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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Ana Carolina Rocha Vaz

O celular e os novos modos de socialização

MESTRADO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA E DESIGN DIGITAL

SÃO PAULO

2010
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP

Ana Carolina Rocha Vaz

O celular e os novos modos de socialização

MESTRADO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA E DESIGN DIGITAL

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora como exigência parcial
para obtenção do título de Mestre em
Tecnologias da Inteligência e Design
Digital pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, sob a
orientação do Professor Doutor Nelson
Brissac Peixoto.

SÃO PAULO

2010
Banca Examinadora

_____________________________________

_____________________________________

_____________________________________
AGRADECIMENTOS

Meus pais, Paulo e Esther, por terem me


dado a base material e espiritual para que
eu pudesse me desenvolver.

Meu marido, Fábio, que me indicou o


curso e sempre me incentiva a melhorar.

Ao professor Nelson Brissac, por sua


generosidade e pelo apoio ao meu
trabalho desde o início.

A Deus, por mais uma oportunidade de


estudar e me aprimorar.
VAZ, Ana Carolina Rocha. O celular e os novos modos de socialização.
2010. xx p. Dissertação (Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design
Digital) - Pontifícia Universidade de São Paulo – PUC-SP.

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo apontar e analisar os impactos do uso do


telefone celular na vida em sociedade. Observou-se que o uso desse aparelho
pode fortalecer relacionamentos através da troca de informações entre os
usuários por meio de fotos, vídeos, mensagens de texto e chamadas de voz.

O celular mostrou ser o elemento central da computação ubíqua e o que o


diferencia dos outros dispositivos móveis é o fato de poder reunir uma série de
recursos dentro de um equipamento superportátil.

O telefone móvel é uma ferramenta eficiente para a coordenação de atividades


e a possibilidade de reagendamento de compromissos em tempo real, nos
intervalos entre uma atividade e outra, pode transformar a experiência do
tempo, segundo estudiosos da área. A inserção de sistemas de localização
nesse dispositivo permitiu novas formas de apropriação do espaço físico,
sobretudo nos centros urbanos.

As conseqüências de se estar acessível o tempo todo, de qualquer lugar,


também foram discutidas. Há dois movimentos ocorrendo em sentidos opostos:
ao mesmo tempo em que temos ao nosso alcance nossa rede de contatos,
também ficamos vulneráveis para quem quiser nos encontrar.

Essa pesquisa é resultado da leitura do trabalho de autores que analisam as


mudanças sociais que ocorreram com o avanço no desenvolvimento das
tecnologias da inteligência, como Pierre Levy e Manuel Castells. A questão do
impacto do uso do telefone celular foi discutida a partir de pesquisas de Lucia
Santaella, André Lemos, Adriana Souza e Silva, Richard Ling e Howard
Rheingold.

Palavras-chave: telefone celular, modos de socialização, redes móveis,


práticas sociais, dispositivos móveis
ABSTRACT

The aim of this project is to identify and analyze the impacts of mobile
telephone use in society. It was observed that use of this device can strengthen
relationships through the exchange of information between users by means of
photos, videos, text messages and phone calls.

The mobile phone has proven to be a key element in ubiquitous computing and
what differentiates it from other mobile devices is the fact that it can combine a
number of features in one super-portable piece of equipment.

Mobile phones are an efficient tool for coordinating activities. The possibility of
rescheduling commitments in real-time, during breaks between one activity and
another, can transform the experience of time according to researchers. The
addition of localization systems to this device allowed new methods of
appropriating physical space, especially in urban centers.

The consequences of being available any time, any place, were also discussed.
There are two movements going in opposite direction: although we have our
entire social network available, at the same time, we become more vulnerable
to those who wish to find us.

This study is the result of reading the work of authors who analyzed the social
changes occurring due to the advances in the development of smart
technologies such as Pierre Levy and Manuel Castells. The issue of the impact
caused by the use of mobile phones was discussed based on the research by
Lucia Santaella, André Lemos, Adriana Souza e Silva, Richard Ling and
Howard Rheingold.

Keywords: cell phone, mobile networks, social practices, mobile devices


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – iPhone: o primeiro celular com tela sensível ao toque 13


Figura 2 – Tela do Whereabouts Clock 32
Figura 3 – Protótipo da Wearable Key 33
Figura 4 – Tela de simulação do Mscape 36
Figura 5 – Tela do projeto MARA 39
Figura 6 – Locast: mapa de Veneza e as tags de informação 41
Figura 7 – Tela do My Location 42
SUMÁRIO

1 Introdução 1

1.1 Objetivos 4

1.2 Recorte do objeto 7

1.3 Fundamentação teórica 8

1.4 Estrutura do trabalho 9

2 O impacto dos telefones celulares nas nossas vidas 11

2.1 A era da computação ubíqua 15

2.2 Finalmente, a mobilidade 18

2.3 O telefone celular no Brasil 19

2.4 Conseqüências da conexão permanente 25

2.5 Público x privado 28

3 Reapropriação do espaço urbano 31

3.1 Mídias locativas 37

3.1.1 Realidade aumentada 38

3.1.2 Mapeamento e monitoramento do movimento 39

3.1.3 Geotags 40

3.1.4 Anotações urbanas 43

3.1.5 Wireless mobile games 44

4 Mais proximidade nos relacionamentos 47

4.1 A cultura das imagens instantâneas 51

4.2 O poder das mensagens de texto 55

4.3 Compartilhamento de aparelhos 60


4.4 Coordenação de atividades 63

4.4.1 Tempo mais flexível 67

5 Considerações finais 69

Referências bibliográficas 73
CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO

Desde o início deste século vivemos intensamente uma nova migração

tecnológica. Estamos deixando as telas estáticas de nossos computadores de

mesa (os desktops) e temos a possibilidade de fazer todas as nossas

atividades remotamente. Não há mais a limitação que representa a obrigação

de ter que parar na frente do computador (ou da TV, ou do rádio) para se

informar, trabalhar, conversar com alguém ou se divertir. Quando se tem um

telefone celular à mão, “não só a cidade, mas qualquer parte do mundo se

tornou acessível ao toque de minúsculos dígitos de um pequeno aparelho”

(SANTAELLA, 2007, p. 231).

O avanço da tecnologia para promover a mobilidade no processo de

comunicação e na transferência de dados pode alterar nossa relação com o

mundo. A possibilidade de se estar conectado 24 horas por dia e, o melhor, em

movimento, é uma mudança radical na forma de se pensar em tempo e

espaço. Dessa nova relação surgem novas formas de relacionamento.

Com todas as funcionalidades do telefone celular (disponibilidade de

conexão constante e mobilidade, por exemplo) ao alcance das mãos, o usuário

se torna livre para interagir com suas diversas redes sociais (sejam elas físicas

ou virtuais), tendo como limite apenas a infra-estrutura tecnológica de seu

equipamento e da localidade em que está. Com isso ele “aumenta seu controle

sobre o processo de comunicação” (CASTELLS et al., 2004, p. 238, tradução

nossa) e cria uma série de possibilidades de interação, principalmente quando

o celular pode se conectar a Internet: “quando se consolidar, a Internet móvel

não será apenas uma forma de se fazer o mesmo em movimento, mas uma

1
maneira de fazer coisas que antes eram impossíveis” (RHEINGOLD, 2002,

p.20, tradução nossa).

Pode-se dizer que uma das grandes vantagens que os dispositivos

móveis nos trazem é a “capacidade do indivíduo de estar simultaneamente

consigo mesmo e em rede” (CASTELLS et al., 2004, p. 239, tradução nossa).

Essa disponibilidade pode resultar em novas práticas sociais: “As inúmeras

formas de interação entre os usuários e o ciberespaço criam uma grande

quantidade de comportamentos inovadores, cujas conseqüências sociais e

culturais estão começando a ser estudadas” (SANTAELLA, 2007, p. 126).

O telefone celular se tornou um equipamento importante nas atividades

cotidianas e sua relevância aparece nos resultados de algumas pesquisas. É

possível dizer, por exemplo, que o telefone celular está se tornando a

ferramenta central de conexão à Internet. De acordo com o relatório

Convergence Mobile Devices, elaborado pelo instituto de pesquisa IDC (2008),

a previsão é de que, em 2009, existam no mundo 1,9 bilhão de usuários que

acessam a Internet através de um computador comum e 3 bilhões de usuários

que se conectam à web por meio do telefone celular.

Levantamentos mostram que, na hora de se escolher uma assinatura de

serviço de telefonia, a preferência é pelo celular. No Brasil, por exemplo, quem

compra novas linhas de telefone tende a optar por um aparelho móvel: “De

2007 para 2008, mais 4,4 milhões de domicílios passaram a ter algum tipo de

telefone, dos quais 3,98 milhões adquiriram somente celular” (INSTITUTO

BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2009). Nos próximos

capítulos, veremos que essa preferência não é motivada apenas pela

2
mobilidade oferecida pelo celular. A falta de infra-estrutura para a telefonia fixa

e o custo mais baixo dos portáteis somam pontos positivos para a escolha por

um telefone móvel.

A partir do momento em que se torna possível conectar a Internet a

partir do celular, a relação entre o usuário e o dispositivo móvel fica mais

estreita, devido às possibilidades de acesso através da conexão sem fio, o que

dá um novo significado para essas ferramentas de comunicação. “Os telefones

celulares permitem que as pessoas não apenas troquem informações de forma

mais rápida e economizem tempo, mas também entrem em contato com outras

pessoas enquanto se está fazendo alguma outra coisa” (YANG et. al, 2008,

tradução nossa).

Kristóf Nyíri (2009) entende que, com o avanço da tecnologia, o celular

será a principal interface com que vamos interagir com os mundos real e

virtual:

Ao combinar as opções de chamadas de voz com mensagens de


texto e multimídia e, também, com o envio de e-mails, o celular se
tornará a interface natural através da qual o usuário poderá fazer
compras, operações bancárias, agendar vôos (...). É óbvio que o
celular está se tornando um instrumento único para a comunicação
mediada por computadores, fazendo a intermediação não apenas
entre pessoas, mas entre pessoas e instituições e até mesmo entre
pessoas e o mundo dos objetos inanimados (NYÍRI, 2009, tradução
nossa)

Os celulares estão sempre conosco, geralmente colocados em bolsos,

cintos, mochilas e bolsas, “tornando-se um acessório indispensável para a vida

diária” (SOUZA E SILVA, 2006, tradução nossa). A presença constante dos

celulares em nosso dia-a-dia pode até mesmo criar um grau de dependência

das pessoas com relação ao aparelho, como pode ser visto em uma pesquisa

3
com 4 mil pessoas nos Estados Unidos e no Reino Unido. O levantamento

mostrou que 82% das pessoas têm medo de perder seus celulares e que 40%

das pessoas têm mais receio de perder o telefone móvel do que a própria

carteira (MFORMATION, 2009).

Em movimento pelo espaço físico, a maneira pela qual nos

comunicamos pode se dar de formas até então impossíveis e isso traz efeitos

para muitos aspectos de nossas vidas, o que resulta em impactos na

sociedade como um todo. “Uma modificação técnica é uma modificação da

coletividade cognitiva, implicando novas analogias e classificações, novos

mundos práticos, sociais e cognitivos” (LÉVY, 1996, p. 145). Aqui, a

modificação técnica é a mobilidade permitida pelo telefone celular. O objetivo

desse trabalho, como veremos a seguir, é tratar dessas mudanças na forma de

nos socializarmos, que estão emergindo a partir do momento em que a

possibilidade de conexão contínua do telefone celular a redes sociais passou a

fazer parte de nossas vidas.

1.1 - Objetivos

O objetivo desse trabalho de pesquisa é apontar modos de socialização

que surgem da interação dos humanos com dispositivos eletrônicos móveis e

validá-los, através de conceitos encontrados a partir da leitura de autores que

estão estudando o impacto dos telefones celulares nas pessoas e na vida em

sociedade.

O foco está no uso dos telefones celulares, porque outros dispositivos

móveis, como notebooks em suas diferentes formas (dos laptops aos seus

4
irmãos menores, os netbooks), também permitem a conexão móvel à Internet e

até mesmo chamadas telefônicas (que podem ser feitas por meio de softwares,

que permitem esse tipo de ligação, como o Skype1), mas esses computadores

não oferecem a mesma portabilidade que o telefone celular, que pode ser

transportado a qualquer lugar devido ao seu tamanho.

Essa dissertação de mestrado representa o início de uma pesquisa mais

profunda que pode continuar no doutorado sobre quem é este novo homem,

que pode realmente voltar a ter um estilo de vida nômade, como no início de

sua evolução, graças aos avanços das tecnologias móveis de comunicação e

transferência de dados.

Uma das formas de identificar essas novas práticas sociais é analisar

como os telefones celulares têm sido usados. Estudei a questão em minha

monografia de conclusão do curso de pós-graduação em Mídias Interativas do

Centro Universitário Senac, de São Paulo. A pesquisa foi desenvolvida a partir

da análise de protótipos elaborados para serem ferramentas que poderiam ser

adotadas no contexto das redes móveis (VAZ, 2008).

Os novos modos de socialização que emergem da comunicação móvel

podem ser indicados a partir da identificação de tendências de uso. Na

primeira pesquisa (VAZ, 2008), apontei cinco delas:

Computação por contexto: as informações sobre o ambiente onde o

computador está inserido são fundamentais para que a máquina atenda

precisamente as demandas de seu usuário. Através da computação por

1
http://www.skype.com/intl/pt/

5
contexto, o dispositivo móvel pode, antes que o usuário peça, carregar

sua configuração pessoal a partir de mecanismos de identificação sem

fio.

Realidade aumentada: A sobreposição de elementos virtuais sobre a

paisagem real, seja por projeções diretamente sobre os objetos ou pela

mistura de elementos virtuais e reais diretamente na tela do dispositivo

móvel, pode ser utilizada para diversas aplicações de serviço ao usuário,

publicidade e entretenimento.

Computadores de vestir: da expressão em inglês wearable computer,

são máquinas que se acoplam ao corpo ou às roupas do usuário para

atender suas necessidades de conexão e compartilhamento de

informações. Neste caso, os dispositivos computacionais podem até ser

interpretados como extensões do corpo humano.

