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INSTITUIÇÕES DE DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - Prof.

Abel Abelardo Stadniky

CONSTITUIÇÃO
1.Conceito de Constituição

É o conjunto de normas que determinam a forma de governo, a organização dos


poderes e as atribuições destes frente aos direitos e garantias dos particulares.

Podemos dizer, em linguagem simples e corrente, que a Constituição é o


documento político-jurídico por excelência de um Estado, que nos regimes democráticos é redigido,
aprovado e publicado por uma Assembléia Constituinte eleita pelo povo.

É a lei fundamental, a lei magna, que retrata a forma de ser de um Estado e que
confere direitos e garantias fundamentais, tanto aos indivíduos quanto à coletividade. Conforme José
Joaquim Gomes Canotilho, é a obra fundacional de um Estado, ou seja, o conjunto daquelas normas que
fundam um Estado.

Além disso, a Constituição indica os poderes do Estado, através dos quais a nação
há de ser governada e ainda marca e delimita, no regime administrativo brasileiro, por exemplo, as
competências dos três Poderes Constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário), as atribuições da União
e de cada Estado-membro da Federação, bem como dos Municípios e do Distrito Federal.

Outras expressões são empregadas para designar “constituição”, tais como: Carta
Magna, Lei fundamental, Código Supremo, Estatuto Básico, Pacto Fundamental, etc.

2. Histórico Evolutivo do Estado e do Constitucionalismo

Como a Constituição "cria" todaa a estrutura político-jurídico-administrativa e


confere a vocação ideológica de um Estado, não podemos estudá-la dissociada deste. Assim, necessário
faz-se um exame preliminar da natureza e das principais características do Estado, o que podemos
brevemente fazer por meio do resgate de suas fases históricas. É muito provável que os alunos já tenham
visto algo do que agora trataremos em Ciência Política; ainda assim, válido é retomar.

Mas, de início, faz-se necessário delimitarmos o entendimento acerca de duas


categorias fundamentais para este estudo, quais sejam, Estado e Estado Constitucional de Direito.

Em primeiro lugar, o que entendemos por Estado?

Trazemos um conceito de Estado dado por Max Weber, para quem o Estado é o
detentor do monopólio da força legítima, isto é, do monopólio da Justiça (punição), da cobrança de
tributos fiscais, de cunhar moeda etc. Verdadeiramente, um dos mais antigos preceitos da Filosofia
Política diz que o Estado tem o monopólio do uso da força, isto é, apenas o poder público pode usar a
violência (e mesmo assim, na medida necessária) para garantir o cumprimento da lei e evitar que surja a
guerra de todos contra todos. Logo, o Estado é a Instituição com poderes para organizar a sociedade em
um dado território, coercitivamente, isto é, para disciplinar o convívio social humano através do Direito,
por meio de normas jurídicas obrigatórias, acompanhadas de sanções.

E Estado Constitucional de Direito, o que é? É o Estado limitado pelo Direito,


cujo poder se baseia no respeito a uma Constituição, que o auto-limita. Este Estado foi o resultado dos
processos revolucionários dos séculos XVII e XVIII, marcado pela preocupação com a limitação do
poder soberano, significando o reconhecimento, ao indivíduo, de uma esfera de liberdade intangível pelo
próprio Estado.
3. Estado - Histórico de sua formação

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Procuramos, neste item, reconstruir minimamente os vários tipos de Estado e suas


fases históricas correspondentes. É importante frisar que o Estado, como o conhecemos, é uma invenção
moderna, que adveio com o surgimento dos grandes Estados-Nações, mas mesmo assim é importante que
se tenha uma visão panorâmica de como se organizava o poder político desde a Antigüidade Clássica.

3.1. Antigüidade Clássica. Estados Escravistas

Caracterizava-se a organização política da Antigüidade Clássica pela


multiplicidade de Cidades-Estados gregas (polis), tais como Atenas, Esparta, Tebas, Cartago, Itaca, e pela
Civitas Romana, que era um Estado-Cidade. Todos eram, de regra, Estados de tipo escravistas.

3.2. Feudalismo. Europa Medieval. Estado Feudal

O Feudalismo foi o sistema social que vigiu na Europa durante quase toda a Idade
Média. Nele, os Estados eram caracterizados pela debilidade do poder central e pela dispersão do poder
público entre inúmeros senhores feudais, para os quais o exercício da função estatal confundia-se com o
interesse privado. A principal característica do Estado feudal era, portanto, a fragmentação da autoridade.
Cada feudo fazia as vezes de um Estado (exatamente porque todas as tarefas e funções hoje centralizadas
no Estado eram realizadas por cada feudo, eis que possuíam poder local autônomo economicamente,
exércitos próprios, aparelhos jurídicos - prisões e tribunais -, tributação e administração próprias, etc.) e,
assim, o poder era fragmentado. O Estado em si era descentralizado em relação ao Rei (este revelava-se
fictício, submisso ao Papa, verdadeiro poder temporal e representante do poder espiritual na Terra). Para
o declínio do sistema feudal contribuiu o início das Grandes Navegações (o que originou a fase
"metalista" do mercantilismo, ou seja, país rico seria aquele que lograsse possuir metal precioso) e o
conseqüente comércio de especiarias, sedas e outras mercadorias, o que deu destaque aos mercadores e
artesãos e fez cair radicalmente o preço da terra. Com a desvalorização fundiária, as pestes, as guerras
internas entre senhores feudais, tomou força a evasão dos servos para os "burgos", dando origem à
incipiente burguesia, a qual, em pouco tempo, passou a ter a proeminência econômica. Mas faltava-lhe a
centralização econômica total, o que passava pela centralização do poder político, notadamente para
destruir alguns obstáculos às suas atividades, como por exemplo a necessidade de pagar tributos aos
feudos para transportar as mercadorias de um burgo para outro, a falta de um exército nacional, a
necessidade de moeda única etc. E, assim, em fins da Idade Média e primórdios da Idade Moderna, essa
mesma burguesia aliou-se ao Rei para absolutizar o poder na figura deste. Para isso, contribuiu também o
inicial esclarecimento das pessoas por meio da invenção da imprensa, em 1440, por Gutemberg, a
apologia do Absolutismo Monárquico feita por Thomas Hobbes (que viveu de 1588 a 1679), já que, para
ele, os homens eram maus por natureza (lobos entre si) e, para evitar um estado de permanente violência,
o poder deveria ser centralizado no monarca; após, também contribuiu a nova ideologia nacionalista pró-
unificação dos Estados Nacionais, desenvolvida pelo florentino Maquiavel (1469-1527), em seu famoso
livro "O Príncipe", escrito em 1513. Maquiavel, que foi o primeiro grande pensador da Idade Moderna,
inclusive desprezava o pensamento deísta da Idade Média e proclamava que a origem do poder não era
divina, mas se encontrava na força.

3.3. Idade Moderna. Estado Absolutista ou Absolutismo Monárquico

Por fim o Rei, aliado à burguesia, cumpriu a tarefa de unificar o Estado e passou a
governar de forma absoluta, tendo sido o francês Luis XIV o paradigma dos monarcas absolutistas (foi
ele, o Rei Sol, que proferiu a célebre frase L'État c'est moi: "o Estado sou eu"), revelando a completa
identificação entre o Rei e o Estado. O poder centralizado nas mãos do monarca substituiu de vez a
fragmentação da autoridade que caracterizava o Estado medieval. Como já adiantado acima, o filósofo
moderno Thomas Hobbes representava o reacionarismo, o totalitarismo, o domínio do indivíduo pelo
Estado, representado este pela figura do Leviatã, que serviu de nome à sua obra fundamental.

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Hobbes defendia, então, a teoria do Governo Absoluto, e é por isso que nestes
Estados Absolutos Unificados, os direitos do homem enquanto indivíduo não tinham condições de ser
exigidos, pois, na verdade, eram os habitantes do reino apenas "súditos" e não titulares de direitos. Aliás,
não havia um Estado de Direito, e sim algumas tolerâncias por parte do monarca, em um regime de
privilégios, sendo que estes poderiam a qualquer momento ser violados ou derrogados pelo próprio
monarca, conforme sua única e exclusiva vontade.

No Absolutismo Monárquico (muitas vezes "Despotismo Esclarecido"), tinha-se


como base e justificativa dos mandos e desmandos o Poder Divino dos Reis, e assim fazia-se o "Pacto
Social", pelo qual os súditos contratavam a própria submissão perante o Estado. Para além disso, a
burguesia, que havia lutado pela unificação dos Estados Nacionais, ficou de fora do poder político, da
gestão pública, pois o monarca, na hora de compor sua corte, não deu lugar de destaque aos burgueses,
indo buscar os membros nos antigos feudos, isto é, na aristocracia. Descontente com este estado de
coisas, a burguesia decide tomar de assalto aquele mesmo poder que ajudou a construir e investe contra o
Rei. A partir daí vêm os desdobramentos da Revolução Francesa, o que pode ser visto com bastante
didática em análises ao filme "Danton", que consegue recriar a época em que se bradava a "morte ao
Rei"!

Ressaltamos que John Locke (que viveu de 1632 a 1704) foi, juntamente com
Hobbes, o outro grande filósofo da época moderna, porém, de idéias contrárias, movidos por espíritos
diferentes, já que Hobbes era absolutista e Locke anti-absolutista. Aqui importa frisar que Locke,
inspirado no liberalismo inglês, advogou o regime de liberdade individual e de equilíbrio político,
procurando proteger o homem contra os abusos do Estado e os abusos do poder. Sua obra fundamental
recebe o nome de "Dois Ensaios sobre o Governo Civil" e nela vamos encontrar a filosofia política do
princípio de Liberdade, de equilíbrio, que constitui a base do Regime Democrático. Para ele, o
pressuposto da liberdade era a propriedade.

3.4. Início da Idade Contemporânea. Estado Liberal Clássico, Gendarme (Estado Polícia, Estado
Segurança ou Estado Guarda-Noturno), Não-interventor.

No início da Idade Contemporânea, outro discurso passa a justificar e a


fundamentar o exercício do poder político: da teoria da Soberania Divina dos Reis passa-se à teoria da
Soberania Popular, tendo para isso contribuído as formulações teóricas de grandes ideólogos, com
destaque para John Locke, Jean-Jacques Rousseau, Montesquieu (que viveu de 1678 a 1755) e Emmanuel
Joseph Sieyès. Para derrubar a Teoria do Direito Divino dos Reis, Rousseau apregoava que o soberano
não era o representante de Deus na terra, mas que deveria ser o representante do povo. Assim, a soberania
popular seria a expressão da vontade soberana de todos os homens, considerados livres e iguais por
natureza. Nascem aí os Estados Constitucionais limitados pelo Direito. Do mesmo modo, o famoso abade
Sieyès (que será melhor estudado quando formos tratar do Poder Constituinte Originário) havia lançado,
com seis meses de antecedência à Revolução Francesa, a sua não menos famosa obra "Que é o Terceiro
Estado?", que acabou se traduzindo na grande palavra de ordem destruidora da monarquia tradicional,
isto é, do Antigo Regime. Para Sieyès, o Terceiro Estado representava a Nação, entidade abstrata e
indefinível, mas que se concretizava na representação do povo e da burguesia. E a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, acolhendo as teorias de Sieyès, enunciou solenemente: "O princípio de
toda soberania reside essencialmente na nação". Passou a ser a nação, por conseguinte, titular do poder
supremo.

Para os ideólogos da burguesia revolucionária o Estado era uma criação da


sociedade civil, devendo a ela subordinar-se e somente teria legitimidade o Estado que fosse
representativo, isto é, cujos órgãos dirigentes fossem eleitos pelos cidadãos.

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Este modelo de Estado dos primórdios da Idade Contemporânea, isto é, logo após
os feitos revolucionários franceses de 1789, passou a receber a designação de Estado Gendarme, isto é,
aquele Estado que apenas fazia as vezes de um "Guarda Noturno", no sentido de que se limitava a
policiar a ordem pública, ou seja, era não-intervencionista. É este o Estado Liberal Clássico: aquele que
governa e administra, porém não interfere nas atividades econômicas privadas, nas relações contratuais
dos indivíduos, deixando isso para a "mão invisível do mercado". Diz-se liberal clássico porque foi
centrado no valor "liberdade", isto é, garantia a ampla liberdade dos cidadãos perante seu poder,
especialmente em relação à propriedade privada. Naquele contexto, o aforismo econômico laissez faire,
laissez passer (deixai fazer, deixai passar) traduziu o ditames da escola liberal: liberdade de produção e
liberdade de circulação, sendo defeso ao Estado intervir na ordem econômica, bem como proibido limitar
o direito de propriedade.

Mas ocorre que a alta burguesia, tão-logo realizada a Revolução e ter ascendido
ao poder, transformou-se em uma força conservadora, contrária a qualquer outro avanço revolucionário
fazendo com que, dentre todas as camadas sociais que integravam o Terceiro Estado, tivesse sido a que
colheu os melhores frutos da Revolução. Nasceram aí as desigualdades fáticas, que, tempos mais tarde,
com o acirramento das exclusões e das explorações sociais, iriam culminar com a imperativa necessidade
de entrar em cena um Estado que, pela intervenção na economia, pudesse corrigir esses defeitos de
origem do Estado liberal individualista.

3.5. Idade Contemporânea. Início do século XX. Estado-Providência, Estado do Bem-Estar Social,
Welfare State, Estado Intervencionista.

