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TEMPO COMUM. VIGÉSIMA SEGUNDA SEMANA.

QUINTA-FEIRA

88. O PODER DA OBEDIÊNCIA


– A obediência dá forças e frutos.

– Necessidade desta virtude para quem quer seguir Cristo de perto.

– Não impor limites ao querer de Deus.

I.  JESUS ESTAVA JUNTO  do lago de Genesaré com uma grande multidão 
que   desejava   ouvir   a   Palavra   de   Deus.   Pedro   e   os   seus   companheiros   de 
trabalho   lavavam   as   redes   depois   de   terem   labutado   uma   noite   inteira   sem 
pescar nada. E Jesus, que queria meter­se a fundo na alma de Simão, entrou 
na sua barca e pediu­lhe que a afastasse um pouco da margem. E, sentado, 
ensinava   da   barca   à   multidão1.   Enquanto   escutava   o   Mestre,   a   quem   já 
conhecia desde que seu irmão André o levara até Ele2, talvez Pedro tivesse 
continuado com a tarefa de deixar arrumados os apetrechos de pesca, sem 
suspeitar dos planos grandiosos do Senhor.

Quando acabou de falar, Jesus disse a Simão: Guia mar adentro e lançai as  
vossas   redes   para   a   pesca.   Tudo   convidava   à   desculpa:   o   cansaço,   que   é 
maior quando não se pescou nada, as redes já lavadas e preparadas para a 
noite seguinte, a inoportunidade da hora para a pesca. Mas o olhar de Jesus, o 
tom imperativo e ao mesmo tempo amável com que deu a ordem, a enorme 
atracção que Cristo exerce sobre as almas nobres, levaram Pedro a fazer­se ao 
largo novamente. O único motivo por que o fez foi Jesus: Mestre – disse­lhe –, 
estivemos trabalhando durante toda a noite e nada pescamos, mas, sob a tua  
palavra, lançarei as redes. Sob a tua palavra. Essa foi a grande razão.

Em muitas ocasiões, quando aparece essa fadiga peculiar que resulta de 
não vermos frutos na vida interior ou na acção apostólica, quando nos parece 
que   tudo   foi   um   fracasso   e   nos   assaltam   raciocínios   humanos   que   nos 
pretendem convencer a abandonar a tarefa, devemos ouvir a voz de Jesus que 
nos diz:  Duc in altum, guia mar adentro, recomeça, torna a tentar... em meu 
Nome.

“O segredo de todos os progressos e de todas as vitórias é, na verdade, o 
saber recomeçar, o tirar ensinamentos de um fracasso e o tentar de novo”3. 
Através   desses   aparentes   fracassos,   talvez   o   Senhor   queira   dizer­nos   que 
devemos trabalhar por motivos mais sobrenaturais, por obediência, por Ele e só 
por Ele.
“Que poder o da obediência! – O lago de Genesaré negava os seus peixes 
às redes de Pedro. Toda uma noite em vão.

“– Agora, obediente, tornou a lançar a rede à água e pescaram «piscium 
multitudinem copiosam» – uma grande quantidade de peixes.

“– Acredita: o milagre repete­se todos os dias”4.

Se alguma vez nos encontramos cansados e sem forças para recomeçar, 
olhemos   para   o   Senhor   que   nos   acompanha   nesta   nossa   barca.   Jesus 
convida­nos   então   a  pôr   em   prática,   com   docilidade   interior,  com   empenho, 
esses conselhos que recebemos na confissão, na direcção espiritual, certos de 
que recuperaremos as forças. “Muitas vezes – diz Santa Teresa –, parecia­me 
não   poder   sofrer   o   trabalho   conforme   a   minha   baixeza   natural.   Disse­me   o 
Senhor: Filha, a obediência dá forças”5.

II. PEDRO FEZ­SE AO LARGO com Jesus na barca, e em breve percebeu 
que as redes se enchiam de peixes; tantos, que parecia que iam rompê­las. E  
fizeram sinais aos companheiros da outra barca para que viessem ajudá­ los.  
Eles vieram e encheram as duas barcas, tanto que se afundavam. Houve peixe 
para todos; Deus sempre recompensa a obediência com frutos sem conta.

Esta passagem do Evangelho está cheia de ensinamentos: durante a noite, 
na ausência de Cristo, o trabalho havia sido estéril. O mesmo acontece na vida 
dos cristãos, quando querem empreender tarefas apostólicas sem contar com o 
Senhor,   em   plena   escuridão,   deixando­se   levar   unicamente   pela   sua 
experiência ou por esforços demasiado humanos.

“Empenhas­te   em   andar   sozinho,   fazendo   a   tua   própria   vontade,   guiado 


exclusivamente   pelo   teu   próprio   juízo...   e,   bem   vês!,   o   fruto   chama­se 
«infecundidade».

“Filho, se não abates o teu juízo, se és soberbo, se te dedicas ao «teu» 
apostolado, trabalharás durante toda a noite – toda a tua vida será uma noite! 
–, e no fim amanhecerás com as redes vazias”6.

Pedro mostrou­se humilde ao obedecer à voz de quem, por não ser homem 
de mar, bem se poderia pensar que pouco ou nada sabia daquele trabalho em 
que ele, Simão, tinha adquirido tanta experiência e saber ao longo dos anos. 
Fia­se, no entanto, do Senhor, tem mais confiança na palavra de Jesus do que 
nos seus anos de faina pesqueira. Esta obediência e confiança nas palavras de 
Jesus acabaram de preparar Pedro para receber a sua chamada definitiva. Foi 
como se o Senhor só tivesse querido chamá­lo para sempre depois de obter 
dele um acto de obediência e de confiança plenas.

