Você está na página 1de 8

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE CONTABILIDADE

E m disciplinas anteriores, você já estudou os Princípios Fundamentais de Contabilidade.

No entanto, em função de sua importância para o desenvolvimento da profissão, é


necessário que o estudante (e o profissional também) esteja sempre revendo esse assunto,
já que o exercício da Contabilidade é pautado na correta aplicação da doutrina.

Você já deve saber que os princípios são o alicerce da nossa profissão. Todo profissional
contábil tem a obrigação de saber interpretá-los e aplicá-los no dia-a-dia. Conforme dito
pelo Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá, ‘os princípios são macro-regras que orientam a tudo’.

Faremos um resgate do que já foi estudado e traremos para discussão novos estudos com o
objetivo de enriquecer ainda mais conhecimento contábil de vocês. Mas é extremamente
importante que se lembrem de que o estudo acerca desse assunto não se esgotará aqui.
Muito pelo contrário! O objetivo é que esse conteúdo funcione como estimulante para novos
estudos.

1. O estudo do IPECAFI

Nosso conteúdo acerca dos Princípios Fundamentais começa no estudo realizado pelo
Instituto Brasileiro de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras – IPECAFI em 1986.
Tal estudo contou com a aprovação e divulgação pelo Instituto dos Auditores
Independentes do Brasil e foi referendado pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM.

O documento elaborado pelo IPECAFI trata da “Estrutura Conceitual Básica da


Contabilidade” e faz um estudo realmente importante acerca da conceituação da ciência,
suas características e usuários, além dos cenários contábeis. A leitura integral desse
documento é bastante interessante e a recomendo, no entanto, vamos voltar nossas
atenções aos Princípios Fundamentais de Contabilidade expostos no estudo do IPECAFI.

A classificação recomendada pelo estudo para os Princípios Fundamentais de Contabilidade


foi:

• Postulados ambientais de Contabilidade


• Princípios contábeis propriamente ditos
• Convenções contábeis – restrições aos princípios fundamentais

Vamos ver o que significa cada uma dessas classificações:

1. Postulados Ambientais de Contabilidade


De acordo com o estudo, por analogia, os postulados podem ser entendidos como axiomas.
Hã?! Axiomas? O que é isso?? Creio que é necessário fazer uma pequena passagem pela
Matemática antes de falar sobre os postulados, pois é preciso conhecer alguns conceitos
importantes:

o Axioma: premissa (proposição) tão evidente que não precisa de


demonstração.
o Teorema: premissa que necessita de demonstração
o Corolário: premissa deduzida a partir de outra já demonstrada.

Dessa forma, entendidos como axiomas, os postulados são aquilo que não se pode evitar.
São situações que existem independentemente da Contabilidade e que por isso escapam ao
seu controle. Podemos colocar aí as condições sociais, econômicas e institucionais nas quais
atua o profissional contábil.

Foram identificados dois postulados ambientais de contabilidade. São eles:

Postulado da Entidade Contábil

Enunciado: “A Contabilidade é mantida para as Entidades; os sócios ou quotistas destas


não se confundem, para efeito contábil, com aquelas...”

O postulado da Entidade Contábil faz a separação entre o patrimônio dos sócios ou


proprietário (firma individual) e o patrimônio da empresa. Ora, quando uma empresa é
constituída, está havendo a criação de uma “nova pessoa”. Uma Pessoa Jurídica, com
documentos próprios (CNPJ, Registro na JUCEPA, na SEFA, na Prefeitura), sendo,
portanto, diferente da Pessoa Física que a constituiu. O sócio ou proprietário, ao investir
na constituição de uma empresa, transferiu recursos para esta em definitivo, dando-lhe o
“combustível” necessário ao início de suas atividades.

O Postulado da Entidade tem as seguintes dimensões:

Jurídica  trata da separação entre PF e PJ, conforme já foi falado anteriormente.

Econômica  diz respeito à necessidade que a Contabilidade tem de registrar a evolução


patrimonial tanto qualitativa quanto quantitativa.

Organizacional  a entidade é um grupo de pessoas que controlam receitas e despesas

Social  a entidade gera benefícios não apenas para si, mas também para a sociedade.