Localização: A disponibilidade de recursos que indicam onde está o

usuário, como o Sistema de Posicionamento Global por satélite

(conhecido pela sigla GPS, de Global Positioning System), e a

mobilidade permitida pelo uso desses dispositivos destacam a

importância da localização do usuário para diversas aplicações.

Colaboração: todos podem desenvolver e distribuir conteúdo através de

suas redes sociais que, com a conexão sem fio à Internet, agora podem

ser acessadas pelos telefones celulares. Em movimento, as pessoas

6
podem tornar muito mais dinâmica a participação em comunidades

virtuais.

Todas essas tendências acabam se combinando, porque muitas

aplicações utilizam mais de uma delas. Portanto, nos exemplos citados na

monografia (VAZ, 2008), procurei aplicações em que uma das tendências tinha

mais destaque e podia ser melhor explicada.

Com o avanço das leituras durante o andamento do mestrado, inseri

outras tendências de uso como a coordenação de atividades e a troca de

mensagens de texto.

1.2 – Recorte do objeto

A tecnologia de comunicação sem fio engloba uma variedade imensa de

questões e há diferentes abordagens para cada uma delas. Para definir o tema

desta dissertação foi preciso escolher, entre diversos aspectos relacionados ao

uso dos dispositivos móveis, o que poderia ser mais um passo em minha

trajetória acadêmica e que estimulasse novas pesquisas. Além disso, a

dissertação também poderia reunir pensamentos de diversos autores e, dessa

forma, ajudar outras pessoas que estão começando a estudar o assunto.

Pretendo continuar meu percurso pesquisando o impacto dos

dispositivos móveis, principalmente os telefones celulares, na forma como nos

relacionamos. Para isso, estou buscando estudos de caso e autores que tratem

das novas formas de socialização resultantes do uso desse equipamento.

7
1.3 – Fundamentação teórica

Para entender as mudanças provenientes do emprego dos telefones

móveis na comunicação interpessoal, nas relações de trabalho e no

entretenimento, busquei autores que vêm discutindo o assunto tanto no Brasil

como em outros países.

Entre eles estão Lucia Santaella, autora do livro Linguagens Líquidas na

Era da Mobilidade, que foi a principal contribuição para essa dissertação; e

Pierre Lévy, que analisa a evolução do que ele chama de “tecnologias da

inteligência”. A leitura de suas obras, nem todas citadas aqui, foi fundamental

para a reflexão sobre o impacto dos telefones celulares na sociedade. Howard

Rheingold também foi importante, porque ele tratou da interação humana nas

redes sociais na Internet e, posteriormente, também passou a discutir os

efeitos da conexão móvel nos relacionamentos (analisando profundamente a

coordenação de atividades através dos celulares). Manuel Castells,

pesquisador do impacto das redes, e Paul Levinson, autor de um livro que trata

dos efeitos do telefone celular em nossas vidas, foram autores fundamentais

para o desenvolvimento da pesquisa.

Também foram de grande importância as pesquisas de dois estudiosos

brasileiros que estão explorando os impactos do uso do telefone celular: André

Lemos e Adriana de Souza e Silva, que contribuiu na pesquisa indicando

outros autores para leitura, como Richard Ling.

8
1.4 – Estrutura do trabalho

Após essa introdução, o capítulo 2 traz o resultado das leituras feitas

sobre os impactos do uso do telefone celular em nossas vidas, mostrando

como grandes pesquisadores da área estão vendo as mudanças na sociedade

causadas pela computação ubíqua. O capítulo traz a evolução do celular no

Brasil e sugere algumas conseqüências da conexão permanente permitida por

esses equipamentos.

No capítulo 3, começamos a tratar dos modos de socialização que são

resultado do uso desses aparelhos. O primeiro a ser abordado é a apropriação

do espaço urbano pelos usuários de telefones celulares, que tem como

principal estímulo as ferramentas que apontam o posicionamento do usuário

enquanto ele se desloca. Com base no trabalho de André Lemos, é feito um

panorama do que são mídias locativas.

O capítulo 4 traz uma discussão sobre a principal hipótese que motivou

esse trabalho de pesquisa: a conexão móvel poderia ser um meio para

incentivar uma aproximação maior entre as pessoas e uma ferramenta eficaz

para a coordenação de atividades. Estudos de caso realizados no Brasil e em

outros países tão díspares como Índia, Coréia do Sul e Noruega, mostram

como as pessoas estão utilizando os recursos do telefone celular (como envio

de fotos e textos) para fortalecer laços afetivos anteriores à conexão sem fio e,

também, para se unir em grandes comunidades de desconhecidos que buscam

um mesmo objetivo.

9
O capítulo 5 traz as considerações finais sobre a pesquisa e algumas

questões que podem ser estudadas no futuro.

10
Capítulo 2 - O impacto dos telefones celulares nas nossas vidas

É possível dizer que a criação dos telefones celulares e demais

dispositivos móveis, definidos por Lucia Santaella (2007, p.199) como

"tecnologias da conexão contínua”, foi incentivada a partir das necessidades de

trabalho, comunicação e lazer das pessoas, que passaram a estar cada vez

mais em trânsito, fora de sua base (seja ela a casa, o local de estudo ou o de

trabalho). E, em movimento, essas pessoas precisavam continuar acessíveis

aos seus contatos. Era preciso criar uma ferramenta que permitisse o acesso a

pessoas, a execução de tarefas e a coordenação de atividades sem a

necessidade de uma estação fixa (como um computador de mesa) para trocar

informações.

Quando foi iniciada a comercialização dos primeiros aparelhos do

gênero no mundo, durante a década de 1980, os telefones portáteis eram muito

caros e a conexão, ainda analógica, era instável e restrita a certas regiões

(RAPPAPORT, 2001, p. 7-10). Porém, os avanços tecnológicos da

comunicação sem fio que surgiram gradualmente fizeram com que o telefone

celular se tornasse uma ferramenta quase obrigatória para uma série de

atividades, profissionais ou particulares. A partir do momento em que o telefone

celular se popularizou, ele se tornou “a tecnologia pessoal mais disseminada

no planeta, com a estimativa de 4,6 bilhões de assinaturas em todo o mundo

no final de 2009” (INTERNATIONAL TELECOMMUNICATION UNION, 2009,

tradução nossa).

A conexão à Internet e a inserção de recursos de entretenimento

embutidos no aparelho, como câmera de foto e vídeo e tocador de arquivos de

11
áudio em MP3, fizeram com que o telefone celular passasse a oferecer

diversas outras funcionalidades que fossem não apenas as chamadas

telefônicas. Para definir o telefone celular da atualidade, André Lemos (2007)

utiliza o termo Dispositivos Híbridos Móveis de Conexão Multirredes

(DHMCMs):

O que chamamos de telefone celular é um Dispositivo (um artefato,


uma tecnologia de comunicação); Híbrido, já que congrega funções
de telefone, computador, máquina fotográfica, câmera de vídeo,
processador de texto, GPS, entre outras; Móvel, isto é, portátil e
conectado em mobilidade funcionando por redes sem fio digitais, ou
seja, de Conexão; e Multirredes, já que pode empregar diversas
redes. (LEMOS, 2007)

Os DHMCMs de Lemos são conhecidos no mercado de telefonia como

smartphones (em uma tradução literal, “telefones inteligentes”). São produtos

que reúnem diversas funções em um só aparelho. A diferença básica entre o

telefone celular convencional e um smartphone é que o segundo é capaz de

rodar um sistema operacional próprio, como um computador comum, e tem

capacidade maior de armazenamento de dados. Isso os torna legítimos

computadores de bolso com um diferencial: são capazes de se conectar à

Internet por rede sem fio a partir de qualquer lugar em que a conexão wireless

(sem fio) esteja disponível.

Os smartphones podem desempenhar praticamente todas as tarefas

comuns de um computador convencional e muitos deles ainda vêm com

recursos extras, como o localizador GPS, que detecta, via satélite, as

coordenadas geográficas do local onde o usuário se encontra. “A nova geração

de telefones celulares poderia até ser chamada de geração de computadores

12
móveis com telefonia, pois a telefonia é apenas um dos serviços de

comunicação disponível” (SILVA, 2005).

Em 2007 foi lançado o mais famoso entre os smartphones: o iPhone, da

Apple. Ele trouxe uma nova forma de acoplamento do usuário com seu telefone

celular porque disponibiliza recursos que não eram inéditos, mas que pela

primeira vez foram usados juntos em um só aparelho de telefonia móvel: as

funções de telefone celular, computador de bolso, MP3 player e uma tela

sensível ao toque (touch screen). O iPhone também oferece outros recursos

que se tornaram “itens de fábrica”, ou seja, básicos para um telefone celular:

navegador GPS e câmera digital.

O grande chamariz do produto é a tela sensível ao toque, a interface a

partir da qual todas as funcionalidades estão acessíveis.

Figura 1 – iPhone: o primeiro celular com tela


sensível ao toque
Fonte: (ROSA, 2008)

A touch screen, até então inédita em um telefone celular (o mais próximo

disso era o uso de uma caneta chamada “stylus”, utilizada para acessar

funções na tela), trouxe à tona uma discussão sobre como o universo sensorial

muda a partir desta nova forma de interação com um dispositivo móvel.

13
Deixamos de lado o teclado, o mouse, os botões e as canetas stylus,
que serviam como condutores passivos na nossa integração com as
interfaces, e vivenciamos uma nova era de educação táctil, em que
nossos dedos interagem diretamente com o sistema e seus objetos,
tocando aquilo que antes era apenas uma representação visual,
marcando um envolvimento sensorial maior no processo da
comunicação. (ERTHAL, 2008)

Apesar de toda a ansiedade que o lançamento da Apple causou no

mundo todo - foram 1 milhão de aparelhos vendidos em menos de três meses

após o lançamento (APPLE, 2007), o primeiro iPhone não era perfeito.

Faltavam-lhe alguns recursos presentes na maioria dos celulares, tais como um

bom suporte para a tecnologia de transmissão de dados sem fio Bluetooth e

compatibilidade com o padrão de tecnologia de telefonia móvel 3G

(TURRETINE, 2007), que permite acesso à Internet em alta velocidade (um

problema que foi sanado com o lançamento do iPhone 3G, em julho de 2008).

Com o tempo, outras empresas lançaram telefones com touch screen e hoje o

consumidor tem diversas opções a escolher para acessar diversos recursos,

inclusive a Internet pelo celular.

Para Souza e Silva (2006), até mesmo a forma como entendemos a

Internet muda quando podemos conectá-la a partir do telefone portátil:

Com a adição de recursos de localização ao telefone celular, a web


estará cada vez mais conectada aos lugares físicos e, de forma
progressiva, distante a noção de ser um “não-lugar”. Além disso, a
idéia de “entrar na Internet” deve desaparecer, uma vez que os
celulares 3G estão sempre conectados à rede. (SOUZA E SILVA,
2006, tradução nossa)

É possível dizer que o iPhone, assim como seus pares repletos de

funcionalidades que se multiplicam nas vitrines das lojas, são ferramentas que,

para Paul Levinson (2004), permitem que nos tornemos um “centro de

14
comunicação móvel”, capazes de acessar quem e o que precisamos a qualquer

momento, ficando também disponíveis para quem precisar nos encontrar . “Tão

logo o telefone celular se conectou à Internet ou passou a oferecer alguns de

seus recursos (...), ele se tornou um lar fora de casa para os meios de

comunicação, uma casa móvel ou um lar de bolso” (LEVINSON, 2004, p.53,

tradução nossa).

2.1 - A era da computação ubíqua

O número cada vez maior de usuários de telefones celulares e demais

dispositivos computacionais móveis (como notebooks e câmeras digitais) traz

para a realidade o conceito de computação ubíqua introduzido por Mark Weiser

e John Seely Brown (1997). Os pesquisadores definiram três passos na

evolução da relação entre homens e computadores, utilizando como base a

relação entre o número de máquinas e o de usuários (VASSÃO, 2008).

Estamos hoje na era da conexão em que a „Ubicomp‟ profetizada por


Weiser torna-se uma realidade. Esta é, verdadeiramente, a
computação do século XXI, da era da conexão. Trata-se de colocar
as máquinas e objetos computacionais imersos no quotidiano de
forma onipresente. (LEMOS, 2004)

A era da computação ubíqua é precedida de duas etapas importantes. O

primeiro momento é chamado de “Era dos Mainframes”, situado entre as

décadas de 1960 e 1970, quando grandes computadores processavam dados

para instituições corporativas e acadêmicas. O acesso a essas máquinas

estava restrito a técnicos especializados, ou seja, um mesmo computador era

utilizado por muitas pessoas.

15
O lançamento dos primeiros computadores pessoais em 1981 marca o

início da “Era do PC”, quando se tornou possível ter um equipamento próprio

dentro de casa. Dessa forma, a relação entre número de computadores e

número de pessoas começava a ficar mais parelha, mas ainda havia um longo

caminho pela frente para que cada pessoa tivesse seu próprio dispositivo

computacional.

Finalmente, a terceira era é chamada por Weiser e Brown de

“Computação Ubíqua”. O conceito traduz a idéia de computadores inseridos em

praticamente todas as nossas atividades cotidianas.

Ao analisar o raciocínio de Weiser e Brown e a disseminação dos

telefones celulares, Souza e Silva (2006) conclui que:

Aplicar o conceito de computação ubíqua aos telefones celulares não


significa apenas perceber a característica pervasiva da tecnologia,
mas também ver o telefone celular como um tipo de computador que
inclui conexão à Internet, agenda pessoal, capacidade de receber e
enviar e-mails e mensagens instantâneas e que nos ajuda na
formação de comunidades. (SOUZA E SILVA, 2006, tradução nossa)

Nesse cenário “os dispositivos conectados não são apenas variados em

tipologia e tamanho, mas também no nível em que interagem com seres

humanos” (VASSÃO, 2008). Pode-se dizer que os notebooks, ou PCs portáteis,

bem como os computadores de mão (como palmtops e PDAs) e os diversos

modelos de telefones celulares, desde os mais simples, capazes de fazer e

receber chamadas e enviar mensagens de texto, até os mais convergentes,

incluindo os smartphones, são os equipamentos que trazem para a realidade

dos dias de hoje o conceito de computação ubíqua.

