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Rev. Sociol. USP, S. Paulo 4(1-2): 169-182, 1992. REFLEXOES SOBRE AS CONDICOES SOCIAIS DE PRODUGAO DA SOCIOLOGIA DA EDUCAGAO: Primeiras Aproximagoes * Luiz Antonio Cunha** RESUMO: A despeito do notivel desenvolvimento da pesquisa universitéria no Brasil dos anos recentes, a educagdo € muito pouco valorizada como objeto de pesquisa ¢ de especializagao temiética pelos socidlogos brasileiros. A situagao jé foi diferente, tendo sido a Sociologia da Educagao campo fecundo de produgio de conhecimento nos anos 1950 e 60. O artigo procura por o problema dessa desvalorizagio, de forma a tentar explicé-la a partir das condigdes sociais de produgio imediatamente universitirias, ligadas & organizacao interna do ensino ¢ da pesquisa, a “nova” divisio social do trabalho académico resultante da Reforma Universitaria de 1968 patrocinada pelo regime militar, que criou as Faculdades de Educago. No decorrer da explanago, o autor enfatiza, como problema correlato, o diletantismo docente. UNITERMOS: educaco, Sociologia da Educago, Universidade, reforma universitaria, pesquisa académica, diletantismo docente. * Texto apresentado no Seminario de Estudos sobre Sociologia da Educagao, em homenagem a Profa. Dra, Aparecida Joly Gouveia, promovido pelos departamentos de Sociologia (FFLCH) ¢ de Metodologia do Ensinoe Educagio Comparada (Faculdade de Educagao), da Universidade de Sto Paulo,epelo Departamento de Metodologia do Ensino (Faculdade de Educacdo) da Universidade Estadual de Campinas, realizado na USP, em 21/3/91. ** Sociélogo, professor da Faculdade de Educagdo da Universidade Federal Fluminense. 169 CUNHA, Luiz Antonio, Reflexdes sobre as condigdes sociais de produgao da sociologia da educagio: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. Para essas primeiras aproximagGes ao tema, tomei como materiais as reflexdes que Ja havia feito sobre a educagao brasileira, especialmente sobre a universidade. E avancei © quanto pude para tentar compreender porque a educagiio ¢ tao pouco valorizada como objeto pelos socidlogos brasileiros. Como se pode explicar que um problema tao grave como a escolarizago da maioria da populagao, que ainda hoje, a menos de dez anos do fim do século, garante votos para demagogos e da esperanga para reformadores sociais de tantas tendéncias, no tenha sido erigido a primeira prioridade de pesquisa? Refletir sobre esse tema no inicio dos anos 90 é tarefa dificil de se fazer sem uma boa dose de saudade. Como nao reconhecer que jf se fez mais Sociologia da Educagio do que hoje, a despeito do enorme desenvolvimento da pesquisa universitaria no Brasil, sobre os mais diversos temas? Apesar de nao ter vivido esse tempo, lamento nao termos hoje a eficdcia da inspiragdo de Anisio Teixeira no Instituto Nacional de Estudos Pedagogicos-INEP que, através do Centro Brasileiro ¢ dos Centros Regionais de Pesquisas Educacionais resultou numa importante produgao no campo da Sociologia da Educagao nos anos 50 ecomego dos 60. Que pena nao termos hoje nada que ocupe o lugar da revista Educagiio e Sociais, editada pelo CBPE, que teve publicados 21 niimeros, de margo de 1956 adezembro de 1962. Essa rede de centros de pesquisa ¢ essa revista delimitavam bem um campo de produgao da Sociologia da Educagio, ainda que incipiente e desigual. Tudo isso foi demolido pelos governos militares, em tarefa facilitada pela deterioragdo interna dos Orgios oficiais de educagdo, acionada pela politica expressa na LDB. O INEP foi trans formado em uma agéncia de intermediagao de recursos, sendo os centros desativados, tanto o brasileiro (no Rio de Janeiro) quanto os regionais (em Recife, Belo Horizonte, Sio Paulo e Rio Grande do Sul). Como a reforma universitaria de 1968 tinha como alvo principal a criagdo de uma universidade onde o ensino ¢ a pesquisa estivessem indissociados, a expectativa era a de quea pesquisa desenvolvida na rede do INEP ressurgisse nas universidades, e atécom mais forga. No entanto, nao foi isso 0 que aconteceu, por razdes que advieram das condigées politicas da implantacao da reforma universitaria: de suas diretrizes e de caracteristicas internas ao proprio campo académico. As condigdes politicas de implantagao da reforma ndo favoreceram a Sociologia da Educagao. Tanto os socidlogos estiveram por muito anos sob generalizada suspeita quanto 0 exame mais critico da educagdo esbarrava com alguma freqiiéncia nos propésitos dos administradores, que pretendiam escamotear a curiosidade alheia, especialmente em se tratando de programas financiados ou assessorados pela USAID. Eu proprio vivi uma 170 ‘CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobreas condigdes sociais de produgao da sociologiada educago: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, (1-2): 169-182, 1992, situagdo em que pesquisa com resultados possivelmente desfavoraveis para os interesses imediatos de uma instituigdo de educagio