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M úsica

Foto: Guiliano

Banda.
Já montou a sua?
Giuliano Martins

O avanço tecnológico e a praticidade da


internet propiciaram uma nova maneira de se
produzir e divulgar música. E ela só se expande.

 Revista Inverso
Fotos: Guiliano

É unânime. Não há banda entrevistada


que, ao ser questionada sobre os bene-
fícios da internet e do avanço tecnológi-
co, a resposta não saia como um sonoro coro de
contentes.
blico. Não é para menos que recentemente em
São Paulo, Mallu Magalhães, aos 15 anos, dis-
ponibilizou algumas gravações caseiras de suas
composições e virou a sensação da música com
seu folk ingênuo, tendo mais de dois milhões
Para os artistas a tão famosa crise no meio acessos de seu perfil.
musical é apenas da indústria fonográfica e não Para o cantor e guitarrista Josiel Rus-
de produção. Pela web pipocam inúmeros sites mont, da banda bauruense Estereoterapia, a
e ferramentas digitais voltadas para a divulga- primazia de divulgação pela rede é extraordiná-
ção de artistas e sua música. É através de pági- ria. “Certamente faz com que possamos levar o
nas de relacionamentos, de blogs, do You Tube, nosso trabalho a qualquer lugar do mundo, ra-
portais e, principalmente, pelo My Space que pidamente, e podemos dizer, quase sem custo”,
artistas desconhecidos, e outros já famosos, admite. Ele viu no avanço tecnológico a possi-
passaram a fazer a conexão direta com o pú- bilidade de ampliar seu trabalho. O músico deci-

Revista Inverso 
diu montar um estúdio para ensaiar e gravar as empresas divulgam seu nome em iniciativas
com sua banda e, a partir daí, estendeu essa op- politicamente corretas, recebendo descontos
ção, abrindo o estúdio para outras bandas terem através das leis de incentivos culturais, e os mú-
a mesma oportunidade, a um valor mais justo sicos recebem por seu trabalho divulgado.
com o bolso do músico. “Quem é músico sabe a A Estereoterapia se beneficiou disso. Além
dificuldade que é fazer o seu som. Desde ter um de disponibilizar todo seu material anterior-
instrumento, passando pelo processo de grava- mente produzido, lançou, este ano, seu primei-
ção, até a divulgação do seu trabalho”, avalia. O ro single virtual através da plataforma da Trama.
resultado disso são todos os horários do estú- Para Rusmont, principal compositor da banda,
dio fechados, e muita experiência adquirida. a iniciativa serviu tanto financeiramente, quan-
to para a promoção do novo material. “Fizemos
My Space e as novas gravadoras apenas uma pequena tiragem para poder fazer
divulgação nos shows”, observa o músico que
Outro aspecto da divulgação pela inter- acredita no poder dos novos caminhos traçados
net não está apenas na possibilidade de expo- pela tecnologia. “Além de fazer interagir bandas
sição global. Toda a estrutura de promoção de de vários locais do país, proporcionando até
um artista, que geralmente estava associada as um intercâmbio entre elas, divulga e expõe seu
grandes gravadoras, está nas mãos dos próprios trabalho”. A mesma observação é completada
músicos, ou de pequenos selos musicais que se pelo baterista da banda Filha Solteira, Eduardo
especializaram neste tipo de suporte as bandas. Dubowski referindo-se ao My Space: “É livre.
(veja na página 18 matéria sobre selo especializado Tanto pra quem cria, como para quem baixa. A
na divulgação de bandas). facilidade de alguém te ouvir, ver, saber onde
Atualmente, essa badalação será seu próximo show, ler sobre
está quase sempre associada ao My A atual cena você e poder criar um vínculo, em
Space, site de relacionamentos es- qualquer lugar do mundo. Imagina
pecializado em divulgação musical, musical está isso há dez anos, teria que ter um
tendo adeptos em todo o mundo, e
que no Brasil recebeu uma versão em associada ao álbum, cartaz, release, passar seu
telefone”, avalia. Eis o novo cami-
português, devido ao grande núme-
ro de cadastrados. Raul Lorenzeti,
My Space nho da música, aproximar o artista
de seu público através de apenas
guitarrista da banda Filha Solteira, alguns cliques.
vê esse “espaço” como a nova grava-
dora dos músicos: “É legal pela praticidade. A
gente ainda não tinha o álbum prensado, então,
por enquanto, a ‘nossa cara’ tanto pra merca-
do, festival e público é o site”. O músico crê nas
utilidades fornecidas, pois há ferramentas para
postagem de vídeos, fotos, release, bem como
o blog, e contador de visitas. “Você fica meio
maravilhado e assustado quando vê que já escu-
taram sua música mais de 700 vezes, ou que há
pessoas na Suécia ouvindo o nosso som”, admi-
te Lorenzeti.
Algumas gravadoras, com visão mais aber-
ta à produção musical, encontraram um meio
termo entre o lucro e o investimento em artis-
tas dentro do mercado virtual. A gravadora Tra-
ma apostou na internet. Seu braço digital en-
cabeçou uma idéia interessante ao possibilitar
que qualquer banda criasse um perfil no site e
disponibilizassem material para download. Os
artistas são remunerados – conforme o número
de músicas baixadas – por empresas associadas
ao portal. Com isso, todos ganham: a gravadora
pode redirecionar seu capital de investimento,