16
A partir da leitura de autores que estudam o tema (LEMOS, 2007;

SOUZA E SILVA, 2006; LEVINSON, 2004; SANTAELLA, 2007; CASTELLS et

al., 2004; RHEINGOLD, 2002) é possível sugerir também que o telefone celular

é, hoje, o dispositivo móvel mais importante na comunicação sem fio. O grande

trunfo do telefone celular sobre outros dispositivos móveis seria o fato de que,

além das chamadas, ele é capaz de oferecer muitos outros recursos dentro de

um aparelho superportátil.

O desenvolvimento das tecnologias que proporcionam a conexão móvel

permitiu, além da transmissão de volumes maiores de dados, que os telefones

celulares fossem se tornando cada vez mais acessíveis para todas as classes

sociais e faixas etárias. Estão disponíveis para compra, como alternativa aos

modelos de ponta, que sempre serão mais caros, celulares a preços mais

baixos, que permitem a disseminação do uso das tecnologias de comunicação

móvel: “a queda dos preços dos serviços móveis tem tornado a tecnologia cada

vez mais acessível e, como resultado, com maior poder para atrair usuários

diversos” (CASTELLS et al., 2004, p. 42, tradução nossa).

Vivemos hoje em uma sociedade que está adaptando suas práticas a

esses dispositivos móveis que, pelos recursos disponibilizados, incentivam

novas formas de interação e relacionamento. Pierre Lévy entende que “o

aspecto da informática mais determinante para a evolução cultural e as

atividades cognitivas é sempre o mais recente, relaciona-se com o último

envoltório técnico” (LÉVY, 1997, p. 102). Nos dias de hoje, esse “envoltório

técnico” é a conexão sem fio e todas as ferramentas tecnológicas que a tornam

possível.

17
A possibilidade de que milhões de pessoas tenham sistemas de
comunicação „permanente‟ em casa e no trabalho expões questões
profundas sobre a qualidade e o significado da vida. Como as
comunicações móveis vão influir na vida familiar e social?
(RHEINGOLD, 2002, p.27, tradução nossa)

Trata-se de uma mudança social profunda, porque “a comunicação é um

processo fundamental da atividade humana e a modificação dos processos de

interação entre a estrutura e a prática sociais e uma nova variedade de

tecnologias de comunicação trazem grandes transformações” (CASTELLS et

al., 2004, p. 238, tradução nossa). Analisar essas mudanças é o objetivo deste

trabalho.

2.2 – Finalmente, a mobilidade

Para Levinson (2004, p. 13, tradução nossa), o sucesso do telefone

celular é resultado de "uma necessidade tão antiga quanto a espécie humana:

a necessidade de andar e falar, ou seja, de se comunicar e se mover ao

mesmo tempo". Pode-se dizer que o fato do celular ter finalmente resolvido a

questão da mobilidade da comunicação causou uma verdadeira revolução na

forma como vivemos.

O telefone celular é o primeiro equipamento que, se for de nosso desejo,

nos permite estar disponíveis durante todo o tempo. E, quando optamos por

isso, passamos a participar de múltiplos processos que se interconectam e

Santaella (2007, p.187) utiliza o termo “hipermobilidade” para caracterizar esse

fenômeno. Trata-se da fusão entre as diversas redes virtuais e o espaço físico,

das ligações entre o “espaço de fluxos”, ou seja, onde se dá a interação dos

nós que constituem as diversas redes de informação das quais participamos, e

18
o “espaço de lugar”, onde está toda a infra-estrutura física necessária para o

trânsito das informações digitais.

Lemos (2008) define esse “espaço movente, híbrido, formado pela

relação entre o espaço eletrônico e o espaço físico” como território

informacional. O autor afirma que, com o uso do telefone celular “emergem

formas de contato permanente e contínuo, em mobilidade, propiciando novas

vivências do espaço e do tempo das (ciber) cidades” (LEMOS, 2007).

Ou seja, não é apenas o espaço que se amplia, ao se desdobrar em

muitos outros que estão ao alcance de uma chamada ou de uma mensagem

instantânea enviada pelo celular, mas as 24 horas do dia também podem não

ser mais percebidas como eram anteriormente, porque somos capazes de

reagendar compromissos com muito mais facilidade, como se fôssemos

capazes de alterar nosso futuro continuamente. Este assunto será discutido no

capítulo 4, quando a questão da coordenação de atividades pelo celular for

tratada.

2.3 – O telefone celular no Brasil

O Brasil tem acompanhado a tendência mundial de disseminação do

telefone celular entre grande parte da população. Atualmente, nosso país tem

cerca de 166 milhões de acessos móveis (AGÊNCIA NACIONAL DE

TELECOMUNICAÇÕES, 2009). Isso significa que há 86,67 assinaturas de

serviços de telefonia celular para cada 100 habitantes, uma teledensidade de

8,6.

19
No Brasil, o primeiro dispositivo de comunicação móvel que ganhou

popularidade foi o pager, conhecido popularmente como “bip”, um pequeno

aparelho que funcionava com pilhas comuns e recebia mensagens de texto por

uma tela de cristal líquido. Sucesso na década de 90, com mais de 1 milhão de

usuários no país (AVRUCH, 2000), o serviço de paging foi arrasado pelo

surgimento dos celulares pré-pagos, mais acessíveis para o grande público do

que as assinaturas pós-pagas de telefonia celular, e pelas mensagens de texto

via SMS, sigla em inglês para Serviço de Mensagens Curtas (AVRUCH, 2000).

O primeiro telefone celular do Brasil custou 22 mil dólares e foi

comprado em 1990 (PEREIRA; GUEDES, 2004). Cinco anos depois, havia 1,2

milhões de aparelhos em uso. Quase 20 anos depois, há 166 milhões de

assinaturas no país. Ao observar o ocaso do pager, sugere-se que a

substituição do rudimentar aparelho de recebimento de mensagens, o “bip”,

pelo telefone celular é compreensível e algo até esperado, uma vez que a

comunicação no pager é de mão única, porque o contato entre as duas partes

não era simultâneo. Se fosse necessário responder à mensagem recebida, o

assinante do serviço precisaria encontrar um telefone fixo para retornar a

ligação e torcer para que a pessoa que enviou o texto também estivesse

próxima de um, o que nem sempre acontecia.

Segundo Souza e Silva (2007), uma das razões para a forte presença

dos telefones celulares no Brasil é o fato de que a infra-estrutura de telefonia

fixa é muito escassa, como acontece em outros países da América Latina.

Além disso, mesmo nas regiões Sul e Sudeste do país, onde é mais fácil

adquirir um telefone fixo, o celular continua a ser a opção mais barata.

20
Das 166 milhões de assinatura de serviços de telefonia celular no Brasil,

82,21% são serviços pré-pagos (AGÊNCIA NACIONAL DE

TELECOMUNICAÇÕES, 2009). O celular pré-pago é “um dos principais fatores

para a popularidade da comunicação sem fio no país” (PELLANDA, 2009,

tradução nossa). Isso ocorre porque, apesar de ter uma tarifa mais alta por

minuto do que o serviço pós-pago, o pré-pago dá uma grande flexibilidade ao

usuário, que continua recebendo chamadas (e, portanto, conectado à sua rede

de contatos) mesmo quando seus créditos de ligação acabam.

Em comunidades de baixa renda, como as favelas no Rio de Janeiro, o

celular é compartilhado e usado como um telefone público comum. “Como

muitos não têm telefone em casa, o telefone celular „público‟ se torna a

principal tecnologia de conexão para membros da comunidade que trabalham

remotamente” (SOUZA E SILVA, 2007, tradução nossa). A autora destaca que

é interessante notar que uma tecnologia como o telefone celular, que tinha

todas as características de ser uma ferramenta individual e privada, passa a ter

uma função coletiva em regiões de baixa renda.

Não é possível generalizar a forma de utilização do telefone celular no

Brasil porque “as diferenças econômicas são enormes e o uso da tecnologia

varia de acordo com a posição socioeconômica” (SOUZA E SILVA, 2007,

tradução nossa) e para se estudar os efeitos do telefone celular na sociedade

“deve se levar em conta os contextos sociais, econômicos e psicológicos das

culturas observadas” (RHEINGOLD, 2002, p.52, tradução nossa). No Brasil,

dentro de um mesmo estado ou até de uma cidade, as diferenças sociais são

21
marcantes e impedem que se generalize a forma como a comunicação sem fio

foi apropriada.

Para Eduardo Pellanda (2009), devido a essas grandes diferenças, o

Brasil reúne os dois lados da disseminação da telefonia celular no mundo. Por

um lado, nos assemelhamos a regiões da África em que a conexão móvel foi a

solução onde a infra-estrutura de telefonia fixa não podia chegar e, por outro,

nos grandes centros urbanos, o nível de desenvolvimento tecnológico é

parecido com o dos países mais ricos do mundo, onde a teledensidade se

aproxima de 100%, como é o caso da Noruega. Voltando ao raciocínio de

Souza e Silva (2007), é possível dizer que mesmo dentro dos grandes centros

urbanos encontramos as duas formas de uso: o compartilhamento de um

mesmo telefone em comunidades pobres e mais de um celular de última

geração por pessoa entre os mais ricos.

O impacto dos telefones celulares não se restringe às inovações

tecnológicas resultantes de seu uso. A forma como nos relacionamos uns com

os outros a partir dessa ferramenta também foi afetada. “O celular se insinuou

nas capilaridades da vida cotidiana, alternando nossas formas de viver ao

propiciar possibilidades de comunicação antes inexistentes” (SANTAELLA,

2007, p. 233) e são justamente esses novos modos de socialização que estão

sendo discutidos neste trabalho.

Tanto no Brasil como em outros países em desenvolvimento, o telefone

celular surgiu como uma solução de custo relativamente menor para a falta de

infra-estrutura para telefonia fixa e para a conexão sem fio à Internet. Com isso,

22
pessoas que até então não tinham acesso a ferramentas tecnológicas de

comunicação passaram a integrar uma grande rede de usuários.

O telefone portátil passa a ser o primeiro computador para muita gente:

“os celulares são muito mais baratos do que os laptops e computadores de

mão e, portanto, acessíveis para um número maior de usuários” (SOUZA E

SILVA, 2007, tradução nossa)

Dado o potencial do telefone celular como uma ferramenta social e de

cidadania, Caio Vassão (2008) sugere que

A questão da telecomunicação deixou de ser item de consumo de


luxo há muito tempo, e poderíamos argumentar que a telefonia celular
fosse incluída no rol em que encontra-se o fornecimento de água,
energia elétrica, esgotos e vias públicas. (VASSÃO, 2008)

A popularização da telefonia celular está levando essa tecnologia para

um público totalmente novo e essa apropriação “é ainda mais significativa (do

que a disseminação da Internet), porque os primeiros usuários da Internet

tinham grande conhecimento de tecnologia, enquanto o grupo de novos

usuários das ferramentas de comunicação sem fio são jovens sem habilidades

técnicas especiais” (CASTELLS et al., 2004, p. 244, tradução nossa). Sem a

experiência da Internet no desktop, os novatos da rede, com seus celulares à

mão, estão intensificando ou inventando práticas sociais.

Um exemplo, como veremos mais à frente, é a importância das

mensagens de texto (SMS) nos telefones portáteis pode trazer proximidade aos

usuários de uma mesma rede social. É a intensificação do uso de mensagens

do texto que já vinha da Internet através de serviços de mensagens

23
instantâneas e dos sites de relacionamento. Outro exemplo é a coordenação

de atividades, que também vamos discutir e ocorre de uma forma diferente nas

redes móveis, porque a conexão sem fio faz toda a diferença na mobilização de

um grupo de pessoas para diferentes fins. Por outro lado, a intromissão

causada pelo uso dos telefones celulares em qualquer lugar está obrigando

todos nós a nos adaptarmos e revermos questões relacionadas à privacidade.

Assim como precisamos respeitar leis de trânsito e um código de

conduta informal para dirigir, também estamos aprendendo a lidar com a

conectividade contínua propiciada pelo telefone celular. Alguns livros sobre

“etiqueta móvel” ou, em inglês, m-etiquette, já foram publicados, mas há regras

não escritas que estão em transformação. Estudos sobre o assunto

(CASTELLS et al., 2004, p. 230) mostram que já há algumas regras, todas

atreladas ao bom senso do usuário, mas que nem sempre são seguidas: por

exemplo, falar baixo ao celular em locais públicos e deixar o telefone no modo

silencioso no local de trabalho.

Pode-se falar de um processo de aprendizado social sobre como lidar


com a disponibilidade permanente, que tem um importante
componente aleatório, porque parte das interações são inesperadas
(por exemplo, quando se recebe uma ligação). (CASTELLS et al.,
2004, p. 230, tradução nossa)

Estudos feitos na Inglaterra (CAMPBELL, RUSSO; 2003) constataram

que as pessoas utilizam gestos e desviam o olhar na hora de se “negociar” o

uso do telefone celular dentro dos trens. As reações não verbais das pessoas

que estão ao redor de quem recebe a ligação também são importantes para

estabelecer as práticas sociais resultantes do uso do telefone celular em

público.

24
2.4 – Conseqüências da conexão permanente

A conexão permanente, “always on”, de quem transita com um telefone

celular em mãos traz mudanças em nossa forma de conviver em grupo. O fato

de se estar fazendo duas coisas ao mesmo tempo, como receber chamadas

quando se está em locais públicos ou rodeado de conhecidos, é tema de

discussão para muitos pesquisadores.

Santaella (2007, p. 233-245) entende que a conexão permanente

permitida pelo celular cria espaços de presença-ausência. Todos nós já

passamos por isso uma série de vezes: pode ser a interrupção de uma

conversa com alguém que está ao seu lado para atender uma ligação ou ler e

responder uma mensagem de texto no celular. Isso acontece durante

encontros de todos os níveis: de reuniões no escritório a almoços de família.

Assim como a Internet compete com a televisão e as comunicações


face a face em casa e no local de trabalho, as tecnologias móveis
competem com a atenção dada a outras pessoas que estão
presentes em espaços públicos e com o próprio tempo livre dos
usuários entre a casa e o trabalho. (RHEINGOLD, 2002, p. 219,
tradução nossa)

Ao mesmo tempo em que a pessoa está inserida em um determinado

local físico, cercada de pessoas conhecidas ou não, com as quais interage,

mesmo sem palavras, ela se ausenta temporariamente para outro encontro,

pelo celular. Neste período de tempo, ela continua participando da ação física

apenas com a presença de seu corpo, porque sua atenção está voltada para o

interlocutor que a chama pelo telefone.