de adultos no Nordeste, em 1966/67, foi alvo de tentativa de dissimulagio mediante acusacao dos entrevistadores (a maioria estudantes de Ciéncias Sociais) como “comunistas”, & época mais do que mera classificagao po! ideolégica, uma condenagio antecipada, A orientagao da reforma universitaria também nao foi favoravel para com a produgiio académica da Sociologia da Educagiio. Parece-me que a fragmentagio das faculdades de Filosofia, Ciéncias ¢ Letras foi um elemento muito danoso para a produgao da disciplina. Para explicar meu ponto de vista preciso fazer uma digressio. Dois pontos definiam o principio estrutural da universidade projetada pela reforma: o regime departamental e a faculdade de educagiio. Ademais de objetivos econémicos que nao serio analisados aqui, a substituigdo do regime de catedras pelo regime departamental foi saudada como a criagdo de condigdes organizacionais para que auniversidade se libertasse da mediocridade técnico-cientifica edo clientelismo académico. No entanto, 0 que se viu foi que o regime departamental permitiu que uma e outro permanecessem vivos ¢ até crescessem com as proprias universidades. E especialmente relevantearesisténcia que departamentos opuseram institucionalizagao da pés-graduagao, ‘© que levou ao artificio de se organizarem programas de ensino e pesquisa supra- departamentais, assim como de centros ou nicleos a parte, como forma de contornar os efeitos frenadores que a mediocridade técnico-cientifica ¢ o clientelismo académico interpunham a pesquisa. Jé a faculdade (centro ou departamento, conforme 0 caso) de educagao, resultou da induzida fragmentagao das faculdades de filosofia, ciéncias ¢ letras das universidades: nesse sentido, 0 decreto 53/66, que abriu caminho para a reforma nas universidades federais, determinava que existisse uma unidade especializada na formagio de professores para o ensino de 2” grau e de especialistas em educacao. A segregagio institucional da segao de Pedagogia da FFCL, por muitos vista como uma valorizagao, resultou, a meu ver, em perda dos efeitos positivos advindos na interagao com outras segdes (agora faculdades, escolas e institutos), em especial de Filosofia, de Historia, de Cincias Sociais, de Psicologia, de Comunicago, de Letras. Nao foram poucas as faculdades de Educagao que reforgaram essa segregagao carregando consigo (ou criando) disciplinas préprias para o ensino das demais ciéncias sociais ¢ humanas (Filosofia, Historia, Psicologia, Sociologia, Economia, seguidas ou nao do qualificativo “da educagao”) e até da Biologia ¢ da Matematica aplicada (estatistica) para comporem seus curriculos. Algumas chegaram a criar departamentos de Ciéncias Sociais aplicadas a educagao, que ofereciam, até mesmo, Introdugao a Sociologia como disciplina obrigatéria para os alunos do curso de Pedagogia. Isso levou ao isolamento de professores e estudantes im CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobre as condigdes sociais de produgao da sociologia da educagao: primeiras aproximagées. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. por uma espécie de auto-suficiéncia académica que determinou, ao lado de outros fatores, anao melhoria ouo rebaixamento da qualidade do ensino e da pesquisa na area educacional. Em conseqiiéncia, pode-se constatar uma pritica reativa de outras areas (faculdades, escolas ¢ institutos) no sentido de desenvolverem suas proprias assessorias ¢ programas de ensino e de pesquisa em educagao, até mesmo a nivel pés-graduado, sem articulagaio com os da unidade formalmente destinada a promové-los. As dificuldades trazidas aos cursos de licenciatura pelo distanciamento académico entre a faculdade (centro) de educagio e os institutos e faculdades de contetido especifico tém levado 4 proposta equivocada de que as universidades brasileiras criem sua propria versio dos teachers’ colleges, Esta era, alids, a idéia basica que orientou a concepgio da primeira faculdade de educagao, na Universidade de Brasilia. Se executada, teriamos uma radical mudanga de orientagdo das licenciaturas. Hoje (como desde os anos 30), os licenciandos e bacharelandos nas ciéncias ¢ nas letras estudam juntos, ingressando nas faculdades e nos institutos voltados para 0 cultivo de campos especificos. Os licenciandos vio a faculdade (centro) de educagao buscar as disciplinas didatico-pedagdgicas para completarem seu curriculo. Nomodelo norte-americano, os interessados em graduar-se em Fisica, Quimica, Matematica, Histéria, Ciéncias Sociais, Psicologia, Letras, Geografia, ctc., ingressam nas unidades respectivas. Ja os candidatos ao magistério procuram as unidades especializadas em educagdo, e recorrem aquelas outras apenas para as disciplinas de conteudo visadas. Esse modelo, retomado para discussao em certas faculdades (centros) de educago, numa perspectiva hegeménica, procura justificar-se com argumentos que mostram 0 pequeno envolvimento dos licenciandos com os estudos