2006
UMA COMÉDIA NADA ROMÂNTICA FOX 2006
UMA VERDADE INCONVENIENTE UIP 2006
VELOZES E FURIOSOS 3 UIP 2006
VIAGEM MALDITA FOX 2006
VINICIUS UIP 2006
VOLVER FOX 2006
VÔO 93 UIP 2006
VOVÓ ZONA 2 FOX 2006
XMEN O CONFRONTO FINAL FOX 2006
XUXA GÊMEAS FOX 2006
9 CANÇÕES LUMIÈRE 2005
A CASA DOS BEBÊS PANDORA 2005
A CHAVE MESTRA UNIVERSAL 2005
A FAMÍLIA DA NOIVA FOX 2005
A INTÉRPRETE UNIVERSAL 2005
A JANELA DA FRENTE PANDORA 2005
130
A LUTA PELA ESPERANÇA BUENA VISTA 2005
A MENINA SANTA PANDORA 2005
A VIDA MARINHA COM STEVE
BUENA VISTA 2005
ZISSOU
A VIDA SECRETA DOS DENTISTAS PANDORA 2005
ÁGUA NEGRA BUENA VISTA 2005
ALFIE PARAMOUNT 2005
AMALDIÇOADOS LUMIÈRE 2005
AMIGO OCULTO FOX 2005
AMOR EM JOGO FOX 2005
ASSALTO À 13A DP UNIVERSAL 2005
BRIGADA 49 BUENA VISTA 2005
CARGA EXPLOSIVA 2 FOX 2005
CORONEL E O LOBISOMEM FOX 2005
DE REPENTE É AMOR BUENA VISTA 2005
DELOVELY VIDA E AMORES DE
FOX 2005
COLE PORTER
DESDE QUE OTAR PARTIU PANDORA 2005
DESVENTURAS EM SÉRIE UNIVERSAL 2005
DIÁRIO DE UM NOVO MUNDO PANDORA 2005
DOMINO: A CAÇADORA DE
UIP 2005
RECOMPENSAS
ELEKTRA FOX 2005
ELIANA EM O SEGREDO DOS
FOX 2005
GOLFINHOS
EM BUSCA DA TERRA DO NUNCA LUMIÈRE 2005
ENTRANDO NUMA FRIA MAIOR
UIP 2005
AINDA
GOL! BUENA VISTA 2005
GUERRA DOS MUNDOS UIP 2005
HERBIE – MEU FUSCA TURBINADO BUENA VISTA 2005
HERÓI BUENA VISTA 2005
HORA DE VOLTAR BUENA VISTA 2005
131
HORROR EM AMITYVILLE BUENA VISTA 2005
JOGO SUBTERRÂNEO BUENA VISTA 2005
KINSEY VAMOS FALAR DE SEXO FOX 2005
MADAGASCAR UNIVERSAL 2005
MAR ADENTRO FOX 2005
MELINDA E MELINDA FOX 2005
MERGULHO RADICAL FOX 2005
MEU TIO MATOU UM CARA FOX 2005
O CASAMENTO DE ROMEU E
BUENA VISTA 2005
JULIETA
O CHAMADO 2 UNIVERSAL 2005
O FANTASMA DA ÓPERA UNIVERSAL 2005
O GUIA DO MOCHILEIRO DAS
BUENA VISTA 2005
GALÁXIAS
O JARDINEIRO FIEL UNIVERSAL 2005
O OPERÁRIO PARAMOUNT 2005
O OUTRO NOME DO JOGO FOX 2005
O SENHOR DAS ARMAS PANDORA 2005
O VIRGEM DE 40 ANOS UNIVERSAL 2005
O VÔO DA FÊNIX FOX 2005
OPERAÇÃO BABÁ BUENA VISTA 2005
OS INCRÍVEIS BUENA VISTA 2005
PAPAI NOEL ÀS AVESSAS LUMIÈRE 2005
PAPARAZZI PANDORA 2005
PLANO DE VÔO BUENA VISTA 2005
QUARTETO FANTÁSTICO FOX 2005
QUATRO IRMÃOS PARAMOUNT 2005
QUERIDO FRANKIE BUENA VISTA 2005
QUESTÃO DE IMAGEM PANDORA 2005
RAY UNIVERSAL 2005
ROBÔS FOX 2005