Como já adiantamos acima, com o incremento do liberalismo e da Revolução


Industrial, as explorações cometidas aos seres humanos pelo regime capitalista foram se acirrando,
devendo os trabalhadores laborarem sem qualquer proteção social ou legal, em jornadas diárias
trabalhistas em torno de 12 a 18 horas, muitas vezes chegando a 20, por salários miserentos e inclusive
diminuindo sobremaneira a expectativa de suas vidas. E o Estado Liberal Clássico, que não intervinha
neste tipo de relações privadas (entre trabalhadores e patrões) passou a não dar conta da crescente
situação de extrema pobreza e desigualdade social. A partir daí, os trabalhadores, sem a proteção do
Estado ausente, recorreram à violência como represália às relações trabalhistas não-regulamentadas e a
todas as demais injustiças cometidas à época. Neste contexto é escrito por Marx e Engels, em 1848, o
Manifesto do Partido Comunista, conclamando os "trabalhadores do mundo inteiro" para unirem-se na
defesa de seus interesses. No início do século XX ocorrem duas revoluções de cunho socialista (a
Revolução Russa e a Revolução Mexicana, de 1917), entre 1914 e 1918 ocorreu a Primeira Guerra
Mundial e tudo isso fez com que o Estado, de mero espectador passasse a ator, passasse a atuar a serviço
do bem comum. Em suma, foi preciso que os horrores da I Guerra Mundial alterassem profundamente as
condições econômicas e políticas do Estado para que se realizassem reformas de base e estrutura. Foram
estas complexidades da sociedade contemporânea, aqui sumariamente referidas, que retiraram o Estado
daquela passividade em que se viu imerso ao longo de quase dois séculos. A partir daí, nasce o que se
passou a chamar Estado Social, ou Estado do Bem-Estar Social, ou Welfare State, todos sinônimos para
designar um Estado intervencionista, providente, ou seja, aquele Estado que se obrigou a implementar um
sistema de previdência e de seguros sociais, de seguro desemprego, de habitação e educação às suas
populações pauperizadas. Foi o Estado obrigado a dirigir, a traçar normas, ao mesmo tempo restringindo
um tanto o indivíduo em sua autonomia contratual e contemplando interesses sociais, através da
intervenção nas atividades econômicas. O grande marco do surgimento deste modelo de Estado são as
Constituições Mexicana, de 1917 e a de Weimar, de 1919.
Mais tarde, após o crack da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, esta teoria do
Intervencionismo estatal ganhou mais um aliado, o teórico economista John Keynes (Keinesianismo =
Intervencionismo).

3.6. Fase atual. Globalização. Estado Neoliberal, Gestor ou Gerencial

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Após o já referido crack da Bolsa de Nova Iorque, veio a II Guerra Mundial e,


com a quebra quase total da Europa, foi preciso apelar para o Plano Marshall de reconstrução do
continente europeu, o que demandou novamente uma forte intervenção dos Estados de cunho social. Com
o passar do tempo, nas décadas de 80 e 90, foi-se percebendo que este tipo de Estado onerava muito os
cofres públicos e teve início uma "campanha" para enfatizar a idéia da necessidade de diminuir gastos
com seguro desemprego, com previdência social etc. Este movimento acaba por retirar o Estado da
economia, como se estivéssemos voltando ao liberalismo clássico, mas como o processo assume novas
feições, denomina-se neo; daí "neoliberalismo". Atualmente, esse encolhimento do Estado (teoria do
Estado mínimo) está sendo efetivado por meio de uma onda de privatizações e por um processo de
"Desregulamentação" das relações trabalhistas, incluindo flexibilização para as contratações trabalhistas
(contratações e dispensas temporárias), o que acaba sendo uma regulamentação por outros meios, já que
passa a garantir a sobrevivência dos grandes na área econômica, dos oligopólios. O Estado sai, aos
poucos, da intervenção econômica e passa a ser um mero "Gestor"; este é o modelo do Estado gerencial
apregoado pelo Ministro brasileiro da Administração e Reforma do Estado, Sr. Bresser Pereira.

Para se ter uma idéia básica e geral a respeito desse processo de globalização e
das nefastas conseqüências disso nas vidas dos trabalhadores, sugiro a leitura da obra "O Horror
Econômico", da francesa Viviane Forrester.]

E, lamentavelmente, parece que esse processo globalizador neoliberal veio para


ficar, fazendo com que os trabalhadores cheguem ao cúmulo de se submeterem a salários menores (o que
inclusive é inconstitucional para nós brasileiros), a jornadas menores, à desproteção legal, tudo para
poderem manter um emprego. E como diz Joan Robinson, na abertura da obra "Manual do Perfeito Idiota
Latino-Americano": "Só há uma coisa pior do que ser explorado pelo imperialismo: é não ser por ele
explorado".

4. Histórico do Constitucionalismo

Como a cada tipo de Estado corresponde um tipo de Constituição, procuraremos


dar, em rápidas pinceladas, uma visão a respeito do nascimento do que se chamou "constitucionalismo".
Embora o Constitucionalismo dito "moderno" só tenha iniciado em fins do século XVIII, iniciaremos
pela Antigüidade Clássica, pois lá já havia Constituições, embora com outras características, haja vista
que o próprio modelo de Estado de antanho possuía características bem diversas das que modernamente
se firmaram.

4.1. Antigüidade Clássica (época da fundação de Roma - século 8 a.C. - em diante)

A grande maioria dos autores de Direito Constitucional não menciona a existência


de Constituições na Antigüidade Clássica. Mas que as havia, havia. Porém, com outras funções e
características, e isto nos atesta o próprio Aristóteles, que buscou estudar as Constituições gregas.
Naquela época, a Constituição apenas organizava a Sociedade, como algo natural, e não o poder na
Sociedade, eis que não havia distinção entre Estado e Sociedade Civil. Assim, a idéia era a de uma
relação natural, a de uma constituição para o perfeito funcionamento do corpo social. Aliás, a própria
gênese da palavra CONSTITUIÇÃO demonstra que a mesma não vem da Ciência Política, mas sim da
Biologia, da idéia de Natureza, de constituição física de um corpo. E é por isso que era natural que
existissem escravos, que as mulheres e filhos fossem considerados res nulius ("coisas de ninguém") e que
obedecessem aos patriarcas e livres fossem apenas estes, que obedeciam apenas a Deus.

4.2. Idade Média - século XIII

Podemos dizer que a Inglaterra escreveu um primeiro capítulo na história do


Constitucionalismo dito "moderno", o que se deu em 1215, com a assinatura da Magna Cartha

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Libertatum, sendo esse o primeiro documento em defesa das liberdades, resultado da marcha dos barões
ingleses sobre Londres, em protesto às tiranias do Rei João Sem-Terra. É por isso que se considera a
Inglaterra o berço do Liberalismo.

Conta-nos Pontes de Miranda (1955, p. 11-4) que, morto Ricardo I (Ricardo


Coração de Leão), sucedeu-lhe no trono da Inglaterra seu tio João, que tantas anarquias, desastres e
arbitrariedades cometeu no novo governo até que a nação, por seus representantes mais tradicionais,
reagiu: os barões acordaram que era preciso obter do rei uma carta de liberdades, o que aconteceu a 19 de
junho de 1215. Depois de outorgada, no entanto, João Sem-Terra violou por várias vezes essa declaração
de 1215.

4.3. Idade Moderna

Um segundo capítulo na história do Constitucionalismo tem como protagonistas


novamente a Inglaterra e suas ex-colônias na América do Norte. Os acontecimentos que marcam o que
chamamos "Constitucionalismo Moderno" tiveram vez nos últimos quartéis dos séculos XVII e XVIII.

Primeiramente, há que se destacar, em 1689 (logo após a Revolução Inglesa, de


1688), a afirmação do Bill of Rights, que foi uma Declaração de Direitos para limitar o Poder Absoluto.

Na seqüência, em 1776, tem-se a Declaração de Independência de Virgínia, após


a rebelião das 13 colônias de origem britânica, formando a Confederação dos Estados Norte-Americanos.

E, por fim, em 1787, em Filadélfia, assina-se a primeira Constituição escrita da


história do Constitucionalismo, marcando a criação da Federação dos Estados Unidos da América do
Norte. Tal Constituição ainda está em vigor.

É interessante ressaltar que a Revolução Inglesa, de 1688, a revolução que marcou


a independência norte-americana e a Revolução Francesa formam o conjunto das assim denominadas
grandes "Revoluções Burguesas", sendo a francesa a mais radical revolução anti-feudal, conforme
veremos a seguir.

4.4. Idade Contemporânea. Constitucionalismo Liberal Clássico

Na França, em fins da Idade Moderna, a Monarquia Absolutista dos Bourbons


mantinha a divisão social em três classes: a nobreza, o clero e o povo, sendo que este compunha o que se
denominava Terceiro Estado, vivia na miséria e não participava no plano governamental, sequer para
fiscalizá-lo. E foi em tal contexto que, marcando o início da Idade Contemporânea, um importantíssimo
passo foi dado na erradicação dos resquícios do poder feudal e do absolutista monárquico: a Revolução
Francesa, eclodida em 1789, com a literal queda da Bastilha (símbolo maior do poder monárquico), tendo
sido capitaneada pelo assim denominado Terceiro Estado (burguesia, artesãos, operários e camponeses) e
excluído das benesses do Reino a nobreza parasitária que às suas custas vivia. Sobreveio-lhe, ainda no
mesmo ano, a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão e, logo após, em 1791, criou-
se, de forma popular representativa, a Primeira Constituição escrita da Europa, contemplando a laicização
do Estado (isto é, a separação entre a Igreja e o Estado) e registrando em seu texto outras tantas vitórias
das idéias democráticas, embora o Poder Executivo tenha continuado a ser exercido pelo Rei (a
República só foi proclamada em 1792) e houvesse sido instituído o voto censitário. A Nova Ordem foi
instituída sob a tríade Liberdade, Igualdade, Fraternidade, justamente o lema da bandeira francesa.

Esta Constituição Liberal Clássica continha como conteúdo básico, exatamente o


teor do artigo 16 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão: "Toda a sociedade na
qual a garantia dos direitos não estiver assegurada nem determinada a separação dos poderes, não tem
Constituição". Assim, seu duplo conteúdo essencial era: a) a tripartição do Poder em Executivo,

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Legislativo e Judiciário, visando com isso limitá-lo, já que, pela teoria clássica elaborada por
Montesquieu: "todo aquele que exerce o poder tende a dele abusar" e "só o poder freia o poder" (le
pouvoir arrête le pouvoir), limitação feita através do sistema de cheks and balances: "freios e
contrapesos"; b) a declaração dos direitos fundamentais do homem, que haviam sido negados durante
séculos e que agora passaram a ser exigidos como inatos, inalienáveis, imprescritíveis, anteriores e
superiores ao próprio Estado. Nasceram, assim, as Constituições, com a fundamental função de proteger a
pessoa humana contra os abusos de poder dos governantes.

É nesta fase do constitucionalismo que efetivamente o Poder Divino dos Reis


cedeu por completo ao Poder Soberano do Povo, ou seja, a partir de então o "contrato social" seria
redigido entre o povo e o Estado, por intermédio de representantes eleitos para tal. Assim, a idéia de
"contrato social" passa a coincidir com a idéia de Constituição, e de Constituição escrita.

E este modelo de Constituição escrita espraiou-se para outros países europeus


continentais (isto porque a Inglaterra seguiu na sua tradição de Constituição não-escrita) e por suas
colônias americanas, principalmente as de Portugal e Espanha, onde nos incluímos.

Mas importa ressaltar que, embora tenha representado um avanço grandioso na


conquista e no reconhecimento de direitos e na limitação do poder político, este modelo de
constitucionalismo - o liberal clássico - realizou, dentre o tripé que sustentou o movimento
revolucionário, muito mais e prioritariamente o valor "liberdade" (e por isso institui direitos que os
chamamos "negativos", "de oposição ao Estado", o que era necessário justamente para o exercício da
ampla liberdade dos indivíduos), deixando em segundo plano o valor "igualdade".

4.5.Idade Contemporânea. Constitucionalismo Social

Esta fase do constitucionalismo tem como principal característica a entrada de direitos sociais e
trabalhistas nos textos constitucionais, e isto deu-se grandemente por meio das assim denominadas
Normas Programáticas, ou seja, normas portadoras de programas para tentar realizar na prática o
valor/direito "igualdade". Aí começou-se a falar em "função social da propriedade", em direitos
educacionais e habitacionais, na disciplina das relações entre capital e trabalho, no direito à saúde e à
previdência social. O Estado foi, assim, chamado a efetivar direitos que até então só existiam nos textos
das leis, especificamente todos aqueles direitos ligados ao Direito à Igualdade. Por isso tais direitos são
tidos como "positivos", pois impõem obrigações positivas ao Estado. E isto significou uma guinada
daquele individualismo clássico do Liberalismo Clássico para o coletivismo, para o socialismo.

Em nível mundial ocidental, a primeira Constituição que teve essas preocupações


com o social, com o coletivo, foi a do México, de 1917 (que ainda está em vigor). Após, a Constituição
de Weimar, de 1919, teve um programa que contemplava esses direitos. Esta Constituição regeu a vida da
Alemanha do imediato pós-guerra até 1931, com a ascenção de Hitler ao poder (o período da história
alemã denominado "República de Weimar" foi de 1918 a 1931).

No Brasil, a Constituição de 1934 é tida como a versão sul-americana da


Constituição de Weimar. Direitos sociais e preocupações coletivistas seriam retomados, após, na
Constituição de 1946.

4.6. A Constituição no Neoliberalismo. Fase de “Desconstitucionalização"

Como reflexo direto da Globalização e do Neoliberalismo, as reformas à


Constituição visam retirar do seu texto aquelas normas que sustentam a tese da ingovernabilidade: em
não havendo como cumpri-las, tira-se-as da Constituição. E neste contexto de Nova Ordem Mundial, o
Consenso de Washington dita aos países "periféricos" (dentre estes o Brasil) atitudes a serem tomadas
pelos governos de plantões, especialmente no que se refere às imposições dos programas de privatizações

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e descentralizações, isto é, passando para a iniciativa privada o patrimônio que sempre foi público e que
foi construído com os tributos pagos pela população trabalhadora do País. Assim, pouco a pouco, o
Estado retira-se da economia, deixando tudo mais uma vez nas "mãos invisíveis do mercado" e esse
processo passa necessariamente por reformas às Constituições.

