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RELATÓRIO DE PESQUISA

Bolsa de Estudos FAPESP

O Mal e a Morte em
The Lord of the Rings

Bolsista: André Luiz Rodriguez Modesto Pereira


Orientadora: Profª Drª Karin Volobuef

Faculdade de Ciências e Letras


Araraquara
UNESP
2008
2

Índice

RESUMO DO PROJETO INICIAL ...................................................................... 3


RESUMO DA PESQUISA REALIZADA NO PERÍODO..................................... 3
PESQUISA REALIZADA NO PERÍODO ............................................................ 4
The Lord of the Rings e sua dimensão estética ...................................................... 4
Middle-earth e The Lord of the Rings.................................................................... 9
O Mal e a Morte em The Lord of the Rings ......................................................... 19
The Lord of the Rings e os gêneros literários....................................................... 28
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 38
APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS E PUBLICAÇÕES................................. 40
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES PARA O PRÓXIMO PERÍODO .............. 42
3

RESUMO DO PROJETO INICIAL


A pesquisa aqui proposta destina-se a analisar o romance The Lord of the Rings,
de J. R. R. Tolkien, sob a temática do Mal e da Morte. Para isso a análise se deterá em
dois aspectos fundamentais: a problematização do gênero da obra, visto que uma parte
da crítica a considera como romance de fantasia (Fantasy Novel), enquanto outra parte a
vê como sátira ou alegoria dos eventos históricos de meados do século XX; e a
caracterização das personagens, levando em conta o grupo ou povo a qual pertencem,
com uma atenção especial voltada para os hobbits.

RESUMO DA PESQUISA REALIZADA NO PERÍODO

A pesquisa realizada no período compreendeu a elaboração dos seguintes


estudos: a) rápidas considerações sobre o caráter estético da obra de Tolkien (tendo em
vista que a dimensão estética é base importante para justificar a análise da obra sob a
ótica da teoria literária); b) mapeamento geral do enredo de The Lord of the Rings, que
permite vislumbrar com mais facilidade o fio condutor da ação e a constituição dos
tópicos analisados a seguir; c) discussão do Mal conforme diversos aportes teóricos,
bem como seu acoplamento ao tema da Morte, e, finalmente, d) exposição de alguns
problemas envolvendo o gênero literário no qual o texto poderia ser inserido.
A divulgação dos resultados da pesquisa se dará por meio de apresentação de
trabalhos nos eventos: XIX Congresso de Iniciação Científica da UNESP, XVI
Congresso de Iniciação Científica (CIC) da UFSCar e Simpósio Internacional de
Iniciação Científica da USP, os quais serão realizados no segundo semestre de 2008 e
abrirão possibilidade de publicação de resumos e trabalhos completos em Anais.
Também haverá a participação em eventos na condição de ouvinte, dentre os quais
merece destaque o Seminário de Pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Estudos
Literários (UNESP-Araraquara).
Além da pesquisa propriamente dita, o período também contou com o
cumprimento dos créditos do Curso de Gradução (vide Histórico Escolar em anexo).
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PESQUISA REALIZADA NO PERÍODO

The Lord of the Rings e sua dimensão estética

Publicado entre os anos de 1954 e 1955, The Lord of the Rings, a principal obra
de John Ronald Reuel Tolkien (1892-1973), seria por muito tempo alvo de críticas,
interpretações e polêmicas. Apesar disso, não recebeu grande atenção da crítica literária
especializada da época, que, em muitos casos, não a considerava digna de atenção.
Certas leituras arrevesadas e o gosto modernista cultivado a partir das primeiras
décadas do século XX parecem ser alguns dos motivos para esse desprezo da academia.
De fato, a obra tolkieniana apresenta características incomuns em uma época dominada
pelas vanguardas, em que a literatura, juntamente com as experimentações com a
linguagem e as inovações técnicas daí decorrentes, promovia um mergulho na
subjetividade e conhecia o indivíduo fragmentado, conforme revelado pelas novas
teorias psicanalíticas. Afastando-se dessas tendências, J.R.R. Tolkien desenvolve em
The Lord of the Rings uma longa narrativa, marcada pela complexidade do enredo e
grande número de personagens, ambientados em uma era remota e dispostos num tempo
predominantemente linear. Dessa forma, o autor tenta reconstruir um passado mítico da
humanidade, dialogando com as tradições das mitologias nórdica, germânica e greco-
latina, além dos textos medievais, como as novelas de cavalaria e as canções de gesta
(marcadas pelo espírito cristão), que ajudaram a construir o imaginário ocidental.
Contudo, deve-se ressaltar que, embora distante das experimentações técnicas a
maneira modernista, Tolkien era um escritor consciente do seu trabalho com a
linguagem. Pode-se dizer ainda que o seu modo de trabalhar a linguagem estava
intimamente relacionado à sua carreira de filólogo e professor em Oxford, o que sugere
que as suas preocupações estariam voltadas antes à busca do significado primitivo de
uma palavra do que para a tentativa de novas criações lexicais dentro da língua inglesa.
Ao buscar a palavra em sua origem, Tolkien procura abrir um caminho em busca dos
primórdios da própria linguagem e, assim, o falar e o escrever assumem freqüentemente
em sua obra um caráter mágico e performativo. A palavra é, então, traduzida em ação,
ou, nas palavras de Flieger:

he gives us back word, those tired old counters worn with use, and makes
them new again in their power variety and magic. He remembers for us what
we have forgotten, that spell is both a noun and a verb, that it means
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incantation as well as the formation of a word by letters, and that to use it in


either sense inevitably involves using it in both senses (FLIEGER apud
SUÁREZ, 2006, p.35 – grifo da autora)

Para citar um exemplo de como Tolkien caracteriza esse uso da palavra/ação


recorremos ao momento em que a inscrição gravada no Anel maligno é lida em voz alta
por Gandalf, o mago, sendo possível notar alterações não apenas nos sentimentos dos
ouvintes, mas também na natureza que os cerca:

Ash nazg durbatulûk, ash nazg gumbatul, ash nazg thrakatulûk


agh burzum-ishi krimpatul.

The change in the wizard’s voice was astounding. Suddenly it became


menacing, powerful, harsh as stone. A shadow seemed to pass over the high
sun, and the porch for a moment grew dark. All trembled, and the Elves
stopped their ears. (TOLKIEN, 1966b, p. 285)

O que Tolkien constrói, então, é um mundo de linguagem, onde esta ocupa uma
posição fundamental. Conforme W. H. Auden, a primeira tarefa do construtor de um
mundo imaginário é a de encontrar nomes para todas as coisas e, caso haja mais de uma
língua, ele terá seu trabalho multiplicado pelo número de línguas existentes no mundo
inventado. Auden prossegue:

In the nominative gift, Tolkien surpasses any writer, living or dead, whom I
have ever read; to find the “right” names is hard enough in a comic world; in
a serious on success seems almost magical. Moreover, he shows himself
capable of inventing not only names but whole languages which reflect the
nature of those who speak them. (AUDEN, 2004, p.42)

Este universo de linguagem criado por Tolkien para constituir o cenário para
suas histórias é denominado Middle-earth (Terra-Média), um mundo construído com
grande minúcia de detalhes, compreendendo sua própria geografia, sua história e
diversas línguas – que representam os maiores esforços do autor como invenção
lingüística. Habitam ali seres abstraídos da tradição folclórica européia como magos,
elfos, trolls, anões e orcs, além de criaturas inventadas pelo próprio autor, como os ents
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e os hobbits. Para a construção dessa engrenagem ficcional extremamente multifacetada


e complexa, Tolkien lançou mão de seus amplos conhecimentos de literatura, mitologia
e filologia, os quais provinham de suas pesquisas enquanto professor na Universidade
de Oxford. Middle-earth não é, contudo, nenhum planeta distante ou um mundo cuja
existência se dá unicamente no reino da fantasia; pelo contrário, trata-se de nosso
próprio planeta em uma época muito antiga, anterior até mesmo aos épicos que nos
transmitem as mitologias. O próprio nome Middle-earth já atesta esse significado, pois
é um termo antigo para “mundo”, e, conforme Lin Carter (2003, p. 38), é um vocábulo
freqüente em muitas obras da literatura inglesa. Com isso, o leitor não se sente um
completo estranho diante do universo criado pelo professor de Oxford.
O esforço dedicado por J. R. R. Tolkien à construção de narrativas é também um
dos motivos pelos quais a sua obra é freqüentemente desprezada. Com o mergulho no
indivíduo e o surgimento de técnicas como o fluxo de consciência, acentuou-se a
tendência, na literatura, de escrita de romances cada vez mais voltados à personagem e
desligados da ação. Assim, pode-se dizer que no início do século XX era possível
constatar um declínio da arte da narrativa. Esse declínio já é apontado por Walter
Benjamin em seu ensaio intitulado “O narrador”, escrito por volta de 1936; que embora
seja dedicado à obra de Nicolau Lescov, adapta-se perfeitamente aos escritos
tolkienianos. O motivo que o crítico encontra para essa diminuição no valor da narrativa
é, por um lado, a perda do valor das experiências humanas e, por outro, ao surgimento
de uma nova forma privilegiada de comunicação baseada na informação. Para
Benjamin, a narrativa era a principal forma de aconselhamento e de transmissão de
experiências, visto que

“dar conselho” significa muito menos responder a uma pergunta do que


fazer uma proposta sobre a continuidade de uma estória que neste instante
está a se desenrolar. Para formular o conselho é necessário antes de mais
nada saber narrar a estória. (BENJAMIN, 1975, p.65).

Grande parte do prestígio recebido pela informação vem de sua capacidade de


oferecer alguma ligação direta com a vida prática, ao contrário da narrativa que muitas
vezes se desenvolve através de um relato sobre lugares longínquos ou tempos afastados.
A validade da informação é baseada, portanto, ou em sua verificabilidade ou em seu
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caráter de verossimilhança. Para Benjamin, o que afasta a informação da arte narrativa é


o fato de que

[...] nenhum acontecimento é revelado sem que seja permeado de


explicações. Em outras palavras: nada mais do que acontece é abrangido
pela narrativa, e quase tudo pela informação. Pois metade da habilidade de
narrar reside na capacidade de relatar a estória sem ilustrá-la com
explicações. (BENJAMIN, 1975, p.67)

A ausência de informação, na narrativa não causa, ao contrário do que se pode


imaginar, um empobrecimento do assunto narrado.

O extraordinário e o maravilhoso são sempre relatados com a maior


exatidão, mas o relacionamento psicológico dos fios da ação não é oferecido
à força ao leitor. Fica a seu critério interpretar a situação tal como a entende,
e assim a narrativa alcança uma envergadura ampla que falta à informação.
(BENJAMIN, 1975, p.67)

Dessa forma, o crítico ressalta o valor do narrador e das narrativas, tanto orais
quando escritas, e acrescenta ainda que:

A arte de narrar aproxima-se do seu fim por extinguir-se o lado épico da


verdade, a sabedoria. Trata-se de processo que vem de longe. E nada mais
tolo do que contemplá-lo como “fenômeno de decadência” ou, pior ainda,
fenômeno de “decadência moderna”. (BENJAMIN, 1975, p.65).