SIDEWAYS ENTRE UMAS E OUTRAS FOX 2005
132
SIN CITY – CIDADE DO PECADO BUENA VISTA 2005
SOBREVIVENDO AO NATAL UNIVERSAL 2005
STAR WARS 3: A VINGANÇA DOS
FOX 2005
SITH
SUPER ESCOLA DE HERÓIS BUENA VISTA 2005
TERRA DOS MORTOS UNIVERSAL 2005
TUDO ACONTECE EM
PARAMOUNT 2005
ELIZABETHTOWN
VÔO NOTURNO UNIVERSAL 2005
VOZES DO ALÉM UNIVERSAL 2005
VOZES INOCENTES FOX 2005
WALLACE & GROMIT – A BATALHA
UNIVERSAL 2005
DOS VEGETAIS
ZATOICHI ZATOICHI BUENA VISTA 2005
21 GRAMAS UIP 2004
A BATALHA DE RIDDICK UIP 2004
A DONA DA HISTÓRIA BUENA VISTA 2004
À FRANCESA FOX 2004
A MARCA UIP 2004
A SUPREMACIA BOURNE UIP 2004
A VILA BUENA VISTA 2004
ACQUÁRIA FOX 2004
ALIEN VS PREDADOR FOX 2004
AMERICAN PIE O CASAMENTO UIP 2004
AMOR SEM FRONTEIRAS UIP 2004
APAIXONADOS BUENA VISTA 2004
AS BICICLETAS DE BELLEVILLE PANDORA 2004
BEIJE QUEM VOCÊ QUISER PANDORA 2004
BRILHO ETERNO DE UMA MENTE
UIP 2004
SEM LEMBRANÇAS
CHAMAS DA VINGANÇA FOX 2004
CHUVA DE VERÃO PANDORA 2004
133
CINEGIBI A TURMA DA MÔNICA UIP 2004
COISAS BELAS E SUJAS LUMIÈRE 2004
COLATERAL UIP 2004
COLD MOUNTAIN BUENA VISTA 2004
COM A BOLA TODA FOX 2004
COM AS PRÓPRIAS MÃOS FOX 2004
COMO FAZER UM FILME DE AMOR LUMIÈRE 2004
CONNIE & CARLA AS RAINHAS
UIP 2004
DA NOITE
CORAÇÕES LIVRES PANDORA 2004
DANÇA COMIGO? BUENA VISTA 2004
DE PASSAGEM LUMIÈRE 2004
DIÁRIO DA PRINCESA 2 BUENA VISTA 2004
DIÁRIOS DE MOTOCICLETA BUENA VISTA 2004
DIRTY DANCING 2: HAVANA
LUMIÈRE 2004
NIGHTS
DOZE É DEMAIS FOX 2004
DUPLEX LUMIÈRE 2004
ENCONTROS E DESENCONTROS UIP 2004
ESCOLA DE ROCK UIP 2004
EU, ROBÔ FOX 2004
FÁBIO FABULOSO LUMIÈRE 2004
GARFIELD O FILME FOX 2004
GAROTAS DO CALENDÁRIO BUENA VISTA 2004
GRANDE MENINA, PEQUENA
FOX 2004
MULHER
HISTÓRIAS MÍNIMAS PANDORA 2004
INTERVENÇÃO DIVINA PANDORA 2004
IRMÃO URSO BUENA VISTA 2004
KILL BILL VOL. 1 LUMIÈRE 2004
KILL BILL VOL. 2 LUMIÈRE 2004
LIGADO EM VOCÊ FOX 2004
134
LINHA DO TEMPO UIP 2004
LUTERO PANDORA 2004
MÁ EDUCAÇÃO FOX 2004
MADRUGADA DOS MORTOS UIP 2004
MAR DE FOGO BUENA VISTA 2004
MATADORES DE VELHINHA BUENA VISTA 2004
MENINA DOS OLHOS LUMIÈRE 2004
MENINAS MALVADAS UIP 2004
MESTRE DOS MARES BUENA VISTA 2004
MONSIEUR N. PANDORA 2004
MULHERES PERFEITAS UIP 2004
NARRADORES DE JAVÉ LUMIÈRE 2004
NATHALIE X PANDORA 2004
NEM QUE A VACA TUSSA BUENA VISTA 2004