5. Estrutura e classificação das Constituições

5.1.Estrutura da Constituição

Geralmente as Constituições trazem suas normas agrupadas em TÍTULOS, os


quais, de maneira sistematizada, são divididos em CAPÍTULOS, e estes em SEÇÕES e SUBSEÇÕES,
que agrupam os ARTIGOS, com seus INCISOS (algarismos romanos) e ALÍNEAS (letras minúsculas do
nosso alfabeto), em função da conexão do conteúdo específico que as vincula. Convém salientar que
inciso de artigo faz parte do caput (cabeça) desse artigo, já o parágrafo (§) possui uma certa autonomia
em relação ao caput.

Quanto à estrutura de nossa Lei Maior, a Constituição Federal de 1988, é


composta por 320 artigos, tendo 246 destes em sua parte fixa e 74 dispositivos denominados de
"Disposições Constitucionais Transitórias" - ADCT. Estes dispositivos possuem vida útil curta, pois uma
vez desenvolvidos, cumpridos, perdem seu valor enquanto ordem, restando apenas como parte histórica
no texto da Constituição.

Antes da numeração sucessiva dos seus 320 artigos, possui a CF/88 um


Preâmbulo, após o qual os 246 artigos referidos encontram-se divididos em 9 grandes TÍTULOS, os
quais por sua vez dividem-se em Capítulos, Seções e Subseções, conforme o conteúdo que agrupam, cada
um deles representando um assunto específico.

Os nove Títulos referidos são:

I - Dos Princípios Fundamentais


II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais
III - Da Organização do Estado
IV - Da Organização dos Poderes
V - Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas
VI - Da Tributação e do Orçamento
VII - Da Ordem Econômica e Financeira
VIII - Da Ordem Social
IX - Das Disposições Constitucionais Gerais

5.2. Classificação das Constituições

Trazemos aqui as quatro grandes classificações em que comumente são as


Constituições enquadradas.

5.2.1.Quanto à forma.

1)- Escritas ou Positivas: aquelas postas em documentos formais, em um corpo


textual único. Acompanharam o processo de racionalização do Direito e tiveram origem no "Contrato
Social" de Rousseau, só podendo ser modificadas pela soberania popular. Em geral, as Constituições dos
Estados modernos são escritas e codificadas, por pelo menos três razões comprovadas, conforme Paulo

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Bonavides (1996, p. 69): a) crença na superioridade da lei escrita sobre o costume; b) a imagem
simbólica de que quando se criasse uma Constituição estar-se-ia renovando o "contrato social"; c) a
concepção firmada desde o século XVIII de que não há melhor instrumento de educação política do que o
texto de uma Constituição. Aqui fazemos uma crítica: esta última razão só se justifica onde a população à
Constituição tem acesso!

Exemplos: a Constituição dos EUA; todas as do Brasil; a da França, da Espanha,


da Itália, da Argentina, do Paraguai, etc.

É importante ressaltar que em relação às Constituições Escritas poderia haver


ainda uma classificação que as dissessem Imutáveis ou Fixas, mas isto possui apenas valor histórico, mais
especificamente referindo-se às Leis Fundamentais antigas, como o Código de Hamurabi e a Lei das XII
Tábuas, que, tendo surgido com a pretensão de eternidade, não podiam ser modificadas sob pena de
maldição dos deuses.

2)- Não-escritas, Costumeiras ou Consuetudinárias: por não serem escritas, são


praticamente auto-explicativas; aquelas que se baseiam nos costumes e nas tradições observadas
espontaneamente por um povo, secularmente transmitidas. Predominaram até os fins do século XVIII, em
grande parte coincidindo com os regimes absolutistas. Atualmente são em número muito reduzido e
podemos dizer que são "impostas" pela prática.

Exemplos: o exemplo clássico vem da Inglaterra (que entretanto também se


baseia em alguns textos fundamentais escritos); a da Hungria e a da Nova Zelândia.

5.2.2. Quanto à origem

1)- Democráticas, Populares ou Promulgadas: aquelas que têm origem em órgão


constitucional eleito especialmente eleito pelo povo para tal finalidade, por meio de sufrágio universal e
direto. São elaboradas pelas Assembléias Nacionais Constituintes, como expressão do Poder Constituinte
Originário, isto é, exprimindo o princípio político e jurídico de que todo o governo deve ser legitimado
pelo consentimento dos governantes.

Exemplos: As brasileiras de 1891, de 1934, de 1946 e de 1988, embora seja esta


última questionável quanto à legitimidade de sua origem, uma vez que os Deputados Federais e os
Senadores da República eleitos em 1986 não o foram com a exclusiva finalidade de criação da
Constituição e, além disso, não podemos nos esquecer que, como a renovação do Senado Federal se dá de
quatro em quatro anos, por um e dois terços, havia Senadores eleitos em 1982 (cujo cumprimento do
mandato de 8 anos dar-se-ia em 1990), os quais, com certeza não foram eleitos para o fim de elaborar a
nova Constituição, até porque em 1982 ainda nem se cogitava uma efetiva feitura de novo texto
constitucional.

2)- Outorgadas: são aquelas impostas pelo detentor eventual do poder. Assim,
não resultam da manifestação da soberania popular. A outorga aproxima-se das formas totalitárias de
governo, uma vez que suprime do povo o exercício do poder de fazer a Constituição, através de seus
representantes eleitos.

Exemplos: as brasileiras de 1824 (imposta por D. Pedro I), de 1937 (imposta pelo
ditador Getúlio Vargas), de 1967 (esta é também denominada "Atípica", por ter sido outorgada pelo
Congresso Nacional, mas em função ordinária, isto é, sem delegação constituinte, o que não lhe retira o
caráter de outorga) e a de 1969.

3)- Pactuadas: aquelas que exprimem um compromisso entre duas forças


políticas rivais, como por exemplo, na época dos primórdios do constitucionalismo, a realeza absoluta
debilitada e a nobreza de um lado e, de outro, a burguesia em franca ascenção. Desse pacto resultou a

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Monarquia Limitada ou Monarquia Constitucional. Formam uma categoria de Constituições históricas,


pois dificilmente as veremos nos dias atuais.

Exemplos: o já mencionado documento constitucional Bill of Rights, de 1689 e a


Magna Cartha inglesa, de 1215, firmada entre os barões e o Rei João Sem-Terra.

5.2.3. Quanto à consistência, à estabilidade ou à mutabilidade

Esta classificação deve-se a James Bryce, referindo-se à maior ou menor


facilidade para a modificação dos textos constitucionais, sempre tendo como parâmetro de comparação as
leis ordinárias. Assim, quanto à mutabilidade as Constituições podem ser:

1)- Rígidas: as que exigem a observância de procedimento diferenciado e mais


complexo para sofrerem alterações em seus textos, sempre em relação às leis ordinárias. Assim, não
podem ser alteradas pelo processo comum de elaboração das leis ordinárias, pois requerem debates mais
amplos, prazos dilatados e quóruns qualificados. São adotadas pela maioria dos países contemporâneos.
Esta diferença no processo de reforma visa proteger a Constituição dos golpes de força das maiorias
partidárias, de tendências oportunistas de grupos políticos predominantes e da exaltação dos ânimos em
momentos de crise nacional.

Exemplos: a dos EUA; todas as brasileiras, exceto a Imperial.

2)- Flexíveis ou Plásticas: aquelas que sofrem alterações da mesma maneira pela
qual se elabora ou modifica qualquer espécie normativa, isto é, não exigem nenhum requisito especial de
reforma. Certo é que só servem para nações democráticas evoluídas e de alto nível cultural.
Exemplo: o exemplo clássico é da Constituição da Inglaterra, onde o Parlamento
tem função de Poder Constituinte Originário permanente.

3)- Semi-rígidas: aquelas que possuem parte de seu texto rígido, parte flexível,
mas isto não quer dizer que não possam ser modificadas. Todas as Constituições podem sofrer alterações,
o que varia apenas é o grau de dificuldade ou de facilidade para tanto. Assim, nas semi-rígidas, parte do
texto é modificado como o são as leis ordinárias, e parte requer para sua mutação os procedimentos
rigorosos e difíceis próprios das Constituições rígidas.

Exemplo: a Constituição Imperial brasileira (de 1824) que, pela regra do art. 178
criou uma terceira categoria de Constituições, integrando parte de dispositivos rígidos, parte flexíveis,
isto é, vindo a ser semi-rígida.

Devemos ressaltar que a atual Constituição brasileira instituiu, com relação a


algumas matérias, as chamadas cláusulas pétreas, ou seja, dispositivos constitucionais que são inalteráveis
até mesmo pelas Emendas à Constituição. Esses dispositivos somente poderão ser alterados pelo Poder
Constituinte originário.

O § 4° do art. 60 estabelece que não serão objeto de alteração através de


Emendas:
-a forma federativa de Estado
-o voto direto, secreto, universal e periódico;
-a separação dos Poderes;
-os direitos e garantias individuais;

5.2.4. Quanto à extensão

1)- Concisas: são as sintéticas, breves, sumárias; as que apresentam texto enxuto,
sucinto. Abrangem somente direitos e princípios gerais, bem como regras básicas de organização e

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fundamento dos sistema político-jurídico estatal, deixando as pormenorizações à legislação complementar


ou ordinária e, por isso mesmo, atendem à metáfora do "guarda-chuva", como se suas regras básicas
fossem as poucas varetas que o compõem. São as Constituições do tipo "clássicas", qual seja, aquelas que
contemplam apenas o conteúdo básico apregoada pelo já conhecido art. 16 da Declaração Universal dos
Diretos do Homem e do Cidadão.

Exemplo: a dos EUA, que, desde 1787, possui apenas 7 artigos e 26 emendas.

2)- Prolixas: são aquelas ditas inchadas, extensas, longas, que apresentam texto
amplo. Também chamadas "Analíticas" por alguns autores, devido justamente à sua extensão. Cada vez
mais numerosas, geralmente contemplam regras programáticas e apresentam caráter polifacético por
albergarem normas não apenas materialmente, mas sobretudo formalmente constitucionais. Até parece
que o que não está na Constituição não está no mundo, mas isso tem uma razão de ser: as matérias de
natureza alheia ao Direito Constitucional propriamente dito adentram nos textos das Constituições,
visando garantias que só as próprias Constituições proporcionam em toda a amplitude.

Exemplos: a brasileira de 1988 - originalmente contendo 315 artigos, atualmente


está com 324; a de Portugal (de 1976), que possui 296 artigos mais a Lei do Tribunal Constitucional; a da
Espanha (de 1978); a Constituição da República do Paraguai, com 311 artigos e a da República da Índia,
com 395 artigos. Longe estão, como vemos, de ser Constituições "Clássicas".

Aqui vale uma observação: praticamente todas estas Constituições extremamente


extensas surgiram em contextos de larga desconfiança em relação a recém-extintos regimes militares
ditatoriais, o que fez com que se quisesse pôr o máximo de direitos nos textos constitucionais justamente
para que aí desfrutassem da garantia de não serem suprimidos com tanta facilidade. Ocorre que isto
configura uma "faca de dois gumes", pois, se de um lado realmente elevou vários direitos à categoria de
constitucionais, por outro lado, dá azo aos argumentos de "ingovernabilidade", ou seja, fortalece aqueles
ataques à Constituição que afirmam que é impossível governar com uma Constituição tão inchada e isso
vem, paradoxalmente, apressar a sua reforma.
5.3. Classificação da Constituição Federal brasileira de 1988

Aplicando as tipologias a respeito das Constituições acima vistas, temos que a


Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é: escrita quanto à forma como se apresenta;
promulgada, democrática ou popular quanto à sua origem; rígida quando à sua alteração e prolixa ou
analítica quanto à sua extensão.

Estudo dirigido

1. O que devemos entender por Estado?


2. O que significa Estado Constitucional de Direito?
3. Qual foi o pensador da Idade Moderna a contrariar o pensamento deísta de Idade Medida com
relação ao poder no Estado?
4. A que ramo do Direito pertence o Direito Constitucional?
5. De que trata a Constituição?
6. Cite três expressões diferentes que são empregadas para designar “constituição”.
7. O que acontece com a lei ordinária que diverge dos princípios constitucionais?
8. Como se classificam as constituições quanto a forma?
9. Citar os tipos de constituição quanto à origem e explicar a diferença entre eles.
10. O que se entende por constituição flexível?

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11. Como se classifica a atual constituição brasileira com relação a sua extensão?
12. Quais são as disposições de nossa Constituição que não podem ser modificadas através de
Emendas?

PREÂMBULO

O preâmbulo é um recurso utilizado a título de introdução ao texto


Constitucional. João Barbalho ensina: “O preâmbulo enuncia por quem, em virtude de que autoridade e
para que fim foi estabelecida a Constituição. Não é uma peça inútil ou de mero ornato na construção dela:
mas simples palavras que constituem, resumem e proclamam o pensamento primordial e os intuitos dos
que o arquitetam”.1

Nem todas as constituições têm preâmbulo. No entanto, ele sempre existiu nas
constituições brasileiras, e por duas vezes (1891 e 1937) nele omitiu-se a invocação do nome de Deus.

Não há unanimidade de opinião entre os autores a respeito do caráter coativo do


preâmbulo. José Celso de Melo Filho afirma: “O preâmbulo não tem valor normativo, já que nele não se
contém qualquer regra de direito positivo. Dessa forma, os princípios que enuncia não são obrigatórios.
Servem como diretrizes para a ação do poder público”. 2 Por outro lado, Giese, no livro “A Constituição
do Estado Alemão”, afirma que o preâmbulo é parte integrante da Constituição, como uma reprodução
sintética e popular de seu conteúdo.3

O preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, refere-


se à Assembléia Nacional Constituinte, formada de representantes do povo, buscando estabelecer um
regime democrático, ou a democracia como forma de governo, enunciando e garantindo os direitos
individuais, políticos, sociais e econômicos, em um mundo fraterno e de paz, tendo como forma de
Estado o regime federativo.
1
BARBALHO, João. Constituição Federal Brasileira. 2ª ed., Rio de Janeiro: 1924,
p. 3.
2
MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada. 2ª ed., Rio de
Janeiro/São Paulo, 1986, p. 20.
3
GIESE, Friedrich. Grundgesetz fuer die Bundesrepublik Deutschland Kommenta.
4ª ed., Frankfurt: 1955, p. 9-11:

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As palavras introdutórias da nossa Constituição anunciam os propósitos


fundamentais da mesma. Além disso, devemos esclarecer que, ao ser jurada sob a proteção de Deus, a
Constituição Federal professa um teísmo, embora isso não queira significar união entre Igreja e Estado,
eis que vigente entre nós, desde 1891, o Princípio da Separação entre Estado e Igreja. Assim, no
Preâmbulo apenas se professa um teísmo, sem se dizer qual Deus.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
ART. 1° ao 4°

O prof. Nelson Godoy faz os seguintes comentários a respeito dos Princípios


Fundamentais estabelecidos na Constituição brasileira de 1988:

“Assim como cada ciência é gerada por princípios ou cânones, também a


Constituição oferece seus princípios fundamentais, sem os quais não se pode, de maneira alguma,
interpretar a Constituição. Destarte, a Constituição estabelece, como base de seu funcionamento, o
sistema democrático, a forma federativa de Estado e a forma republicana de governo.”