É notável que Tolkien, no início de seu ensaio intitulado “On Fairy-Stories”,


faça uma observação semelhante quanto ao contraste entre narrativa e informação:

I propose to speak about fairy-stories, though I am aware that this is a rash


adventure. Faerie is a perilous land, and in it are pitfalls for the unwary and
dungeons for the overbold. And overbold I may be accounted, for though I
have been a lover of fairy-stories since I learned to read, and have at times
thought about them, I have not studied them professionally. I have been
hardly more than a wandering explorer (or trespasser) in the land, full of
wonder but not of information. (TOLKIEN, 1966, p.33 – grifo meu)
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Essas considerações iniciais se fazem necessárias, pois permitem ressaltar alguns


dos principais motivos pelos quais a obra de J. R. R. Tolkien merece ser analisada e
considerada literatura. A crítica hostil freqüentemente desconsidera a importância da
narrativa e o caráter criativo do autor tanto no campo da invenção de um novo universo,
quanto no campo da invenção lingüística. Com os lançamentos dos filmes de Peter
Jackson baseados na obra tolkieniana, essa crítica encontrou outros motivos, além do
enorme sucesso da obra e o comportamento exagerado de alguns fãs, durante os anos de
1960, para sustentar a sua posição de que um autor como Tolkien não deveria ser
considerado seriamente, taxando sua obra como cultura de massa e, conseqüentemente,
algo de menor qualidade artística. Além disso, é comum que se considere The Lord of
the Rings apenas como uma alegoria da II Guerra Mundial, ou ainda, que se destaque
certos elementos da obra de modo a caracterizá-la como uma alegoria do cristianismo.
Esses tipos de leituras, no entanto, baseiam-se antes no contexto de publicação da obra
(cerca de dez anos após a referida guerra) e no fato de Tolkien se declarar um católico
devoto, do que em características próprias do texto. O autor, por sua vez, afirma não ter
tido quaisquer intenções de construir estas alegorias, mas, utilizando-se do termo
“applicability” (TOLKIEN, 1966b, p. X), dá a liberdade ao leitor para que ele crie uma
ampla variedade de interpretações.
De acordo com Patrick Curry, em Defending Middle-Earth, o sucesso alcançado
pela obra é devido ao surgimento de uma nova sensibilidade e à existência de um
público carente de narrativas. Dessa forma, Tolkien antecipa a tendência pós-moderna
de buscar alternativas para os padrões estabelecidos pelas vanguardas e pelo
Modernismo. Ou seja, sua obra deixa entrever a desilusão com os ideais e propostas
iluministas e mostra-se consciente do fracasso da visão de mundo construída desde o
século XVII e que culminou com uma realidade caracterizada principalmente pela
“combination of modern science, a global capitalist economy, and the political power of
the nation-state”. (CURRY, 1998, p. 22).
Como se poderá observar, ao longo desse relatório, a postura adotada por alguns
críticos para com a obra influencia fortemente o resultado de suas análises, gerando
visões distorcidas ou, até mesmo, equivocadas sobre o trabalho do professor de Oxford.
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Deve-se, portanto, em primeiro lugar, indicar na obra a ser analisada quais serão as
principais características que a definem sustentando sua unidade fundamental.
Com a abordagem da obra sob a temática do Mal e da Morte e a investigação no
plano dos gêneros literários, pretende-se, também, dar início a uma tentativa de
interpretação geral, que será aprofundada na segunda parte dessa pesquisa com a análise
das principais personagens. Para isso, revisaremos de forma crítica textos de vários
autores que se preocuparam com esse tema e com o enquadramento de The Lord of the
Rings do ponto de vista dos gêneros literários, explorando inclusive as tentativas de
interpretação alegórica, além de elaborarmos algumas propostas de classificação da
obra.

Middle-earth e The Lord of the Rings


Tolkien escreveu vários livros ambientados em Middle-earth, sendo o primeiro
The Hobbit, publicado em 1937. Somente dezessete anos depois foi publicado The Lord
of the Rings, cujos três volumes saíram entre 1954 e 1955. Os volumes são identificados
como “The Fellowship of the Ring”, “The Two Towers” e “The Return of the King”, o
que fez com que a obra fosse muitas vezes tida como uma trilogia, isto é, um conjunto
de três obras interligadas. Contudo, deve-se ressaltar que The Lord of the Rings apenas
foi publicado de forma tripartite devido a uma decisão editorial baseada no custo do
papel na Grã-Bretanha pós-II Guerra (cf. SHIPPEY, 2000, p. 50). Entre as obras de
Tolkien ainda cabe mencionar The Silmarillion (1977), Unfinished Tales of Númenor
and Middle-earth (1980) e The Children of Hurin (2007) - publicadas postumamente
com a contribuição de Christopher Tolkien, editor e filho de J. R. R. Tolkien.
Como se pode notar, The Lord of the Rings faz parte de um conjunto amplo de
textos escritos em verso e em prosa, nos quais podemos encontrar a história de Middle-
earth desde a sua criação – narrada em The Silmarillion – até o início da Quarta Era,
quando todas as criaturas mágicas de Middle-earth estão destinadas a desaparecer e se
inicia a Era dos Homens. Por esse motivo, deve-se ter em conta que, apesar de constituir
uma obra autônoma, a estreita ligação existente em The Lord of the Rings com os outros
escritos referentes a Middle-earth torna necessário que, em certos momentos, se recorra
a essas outras fontes para que seja possível reconstruir o sentido completo da obra que
nos propomos a analisar.
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The Lord of the Rings é dividido em seis livros, além de seis apêndices, com
várias informações sobre o universo criado pelo autor, e um Prólogo, que estabelece
uma ligação com o seu livro anterior – The Hobbit – e fornece mais algumas
informações detalhadas sobre os hobbits e o seu modo de vida, bem como sobre o
chamado Red Book of Westmarch, que seria a fonte de onde se traduziu The Hobbit e
The Lord of the Rings.
Logo no “Prologue” da principal obra de J. R. R. Tolkien é dito que: “This book
is largely concerned with Hobbits, and from its pages a reader may discover much of
their character and a little of their history.” (TOLKIEN, 1966b, p. 1). Mas o que seriam
hobbits? A palavra “hobbit” é, segundo a etimologia indicada pelo autor, uma forma
deturpada de holbytla, que significa “hole-builder” (TOLKIEN, 1966d, p. 456). Mas
isso pouco indica além do fato de que tais seres tinham o costume de construir e morar
em tocas com portas e janelas redondas. O lugar em que habitavam era conhecido como
Shire, uma área de economia predominantemente rural onde eles viviam sem maiores
preocupações com o que acontecia além de suas fronteiras. No “Prologue” de The Lord
of the Rings, eles são descritos assim:

As for the Hobbits of the Shire, with whom these tales are concerned, in the
days of their peace and prosperity they were a merry folk. They dressed in
bright colours, being notably fond of yellow and green; but they seldom
wore shoes, since their feet had tough leathery soles and were clad in a thick
curling hair, much like the hair of their heads, which was commonly brown.
Thus, the only craft little practised among them was shoe-making; but they
had long and skilful fingers and could make many other useful and comely
things. Their faces were as a rule good-natured rather than beautiful, broad,
bright-eyed, red-cheeked, with mouths apt to laughter, and to eating and
drinking. And laugh they did, and eat, and drink, often and heartily, being
fond of simple jests at all times, and of six meals a day (when they could get
them). They were hospitable and delighted in parties, and in presents, which
they gave away freely and eagerly accepted. (TOLKIEN, 1966b, p.2)

Acrescenta-se ainda que os hobbits poderiam ser considerados parentes dos seres
humanos e que, embora morassem em tocas, não tinham quaisquer relações com
animais que possuem o mesmo hábito, conforme sugere a comparação feita por Edmund
Wilson entre “hobbits” e coelhos (rabbits) (cf. WILSON, 2008).
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O “Prologue” inclui ainda algumas informações sobre Shire e seus registros


históricos, sobre o hábito de fumar dos hobbits e, mais importante, sobre o achado do
Anel por Bilbo Baggins.
Bilbo Baggins é a personagem principal de The Hobbit, que participa de uma
aventura com um grupo de treze anões e o mago Gandalf, que os acompanha até certo
momento da jornada. O objetivo principal da busca a que se lançam é o de recuperar o
reino e o tesouro roubados e protegidos pelo dragão Smaug. Entretanto, o evento mais
importante dessa viagem é quando Bilbo se perde do grupo e encontra um anel no chão
de uma caverna. Em The Hobbit pouca atenção é dada ao anel, cuja função, aqui, se
limita a tornar invisível aquele que o coloca no dedo.
Somente em The Lord of the Rings é revelada a verdadeira natureza desse anel,
que passa a ser designado como um anel único e especial (the One Ring), como “Anel
Governante” (the Ruling Ring), uma terrível arma criada por Sauron que possibilitaria
ao seu possuidor, caso fosse poderoso o suficiente, o domínio absoluto sobre Middle-
earth. Esse Anel possui, porém, uma natureza maligna que pouco a pouco é capaz de
subjugar aquele que o possui, pois, em seu processo de feitura, grande parte da essência
de seu artífice foi incorporada à jóia.
A história narrada em The Lord of the Rings tem início vários anos após as
aventuras contadas em The Hobbit. Bilbo surge mais velho, porém, devido à posse do
Anel, extremamente conservado, não exibindo traços de envelhecimento. Cansado de
sua permanência no Shire, ele prepara-se para uma nova viagem e, logo no primeiro
capítulo, abandona a sua terra natal deixando todos os seus bens, inclusive o Anel, para
seu sobrinho Frodo.
Com a saída de Bilbo do Shire, a narrativa concentra-se em Frodo, o novo
portador do Anel, que logo descobre, através de Gandalf, os perigos que essa herança
podia lhe acarretar. Seguindo os conselhos do mago, Frodo também se decide a deixar o
Shire e dirigir-se para Rivendell, como fizera o seu tio Bilbo.
Acompanhado de seu jardineiro e amigo Sam, e de seus parentes e amigos
Merry e Pippin, Frodo parte do Condado em uma viagem perigosa, na qual são
perseguidos pelos Black Riders (Cavaleiros Negros), servos de Sauron em busca do
Anel. Apesar dos grandes riscos, a viagem também proporciona algumas experiências
mais agradáveis, como o encontro com Tom Bombadil e com Strider, que se junta aos
quatro hobbits durante a passagem por Bree.
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Essa primeira parte da viagem ocupa todo o Livro I de The Lord of the Rings –
conforme a divisão em seis livros proposta pelo autor. Ao fim dessa viagem, Frodo está
gravemente ferido, pois recebera o golpe de uma faca enfeitiçada de um dos Cavaleiros
Negros; e não se sabe o destino que será dado ao Anel. Além disso, Gandalf
desaparecera sem deixar vestígios, mistério que é resolvido logo no início da segunda
parte do enredo.
O Livro II tem início com a pequena comitiva já em Rivendell e Frodo
parcialmente recuperado do ferimento que recebera – ferimento que, até o fim do
romance, não chega a se curar completamente. Gandalf reaparece e conta que tinha sido
preso por Saruman, outro mago da mesma ordem que havia se corrompido e passara a
desejar o Anel para si.
Em Rivendell ocorre “The Council of Elrond” (Conselho de Elrond), realizado
na presença de personagens importantes que representam todos os povos livres da
Middle-earth. Nesse Conselho são prestados esclarecimentos a todos os presentes sobre
a situação atual: o aumento do poder de Sauron, a traição de Saruman, a natureza
maligna do Anel, bem como a necessidade de destruí-lo. A decisão tomada pelo
Conselho é a de que the One (o Um) deve ser destruído. Para isso, o objeto deverá ser
levado até Mount Doom (a Montanha da Perdição), no coração da terra de Mordor, o
reino do Inimigo. Surge então um impasse sobre quem seria o encarregado dessa terrível
missão. Porém, existe ainda uma difícil questão a respeito dessa jornada, pois a tarefa de
destruir o anel não poderia ser atribuída a contragosto, mas ser assumida de livre
vontade. De fato, personagens poderosos, como o mago Gandalf, recusam-se a carregar
esse fardo, com medo de que sejam corrompidos pelo poder do Anel e se transformem
em um novo Senhor do Escuro.
Esse impasse é resolvido quando Frodo se prontifica a levar o Anel para Mordor.
Além de Frodo, mais oito personagens se oferecem para ajudar na realização da difícil
empresa, formando-se, assim, uma comitiva formada por nove membros: Gandalf, o
mago; Strider, agora revelado como Aragorn, herdeiro do trono de Gondor; Boromir,
filho do regente de Gondor; o elfo Legolas; o anão Gimli; e os hobbits Frodo, Sam,
Pippin e Merry. O número nove, aliás, possui um significado especial, já que indica a
contraposição da “Sociedade do Anel” aos nove Cavaleiros Negros de Sauron.
A comitiva segue para o sul, viajando com muito cuidado e prevenindo-se contra
o assédio de lobos e pássaros espiões. A travessia das Misty Mountains (Montanhas
Sombrias) impõe-lhes uma escolha difícil que resulta, ao final da passagem pelas Minas
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de Moria – um antigo reino dos anões – no desaparecimento de um dos membros mais


