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A legislação atual
segundo o CONSU, “deve ser elaborada pela operadora e terá como objetivo principal
relacionar, se for o caso, todas as doenças de conhecimento prévio do consumidor,
em relação a ele próprio e a todos os seus dependentes integrantes do contrato”.
Para preenchimento dessa declaração, o CONSU criou o seguinte procedimento:
o consumidor deve escolher, na rede credenciada ou apresentada pela empresa, um
médico para realizar uma “entrevista qualificada”, que resultará no preenchimento do
formulário de declaração de saúde, sem qualquer ônus para o consumidor. Ainda
segundo o CONSU, “o médico escolhido atuará como orientador, esclarecendo, no
momento do preenchimento do formulário, todas as questões relativas às principais
doenças ou lesões passíveis de serem classificadas como preexistentes, as
alternativas de cobertura e demais conseqüências em relação a sua omissão”. Se o
consumidor preferir, pode optar por ser orientado por outro médico, não pertencente
à lista de profissionais da rede credenciada da operadora contratada, mas terá que
arcar com o ônus dessa entrevista.
Caso seja declarada alguma doença ou lesão preexistente, a operadora deverá
oferecer ao consumidor a possibilidade de optar, por escrito, por uma das duas
alternativas a seguir: cobertura parcial temporária ou agravo do contrato.
A resolução CONSU no 15, de 29 de março de 1999, que altera parte do texto
da resolução CONSU no 02, define cobertura parcial temporária como “aquela que
admite num prazo determinado a suspensão da cobertura de eventos cirúrgicos, leitos
de alta tecnologia e procedimentos de alta complexidade, relacionados às doenças e
lesões preexistentes” (Brasil, 1999). O agravo significa pagamento mais caro desde o
início do contrato para ter direito ao atendimento sem ter que esperar os 24 meses da
cobertura parcial temporária. Essa resolução também determina que “o agravo pode
ser aplicado apenas à patologia que requeira evento cirúrgico, e/ou uso de leitos de
alta tecnologia, e/ou procedimentos de alta complexidade”. Ou seja, em caso de
doença ou lesão preexistente, o consumidor poderá escolher entre aguardar 24 meses
ou pagar mais caro desde o início do contrato para ter direito ao atendimento integral.
Essa decisão depende, segundo a lei, “exclusivamente da decisão do consumidor por
meio de declaração expressa”.
Ainda segundo a resolução CONSU no 15, de 29 de março de 1999, se a opção
for pela cobertura parcial temporária, as operadoras somente poderão suspender,
durante o prazo máximo de 24 meses, cirurgias, uso de leito de alta tecnologia e/ou
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RDCs são resoluções aprovadas pela diretoria colegiada da ANS, que começaram a ser editadas após a criação da
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Agência.
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cobertura parcial temporária. Entretanto, a lei diz que não pode haver recontagem de
carência para atualização de contratos antigos, portanto se o plano tiver mais de 24
meses, já terá cumprido o máximo permitido de carência para doenças preexistentes,
devendo a cobertura ser, portanto, integral. Em relação ao agravo, o CONSU não
permitiu aumento de mensalidade por doença preexistente, no caso de adaptação de
contrato antigo às novas regras. Se o consumidor preferir ficar com o plano antigo,
que prevê exclusão de cobertura para doenças preexistentes, precisar de atendimento
para alguma delas e a operadora negar o atendimento, o consumidor poderá recorrer
à justiça, com grande chance de vencer. Entretanto, isso poderá ser custoso e
demorado, nesse sentido seria mais interessante, para os consumidores, ajustar o
plano antigo às novas regras.
Um problema que tem ocorrido com freqüência para os usuários que tem plano
empresarial e passam para individual (em função de perda de emprego) é que muitas
operadoras estão considerando como doença preexistente aquelas doenças
apresentadas pelo usuário no plano anterior. Essa conduta pode ser considerada
abusiva (Salazar et al, 2002).
Toda essa legislação sobre doenças preexistentes não tem sido suficiente para
garantir satisfação entre consumidores e empresas de planos de saúde. Segundo a
advogada do IDEC Karina Rodrigues, as empresas de planos de saúde foram campeãs
de reclamações na entidade em 2002 e até março deste ano. Em abril, ocuparam o
segundo lugar, perdendo somente para telefonia (O Globo, 2003). Em 2002, o IDEC
registrou 2.163 reclamações contra planos de saúde. Este ano, 855 consumidores
fizeram queixas, um crescimento de 17,3% sobre igual período de 2002. As principais
queixas são aumento abusivo de mensalidades para idosos, recusa a dar atendimento
alegando que os consumidores tinham doenças preexistentes e descredenciamento de
médicos e hospitais sem aviso prévio (O Globo, 2003).