Por serem normas com um âmbito de validade muito maior do que qualquer
outra norma, servem os princípios constitucionais como critério de interpretação e de integração do
direito posto, dando coerência geral ao sistema jurídico.

Em vista disso, é necessária muita atenção aos Princípios Constitucionais, eis que
dão a diretriz axiológica, isto é, demonstram quais os valores devem ser respeitados, observados,
mantidos na Interpretação Constitucional. Para aferir a essência, o "espírito" de uma norma, necessário se
faz conhecer o todo normativo, para poder ver, em cada caso, concreto ou abstrato, qual é o Princípio ou
quais são os Princípios que orientam a interpretação.

Mas ao lado e de forma a complementar essa principal função dos princípios


constitucionais, qual seja, a de servir de vetor para a interpretação, outras funções evidenciam-se, sendo
que todas acabam por reforçar a aplicabilidade da Constituição. Assim, os princípios constitucionais são
necessários à efetivação da garantia constitucional dos Direitos Fundamentais, através dos direitos da
ação e da defesa. Ademais, exercem função fundamentadora, supletiva, diretiva e limitativa, neste último
caso, especialmente para normas programáticas.

O Princípio Republicano e o Princípio Federativo. Já sabemos que o Federalismo


nasceu com a Constituição norte-americana de 1787 e que o Brasil assumiu a forma de Estado Federação
em 1889, com a proclamação da República, eis que se queria a "Federação, com ou sem Corôa". Essa
vocação federativa nos foi ditada pela dimensão territorial, e foi a mesma mantida nas Constituições
posteriores, embora o federalismo das Constituições de 1967 e de 1969 tenha sido apenas "nominal",
devido à centralização autoritária então vigente. O mesmo ocorreu na Carta de 1937, quando o
federalismo cedeu lugar ao unitarismo, para que houvesse condições para o exercício da ditadura então
implantada e que duraria até 1945.

A nossa FEDERAÇÃO consiste na união de coletividades regionais autônomas,


denominadas ESTADOS FEDERADOS, ESTADOS-MEMBROS ou simplesmente ESTADOS (em
número de 26), DISTRITO FEDERAL e MUNICÍPIOS. Cumpre-nos observar que os TERRITÓRIOS
FEDERAIS foram extintos pelos artigos 14 e 15 do ADCT, mas podem vir a ser criados, só que, em tal
ocorrendo, não farão parte da Federação, e sim da União (cf. art. 18, § 2º). Correlato aos Princípios
Republicano e Federativo, destacam-se os Princípios da Autonomia Municipal (este se por um lado,
conforme o art. 18, aumentou a autonomia dos entes municipais, por outro lado também lhes acarretou
um aumento de responsabilidades e das competências materiais dos mesmos) e o da Indissociabilidade,

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ou da Indissolubilidade, vedando a separação de qualquer ente federado para a formação de outra


Federação que não a já existente.

Ainda quanto ao Princípio Federativo, devemos frisar que SOBERANIA só o


Estado Federal a possui, como o único titular da capacidade de auto-determinação. Já os Entes Federados
apenas possuem AUTONOMIA, isto é, são titulares apenas desta prerrogativa, que redunda em governo
próprio dentro do círculo de competências traçadas pela Constituição Federal.

Quanto ao Princípio Republicano, desde Maquiavel (1513) que, pela teoria


política, todos os Estados ou são REPÚBLICAS ou PRINCIPADOS. A REPÚBLICA pressupõe eleição
periódica do Chefe de Estado, a divisão do poder em três funções distintas, e implica na necessidade de
legitimidade popular do Presidente da República, dos Governadores dos Estados e dos Prefeitos
Municipais, ou seja, dois dos seus poderes (Executivo e Legislativo derivam de eleições populares). A
característica da "temporariedade dos mandatos eletivos" tem como conseqüência a não-possibilidade de
reeleição dos cargos políticos unipessoais, para evitar a vitaliciedade dos cargos políticos (própria de
Regimes Monárquicos, de poderes absolutos, unitários) que são exercidos por uma única pessoa, como é
o caso do Poder Executivo (o Legislativo é sempre exercido por órgãos colegiados). Por isso é que a
Emenda da Reeleição (a de número 16) sofreu tantas acusações de inconstitucionalidade, além de ter sido
uma das mais custosas a ser aprovada.

Agora existe uma articulação para estabelecer uma espécie de


"semipresidencialismo" (mesclando institutos parlamentaristas, como a existência de um Primeiro-
Ministro) e permitir um terceiro mandato para o atual Presidente da República, o que seria violentar a
vontade popular, eis que no plebiscito de 1993, o parlamentarismo foi rotundamente rejeitado pelo voto
direto, livre e soberano do eleitorado brasileiro.

Por fim, relembramos que, pela atual Constituição, o Princípio Republicano não é
mais protegido contra Emenda Constitucional tendente a aboli-lo.

O Princípio do Estado Democrático de Direito. Já dizia o estadista inglês Winston


Churchill, que a democracia é o pior de todos os regimes, exceto todos os demais! É dizer: de tudo o que
se conhece, embora tenha suas deficiências, a democracia ainda é o que de melhor temos para o convívio
e a regência da humanidade. E o Estado Democrático de Direito é o regime jurídico que auto-limita o
poder do governo ao cumprimento das leis que a todos subordinam, inclusive a si próprio.

Em 1988, a instituição de um Estado Democrático de Direito por uma Assembléia


Nacional Constituinte significou a celebração de um pacto político entre o povo brasileiro (do qual todo
poder emana) e um novo Estado que ali nascia, que ali se configurava e, em certa medida, se prometia.
Além de dever respeito à Constituição, o adjetivo Democrático quis evidenciar ser o Estado fundado na
Soberania Popular, visando a realização dos valores igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana.

Neste sentido, José Afonso da Silva (1998, p. 1-2) diz que a Constituição Federal
brasileira de1988, ao instituir uma nova idéia de Direito e uma nova concepção de Estado - o Estado
Democrático de Direito - inspirou-se em princípios e valores que incorporaram um componente de
transformação da situação anteriormente existente, dentre os quais refere:

a) o Princípio Democrático - que há de constituir uma democracia representativa e


também participativa, pluralista, e que seja a garantia geral da vigência e da eficácia dos direitos
fundamentais, conforme se depreende do art. 1º da CF/88;

b) o Princípio da Proteção dos Direitos Fundamentais - compreendendo os


direitos individuais, coletivos, políticos e sociais e procurando realizar a justiça social.

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Após, nos cinco incisos do art. 1º encontramos os Fundamentos do Estado


Brasileiro:
I - a soberania - trata-se aqui da soberania nacional, entendida como a capacidade
para fazer valer suas decisões dentro de seu território e de estar em pé de igualdade com qualquer outra
nação soberana do universo; é o poder político supremo e independente, não limitado por nenhum outro
na ordem interna e em pé de igualdade com os poderes supremos dos outros povos, só acatando regras
voluntariamente aceitas;

II - a cidadania - que aí aparece em um sentido mais amplo do que o da mera


titularidade de direitos políticos. Para além da soberania popular (enquanto expressão da vontade popular,
possibilitada pelo conjunto dos direitos políticos previstos no art. 14), envolve: o conceito de dignidade
da pessoa humana e os objetivos da educação (art. 205 e art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias), como metas do regime democrático;

III - a dignidade da pessoa humana - este é o valor supremo que norteia e atrai o
conteúdo de todos os demais direitos fundamentais humanos. Para sua efetividade requer:

- uma ordem econômica que assegure a todos a existência digna (art. 170);
- uma ordem social que vise a realização da justiça social (art. 193);

- a função social da propriedade (art. 5º, XXIII) - como combate à valorização


especulativa (fundiária, urbana e até das empresas);

- educação e preparo da pessoa para o exercício da cidadania (art. 205).

Aqui registramos uma informação supletiva, que se refere a uma recente decisão
do Tribunal Constitucional da Hungria, no sentido de excluir dos benefícios econômicos da globalização
todas aquelas empresas (e quiçá países!) que cometem violações à dignidade da pessoa humana.
Violações deste tipo são comuns no Brasil, onde temos desde trabalho escravo até a exploração do
trabalho infantil. E aí perguntamos se com um quadro desses é possível dizer que há dignidade para as
pessoas humanas?

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa - há que se notar que aqui


não se trata de garantia de emprego, mas sim do direito a uma remuneração justa e a mínimas condições
para o desenvolvimento das atividades. Poderão perguntar os senhores: em época de desemprego
estrutural de que vale uma regra destas?

V - pluralismo político - que deve ser interpretado conjuntamente com o teor do


artigo 17 da Constituição. Significa a existência de pelo menos mais de um partido político disputando o
poder político, especialmente para possibilitar o exercício da oposição e do controle do Estado, o que
nem sempre foi possível em nossa história político-constitucional, eis que já tivemos bipartidarismo
forçado e mesmo a suspensão de todos os partidos políticos, bem como das eleições.

No Parágrafo Único do art. 1º temos o Princípio da Soberania Popular,


permitindo ao povo (governados) uma efetiva participação no processo de formação da vontade política
(governo), direta ou indiretamente. Este princípio firmou-se com o advento do Estado Liberal Clássico,
quando realizou-se a separação entre Estado (espaço público, do poder e da política) e Sociedade Civil
(espaço privado da vida econômica). Por esse princípio, o povo deve governar-se, mas ante a
impossibilidade de todos atuarem diretamente no poder, passa-se a governar através de alguns
representantes eleitos (Democracia Representativa ou dita Indireta) ou se exerce o poder por outros
mecanismos próprios da Democracia Direta, cujo exemplo histórico mais marcante é o do povo grego
reunido na praça (na Ágora), e que na CF/88 concretizam-se pela Iniciativa Popular de Lei, pelo
Plebiscito e pelo Referendo.

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Na seqüência, o art. 2º trata do Princípio da Separação dos Poderes - que talvez


seja justamente o que a Constituição tenha de mais caro, inclusive historicamente, por ser a garantia
básica do cidadão contra o exercício arbitrário do poder pela autoridade pública. Pela CF/88 temos a
separação tripartite (Montesquieu), em Executivo, Legislativo e Judiciário, mas nem sempre foi assim,
eis que na Constituição do Império tivemos a separação quadripartita, com a presença do Poder
Moderador.

É este um princípio essencial à Democracia, pois visa impedir a prepotência do


Estado sobre os indivíduos e de um dos poderes sobre os demais e, assim, reunindo um dos Poderes mais
de uma função do Estado, passamos a estar à beira de uma tirania. A exceção mais marcante ao princípio
clássico da separação dos poderes na CF/88 está na possibilidade de adoção de Medidas Provisórias com
força de lei pelo Presidente da República (art. 62).

O Art. 3º trata dos Objetivos Fundamentais da República Federativa Brasileira,


pela primeira vez consignados. Por eles, deve o Estado brasileiro agir no campo interno tendo em vista o
atendimento aos seguintes objetivos:

"I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;


II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras formas de discriminação".

Quanto aos três primeiros objetivos podemos registrar uma crítica à histórica
tradição dos governantes brasileiros de reduzir a questão nacional do subdesenvolvimento e das chagas
sociais à "teoria do crescimento do bolo", isto é, os marginalizados e as regiões mais pobres seriam
incluídos nos bolsões de riqueza nacionais quando enfim o país se desenvolvesse o bastante. E para
propiciar esse desenvolvimento seletivo, investe-se pesado, inclusive com a contração de empréstimos
internacionais. Mas ocorre que um tal modelo de desenvolvimento acirra exponencialmente as
desigualdades sociais e, assim, adia-se indefinidamente a resolução de problemas que foram elevados à
categoria de Princípios Constitucionais e que, portanto, são ordens aos governos, não meros conselhos.

Quanto ao quarto inciso podemos mencionar a iniciativa do próprio constituinte


originário em ter transformado o crime de racismo em inafiançável e imprescritível. Do mesmo modo,
louvável foi o advento da Lei nº 9.459/97, que amplia as hipóteses de crime por racismo, bem como
aumentou a pena (reclusão de 1 a 3 anos e multa) ao injuriador por cor, raça, etnia, religião ou origem,
além de punir a divulgação do nazismo.

E, por fim, o Art. 4º estabelece os Princípios com os quais o Brasil deverá reger
suas Relações Internacionais, definindo assim a posição da República Federativa do Brasil frente aos
demais Estados estrangeiros, reafirmando sua Soberania, o respeito à autodeterminação dos povos, à
igualdade entre os Estados e à independência nacional, o não-intervencionismo, a solução pacífica dos
conflitos internacionais (por meio da defesa da paz), o repúdio ao terrorismo e ao racismo, a prevalência
dos direitos humanos, a concessão de asilo político e a cooperação entre os povos para o progresso da
Humanidade. Em seu Parágrafo Único positiva a autorização para a entrada no MERCOSUL, por
exemplo, assim dizendo o texto: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica,
política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-
americana de nações".

Estudo dirigido

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O aluno deverá fazer uma leitura atenta dos artigos 1° ao 4° da Constituição Federal e,
posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar resposta “sim” ou “não”,
deverá ser justificada.