importantes da comitiva: o mago Gandalf. Após a saída de Moria, ainda perseguidos por
orcs, os membros da comitiva buscam refúgio em Lothlórien, a floresta habitada por
elfos, onde, após uma primeira acolhida pouco amigável, são bem recebidos pelos
governantes Celeborn e a senhora élfica Galadriel.
Após um tempo de descanso em Lothlórien, a comitiva retoma sua jornada
através do grande rio Anduin. Essa viagem através do rio foi possível graças aos
pequenos barcos presenteados pelos elfos e possibilitou adiar a decisão sobre qual
caminho seguir, já que o grupo se dividia entre seguir direto para Mordor, escolhendo
um dos lados da margem do rio, ou passar primeiramente por Minas Tirith, capital de
Gondor, localizada na outra margem do rio.
Quando a decisão se torna inadiável, o grupo pára mais uma vez e deixa a
escolha ao encargo do portador do Anel. Frodo afasta-se do grupo por alguns instantes,
mas é surpreendido por Boromir, que tenta arrebatar-lhe o objeto de poder. Convencido
de que a presença do Um em meio à comitiva já lhes trazia problemas, ele decide-se a
partir para Mordor acompanhado apenas de Sam e atravessando o Anduin. A parte do
grupo que havia ficado naquela margem do rio é atacada por orcs uruk-hai, enviados
pelo mago traidor, Saruman. Boromir arrepende-se de ter tentado tomar o Anel de seu
portador, mas encontra uma espécie de remissão de sua culpa ao morrer tentando
proteger os hobbits Merry e Pippin, que, a despeito de todos os esforços, são levados
pelos seqüestradores. Assim, termina o Livro II e The Fellowship of the Ring (a
Sociedade do Anel) é desfeita.
No Livro III são narradas as peripécias de Merry e Pippin, que foram
seqüestrados pelos orcs de Saruman, e as vividas por Aragorn, Legolas e Gimli (que
tentarão salvá-los). Após a realização do funeral de Boromir, cujo corpo é enviado rio
abaixo em um dos barcos presenteados por Galadriel e Celeborn, os três membros
restantes da comitiva partem em socorro dos hobbits. Enquanto seguiam o rastro dos
orcs que haviam seqüestrado seus amigos, as três personagens encontram um grupo de
cavaleiros vindos de Rohan, conhecida também como Riddermark (Terra dos
Cavaleiros), e liderados por Éomer. Através destes são informados sobre a guerra entre
Rohan e Isengard e, também, que um grupo de orcs de Saruman havia sido dizimado
pelos Cavaleiros em um combate durante a noite anterior; porém nenhum hobbit fora
encontrado durante o conflito. Os três viajantes recebem dois cavalos como uma forma
de ajuda de Rohan.
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No capítulo seguinte descobre-se que, durante o a batalha, Merry e Pippin


haviam conseguido escapar dos orcs, refugiando-se na misteriosa floresta de Fangorn,
onde se encontram com o ent chamado Treebeard, uma criatura semelhante a uma
árvore, mas que podia se mover e falar. Durante esse encontro, os dois hobbits tomam
uma bebida que os fará crescer mais que um hobbit normal. O ent fala muito sobre a sua
função de pastor de árvores, sobre sua língua e sobre as mudanças ocorridas em tempos
recentes. Então, alarmado por algumas notícias dadas pelos hobbits, ele decide convocar
o Entmoot, uma reunião com todos os ents da floresta para decidirem como reagir à
traição de Saruman, que também atacava a floresta. O Entmoot foi deveras demorado,
visto que a língua dos ents “is a lovely language, but it takes a very long time to say
anything in it” (TOLKIEN, 1966c, p. 66), mas Saruman foi reconhecido como traidor e
os pastores de árvores decidem atacar Isengard.
Enquanto isso, Aragorn, Legolas e Gimli investigam a região da batalha entre
Cavaleiros e orcs em busca de algum sinal de Merry e Pippin. Além disso, preocupam-
se com a aparição de um velho vestido de branco na noite anterior e hesitam em entrar
na misteriosa floresta de Fangorn.
Pouco tempo após penetrar os domínios da floresta, eles se deparam com outra
figura do velho vestido de branco e surpreendem-se ao reconhecer nele Gandalf. O
mago faz um relato de sua batalha contra o Balrog e fala de como fora reenviado a
Middle-earth para terminar sua missão, desta vez sob a forma de mago branco,
incorporando aquilo que Saruman havia representado. Também tranqüiliza os três
amigos sobre o destino dos hobbits, assegurando-lhes que os pequenos estariam em
segurança. Por fim, os quatro decidem partir para Rohan, de onde a guerra se
aproximava e a presença deles seria mais urgente.
A recepção dos quatro viajantes na Terra dos Cavaleiros é hostil e eles são, num
primeiro momento, impedidos de entrar na cidade para ver o rei. Essa hostilidade é
atribuída à grande influência que o conselheiro Gríma Wormtongue exerce sobre o rei
de Rohan. Posteriormente é revelado que Gríma é, também, um servo de Saruman e que
seus maus conselhos dados ao rei Théoden são uma forma de satisfazer aos desígnios do
mago traidor.
Depois que conseguem entrar na cidade e falar com o rei, Gandalf desmascara o
falso conselheiro e Théoden reassume sua vitalidade e o comando de seu reino. Gríma é
expulso de Rohan e cavalga sozinho até Isengard, onde se junta ao seu verdadeiro
senhor. Théoden, então, recebe as notícias das intenções de Saruman, que estava
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reunindo um grande exército e em breve atacaria a Terra dos Cavaleiros. Diante dessa
situação, o rei decide levar seu povo até Helm’s Deep (Abismo de Helm), onde existia
uma fortaleza, na qual os Cavaleiros nunca tinham sido derrotados. Gandalf se separa
do grupo dizendo ter outra missão urgente a cumprir. Éowyn, sobrinha de Théoden,
expressa seu desejo de se juntar aos guerreiros e lutar na guerra contra Saruman. Mas
seu pedido não é atendido e ela recebe a missão de levar o seu povo em segurança,
especialmente as mulheres e as crianças, até as proximidades de Helm.
A chegada aos portões da fortaleza é apressada e a batalha contra os exércitos de
Isengard logo se inicia. Depois de um longo tempo de combate, quando as esperanças já
estavam diminuídas, Gandalf retorna acompanhado de Éomer e seus cavaleiros e, por
fim, Rohan consegue derrotar seus inimigos, com a ajuda de misteriosas árvores que
apareceram, de repente, perto do campo de batalha e que, mais tarde, também
desaparecem do local.
Após a batalha, o grupo viaja para Isengard e a encontra destruída, em grande
parte pela ação do próprio Saruman que a transformara em uma cópia de Mordor, e
também, pelo ataque dos ents à cidade. Próximo às ruínas de Isengard, os viajantes se
reencontram com Merry e Pippin, e Théoden maravilha-se ao avistar os hobbits, pois os
conhecia apenas de lendas. Durante a noite, o grupo de guerreiros que saíra do Abismo
de Helm ouve a narração dos eventos envolvendo os hobbits, os ents e o ataque a
Isengard.
No dia seguinte, o grupo de Gandalf prepara-se para uma última visita a
Saruman, que ficara refugiado em Orthanc, uma enorme torre no centro de Isengard.
Conforme Gandalf avisa, o mago traidor ainda dispõe de uma arma extremamente
ameaçadora: sua voz. E, quando se dá o encontro, o grupo de ouvintes escapa por pouco
de ser convencido pelas palavras de Saruman, que se mostra de fato um “corrupter of
men’s hearts” (TOLKIEN, 1966c, p. 204). Depois disso, Gandalf expulsa Saruman da
ordem dos magos e de sua torre, quebrando-lhe o cajado e tomando as chaves de
Orthanc. Então, Gríma, enfurecido, atira o palantír pela janela procurando atingir algum
dos guerreiros que lá estavam, mas seu gesto apenas revela o meio de comunicação
entre Sauron e Saruman.
Assim, os viajantes descobrem que havia um vínculo entre Isengard e Mordor,
que era mantido através daquele objeto semelhante a uma bola de vidro, chamada
palantír. Embora Gandalf esconda o palantír, Pippin não resiste à curiosidade e rouba o
objeto do mago para examiná-lo com mais cuidado. Dessa forma, o hobbit se revela ao
16