Sadie Plant (2001, p.31) dividiu a forma de se atender ao telefone celular

em público em três categorias: “vôo”, na qual o usuário se ausenta

25
imediatamente do círculo social no momento da ligação; “suspensão”, quando

quem recebe a ligação continua em seu lugar, mas para o que estiver fazendo

durante o tempo da chamada e “efetivamente se desliga do ambiente em que

está”; e “persistência”, na qual os usuários permanecem no lugar e tentam

fazer, na medida do possível, o mesmo que faziam antes da chamada ocorrer.

Como a comunicação via telefone celular se dá tanto em ambientes

privados como em locais públicos, a fronteira entre o que é pessoal e o

contexto social praticamente desaparece e os usuários tentam remediar isso da

melhor forma possível. Ao falar no telefone celular em público, “as pessoas

criam seu espaço privado simplesmente ignorando os que estão a sua volta”

(CASTELLS et al., 2004, p. 242, tradução nossa). Para Santaella (2007, p. 246-

247), isso acontece porque há uma necessidade de se criar “uma ilha de

intimidade no oceano dos ambientes públicos”.

O sentido de ver e ser visto muda com a tecnologia móvel. Delimitar o

que é público e o que é privado fica ainda mais difícil quando não é possível

dizer “você pode vir apenas até aqui”. A intromissão de uma chamada pode

acontecer a qualquer momento. A única forma de se evitar totalmente que isso

aconteça é desligar o aparelho ou não atender.

Quando faz uma chamada pelo celular, o usuário é identificado

imediatamente, a não ser que ele proteja seu próprio número e opte por

aparecer como “anônimo” para seu interlocutor. Portanto, é possível dizer que

a parte em que se pergunta “quem é?” já pode ser suprimida das conversas.

No entanto, indagações sobre o local onde a pessoa está e sua disponibilidade

para a conversa tomam certo tempo antes que se entre no assunto central,

26
aquele que originou a ligação. “Algumas vezes é fundamental informar o autor

da chamada sobre o contexto, devido à intromissão que o telefonema pode

causar” (CASTELLS et al., p. 229, tradução nossa). A “invasão” sentida a partir

de uma chamada pode fazer com que a pessoa não atenda ou simplesmente

desligue o telefone quando ele tocar, o que pode ter diversos significados para

quem está fazendo a ligação.

Ao analisar a maneira como os usuários de telefones celulares lidam

com o fato de se estar sempre on-line, Howard Rheingold (2002) acredita que

impor limites para a intrusão causada pela conexão permanente será uma

tarefa de cada um de nós: “No futuro, o uso sensato da tecnologia vai exigir

que cada pessoa e cada família decidam em que circunstâncias e ocasiões

devem ficar longe do alcance dos meios de comunicação” (RHEINGOLD, 2002,

p. 210, tradução nossa)

Para Rheingold, a possibilidade de se estar continuamente conectado de

forma remota a redes sociais virtuais é “ao mesmo tempo, o elemento que o

isola dos demais que estão presentes no espaço público” (RHEINGOLD, 2002,

p. 40, tradução nossa). No entanto, Souza e Silva (2006) acredita que o uso do

telefone celular em grupo não isola, necessariamente, a pessoa do espaço

físico em que ela está. Estudos (SOUZA E SILVA, 2006) mostram que, muitas

vezes, o conteúdo da conversa, da mensagem ou do e-mail recebidos (e que

causaram a interrupção) é compartilhado com as pessoas que estão próximas

fisicamente. Também existe a possibilidade de, pelo celular, integrar a um

encontro face a face alguém que está distante.

27
Por permitir a interação entre pessoas que estão em lugares diferentes,

os espaços em que a comunicação via celular se dá podem ser chamados

híbridos, porque são formados “pela comunicação transmitida de forma

múltipla, por indivíduos que estão se movendo simultaneamente através de

espaços físicos e virtuais, utilizando tecnologias móveis como interfaces de

conexão” (SOUZA E SILVA, 2006, tradução nossa).

2.5 – Público x privado

Nesses espaços híbridos, as mesmas tecnologias que permitem ao

usuário estar permanentemente conectado e informado, também representam

uma ameaça à sua privacidade.

Para Bruno (2009), a distribuição das tecnologias de comunicação

móvel, a computação ubíqua e os sistemas de localização por satélite são

razões centrais para a crescente ligação entre monitoramento e mobilidade

uma vez que essas tecnologias – apesar de não terem sido


projetadas especificamente para desempenhar tarefas de vigilância –
incluem sistemas de monitoramento para ações, informação,
comportamento e comunicação de seus usuários dentro de seu
próprio mecanismo. (BRUNO, 2009, tradução nossa).

Para Rheingold (2002, p. 211), há pelo menos três tipos de ameaça

potencial ao usuário provenientes das tecnologias da comunicação. São elas a

ameaça à liberdade, uma vez que a distribuição generalizada de informação

está ligada à vigilância ubíqua; a ameaça à qualidade de vida, uma vez que o

excesso de informações pode criar angústia e ansiedade; e, em terceiro lugar,

ameaças à própria dignidade humana “na medida em que deixamos mais

aspectos de nossas vidas dependentes de uma interação simbiótica com as

28
máquinas, nos convertemos em seres mais mecânicos do que humanos”

(RHEINGOLD, 2002, p. 211, tradução nossa). Nesta investigação, trataremos

apenas da primeira delas, que reside na vigilância permanente atrelada à

conexão sem fio. Ao mesmo tempo em que queremos ter acesso a tudo por

meio de nossos celulares, também ficamos vulneráveis.

Rheingold (2002) alerta para a distribuição de dados pessoais sem

consentimento dos usuários e do recebimento massivo de informações (como

no caso dos spams, que já começam a chegar a nossos telefones portáteis, por

exemplo, através de mensagens de texto envias até mesmo pelas próprias

operadoras de serviços de telefonia).

Ainda que a vigilância promovida pelo Estado e grande parte da


compilação de dados para fins comerciais sejam feitas, geralmente,
sem o consentimento ou o conhecimento do vigiado, as questões de
privacidade se complicam ainda mais pela adoção voluntária de
tecnologias que revelam informações particulares a outras pessoas.
(RHEINGOLD, 2002, p. 212, tradução nossa).

O fato de que, para encontrar um telefone celular, não é preciso fazer

uma chamada, basta que o aparelho a ser encontrado esteja ligado, é um

exemplo usado por Rheingold (2002) para mostrar como nossa privacidade é

vulnerável quando estamos conectados às diversas redes sem fio disponíveis.

Além da detecção da localização que, como veremos nos próximos

capítulos, pode ter grande utilidade na coordenação de atividades, o telefone

celular provoca outras discussões quando se trata de preservar espaço público

e espaço privado. Pode-se dizer que há dois movimentos ocorrendo em

direções contrárias: “se o espaço privado está sendo erodido na proporção do

crescimento da conectividade em qualquer lugar e em qualquer tempo, o

29
inverso também é verdadeiro: com o celular, a vida privada invade o espaço

público” (SANTAELLA, 2007, p. 246).

Os exemplos da invasão da vida privada no espaço público pelo uso de

telefones portáteis são inúmeros: ouvir a conversa de um desconhecido que

está ao seu lado dentro do ônibus e saber detalhes de um encontro que não

lhe diz respeito; perder a concentração na história de um filme quando o

telefone de alguém toca dentro da sala de cinema.

Apesar de os telefones celulares serem usados de formas diferentes


em diversas partes do mundo, eles promovem um enfraquecimento
das fronteiras entre os espaços público e privado: envolvendo o
privado dentro do público, trazendo o público para o privado e criando
ilhas móveis público/privadas. (SOUZA E SILVA, 2006, tradução
nossa)

Os grandes centros urbanos são os espaços em que essas interações

propiciadas pelo telefone celular ganham espaço com mais rapidez. No

próximo capítulo, trataremos da nova forma de apropriação do espaço urbano

que foi possibilitada pelo uso do telefone portátil.

30
Capítulo 3 - Reapropriação do espaço urbano

Com um telefone celular, podemos realizar diversas atividades em

movimento, nos deslocando pelo espaço físico. O mapeamento do mundo real

a partir do telefone celular, que pode ser feito a partir de sistemas de

localização, dá um novo sentido a cidades e bairros que já conhecemos há

anos. A reapropriação dos espaços físicos, principalmente dos centros

urbanos, a partir da comunicação móvel tem sido tão marcante que “talvez o

conhecimento da localização seja o recurso mais importante do telefone celular

para se definir como as interfaces móveis podem influenciar nossa interação

com outros usuários e com o espaço em que vivemos” (SOUZA E SILVA, 2008,

tradução nossa). Para Howard Rheingold, “conhecer nossa localização

geográfica exata é uma forma de sensibilidade ao contexto em que as

máquinas melhoram os humanos” (RHEINGOLD, 2002, p. 123, tradução

nossa).

O uso do telefone celular permitiu novas formas de se perceber o mundo

físico e interagir com ele. Pode-se dizer que isso é evidente onde estão

concentrados a disponibilidade de infra-estrutura de comunicação sem fio e um

alto número de usuários: os grandes centros urbanos. Lemos (2007) vê as

práticas de apropriação do espaço urbano a partir de aplicações desenvolvidas

para telefones celulares como “formas emergentes de leitura e escrita das

cidades por meio dos dispositivos móveis digitais”.

A localização do usuário pode ser feita a partir de diferentes tecnologias

desenvolvidas para o telefone celular. Muitos aparelhos já saem da fábrica com

o sistema GPS, que obtêm as coordenadas geográficas de onde o usuário

31
está. Também é possível, por meio deste sistema, “navegar” pela cidade

através dos dados de localização como endereços e marcos como

monumentos e prédios.

Outra maneira de se obter

a localização de um indivíduo

através do telefone celular é

detectar por qual célula de

transmissão de serviço de

telefonia ele está passando

naquele momento. Os dados

não são tão aproximados quanto

os do GPS, mas é possível Figura 2 – Protótipo do Whereabouts Clock


Fonte: (SELLEN et al, 2006 apud VAZ, 2008)
detectar a região em que o

usuário se encontra. Um exemplo de aplicação desse tipo de tecnologia é o

Whereabouts Clock (VAZ, 2008). A partir de um display de cristal líquido, exibe-

se o local em que está cada membro de um determinado grupo (uma família ou

uma equipe de trabalho, por exemplo), utilizando como referência a torre de

transmissão de telefonia celular que está mais próxima de cada usuário. As

regiões podem ser “marcadas” previamente como “escritório”, “casa” ou

“escola” e, ao passar por uma delas, o usuário deixa, a partir de seu celular,

uma pista de seu paradeiro, que ficará exposta na tela do Whereabouts Clock.

Em uma escala de menor alcance, um usuário pode ser detectado a

partir da tecnologia de conexão sem fio via Bluetooth, presente comumente em

celulares e computadores. No Brasil, o Bluetooth é muito utilizado para ações

32
de marketing, como o recebimento de uma mensagem comercial quando se

passa próximo de um ponto de transmissão de dados que utiliza essa

tecnologia. Por exemplo, o usuário entra em uma concessionária de veículos e

recebe informações sobre os lançamentos de uma determinada montadora.

Também é possível detectar celulares e notebooks próximos, que estão

habilitados com a mesma tecnologia e enviar dados e arquivos a outros

usuários que também tenham ativado a conexão em seus dispositivos móveis.

A tecnologia RFID (sigla em inglês

para Identificação por Rádio Freqüência)

também permite detectar a aproximação

do usuário. Um exemplo de aplicação é

um protótipo desenvolvido pela Sony

chamado Wereable Key (VAZ, 2008). O


Figura 3 – Protótipo da Wearable Key
dispositivo, preso a uma pulseira, Fonte: (MATSUSHITA et al, 2000 apud
VAZ, 2008)
permite a identificação do usuário

quando ele se aproxima de um computador ou de um celular compatíveis com

a tecnologia, fazendo com que a máquina carregue automaticamente suas

configurações, que estão presentes em sua identificação transmitida via rádio.

Howard Rheingold (2002) sugere usos diferentes para essas tecnologias

de conexão sem fio:

Por meio do Bluetooth e de outras tecnologias sem fio de curto


alcance, como o rádio de banda larga com potência muito baixa, os
membros individuais da comunidade poderiam realizar trocas de
informações de forma mais íntima e pontual nos encontros face a
face, enquanto que as tecnologias WiFi ofereceriam a infra-estrutura
para a comunicação no bairro e na Internet. (RHEINGOLD, 2002, p.
197, tradução nossa)

33
A possibilidade de se detectar a localização do usuário a partir do

telefone celular pode mudar a forma como ele é tratado dentro de suas redes

sociais. Atualmente, quando recebemos uma ligação, a primeira pergunta feita

é “Onde você está?”, porque a informação da localização faz toda a diferença

quando você pode ser acessado de qualquer lugar. O local onde o usuário está

pode, inclusive, determinar se a conversa irá adiante ou não.

Ao trafegar nos ambientes urbanos com seus telefones celulares à mão

Os usuários podem reconhecer outros usuários, anotar


eletronicamente um espaço (deixando sua marca com um texto, uma
foto, um som ou um vídeo), localizar ou mapear lugares ou objetos
urbanos, ou mesmo jogar, tendo como pano de fundo ruas, praças e
monumentos. (LEMOS, 2007).

Além da capacidade de poder dar um novo sentido a paisagens já

conhecidas, a conexão sem fio em movimento oferecida pelos celulares pode

incentivar seus usuários a participarem de redes sociais móveis. Em linhas

gerais, as redes sociais que têm por principal atrativo a localização dos

usuários indicam quando a aproximação entre dois integrantes, mesmo que

eles não se conheçam pessoalmente. Neste caso, um encontro real pode

acontecer. “Por criar e potencializar redes de sociabilidade, esses projetos

buscam significar o espaço urbano por meio do reforço comunitário” (LEMOS,

2007).