1. Como se classifica o Brasil face à Constituição de 1988, no que se refere à forma de Estado,
governo e regime político?

2. Em que consiste a forma republicana?

3. O que é um Estado federado?

4. Quais são os poderes dos Municípios brasileiros?

5. Quais são os poderes clássicos do Estado?

6. A Constituição da República Federativa do Brasil é aberta por um Preâmbulo, no caso:


a)- um resumo da Constituição.
b)- uma sinopse do texto constitucional.
c)- uma declaração solene, contendo o objetivo, as características e a promulgação do texto
constitucional.
d)- o capítulo final da Constituição.
e)- nenhuma das alternativas.

7. Por pluralismo político, podemos entender:


a)- o direito de um só partido comportar várias ideologias, mesmo que díspares.
b)- a possibilidade de criação e a convivência de partidos de diferentes tendências políticas.
c)- o direito a um partido de ampliar seu quadro de filiados.
d)- a ação de um determinado partido em várias frentes de ação.
e)- todas estão corretas.

8. O art. 1º e incisos da Constituição dispõe que a República Federativa do Brasil constitui-se em


Estado Democrático de Direito e tem como fundamento:
a)- a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução da criminalidade e das desigualdades
sociais e regionais.
b)- a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a garantia do desenvolvimento nacional.
c)- a soberania, a cidadania, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político
e a dignidade da pessoa humana.
d)- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação.
e)- a independência e a harmonia entre os Poderes da União.
9. “A República Federativa do Brasil, formada pela ......indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em............ “.
a)- união - estado de Direito.
b)- união - Estado Democrático de Direito.

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c)- União - Estado Democrático de Direito.


d)- União – Estado de Direito.
e)- nenhuma das alternativas.

10.Classifica-se como.........a República com regiões dotadas de autonomia para se auto-organizar através
de constituições próprias:
a)- Liberal.
b)- Anárquica.
c)- Democrática.
d)- Federativa.
e)- nenhuma das alternativas.

11. Incluem-se entre os Princípios Fundamentais da Constituição:


a)- a pluralidade orçamentária e a soberania.
b)- a descentralização administrativa e a cidadania.
c)- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
d)- a valorização dos Municípios e o controle do Poder Executivo.
e)- a dependência entre os Poderes e o pluralismo político.

12. O parágrafo único do art. 1º da Constituição reza que “Todo o poder emana do povo, que o exerce
por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. São exemplos de
poder exercido DIRETAMENTE pelo povo:
a)- voto e plebiscito.
b)- voto e referendo.
c)- plebiscito e referendo.
d)- todas as alternativas.
e)- nenhuma das alternativas.

13. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, exceto:


a)- garantir o desenvolvimento nacional.
b)- conquistar a independência nacional.
c)- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras
formas de discriminação.
d)- construir uma sociedade livre, justa e solidária.
e)- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.

14. O artigo 4º da CF normatiza que dois dos princípios a serem seguidos pelo Brasil em suas relações
internacionais são os de “igualdade entre os Estados” e “concessão de asilo político”.
Respectivamente, isso equivale a dizer que o Brasil:

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a)- apenas em princípio considera iguais os países e a permissão do ingresso de ativistas em seu
território.
b)- trata igualitariamente todos os países e abriga os exilados pó motivos políticos.
c)- jamais privilegiará o Estado do Rio de Janeiro em detrimento do Estado do Acre, e permitirá o
ingresso, no território nacional, de exilados por motivos políticos.
d)- abriga os exilados por motivos políticos e respeita igualitariamente tanto uma grande potência
quanto um peque país.
e)- nenhuma das alternativas.

15. O Brasil em suas relações internacionais, rege-se pelos seguintes princípios, exceto:
a)- independência nacional e prevalência dos direito humanos.
b)- soberania nacional e combate ao tráfico internacional de drogas.
c)- autodeterminação dos povos e defesa da paz.
d)- solução pacífica dos conflitos e repúdio ao terrorismo e ao racismo.
e)- concessão de asilo político e igualdade entre os Estados.

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OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais do homem são aqueles oriundos da própria condição


humana, direitos contra os quais nenhuma lei pode prevalecer e que estão previstos pelo ordenamento
constitucional. Além desses direitos, há os remédios constitucionais-processuais, chamados de garantias
constitucionais, que são os meios oferecidos para a proteção dos direitos humanos.

Nossa Constituição divide os Direitos Fundamentais em cinco capítulos distintos:


a)- Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos (art. 5°); b)- Dos Direitos Sociais (arts. 6° ao 11); c)-
Da Nacionalidade (arts. 12 e 13); d)- Dos Direitos Políticos (arts. 14 a 16) e e)- Dos Partidos Políticos
(art. 17).

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS


Art. 5°

Nossa Constituição assegura a inviolabilidade de cinco direitos fundamentais: a)-


direito à vida; b)- direito à liberdade; c)- direito à igualdade; d)- direito à segurança e e)- direito à
propriedade.

Os direitos individuais e coletivos, bem como as garantias constitucionais-


processuais ainda se estendem aos estrangeiros residentes no país. Como já vimos anteriormente o
sentido da expressão “estrangeiros residentes” deve ser interpretado extensivamente para proteger não só
os estrangeiros com residência fixa no país, bem como todos os que estiverem em território nacional. Por
outro lado, verificamos que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu o direito aos não-residentes no
país de terem acesso às ações, ou seja, as garantias constitucionais-processuais. Assim, o estrangeiro não
residente no país poderá lançar mão das garantias constitucionais para a defesa de seus direitos.

As garantias constitucionais são em número de cinco: a)- Mandado de Segurança


(individual e coletivo); b)- Habeas corpus; c)- Ação popular; d)- Mandado de injunção e e)- ou
Habeas data.

Mandado de Segurança - É o remédio jurídico que serve para proteger direito


líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data. Direito líquido e certo é aquele que não
precisa ser declarado com exame de provas, pois resulta de fato certo que pode ser provado por
documentos inequívocos.

O mandado de segurança é a defesa mais eficaz contra qualquer ilegalidade que


possa atingir os direitos fundamentais do homem, desde que não se trate da liberdade de locomoção.

Habeas Corpus - É o remédio jurídico que tem por finalidade garantir a


liberdade física de ir, vir, ficar, a liberdade física de locomoção. Qualquer brasileiro, em favor de
qualquer compatriota ou estrangeiro, poderá impetrá-lo.

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Mandado de Injunção - É o remédio jurídico que tem por finalidade garantir o


exercício de direitos concedidos pela Constituição quando não existir leis específicas que garantam esse
exercício.

Habeas Data - É o remédio jurídico que tem por finalidade possibilitar ao


indivíduo saber se tem ficha em órgão de informação, o que dela consta e, se necessário, mandar fazer
retificações. Assegura ao indivíduo acesso às referências e informações sobre sua pessoa em entidade
pública ou privada, bem como, garante a retificação de dados incorretos.

Ação Popular - É o remédio jurídico que permite ao cidadão (pessoa no


exercício dos direitos políticos) obter a invalidade dos atos lesivos ao patrimônio público e assegura a
defesa da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural.

Estudos Dirigido

O aluno deverá fazer uma leitura atenta do artigo 5°, com 73 itens, da
Constituição Federal e, posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar
resposta “sim” ou “não”, deverá ser justificada.

1. Qual é a limitação imposta quanto a manifestação do pensamento?


2. Em quais casos poderá haver a violabilidade da casa?
3. Em quais casos poderá haver a violabilidade da comunicação telefônica?
4. O que estabelece a Constituição quanto ao direito de propriedade?
5. Quais são as normas relativas a retroatividade da lei?
6. O que prevê a Constituição quanto a instituição da pena?
7. O que prevê a Constituição quanto a aplicação da pena?
8. Em quais circunstâncias alguém poderá ser preso?
9. Qual a finalidade do “habeas corpus”?
10. Quais são as garantias asseguradas ao preso?
11. Em quais casos poderá haver prisão por dívida?
12. Além dos casos previstos no § 3° do artigo 12 da Constituição, cite outro de distinção entre
brasileiro nato e naturalizado.
13. Em quais casos poderá ser requerido o “habeas data”?
14. Qual a finalidade da ação popular?
15. O que é necessário para alguém propor uma ação popular?
16. Quando se concederá o mandado de segurança?
17. Em quais casos poderá ser concedido o mandado de injunção?

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DOS DIREITOS SOCIAIS


Art. 6° a 11

No artigo 6°, a Constituição estabelece que os direitos sociais são: a)- educação;
b)- saúde; c)- trabalho; d)- moradia; e)- lazer; f)- segurança; g)- previdência social; h)- proteção à
maternidade e à infância e i)- assistência aos desamparados. No entanto, esse capítulo que é composto
pelos artigos 6° ao 11, traz tão somente normas relativas ao trabalho, deixando para o título “Da Ordem
Social” (arts. 193 a 232) as disposições relativas a Seguridade Social (Saúde, Previdência Social e
Assistência Social); Educação, Cultura e Desporto; Ciência e Tecnologia; Comunicação Social; Meio
Ambiente; Família, Criança, Adolescente e Idoso; Índios.

Estudo Dirigido

O aluno deverá fazer uma leitura atenta nos artigos 6° a 11 da Constituição


Federal e, posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar resposta “sim” ou
“não”, deverá ser justificada.

1. Qual é a função do sindicato?


2. Que garantia possui o diretor do sindicato?
3. Quais são as fontes de receita dos sindicatos?
4. O que estabelece a Constituição quanto a prescrição dos direitos trabalhistas?
5. Qual é a idade mínima para que alguém possa ser contratado como empregado?
6. O que estabelece a Constituição quanto a estabilidade no emprego?
7. Quais são os direitos assegurados aos domésticos?
8. Quais são os direitos assegurados aos filhos dos trabalhadores?
9. Quais são dos direitos assegurados especialmente às mulheres?
10. De que forma deverá ser a remuneração das férias?
11. Qual é a remuneração mínima para prestação de serviços extraordinários?
12. Quais são as necessidades básicas que o salário mínimo deverá atender?
13. Qual é a jornada normal de trabalho?
14. Quantas horas normais trabalha o empregado mensalmente?

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N A C I O N A L I D A D E
Art. 12 a 14

Os Estados, por serem soberanos, têm competência para estabelecer normas


jurídicas para determinar quem será considerado nacional ou estrangeiro. No entanto, existem alguns
princípios observados em quase todas as legislações nos países existentes. Assim, verificamos dois tipos
distintos de nacionalidade que são comuns em quase todos os Estados: 1. Originária e 2. Adquirida. Da
mesma forma existem dois critérios, que também podemos considerá-los universais, que regulam a
Nacionalidade Originária, que são: 1. O “jus soli” ou princípio da territorialidade e 2. O “jus
sangüinis” ou princípio da consangüinidade.

Desta forma podemos representar essa questão com o seguinte quadro:

“jus soli”
Originária
(natos) “jus sangüinis”
Nacionalidade

Expressa
Adquirida
(naturalizados) Tácita

Nacionalidade

Ë o vínculo jurídico que une uma pessoa a um Estado.

Nacionalidade Originária

É a nacionalidade obtida em razão do nascimento da pessoa.

As pessoas que possuem a nacionalidade originária são denominadas de Natos.

“Jus Soli”

Ë o princípio através do qual a nacionalidade originária é determinada em


razão do lugar do nascimento da pessoa. Assim, o país que adota este princípio considera, como sendo
nacional, o nascido em seu território.

O Brasil adota, como regra geral, este princípio pois considerada brasileiro nato o
nascido em seu território. À essa regra geral se opõe uma única exceção, ou seja, só não é considerado
brasileiro o aqui nascido, se for filho de pai estrangeiro e que esteja no Brasil a serviço de seu país.
Assim, por exemplo, não seria brasileira a criança aqui nascida, filha do Embaixador dos Estados Unidos
que estivesse no Brasil a serviço de seu país. (Constituição Federal, art. 12, inciso I, letra “a”).

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“Jus Sangüinis”

É o princípio através do qual a nacionalidade originária é determinada em


razão da nacionalidade dos pais. O país que adota este princípio considera nacional os filhos de
nacionais, não importando o lugar (território) de seu nascimento.

O Brasil também adota o “Jus sangüinis”, embora não de forma tão ampla como
o “jus Soli”. A Constituição estabelece no art.12, inciso I, letras “b” e “c”, as circunstâncias nas quais o
nascido no exterior é considerado brasileiro nato, pelo fato de ser filho de pai ou mãe brasileira.

Nacionalidade Adquirida

Ë a nacionalidade obtida em razão da manifestação de vontade ou pelo fato da


pessoa preencher certas condições legais que determinam sua aquisição, mesmo sem a manifestação de
vontade.

As pessoas que obtiveram a nacionalidade adquirida são denominadas de


Naturalizadas.

Expressa

Diz-se que a nacionalidade é adquirida de forma expressa quando há a


manifestação de vontade no sentido de desejar naturalizar-se em determinado país. Quando a pessoa
expressa sua vontade no sentido de obter a nacionalidade.

Nossa Constituição disciplina esta questão no art.12, inciso II, letras “a” e “b”.
Abre, entretanto, uma exceção aos originários de países de língua portuguesa ao exigir, tão somente,
residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral.

Tácita

Diz-se que a nacionalidade é adquirida de forma tácita quanto é obtida sem que
haja manifestação da vontade, com o simples preenchimento de certas condições estabelecidas na lei.

A Lei Brasileira não prevê hoje essa hipótese. No entanto ela já foi contemplada
pela Constituição de 1891 (1ª constituição Republicana), que assim determinava em seu art.69, itens IV
e V:
São brasileiros naturalizados:

IV- “Os estrangeiros que, achando-se no Brasil aos 15 de novembro de 1889, não
declararem, dentro em seis meses depois de entrar em vigor a Constituição, o ânimo de conservar a
nacionalidade de origem.

V- Os estrangeiros que possuírem bens imóveis no Brasil, e forem casados


com brasileira ou tiverem filhos brasileiros, contanto que residam no Brasil, salvo se
manifestarem a intenção de não mudarem de nacionalidade.”