O AGENTE DA ESTAÇÃO LUMIÈRE 2004
O ÂNCORA A LENDA DE RON
UIP 2004
BURGUNDY
O BUQUÊ PANDORA 2004
O CUSTO DA CORAGEM BUENA VISTA 2004
O DIA DEPOIS DE AMANHÃ FOX 2004
O ESPANTA TUBARÕES UIP 2004
O GATO UIP 2004
O PAGAMENTO UIP 2004
O TERMINAL UIP 2004
OLGA LUMIÈRE 2004
ONDE ANDA VOCÊ UIP 2004
OS RUGRATS E OS THORNBERRYS
UIP 2004
VÃO APRONTAR
PAIXÃO DE CRISTO FOX 2004
PELÉ ETERNO UIP 2004
QUERO FICAR COM POLLY UIP 2004
RECONSTRUÇÃO DE UM AMOR PANDORA 2004
135
REFÉM DE UMA VIDA FOX 2004
REI ARTUR BUENA VISTA 2004
RESISTINDO ÀS TENTAÇÕES UIP 2004
SAMBA RIACHÃO PANDORA 2004
SEXO COM AMOR FOX 2004
SEXO, AMOR E TRAIÇÃO FOX 2004
SEXTAFEIRA MUITO LOUCA BUENA VISTA 2004
SHOW DE VIZINHA FOX 2004
SHREK 2 UIP 2004
SIMPLESMENTE AMOR UIP 2004
SOB O DOMÍNIO DO MAL UIP 2004
SOB O SOL DA TOSCANA BUENA VISTA 2004
SOBREVIVENDO AO NATAL UIP 2004
STARSKY & HUTCH JUSTIÇA EM
BUENA VISTA 2004
DOBRO
TÁXI FOX 2004
TERRA DE SONHOS FOX 2004
TODO MUNDO EM PÂNICO 3 LUMIÈRE 2004
UM CÃO DO OUTRO MUNDO FOX 2004
UM JOVEM SEDUTOR LUMIÈRE 2004
VALENTIN BUENA VISTA 2004
VAN HELSING CAÇADOR DE
UIP 2004
MONSTROS
VIVA VOZ BUENA VISTA 2004
WIMBLEDON: O JOGO DO AMOR UIP 2004
A FILHA DO CHEFE LUMIÈRE 2003
007 UM NOVO DIA PARA MORRER FOX 2003
8 MILE A RUA DAS ILUSÕES UIP 2003
A CASA CAIU BUENA VISTA 2003
A LIGA EXTRAORDINÁRIA FOX 2003
A ONDA DOS SONHOS UIP 2003
A ÚLTIMA NOITE BUENA VISTA 2003
136
A VIDA DE DAVID GALE UIP 2003
ABAIXO O AMOR FOX 2003
ACONTECE NAS MELHORES
BUENA VISTA 2003
FAMÍLIAS
ALBERGUE ESPANHOL FOX 2003
AMERICAN PIE O CASAMENTO UIP 2003
AMORES PARISIENSES PANDORA 2003
ANITA NÃO PERDE A CHANCE PANDORA 2003
AOS OLHOS DE UMA MULHER FOX 2003
AOS TREZE FOX 2003
AS HORAS LUMIÈRE 2003
AS NOVAS ROUPAS DO
UIP 2003
IMPERADOR
AS QUATRO PLUMAS LUMIÈRE 2003
ASSUNTO DE MENINAS PANDORA 2003
BATER OU CORRER EM LONDRES BUENA VISTA 2003
CARGA EXPLOSIVA FOX 2003
CHEGADAS E PARTIDAS LUMIÈRE 2003
CHICAGO LUMIÈRE 2003
COMO PERDER UM HOMEM EM 10
UIP 2003
DIAS
CONFISSÕES DE UMA MENTE
LUMIÈRE 2003
PERIGOSA
CORRIDAS CLANDESTINAS UIP 2003
CRISTINA QUER CASAR FOX 2003
DEMOLIDOR O HOMEM SEM
FOX 2003
MEDO
DEVORADOR DE PECADO FOX 2003
DOIDA DEMAIS FOX 2003
DOIS PERDIDOS NUMA NOITE
PAND/RIOF 2003
SUJA
DRIBLANDO O DESTINO FOX 2003
ERA UMA VEZ NO MÉXICO BUENA VISTA 2003
137