O encontro face a face entre dois membros de uma rede social móvel é

apenas uma das possibilidades ao se combinar a tecnologia e a comunicação

sem fio com o deslocamento pelo espaço urbano. Em minha monografia para a

34
conclusão da pós-graduação em Mídias Interativas no Centro Universitário

Senac (VAZ, 2008), analisei o aplicativo Mscape, desenvolvido nos laboratórios

da HP, que tem como principal atrativo uma ferramenta com a qual é possível

fazer “anotações virtuais” sobre um determinado local, utilizando como ponto

de referência as coordenadas geográficas. É como deixar um recado que pode

ser acessado por outros usuários que também tenham instalado o aplicativo

em seus telefones celulares.

Em texto, som e imagem, as indicações de um usuário para um

determinado passeio (por exemplo, as anotações feitas em pontos diversos de

um grande parque) ficam disponíveis no site do projeto2 e recebem avaliações

de quem experimentou o roteiro proposto. Qualquer pessoa que tenha um

celular equipado com GPS pode baixar um roteiro pelo site e integrá-lo ao

passeio que fará por um determinado local. Ao passar pelas coordenadas

geográficas pré-definidas pelo autor do roteiro, as anotações feitas aparecem

na tela do celular.

Depois de experimentar um dos roteiros disponíveis, o usuário também

pode fazer a sua própria narrativa, que os autores do projeto chamam de

mediascapes, e deixar disponível para download no site.

É possível dizer que os jogos têm funcionado muito bem como

mediascapes. Um deles é um caça-fantasmas virtual dentro da Torre de

Londres. A partir de pistas deixadas em determinados pontos dentro da

construção, o usuário precisa encontrar fantasmas que lhe contarão uma

história sobre o lugar.

2
www.mscapers.com

35
Figura 4 – Tela de simulação do Mscape (VAZ, 2008)

Lemos (2007) vê essas manifestações como uma forma de vermos o

mesmo espaço urbano pelo qual passamos diariamente “como se fôssemos

estrangeiros em nossas próprias cidades”. O pesquisador também chama a

atenção para a desconstrução de um espaço virtual, sem ligação com o real,

que supunha-se que surgiria com a intensificação da presença de ferramentas

digitais no cotidiano:

Na medida em que vamos „desplugando‟ nossas máquinas de fios e


cabos, à medida que redes de telefonia celular, Bluetooth, RFID ou
Wi-Fi fazem das nossas cidades máquinas comunicantes
„desplugadas‟ e sem fio, paradoxalmente vamos criando projetos que
buscam exatamente o contrário, territorialização, ancoragem no
espaço físico, acoplagem a coisas, lugares, objetos, pessoas.
(LEMOS, 2007).

No final de 2007, o site do aplicativo Mscape tinha uma dezena de

mediascapes disponívels para download. Quase dois anos depois, há mais de

300 mediascapes diferentes, que surgiram a partir da idéia de se fazer

anotações sobre um determinado espaço físico. Hoje é possível acrescentar

arquivos de áudio, vídeo e foto aos recados, portanto muitas das aplicações

36
têm trilhas sonoras para serem usadas durante o passeio ou imagens que são

exibidas quando se está em uma determinada localização.

Há muitos jogos e roteiros de passeios, como um que sugere ao usuário

circular pela região de Bristol, no Reino Unido, e encontrar construções e

monumentos da década de 1950 que foram substituídos com o passar do

tempo. As aplicações são tão variadas que até a reprodução do caminho feito

durante o primeiro encontro de um casal pode ser acessado através de um

mediascape.

“As diversas formas de interação possíveis a partir das redes móveis

que utilizam como diferencial a localização do usuário criam “um „lugar‟, algo

dotado de sentido, na indiferenciação dos espaços urbanos” (LEMOS, 2007).

Essas aplicações também costumam ser chamadas de mídias locativas.

3.1 – Mídias locativas

André Lemos (2008) define mídias locativas como “um conjunto de

tecnologias e processos info-comunicacionais, cujo conteúdo informacional

vincula-se a um lugar específico”. Essas aplicações podem ter um sentido

artístico ou simplesmente prestar um serviço ao usuário. Para melhor definir

esse conceito, Lemos divide as mídias locativas em cinco categorias:

37
3.1.1 – Realidade aumentada

Pode-se chamar de realidade aumentada a sobreposição de elementos

virtuais sobre a paisagem real, seja por projeções feitas diretamente sobre os

objetos do mundo real ou pela mistura de elementos virtuais e reais

diretamente na tela do dispositivo computacional, fixo ou móvel. Ronald

Azuma (1997), estudioso do assunto, afirma que aplicações que utilizam a

realidade aumentada deixam o mundo real mais rico, ao invés de simplesmente

substituí-lo por conteúdo digital. “A Realidade Aumentada enriquece a

percepção do usuário e sua interação com o mundo real. Os objetos virtuais

exibem informações que o usuário não pode detectar diretamente com seus

próprios sentidos” (AZUMA, 1997, tradução nossa).

“As mídias locativas permitem que informações sobre uma determinada

localidade sejam visualizadas em um dispositivo móvel, „aumentando‟ a

informação‟” (LEMOS, 2008). Um exemplo é o projeto MARA (sigla para Mobile

Augmented Reality Applications) (LEMOS, 2008; VAZ, 2008), desenvolvido

pela Nokia. O objetivo é oferecer um serviço de informações sobre uma cidade

a partir das coordenadas geográficas e das imagens pré-gravadas de edifícios

diversos. A partir da visualização de um restaurante pela câmera do celular, por

exemplo, o MARA reconhece o local pela imagem e pela localização e, essa

forma, o usuário pode baixar informações da Internet sobre o estabelecimento,

como o cardápio. Também é possível procurar uma loja por um serviço de

busca e saber qual é a distância até o local, visualizando sua localização por

meio de um mapa elaborado com uma imagem feita por satélite.

38
Figura 5 – Telas do MARA, da Nokia
Fonte: (KÄHÄRI; MURPHY, 2006 apud VAZ, 2008)

O projeto obedece três requisitos básicos idealizados por Azuma (1997)

para definir uma aplicação de realidade aumentada: o MARA mistura o real e o

virtual dentro de um ambiente físico (o que é feito através das imagens

captadas pela câmera do celular), sua interação acontece em tempo real (a

partir do servidor central que responde aos dados do GPS) e a aplicação, por

ocorrer no mundo físico e não em uma tela estática, ocorre em 3D.

3.1.2 – Mapeamento e monitoramento do movimento

Lemos (2008) define essa categoria como “funções locativas aplicadas a

formas de mapeamento (mapping) e de monitoramento do movimento (tracing)

do espaço urbano através de dispositivos móveis”. Um exemplo desse tipo de

aplicação é o Whereabouts Clock, que já foi apresentado anteriormente e

permite supervisionar o movimento de um determinado usuário, ou de um

grupo, dentro de uma região específica.

Essas aplicações podem trazer preocupações com relação à privacidade

dos usuários:

39
Com freqüência, estar em movimento é estar sujeito a vigilância e
monitoramento, uma vez que não há mais uma distância material,
espacial, temporal ou informacional entre o sistema de
vigilância/monitoramento e o objeto/sujeito que está sendo
observado. (BRUNO, 2009, tradução nossa)

O telefone celular nos permite ficar conectados e acessíveis durante as

24 horas do dia, mas a conexão permanente tem seu preço: “O celular não nos

deixou um só lugar onde podemos estar sozinhos, seja no carro, no parque ou

no topo de uma montanha” (LEVINSON, 2004, p. 63, tradução nossa). Por um

lado, temos à nossa disposição as informações e as pessoas de que

precisamos ao alcance dos dedos, porém, por outro, também estamos à

disposição de todos os nossos contatos, sejam eles nossos familiares e amigos

ou os colegas de trabalho. Além disso, o usuário comum pode não ter

conhecimento tecnológico suficiente para saber se seu telefone celular está

sendo monitorado remotamente.

3.1.3 – Geotags

Nesses tipos de mídias locativas, o objetivo é agregar informação digital

a mapas, colocando tags (etiquetas) repletas de informação sobre um

determinado ponto indicado por coordenadas geográficas, que estão

acessíveis a partir de um clique.

Em junho de 2009, o MIT Mobile Experience Lab iniciou uma nova etapa

de um projeto de pesquisa sobre o futuro dos conteúdos móveis relacionados

ao ambiente físico. O laboratório desenvolveu uma plataforma chamada

Locast, que está sendo utilizada em diferentes aplicações. Na cidade italiana

de Veneza, por exemplo, a equipe do MIT está desenvolvendo uma aplicação

40
que combina a criação e o compartilhamento de conteúdo feito pelo usuário,

combinado ao acervo multimídia do canal de TV RAI. Esses arquivos em vídeo

estão sendo ligados a locações físicas em Veneza, por meio de pontos de

transmissão por Bluetooth instalados em locais estratégicos, enriquecendo a

experiência dos turistas que visitam a região, que podem assistir os vídeos pelo

celular.

Figura 6 – O mapa de Veneza e as tags de informação

Os vídeos de arquivo e os que são feitos pelos turistas podem ser

acessados pelo site do projeto3, onde um mapa de Veneza está repleto de

pontos de visita clicáveis. O objetivo é que quem está em casa também tenha

acesso os vídeos pelo computador. Pode-se dizer que essas aplicações são,

efetivamente, “uma reconfiguração do urbano, uma nova relação entre a esfera

mídiatica e o espaço urbano” (LEMOS, 2008).

O serviço Google Maps concentra uma série de aplicações de

geotagging e permite que sejam criados roteiros sobre os mapas virtuais

disponibilizados para usuários de todo o mundo. Essas aplicações baseadas

3
http://locast.mit.edu

41
na marcação em mapas se tornaram tão populares que, no início de julho de

2009, o Google fez um movimento reverso: trouxe sua aplicação para celulares

chamada My Location, que marca a posição do usuário de celular dentro da

interface do Google Maps, para o desktop e o laptop (BLOCK, HAIM; 2009).

Quando o usuário de um PC visita a página do Google Maps com um

dos browsers que suportam o recurso (como o Firefox 3.5 e o Chrome 2.0), um

botão exibido na tela do My Location convida o usuário a detectar sua

localização no mapa e, por meio do rastreamento do IP de sua rede ou da rede

Wi-Fi que ele estiver utilizando, o círculo azul conhecido dos usuários móveis

vai dar a localização do seu desktop.

Figura 7 - O My Location detecta onde está o


computador, dentro da casa do usuário

Pode-se que essa é uma forma de atrair o usuário de tecnologia que

ainda não possui um celular com o sistema GPS, para experimentar uma

aplicação móvel. A funcionalidade foi estendida para o site de relacionamentos

Orkut, onde o usuário de um computador fixo agora pode mostrar para seus

amigos onde ele está naquele momento.

42
3.1.4 – Anotações urbanas

“A anotação digital dos lugares e objetos físicos poderia favorecer a

interconexão entre grupos de pessoas dentro de uma localidade”

(RHEINGOLD, 2002, p. 128, tradução nossa). As mídias locativas permitem a

utilização de celulares, palms, etiquetas RFID ou redes Bluetooth para indexar

mensagens (SMS, vídeo, foto) a lugares, como “recados” deixados para quem

passar pelo mesmo local posteriormente. Além do Mscape, que vimos

anteriormente, muitos projetos têm sido desenvolvidos nesse sentido e grande

parte deles é colaborativa.

São inúmeras as aplicações que utilizam o sistema de Posicionamento

Global por Satélite presente em um número cada vez maior de modelos de

telefones celulares. Um exemplo recente é o filme feito com base em

coordenadas GPS chamado Nine Lives4, lançado em setembro de 2008.

Realizado por Scott Hessels e estudantes de arte e engenharia da Nanyang

Technological University, o filme transforma a cidade de Cingapura no cenário

de uma trama. O interator (que, aqui, não pode mais ser chamado

simplesmente de espectador) precisa de um dispositivo móvel com GPS por

meio do qual, de acordo com suas coordenadas geográficas (latitude e

longitude), consegue baixar uma parte do filme. São pequenas histórias que se

cruzam, como uma espécie de jogo pra encontrar pistas, em que o participante

percorre a cidade em busca de novas informações para entender todo o filme.

A interação com o espaço urbano é uma forte característica do filme

GPS. Cingapura pode ser considerada o principal personagem da trama,

4
www.gpsfilm.com

43
porque é através da cidade real que o interator vive a história. Quando ele

conhece a cidade e assiste aos trechos do filme nos locais em que eles podem

ser baixados, a percepção da história pode ser diferente da de quem recebeu

os arquivos com todos os trechos do filme e está em São Paulo, por exemplo.

São tipos diferentes de experimentar a mesma narrativa. “A familiaridade com

as ruas, os prédios, os parques - com a experiência urbana local – enriquecem

a trama narrativa” (FIORELLI, BRUNET, 2008).

O Nine Lives proporciona a experiência de se assistir um filme em

movimento, no qual é possível, inclusive, que o interator escolha a ordem em

que quer ver os trechos do filme. Em entrevista, o criador do filme, Scott

Hessels, afirma: “A idéia de que o cinema é algo visto enquanto sentado e

parado não é uma característica formal do meio (cinema), é uma limitação da

tecnologia”. (FIORELLI, BRUNET, 2008).

3.1.5 – Wireless mobile games

Os wireless mobile games são jogos realizados nos espaços urbanos

que agregam várias funções das mídias locativas. O primeiro jogo para celular

baseado na localização do usuário (em inglês location-based mobile games, ou

LBMGs) lançado comercialmente no Brasil foi o Alien Revolt (SOUZA E SILVA,

2008). O jogo transformou a cidade do Rio de Janeiro em um campo de batalha

restrito para os usuários de celulares compatíveis com aplicações na

linguagem Java.

Os LBMGs são um bom exemplo para mostrar que “os telefones

celulares fortalecem as conexões do usuário ao espaço físico, porque são os

44
aparelhos passam a ser usados como ferramentas de comunicação coletivas”

(SOUZA E SILVA, 2008, tradução nossa). E não é apenas a interação com o

espaço físico que esses jogos proporcionam, eles também incentivam a

colaboração entre os usuários, provocando a criação de uma rede virtual que

pode extrapolar para o mundo físico, uma vez que os participantes do jogo

podem promover encontros face a face para se conhecerem pessoalmente.