Nestas hipóteses previstas pela Constituição de 1891 não há a manifestação de


vontade no sentido de querer ser brasileiro, mas sim o preenchimento de certas condições e a não

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manifestação de conservar a nacionalidade estrangeira. Essa naturalização no Brasil é conhecida como:


“a grande naturalização”.

Os Equiparados

Os fortes laços históricos que unem o Brasil a Portugal, fazem com que haja um
tratamento especial aos portugueses residentes no país, a ponto tal de fazer com que o legislador
constituinte constasse na Constituição a regra do § 1° do art. 12, onde equipara, ao brasileiro
naturalizado, os portugueses com residência permanente no Brasil, desde que tal tratamento seja
dispensado aos brasileiros com residência permanente em Portugal.

Devemos ressaltar que os portugueses, nesta situação, não adquirem a


nacionalidade brasileira, sendo, tão somente, tratados como brasileiros naturalizados.

No Brasil o conjuntos de normas que disciplinam esse tratamento especial


deferido aos portugueses recebeu o nome de Estatuto da Igualdade, que foi regulamentado pelo Decreto
sob n° 70.436/72, que abaixo transcrevemos:

DECRETO 70.436 DE 18/04/1972 - DOU 19/04/1972

Regulamenta a Aquisição Pelos Portugueses, no Brasil, dos Direitos e Obrigações Previstos no Estatuto
da Igualdade e dá outras Providências.

CAPÍTULO I

Da Aquisição da Igualdade de Direitos e Obrigações Civis e do Gozo de Direitos Políticos.

ART.1°- Este Decreto regula a igualdade de tratamento entre brasileiros e portugueses, concernentes
aos direitos e obrigações civis e ao gozo dos direitos políticos.

ART.2° - São requisitos para a aquisição da igualdade de direitos e obrigações civis:


I - capacidade civil, segundo a lei brasileira;
II - residência permanente no território brasileiro;
III - gozo da nacionalidade portuguesa.

ART.3° - São requisitos para o gozo dos direitos políticos:


I - residência no território brasileiro pelo prazo de cinco anos;
II - saber ler e escrever o português;
III - estar no gozo dos direitos políticos no Estado da nacionalidade.
Parágrafo único. Nos direitos políticos outorgados ao português não se incluem os que, por disposição
constitucional, sejam privativos de brasileiros natos.

ART.4°- O português poderá a qualquer tempo requerer o reconhecimento da igualdade de direitos e


obrigações civis e do gozo dos direitos políticos.

Parágrafo único. O pedido poderá ser feito cumulativamente ou em separado.

ART.5° - Para adquirir a igualdade de direitos e obrigações civis e o gozo dos direitos políticos, o
português dirigirá petição ao Ministro da Justiça, declarando o nome por extenso, filiação, naturalidade,
nacionalidade, profissão, estado civil e o dia, mês e ano do nascimento.

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ART.6°- A petição, assinada pelo requerente ou por mandatário com poderes especiais, será instruída
com:
I - cédula de identidade de estrangeiro;
II - certidão consular de nacionalidade, expedida em data recente, de que conste o fim a que se destina;
III - atestado policial de residência no Brasil, pelo prazo mínimo de cinco anos, bem como de
inexistência de antecedentes criminais;
IV - certidão consular de estar no gozo dos direitos políticos no Estado da nacionalidade;
V - documento que prove saber ler e escrever o português.

§ 1º Se o requerente limitar o pedido ao reconhecimento da igualdade dos direitos e obrigações civis


ficará dispensado da exibição dos documentos mencionados nos números IV e V, exigindo-se-lhe,
quanto ao documento referido no número III, apenas a prova de residência no Brasil.

§ 2º Nos Estados e Territórios, poderá a petição ser encaminhada através dos órgãos federais ou
estaduais encarregados do registro de estrangeiro, ou da Prefeitura do Município em que tiver domicílio
o requerente.

ART.7° - Recebido o processo, o Diretor do Departamento de Justiça determinará a realização das


diligências que julgar necessárias à completa instrução do pedido, podendo assinar prazo ao requerente
para que supra omissões, bem como requisitar à repartição competente certidões de documentos de seu
arquivo.

§ 1º Se o pedido não preencher os requisitos dos art. 2 e 3, o Diretor do Departamento mandará arquivá-
lo. Deste despacho caberá recurso para o Ministro de Estado no prazo de trinta dias contados da
publicação no órgão oficial.

§ 2º Satisfeitos os requisitos, o Diretor do Departamento submeterá o processo, com parecer, ao


Ministro da Justiça.

ART.8° - A igualdade de direitos e obrigações civis e o gozo de direitos políticos serão reconhecidos
por decisão do Ministro da Justiça, que mandará expedir portaria em favor do requerente.

ART.9° - O Serviço de Identificação do Distrito Federal, dos Estados ou dos Territórios expedirá
documento de identidade de modelo igual ao de brasileiro, com menção da nacionalidade portuguesa do
portador e referência à Convenção sobre o Estatuto da Igualdade, recolhendo a cédula de identidade de
estrangeiro, a qual deverá ser enviada ao Serviço que a tenha expedido, para ser arquivada junto ao
respectivo processo de registro.

ART.10 - O Ministério da Justiça comunicará ao Ministério das Relações Exteriores, e este ao Governo
de Portugal, a relação dos portugueses que adquiriram a igualdade de direitos e obrigações civis e o
gozo dos direitos políticos.

ART.11 - Durante o processo de reconhecimento da igualdade de direitos e obrigações civis e do gozo


dos direitos políticos, poderá qualquer do povo impugnar o pedido desde que o faça
fundamentadamente.

ART.12 - O gozo dos direitos políticos no Brasil importará em suspensão do exercício dos mesmos
direitos em Portugal.

ART.13 - É lícito ao português, a quem foi reconhecido o gozo dos direitos políticos, ingressar no
serviço público do mesmo modo que o brasileiro.

ART.14 - O português, no gozo dos direitos e obrigações civis, pode exercer o comércio, a indústria, a
agricultura e o magistério em qualquer grau.

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§ 1º Pode também:
I - ser proprietário de empresas jornalísticas de qualquer espécie, inclusive de televisão e de
radiodifusão, ou acionista de sociedade anônima proprietária dessas empresas;
II - obter concessão ou autorização para explorar jazidas, minas e demais recursos minerais e potenciais
de energia hidráulica;
III - ser proprietário de aeronave brasileira;
IV - ser corretor de navios e de fundos públicos, leiloeiro e despachante aduaneiro;
V - ser proprietário de terras ou estabelecimentos industriais ou comerciais na faixa de fronteiras;
VI - participar da administração ou representação de sindicatos ou associações sindicais;
VII - ser prático de barras, portos, rios, lagos e canais;
VIII - possuir e operar aparelhos de rádio-amador;
IX - prestar assistência religiosa nos estabelecimentos de internação coletiva, como escolas, hospitais,
presídios ou penitenciárias.

§ 2º É-lhe defeso:
I - assumir a responsabilidade e a orientação intelectual e administrativa das empresas mencionadas no
item I do parágrafo anterior;
II - ser proprietário, armador ou comandante de navio nacional, inclusive nos serviços de navegação
fluvial e lacustre;
III - prestar assistência religiosa às Forças Armadas e auxiliares.

§ 3º O disposto no item II do parágrafo anterior não se aplica aos navios nacionais de pesca, sujeitos a
regulamentação em lei federal.

ART.15 - A aquisição da igualdade de direitos e obrigações civis e do gozo de direitos políticos é


sempre individual, não se estendendo ao cônjuge e à prole do beneficiário.

ART.16 - Não perde a nacionalidade de origem aquele que se beneficiar do Estatuto da Igualdade.

ART.17 - É vedado, porém, ao português:


I - exercer direitos inerentes à sua nacionalidade originária, quando estes não forem admitidos pela
legislação brasileira;
II - prestar serviço militar no Brasil.

ART.18 - O português fica sujeito à lei penal brasileira, do mesmo modo que o nacional, não sendo
passível de extradição, salvo se requerida pelo Governo de Portugal.

Parágrafo único. Mesmo quando requerida pelo Estado da nacionalidade, não será concedida a
extradição por crime político ou de opinião.

ART.19 - No exterior não terá o português direito à proteção diplomática e consular brasileira.

ART.20 - A igualdade de direitos e obrigações civis e o gozo dos direitos políticos extinguir-se-ão pela:
I - cessação da autorização de permanência definitiva no Brasil;
II - expulsão do território nacional;
III - perda da nacionalidade originária.

§ 1º Extinguir-se-á no Brasil o gozo dos direitos políticos se o exercício deste for suspenso em Portugal.

§ 2º Cessará a autorização de permanência definitiva no Brasil se o português deixar o Brasil por prazo
superior a cinco anos.

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§ 3º A perda da nacionalidade originária será comprovada mediante declaração do Governo de Portugal


através de seus representantes diplomáticos no Brasil.

§ 4º O Ministro da Justiça, de ofício ou mediante representação, declarará extinta a igualdade de direitos


e obrigações civis e o gozo dos direitos políticos, comunicando a decisão ao Ministério das Relações
Exteriores, que a transmitirá ao Governo de Portugal.

§ 5º O Ministério da Justiça comunicará à Justiça Eleitoral a decisão que declarar extinto o gozo dos
direitos políticos.

ART.21 - As repartições consulares do Brasil em Portugal concederão certidão de nacionalidade e de


gozo de direitos políticos aos brasileiros que pretendam submeter-se ao regime do Estatuto da
Igualdade.
Parágrafo único. Da certidão de gozo dos direitos políticos constarão o número de inscrição do título
eleitoral e o juízo que o emitiu.

ART.22 - Tanto que seja concedida a brasileiro a igualdade de direitos e obrigações civis e o gozo dos
direitos políticos, a autoridade consular informará o fato à Secretaria de Estado das Relações Exteriores,
que o transmitirá ao Ministério da Justiça.

Parágrafo único. O Ministério da Justiça dará conhecimento à Justiça Eleitoral da outorga do gozo dos
direitos políticos a brasileiros em Portugal.

ART.23 - Quando o brasileiro, que estiver sob o regime do Estatuto da Igualdade, perder a
nacionalidade, o Governo do Brasil comunicará ao de Portugal essa ocorrência.

ART.24 - O pedido de aquisição da igualdade de direitos e obrigações civis, do gozo de direitos


políticos por cidadãos portugueses no Brasil, o registro dos fatos atributivos e extintivos dos referidos
direitos, bem como a expedição das certidões previstas no art. 21 serão gratuitos.

ART.25 - Haverá no Departamento de Justiça:

I - um livro de registro nominal dos portugueses, do qual constarão as datas da aquisição e da extinção
da igualdade de direitos e obrigações civis, bem como do gozo de direitos políticos no Brasil;
II - um livro de registro nominal dos brasileiros, do qual constarão as datas da aquisição e da extinção
da igualdade de direitos e obrigações civis, bem como do gozo de direitos políticos em Portugal.

ART.26 - O Ministro da Justiça anulará o ato concessório, quando obtido em fraude a este Decreto.

ART.27 - Este Decreto entrará em vigor a partir de 22 de abril de 1972, revogadas as disposições em
contrário.

Perda da Nacionalidade

A Lei brasileira não contempla a possibilidade do nacional renunciar à


nacionalidade, no entanto, o Estado Brasileiro poderá declarar a perda da nacionalidade, na forma
estabelecida pelo art. 12, § 4°, itens I e II, como penalidade.

No inciso I encontra-se a hipótese do naturalizado ter cancelado sua naturalização


por atividade nociva ao interesse nacional. Esse cancelamento somente poderá se dar por sentença
judicial definitiva, ou seja, que não comporta mais qualquer recurso. A pessoa assim penalizada não
poderá mais ser renaturalizado.

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No inciso II encontra-se a hipótese do brasileiro, com nacionalidade originária,


adquirir outra nacionalidade.

O brasileiro perderá sua nacionalidade ao adquirir outra, desde que a


naturalização seja voluntária. Por outro lado, se o brasileiro residir em outro país onde, por decorrência
de prazo, ocorrer a naturalização automática (tácita), não perderá a nossa. Quando o silêncio importar
declaração unilateral de vontade positiva, não há voluntariedade e sim imposição. Da mesma forma, não
perderá a nacionalidade o brasileiro residente em Estado estrangeiro que ficar obrigado a se naturalizar
como condição de permanência naquele Estado ou para exercício de direitos civis.

A Dupla Nacionalidade e os Apátridas

Com a aplicação, quase que universal, dos princípios “jus soli” e “jus sangüinis”,
como determinantes para a aquisição da nacionalidade originária, podemos encontrar casos em que a
pessoa poderá ter duas ou mais nacionalidades originárias ou, então, não adquirir nenhuma nacionalidade
ao nascer, que é caso do apátrida.

Assim, por exemplo:

a)- Se um casal, originário de um país que adote o princípio do “jus soli”,


encontrar-se a passeio num país que adote o princípio do “jus sangüinis” e ali nascer um filho seu, essa
criança não obterá a nacionalidade do país em que nasceu. (Isto porque esse país adota o princípio do
“jus sangüinis”). Portanto, ele só considera nacional os filhos de nacionais. Por outro lado, o nascituro
não obterá a nacionalidade dos pais, uma vez que seu país de origem adota o principio do “juz soli”, ou
seja, só considera nacional os nascidos em seu território. Essa criança será um apátrida, por não possuir
uma nacionalidade originária.

b)- Se imaginarmos uma situação inversa, vamos verificar que uma pessoa ao
nascer poderá ter duas ou mais nacionalidades. Se uma criança nascer num país que adota o princípio do
“jus soli” e ela for filha de pai e mãe de diferentes países que adotam o princípio do “jus sangüinis”, ela
terá três nacionalidades: uma do país em que nasceu; outra do país de origem do pai e outra do país de
origem da mãe.