Para você, que ainda está iniciando seus estudos no campo contábil, é importantíssimo
frisar que para compreender a ciência é preciso entender a entidade que, segundo o
IPECAFI, é o pano de fundo da atuação da Contabilidade. E para compreender a entidade,
você precisa observá-la interna e externamente, conhecendo todas as forças atuantes
sobre ela.
Postulado da Continuidade das Entidades

Enunciado: “Para a Contabilidade, a Entidade é um organismo vivo que irá viver (operar)
por um longo período de tempo (indeterminado) até que surjam fortes evidências em
contrário...”

Bom, o significado deste postulado representa o motivo para o qual as empresas (entidades)
são criadas: serem perpétuas. Ao constituir uma empresa, o investidor o faz sem pensar
que dali a pouco tempo aquela empresa acabará. Ao contrário! O que ele quer é que a
empresa cresça sempre mais, consolidando-se.

Isso não quer dizer que a Contabilidade ignore a possibilidade de a empresa acabar. No
entanto, escolherá sempre a continuidade. Só aceitará a descontinuidade quando houver
fortes evidências. Essas evidências não surgem de repente. São, sempre, fruto de
sucessivos resultados negativos, portanto, passíveis de “conserto” antes de levarem a
empresa a encerrar suas atividades.

Uma conseqüência natural da Continuidade é a geração de riqueza, fato necessário para que
a empresa esteja sempre em atividade. Quanto mais riqueza é gerada, maior a empresa fica
e mais longa estará de qualquer possibilidade de descontinuidade.

Você se lembra do conceito de axioma? Isso mesmo! Aquilo que não precisa de
demonstração, de tão óbvio. O Postulado da Continuidade é óbvio para a Contabilidade,
sendo para ela uma premissa básica, uma vez que para que a ciência exista plenamente e
possa atuar, é necessário que exista uma empresa, uma entidade.

Princípios Propriamente Ditos

De acordo com o IPECAFI, “os princípios são o núcleo central da doutrina contábil”. São
eles que determinam os procedimentos do registro contábil. Aqui temos 4 princípios a
conhecer. São eles:

• O Princípio do Custo como Base de Valor;


• O Princípio do Denominador Comum Monetário;
• O Princípio da Realização da Receita
• O Princípio do Confronto das Despesas com as Receitas e com os Períodos
Contábeis
Vejamos o que significa cada um desses princípios...

• O Princípio do Custo como Base de Valor

Enunciado: “... O Custo de aquisição de um ativo ou dos insumos necessários para


fabricá-lo e colocá-lo em condições de gerar benefícios para a Entidade representa a
base de valor para a Contabilidade, expresso em termos de moeda de poder aquisitivo
constante...”

Este princípio orienta o contador a registrar o bem pelo seu valor de aquisição. É claro que
precisamos considerar que o valor do bem sofre variações desde que o ativo é adquirido.
Incidem sobre ele, o desgaste em função do uso, as variações do poder aquisitivo da moeda,
flutuações do preço, mudanças tecnológicas e obsolescência. Essas incidências são
registradas pela Contabilidade com mecânica própria. Cito como exemplo, a conhecida
depreciação. Você sabe o que ela significa não é? Não?!!

Então, vamos relembrar...

A depreciação é o registro do desgaste natural sofrido pelo bem, como forma de atualizar
seu valor. Não podemos alterar o valor do bem (de aquisição), mas devemos atualizá-lo. A
depreciação é esta atualização. Funciona como uma “correção” do valor do bem, por isso
mesmo está classificada como uma conta retificadora de ativo, com natureza diferente das
demais contas do ativo (um “corpo estranho”) e por isso mesmo redutora. Aposto que agora
você lembrou...

• O Princípio do Denominador Comum Monetário

Enunciado: “... As demonstrações contábeis, sem prejuízo dos registros detalhados de


natureza qualitativa e física, serão expressas em moeda nacional de poder aquisitivo
da data do último Balanço Patrimonial...”

A elaboração de demonstrações contábeis deverá respeitar a moeda nacional e


obrigatoriamente utilizá-la nas expressões monetárias dos demonstrativos. Ponto. Apenas
isso. Esse é o direcionamento do procedimento, função dos princípios, conforme já falamos
anteriormente.