O IDEC divulgou relatório, em fevereiro, revelando que, na média, os planos
não cumpriam muitas das regras da Lei 9.656/98 (Diário Catarinense, 2003) . Além
disso, o Instituto coloca em dúvida a eficiência do órgão fiscalizador, a Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Nesse estudo do IDEC, técnicos se passaram
por consumidores e testaram o cumprimento das regras por oito importantes planos
de saúde. A conclusão foi que até 50% das empresas agiam em desconformidade com
a legislação. Em um dos itens pesquisados (enquadramento como doença
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Rede Prestadora 823 4,7 283 15,9 2595 4,1 8 24,3 1529 3,6 523 19,2
Cobertura 1035
Assistencial 3264 18,8 238 13,3 0 16,4 757 11,4 6120 14,2 334 12,3
Operadoras e 1140
Planos de Saúde 2844 16,4 109 6,1 5 18,1 742 11,1 6688 15,5 279 10,3
Contrato e
Regulamento 2231 12,8 116 6,5 7509 11,9 550 8,3 4450 10,3 242 8,9
Doença ou
Lesão 106 375 223
Preexistente 6 6,1 117 6,6 9 6,0 540 8,1 6 5,2 212 7,8
Mecanismos de
Regulação 176 1,0 18 1,0 668 1,1 74 1,1 448 1,0 56 2,1
Carência 954 5,5 20 1,1 3100 4,9 66 1,0 1833 4,3 37 1,4
Aposentados,
Demitidos e
Exonerados 913 5,3 5 0,3 2523 4,0 55 0,8 1626 3,8 35 1,3
Urgência e
Emergência 345 2,0 35 2,0 1328 2,1 99 1,5 650 1,5 30 1,1
Reembolso 343 2,0 20 1,1 786 1,2 70 1,1 436 1,0 22 0,8
Internação 241 1,4 14 0,8 705 1,1 36 0,5 313 0,7 21 0,8
Cobertura
Geográfica 112 0,6 9 0,5 258 0,4 12 0,2 187 0,4 2 0,1
SUS - Sistema
Único de Saúde 39 0,2 1 0,1 118 0,2 2 0,0 63 0,1 2 0,1
ANS 246 1,4 0 0,0 5390 8,5 2 0,0 9108 21,1 1 0,0
Outros 828 4,8 116 6,5 614 1,0 149 2,2 259 0,6 16 0,6
11
173 100, 178 100, 631 100, 665 100, 430 100 271 100
TOTAL 63 0 5 0 01 0 7 0 65 ,0 9 ,0
O Programa Olho Vivo realizou 296 diligências fiscalizadoras, nas quais foram
checadas todas as obrigações legais das operadoras selecionadas por amostragem.
Até o final de 2003, o Programa estima que cerca de 30% das operadoras no mercado
terão sido fiscalizadas. Em relatório preliminar, o Programa Olho Vivo indicou
irregularidades em 50% dos processos de fiscalização. Entre estes, cerca de 30%
apresentaram como irregularidade “deixar de garantir no contrato a descrição
adequada dos procedimentos relacionados à doença ou lesão preexistente para efeito
da cobertura parcial temporária”.
A seguir descrevemos alguns casos de processos motivados por denúncias por
negativa de cobertura sob alegação de doença preexistente, e os respectivos
pareceres da ANS.
CASO 1
CASO 2
CASO 3
CASO 4
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CASO 5
CASO 6
CASO 7
apresenta uma doença mais grave que necessite de evento cirúrgico, e/ou uso de
leitos de alta tecnologia, e/ou procedimentos de alta complexidade, sob alegação de
omissão de informação de doença preexistente. Um exemplo clássico é a descoberta
de um câncer, alguns meses após a assinatura do contrato, cujo tratamento
demanda, muitas vezes, procedimentos de alta complexidade, como quimioterapia e
radioterapia. Muitas vezes, as empresas têm tentado rescindir o contrato, alegando
doença preexistente. Entretanto, fica extremamente difícil provar que o consumidor
tinha conhecimento do diagnóstico e o omitiu deliberadamente. Uma vez que o câncer
(e outras doenças crônicas) apresenta longo período de latência, podendo atingir
décadas, durante o qual existem alterações celulares mas ainda não começaram a
surgir os primeiros sintomas, é provável que a doença já existisse quando o contrato
foi assinado. Entretanto, isso não quer dizer que o usuário tivesse conhecimento do
diagnóstico, por duas razões: o diagnóstico poderia não ter sido ainda realizado, ou,
mesmo que tivesse sido, o paciente poderia não ter sido informado do diagnóstico.
As operadoras costumam utilizar declarações médicas para tentar comprovar
conhecimento prévio do consumidor e, portanto, fraude na declaração de saúde.
Entretanto, as declarações fornecidas por médicos, integrantes ou não do quadro de
profissionais da operadora, podem não demonstrar o conhecimento prévio do
consumidor, se não houver comprovação de diagnóstico realizado antes da data da
assinatura do contato. Uma vez que a declaração é fundamentada na história
patológica pregressa do consumidor, a única prova válida de doença preexistente
seria o diagnóstico anterior detectando a doença ou lesão. Considera-se, que até
mesmo o fato do consumidor ter problemas de saúde, antes da data de adesão ao
plano de saúde, não prova o conhecimento de sua condição física, posto que a
doença, ainda que tenha apresentado sintomas, pode não ter sido diagnosticada.