Estudo Dirigido

O aluno deverá fazer uma leitura atenta dos artigos 12 e 13 da Constituição


Federal e, posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar resposta “sim” ou
“não”, deverá ser justificada.
1. Que é nacionalidade?
2. Que é nacionalidade originária?
3. Que é nacionalidade adquirida?
4. O que se entende por “jus soli”?
5. O que se entende por “jus sangüinis”?
6. Em qual circunstância alguém nascido no Brasil não é considerado brasileiro?
7. O que se exige aos originários de países de língua portuguesa para naturalizarem-se brasileiros?
8. O que se entende por brasileiro equiparado?
9. Em qual circunstância alguém poderá ter duas nacionalidades originárias?

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10. Cite uma situação na qual alguém poderá ter mais de duas nacionalidades originárias?
11. Quantas nacionalidades originárias terá uma pessoa que nasce num país que adota o “jus soli”
sendo filho de pai e mãe originários de países que também adotam o princípio do “jus soli”?
12. Quantas nacionalidades originárias terá a pessoa que nasce num país que adota o “jus sangüinis”,
sendo filho de mãe originária de país que adota o “jus soli” e pai originário de país que adota o “jus
sangüinis”?
13. “A”, brasileira é casada com “B”, uruguaio. “A” perde a nacionalidade nos termos do inciso II,
do § 4° do art. 12 da Constituição. O casal muda-se para Portugal onde nasce um filho que foi concebido
no Brasil. Essa criança poderá ter nacionalidade brasileira?
14. Cite todos os cargos eletivos políticos que somente poderão ser exercidos por brasileiros natos.
15. Cite todos os cargos eletivos políticos que podem ser exercidos por brasileiros naturalizados ou
equiparados.
16. Cite um caso de distinção, feito pela Constituição, entre brasileiro nato e naturalizado.
17. Com quais dizeres a nossa constituição aplica o princípio “jus sangüinis”?
18. O que é necessário para que um alemão, residente no país desde 1970, adquira a nacionalidade
brasileira?

DIREITOS POLÍTICOS
Arts. 14 a 16

No capítulo anterior estudamos a nacionalidade. Agora vamos tratar da


cidadania, que significa a aptidão que tem a pessoa de exercer os direitos políticos.

A nacionalidade é pressuposto básico para a cidadania, ou seja, só é cidadão


quem for nacional ou equiparado a nacional, como é o caso dos portugueses com residência permanente
no Brasil.

A cidadania é um atributo exclusivo da pessoa física no exercício legal dos


direitos políticos. Não pertence à pessoa jurídica. O cidadão pode: a) votar; b) ser votado; c) concorrer
às eleições; d) fundar partido político; e) filiar-se a partido político; f) ajuizar ação popular.

Sufrágio universal

A soberania popular é exercida pelo sufrágio universal. A soberania é o poder de


decisão em última instância, mas deve ser legitimada pelo consenso e pela justiça social. Legalidade não
é legitimidade. A soberania popular significa que a fonte de todo o poder reside no povo e em seu nome
será exercido, através do sufrágio universal, bem como mediante o voto, referendo, plebiscito e iniciativa
popular.

105
INSTITUIÇÕES DE DIREITO PÚBLICO E PRIVADO - Prof. Abel Abelardo Stadniky

Geralmente se confunde sufrágio e voto. Porém a Constituição os emprega em


sentido diferente, sobretudo no art. 14, caput,4 quando afirma que o sufrágio é universal e o voto direto e
secreto, com igual valor para todos. O sufrágio é um direito subjetivo democrático, o voto é o exercício
desse direito.

O sufrágio, quanto à sua extensão e igualdade, pode ser universal ou restrito,


igual ou desigual.

O sufrágio universal corresponde à fórmula “um homem, um voto”. A


universalidade do sufrágio corresponde à plenitude da democracia.

No Brasil, o sufrágio universal está sujeito a determinadas condições, pois deve


preencher os requisitos de nacionalidade, alistamento e cidadania.

V o t o

O voto é meio pelo qual se exerce a soberania popular. Esse termo é usado em
política e em ciência política como sinônimo de votação para indicar o processo pelo qual se registram as
escolhas dos eleitores; geralmente, designa também o papel impresso (cédula eleitoral ou cédula) que
contém o nome dos candidatos ao cargo e/ou declaração de uma proposta que o eleitor deve aprovar ou
rejeitar.

O voto pode ser: a) secreto ou aberto; b) obrigatório ou facultativo; c) direto ou


indireto; d) igual ou desigual.

A nossa Constituição de 1988 consagrou o voto direto, secreto, igual e


obrigatório.
SISTEMAS ELEITORAIS

Sistema Eleitoral é o conjunto de procedimentos e técnicas utilizadas na


realização das eleições, permitindo a representação do povo no território nacional. O sistema eleitoral
permite a regularidade das eleições.

A eleição, feita com liberdade, segurança e garantia de voto, é uma medida


necessária para dar legitimidade ou poder. Mediante ela o povo, que é fonte legítima do poder, atribui
seu consentimento à lei, dá-lhe legitimidade, legitima o poder, visto que legalidade não é legitimidade.

Há dois sistemas eleitorais que prevalecem hoje: a) sistema majoritário e b)


sistema proporcional.

Sistema majoritário

É o processo através do qual é considerado eleito o candidato que obtiver maior


número de votos. Encontramos dois modelos no sistema majoritário: 1. no primeiro, é considerado
eleito o candidato que obtiver o maior número de votos num só turno, ou seja, o candidato é eleito pela
maioria simples; 2. no segundo modelo, o candidato deverá obter o voto da maioria absoluta dos
votantes, caso isto não ocorra, haverá um segundo turno na eleição com a participação dos dois
candidatos mais votados no primeiro turno, e será considerado eleito o que obtiver o maior número de
votos.

4
Significa a cabeça do artigo ou seja sua parte inicial.

106
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No Brasil são eleitos pelo sistema majoritário os candidatos a: Presidente da


República, Governadores, Prefeitos e Senadores. Os cargos de Presidente e Governadores sempre serão
preenchidos através de dois turnos (maioria absoluta). Os de Senadores serão preenchidos sempre em
único turno (maioria simples). E os de Prefeitos serão preenchidos por maioria simples ou absoluta,
dependendo do número de eleitores no Município: se houver mais de 200.000 eleitores, o cargo de
prefeito será preenchido através da maioria absoluta, ou seja, haverá dois turnos. Com número inferior a
200.000 eleitores, haverá um só turno, sendo eleito o candidato que obtiver a maioria dos votos válidos.

Sistema Proporcional

Chama-se proporcional o sistema que garante a representação dos partidos


políticos em razão do número de votos que lhes é atribuído. Esclarece o Prof. Pinto Ferreira, que: “... a
representação proporcional é um sistema através do qual se assegura aos diferentes partidos políticos
no Parlamento uma representação correspondente à força numérica de cada um. Ela objetiva, assim,
fazer do Parlamento um espelho tão fiel quanto possível do colorido partidário nacional.”5

Por esse sistema são preenchidos, no Brasil, os cargos de Deputados Federais, Deputados
Estaduais e Vereadores.

Plebiscito

É a maneira pela qual o povo, diretamente, se manifesta no sentido de aprovar ou rejeitar um


ato do Poder Executivo.

A palavra origina-se do latim plebs, que no Direito Romano é a comunidade ou os cidadãos,


excluindo-se os patrícios e senadores.

Referendo

Referendo ou Referendum é a maneira pela qual o povo, diretamente, se manifesta no sentido


de aprovar ou rejeitar um ato do Poder Legislativo.

Iniciativa popular

É o processo pelo qual determinado percentual do eleitorado pode propor a iniciativa de um


projeto de lei.

No Brasil, no âmbito federal, o projeto de lei ordinário poderá ser apresentado com a subscrição
de, pelo menos, 1% dos eleitores distribuídos em, pelo menos, 5 Estados, e não menos de 0,3% dos
eleitores de cada um deles.

O parentesco e as inelegibilidades

O § 7º do artigo 14 estabelece que são inelegíveis, no território de jurisdição do


titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente
da República, do Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja
substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandado eletivo e candidato à
reeleição.
5
FERREIRA, Pinto. Comentário à Constituição Brasileira. 1ªed., São Paulo:
Editora Saraiva, p. 351.

107
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Portanto além do cônjuge, que não é parente, são inelegíveis no território de


jurisdição do titular, os parentes consangüíneos e afins, até segundo grau, e os por adoção. Por essa razão
devemos ter uma noção a respeito do parentesco e especialmente com relação as normas adotadas para a
contagem dos respectivos graus.

Parentes consangüineos

O parentesco conta-se por linhas e graus.

A linha é a vinculação da pessoa com o tronco ancestral comum. Divide-se em


linha reta e linha colateral.

São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na
relação de ascendentes e descendentes. A linha reta é ascendente ou descendente, conforme se encare o
parentesco, subindo-se da pessoa a seu antepassado, ou descendo-se. São parentes em linha reta o bisavô,
o avô, o pai, o filho, o neto, o bisneto, etc.

São parentes em linha colateral as pessoas que, tendo tronco comum, não
descendem uma das outras. Tais são os irmãos, os tios, os sobrinhos.

O grau é a distância que vai de uma geração a outra.

Na linha reta o grau de parentesco conta-se pelo número de gerações. Geração é


a relação existente entre o genitor e o gerado. Assim, há entre o pai e o filho um grau, entre o avô e o
neto dois, entre o bisavô e o bisneto três.

Na linha colateral, o grau de parentesco também se conta pelo número de


gerações, subindo-se de um parente até o tronco comum e descendo até encontrar o outro. Assim, os
primos são parentes colaterais de quarto grau, porque são quatro as gerações, de um deles para o pai ( 1º
grau), do pai para o avô (2º grau) – escala ascendente -, do avô ao tio (3º grau), do tio ao seu filho (4º
grau) – escala descendente.

Na linha colateral, não há parentesco em primeiro grau, porque se conta subindo


ao antepassado comum e descendo ao parente.

Parentes afins

A afinidade é o vínculo jurídico que se estabelece entre um cônjuge e os parentes


do outro. A afinidade entre pessoas conta-se da mesma forma que o parentesco por consangüinidade, ou
seja, por linhas e graus. Admitindo-se sua existência em linha reta e em linha colateral.

Os parentes consangüíneos do marido são afins da mulher e vice-versa, em iguais


linhas e graus. A consangüinidade é, em suma, a base do cálculo.

Pode alguém ser afim de outrem em linha reta sob tríplice ponto de vista:

1)- Em virtude do casamento por ele contraído, o marido será afim em primeiro
grau com a filha e a mãe da mulher a que se uniu;

108
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2)- Em virtude de casamento contraído pelos filhos, será afim, em primeiro grau
com as esposas destes;

3)- Em virtude de casamento contraído por seu pai, será afim em primeiro grau
com a mulher com quem ele se uniu.

No primeiro caso, a filha ( de outro casamento) de sua mulher será sua enteada.
No segundo, será sogro da mulher de cada filho. No terceiro, enteado da mulher de seu pai.

Na linha colateral, os afins são chamados de cunhados. A afinidade, nessa linha,


não se estende ao terceiro grau, em direito civil, existindo apenas com os irmãos do cônjuge.

Parentes por adoção

Adoção é o ato jurídico pelo qual se estabelece, independentemente do fato


natural da procriação, o vínculo de filiação. Trata-se de ficção legal, que permite a constituição, entre
duas pessoas, do laço de parentesco do primeiro grau na linha reta.
No direito brasileiro persistem duas formas de adoção: uma para os maiores de 18
anos ( Código Civil) e outra para menores de 18 anos ( Estatuto da Criança e do Adolescente).

No regime do Código Civil, a adoção realiza-se por meio de escritura pública e


não depende de autorização judicial. O adotado não se desvincula da família de sangue, apenas o pátrio
poder passa para o adotante. O adotado conserva o parentesco natural, podendo, por exemplo, reclamar
alimentos de seu pai, se for o caso. Torna-se parente do adotante, mas tal parentesco não se estende aos
demais membros de sua família, a não ser quanto aos impedimentos matrimoniais.

No regime do Estatuto da Criança e do Adolescente, somente se realiza a adoção


do menor de 18 anos por meio de sentença judicial. Depende de consentimento dos pais ou representantes
legais do adotado e do próprio menor se tiver mais de 12 anos de idade. Exige estágio prévio de
convivência e somente será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotado e fundar-se em
motivos legítimos.

Essa adoção é irrevogável e vincula o adotado à família do adotante, desligando-o


por completo da família natural, salvo apenas nos impedimento matrimoniais.

Diante da nova família, os direitos do adotado são os mesmos dos filhos de


sangue, inclusive quanto a sucessão. Os genitores naturais perdem o pátrio poder e todos os direitos
sucessórios com relação ao adotado.

Estudos Dirigido
O aluno deverá fazer uma leitura atenta dos artigos 14 a 16 da Constituição
Federal e, posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar resposta “sim” ou
“não”, deverá ser justificada.

1. Com relação aos direitos políticos, o que significa cidadania?


2. À vista do art. 15° da CF., cite um caso de suspensão e um caso de perda dos direitos políticos.
3. Cite duas maneiras de exercício do poder diretamente pelo povo de que trata o parágrafo único do art.
1° da Constituição.
4.Quais as pessoas que podem votar?
5. Que relação existe entre nacionalidade e cidadania?
6.Quais os militares que não podem votar?
7.O analfabeto pode votar e ser votado?

109
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8.O preso poderá votar?


9.Em quais circunstâncias o Presidente da República deverá afastar-se de seu cargo para disputar um
cargo eletivo?
10.Que providência deverá tomar o Governador de Estado que desejar candidatar-se ao cargo de
Deputado Federal?
11.O que é necessário para que o Vice-Presidente da República possa ser reeleito?
12.Em quais circunstâncias a mulher do Prefeito Municipal poderá candidatar-se?
13.A vista do § 7º do art. 14 da Constituição, cite todos os parentes de um Prefeito Municipal que são
inelegíveis.
14. Os parentes do Presidente da República, abaixo mencionados, tornam-se ou não inelegíveis.
Justificar a resposta indicando o tipo de parentesco e o referido grau.
a)- Sogra; b)- Enteado neto (filho de enteado); c)- Cunhado; d)- Madrasta; e)- sobrinho; f)- primo.