 Revista Inverso
Saindo da garagem...
Alberto Filho

SOFTWARES AUXILIAM NA PRODUÇÃO DE MÚSICA


PELO COMPUTADOR

T oda banda já sonhou em ter seu próprio


CD, mas os altos custos na produção
em gravadoras do ramo, muitas vezes
impedem que este desejo seja concretizado.
Mas, hoje já é possível compor e editar suas
Pro Tools M Powered 7 - é uma ferramenta
multi-tarefa para quem quer fazer música no
PC: editar, mixar e gravar são as possibilida-
des oferecidas pelo programa. Com o Pro To-
ols é possível gravar em até 32 canais de áudio
produções em áudio digital, em sua própria simultaneamente em qualidade digital de 16
casa. Com o desenvolvimento da tecnologia, ou 24 bits. Este programa é utilizado em estú-
inclusive a musical, está cada vez mais simples dios profissinais. É possível baixar a versão 5
fazer a gravação de um CD “caseiro”, sem a ne- do programa gratuitamente na internet.
cessidade de gastar uma fortuna.
Na rede existem muitos programas para Sound Forge 9.0 - outro programa bastante
fazer som no PC, entre seqüenciadores, edi- usado para edição musical no PC. A edição,
tores de áudio ou instrumentos virtuais. Para gravação e processamento podem ser feitos
montar um estúdio caseiro basta um compu- em múltiplos canais. Outras possibilidades são
tador potente, uma placa de áudio especial e masterização, recuperação de vinil, uso em rá-
bons microfones. Um PC com um processador dios, finalização surround, uso multicanal am-
de 1,5 GHz, com núcleo duplo e pelo menos 2 plo e pequenas edições em estéreo/surround
GB de memória RAM, já é o suficiente para co- até 7.1. Também é possível extrair áudios de
meçar a gravação. CDs.
Com o equipamento em ordem, resta ape-
nas escolher um dos chamados softwares multi- Adobe Audition – permite a criação de música,
pista, que permitem registrar e editar cada um gravação e mixagem de um projeto, produzir
dos instrumentos separadamente. Há uma vas- um spot de rádio, apagar o áudio de um filme
ta gama de opções. Confira abaixo alguns dos ou criar sons para vídeo-games. Possui edição
principais softwares: multitrack e redução de ruído.

Cubase 4.1 - um dos softwares musicais mais


famosos, o Cubase 4.1 tem um editor para tor-
nar mais fácil a manipulação dos arquivos de
áudio digital. O programa também importa/
exporta arquivos MusicXML para partituras e
conta com quatro instrumentos com mais de
mil sons.

Audacity - software gratuito, disponível no site


audacity.sour.ceforge.net. O programa funcio-
na nos sistemas operacionais Windows, Linux
e Mac, é um ótimo programa para gravações
multipista simples.

Sonar - permite gravar, editar, compilar e nave-


gar por todo o trabalho relacionado à gravação
profissional. Ainda pode sobrepor vozes, criar
partituras e projetar sons com qualidade para
Rusmont utilizando o Pro Tools em seu estúdio
filmes, TV, vídeo, comerciais e jogos.
Foto: Guiliano