ESCRITO NAS ESTRELAS LUMIÈRE 2003
EXTERMÍNIO FOX 2003
FOI SÓ UM BEIJO UIP 2003
FRIDA LUMIÈRE 2003
GAROTA VENENO BUENA VISTA 2003
GERAÇÃO ROUBADA LUMIÈRE 2003
HALLOWEEN: RESURREIÇÃO LUMIÈRE 2003
HULK UIP 2003
IMPÉRIO UIP 2003
JOHNNY ENGLISH UIP 2003
KAMCHATKA BUENA VISTA 2003
LARA CROFT TOMB RAIDER
UIP 2003
ORIGEM DA VIDA
LEGALMENTE LOIRA 2 FOX 2003
LEITÃO O FILME BUENA VISTA 2003
LISBELA E O PRISIONEIRO FOX 2003
LONGE DO PARAÍSO PANDORA 2003
MAIS VELOZES MAIS FURIOSOS UIP 2003
MEU PAPAI É NOEL 2 BUENA VISTA 2003
MEU PEQUENO NEGÓCIO PANDORA 2003
NEMESIS UIP 2003
O AGENTE TEEN FOX 2003
O AMERICANO TRANQUILO BUENA VISTA 2003
O AMOR CUSTA CARO UIP 2003
O CHAMADO UIP 2003
O FILHO PANDORA 2003
O JURI FOX 2003
O NOVATO BUENA VISTA 2003
O NÚCLEO MISSÃO AO CENTRO
UIP 2003
DA TERRA
O OLHO QUE TUDO VÊ UIP 2003
O TERNO DE DOIS BILHÕES DE UIP 2003
138
DÓLARES
O ÚLTIMO BEIJO BUENA VISTA 2003
ONLY THE STRONG SURVINE LUMIÈRE 2003
OS NORMAIS LUMIÈRE 2003
OS THORNBERRYS O FILME UIP/PAR 2003
PACTO DE JUSTIÇA BUENA VISTA 2003
PEQUENOS GRANDES ASTROS FOX 2003
PIRATAS DO CARIBE BUENA VISTA 2003
POR UM FIO FOX 2003
PRENDAME SE FOR CAPAZ UIP 2003
PROCURANDO NEMO BUENA VISTA 2003
RECÉMCASADOS FOX 2003
RUA SEIS, SEM NÚMERO PANDORA 2003
SEABISCUIT ALMA DE HERÓI BUENA VISTA 2003
SEGUNDAFEIRA AO SOL PANDORA 2003
SINBAD A LENDA DOS SETE
UIP 2003
MARES
SOLARIS FOX 2003
SUBMERSOS LUMIÈRE 2003
TODO PODEROSO BUENA VISTA 2003
UM GOLPE DE MESTRE UIP 2003
UMA VIDA EM SETE DIAS FOX 2003
VIOLAÇÃO DE CONDUTA FOX 2003
VIVER MATA FOX 2003
VOANDO ALTO LUMIÈRE 2003
VOLTANDO A VIVER FOX 2003
XMEN 2 FOX 2003
A COMUNIDADE PANDORA 2002
A ERA DO GELO FOX 2002
A HISTÓRIA REAL LUMIÈRE 2002
A ISCA PERFEITA LUMIÈRE 2002
A LÍNGUA DAS MARIPOSAS PANDORA 2002
139
A SOMA DE TODOS OS MEDOS UIP 2002
A ÚLTIMA CEIA LUMIÈRE 2002
AMERICAN PIE 2 – 2ª VEZ É AINDA
UIP 2002
MELHOR
AS NOVAS ROUPAS DO IMPERADOR UIP 2002
ATÉ O FIM FOX 2002
BEIJANDO JESSICA STEIN FOX 2002
CHARLOTTE GRAY UIP 2002
CIDADE DE DEUS LUMIÈRE 2002
DIVAS DE BLUE IGUANA LUMIÈRE 2002
DO INFERNO FOX 2002
DOCE LAR BUENA VISTA 2002
DOMINGO SANGRENTO UIP 2002
DRAGÃO VERMELHO UIP 2002
E SUA MÃE TAMBÉM* FOX 2002
ENIGMA LUMIÈRE 2002
ENTRE QUATRO PAREDES LUMIÈRE 2002
ESTRADA PARA PERDIÇÃO FOX 2002
FALE COM ELA FOX 2002