Questão prática sobre eleição proporcional

Considerando os dados abaixo apresentados, calcular e demonstrar como serão


preenchidas as vagas de Vereadores, numa hipotética Câmara com 15 representantes:

PARTIDO ‘A ‘ PARTIDO ‘B’ PARTIDO ‘C’

Candidato
Candidatos Idade Votos Candidatos Idade Votos Idade Votos
s
01 49 1.150 01 42 750 01 44 390
02 32 1.030 02 67 220 02 32 340
03 45 980 03 54 50 03 37 15
04 25 1.940 04 33 880 04 22 450
05 22 1.112 05 22 920 05 34 434
06 21 560 06 19 875 06 25 722
07 19 1.111 07 29 1.132 07 27 653
08 38 1.095 08 23 1.075 08 39 25

Soma 8.978 Soma 5.902 Soma 3.029


Votos de
Votos de Legenda 122 Votos de Legenda 98 21
Legenda
Total de Votos 9.100 Total de Votos 6.000 Total de Votos 3.050

PARTIDO ‘D’ PARTIDO ‘E’ PARTIDO ‘F‘

Candidato
Candidatos Idade Votos Candidatos Idade Votos Idade Votos
s
01 39 286 01 51 186 01 40 150

110
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02 35 283 02 54 192 02 39 125


03 56 285 03 58 610 03 21 134
04 70 287 04 32 300 04 32 148
05 30 494 05 29 51 05 19 213
06 22 165 06 32 53 06 23 159
07 31 494 07 33 51 07 55 89
08 38 1 08 27 0 08 54 2

Soma 2.295 Soma 1.443 Soma 1.020


Votos de
Votos de Legenda 5 Votos de Legenda 57 30
Legenda
Total de Votos 2.300 Total de Votos 1.500 Total de Votos 1.050

VOTOS 7.00
8.000 VOTOS EM BRANCO:
NULOS: 0

Legislação para consulta

Código Eleitoral Brasileiro, Lei 4.737 de 15/07/l965, artigos 106 a 113.

Art. 106 - Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos


válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se
igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior.

Parágrafo único – ( revogado pela Lei 9.504 de 30.09.1997)

Art. 107 - Determina-se para cada Partido ou coligação o quociente partidário,


dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação
de legendas, desprezada a fração.

Art. 108 - Estarão eleitos tantos candidatos registrados por um Partido ou


coligação quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem de votação nominal que cada um
tenha recebido.

Art. 109 - Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários
serão distribuídos mediante a observação das seguintes regras:

I - dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada Partido ou coligação


de Partidos pelo número de lugares por ele obtido, mais um, cabendo ao Partido ou coligação que
apresentar a maior média um dos lugares a preencher.

II - repetir-se-á a operação para a distribuição de cada um dos lugares.

§ 1° - O preenchimento dos lugares com que cada Partido ou coligação for


contemplado far-se-á segundo a ordem de votação nominal dos seus candidatos.

§ 2° - Só poderão concorrer à distribuição dos lugares os Partidos e coligações


que tiverem obtido quociente eleitoral.

111
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Art. 110 - Em caso de empate, haver-se-á por eleito o candidato mais idoso.

Art. 111 - Se nenhum Partido ou coligação alcançar o quociente eleitoral,


considerar-se-ão eleitos, até serem preenchidos todos os lugares, os candidatos mais votados.

Art. 112 - Considerar-se-ão suplentes da representação partidária:

I - os mais votados sob a mesma legenda e não eleitos efetivos das listas dos
respectivos partidos;

II- em caso de empate na votação, na ordem decrescente de idade.

Art. 113 - Na ocorrência de vaga, não havendo suplente para preenchê-la, far-se-
á eleição, salvo se faltarem menos de nove meses para findar o período de mandato.

PARTIDOS POLÍTICOS
Art. 17

A Constituição Federal garante o pluralismo político e o pluripartidarismo, ou


seja, observadas as regras do art. 17 da CF, é livre a criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos
políticos, qualquer que seja a sua ideologia. Tal liberdade, porém, não é irrestrita, pois todos os partidos
devem resguardar a soberania nacional, o regime democrático, o próprio pluripartidarismo e os direitos
fundamentais da pessoa humana.
Desde a Lei n. 9.096/95, os partidos políticos estão
expressamente classificados entre as pessoas jurídicas de Direito Privado. Para a
sua constituição, inicialmente são registrados no Cartório de Registros Civil das
Pessoas Jurídicas, da Capital Federal (art. 114, III, da Lei dos Registros Públicos –
Lei n. 6.015/73, c. c. os arts. 7.º e 8.º da Lei Orgânica dos Partidos Políticos – Lei n.
9.096/95) e, após adquirirem personalidade jurídica, são registrados no TSE (art.
17, § 2.º, da CF).
Para ter seu estatuto registrado junto ao TSE e assim desfrutar dos recursos do fundo
partidário e do acesso gratuito ao rádio e à televisão, o partido deve ter caráter nacional, ou seja, o
apoio de eleitores em número correspondente a 0,5% dos votos dados na última eleição para a Câmara
dos Deputados (não computados os votos nulos e os votos em branco), distribuídos por um terço, ou
mais, dos Estados, com o mínimo de um décimo por cento do eleitorado que haja votado em cada um
deles.
As principais proibições impostas aos partidos políticos são:
receber recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou

manter subordinação a estes;
• utilização de organização paramilitar.
Os partidos têm direito ao fundo partidário (constituído pelas multas aplicadas
com base na legislação eleitoral, doações e dotações orçamentárias da União fundadas no número de
eleitores – art. 38 da Lei n. 9.096/95) e acesso gratuito ao rádio e à televisão, nos termos da Lei n.
9.504/97. De acordo com a alínea “c” do inc. VI do art. 150 da CF, atendidos os requisitos da lei, não
incidem impostos (imunidade) sobre patrimônio, rendas e serviços dos partidos políticos.

112
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O parágrafo único do art. 52 da Lei n. 9.096/95 estabelece que


as emissoras de rádio e televisão têm direito a compensação fiscal pela cedência
do horário gratuito previsto naquela norma.
Ao contrário da CF anterior, que até a EC n. 25/85 exigia a
fidelidade partidária e previa a perda do mandato para o parlamentar que
abandonasse o partido pelo qual fora eleito (art. 152, § 5.º) , a CF de 1988 remete
a questão da fidelidade partidária ao estatuto de cada partido (art. 17, § 1.º).
Mestres do porte de Walter Ceneviva sustentam ser de bom
direito admitir que o estatuto do partido pode prever, mediante processo que
assegure plena defesa, a perda de mandato do parlamentar eleito sob a sua
legenda que:
• deixar o partido;
• votar contra diretriz partidária legítima.
Outros estudiosos do tema, porém, sustentam que, para os
casos de infidelidade e indisciplina partidária, os estatutos partidários podem
prever sanções que vão da advertência até a exclusão, mas acrescentam que a
CF/88 não permite a perda do mandato por infidelidade partidária.
Diante do sistema adotado pela legislação eleitoral, que
demonstra ser o partido político veículo indispensável para alguém obter um
mandato (acolhendo inclusive o sistema proporcional e o quociente partidário para
a eleição de Deputados e Vereadores – art. 45 da CF, entendo que a razão está
com Walter Ceneviva, exceto quanto à hipótese de perda do mandato por votar
contra as diretrizes partidárias, já que os parlamentares são invioláveis por suas
opiniões, palavras e votos).
Nem mesmo a regra geral de que ninguém é obrigado a
associar-se ou a permanecer associado se aplica na hipótese, pois no caso
específico a filiação a partido político é obrigatória (pela CF) para alguém disputar
um mandato eletivo.
Observa-se, contudo, que a questão é bastante polêmica e que o
TRE/SP já deliberou que os estatutos, no máximo, podem impor ao faltoso a
expulsão, sem a perda do mandato (Acórdão 123.930, publicado no DOJ de
1.º.3.1996, p. 41).
No mesmo sentido, merece destaque a seguinte decisão do
Paraná :

ACÓRDÃO: 16121
DESCRIÇÃO: Apelação Cível
RELATOR: Des. Pacheco Rocha
COMARCA: Foz do Iguaçu – 4.ª Vara Cível
ÓRGÃO JULGADOR: Primeira Câmara Cível
PUBLICAÇÃO: 12.4.1999

Decisão: acordam os desembargadores integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do


Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento à apelação.

Ementa: Vereador – mudança de partido político – infidelidade – compromisso anterior –


impossibilidade jurídica do pedido – a mudança de partido político, ainda que rotulada de
infidelidade partidária, não acarreta a perda do mandato conferido ao eleito Vereador – por força
do ordenamento jurídico, o mandato conferido pela eleição proporcional é pertinente única e
exclusivamente ao eleito e constitui um bem indisponível, do que se segue que pedir em juízo
acerca do mandato e dos seus consectários, como a percepção de subsídios, contra esse mesmo
ordenamento, caracteriza uma impossibilidade jurídica do pedido.

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Os arts. 25 e 26 da Lei n. 9.096/95, de péssimas redações,


estabelecem que o parlamentar que deixar o partido pelo qual se elegeu ou votar
contra as diretrizes partidárias perderá o cargo e a função que exerce na
respectiva casa legislativa em virtude da proporção partidária. Prevalece, porém,
que os dispositivos atingem os cargos internos (Secretário da mesa diretora, por
exemplo), mas não o mandato parlamentar.
O mestre Fávila Ribeiro (Direito Eleitoral, 5.ª ed., Rio de Janeiro,
1999, p. 331) esclarece que a “a matéria não pode escapar do disciplinamento
estatutário, por ser terreno defeso à ingerência da lei, caracterizando-se abuso de
poder normativo, por usurpação da competência reservada pela Constituição
Federal aos partidos políticos...”.
Em síntese, entende-se que somente os estatutos partidários
podem prever as hipóteses de infidelidade partidária e suas conseqüências
(cláusula de reserva estatutária), ainda assim respeitando a inviolabilidade dos
parlamentares quanto às suas opiniões, palavras e votos.
Acredita-se, por isso, ser legítima a perda do mandato pelo
parlamentar que voluntariamente abandona o partido pelo qual foi eleito, desde
que a sanção esteja prevista no estatuto do partido, mas incabível a sanção na
hipótese de voto contrário às orientações partidárias (pela inviolabilidade que o
parlamentar desfruta quanto às suas opiniões, palavras e votos). Ou seja, as
hipóteses de perda do mandato previstas no art. 55 da CF não são taxativas (esta
posição é minoritária, pois prevalece que as hipóteses do art. 55 são taxativas e
que infidelidade partidária pode, no máximo, implicar a expulsão do partido, sem
que isso acarrete a perda do mandato).

Os Partidos
Relacionamos aqui os partidos políticos, com os respectivos Presidentes, que se
encontravam devidamente registrados no Superior Tribunal Eleitoral até o dia 02.05.2004.
SIGLA NOME PRESIDENTE NACIONAL CARGO Nº

1 PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro Michel Temer Deputado 15


2 PTB(PSD)* Partido Trabalhista Brasileiro Roberto Jefferson Deputado 14
3 PDT Partido Democrático Trabalhista Carlos Roberto Lupi - 12
4 PT Partido dos Trabalhadores José Genoino Neto - 13
5 PFL Partido da Frente Liberal Jorge Konder Bornhausen Senador 25
6 PL (PST/PGT)* Partido Liberal Valdemar Costa Neto Deputado 22
7 PC do B Partido Comunista do Brasil José Renato Rabelo - 65
8 PSB Partido Socialista Brasileiro Miguel Arraes - 40
9 PSDB Partido da Social Democracia Brasileira José Serra - 45
10 PTC Partido Trabalhista Cristão (Antigo PRN) Daniel Sampaio Tourinho - 36
11 PSC Partido Social Cristão Víctor Jorge Abdala Nósseis - 20
12 PMN Partido da Mobilização Nacional Oscar Noronha Filho - 33
13 PRONA Partido de Reedificação da Ordem Nacional Eneas Ferreira Carneiro - 56
14 PRP Partido Republicano Progressista Ovasco Roma Altimari Resende - 44
15 PPS Partido Popular Socialista- (Antigo PCB) Roberto J. P. Freire Deputado 23
16 PV Partido Verde José Luiz De França Penna - 43
17 PT do B Partido Trabalhista do Brasil Antônio Rodriguez Fernandez - 70
18 PP Partido Progressista (Antigo PPB) Pedro Corrêa - 11
19 PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado José Maria De Almeida - 16

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20 PCB Partido Comunista Brasileiro Zuleide Faria De Melo - 21


21 PRTB Partido Renovador Trabalhista Brasileiro José Levy Fidelix Da Cruz - 28
22 PHS Partido Humanista da Solidariedade Francisco Caminha - 31
23 PSDC Partido Social Democrata Cristão José Maria Eymael - 27
24 PCO Partido da Causa Operária Rui Costa Pimenta - 29
25 PTN Partido Trabalhista Nacional Dorival Masci De Abreu - 19
26 PAN Partido dos Aposentados da Nação Dreyfus Bueno Rabello - 26
27 PSL Partido Social Liberal Luciano Caldas Bivar - 17

(*) Incorporação do PSD ao PTB.


(*) Incorporação do PST e do PGT ao PL.

Estudos Dirigido
O aluno deverá fazer uma leitura atenta do artigo 17 da Constituição Federal e,
posteriormente, responder as seguintes questões. Toda questão que ensejar resposta “sim” ou “não”,
deverá ser justificada.

1. Qual é o documento que regulamenta a organização e funcionamento do Partido Político?


2. Como os Partidos Políticos obtém personalidade de direito?
3. Quais são os princípios que devem ser respeitados na organização dos Partidos Políticos?
4. Quais são as limitações impostas quanto a fusão de Partidos Políticos?
5. O que se entende por fidelidade partidária?
6. A onde encontra-se a regulamentação da fidelidade partidária?
7. A pessoa jurídica, Partido Político, pertence a qual ramo do direito positivo?
8. Quais são a limitações impostas aos Partidos Políticos na obtenção de recursos?

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