Revista Inverso 
Foto: Divulgação
Da Cana ao Açúcar
Gleice Bernardini
Jaú é muito conhecida por sua indústria
Você já reparou como cada vez mais ban- de calçados e de etanol. Com larga produção de
das independentes gravam cd’s? E que esses cd’s cana-de-açúcar, fornece o açúcar e o álcool para
já não são vendidos apenas nas “barraquinhas” o estado desde o tempo do Império. Seus monu-
dos shows? É isso mesmo. Hoje em dia, está mentos e prédios históricos que cativam os turis-
cada vez mais fácil produzir, divulgar tas e trazem investimento para cidade
e vender cd’s com selos independentes. começam a dar lugar a uma nova fonte
Você vai a uma loja ou visita um site co- de renda: a música.
nhecido e lá está o cd da banda que você Existem centenas de bandas in-
viu ontem na balada. dependentes na região, todas buscam
A produção independente su- sair do chamado circuito “alternati-
perou a fase “alternativa” – divulgação vo” e encontrar o seu “lugar ao sol”.
boca a boca e venda de mão em mão - As bandas de “garagem” agradecem
ambicionando fatias cada vez maiores e o surgimento do selo independente
Jaú
artisticamente mais importantes na pro- GATO CARTEIRO - Histórias elé- Engenho, pois somente através deste,
dução, divulgação e comercialização de tricas de um cuco maluco, segundo podem mostrar o seu trabalho.
CDs e DVDs. É esse o papel que o Selo
CD Sentindo a necessidade de or-
Musical Engenho faz. ganizar e profissionalizar o cenário da
música de Jaú e região, Alexandre Ometto, Beti-
nho Padrenosso e Dany Kamada, criaram o Selo
Engenho. O primeiro trabalho foi o lançamento
 Revista Inverso
da coletânea Subindo a A transforma-
Ladeira, em outubro de ção da cana em açúcar
2004 que vendeu 1.700 foi rápida. “ Era como
cópias em 6 meses, o que uma cooperativa en-
corresponde aproximada- tre bandas, onde se
mente a 1,4% da popula- dividiam experiências,
ção da cidade. contatos e também as
Assim como a cana contas a pagar”, brinca
passa pelo engenho para Dany Kamada, diretor
Lençois Paulista virar açúcar, as bandas uti- administrativo do selo. Bauru
KRUSTIN - Fique pra vencer, se- MOVEOVER - Ir Além, primeiro
gundo CD lizam o selo para mostrar O sucesso foi tanto que CD
seu trabalho. Fazendo o o selo já vendeu 16 mil
papel de pai da banda, a produção da Engenho cópias entre coletâneas e os álbuns das bandas Os
realiza atividades que vão desde o acompanha- Patrões (Jaú), Move Over (Bauru), Mandrake
mento da gravação – parceria com o estúdio (Jaú), Krustin (Lençóis Paulista) e Jet Set (Cam-
Faro Fino - a produção e o encaminhamento do pinas), além dos 4 mil singles do Vambora, Gato
cd para a prensagem até o trabalho de pós-lan- Carteiro e Overjoy (todas de Jaú).
çamento, com assessoria de imprensa e distribui- O que o selo quer é chamar a atenção do
ção do trabalho no mercado, ou seja, o selo plan- público para o interior, saindo um pouco do eixo
ta, cuida, corta, moí e faz o açúcar, ou melhor o Rio – São Paulo. “Precisamos mudar isso, fazer
cd. Após esse processo os cd’s com selo Engenho com que as pessoas olhem para o Interior. Talen-
são divulgados e distribuídos pela Tratore, que se to, as bandas têm de sobra. Precisamos fortalecer
auto intitula - a distribuidora dos independentes. nossa região, criar um circuito entre as cidades
O engenho começou daqui e virar referência
com uma idéia pequena, quando o assunto for
mas que não quer se res- música”, defende Ka-
tringir apenas ao interior. mada.
“No início as bandas aju- Fora o selo, o En-
daram o Engenho a nas- genho produz progra-
cer. Continuam ajudando mas de rádio, uma série
o Engenho a se fortalecer. de shows de bandas
Sabem que quanto mais independentes, intitu-
Jaú
Campinas forte estiver o selo, melho- lado Projeto Garagem, OS PATRÕES - Cobaia, segundo
JET SET - Ultravioleta, segundo
CD res serão os frutos. O ob- o Portal Engenho - que CD
jetivo inicial era organizar traz informações sobre
o nosso pedaço e colocá-lo num circuito. A idéia os serviços do selo musical e da Engenho Produ-
é expandir, dando passos do tamanho de nossas ções - e a produtora Engenho - responsável pelo
pernas, sem cometer loucuras” diz Alexandre agendamento dos shows, pela organização de
Ometto , um dos fundadores do selo e que toca eventos, a facilitação de intercâmbio e a produ-
na Mandrake, uma das bandas do Engenho. ção do Festival Subindo a Ladeira. Eles contam
Já sobre o profissionalismo e a produção ainda com a parceira dos Estúdios Faro Fino e
Ana Alice Gallo, jornalista e baterista da banda com o trabalho da Tratore que divulga os cd’s.
Milhouse explica que “Quando os cd’s do Enge- * Os cd’s são de bandas do selo Engenho.
nho caíram na minha mão
pela primeira vez, foi im-
possível resistir à tentação
de ouvi-los, já que a apre-
sentação era impecável. A Links Relacionados:
sonoridade, idem: você
www.engenho.art.br
pode não gostar do som, www.tratore.com.br
mas a produção não deve http://credencialtosca.blogspot.com
Jaú em nada. E os caras ainda www.tropicalnet.fm.br
MANDRAKE - Mandrake, primeiro contam com um profis-
www.radiopatrulha.com.br
CD
sionalismo administrati-
vo que você duvida que seja verdade”. Fotos: Divulgação

