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Sobre a crise
e os meios de a vencer
23 MAIO 2010
O fundo europeu
O fundo de 750 mil milhões de euros inclui uma parti- situação de incumprimento que afectaria fortemente os seus
cipação do FMI de um terço, imposta pela Alemanha, próprios bancos (que reforçaram, a partir de 2007, os seus in-
como condição para a sua viabilização. A posição da vestimentos em dívida pública de países periféricos). Assim,
Alemanha teve com objectivo forçar a aceleração dos o empréstimo à Grécia, este novo fundo e a decisão imposta
processos de ajustamento orçamental com medidas ao BCE de comprar dívida pública nos mercados secundários,
adicionais (o pacto PS-PSD em Portugal). cumprem uma função muito importante de salvação da banca
alemã (e francesa).
Além disso, com a criação do Fundo são introduzidas altera- O Plano inclui três verbas. Em primeiro lugar, o Mecanismo
ções importantes na relação entre as instituições europeias de Auxílio Mútuo (60 mil milhões), financiado por emprés-
e os Estados nacionais. A mais importante dessas alterações timos obrigacionistas a contrair pela Comissão Europeia.
é a que estipula que uma maioria dos Ministros das Finanças Criado para países não membros do Euro, é agora estendido
possa alterar os orçamentos aprovados pelos parlamentos aos países da zona euro, mas é duvidoso que tenha alguma
nacionais, e que existe um visto prévio dos projectos de Orça- realidade financeira. Em segundo lugar, uma verba de 440
mento antes de serem discutidos nos parlamentos nacionais. mil milhões, com um veículo estruturado constituído a par-
Para além dessa alteração, a Alemanha está a pressionar os tir de contribuições dos Estados-Membros, proporcionais às
Estados-Membros para consagrarem constitucionalmente li- suas participações no Banco Central Europeu. A contribuição
mites para o Défice e a Dívida Pública (já defendido em Portu- do Estado português é de 1,75% (portanto cerca de 7,7 mil
gal pelo PSD e CDS, e agora pelo ministro Luís Amado). milhões, ou seja quase 5%do PIB). Finalmente, 250 mil mi-
Não se julgue, porém, que as pressões da Alemanha resultam lhões são financiamento do FMI, o que mostra a fragilidade
do seu menor interesse neste plano de intervenção. Pelo con- da resposta europeia e o interesse dos EUA na estabilização
trário, o Estado alemão não tem nenhuma vantagem numa monetária europeia.
social devem ser os pontos fulcrais da Elementos 2. Nunca perder de vista que o
acção económica de uma estratégia al- de resposta política inimigo também está no nosso pró-
ternativa com viabilidade. De facto, a fle- prio país.
do Bloco
xibilização do trabalho, essa “demolição A política baseia-se sempre numa
metódica da relação salarial fordista” co- estratégia e na visão clara da relação
São dois os nossos focos de aten-
mo lhe chama Frederic Lordon, acentua de forças. Por isso, partimos de uma
ção e de resposta, sendo o segundo
a mercadorização do trabalho, ao passo constatação: se é indispensável esta
desproporcionadamente mais impor-
que o contrato a combate. dimensão europeia da recusa do pla-
tante para a agitação e para a mobili-
A segunda é a defesa de políticas no de austeridade e de apresentação
zação.
fiscais autónomas. O aumento das recei- de alternativas consistentes, a força do
tas fiscais é a única resposta possível à Bloco deve estar concentrada no movi-
1. Uma resposta europeia consis-
bola de neve da dívida e, portanto, aos mento de resposta e contestação que
tente contra a nova recessão.
mercados financeiros. E é uma questão determine a relação de forças, a partir
No plano europeu e com o quadro
essencial de democracia económica de uma situação inicial desfavorável,
anteriormente apresentado, insistimos
contra uma das formas mais violentas para todas as soluções que estejam em
nas seguintes propostas:
de acumulação, a via da evasão ou dos disputa.
> Um sistema de emissão de dívida
benefícios fiscais. Desse modo, tornamos claro que o
europeia, de que uma parte pudesse
A terceira é uma estratégia de di- inimigo também está no nosso próprio
ser trocada por 10 ou 15% dos títulos
DOCUMENTO DA COMISSÃO POLÍTICA DO BLOCO DE ESQUERDA [7]
país, que não transigimos com alianças corta a relação umbilical entre os ban- multiplicação de forças. Nesse contex-
comprometidas que desarticulam a cos e especulação imobiliária, aumenta to, o Bloco escolherá no seu tempo
capacidade de combate dos trabalha- o valor real do salário e das pensões, re- próprio as formas de confronto com o
dores à espera de uma burguesia na- constrói a relação de vida nas cidades, governo, seja através de uma moção de
cional que, de facto, é parte integran- cria emprego. censura ou da exigência de uma mo-
te da especulação financeira contra a 3. Ainda para limitar o endivida- ção de confiança, e da apresentação de
economia nacional e portanto contra o mento e relançar a poupança interna, propostas alternativas que confrontem
salário e o emprego. Respondemos por o banco público devia enfrentar as os partidos, o PS e a sua aliança com o
isso ao PEC 1 e 2 – e ao PEC 3 que vem respostas especulativas dos bancos co- PSD e mesmo com o CDS, com as pro-
a caminho – com uma política socialis- merciais: este é o momento de a CGD messas eleitorais e com a crise social
ta que procura influenciar a massa dos desferir um golpe duro na banca co- que a sua governação está a provocar.