Dessa forma, o consumidor por não estar ciente de seu real estado de saúde, não
informará doença(s) quando preencher o formulário de declaração de saúde.
Mesmo quando o consumidor preenche corretamente a declaração de saúde,
informando todas as doenças de seu conhecimento previamente à assinatura do
contrato, as empresas tentam, muitas vezes, suspendê-lo quando surge a
necessidade de algum tratamento mais dispendioso. Como exemplos, podemos citar
casos nos quais foi declarada hipertensão arterial e o usuário apresentou acidente
vascular cerebral, durante os primeiros 24 meses de contrato. Ou então, casos nos
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quais foi declarada diabetes mellitus e o usuário apresentou crise hipertensiva alguns
meses depois (Galdino, 2001). E, vários casos similares a esses, as operadoras
tentaram suspender o contrato, sob alegação de omissão de doença preexistente.
Entretanto, pode ser demonstrado que, mesmo com a possibilidade de se tratarem de
complicações de doenças preexistentes, tais quadros clínicos não haviam ainda
ocorrido quando o contrato foi assinado, e, portanto, não poderiam estar sendo
omitidos. Todos esses exemplos, quando foram levados a julgamento, tiveram
resultados favoráveis ao consumidor, tendo as empresas que arcar com os custos dos
respectivos tratamentos.
Outra questão bastante controversa é a definição de alta complexidade. O
Ministério da Saúde, com a finalidade de acompanhar a utilização de recursos
financeiros, assegurar o controle e qualidade do atendimento no SUS e hierarquizar a
rede assistencial, divulgou uma lista de procedimentos considerados de alta
complexidade através da portaria número 627/GM de 26 de abril de 2001 (Brasil, MS,
2001a). Essa lista tem sido periodicamente alterada por inclusão de novos
procedimentos ou exclusão de certos procedimentos que passam a ser considerados
estratégicos, mas não de alta complexidade, como, por exemplo, transplante de
medula óssea e cirurgias de correção para deformidades crânio-faciais (Brasil, MS,
2001b). Uma vez que não existe uma definição médica para esse termo, atualmente
se utiliza a lista de procedimentos de alta complexidade divulgada pelo CONSU. Essa
lista gerou muita discussão devido ao questionamento sobre alguns procedimentos aí
incluídos que não caracterizariam alta complexidade, tais como determinação do
volume plasmático, refluxo gastro-esofágico, cistografia, gastrostomia percutânea
entre outros. Para alguns procedimentos, tais como quimioterapia, radioterapia e
hemodiálise, existe razoável consenso que se tratam de alta complexidade, porém sua
exclusão, mesmo que temporária, pode ser considerada um retrocesso, pois os
contratos antigos já previam a cobertura desses tratamentos (Salazar et al, 2002).
O papel da ANS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente, existe um aumento da freqüência de comorbidades na população
usuária dos planos de assistência à saúde, decorrente do envelhecimento populacional
e do aumento das doenças crônico-degenerativas. Assim, com o passar do tempo,
parcela cada vez maior da clientela das empresas operadoras de planos de saúde será
portadora de doenças ou lesões preexistentes. Esse fato, aliado aos custos crescentes
da tecnologia médica devido à comercialização de novos materiais e equipamentos,
está levando o sistema de saúde suplementar a uma crise financeira, com falências de
diversas empresas.
A tentativa de escapar do custo elevado dos tratamentos de alta complexidade,
pela legislação atual sobre doenças e lesões preexistentes, não parece ser um
caminho adequado para sair da crise, pois fere princípios constitucionais fundamentais
na atenção à saúde.
Talvez, um caminho possível a médio e longo prazo para a crise no setor, seja o
aumento dos investimentos em medidas de promoção da saúde e prevenção de
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REFERÊNCIAS
11.COSTA, N.R.; RIBEIRO, J.M.; SILVA, P.L.B. & MELO, M.A., 2002. As agências de
regulação independentes. In: Brasil, Ministério da Saúde, Agência Nacional de
Saúde Suplementar. Regulação & Saúde, Estrutura, Evolução e Perspectivas da
Assistência Médica Suplementar, Rio de Janeiro, p. 133-143.
12.DIÁRIO CATARINENSE, 2003. CPI dos planos de saúde quer mudar a lei. Diário
Catarinense, Florianópolis, 16 de junho de 2003.
15.O GLOBO, 2003. Multas a planos de saúde somam R$ 671 milhões. O Globo,
Rio de Janeiro, 16 de junho de 2003.
16.SALAZAR, A.; RODRIGUES, K.; SILVER, L. & DOLCI, M.I.R.L., 2002. Planos de
Saúde. São Paulo, Série Cidadania, Editora Globo/IDEC.