Senhor das Trevas e Gandalf, preocupado, entrega o palantír a Aragorn e parte a cavalo
para Minas Tirith, levando Pippin consigo. Assim termina o Livro III de The Lord of the
Rings.
O Livro IV é relativamente mais estático em relação ao anterior, contendo um
número menor de eventos, e a história se volta novamente para Frodo e Sam, pouco
após a sua separação do restante do grupo. Perdidos em uma árida cadeia de montanhas,
eles são seguidos por Gollum, que acaba por convencer os hobbits de que pode guiá-los
até os portões de Mordor, o que faz sob um juramento de fidelidade feito em nome do
Anel.
A viagem até o portão norte da terra de Sauron é tensa e cheia de desconfianças
quanto ao guia. Sam se mostra especialmente hostil a Gollum, enquanto Frodo parece se
reconhecer na figura atormentada que agora os serve. Além de compartilhar de um
sentimento parecido em relação ao Anel, certas semelhanças físicas deixam claro que
Gollum foi outrora um hobbit, tendo sido gradualmente deformado nos séculos
passados nas escuras e úmidas profundidades da montanha onde viveu em companhia
de seu Precious (Precioso).
Ao chegarem a Mordor, deparam-se com uma entrada fortemente vigiada, o que
os obriga a seguir por um outro caminho, conhecido por Gollum. Seguindo pelas
encostas das montanhas que rodeavam Mordor, os três viajantes são surpreendidos por
um grupo de homens de Gondor, liderados por Faramir, irmão de Boromir. Os hobbits
são capturados, mas Gollum consegue escapar. Faramir descobre a missão de Frodo,
mas não tenta tomar o Anel para si, o que propicia uma relação mais amigável entre os
hobbits e os homens.
Retomando sua jornada, Gollum guia Frodo e Sam até uma passagem por dentro
da montanha – um escuro túnel onde morava a gigantesca aranha Shelob. Ela consegue
atacar o portador do Anel, injetando-lhe um veneno que o deixa imobilizado. Sam, por
sua vez, enfia a espada no ventre de Shelob, que foge para as profundezas do seu
esconderijo. Pensando que seu mestre havia morrido, o fiel amigo de Frodo toma para si
o Anel, com o objetivo de completar a demanda. Quando surgem alguns orcs, Sam se
esconde e ouve deles que, afinal, Frodo ainda vivia. Sam inicia então sua tentativa de
resgate de Frodo. Assim termina o Livro IV.
No Livro V a narrativa volta, mais uma vez, para os outros membros da comitiva
que saíra de Rivendell. Gandalf e Pippin, que ao final do Livro III haviam se separado
do restante do grupo, chegam a Minas Tirith, onde se apresentam ao regente Denethor e
17

Pippin oferece os seus serviços ao reino de Gondor. O diálogo entre Gandalf e Denethor
é tenso, e Gandalf passa a desconfiar que havia outro palantír no palácio de Minas
Tirith. Depois disso, parte a procura de Faramir e retorna preocupado. Pippin permanece
na cidade.
Enquanto isso, o exército de Théoden e os outros membros da comitiva se
dirigem para Minas Tirith. Durante a viagem, Aragorn olha dentro da pedra de Orthanc
e mostra-se a Sauron, que o teme, reconhecendo-o como herdeiro daquele que um dia
foi capaz de derrotá-lo. Depois do confronto através do palantír, Aragorn decide tomar o
caminho conhecido como The Paths of the Dead (as Sendas dos Mortos), conforme lhe
indicavam as profecias referentes ao futuro rei de Gondor. Juntamente com Legolas,
Gimli e mais trinta cavaleiros vindos do norte, atravessa a Senda e convoca os mortos
para que os ajudem na luta contra Mordor.
Merry oferece os seus serviços a Rohan, tornando-se um guerreiro daquele reino
e caminhando para Minas Tirith ao lado do rei. Ao chegarem ao Templo da Colina,
encontram-se com Èowyn, vestida como um cavaleiro, mas sem poder ir à batalha. No
dia seguinte o sol não brilhou, pois Mordor havia encontrado um modo de encobri-lo
com nuvens escuras. Isso faz com que os Cavaleiros de Rohan se apressem para a luta.
Quando Merry é impedido de ir à guerra, um cavaleiro (Éowyn) oferece-se para levá-lo.
Em Minas Tirith, Denethor mostra-se muito aborrecido, dizendo que, dos dois
filhos, preferia ter perdido Faramir a Boromir, pois este lhe teria trazido o Anel. Faramir
é mandado novamente à batalha e retorna desacordado. Denethor, sem esperanças, vê na
possível morte do filho o fracasso da casa dos regentes. Ele decide incinerar-se e manda
que se faça uma pira para ele e para o filho. Enquanto Denethor é consumido pelas
chamas, Pippin consegue a ajuda de um soldado de Gondor e salva Faramir de ser
queimado vivo.
A cidade está cercada pelos exércitos de Mordor, quando chegam os Cavaleiros
de Rohan para ajudar a defendê-la, e, com eles, dissipa-se a escuridão. Durante a
batalha, Théoden cai sob seu cavalo, ficando mortalmente ferido. Éowyn e Merry
acorrem para salvá-lo do Senhor dos Cavaleiros Negros. Embora estivesse convencido
de sua invencibilidade (já que não poderia ser morto por homem algum), o nâzgul acaba
trespassado por Éowyn, morrendo assim pela mão de uma mulher. No momento de
maior desespero chegam Aragorn e sua companhia de espíritos das Sendas dos Mortos,
contribuindo decisivamente para o resultado da batalha.
18

Aragorn, o rei que cura, consegue o restabelecimento de Éowyn, Merry e


Faramir. Para aumentar as chances de Frodo, distraindo a atenção do inimigo, um
pequeno exército parte de Minas Tirith rumo ao portão negro de Mordor. O Livro V
termina com o início da batalha diante dos portões da terra de Sauron e o aparecimento
das águias auxiliando os povos livres.
No Livro VI, a narrativa retorna para Sam, que consegue resgatar Frodo com a
ajuda do Anel. O caminho até Mount Doom, onde o Anel seria destruído, é marcado
pela preocupação com água e comida. Frodo, sob o efeito do Anel, mostra-se
especialmente abatido e os hobbits percebem que estão sendo perseguidos por Gollum.
Quando finalmente chegam à montanha, Frodo decide que não iria destruir o Anel e o
põe no dedo. Gollum aparece e arranca a dentadas o dedo e o Anel de seu possuidor.
Porém, empolgado com a posse do Precioso, ele escorrega e cai para dentro do fogo da
montanha, destruindo, assim, a arma de Sauron.
Com a destruição do Anel o seu Senhor também é derrotado, caindo assim a
Torre de Barad-Dûr, de onde ele governava. Seguiu-se um grande terremoto, o que fez
com que os soldados de Sauron se dispersassem e terminasse a batalha. Frodo e Sam
foram resgatados pelas águias. Aragorn foi coroado rei de Gondor, e os quatro hobbits
puderam voltar para o Shire.
Contudo, o Shire havia sido tomado, destruído e era agora dominado por uma
figura chamada Sharkey. Merry, Pippin, Frodo e Sam lideram, então, uma revolta pela
libertação de sua terra e descobrem que o inimigo dominador era Saruman,
acompanhado de Gríma. Quando se preparava para partir, Saruman é atacado e morto
por Wormtongue, que, por sua vez, é ferido fatalmente por uma flecha hobbit.
Inicia-se a partir daí o processo de recuperação do Shire. Frodo, porém, ainda
sofre com o ferimento que recebera de um dos Cavaleiros Negros e também pelo longo
tempo que carregou o Anel. Por isso, ele é convidado a deixar Middle-earth, juntamente
com Gandalf, Bilbo (que também foi portador do Anel por longos anos) e os elfos,
dirigindo-se para um lugar onde poderia encontrar algum alívio para seu sofrimento. A
narrativa de The Lord of the Rings termina, então, com a despedida de Frodo dos seus
amigos e sua partida de Grey Havens (Portos Cinzentos).
Note-se que, apesar da demanda ter sido cumprida, o final da principal obra de J.
R. R. Tolkien é fortemente marcado pela perda da principal personagem, o que
acrescenta um tom melancólico à obra.
19

O longo resumo do enredo que apresentamos acima torna-se necessário para o


estudo central de nossa pesquisa. Sua importância se dá tanto para a tentativa de
classificação de acordo com os gêneros literários e a abordagem do tema aqui proposta,
quanto para a determinação de um juízo de valor referente ao texto.

O Mal e a Morte em The Lord of the Rings

A discussão sobre o Mal na principal obra tolkieniana parte de duas questões


principais:
1. Qual é a natureza do Mal?
2. Qual é a sua origem?

Patrick Curry, em Defending Middle-Earth, aponta que Tolkien recebeu várias


críticas devido a esse problema e, como exemplo, cita a opinião de Robert Giddings:

The evil in the world as portrayed by Tolkien has nothing whatever to do


with social or economic causes. It is evil, pure and simple. Consequently
there is no need for change of socio-economic conditions, the environmental
conditions of life, relations between different classes, etc., etc. – all these
things which make up the very fabric of a society, of any society, are
perceived by Tolkien as totally beyond any need or possibility of change.
(GIDDINGS apud CURRY, 1998, p.100)

Curry, que analisa exatamente as questões relacionadas à política, meio


ambiente, cultura e sociedade em The Lord of the Rings, discorda de Giddings,
afirmando que o Mal, como retratado por Tolkien, possui, sim, seus desdobramentos em
todas as esferas mencionadas, o que lhe infunde uma certa complexidade. Para o autor,
porém, a existência do Mal atuando sobre diversas áreas não é algo que possa ser
completamente eliminado, pois, por mais que se identifique e combata a sua existência,
não se pode prevenir que ele venha a ressurgir sob outra forma. Assim, Curry entende o
Mal na obra tolkieniana como um problema sem solução permanente, mas não explora
as questões relacionadas à sua natureza ou sua causa.
Tom Shippey em The Road to Middle-Earth (2003) e J. R. R. Tolkien: author of
the century (2000) aborda de forma mais objetiva a questão sobre a natureza do Mal na
20

principal obra do professor de Oxford. Sua análise se detém sobre três elementos: a
Sombra (Shadow), os Espectros do Anel (the Ringwraiths) e, por fim, o Anel. Para
Shippey, a natureza do Mal, conforme demonstrada em The Lord of the Rings, é
ambígua, adaptando-se simultaneamente às visões do Mal de Boécio e dos
Maniqueístas.
Shippey explica que Boécio foi um político e filósofo romano para quem “there
is no such thing as evil: ‘evil is nothing’, is the absence of good, is possibly even an
unappreciated good” (SHIPPEY, 2003, p.140). Este conceito é ilustrado pela imagem da
Sombra, constantemente evocada durante a obra e que, por vezes se torna a própria
representação do Mal, ou mesmo de Sauron, pois, da mesma forma que a sombra é a
mera ausência de luz, o Mal é apenas a ausência do Bem. Em outras palavras, o Mal não
existiria, de fato, e tudo aquilo que é identificado com ele seria o resultado do
afastamento daquilo que é Bom. O Mal não poderia ser criado ou criar-se a si próprio,
mas seria antes o resultado do livre arbítrio de se afastar do Bem, como fizeram Lúcifer
ou Adão e Eva, na mitologia cristã.
Essa visão é afirmada várias vezes durante a obra, como por exemplo, quando
Frodo diz que:

The Shadow that bred them [orcs] can only mock, it cannot make: not real
new things of its own. I don’t think it gave life to the orcs, it only ruined
them and twisted them; and if they are to live at all, they have to live like
other living creatures. Foul waters and foul meats they’ll take, if they can get
no better, but not poison. (TOLKIEN, 1966d, p. 201)

Ou quando Elrond afirma: “For nothing is evil in the beginning. Even Sauron was not
so” (TOLKIEN, 1966b, p. 300).
A Sombra é mencionada logo no início do primeiro volume, em referência à
terra de Mordor, no verso: “In the Land of Mordor where the Shadows lie” (TOLKIEN,
1966b, p. vii). Contudo, mesmo sob a terrível sombra do inimigo, Sam consegue
encontrar algum consolo ao olhar uma estrela:

[…] There, peeping among the cloud-wrack above a dark tor high up in the
mountains, Sam saw a white star twinkle for a while. The beauty of it smote
his heart, as he looked up out of the forsaken land, and hope returned to him.
21