Entre 2005 e 2007, o jogo Alien Revolt serviu como uma ferramenta para

compreender as diferenças existentes entre os usuários de celular no Brasil,

que são grandes quando se leva em conta o poder aquisitivo de cada um. O

game só funcionava para quem tinha um determinado modelo de celular

fabricado pela Nokia, de preço mais alto do que a média, capaz de rodar a

aplicação em Java desenvolvida para o jogo. Além de ter um telefone mais

caro, os interessados ainda tinham que pagar pelas mensagens SMS geradas

de acordo com o andamento do jogo e pela transmissão de dados pela Internet

sem fio.

Em um país com predominância de aparelhos pré-pagos, como vimos

anteriormente, grande parte dos usuários controla os créditos gastos e utiliza o

celular apenas para receber ligações. Segundo pesquisas (SOUZA E SILVA,

2008), o Brasil é um país em que o uso de SMS e de Internet sem fio é baixo e

que o telefone celular ainda é usado primordialmente para a comunicação por

voz. E, ainda assim, “o número de minutos falados no celular é muito baixo se

comparado com outros países latino-americanos” (SOUZA E SILVA, 2008,

tradução nossa).

45
Em resumo, o estudo de caso concluiu que, apesar de serviços de ponta

como o jogo Alien Revolt estarem disponíveis para os modelos pré-pagos, a

maioria dos usuários não quer pagar por eles “porque sua principal

preocupação é controlar seus custos” (SOUZA E SILVA, 2008, tradução nossa)

com o aparelho. Usuários entrevistados para a pesquisa disseram que haviam

desistido de participar do jogo porque “ele estava se tornando muito caro”.

Como já dissemos anteriormente, Lemos (2008) define “áreas de

controle do fluxo informacional digital em uma zona de intersecção entre o

ciberespaço e o espaço urbano” como territórios informacionais. Esses

territórios “estão vinculados aos demais territórios, sejam eles culturais,

políticos, subjetivos, corporais, geográficos” (LEMOS, 2008) e, por isso, as

informações de localização do usuário também estão sendo utilizadas para a

coordenação de atividades e colaboram para reforçar laços sociais, como

veremos no próximo capítulo.

46
Capítulo 4 - Mais proximidade nos relacionamentos

Uma das hipóteses que motivou o início desse trabalho de pesquisa foi a

observação informal, de amigos e familiares, de que o uso do telefone celular

poderia tornar os relacionamentos mais próximos. Para comprovar essa

hipótese, foi preciso buscar dados empíricos e, também, conceitos teóricos que

estão sendo elaborados por pesquisadores em diversos países, inclusive no

Brasil.

O celular é um dispositivo de conexão permanente e “estar sempre lá -

ao toque de um sinal, em qualquer lugar que se esteja – estreita relações”

(SANTAELLA, 2007, p. 238). Para CASTELLS et al (2004, p. 230), o simples

fato de se poder iniciar uma conversa enquanto estamos andando na rua é

visto como “uma forma de não ficar mais sozinho”.

Pode-se dizer que o celular tornou-se uma ferramenta de integração

com outras pessoas:

Com freqüência, uma chamada ou uma mensagem de texto é mais


um gesto do que uma tentativa de conversar sobre qualquer coisa em
particular. E esses gestos servem ao importante objetivo de reforçar
laços entre membros de redes sociais. (CAMPBELL, RUSSO; 2003,
tradução nossa).

Paul Levinson (2004) defende a idéia de que, de posse de um telefone

celular, somos um centro de comunicação móvel. Ele acredita que “não há

mais lugar onde é possível ficar longe da família (...) Do ponto de vista da

comunicação familiar, a casa física se torna menos relevante, menos essencial”

(LEVINSON, 2004, p.89, tradução nossa) para que possamos estar em contato

com amigos e parentes próximos.

47
Duas pesquisas feitas nos Estados Unidos, uma na Coréia do Sul e uma

realizada no Brasil mostram que os usuários de telefones celulares realmente

sentem uma reaproximação com seus familiares e amigos.

Famílias com alto índice de uso de tecnologia estão reforçando seus

laços afetivos a partir de celulares e notebooks, segundo um levantamento feito

pelo instituto de pesquisa Pew Internet & American Life Project (WELLMAN et

al., 2008). O estudo, que ouviu 2.252 pessoas nos Estados Unidos, mostra que

a presença constante de tecnologia de comunicação móvel no cotidiano das

famílias está fazendo com que seus membros interajam de novas maneiras e

se aproximem mais.

Outra pesquisa feita nos Estados Unidos com mais de 2,5 mil pessoas

de idade acima dos 18 anos (HAMPTON et. al., 2009) revela que o contato via

telefone celular só perde para as conversas face a face em relação ao método

mais utilizado pelas pessoas para estar em contato com seus amigos e

parentes mais próximos. Os contatos via celular já são muito mais freqüentes

do que os feitos via telefone fixo.

Em um ano, na média, as pessoas tem contato pessoal com seus


laços sociais mais importantes aproximadamente 210 dias; elas
fazem contato com essas pessoas via chamada do telefone celular
em 195 dias do ano e utilizam o contato através do telefone fixo em
125 dias por ano. (HAMPTON et. al., 2009, tradução nossa)

O levantamento mostra ainda que a intensidade de uso das mensagens

de texto via celular para contatar as pessoas mais próximas já é a mesma das

ligações feitas por telefone fixo: 125 dias por ano. O uso de e-mail vem em

quinto lugar, usado em média 72 dias por ano (HAMPTON et. al., 2009). Em

48
um ranking de formas de comunicação utilizadas para estar em contato com as

pessoas mais próximas, o telefone celular aparece em duas das cinco opções

mais escolhidas.

Com base em números estatísticos e sem fazer uma análise profunda, a

mesma pesquisa mostra outros números relevantes para o estudo do impacto

do telefone celular na vida social. Se comparados a usuários de outras ICTs

(sigla em inglês para Information and Communication Technologies, em

português “Tecnologias de Informação e Comunicação”), quem tem telefone

celular tem, em média, um número 12% maior de confidentes (HAMPTON et.

al., 2009). O estudo também analisou a relação entre o número de parentes

próximos e a participação em diversas atividades na Internet e no telefone

celular. Foi constatado que o usuário de telefone celular tem um número

aproximadamente 15% maior de membros da família com quem ele discute

questões consideradas importantes. Ou seja, ele tem mais pessoas com quem

tem laços mais fortes e pode se dizer que são os recursos oferecidos pelo

telefone celular que estão intensificando relacionamentos.

A pesquisa sobre a reaproximação de famílias pelo celular e pela

Internet (WELLMAN et al., 2008) mostra que um grupo familiar conectado por

redes móveis tem maior probabilidade de dividir momentos com seus entes

queridos enquanto eles estão on-line (por exemplo, enviar uma foto ou fazer

um comentário que ficaria perdido no tempo sem a disponibilidade da conexão

sem fio) e coordenar atividades e encontros. Entre os entrevistados, 25%

responderam que sentem que suas famílias ficaram mais próximas devido ao

uso da Internet e do telefone celular. Além disso, 33% dos que utilizam Internet

49
(acessada pelo computador ou pelo celular) disseram que o uso da rede

melhorou “muito” suas relações com os amigos e 23% dizem que o mesmo

aconteceu no relacionamento com os membros de sua família.

Na Coréia do Sul, um grupo de pesquisadores (YANG et. al, 2008)

analisou a forma como 16 jovens universitários, com idades entre 19 e 26 anos,

utilizam seus celulares. Para a maioria deles, os telefones portáteis, e

principalmente as mensagens de texto enviadas por esses aparelhos, permitem

que eles entrem em contato com as pessoas queridas independentemente do

horário, da localização física, do que eles estão fazendo naquele momento e de

quem está em volta no momento do contato. De acordo com o estudo, “do

ponto de vista emocional, isso significa muito para eles” (YANG et. al, 2008,

tradução nossa).

O estudo sugere que o telefone celular reforça as relações já existentes:

Diferente de outras formas de se entrar em contato com outras


pessoas, a comunicação feita pelo telefone celular não é anônima.
Não é comum para os usuários de telefones portáteis fazer uma
ligação para o número de uma pessoa totalmente estranha, nem para
alguém que não é familiar a elas. Portanto, os telefones celulares têm
mais probabilidade de serem utilizados para fortalecer a rede pré-
existente de contatos do indivíduo. (YANG et al, 2008, tradução
nossa).

No Brasil, em um estudo sobre o impacto do uso do telefone celular

entre jovens entre 18 e 25 anos, realizado no Rio de Janeiro (NICOLACI-DA-

COSTA, 2004), foram identificadas algumas mudanças na rotina de quem está

conectado ininterruptamente à rede sem fio. A fluidez e o movimento emergem

como características constantes do dia-a-dia desses jovens que, ao mesmo

tempo em que precisam lidar com o controle muitas vezes excessivo dos pais,

50
que têm acesso remoto a eles pelo telefone celular, desfrutam da sensação de

não se sentirem mais sozinhos porque, a qualquer momento, eles têm alguém

à mão para recorrer, seja na hora de pedir uma carona para casa, contar uma

novidade ou matar as saudades.

A conexão constante permitida pelo celular “geram um constante fluxo

de ligações ao longo do dia e da noite, inclusive de madrugada. A sociabilidade

desses jovens é intensa e fluida. Não há muito espaço para a solidão”

(NICOLACI-DA-COSTA, 2004).

Os jovens entrevistados vêem o celular como provedor de um espaço de

privacidade que não existia quando tinham apenas à disposição o telefone fixo

instalado na casa dos pais. O telefone portátil também deu a eles uma

capacidade de mobilidade com relativa segurança, por estarem sempre

conectados. Por isso, a interrupção da conexão, seja pela falta de bateria ou

pela perda do aparelho, causa temor:

Na ausência desse acesso, (os jovens se sentem) excluídos do


convívio de seus amigos, parentes, namorados, etc. e enfrentam uma
nova forma de solidão, não menos dolorosa do que as tradicionais: a
solidão do sedentário em um mundo de nômades em constante
movimento. (NICOLACI-DA-COSTA, 2004).

4.1 – A cultura das imagens instantâneas

Emerge uma cultura de imagens radicalmente nova, onde elas podem


ser produzidas facilmente e em quantidades infinitas, arquivadas e
transportadas em dispositivos móveis como as câmeras digitais e, de
forma mais comum, em telefones equipados com câmeras. (NYIRI,
2009, tradução nossa)

51
As fotos e os vídeos produzidos pelo telefone celular colaboram para

enriquecer o relacionamento entre integrantes de uma mesma rede social. “O

consumo (do conteúdo produzido no celular) se dá pela circulação na rede, o

envio rápido e imediato. Trata-se de circular e não memorizar, para reforçar

laços sociais” (LEMOS, 2004).

André Lemos (2004) entende que as fotos e os vídeos feitos com as

câmeras contidas nos telefones celulares não têm apenas a qualidade de

registro, porque “o que os diferenciam é a produção individualizada, a

circulação imediata, a conexão planetária, fazendo de todos nós, queiramos ou

não, testemunhos virtuais, partícipes da experiência, de tudo e de qualquer

coisa” (LEMOS, 2004).

Compartilhar imagens não é apenas uma questão de expor

publicamente a vida privada para uma determinada rede social: “busca-se o

que é vivido junto, a cumplicidade. Não mais a sociedade do espetáculo, mas o

espetáculo da vida banal, do dia-a-dia compartilhado” (LEMOS 2004).

Atualmente, as câmeras fotográficas e de gravação de pequenos vídeos

são itens de fábrica da grande maioria dos telefones celulares. A evolução da

tecnologia está fazendo com que a qualidade das fotos clicadas pelo celular

fique cada vez mais próxima das imagens feitas com câmeras fotográficas

digitais. Pode-se dizer que, junto com a popularização crescente da Internet

sem fio, são razões que fizeram com que a propagação de imagens entre os

usuários de telefones celulares se tornasse uma prática bastante comum.

Quase todos os usuários têm uma câmera à disposição: “Agora a lógica é „uma

câmera na não e conexões na cabeça‟” (LEMOS, 2008).

52
Kristóf Nyíri (2009) lembra que imagens em movimento não são

novidade, uma vez que, na década de 1990, já era possível enviar arquivos por

e-mail ou fazer o download de imagens a partir de sites na Internet. A novidade

é poder compartilhar fotos e vídeos a partir de mensagens multimídia, ou MMS

(sigla em inglês para Multimedia Messaging Service), através do celular. Ao

receber essas mensagens, o usuário do telefone portátil não precisa estar em

lugar fixo, como seu computador de mesa, para poder ver as imagens

enviadas. Ele faz isso quase imediatamente após receber a mensagem,

acompanhando, em tempo real, o que seus amigos e familiares estão vendo.

Santaella (2007, p. 386-403) conceitua os registros fotográficos feitos em

câmeras digitais e, principalmente, nas câmeras dos telefones celulares, como

“imagens voláteis” porque, além de serem facilmente registradas devido à

disseminação dos telefones celulares com câmeras, podem ser “remetidas a

quaisquer outros celulares com a mesma capacidade técnica ou para

quaisquer terminais de computador em quaisquer pontos do planeta”

(SANTAELLA, 2007, p. 386). É possível publicar as imagens clicadas pelo

celular em blogs e redes sociais como Facebook, utilizando a conexão sem fio

à Internet, e enviá-las por e-mail.

A facilidade de uso das câmeras embutidas nos celulares faz com que

qualquer momento seja registrado e compartilhado com equipamentos em

qualquer lugar do mundo, com muita rapidez. “As fotos são tiradas, vistas e

descartadas imediatamente; elas circulam como forma de fazer contato: enviar

para amigos, mostrando onde se está, os momentos banais, fora da

solenidade” (LEMOS, 2004).

53
A informalidade das fotos também aparece nos registros em vídeo feitos

nos telefones celulares.

Além do fator mobilidade, portabilidade, há a disseminação massiva


do artefato que faz de qualquer um, virtualmente, um produtor,
distribuidor, consumidor de imagens. A diferença fundamental é,
efetivamente, a rede, a potência de conexão e de colaboração, que
no caso da disseminação da fotografia popular ou do vídeo/cinema,
não existia. (LEMOS, 2004)

A grande quantidade de filmes feitos e distribuídos pelo telefone celular

pode sugerir uma espécie de renascimento de um fenômeno conhecido como

microcinema, um movimento que surgiu no começo dos anos 90, na Califórnia,

que incentivava a produção e a exibição de filmes de baixo custo ou amadores.