Explorando um pouco mais esse princípio, podemos chegar à necessária homogeneização da


expressão contábil, como forma de facilitar a leitura para o usuário. Ou seja, para o leigo,
que precisa entender a demonstração sem necessariamente compreender a contabilidade,
será de grande utilidade se todos os elementos patrimoniais (ativos – bens e direitos e
passivos – obrigações) estiverem expressos na moeda nacional, conhecida por todos. Isto é
particularmente interessante para uma empresa exportadora que negocia seus produtos em
várias moedas. Já pensou se os registros fossem feitos nos valores negociados, sem
conversão?? Seria uma imensa confusão de euros, dólares, ienes, etc.
• O Princípio da Realização da Receita

Enunciado: “... A receita é considerada realizada e, portanto, passível de registro


pela Contabilidade, quando produtos ou serviços produzidos ou prestados pela Entidade
ou pessoa física com a anuência destas e mediante pagamento ou compromisso de
pagamento especificado perante a Entidade produtora...”

Aqui, é importantíssimo para nós, sabermos o que significa “realizar receita”. Uma receita
só é realizada quando há a transferência da posse do produto ou serviço entre vendedor e
comprador. Independentemente de haver pagamento ou promessa de pagamento. Ou seja,
não importa se foi uma venda à vista ou a prazo. O que importa é que houve a entrega do
bem ou a prestação do serviço. Se a receita foi realizada, deverá ser registrada.

Hum... Isso me parece familiar... O que será? Você também está com a sensação de que já
viu isso em algum lugar? É claro!!! Sabia que você associaria corretamente. Aí está o nosso
Princípio da Competência! Aqui ele se refere apenas à receita, mas a essência é a mesma.

Aproveitando a oportunidade...

 Lembre-
Lembre-se:

• Receita Realizada Recebida  Venda à vista, com a entrega imediata do bem ou


a prestação do serviço.
• Receita Realizada Não Recebida  Venda a prazo, com a entrega do bem ou a
prestação do serviço.
• Receita Recebida Não Realizada  Adiantamento de Clientes ou Receita
Recebida Antecipadamente. Representa a obrigação da empresa de entregar o bem
ou prestar o serviço, por isso o registro é no Passivo. Como não houve a
transferência do bem ou serviço para o cliente, a receita não pode ser registrada.

• Princípio do Confronto das Despesas com as Receitas e com os Períodos
Contábeis

Enunciado: “Toda despesa diretamente delineável com as receitas reconhecidas em


determinado período, com as mesmas deverá ser confrontada; os consumos ou
sacrifícios de ativos (atuais e futuros), realizados em determinado período e que não
puderam ser associados à receita do período nem às dos períodos futuros, deverão ser
descarregados como despesa do período em que ocorreram...”

Este princípio é uma continuação do anterior. Se antes a referência foi apenas para a
receita, temos agora a referência ao registro das despesas, desde que incorridas. A
orientação é: despesas e receitas de um mesmo período deverão ser confrontadas (a fim de
apurar o resultado) neste mesmo período. Novamente podemos fazer a associação com o
Princípio da Competência: o resultado é apurado (confronto) no período de ocorrência das
receitas realizadas (ou reconhecidas) e das despesas incorridas. Falando nisso...

 Lembre-
Lembre-se:

• Despesa Incorrida e Paga  Despesa cujo pagamento aconteceu no mesmo


período de sua incorrência (acontecimento).
• Despesas Incorrida e Não Paga  Despesas ocorrida, mas cujo pagamento sé
ocorrerá em um período futuro.
• Despesa Paga e Não Incorrida  Despesas pagas antecipadamente. Sua
incorrência pertence a períodos futuros. Não pode ser registrada como despesa e
nem ser lançada no resultado. Este evento gera para a entidade o direito de fazer a
apropriação das despesas nos períodos em elas ocorrerem (futuramente).

Convenções Contábeis (Restrições aos Princípios)

São complementos aos Postulados e aos Princípios, funcionando como delimitares de


conceitos, atribuições e direcionamentos. As convenções são importantes norteadoras no
trato dos diversos problemas contábeis com que nos deparamos no exercício da profissão.
É... a vida do Contador não é nada fácil, não!

Convenções

Restrições aos Princípios, condicionamentos de aplicação

A representação dos Postulados, Princípios e Convenções poderia ser expressa assim...