Revista Inverso 
Estréia de suingue Lados Distintos
Filha Solteira Estereoterapia
Filha Solteira - Lado A, Lado B,
Lado C - 2008
2008

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

(Download gratuito)
(Download gratuito)
http://www.tramavir-
http://www.myspace.
tual.com.br/estereote-
com/filhasolteira
rapia
Giuliano Martins Giuliano Martins

Balanço. Este é termo que serviria para As composições do single Lado A, Lado
resumir o trabalho de estréia da banda Filha B, Lado C da banda Estereoterapia têm balanço
Solteira. As cinco faixas do álbum homôni- radiofônico, refrões chiclete e melodia assoviá-
mo contêm suingue brasileiro, numa mistura vel, e é justamente nestes elementos que o perfil
de ritmos que vão de funk ao samba-rock, do sonoro se refina, e não cai na mesmice. Pois, es-
baião ao rock, sendo que o importante é o re- tas características que geralmente afetam a qua-
sultado dançante e não o gênero a que isso pos- lidade de uma composição, aqui só adicionam,
sa ser creditado. devido à originalidade das composições serem
As influências são distintas, indo de tão ímpares. Sua beleza se manifesta na singe-
Mundo Livre S/A a Metallica, e talvez por isso leza da melodia e nos detalhes da estrutura dos
mesmo, o resultado é tão instigante. As letras arranjos, um pop-rock eficiente. Ao mesmo
também não deixam a festa de lado, e falam de tempo, as três composições são distintas amos-
leveza, bebida, folia e alegria. É produto para tras da capacidade da banda de não se prender a
contagiar o ambiente. A música ‘Mais uma pra um formato musical de audição fácil, ou gosto
dançar’ já é hit no circuito universitário. duvidoso. É para ouvidos apurados.

Chega de Saudade da Bossa


Giuliano Martins

Jackson do Pandeiro tem sua valorização diminuída na música brasileira perante os artistas da bossa
nova. Sendo seu nome uma unificação entre o estrangeiro e nacional, em sua originalidade mais fiel, sua
música poderia muito bem atender aos conceitos bossa novistas. Mas, não é este o caso. Pois, o próprio
entoava que “só ponho bebop no meu samba quando o Tio Sam pegar no tamborim, quando ele pegar no
pandeiro e na zabumba, quando ele aprender que o samba não é rumba”.
Na bossa nova, os artistas não esperaram que o Tio Sam pegasse no tamborim. Eles acabaram botan-
do o bebop no samba, fazendo o país, e o mundo, engolirem um pseudo-jazz, disfarçado de MPB.
A letra é da música ‘Chiclete com Banana’, de autoria de Gordurinha e Almira Castilho, que somada
a musicalidade de Jackson, demonstra como a bossa nova não soube valorizar as estruturas harmônicas
e melódicas da música brasileira. Construíram sua base sobre a égide do jazz, gênero americano. O con-
ceito de Jackson foi seguido por artistas no país, que conseguiram grande repercussão dentro e fora das
terras tupiniquins: Alceu Valença pegou o forró de Luiz Gonzaga e misturou com os shorts das meninas,
e atiçou Oropa, França e Bahia; Lenine ao consumir e mastigar Aipim junto com Coca-Cola incitou toda
a Europa com seu som caracteristicamente brasileiro e contemporâneo; e Chico Science que botou dis-
cman no caranguejo em meio ao caos da lama, fez as regiões ao sul do país reverenciar a cultura do man-
gue. A música desses artistas foi digerida, e resultou em uma nova identidade musical da era globalizada,
onde a fusão do original com o importado não é apenas mais um produto corriqueiro dentro do cardápio
exótico do consumo mundial, assim como Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro botaram o coco para ra-
lar, levando para o país inteiro um som genuinamente brasileiro.
Enquanto houver o valor supra-estimado da bossa nova como característica da genuína música bra-
sileira, precisaremos de mais 50 anos para valorizar o que é de raiz e o que pode até ter influências de
outras culturas, mas desde que seja utilizado para criar algo caracteristicamente brasileiro.
 Revista Inverso

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