FLAMENCO PANDORA 2002
FULL FRONTAL BUENA VISTA 2002
HISTÓRIAS PROIBIDAS PANDORA 2002
IDENTIDADE BOURNE UIP 2002
INFIDELIDADE FOX 2002
LILO & STITCH BUENA VISTA 2002
LÚCIA E O SEXO PANDORA 2002
MEU PRIMEIRO HOMEM UIP 2002
MINORITY REPORT – A NOVA LEI FOX 2002
MONSTROS S. A. BUENA VISTA 2002
O AMOR É CEGO FOX 2002
O ARTICULADOR LUMIÈRE 2002
O CLOSET PANDORA 2002
140
O CONDE DE MONTE CRISTO BUENA VISTA 2002
O DIÁRIO DA PRINCESA BUENA VISTA 2002
O ESCORPIÃO REI UIP 2002
O FABULOSO DESTINO DE AMÉLIE
LUMIÈRE 2002
POULAIN
O GOSTO DOS OUTROS PANDORA 2002
O HOMEM QUE NÃO ESTAVA LÁ BUENA VISTA 2002
O IMPÉRIO DO BESTEIROL CONTRA
LUMIÈRE 2002
ATACA
OS EXCÊNTRICOS TENENBAUMS BUENA VISTA 2002
PARAÍSO LUMIÈRE 2002
POR UM SENTIDO NA VIDA FOX 2002
SEXY BEAST FOX 2002
SIMPLESMENTE MARTHA UIP 2002
SINAIS BUENA VISTA 2002
SPIRIT – O CORCEL INDOMÁVEL UIP 2002
STAR WARS: EPISÓDIO 2 FOX 2002
TEIA DE CHOCOLATE PANDORA 2002
TERRA DE NINGUÉM LUMIÈRE 2002
UMA MENTE BRILHANTE UIP 2002
UMA QUESTÃO DE FAMÍLIA LUMIÈRE 2002
VANILLA SKY UIP 2002
VIVER MATA FOX 2002
WAKING LIFE FOX 2002
102 DÁLMATAS DISNEY 2001
A ESPINHA DO DIABO FOX 2001
A HORA DO RECREIO BVI 2001
A HORA DO RECREIO DISNEY 2001
A NOVA ONDA DO IMPERADOR BVI 2001
A NOVA ONDA DO IMPERADOR DISNEY 2001
ANTES DO ANOITECER FOX 2001
AS MULHERES DE ADAM LUMIÈRE 2001
141
AS VIRGENS SUICIDAS UIP 2001
BILLY ELLIOT UIP 2001
CHOCOLATE LUMIÈRE 2001
CONCORRENCIA DESLEAL PANDORA 2001
CONTOS PROIBIDOS... FOX 2001
E TUA MÃE TAMBÉM FOX 2001
ENFERMEIRA BETTY UIP 2001
MALENA LUMIÈRE 2001
MONSTROS S.A. BVI 2001
MONSTROS S.A. DISNEY 2001
MOULIN ROUGE FOX 2001
O CAMINHO DE KANDAHAR LUMIÈRE 2001
RUGRATS EM PARIS UIP 2001
SHREK UIP 2001
VATEL LUMIÈRE 2001
A CARTADA FINAL UIP/UNIVERSAL 2001
A FUGA DAS GALINHAS UIP/DREAMWORKS 2001
A MEXICANA UIP/DREAMWORKS 2001
A NOVA ONDA DO IMPERADOR BUENA VISTA 2001
A TEIA DE ARANHA UIP/PARAMOUNT 2001
ATLANTIS O REINO PERDIDO BUENA VISTA 2001
CHOCOLATE LUMIÈRE 2001
CORPO FECHADO BUENA VISTA 2001
DR. DOLITTLE 2 FOX 2001
ENTRANDO NUMA FRIA UIP/UNIVERSAL 2001
HANNIBAL UIP/UNIVERSAL 2001
JURASSIC PARK III UIP/UNIVERSAL 2001
LARA CROFT: TOMB RAIDER UIP/PARAMOUNT 2001
LEGALMENTE LOIRA FOX 2001
MOULIN ROUGE FOX 2001
NÁUFRAGO UIP/DREAMWORKS 2001