Como “uma casa”. Uma casa??? Isso mesmo! Da seguinte forma:
Princípios

Representam o núcleo central da profissão. São os delimitadores da postura profissional

Postulados

Representam as premissas fundamentais.

• A Convenção da Objetividade

Enunciado: “Para procedimentos igualmente relevantes, resultantes da aplicação dos


Princípios, preferir-se-ão, em ordem decrescente: a) os que puderem ser comprovados
por documentos e critérios objetivos; b) os que puderem corroborados por consenso de
pessoas qualificadas da profissão, reunidas em comitês de pesquisa ou em entidades
que têm autoridades sobre Princípios Contábeis...”

 É preciso que o Contador saiba que deverá ser registrado apenas o fato
administrativo que puder ser comprovado por documentos ou por consenso de profissionais
habilitados para tal. Na prática, a segunda opção é pouco usual, portanto, atenção
redobrada para a primeira! O registro contábil não deve ser feito sem o amparo de
documentos que o comprovem ou de critérios objetivos. Esta convenção restringe as ações
do Contador porque o faz registrar apenas aquilo for evidente e passível de comprovação.
Temos aqui, também, um importante suporte para o desenvolvimento (e manutenção!) da
ética profissional.

Como pode um profissional acatar como verdade e registrar uma operação que não possui
documentos (nota fiscal, recibo, contratos, etc.)? seria permitido se não houvesse a
restrição da objetividade, uma vez que os Princípios orientam o procedimento, mas não o
delimitam.

• A Convenção da Materialidade

Enunciado: “O contador deverá, sempre, avaliar a influência e materialidade da


informação evidenciada ou negada para o usuário à luz da relação custo-benefício,
levando em conta aspectos internos do sistema contábil...”

O que significa ‘materialidade’? Material é aquilo que você pode ver e tocar. Transformando
isso para a nossa linguagem contábil, significa que o profissional deve avaliar com atenção
cada um dos fatos e registrar somente aqueles que são relevantes, dignos de atenção e
sempre na ocasião certa, sem perder a oportunidade de lançar. O Contador deve ter o bom
senso apurado para que possa conhecer distintamente e decidir o que deve ser
contabilizado.
• A Convenção da Consistência

Enunciado: “A Contabilidade de uma entidade deverá ser mantida de forma tal que os
usuários das demonstrações tenham possibilidade de delinear a tendência da mesma
com o menor grau de dificuldade possível.

Esta convenção também é conhecida como Uniformidade. Uniforme é tudo aquilo que possui
harmonia, direcionamento único. A Contabilidade e as Demonstrações Contábeis têm um
padrão a ser seguido, inclusive normativo (baseado em NBC). Ao divulgá-las é imperativo
que a linguagem esteja o mais próximo possível do usuário. Ou seja, os interessados nela,
devem ter condições de compreendê-la.

Para finalizar, transcrevo um trecho do nosso “Livro-Bíblia”, Manual de Contabilidade das


Sociedades por Ações:

“Devemos conviver com esse conjunto


(Postulados, Princípios e Convenções) e
aplicá-lo da forma mais correta possível,
como conseqüência do melhor de nossos
esforços e sempre lembrando que nossa
responsabilidade, como profissionais e
cidadãos é, antes de mais nada, social”.
(grifo nosso)

Bom, pessoal esse foi o primeiro material do EAD – Ensino a Distância. Virão outros, sempre
com o objetivo de acrescentar ao conteúdo de sala de aula e despertá-los para o
conhecimento contábil. Nós nos encontraremos em sala de aula e vocês poderão tirar as
possíveis dúvidas.

Sempre válido lembrar que o assunto não acabou não! A doutrina contábil é bastante ampla
e rica para pesquisas. Não se esqueçam de estudar sempre a Resolução CFC 750/93, assim
como as Normas Brasileiras de Contabilidade, tanto as Técnicas quanto as Profissionais.

Fonte:

IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARTINS Eliseu, GELBCKE, Ernesto Rubens. Manual de


contabilidade das sociedades por ações: aplicável às demais sociedades. 7 ed – 2.
Reimpr. São Paulo: Atlas, 2007.

Você também pode gostar