For like a shaft, clear and cold, the thought pierced him that in the end the
Shadow was only a small and passing thing: there was light and high beauty
for ever beyond its reach. (TOLKIEN, 1966d, p.211)

Essa passagem nos dá elementos que corroboram a idéia de Shippey sobre o Mal
de acordo com a perspectiva de Boécio: o Mal corresponde à ausência do Bem da
mesma forma que a sombra é resultado da ausência de luz. Porém, para o comentador, a
obra tolkieniana também oferece subsídios para uma outra abordagem do problema: a
visão maniqueísta. Segundo essa vertente, o Mal teria uma existência própria e efetiva,
ao invés de constituir-se apenas como ausência do Bem. Dessa forma, Bem e Mal
seriam forças opostas e de grandezas equivalentes agindo sobre o universo; e, sendo o
Mal uma força externa ao indivíduo, este pode resistir a ela ou até mesmo combatê-la.
Como se pode notar, Boécio e os maniqueístas apresentam idéias opostas sobre o
Mal, mas ambas encontram-se fundidas na obra de J. R. R. Tolkien de modo a criar uma
visão paradoxal, mas ao mesmo tempo, complementar sobre o problema.
Os Ringwraiths podem ser considerados um símbolo dessa dupla visão sobre o
Mal. Shippey aponta a palavra wraith como um problema filológico, uma palavra de
origem incerta e com significados contraditórios. O autor cita duas definições para
wraith: “an apparition or spectre of a dead person: a phantom or ghost” ou “an
immaterial or spectral appearance of a living being” (SHIPPEY, 2003, p.148). Diante
dessas duas definições, surge a questão: Wraith refere-se a um ser vivo ou morto? Da
mesma forma, poder-se-ia perguntar se o Mal existe ou se é apenas a ausência do Bem.
Essas duas visões contraditórias encontram a sua materialização no Anel. O
estudioso explica que para entender a demanda de Frodo é necessário aceitar três
condições sobre a existência do Anel:

First [...] the Ring is immensely powerful, in the right or in the wrong hands.
[…] Second […] the Ring is deadly dangerous to all its possessors: it will
take them over, ‘devour’ them, ‘possess’ them. […] The Ring turns
everything to evil, including its wearers. There is no one who can be trusted
to use it, even in the right hands, for good purposes: there are no right hands,
and all good purposes will turn bad if reached through the Ring. […] But
finally […] the Ring cannot simply be left unused, put aside, thrown away: it
has to be destroyed, and the only place where it can be destroyed is the place
of its fabrication, Orodruin, the Cracks of Doom. (SHIPPEY, 2000, p. 113–
114)
22

Dessas três idéias fundamentais, Shippey assinala um ponto que particularmente


entra em choque com a época heróica que Tolkien procura resgatar em sua obra (mas,
longe de considerar a mistura de elementos antigos com idéias contemporâneas um
defeito na escrita tolkieniana, Shippey a vê como um dos principais modos de
atualização das formas antigas, que Tolkien tanto prestigiava). O aspecto da obra de
Tolkien que contrasta com o mundo heróico teria sido aventado pela primeira vez em
1887 por Lord Acton, segundo o qual, “Power tends to corrupt, and absolute power
corrupts absolutely. Great men are almost always bad men...” (apud SHIPPEY, 2000,
p. 115).
A idéia de que o poder corrompe não condiz com o mundo das epopéias e relatos
míticos, mas seria, ao contrário, uma concepção tipicamente moderna. Contudo, ela não
teria a suficiente potência para subjugar o indivíduo, pois, para corromper-se, este
deveria primeiro desejar o poder, logo, afastando-se por vontade própria do Bem –
aspecto condizente com a visão de Boécio. Porém, o fato de que não se pode escapar da
ação do Anel, aproxima-o da noção maniqueísta do Mal, atribuindo-lhe um papel ativo
na corrupção das personagens.
A própria natureza do Anel é ambígua. Por um lado, ele pode ser considerado
apenas como um objeto de poder, uma espécie de arma, manipulável por qualquer um
que tiver poder e capacidade suficiente. Por outro, o Anel é capaz de devorar a mente de
quem o possui, usando e manipulando esse portador como veículo para retornar junto
àquele que o forjou. De suas estratégias faz parte até a traição de seu possuidor. Assim,
por exemplo, ele levou Isildur à destruição e utilizou-se de Gollum para esconder-se por
longo tempo e, quando surgiu o momento de poder retornar a Sauron, descartou
Gollum, escapando de suas mãos.
Para Shippey, se não fosse essa ambigüidade acerca da natureza do Mal em The
Lord of the Rings, a demanda seria cumprida de modo muito mais simples:

If evil was just the absence of good, then the Ring could never be more than
psychic amplifier, and all the characters would need to do would be to put it
aside, perhaps give it to Tom Bombadil: in Middle-earth we are assured that
would be fatal. Conversely, if evil were only an external force without echo
in the hearts of the good, then someone might have to take it to Orodruin,
but it would not need to be Frodo: Gandalf could take it or Galadriel, and
whoever did so would have to fight only with their enemies, not their friends
or themselves. (SHIPPEY, 2000, p. 142)
23

Assim, a natureza dupla do Mal e do Anel se torna uma condição necessária para
o desenvolvimento coerente da narrativa. Todavia, diante dessa dualidade, não é
possível para Shippey estabelecer uma causa para o Mal. Além disso, outro elemento
parece não ter sido considerado pelo autor: a capacidade do Anel de prolongar a vida de
quem o possui.
Rose A. Zimbardo, em seu ensaio intitulado “Moral Vision in The Lord of the
Rings” (2004), adota uma visão do Mal que se assemelha à perspectiva de Boécio, mas
acrescenta ainda mais um elemento:

Evil in the romance vision is not an aspect of human nature but rather is the
perversion of human will. It results when a being directs his will inward to
the service of the self rather than outward to the service of the All. The
effect of such inversion is the perversion of nature, both man’s nature and
the greater nature of which it is a part. (ZIMBARDO, 2004, p.69)

O tópico apontado por Zimbardo é a oposição entre o self e o Todo (All). Para a
estudiosa, a harmonia do universo depende da vontade de cada indivíduo de se dedicar
ao Todo. Porém, quando esse indivíduo decide se elevar sobre o Todo, ele provoca o
Mal: “the rejection of the other and subjection of the All to the self, is the ultimate
negative power” (ZIMBARDO, 2004, p.73).
Uma proposta semelhante pode ser lida em Os arquétipos literários de E. M.
Meletínski (1998), quando o autor reflete acerca do embate entre o Bem e o Mal nos
mitos e nos contos populares:

A idéia corrente de que nos mitos e particularmente nos contos maravilhosos


se desencadeie o embate entre o bem e o mal é uma simplificação muito
grande e, em princípio, indevida. Trata-se antes, desde o começo, da
contraposição ‘próprio’/‘alheio’, ‘caos’/‘cosmos’. (MELETÍNSKI, 1998,
p.107)

Pode-se notar, aqui, uma semelhança entre as oposições próprio/alheio e self/All.


Em The Lord of the Rings essas oposições estão presentes de modo especialmente
24

evidente, um vez que a grande ambição de Sauron é subjugar os povos livres de Middle-
earth, ampliando os seus domínios em detrimento da liberdade dos outros. Em
contrapartida, as personagens centrais do romance lutam para manter a sua autonomia e
liberdade. Note-se que somente a luta pela defesa do “próprio” – que não significa
apenas o indivíduo, mas pode abranger todo o seu clã, tribo ou povo – é colocada
positivamente no romance, e qualquer coisa que ofenda a esse princípio, como as hostes
agressoras de Sauron e Saruman, são encaradas como o Mal. A contraposição entre o
“caos” e o “cosmos” é menos visível, contudo, pode ser identificada nos terríveis
monstros Balrog e Shelob, além do regente Denethor, cuja loucura, acarretada pela
suposta morte do filho, é o motivo do trágico episódio que termina com a sua própria
incineração.
Sobre a natureza do Mal e o que o origina, vimos até agora os efeitos do Poder e
o anseio de um indivíduo se sobrepor a outro. Contudo, deve-se considerar ainda outro
elemento fundamental. Esse elemento é tido por J. R. R. Tolkien como tema
fundamental de sua obra, conforme exposto em uma de suas cartas:

Mas devo dizer, caso perguntado, que a história não é realmente sobre Poder
e Domínio: isso apenas mantém as rodas girando; ela é sobre a Morte e o
desejo pela imortalidade. Que não mais é do que dizer que esta é uma
história escrita por um Homem! (TOLKIEN, 2006, p. 250)

A morte e a busca pela imortalidade, tomadas como tema central de The Lord of
the Rings, revelam o princípio gerador de todos os eventos narrados, além de ser o
ponto de partida para o esclarecimento de várias personagens, como, por exemplo, os
Nazgûl, antigos reis que se submeteram a Sauron em troca de poder e imortalidade,
transformando-se, porém em meros fantasmas, fantoches do grande inimigo. Dessa
forma, pode-se compreender o outro motivo pelo qual o Anel é cobiçado: pela sua
capacidade de prolongar a existência ou, nas palavras de Rose A. Zimbardo, “It arrests
time” (2004, p.74).
Essa capacidade de deter o tempo não é exclusividade do Anel Governante.
Deve-se considerar que isso também é possível para os três anéis concedidos aos elfos.
É esse poder que mantém e protege, por exemplo, Rivendell e Lothlorien. Todavia, o
poder desses três anéis também está subordinado ao poder do Um, o que os tornará
25

inúteis após a destruição deste. No trecho seguinte, retirado de uma de suas cartas,
Tolkien explica a relação dos anéis élficos e o desejo de deter as mudanças naturais
provocadas pelo tempo:

Uma mera mudança como tal não é obviamente representada como


“maligna”: é o desdobramento da história, e recusar isso é obviamente
contra o desígnio de Deus. Mas a fraqueza Élfica é nesses termos
naturalmente lamentar o passado e tornar-se relutante em enfrentar as
mudanças: como se um homem odiasse um livro muito longo ainda em
andamento e desejasse estabelecer-se em um capítulo favorito. Por essa
razão caíram até certo ponto nos artifícios de Sauron: desejavam um certo
“poder” sobre as coisas tal como são (o que é bastante distinto da arte), para
tornar efetiva sua vontade particular de preservação – capturar a mudança e
manter as coisas sempre novas e belas. (TOLKIEN, 2006, p. 227 – grifo do
autor)

Porém, apenas a vontade de preservar o mundo de qualquer mudança não é


motivo suficiente para torná-los maus. Os elfos não desejavam tomar o mundo para si,
nem subjugar a vontade dos outros seres. Com a destruição do Um, todas as suas
tentativas de preservação foram despedaçadas e pouco sobrou em Middle-earth que
pudesse satisfazer os seus anseios.
Em The Lord of the Rings, deter o tempo é considerado sempre algo ruim,
antinatural. Essa opinião é expressa pelo povo de Shire logo no início da obra, quando
se observa o modo como a aparência de Bilbo permaneceu inalterada ao longo dos anos:

And if that was not enough fame, there was also his prolonged vigour to
marvel at. Time wore on, but it seemed to have little effect on Mr. Baggins.
At ninety he was much the same as at fifty. At ninety-nine they began to call
him well-preserved; but unchanged would have been nearer the mark. There
were some that shook their heads and thought this was too much of good
thing; it seemed unfair that anyone should possess (apparently) perpetual
youth as well as (reputedly) inexhaustible wealth.
‘It will have to be paid for,’ they said. ‘It isn’t natural, and trouble will
come of it!’ (TOLKEIN, 1966b, p. 21 – grifo do autor)

Uma relação direta entre o Mal e a Morte é feita por Terry Eagleton em
Depois da Teoria. No início do último capítulo de seu estudo, “A morte, o mal e o não-
ser”, o pesquisador trata da natureza da existência humana difusa e indefinida: “A
consciência humana não é uma coisa em si, mas só é definível em termos daquilo para o
26

que olha ou daquilo que pensa. Em si mesma, é inteiramente vazia” (EAGLETON,


2005, p.281). Além disso, a essência do humano, como ser histórico, estaria em
constante processo de formação, em um eterno vir a ser, sem que exista em sua
plenitude.
O pesquisador ainda ressalta o acaso dessa existência e a possibilidade de que o
mundo e o homem pudessem simplesmente não existir, visto que não há nada que torne
essa existência necessária. Por isso, ele diz:

Aceitar a falta de bases para nossa existência significa, entre outras coisas,
viver à sombra da morte. Nada ilustra mais graficamente quão
desnecessários somos do que nossa mortalidade. Aceitar a morte seria viver
mais plenamente (EAGLETON, 2005, p.284).