Na maioria, eram filmes caseiros em vídeo ou 16mm e exibidos em garagens e

festivais independentes (FIORELLI, BRUNET, 2008). Agora, esse fenômeno

se reproduz nas telas dos telefones celulares.

É um tipo de processo que, a partir das possibilidades trazidas pelo


novo paradigma tecnológico, permite uma produção em grande
escala, independente de grandes financiamentos, e que encontra
meios de contornar os problemas de distribuição e exibição através
de mostras, festivais e sítios da Internet. Afinal, não é à toa que muito
da discussão atual sobre o mercado audiovisual inclui também a
telefonia celular. (COUTINHO, 2004)

Com a popularização de sites de exibição de vídeos como o Youtube e

dos dispositivos móveis que gravam vídeo, o microcinema ganhou uma nova

dimensão e, agora, seu público é formado pelos bilhões de pessoas que

navegam no ciberespaço e não apenas pelo público dos festivais

independentes. Com a possibilidade de se compartilhar arquivos de vídeo pelo

telefone celular “o microcinema ganha mais um lugar e forma de exibição

54
(mesmo que dentro de uma esfera de conexão privada) – o espaço público”

(FIORELLI, BRUNET, 2008). Um exemplo é o filme Nine Lives, que citamos no

capítulo anterior, e os milhares de vídeos feitos por celular que são exibidos em

programas de televisão, blog, sites de humor e redes sociais, entre outros

veículos.

Para Kristóf Nyíri (2009), os pocket films feitos com a câmera do telefone

celular, com baixa qualidade de imagem e duração não superior a um ou dois

minutos, pertencem a uma categoria chamada “microconteúdo” (do inglês

microcontent). “Ao se tornar o meio de comunicação dominante, o telefone

celular estimula a criação de novos gêneros de vídeos, especificamente

ajustados para serem vistos na tela pequena e em movimento” (NYÍRI, 2009,

tradução nossa).

As imagens transmitidas pelo telefone celular são um importante meio

de socialização, mas que ainda está restrito a usuários que tenham aparelhos

mais avançados e uma conexão de maior velocidade, o que pode representar

um valor mais alto na assinatura do serviço. As mensagens de texto, como

veremos a seguir, têm até mesmo ultrapassado o volume de uso das

chamadas convencionais, de voz, na hora dos usuários se comunicarem pelo

telefone celular.

4.2 – O poder das mensagens de texto

A primeira mensagem de texto foi enviada em dezembro de 1992, no

Reino Unido (RHEINGOLD, 2002, p. 43). Na época, o padrão de telefonia GSM

trouxe uma novidade: a possibilidade de se enviar mensagens de texto de até

55
160 caracteres de um telefone para outro. Quando foi projetado, o sistema de

envio de textos curtos pelo celular não tinha como objetivo principal ser uma

forma de interação pessoal, mas um meio de avisar os usuários sobre o

recebimento de mensagens no correio de voz nos seus aparelhos e até como

um sistema para envio de atualizações sobre o clima ou o mercado de ações

(LING, 2005). “O sucesso inesperado da mensagem de texto através do celular

era também um sinal de que os usuários, mais uma vez, se apropriavam de

uma tecnologia de comunicação para fins sociais” (RHEINGOLD, 2002, p. 43,

tradução nossa).

“O silêncio da troca de mensagens de texto é provavelmente seu ativo

social mais valioso” (LEVINSON, 2004, p.112, tradução nossa). A frase de Paul

Levinson pode ser considerada uma justificativa importante para a adoção

massiva das mensagens de texto, conhecidas também pela sigla SMS. Para se

ter uma idéia do volume de uso desse serviço, entre 31 de dezembro de 2007 e

1º de janeiro de 2008, foram enviadas no mundo 43 bilhões de mensagens de

texto via celular para celebrar o ano novo (ACISION, 2008).

A mensagem de texto serve como uma maneira de “bater antes de

entrar” na hora de chamar alguém pelo telefone celular: “ao enviar mensagens

do tipo „Você pode falar no telefone agora?‟ ou „Você está acordado?‟, quem

faz o contato evita acordar ou interromper de forma rude a pessoa com quem

quer falar, o que faria se optasse por uma ligação repentina” (ITO, 2003,

tradução nossa).

Chama-se a troca de textos entre celulares de comunicação assíncrona,

porque ela não é necessariamente uma troca imediata de informações. Isso só

56
ocorre quando o destinatário estiver conectado e motivado a responder assim

que recebê-la, o que não é obrigatório:

O SMS é uma forma assíncrona de comunicação. Eu envio uma


mensagem sabendo que o destinatário vai lê-la em algum momento e
responder quando isso acontecer. Sabe-se que (com a mensagem de
texto) não se pode, necessariamente, chamar a atenção do
interlocutor da mesma forma que se faria através em uma chamada
de voz. (LING, 2005, tradução nossa).

Para Richard Ling (2005), o SMS, assim como o e-mail e as cartas

convencionais, não é um tipo de comunicação em que a demora na resposta é

vista como algo indelicado.

O uso massivo das mensagens de texto se deu, sobretudo, entre os

jovens de diversas nacionalidades. No Japão, o termo oyayubisoku (em

português, “a tribo do polegar”) é utilizado para definir esses usuários

(RHEINGOLD, 2002, p. 31-35). Além de serem um meio mais barato para se

comunicar em muitos países, as mensagens de textos criaram um “espaço de

intimidade” para os jovens, que podem manter diálogos que não gostariam que

fossem ouvidos por seus pais ou outras pessoas que estão à sua volta.

Um estudo feito no Japão (ITO, 2003) mostrou que há uma diferença

drástica entre o volume de mensagens enviadas pelos jovens e pelos usuários

mais velhos. A pesquisa mostra que os adolescentes japoneses enviam uma

média de 70 mensagens por semana, o que é o dobro do que os usuários de

20 a 29 anos, a categoria de idade mais próxima, enviam.

O SMS permite que se compartilhe continuamente o que está

acontecendo através de mensagens simples. Uma pesquisa realizada em 1997

57
na Europa pelos pesquisadores Pasi Mäenpäa e Timo Kopomaa mostrou que a

troca de mensagens de texto representa “viver no mesmo ritmo que os amigos

mais próximos, com a sensação de se compartilhar continuamente a vida com

os outros” (RHEINGOLD, 2002, p. 45, tradução nossa).

Pesquisas mostram que as mensagens de texto reforçam os laços

sociais entre os jovens na Inglaterra e na Noruega (CAMPBELL, RUSSO;

2003). Na Noruega foi observado que as mensagens de texto enviadas por

celular “que, superficialmente, parecem conter uma comunicação sem sentido,

na verdade estabelecem e mantêm conexões entre parceiros em redes sociais”

(CAMPBELL, RUSSO; 2003, tradução nossa).

O fluxo constante de mensagens de texto e fotos enviados pelo


telefone celular é realizado, principalmente, entre pares
compartilhando notícias pessoais e interpretações de informações
com as quais eles acabaram de se deparar: suas impressões sobre
um programa de TV, o fato de se estar ouvindo algo interessante do
rádio, a foto de um evento em que eles estão ou a informação de que
alguém não foi a aula devido a um resfriado. (ITO, 2003, tradução
nossa).

São mensagens que, a princípio, parecem sem importância, mas que

estão sendo fundamentais para a comunicação via celular entre jovens. A

coordenação de atividades feita por mensagens de texto, que é uma das

vantagens do SMS, será vista posteriormente neste trabalho.

Para Rheingold (2002, p. 30), o serviço de SMS permite criar uma esfera

onde estão os canais privados de mensagens de texto, em que um fluxo de

comunicações lacônicas conecta as pessoas em tempo real e no espaço físico.

Richard Ling (2005) destaca que o próprio conteúdo das mensagens traduz o

acompanhamento da rotina diária a partir da troca de pequenos textos: “O SMS

58
traz características tanto da cultura falada como da escrita, mas com apelo

suficiente para prender sua atenção. Há muitos elementos que fazem com que

se pense que o SMS é mais parecido com falar do que escrever” (LING, 2005,

tradução nossa). Entre essas características, estão o caráter imediato da

comunicação por texto, a informalidade das mensagens e sua efemeridade: “é

difícil imaginar que, daqui a 50 ou 100 anos, alguém vai encontrar o arquivo

secreto de SMS da vovó no sótão” (LING, 2005, tradução nossa).

Uma pesquisa realizada com jovens na Coréia do Sul mostrou que o

SMS é o meio preferido para se pedir ajuda pelo celular: “É fácil e rápido e,

ainda mais importante, escrever ao invés de falar permite aos usuários

expressar-se de uma forma mais cuidadosa” (YANG et. al, 2008, tradução

nossa).

Com a popularização da conexão à Internet pelo telefone celular, não

são apenas as palavras das mensagens via SMS que são disparadas de

aparelho para aparelho. Sites de relacionamento como Orkut e Facebook têm

versões para celular, o que facilita o envio de mensagens diretamente para

esses sites. O Twitter, uma rede social baseada em mensagens curtas de 140

caracteres, também pode ser acessado pelo celular e permite que as

mensagens viagem além dos contatos de celular, para todos os que estão

ligados ao perfil do usuário nessa rede.

Ao observar jovens interagindo na Noruega, Howard Rheingold

constatou que “os adolescentes escandinavos costumam mostrar as

mensagens de texto na tela do celular a seus colegas ou fazem o telefone

circular entre o grupo” (RHEINGOLD, 2002, p.54, tradução nossa). Essa é

59
apenas uma da forma de se compartilhar o telefone celular com outras

pessoas, como veremos a seguir.

4.3 – Compartilhamento de aparelhos

O compartilhamento do telefone celular entre amigos, membros de uma

família ou até mesmo no local de trabalho é um fenômeno que ocorre tanto em

países em desenvolvimento, como no Brasil e na Índia, como nos países mais

ricos, nos quais praticamente 100% da população têm telefone celular. “É

possível observar a transformação de um aparelho que tem sido observado

com freqüência como um meio „privado‟, de propriedade de uma única pessoa,

em um telefone público” (SOUZA E SILVA, 2007, tradução nossa). O que muda

é a forma como esse compartilhamento se dá.

No Brasil, o compartilhamento ocorre em comunidades de baixa renda,

como nas favelas do Rio de Janeiro (SOUZA E SILVA, 2007), onde o telefone

celular passa a ter a função de um telefone público para quem não tem

condições financeiras de ter seu próprio aparelho.

Estudos (STEENSON, DONNER; 2009) mostram que, na Suécia,

adolescentes compartilham o celular ao permitir a participação de outras

pessoas em uma chamada recebida e, também, ao permitir que amigos e

familiares enviem mensagens de texto de seus aparelhos particulares. Naquele

país, o SMS é gratuito.

Na Índia, o compartilhamento de celular se dá em todas as classes

sociais: os aparelhos são compartilhados livremente dentro do ambiente

familiar e também no de trabalho. A afirmação é resultado de um estudo de

60
caso feito a partir de observação e entrevistas com 39 moradores de Bangalore

em 2006 (STEENSON, DONNER; 2009).

O envio de mensagens de texto é gratuito na Índia e “o

compartilhamento constante de aparelhos, mensagens e créditos dentro do

grupo reforça a proximidade do relacionamento entre seus integrantes”

(STEENSON, DONNER; 2009, tradução nossa).

Os pesquisadores encontraram na Índia quatro tipos de

compartilhamento do celular. Em primeiro lugar, independentemente de quem é

o dono do telefone, o compartilhamento informal ocorre bastante. Em muitos

casos, ocorre em razão da proximidade entre quem empresta e quem pede,

mas também ocorrem empréstimos entre vizinhos, mesmo que eles não

tenham relações muito próximas.

O segundo tipo ocorre quando quem pede emprestado tem alguma

limitação, seja econômica ou de alfabetização. No terceiro, o compartilhamento

traduz uma relação de poder tanto no ambiente doméstico como no de

trabalho, ou seja, o celular é sempre de propriedade de alguém considerado

“superior” naquele cenário. E em quarto lugar, o compartilhamento do celular

faz a ponte de conexão entre comunidades urbanas e vilas rurais.

Para exemplificar alguns desses tipos de compartilhamento, a pesquisa

mostra a rotina de Lata, uma mulher de 44 anos, que usa o telefone celular do

marido quando está em casa, mas nunca leva o aparelho consigo. Quando

está na rua, ela liga para casa utilizando uma cabine telefônica ou utilizando o

celular de um fornecedor.

61
“Como para outras mulheres que nós entrevistamos e que não têm seu

próprio celular, pedir o aparelho emprestado ao esposo é algo tão comum que

só é mencionado quando se pergunta diretamente” (STEENSON; DONNER,

2009, tradução nossa). Segundo os pesquisadores, os padrões de

compartilhamentos entre maridos e esposas refletem as diferenças dos papéis

entre homens e mulheres na Índia. Além de ser dona de casa, a mulher

também cumpre um ideal cultural de obediência ao marido e, por isso, pede o

telefone celular emprestado.

O compartilhamento do celular é uma prática tão comum na Índia, que

os pais cujos filhos não têm celular sabem que podem encontrá-los ao ligar

para os celulares dos amigos deles (STEENSON; DONNER, 2009).

Ao analisar essas diversas formas de compartilhamento, é possível

lembrar da análise de André Lemos sobre a forma como estamos sendo

levados a repensar a vida social com as tecnologias móveis. “Das formas de

isolamento e fragmentação da vida moderna, a introdução de tecnologias

móveis estão nos levando a um re-exame do que significa proximidade,

distância e mobilidade” (LEMOS, 2004). E as práticas sociais que envolvem o

uso de telefones celulares têm mostrado bem essa reavaliação de parâmetros.

Além do compartilhamento do celular, de imagens e vídeos em tempo

real e de bilhões de mensagens de texto, os usuários de telefones celulares

têm utilizado seus aparelhos para reforçar seus laços sociais através da

coordenação de atividades, que vão desde compromissos rotineiros até

manifestações públicas de grande escala.

62
4.4 – Coordenação de atividades

O telefone celular tem mostrado ser uma excelente ferramenta de

coordenação de atividades, das mais diversas, entre seus usuários.