Para quem quer ser discípulo de Cristo, a necessidade da obediência não 
resulta   de   considerações   de   conveniência   ou   de   eficácia,   mas   de   que   a 
obediência faz parte do mistério da Redenção, pois o próprio Cristo “revelou o 
seu mistério e levou a cabo a Redenção por meio da sua obediência” 7. Quem 
quiser seguir os passos do Mestre não pode, pois, pôr limites à sua obediência; 
o Senhor quer que lhe obedeçamos no fácil e no heróico, como Ele próprio o 
fez: “Obedeceu em coisas gravíssimas e dificílimas: até à morte de Cruz”8.

A obediência leva­nos a querer identificar em tudo a nossa vontade com a 
vontade de Deus, que nos é dada a conhecer através dos pais, dos superiores, 
dos   deveres   que   nos   são   impostos   pelos   afazeres   familiares,   sociais   e 
profissionais. Numa palavra, leva­nos a uma submissão alegre e delicada às 
disposições   da   autoridade   legítima   nas   diversas   ordens   da   vida   humana, 
principalmente ao Papa e ao Magistério da Igreja. E no que se refere à alma, 
leva­nos de modo muito particular a ser dóceis aos conselhos recebidos  na 
confissão e na direcção espiritual.

Quando   permanecemos   com   Cristo,   Ele   sempre   enche   de   peixes 


abundantes   as   nossas   redes.   Junto   d’Ele,   até   o   que   parecia   estéril   e   sem 
sentido  torna­se  eficaz  e  frutuoso.   “A obediência   torna  meritórios   os  nossos 
actos   e   sofrimentos,   de   tal   forma   que,   por   mais   inúteis   que   estes   últimos 
venham   a   parecer­nos,   podem   chegar   a   ser   muito   fecundos.   Uma   das 
maravilhas realizadas por Nosso Senhor foi ter tornado proveitosa a coisa mais 
inútil que existe à face da terra: a dor. Ele a glorificou mediante a obediência e 
o amor”9.

III.  PEDRO FICOU ASSOMBRADO  com a pesca. Neste milagre, o Senhor 


manifestou­se   muito   particularmente   a   ele.   O   Apóstolo   olhou   para   Jesus   e 
lançou­se aos seus pés, dizendo­lhe:  Afasta­ te de mim, que sou um homem  
pecador.   Compreendeu   a   sua   pequenez   diante   da   suprema   dignidade   de 
Cristo.   Jesus   disse­lhe:  Não   temas;   doravante   serás   pescador   de   homens. 
Pedro   e   os   que   o   haviam   acompanhado   na   pesca,  atracando   as   barcas,  
deixaram tudo e seguiram­ no.

Jesus começou por pedir­lhe que lhe cedesse a barca, e acabou por ficar 
com a sua vida. E Pedro haveria de deixar atrás de si uma marca inesquecível 
em   tantas   almas   que   o   próprio   Cristo   poria   ao   seu   alcance.   Começou   por 
obedecer   num  pequeno   pormenor   e  o  Senhor  manifestou­lhe   os  grandiosos 
planos que tinha para ele, pobre pescador da Galileia, desde toda a eternidade. 
Nunca teria podido suspeitar da transcendência e do valor da sua vida. Milhões 
e milhões de pessoas acenderiam a sua fé na daqueles que seguiram Jesus 
naquele   dia,   e   muito   particularmente   na   de   Pedro,   que   seria   a   rocha,   o 
fundamento inamovível da Igreja.

Nós também não podemos imaginar as consequências da nossa fidelidade 
em   seguir   as   pegadas   de   Cristo.   O   Senhor   pede­nos   cada   vez   mais 
correspondência,   mais   docilidade   e   mais   obediência   ao   que   nos   vai 
manifestando   de   muitas   maneiras.   E,   se   formos   fiéis,   um   dia   far­nos­á 
contemplar   a   transcendência   do   nosso   seguimento   com   obras:   “Se 
corresponderes à chamada que o Senhor te fez, a tua vida – a tua pobre vida! – 
deixará   na   história   da   humanidade   um   sulco   profundo   e   largo,   luminoso   e 
fecundo, eterno e divino”10.

Não ponhamos limites ao Senhor, tal como Pedro não os pôs. “Se és homem 
de mar alto, agarra com firmeza o teu leme [...]. Se te dás a Deus, dá­te como 
os santos se deram. Que nada prenda a tua atenção e te desvie da marcha que 
empreendeste: és de Deus. Se te dás, dá­te para a eternidade. Nem as vagas 
nem a ressaca abalarão os teus alicerces. Deus apoia­se em ti; mete também 
ombros ao trabalho, e navega contra a corrente [...]. Duc in altum! Lança­te às 
águas com a audácia dos ébrios de Deus”11.

A nossa Mãe Santa Maria, Stella maris, Estrela do mar, ensinar­nos­á a ser 
generosos com o Senhor quando nos pedir emprestada uma barca e depois 
quiser que lhe demos a vida inteira.

(1) Lc 5, 1­11; (2) cfr. Jo 1, 41; (3) G. Chevrot, Simão Pedro, pág. 20; (4) Josemaría Escrivá, 
Caminho, n. 629; (5) Santa Teresa, Fundações, pról. 2; (6) Josemaría Escrivá, Forja, n. 574; (7) 
Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 3; (8) São Tomás, Comentário à Epístola aos Hebreus, 5, 
8, lec. 2; (9) R. Garrigou­Lagrange, As três idades da vida interior, pág. 683; (10) Josemaría 
Escrivá, Forja, n. 59; (11) J. Urteaga, O valor divino do humano, págs. 130­132.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal AQUI)

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