É nessa difícil relação com a morte que se encontra a origem do mal, pois é ela
que nos mostrará a natureza indomável da vida humana e a não aceitação da morte
levará ou à busca da segurança absoluta do nada ou a uma tentativa de negar esse nada,
o não-ser. Assim, Eagleton define duas formas do Mal, sendo a primeira a negação do
ser, que

é uma paródia satânica do divino, encontrando no ato da destruição a espécie


de liberação orgástica que se pode imaginar Deus tenha encontrado no ato
da criação. É o mal como niilismo – uma explosão de riso sarcástico ante a
suposição solene e farsesca de que qualquer coisa meramente humana
pudesse alguma vez ter qualquer importância. [...] É uma fúria violenta e
vindicativa contra a existência em si mesma. (EAGLETON, 2005, p.291)

A segunda forma seria o oposto da primeira, ou seja, a tentativa de destruir o


não-ser, encarando-o como “uma ameaça inominável à integridade da individualidade”
(EAGLETON, 2005, p.291). Tal ameaça sem forma ou identidade cria a necessidade de
atribuir um nome para essa força assustadora, um fardo que, para Eagleton, costuma ser
atribuído às minorias, como judeus, árabes, homossexuais, etc.

Isso é o Mal como visto do ângulo daqueles que têm uma superabundância
de ser, mais do que uma insuficiência dele. Não podem aceitar a inominável
verdade de que a matéria viscosa e contagiosa contra a qual guerreiam,
longe de ser estranha, está tão perto deles quanto respirar. (2005, p. 292)
27

Note-se que há um paralelo entre as análises de E. M. Meletínski, de Terry


Eagleton e, em certa medida, de Rose A. Zimbardo. A negação do ser e a fúria contra a
existência, tal como as encontramos em Tolkien, são comparáveis ao princípio de
oposição entre “caos” e “cosmos”, conforme sugerido pelo crítico russo. Logo, à
tentativa de destruição do não-ser, visto como ameaça à individualidade, pode-se
comparar a contraposição entre “próprio” e “alheio” ou entre “self” e “All”.
Como dito anteriormente, há em The Lord of the Rings a predominância da
segunda manifestação da maldade. Pode-se notar em Sauron, o grande arquétipo do
Mal, o mesmo processo descrito por Eagleton sobre a relação entre o ser e a morte. A
despeito de sua natureza de divindade e de sua vida ter se prolongado desde o princípio
dos tempos, no final da Terceira Era ele não passa de uma figura enfraquecida, que
sequer pode assumir uma forma física. Logo, a busca pelo Anel, o qual abriga parte de
sua essência, não é simplesmente equivalente à procura por uma arma de guerra ou um
instrumento de dominação; é a busca por sua completude, um modo de se definir como
ser e afastar a possibilidade iminente de seu apagamento completo. Os povos livres de
Middle-earth, por não se submeterem a sua vontade, são então identificados com a força
assustadora do não-ser.
Rose A. Zimbardo ressalta o modo como Sauron é mostrado em The Lord of the
Rings: “The Ring is all that we see of Sauron because Sauron has no other identity but
that for which the Ring stands. He has only negative identity. He is a dark shadow, the
negation of positive being itself” (ZIMBARDO, 2004, p. 73). Note-se que a autora
também destaca a identificação de Sauron com a Sombra, remetendo, dessa forma, às
visões do Mal, conforme propostas por Tom Shippey. Desse modo, reafirma-se a visão
paradoxal do Mal, pois Sauron, como um wraith, pode ser uma entidade
simultaneamente viva e morta – capaz de realizar suas próprias ações, como vivo, mas
incapaz de agir diretamente, transformando-se apenas em uma ameaçadora ausência,
como a sombra. Sua luta é para que o seu ser se torne completo e cresça de modo a se
sobrepor ao Todo, e dessa forma, talvez, ele conseguisse se desfazer da ambigüidade
para alcançar a sua realização completa e transformar-se em uma força ativa, o que
resolveria o problema sobre o Mal em The Lord of the Rings em favor da visão
maniqueísta sobre o assunto.
28

Contudo, o enredo não oferece essa solução e a natureza do Mal continua


assentada sobre a combinação paradoxal das visões de Boécio e dos maniqueístas. A
origem do problema surge, em um primeiro momento, do embate entre as forças do
“próprio” e do “alheio” ou do self contra o All. Porém, em uma investigação mais
profunda, constata-se que Tolkien tentou representar um problema essencialmente
humano, inserindo a mais profunda origem para o Mal nos desejos de busca pela
imortalidade e na impossibilidade de alcançá-la, o que resulta na tentativa de ataque ao
não-ser, sempre presente tanto no eu quanto no outro.
Como se pode notar, Tolkien oferece uma visão complexa sobre a relação do
Mal, do Homem e de sua Mortalidade. Porém, essa proposta nem sempre é aceita, e sua
obra é freqüentemente reduzida a leituras mais simples do problema, baseadas na
tentativa de adequar sua leitura a uma determinada interpretação alegórica. Por este
motivo, na próxima seção, serão analisadas algumas dessas formas leituras,
investigando qual delas seria a mais adequada e buscando, assim, a melhor classificação
para o gênero da obra.

The Lord of the Rings e os gêneros literários

Christine Brooke-Rose dedica um capítulo de seu livro A rethoric of the unreal


(1981) à análise da principal obra tolkieniana. Seu ponto de partida são as teorias de
Tzvetan Todorov sobre o maravilhoso e o fantástico, que podem ser distinguidos da
seguinte forma: no universo do maravilhoso os eventos sobrenaturais são aceitos pelos
personagens e pelo leitor sem nenhuma necessidade de explicação ou adequação ao
mundo real; no fantástico, o evento sobrenatural não é completamente aceito, nem
explicado pelas leis da razão ou da natureza, sendo caracterizado, principalmente, pela
dúvida sobre a autenticidade dos eventos relatados. Por fim, a teoria de Todorov se
completa com a noção do estranho, que ocorre quando os acontecimentos supostamente
sobrenaturais são explicados – por motivo de loucura ou uso de drogas, por exemplo –,
perdendo a sua aura de mistério. Em Introdução à literatura fantástica (2007, p. 50),
Todorov nos fornece o seguinte esquema, no qual o fantástico puro seria representado
pela linha do meio do esquema:
29

Estranho Fantástico- Fantástico- Maravilhoso


puro estranho maravilhoso puro

Brooke-Rose situa The Lord of the Rings no campo do puro maravilhoso, ou


seja, onde os elementos sobrenaturais são aceitos sem a necessidade de explicações e
“no surprise is created by the magical elements” (1981, p.235). Além disso, a crítica
também caracteriza a forma da obra em questão como sendo uma quest (busca), ou,
mais especificamente:

it is a heroic quest, and thus akin to both the heroic period (Odissey) and to
the fairy-tale in which the hero goes off on an explicit adventure (to kill a
dragon, rescue a princess, bring back a treasure or a rare or impossible
object), and encounters incarnated adjuvants and opposants. (BROOKE-
ROOSE, 1981, p.235)

Dessa forma, a heroic quest pode ser resumidamente caracterizada como a


narrativa em que o herói empreende uma série de aventuras com vistas a cumprir com
determinado objetivo, após o qual recebe uma recompensa. Contudo, a crítica ressalta
que, em The Lord of the Rings, o principal objetivo do herói é o de perder um objeto
precioso e não de encontrá-lo. Dessa forma, o que se tem é uma inversão da fórmula
tradicional da quest (busca). Essa inversão, porém, não modifica a estruturalmente o
modelo da narrativa, embora altere profundamente o seu significado.
Após a identificação da predominância do maravilhoso na narrativa e da forma
de narrativa utilizada, Brooke-Rose dedica-se a uma análise dos recursos realistas
utilizados por Tolkien em The Lord of the Rings, amparando-se nos quinze
procedimentos do realismo descritos por Philippe Hamon. Desses quinze
procedimentos, destacamos apenas quatro: (1) a descrição, (2) redundância e
previsibilidade, (3) a história paralela, e (4) desfocalização do herói.
O excesso de descrições é apontado como sendo um elemento típico da estética
realista e incomum dentro do gênero maravilhoso. Além disso, contribui para
desacelerar o ritmo da narrativa, tecendo uma série de descrições consideradas
30

desnecessárias pela pesquisadora. Com a expressão “redundância e previsibilidade”,


Brooke-Rose refere-se às indicações de costumes, posição social e atividades diárias,
que também prejudicam o andamento da narrativa sem que contribuam efetivamente
para o desenvolvimento do enredo. Esse tipo de procedimento se evidencia, sobretudo,
nos momentos de repouso, como acontece, por exemplo, em Lothlórien. A opção por
estruturar o enredo de The Lord of the Rings segundo o modelo da narrativa de busca
(quest) suscita as críticas da autora referentes às histórias paralelas, isto é, às partes da
obra que não dizem respeito diretamente à demanda de Frodo. Dessa forma, não apenas
os relatos referentes à Guerra do Anel, que envolvem as outras personagens que
participavam da comitiva, mas também todo o pano de fundo histórico e mítico
construído pelo autor, a estudiosa considera prejudiciais à estrutura do romance,
causando um excesso de informação que dificulta a leitura da obra.
Ao abordar a desfocalização do herói, a autora toca também na questão do
gênero. A superdiferenciação do herói, que provoca uma diminuição do efeito realista, é
um recurso típico das narrativas heróicas, do maravilhoso e do romanesco. Em The Lord
of the Rings, porém, nota-se que Frodo, o portador do Anel, é constantemente deixado
de lado, especialmente quando a narrativa se concentra nas aventuras dos demais
membros da comitiva. Além disso, depois de cumprida a demanda, não é Frodo quem é
glorificado, mas Aragorn, e mesmo após voltar ao Shire, ele é apenas uma figura menor
ao lado dos hobbits guerreiros e crescidos, Merry e Pippin.
O excesso de descrições, inclusive de atividades diárias e costumes, a presença
de uma história paralela, a desfocalização do herói e a criação de um universo
pormenorizado são alguns dos procedimentos realistas que, segundo Brooke-Rose
(1981, p. 254), realmente modificariam o gênero de The Lord of the Rings, fazendo com
que a obra não pertença mais, unicamente, ao maravilhoso. Além disso, a pesquisadora
conclui que os elementos realistas empurram a narrativa para uma interpretação
alegórica, encarando a obra como uma representação figurada da Segunda Guerra
Mundial. Cabe ressaltar que Tolkien sempre negou que seu romance tivesse um objetivo
alegórico, explicando no “Foreword” de The Lord of the Rings que a interpretação
alegórica seria possível, mas limitaria e empobreceria a amplitude e o alcance de sua
obra. Ciente desta declaração do autor sobre sua obra, Brooke-Rose diz:
31

But whatever his intention, the fictional megatext, technically modelled as it


is on the ‘real’ megatext of realistic fiction, produces allegory, precisely
because it can only give ‘the effect of the real’ by analogy, and the realistic
mechanisms encourage the reader to project his megatextual habits onto the
fictional megatext, which is in fact pretty close to mid twentieth-century
history [...] (BROOKE-ROSE, 1981, p.254)

Sobre as tentativas de se interpretar alegoricamente um texto qualquer, Todorov


afirma que

É preciso insistir no fato de que não se pode falar de alegoria a menos que
dela se encontrem indicações explícitas no interior do texto. Senão, passa-se
à simples interpretação do leitor; por conseguinte, não existiria mais texto
literário que não fosse alegórico, pois é próprio da literatura ser interpretada
e reinterpretada infinitamente por seus leitores. (TODOROV, 2007, p.81).