Redes de computadores, disponibilidade permanente e aprendizagem


por meio de equipamentos móveis fortificam as tendências
descentralizadoras e dão suporte a comunidades locais ou outras
organizadas não geograficamente” (SANTAELLA, 2007, p. 245)

Souza e Silva (2006) descreve duas formas de coordenação por meio do

telefone celular. A microcoordenação é o resultado de diversos contatos

telefônicos curtos com o objetivo de marcar compromissos ou manter alguém

informado sobre eventos que estão se desdobrando naquele momento. Por

outro lado, a macrocoordenação significa a criação de redes sociais móveis

utilizando o telefone celular como um aparelho de comunicação coletiva.

A partir do uso dos telefones móveis conectados a redes sociais como

sites de relacionamento e blogs, observa-se o surgimento de comunidades

espontaneamente, sem planejamento, em tempo real, “que transformam a

iniciativa de se fazer algo em grupo em uma mensagem que é respondida por

múltiplas fontes que desejam participar daquilo” (CASTELLS et al., 2004, p.

240, tradução nossa). E isso não tem sido observado apenas em mobilizações

de caráter político, mas também em reuniões sociais dos mais diversos tipos,

de festas a trabalhos voluntários e comemorações esportivas. Isso mostra que

essas comunidades se formam se a mensagem a ser transmitida tem sentido e

valor para uma determinada rede de pessoas afins.

63
Howard Rheingold (2002) criou o termo “smart mobs” (em português

literal, “multidões inteligentes”) para tratar dessas massas que se unem para

um objetivo comum.

As multidões inteligentes são formadas por pessoas capazes de atuar


em grupo, mesmo que não se conheçam. Os membros desses
grupos cooperam de formas inconcebíveis em outras épocas, porque
adotam sistemas informáticos e de comunicações muito modernos,
que lhes permitem conectar-se com outros sistemas ao redor, tais
como os telefones celulares de outras pessoas. (RHEINGOLD, 2002,
p.18, tradução nossa)

Esse potencial de coordenação e mobilização a partir da rede sem fio

tem sido bastante utilizado com fins políticos e sociais. O primeiro grande

exemplo que surgiu neste sentido foi o Power People II, na Filipinas, em 2001

(CASTELLS et al., 2004, p. 197-206; RHEINGOLD, 2002, p. 183-188). Em

janeiro daquele ano, milhares de filipinos participaram de um evento de

mobilização que durou quatro dias e derrubou o presidente do país na época,

Joseph Estrada, acusado de corrupção. O Power People II (que ganhou esse

nome por seguir o People Power Movement, que tirou Ferdinand and Imelda

Marcos do poder nas Filipinas, em 1986) convocou a população a protestar a

partir de mensagens de texto recebidas nos celulares dos cidadãos. A resposta

da população foi tão forte que Estrada foi perdendo todos os seus aliados e

acabou saindo do governo.

Certamente, os bastidores políticos e sociais que levaram à queda de

Estrada são muito mais profundos. Mas “embora não possamos atribuir as

conseqüências políticas apenas à mobilização por tecnologias móveis, parece

ser evidente que estas constituem-se como ferramentas importantes de

mobilização” (LEMOS, 2004). No entanto, esse foi o primeiro evento em que

64
uma grande mobilização social utilizou o telefone celular como principal

ferramenta de comunicação para ser organizada.

As mensagens de texto via celular mostraram ser uma ferramenta

eficiente naquele momento porque elas “permitiram a comunicação instantânea

a qualquer momento, de qualquer lugar, e isso é mais adequado para reunir

manifestações em larga escala de forma imediata” (CASTELLS et al., 2004, p.

206, tradução nossa). No caso filipino, a mensagem de texto já era uma

ferramenta familiar para a população. O SMS foi lançado nas Filipinas em 1995

como um serviço gratuito (RHEINGOLD, 2002, p. 184), o que motivou a adoção

das mensagens de texto como meio de comunicação com uma grande

velocidade.

Outra forma de macrocoordenação que chama a atenção pela

originalidade são os flash mobs. São eventos relâmpago, que acontecem de

surpresa, sem que aqueles que não estão envolvidos percebam até o momento

da ação. São manifestações “apolíticas, onde pessoas que não se conhecem

marcam, via rede (blogs, celular com uso de voz e SMS), locais públicos para

se reunir e se dispersar em seguida, causando estranheza e perplexidade aos

que passam” (LEMOS, 2004).

A possibilidade de encontro de membros de redes virtuais também

parece ser um estímulo para os flash mobs. “O que parecia mover os mobbers

era o sentimento de „estar junto‟ não só imaterialmente, mas também nos

espaço físico da cidade” (PAMPANELLI, 2004). São encontros que quebram a

rotina urbana, mesmo que por um minuto, tornando-se muito relevantes para

aqueles que puderam participar e assistir. “O movimento é apolítico e de apelo

65
ao estranhamento, à suspensão do espaço-tempo da vida quotidiana” (LEMOS,

2004).

Apesar de grande parte dessas manifestações coordenadas pelo

telefone celular tenham por objetivo algo benéfico, Rheingold (2002) ressalta

que nem todas essas manifestações são positivas:

As „smart mobs‟ nem sempre são benéficas. Os grupos de


linchamento e as masocracias continuam engendrando atrocidades.
A mesma convergência tecnológica que abre novas formas de
cooperação (...) dá poder tanto aos sádicos quanto aos altruístas.
(RHEINGOLD, 2002, p.24, tradução nossa)

Além das manifestações inusitadas dos flash mobs e das mobilizações

políticas de diversos teores, o uso do telefone celular tem engendrado o

espírito de cooperação para ajuda mútua.

Um exemplo disso é um aplicativo lançado em versão beta em 2008 pela

Microsoft, um serviço chamado Vine. Trata-se de uma ferramenta de

colaboração e mobilização que utiliza os recursos da conexão móvel e de

detecção da localização dos usuários, no qual é possível criar uma rede social

móvel com familiares, amigos e pessoas que dividem interesses comuns (como

um grupo de proteção a animais de rua, por exemplo). O objetivo é que essas

pessoas estejam conectadas 24 horas por dia, disponíveis para receber um

aviso por meio de mensagens de texto.

No caso de um acidente ou outro tipo de emergência, todos os

interessados podem ser comunicados imediatamente a partir dessa ferramenta.

No caso do grupo de proteção de animais, os integrantes podem ser avisados

quando um animal é resgatado e coordenar onde ele será abrigado até

66
encontrar um lar definitivo. Vizinhos podem combinar entre si quem vai buscar

as crianças, se um dos moradores tiver problemas no trabalho e precisar ficar

até mais tarde no escritório.

Cada usuário do Vine escolhe a forma como quer receber as

informações da sua rede: por e-mail ou mensagens de texto instantâneas. No

site feito para o Vine o usuário pode fazer o download de um cartão com seu

número de identificação, para ser impresso e levado na carteira, para que as

pessoas próximas sejam avisadas no caso de uma eventualidade em que o

usuário fica impedido de acessar sua rede de contatos pelo telefone celular.

4.4.1 – Tempo mais flexível

A coordenação de atividades permitida pela conexão sem fio muda

também a forma de experimentar o tempo. Kristof Nyíri (2007) aponta que uma

das funções fundamentais do telefone celular é a de permitir o reagendamento

de atividades de forma contínua, quando se está em movimento. “A

comunicação móvel coordena os movimentos das pessoas não apenas no

espaço, mas também no tempo: dentro da estrutura geral do tempo fixo

público, janelas de tempo personalizadas estão sendo abertas” (NYÍRI, 2007,

tradução nossa).

Ao utilizar o telefone celular para administrar e gerenciar nossos

compromissos, vivemos com um “pé no futuro” e conseguimos lidar com o

tempo de forma mais maleável:

67
Isso introduz uma mudança em nossa percepção do tempo, de modo
que a idéia de um futuro organizado, produzido previamente, é
substituída por uma sensação de tempo móvel, que se altera
constantemente para fazer o futuro. O futuro já não se concebe como
algo formado de momentos exatos, mas como „lugares no tempo‟
aproximados, abertos à negociação de acordo com a situação”.
(RHEINGOLD, 2002, p. 220, tradução nossa)

Castells et. al (2004, p. 233) chama de “tempo atemporal” (do inglês

timeless time) essas camadas de tempo extra que são acrescentadas pela

comunicação móvel ao passar de tempo convencional. Manuel Castells e sua

equipe de pesquisadores constataram que a disponibilidade constante da

comunicação móvel torna possível saturar o tempo com práticas sociais ao se

inserir comunicação em todos os momentos em que não é possível fazer

outras coisas “como no intervalo „entre duas atividades‟, enquanto se está em

um meio de transporte ou numa fila de espera” (CASTELLS et. al, 2004, p. 233,

tradução nossa).

Para Nyíri, o uso do telefone celular mudou totalmente a forma como

coordenamos nossos encontros com outras pessoas “A coordenação da

atividade social depende hoje, em grande parte, da negociação móvel, ao invés

de se manter agendas pré-definidas” (NYÍRI, 2007, tradução nossa).

Pode-se dizer que as cidades são o cenário onde esses espaços

híbridos, em que o lugar físico e os espaços permitidos pela conexão

permanente se unem, criando novas esferas de tempo, estão se tornando

reais. Nesses espaços, não estamos apenas reaprendendo a conviver com

pessoas, mas também com o espaço físico, que é revestido por uma camada

digital com a criação de uma série de recursos que utilizam como base a

localização geográfica.

68
Capítulo 5 – Considerações finais

Este trabalho de pesquisa procurou discutir os impactos causados pelo

telefone celular na vida em sociedade. O debate foi feito a partir de conceitos e

idéias de autores que estão pesquisando o assunto e que, através de

observações empíricas e dados estatísticos, têm conseguido apontar algumas

práticas sociais novas ou provenientes de outros meios de comunicação

anteriores adotadas por usuários de telefones celulares, potencialmente

capazes de ficar continuamente conectados.

Foi sugerido que o uso do telefone celular pode fortalecer

relacionamentos por meio da troca de fotos e vídeos e, também, de mensagens

de texto. A coordenação de atividades tanto na rotina diária dos usuários como

para manifestações políticas é uma característica marcante do uso de telefones

celulares. A disponibilidade contínua que o telefone portátil oferece a seus

usuários permite o reagendamento de compromissos nos intervalos entre uma

atividade e outra, o que, segundo autores como Castells e Nyíri, dá mais

flexibilidade às 24 horas do dia.

O celular mostrou ser o elemento central da computação ubíqua e o que

o diferencia dos outros dispositivos móveis é o fato de poder reunir uma série

de recursos dentro de um equipamento superportátil. Assim como o passar do

tempo, o espaço físico pode estar ganhando um novo significado a partir das

diversas aplicações que combinam a tecnologia de conexão sem fio a sistemas

de localização por coordenadas geográficas (como o GPS) ou pela

aproximação do usuário (Bluetooth e RFID). Essas aplicações, conhecidas

69
como mídias locativas, podem ser vistas como uma forma de reapropriação

dos espaços urbanos por seus moradores e visitantes.

Os usuários de telefones celulares estão aprendendo a lidar com a

questão da conexão permanente. As conversas ao celular em público e as

interrupções causadas tanto pelo recebimento de chamadas como de

mensagens de texto são tema de diversos estudos. Santaella sugere que há

dois movimentos ocorrendo em sentidos opostos: ao mesmo tempo em que a

esfera pública invade nossa privacidade, a vida privada também invade os

espaços públicos.

Apesar de todas as vantagens que o fato de se poder estar conectado

24 por dia oferece, como a rede de contatos sempre ao alcance e o acesso a

informações diversas e serviços de entretenimento que permeiam os espaços

urbanos, também deixamos “pistas” de nossa localização e até mesmo

informações particulares ao alcance de desconhecidos.

Há muitas questões sobre os telefones celulares que podem vir a ser

estudadas em trabalhos de pesquisas futuros. Nesta dissertação, pouco foi dito

sobre as mudanças nas relações de trabalho causadas pelo telefone celular.

Muitas empresas, hoje, cedem um telefone portátil a seus funcionários, para

que eles possam fazer ligações sem ter que usar seus próprios aparelhos (e

gastar dinheiro com isso). No entanto, sabe-se que isso também torna o

funcionário disponível a qualquer momento, inclusive quando ele não está no

escritório e o horário do expediente já acabou. Há espaço para descansar do

trabalho, uma vez que continuamos conectados a ele quando deixamos o

escritório? No sentido contrário, a conexão móvel também permite que, no

70
horário de trabalho ou de aula, entremos em contato com nossas redes sociais,

criando “ilhas privadas” nesses espaços. Será que ficamos menos produtivos

por causa disso?

No capítulo 2, falou-se brevemente do lançamento do iPhone e de sua

tela sensível ao toque. Essa nova forma de interface para celular e suas

conseqüências também é um assunto que merece ser explorado com

profundidade.

A reapropriação do espaço urbano pelos usuários de dispositivos móveis

é um ponto importante no estudo sobre o impacto dos telefones celulares. Livre

dos fios que as prendiam a um lugar fixo, as pessoas podem interagir com o

espaço físico de forma diferente, agregando conteúdo ao seu deslocamento

diário, outra questão que merece um desenvolvimento mais aprofundado, o

que já está sendo feito por pesquisadores como André Lemos.

Outro assunto interessante para investigação é a produção massiva de

imagens por dispositivos móveis. A produção de fotos e vídeos pelo telefone

celular representa uma nova cultura das imagens? Será que agora todas as

imagens serão descartáveis e mesmo os momentos mais importantes serão

banalizados pela quantidade excessiva de registros?

O telefone celular nos trouxe uma infinidade de possibilidades de

comunicação, lazer e trabalho e, também, uma importante ferramenta de

inclusão social, uma vez que seu custo é muito mais baixo do que o de um

computador convencional e, atualmente, esses dispositivos são capazes de

executar diversas funções de um PC.

71
Estudar o uso do telefone celular e todas as conseqüências é investigar

como as pessoas do século 21 estão lidando com a realização da computação

ubíqua idealizada por Weiser e Brown. É um campo de pesquisa fascinante,

porque ainda há muito a pesquisar sobre o nosso presente e o que ainda está

por vir na comunicação móvel.

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