O DIÁRIO DE BRIDGET JONES UIP/UNIVERSAL 2001
142
O GRINCH UIP/UNIVERSAL 2001
O RETORNO DA MÚMIA UIP/UNIVERSAL 2001
OS OUTROS LUMIÈRE 2001
PEARL HARBOR BUENA VISTA 2001
PECADO ORIGINAL FOX 2001
PLANETA DOS MACACOS FOX 2001
REFÉM DO SILÊNCIO FOX 2001
SHREK UIP/DREAMWORKS 2001
TODO MUNDO EM PÂNICO 2 LUMIÈRE 2001
VELOZES E FURIOSOS UIP/UNIVERSAL 2001
A FUGA DAS GALINHAS UIP 2000
AS AVENTURAS DE BARNEY FOX 2000
CAMINHO PARA O ELDORADO UIP 2000
DINOSSAURO BUENA VISTA 2000
DINOSSAURO DISNEY 2000
DUAS VIDAS DISNEY 2000
FANTASIA 2000 BUENA VISTA 2000
FANTASIA 2000 DISNEY 2000
INSPETOR BUGIGANGA DISNEY 2000
TIGRÃO O FILME BUENA VISTA 2000
TIGRÃO O FILME DISNEY 2000
TITAN FOX 2000
102 DÁLMATAS DISNEY 2000
A LENDA DO CAVALEIRO SEM
UIP/PARAMOUNT 2000
CABEÇA
A NOVA ONDA DO IMPERADOR DISNEY 2000
ALTA FIDELIDADE BUENA VISTA 2000
AMOR OU AMIZADE LUMIÈRE 2000
ASSÉDIO PAND/NN 2000
BELEZA AMERICANA UIP 2000
DINOSSAURO DISNEY 2000
DOGMA LUMIÈRE 2000
143
DOGMA LUMIÈRE 2000
ECOS DO ALÉM FOX 2000
ENDIABRADO FOX 2000
FANTASIA 2000 DISNEY 2000
FILHA DA LUZ BUENA VISTA 2000
HURRICANE O FURACÃO BUENA VISTA 2000
MENINOS NÃO CHORAM FOX 2000
O INFORMANTE BUENA VISTA 2000
O TALENTOSO RIPLEY LUMIÈRE 2000
PÂNICO 3 LUMIÈRE 2000
QUERO SER JOHN MALKOVICH UIP 2000
REVELAÇÃO FOX 2000
SOBROU PRÁ VOCÊ BUENA VISTA 2000
TENHA FÉ BUENA VISTA 2000
TENHA FÉ BUENA VISTA 2000
TIGRÃO O FILME DISNEY 2000
VIVENDO NO LIMITE BUENA VISTA 2000
101 DÁLMATAS DISNEY 95
A PEQUENA SEREIA DISNEY 98
ALADDIN DISNEY 93
ANASTASIA FOX 97
BAMBI DISNEY 93
FLUBBER UMA INVENÇÃO... DISNEY 97
FORMIGUINHAZ UIP 98
GEORGE O REI DA FLORESTA DISNEY 98
HÉRCULES DISNEY 97
MEU FILHO DAS SELVAS DISNEY 97
MULAN DISNEY 98
O CORCUNDA DE NOTRE DAME DISNEY 96
O LIVRO DA SELVA DISNEY 95
O PRÍNCIPE DO EGITO UIP 98
O REI LEÃO DISNEY 94
144
PATETA O FILME DISNEY 96
POCAHONTAS DISNEY 95
PODEROSO JOE DISNEY 95
QUERIDA ESTIQUEI O BEBÊ DISNEY 93
RUGRATS OS ANJINHOS UIP 99
SANTA CLAUSE DISNEY 95
TARZAN DISNEY 99
VIDA DE INSETO DISNEY 98
101 DÁLMATAS O FILME DISNEY 96
A BRUXA DE BLAIR FOX 99
A CASA AMALDIÇOADA UIP/DREAMWORKS 99
A MÚMIA UIP/UNIVERSAL 99
A PEQUENA SEREIA DISNEY 98
A RAZÃO DO MEU AFETO FOX 98
A VIDA É BELA LUMIÈRE 99
ADORO PROBLEMAS UIP 94
ALADDIN DISNEY 93
ALIEN 3 FOX 92
ALIEN A RESSURREIÇÃO FOX 98