A negação de Tolkien quanto a ter escrito um texto alegórico somada à ausência


de quaisquer marcas explícitas em The Lord of the Rings que sustentem tal interpretação
tornam a proposta de Christine Brooke-Rose mal fundamentada e, portanto, a menos
adequada para o nosso trabalho.
Em A experiência de ler (2000), C. S. Lewis faz uma interessante observação a
respeito das interpretações alegóricas em geral. Ele acredita que existam algumas
histórias, as quais chama de mitos, que possuem uma qualidade inerente em relação ao
leitor. São histórias como a de Orfeu, da mitologia clássica, capazes de provocar um
efeito de grande impacto no leitor ou ouvinte independentemente de sua transmissão se
dar através de uma forma literária ou, simplesmente, através de um dicionário de
mitologia. E acrescenta que a experiência proporcionada por este tipo de histórias

Infunde-nos também um temor respeitoso. Sentimos nela a presença de um


poder divino. É como se algo do maior alcance nos tivesse sido comunicado.
Os reiterados esforços da mente no sentido de captarem – ou seja, e
principalmente, conceptualizarem esse algo reflectem-se na persistente
tendência da humanidade para conferir aos mitos explicações alegóricas. E
depois de se terem experimentado todas as alegorias, continuamos a sentir
que, em si, o mito é mais importante que elas. (LEWIS, 2000, p.65)
32

C. S. Lewis, contudo, não discute a questão dos gêneros literários, apenas


procura assegurar a literariedade a um determinado tipo de texto a que também pertence
The Lord of the Rings.
Luz Pepe de Suárez, em Homero y Tolkien: Resonancias Homéricas en The
Lord of the Rings, traça um breve panorama das tentativas de classificação da obra.
Partindo da classificação sugerida por Aristóteles, a teórica enquadra facilmente a obra
tolkieniana no gênero épico, inclusive comparando-a às obras de Homero. No entanto, a
crítica argentina admite que surgem problemas ao se procurar uma denominação mais
específica para a obra. Entre os rótulos que se costumam atribuir ao principal trabalho
literário de Tolkien encontram-se: romance, novela, novela de cavalaria, relato
fantástico, ficção científica e conto de fadas.
Dentre as abordagens mais interessantes, Suárez cita (2006, p.60) os estudos de
Tom Shippey, Katharin Crabbe e Brian Rosebury, que procuram uma abordagem do
gênero através das “Teorias dos Modos” de Northrop Frye, conforme proposto em
Anatomia da crítica:

Nas ficções literárias o enredo consiste em alguém fazer alguma coisa. O


alguém, se indivíduo, é o herói, e a alguma coisa que ele faz ou deixa de
fazer é o que ele pode fazer ou podia ter feito, no plano dos pressupostos
estabelecidos, para ele, pelo autor, e das conseqüentes expectativas da
audiência. As ficções, portanto, podem ser classificadas, não moralmente,
mas pela força do herói, que pode ser maior do que a nossa, menor ou mais
ou menos a mesma. (FRYE, 1973, p. 39)

Assim, Frye propõe cinco maneiras de classificação do herói:

(1) – O herói como um ser divino, superior em condição aos outros


homens e ao meio em que esses homens habitam. A história sobre
esse herói será considerada um mito;
(2) – O herói é superior em grau ao meio e aos outros homens, contudo,
ainda é identificado como humano. Este é o herói da história
romanesca, que habita um mundo onde as leis da natureza são
ligeiramente suspensas e podemos encontrar armas encantadas,
bruxas, talismãs, animais falantes etc. Esse é o herói que participa da
lenda, do conto popular, do Märchen e derivados literários;
33

(3) – O herói é superior em grau a outros homens, mas não à natureza,


possuindo, freqüentemente a qualidade de líder. Este é o modo
imitativo elevado, típico das tragédias e das epopéias gregas;
(4) – O herói não é superior nem ao seu meio nem a outros homens,
sendo muito semelhante ao homem comum. É o modo imitativo
baixo, típico da comédia e da ficção realística.
(5) – O herói é inferior em inteligência e poder ao homem comum,
pertencendo ao modo irônico.

Seguindo o trabalho de T. Shippey, Luz Pepe de Suárez demonstra, num


primeiro momento, a tentativa de se enquadrar The Lord of the Rings dentro da segunda
categoria, a do gênero romanesco, em que o herói se caracteriza como superior em grau
aos outros homens e ao meio, e as leis da natureza são alteradas. Contudo, Shippey
reconhece que a adequação a esse gênero não se dá tão perfeitamente, já que a obra
oferece uma ampla gama de tipos de personagens, que podem variar desde aqueles que
se aproximam do divino, como Gandalf, até os mais próximos do modo imitativo baixo,
como Merry e Pippin.
Ainda com base nas teorias de Northrop Frye, poderíamos argumentar em favor
de uma leitura de The Lord of the Rings como uma epopéia em prosa, isto é, uma obra
enciclopédica. Através dessa abordagem ampla pode-se abarcar as múltiplas faces da
obra tolkieniana, superando assim os problemas suscitados pela simples tentativa de
adequação ao maravilhoso ou ao romanesco.
Para Frye, “A epopéia diverge da narrativa pelo alcance enciclopédico de seu
tema, do céu ao mundo subterrâneo e através da enorme massa de conhecimento
tradicional” (1973, p.312). Todo esse conhecimento tradicional é reunido em The Lord
of the Rings através de uma série de pequenas narrativas, versos e referências a um
passado muito anterior à Terceira Era, quando se dão os principais eventos que compõe
a obra. Podemos também verificar a presença dos dois ritmos principais que regem a
epopéia clássica que são, segundo Frye, “a vida e a morte do indivíduo, e o ritmo social
mais lento que no curso dos anos [...], leva cidades e impérios a sua ascensão e ruína”
(1973, p.312). Dessa forma, assistimos à ascensão e queda do poder de Sauron e
Saruman, a destruição e os indícios de renovação de Gondor e do Shire, às mortes de
Théoden e Denethor que devem dar lugar aos reis mais jovens, além do próprio ritmo da
narrativa que intercala momentos de tensão e alívio, perigo e segurança como uma
34

forma de assegurar constantemente o contraste entre vida e morte. Além disso,


encontramos uma clara referência ao mito messiânico, também associado a esse ciclo de
vida e morte e incorporado por Aragorn, o rei oculto que atravessa as “Sendas dos
Mortos” para trazer uma esperança renovada ao seu povo. Ironicamente, esse relato
messiânico é contrabalançado pela sua estreita dependência em relação à demanda de
Frodo.
Lin Carter, em O senhor do Senhor dos Anéis, oferece-nos uma visão bastante
proveitosa sobre o assunto. Primeiramente, o crítico tenta afastar as interpretações da
obra do filólogo de Oxford como sendo sátira ou alegoria. O fator decisivo para o
esclarecimento dessa questão, para Carter, é a intenção do autor – e J. R. R. Tolkien
sempre negou que sua obra tivesse intenções alegóricas, apesar das constantes
comparações entre o enredo de The Lord of the Rings e a História de meados do século
XX.

Superficialmente, seria possível argumentar que a trilogia de Tolkien é


alegórica; e sem dúvida ela apresenta a guerra entre o bem e o mal (ou entre
a luz e as trevas) quando o enredo é reduzido aos termos mais simples.
Alguns leitores até mesmo viram nas lutas entre as forças do oeste e de
Mordor, no leste, uma alegoria da guerra fria, entre as democracias da
Europa Ocidental e a Rússia totalitária – tendo o importantíssimo e
incrivelmente perigoso Anel como símbolo das armas nucleares atuais. Mas
nesse caso qualquer história de ação mostrando os mocinhos contra os
bandidos, como em um filme de faroeste, é capaz de gerar uma interpretação
semelhante, assim reduzindo a argumentação ao absurdo. (CARTER, 2003,
p.91-92)

Afastadas as hipóteses de leitura da obra tolkieniana como sátira ou alegoria,


Carter se dedica a investigar a que gênero pertenceria a trilogia de Tolkien.
Contrariando as expectativas de alguns fãs, o crítico considera que “O Senhor dos Anéis
é simplesmente um romance de fantasia” (2003, p. 90), não constituindo, portanto, um
gênero completamente novo, tendo como precursores William Morris, Lord Dunsany e
Eric Rücker Eddison, os inventores da fantasia épica.
Indo ainda além, Tolkien é colocado ao lado de grandes nomes da literatura
internacional que, segundo Carter, também se dedicaram à narrativa de fantasia, embora
com uma intenção muito diferente da do professor de Oxford, como Goethe, Milton,
Swift, Byron, Keats e Spenser, entre outros. Além disso, sua obra passa a ser
enquadrada em uma tradição que surge com os épicos clássicos e, através das canções
35