trabalhadores e a opinião pública. mercial, ganhando partes de mercado
com juros não especulativos. Em toda esta intervenção, sabe-
VENCER A IDEOLOGIA 4. Ao mesmo tempo, o Estado de- mos sempre distinguir entre as bata-
DO “SACRIFÍCIO” via atacar a banca comercial com o lhas de trincheira e as batalhas de mo-
Em conclusão, sublinhamos três estímulo à poupança, promovendo vimento. De trincheira são os debates
orientações fundamentais. um empréstimo interno com o relan- acerca da protecção social aos pobres,
A primeira é disputar a opinião çamento dos certificados de aforro, em aos desempregados, e a qualificação
pública, para evitar o isolamento da condições melhores do que os depó- do investimento público: respondemos
luta dos trabalhadores. O que está em sitos a prazo propostos pelos bancos com propostas, com informação, com
causa é vencer a estratégia do medo, privados. debate, enfrentamos os preconceitos
que levaria à aceitação de todos os “sa- 5. São necessárias medidas em re- e os avanços das ideologias reaccioná-
crifícios” em nome do risco internacio- lação aos mercados financeiros, como rias. Mas batalhas de movimento e de
nal – essa é a propaganda do PS e do o controlo de movimentos internacio- contra-ataque é a informação acerca
PSD. Se esta ideologia do sacrifício ven- nais de capitais. das desigualdade, dos bónus, da acu-
cer, o movimento dos trabalhadores é 6. Retomamos a proposta do Im- mulação de fortunas, da exploração do
derrotado neste confronto. posto sobre as Grandes Fortunas, para trabalhador, da especulação financeira,
Assim, o Bloco reforça a sua agita- financiar a segurança social. da forma como os bancos enriquecem
ção sobre os prémios milionários, os 7. Finalmente, o investimento pú- com a especulação contra a economia
bónus de favor, a acumulação da bur- blico deve ser defendido e qualificado, portuguesa. Em todos esses terrenos,
guesia ascendente e dos boys, porque com prioridades claras. O Bloco propõe queremos criar agenda política, de-
é a melhor forma de combater a ide- a prioridade da reabilitação urbana, terminar o debate nacional, tomar a
ologia do sacrifício. Damos tudo por com os seus efeitos na redução do en- ofensiva, propor medidas que ganhem
tudo na denúncia das transferências dividamento, na criação de emprego apoio social, fazer maiorias no país, iso-
de rendimentos para a especulação e na redução de custos da habitação. lar os partidos de direita e o governo,
e para a ganância e fazêmo-lo com Ao mesmo tempo, temos recusado e enfraquecer as medidas de austerida-
casos e nomes. Os militantes devem recusamos qualquer recuo nos investi- de, fazer crescer a força da esquerda.
estar conscientes de que o aprofunda- mentos previstos que criem emprego e Não descuramos por isso, também,
mento dos argumentos, dos exemplos sublinhamos que a ofensiva ideológica a resposta ao pilar da “cooperação es-
e dos números do saque à economia contra o investimento público é uma tratégica” que é o Presidente: a nossa
portuguesa, são o melhor serviço que das frentes principais dos ataques da apresentação do projecto das uniões
a agitação popular pode fazer contra a direita. de facto, vetado por Cavaco Silva e que
austeridade. A terceira orientação insiste na deve agora ser imposto pelo parlamen-
A segunda orientação é a apre- acumulação de forças para a luta ge- to, sublinha como as correntes ideoló-
sentação de medidas concretas e neralizada. As dificuldades das últimas gicas mais reaccionárias desprezam os
consistentes, como as “15 medidas greves são notórias, mas a resposta po- direitos das pessoas e a necessidade de
alternativas ao PEC”, ou as nossas pro- lítica da manifestação de 29 de Maio uma política de democracia que inclui
postas orçamentais. Assim, insistiremos pode e deve criar um novo contexto todos os direitos. O debate presiden-
nas seguintes propostas: para o confronto com os pacotes de cial deve sublinhar essas diferenças e a
1. Pacote financeiro: taxa efectiva austeridade. A unificação da luta com sua força depende da apresentação de
de 25% de IRC para a banca, imposto a perspectiva de uma greve geral, a ser uma visão alternativa ao situacionismo
de 75% sobre bónus especiais; taxação convocada pelos sindicatos no tempo económico, com propostas contra a di-
das transferências para a Madeira e ou- da mobilização social mais forte, é por tadura dos mercados financeiros e da
tros offshores. isso o caminho que deve ser seguido. austeridade e em defesa do trabalho,
2. Medidas para limitar o endivida- Uma greve forte implica um movimen- do salário, do emprego e dos serviços
mento: o plano de reabilitação urbana to de base, a criação de confiança, a públicos.