AMOR ALÉM DA VIDA FOX 99
ARISTOGATAS DISNEY 95
ARQUIVO X FOX 99
AS BRUXAS DE SALEM FOX 97
AS BRUXAS DE SALEM FOX 97
BAMBI DISNEY 93
CARNE TRÊMULA FOX 98
CÍRCULO DE PAIXÕES FOX 97
COLCHA DE RETALHOS UIP/UNIV 96
DANÇA COMIGO? BUENA VISTA 98
DEAD AGAIN UIP 92
DESCONSTRUINDO HARRY BUENA VISTA 99
E.T. O EXTRATERRESTRE UIP 82
145
ELIZABETH FOX 99
ENCONTRO MARCADO UIP/UNIV 98
ENQUANTO VOCÊ DORMIA BUENA VISTA 95
ESPÉCIES UIP/MGM 95
ESQUECERAM DE MIM FOX 90
EVITA BUENA VISTA 97
FILHOS DO PARAÍSO LUMIÈRE 99
FIM DOS DIAS BUENA VISTA 99
FORÇAS DO DESTINO UIP 99
GHOST DO OUTRO LADO DA
UIP 90
VIDA
GHOST DO OUTRO LADO DA
UIP 90
VIDA
GREASE NOS TEMPOS DA
UIP 78
BRILHANTINA
HALLOWEEN. H20 LUMIÈRE 98
HERCULES DISNEY 97
INDIANA JONES E A ÚLTIMA
UIP 80
CRUZADA
INFERNO NA TORRE FOX 75
JURASSIC PARK O MUNDO
UIP 93
PERDIDO
KUNDUN LUMIÈRE 99
LOUCOS DE AMOR LUMIÈRE 98
MULAN DISNEY 98
NOIVA EM FUGA BUENA VISTA 99
NOTTING HILL UIP 99
NOVE MESES FOX 95
NUNCA FUI BEIJADA FOX 99
O CAMPEÃO UIP 79
O CORCUNDA DE NOTRE DAME DISNEY 96
O FENÔMENO BUENA VISTA 96
O REI LEÃO BUENA VISTA 94
146
O REI LEÃO DISNEY 94
O SEXTO SENTIDO BUENA VISTA 99
O SEXTO SENTIDO BUENA VISTA 99
OS EMBALOS DE SÁBADO À NOITE UIP 78
OS ESPÍRITOS UIP/UNIVERSAL 96
PÂNICO 2 LUMIÈRE 99
PÂNICO NO LAGO FOX 99
PATETA O FILME DISNEY 96
POCAHONTAS DISNEY 95
PROCURASE AMY LUMIÈRE 97
QUEM VAI FICAR COM MARY? FOX 98
ROCKY 4 UIP 86
SABRINA UIP 96
SEIS DIAS, SETE NOITES BUENA VISTA 98
SHAKESPEARE APAIXONADO UIP 99
SHINE BRILHANTE BUENA VISTA 97
STAR WARS EPISÓDIO 1 FOX 99
STIGMATA UIP/MGM 99
TANGO LUMIÈRE 99
TARZAN DISNEY 99
TERREMOTO UIP 75
THOMAS CROWN UIP/UA 99
TITANIC FOX 98
TOY STORY DISNEY 96
TOY STORY 2 DISNEY 99
TUBARÃO UIP 76
TUDO OU NADA FOX 98
TUDO SOBRE MINHA MÃE FOX 99
VIDA DE INSETO DISNEY 98
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Refer ências Bibliogr áficas
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pelo público infantil” in Sujeito, o lado oculto do receptor. Brasiliense: São
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Textos para Discussão, ISSN 14140640 ; 26)
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Brasil 2005 ; Relatório da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
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