de gesta e dos romances medievais, chega até os nossos dias, culminando, de fato, no
romance de fantasia.
Freqüentemente, atribui-se à principal obra de Tolkien o título de “Saga do
Anel”, aproximando-a claramente das tradicionais sagas islandesas. Lin Carter
considera que existe, de fato, uma relação entre os escritos tolkienianos e essa variedade
antiga de narrativa. Contudo, seria essa relação de tal forma estreita que The Lord of the
Rings pudesse ser considerado uma obra do mesmo gênero?
André Jolles, em Formas Simples, propõe uma abordagem de gêneros como a
legenda, a saga, o mito e o conto de fadas (Märchen), baseada na idéia de que existiria
uma determinada disposição mental que daria origem à determinada forma simples. No
caso da saga, Jolles afirma que “Existe uma disposição mental em que o universo se
constrói como família e se interpreta, em seu todo, em termos de clã, de árvore
genealógica, de vínculo sangüíneo” (1976, p.69).
Adequar essa concepção a The Lord of the Rings é uma proposta especialmente
atraente, principalmente quando se tem em vista as árvores genealógicas e os anais
incluídos nos apêndices da obra. Porém, os laços sangüíneos não são a principal
motivação por trás de todos os eventos narrados. O sacrifício de Frodo não é por sua
família, mas antes para proteger seu lugar de origem – para o qual ele ainda nutre um
determinado afeto – ou pessoas amadas, com as quais nem sempre existe um vínculo
familiar. Quando se considera as outras personagens, a tentativa de se estabelecer laços
de sangue que impulsionem suas ações se torna ainda mais difícil.
De fato, não é a noção de família que é sustentada no decorrer da obra. Todavia
existe um elemento unificador que cria uma identificação entre as mais diferentes raças
e povos de Middle-earth, que é a noção de Free Peoples (TOLKIEN, 1966a, p.309) ou
Free Folk (Idem, p.315). Estes são os Povos Livres, todos reunidos para combater um
mal comum que recai sobre os seus destinos.
Para J. R. R. Tolkien, The Lord of the Rings poderia ser classificado como um
conto de fadas, de acordo com a sua visão muito particular sobre o gênero. Em seu
ensaio intitulado On Fairy-stories (1966a), o autor explica que a maioria dos contos de
fadas não tem nenhuma fada entre as suas personagens, tratando, ao invés disso das
aventuras de homens em um reino perigoso. Nesse reino, todos os elementos
maravilhosos ou sobrenaturais devem parecer verdadeiros, não contando com uma
credulidade voluntária por parte do leitor ou dos ouvintes. Assim, torna-se claro o
propósito de todo o universo geográfico, lingüístico, histórico e cultural criado pelo
36

autor, que são os elementos fundamentais para a criação de um mundo secundário


completo, realista e coerente consigo mesmo.
A despeito das considerações de Christine Brooke-Rose, o acréscimo desses
elementos, que ela chama de megatext, não contribuem para uma modificação do gênero
de fantasia ou maravilhoso, mas antes para a sua afirmação como tal. Todo esse
conjunto de itens, descritos nos apêndices de The Lord of the Rings, eram considerados
por Tolkien como parte fundamental de sua criação, constituindo um pano de fundo
detalhado que dá sustentação ao universo imaginado, de modo que ela possa ser
apresentada como real, sem precisar contar com a complacência do leitor.
A habilidade de se utilizar os elementos criados pela imaginação, principalmente
aqueles que contradizem a natureza, de modo que eles venham a adquirir “the inner
consistency of reality” (TOLKIEN, 1966a, p.68) é chamada por Tolkien de Fantasy, e
não é considerada pelo autor como uma forma inferior de Arte, “but a higher form of
Art, indeed the most nearly pure form, and so (when achieved) the most potent”
(TOLKIEN, 1966a, p.69). Tolkien acrescenta ainda que a Fantasia é um privilégio da
arte das palavras, sendo facilmente alcançável através da pintura, o que resulta, muitas
vezes em um resultado banal, e muito problemática no teatro, arte que ele considera
essencialmente diversa da literatura e que não admite que elementos estranhos à
natureza do mundo real sejam apresentados de forma convincente. Sobre o que chama
de Fantasy, o autor finalmente conclui que:

Fantasy is a natural human activity. It certainly does not destroy or even


insult Reason; and it does not either blunt the appetite for, nor obscure the
perception of, scientific verity. On the contrary. The keener and the clearer
is the reason, the better fantasy will it make. If men were ever in a state in
which they did not want to know or could not perceive truth (facts or
evidence), then Fantasy would languish until they were cured. If they ever
get into that state (it would not seem at all impossible), Fantasy will perish,
and become Morbid Delusion. (1966a, p.75)

Outro ponto afirmado por Tolkien a respeito das histórias de fadas permite traçar
um paralelo entre sua formulação e a proposta de André Jolles sobre o conto de fadas.
Para J. R. R. Tolkien, as principais funções das histórias de fadas são: Recovery, Escape
e Consolation.
37

O autor nomeia de Recovery a capacidade dos contos de possibilitar ao leitor ou


ouvinte uma nova descoberta das coisas do mundo primário, as quais são inseridas nos
textos. Assim, se, de um lado, elas podem conter elfos e dragões, de outro, contém o
céu, as árvores, os rios, etc. Por meio dessa junção do mágico com o natural, esses
elementos conhecidos se tornam novamente capazes de produzir encantamento no
leitor, deixando de ser apenas aspectos já gastos do cotidiano, aos quais, geralmente,
dedica-se pouca atenção.
Escape, ao contrário do que normalmente se entende, não é considerado por
Tolkien como uma característica negativa. O escapismo proposto pelo autor não
representa a fuga completa de tudo o que se poderia chamar de “vida real”, mas antes
um alívio para os problemas que esta vida nos impõe. O ponto culminante do escape
contido nas histórias de fadas seria o escape da morte e, nesse ponto, esses contos são
capazes de refletir a verdadeira natureza de quem os criou, que é a natureza humana.
A última das funções das histórias de fadas, Consolation, é definida por Tolkien
da seguinte forma:

[…] the “consolation” of fairy-tales has another aspect then the imaginative
satisfaction of ancient desires. Far more important is the Consolation of the
Happy Ending. Almost I would venture to assert that all complete fairy-
stories must have it. […] Since we do not appear to possess a word that
expresses this opposite – I will call it Eucatastrophe. The eucatastrophic
tale is the true form of fairy-tale, and its highest function. (TOLKIEN,
1966a, p. 85 – grifo do autor).

Uma concepção semelhante à de Tolkien pode ser encontrada na teoria de André


Jolles sobre o conto de fadas. Para o pesquisador, os contos proporcionam certa
compensação

Porque satisfazem, ao mesmo tempo, o nosso pendor para o maravilhoso e o


nosso amor ao natural e ao verdadeiro mas, sobretudo, porque as coisas se
passam nessas histórias como gostaríamos que acontecessem no universo,
como deveriam acontecer. (JOLLES, 1976, p.198 – grifo do autor).

O maravilhoso surge, então, como resultado dessa disposição mental que dá


origem ao conto, pois os acontecimentos do universo não são representados como no
38

mundo real, mas são retratados de modo que venham a satisfazer uma noção de justiça
de seu público. Por esse motivo, é comum que, nessas histórias, os vilões sejam punidos
e os fracos e os tolos tenham sucesso, embora nem sempre possam ser considerados
exemplos de boa conduta moral.
Em The Lord of the Rings, pode-se dizer que essa disposição mental é apenas
parcialmente satisfeita, pois, se por um lado, vilões como Sauron, Saruman ou mesmo
Gollum são punidos, por outro, a máxima que diz “viveram felizes para sempre” não é
cumprida. Somente com muito sofrimento foi possível restabelecer a paz em Middle-
earth. Assim, Gondor e Rohan só encontram a paz após a morte de seus governantes;
Shire deve ser destruído para depois ser novamente reconstruído sob os cuidados dos
hobbits; e, finalmente, Frodo não pode permanecer em Middle-earth, o que acrescenta
uma grande sensação de perda ao final da narrativa.
Todavia, esse final não é incoerente com as idéias do autor, especialmente
quando se considera que, para Tolkien, o principal tema da obra é a Morte e a
Imortalidade. Com o final da Guerra do Anel, o duelo entre esses dois elementos é
resolvido. O início da Era dos Homens representa o triunfo da Mortalidade. Tolkien,
assim, reconstrói o universo dos contos de fadas e, ao mesmo tempo, reafirma os ritmos
de vida e morte, ascensão e ruína da epopéia clássica, conforme dispostos por Frye.
Conclui-se assim que o mais adequado é a classificação da grande obra de J. R.
R. Tolkien como romance de fantasia ou o seu enquadramento como uma forma
enciclopédica, sem que essas duas designações sejam mutuamente excludentes. As
tentativas de leitura como sátira ou alegoria tornam-se inadequadas, visto que não são
capazes de abarcar a complexidade do livro, nem de criar uma relação satisfatória entre
a alegoria e o objeto, ou evento, representado. Além disso, não se deve desprezar as
declarações do próprio autor que, como estudioso de literatura, também nos ofereceu
alguns caminhos para o entendimento de suas obras. E é somente através de uma leitura
adequada, o que não descarta a sua classificação de gênero, que se poderá buscar
compreender a totalidade do romance.

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Comunicações e Resumos Publicados em Anais de Congressos ou Periódicos (resumo


expandido)

1. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. A questão do


gênero em “O Senhor dos Anéis”. In: Anais do XIX Congresso de Iniciação Científica
da UNESP, 2007, Araraquara. Publicação digital.

Comunicações e Resumos Publicados em Anais de Congressos ou Periódicos


(completo)
1. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. Mecanismos da
maldade em “O Senhor dos Anéis” In: Anais do II Colóquio de Estudos Germânicos.
2007, Araraquara. Publicação digital.

Apresentação de comunicações e painéis em eventos científicos

1. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. A Questão do


Gênero em O Senhor dos Anéis. Comunicação apresentada no XIX Congresso de
Iniciação Científica da UNESP, evento realizado em 2007 na Faculdade de Ciências e
Letras da UNESP-Araraquara.

2. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. Intenções de


Classificação de “O Senhor dos Anéis”. Comunicação apresentada no Simpósio
Internacional de Iniciação Científica da USP, evento realizado em 2007 na Escola de
Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.

3. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. “O Senhor dos


Anéis”: Alegoria ou Romance de Fantasia? Painel apresentado no XV Congresso de
Iniciação Científica da UFSCar, evento realizado em 2007 na UFSCar em São Carlos.

4. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. “O Senhor dos


Anéis” como romance de fantasia. Comunicação apresentada nos Seminários de
42

Pesquisa do PET-Letras, evento realizado em 2007 na Faculdade de Ciências e Letras


da UNESP-Araraquara.

5. PEREIRA, André Luiz Rodriguez Modesto, VOLOBUEF, Karin. Mecanismos da


maldade em “O Senhor dos Anéis”. Comunicação apresentada no II Colóquio de
Estudos Germânicos “Mito e magia”, evento realizado em 2006 na Faculdade de
Ciências e Letras da UNESP-Araraquara.

CRONOGRAMA DE ATIVIDADES PARA O PRÓXIMO PERÍODO

No próximo semestre, pretende-se realizar uma análise das principais


personagens do romance, considerando o grupo ou povo a qual pertencem, com uma
especial atenção dedicada aos hobbits. A análise dará prosseguimento ao trabalho com o
tema do Mal e da Morte e levará em conta os resultados obtidos sobre a questão do
gênero de The Lord of the Rings.
Segue-se a lista de congressos nos quais já foi efetuada a inscrição e que serão
realizados no segundo semestre de 2008:
-XIX Congresso de Iniciação Científica da Unesp – com apresentação de
trabalho e publicação de resumo expandido em anais do evento;
-XVI Congresso de Iniciação Científica (CIC) da UFSCar – com apresentação
de trabalho e publicação de resumo (de uma página) em anais do evento;
-Simpósio Internacional de Iniciação Científica da USP – com apresentação de
trabalho e publicação de resumo (de uma página) em anais do evento.

Araraquara, 8 de agosto de 2008.

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André Luiz Rodriguez Modesto Pereira Profa. Dra. Karin Volobuef

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