didatico-pedagdgicos, ao lado da preocupagiio das faculdades e dos institutos especializados nos contetidos especificos em formarem apenas pesquisadores ¢ criticos, néio professores propriamente. Nao creio que seja uma idéia de mau gosto identificar as faculdades privadas, que produzem licenciados, em geral de baixo nivel, com 0 modelo do teachers’ college. Bastaria examinar o que se passa nessas instituigdes para que o modelo fosse rejeitado para as condicées brasileiras. ‘No meu entender, aquela proposta hegeménica da Pedagogia estd assentada sobre um equivoco basico. Se é verdade que os licenciandos demonstram pouco interesse pelos estudos didatico-pedagdgicos, por que supor que eles teriam maior interesse se aumentasse a dose daquilo que rejeitam? Sera que o que se quer é justamente evitar os estudantes mais questionadores, que refutam, ainda que anarquicamente, o baixo nivel do ensino que nossas faculdades (centros) de educag’o oferecem? Nao é raro encontrarmos nelas professores que nao se contentam em tera escola de 1° de 2° graus(e até a pré-escola ea creche) como 172 CUNHA, Luiz Antonio, Reflexdes sobreas condigdes sociais de produgao da sociologia da educagao: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. objeto de seu trabalho, mas se identificam tanto com ele que reproduzem nas universidades 0 ambiente ¢ até o trato com os estudantes como se eles fossem criangas pequenas. E preciso chamar a atengiio para os resultados previsiveis dessa reorientagao, se sucedida, Pode-se afirmar com seguranga que os mecanismos de auto-selegdo negativa operariam com mais forca ainda do que hoje, ou seja, os candidatos aos exames vestibulares que se julgarem menos preparados para a disputa é quese inscreveriam paraas licenciaturas oferecidas pela faculdade (centro) de educagao, adequando sua relativa auto-desvalorizagao com a objetiva desvalorizagao econémica e simbélica do magistério enquanto profissao. Os que se julgarem mais preparados, tentariam as escolas, os institutos ou as faculdades de contetido especifico, visando 0 bacharelado, Juntando a auto-selegdo negativa com a redugao dos créditos de contetido, é possivel prever que a deterioragao da qualidade do corpo docente do ensino de 1* e 2° graus ocorreria a uma velocidade ainda maior do que a das ultimas décadas. Ora, o ensino basico ja sofreu muito, em nosso pais, com a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educagao Nacional (1961), que abriu caminho para o controle privado daescola publica. Sofreu muito, também coma lei 5.692/71 escusdesdobramentos, por forga dos equivocos do curriculo integrado, da profissionalizagio universal ¢ compuls6ria, edo esquema comportamentado de formagaio dos profissionais da educagio. Uma proposta equivocada como essa de separar a licenciatura do bacharelado agravaria ainda mais situagao do ensino basico, justamente naquilo que a universidade tem especial responsabilidade para com ele: a formagio de professores. No que diz respeito a antiga segdo de Pedagogia, a institucionalizacao da pos- graduacdo compensou, até certo ponto, os efeitos negativos da reforma universitiria da segunda metade dos anos 60, no que diz respeito a fragmentagao das FFCL: impediu que fosse total o isolamento dessa segdo diante das demais, agora separadas em diferentes unidades. Contribuiu, assim, para que a Pedagogia/Educagio, agora faculdade (centro ou departamento) mantivesse algum contacto com a Sociologia, a Historia, a Ciéncia Politica, aPsicologia ea Economia, pelos professores que incorporou, evitando o forte componente autérquico (para nao dizer particularista) que caracteriza os cursos de Pedagogia e da parte didatico-pedagdgica das licenciaturas. No entanto, o mestrado surgiu sob o signo da improvisagio. Definido 0 objetivo de se criar um programa, passava-se a buscar os professores que tivessem titulago ou notério saber. Depois de escolhido corpo docente, definiam-se as disciplinas que cada um dos integrantes poderia lecionar, compondo-se 0 curriculo. Os professores poderiam pertencera dreas diferentes da universidade/institui¢ao, ja que sempre é possivel justificar ‘como “educacionais” quaisquer temas tedricos e/ou priticos, em sentido amplo: do teatro 173, CUNHA, Luiz Antonio, Reflexdessobre as condigdes sociais de produgio da sociologia da educagao: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. 4 medicina, da administrago ao sacerdécio, do treinamento profissional 4 militancia sindical. Jé que a tudo se atribuia uma dimensao educacional, nada restava como educagao propriamente dita. Assim, a diversidade do corpo docente foi, ao mesmo tempo, um elemento positivo enegativo para a nossa pés-graduaco. Positivo, por compensar o isolamento institucional e académico. Negativo, por resultar de um processo de composigio inorganica. Se os professores tinham essa diversidade em sua formagio e sua vinculagio a universidade/instituigao, os estudantes nao eram diferentes. Muito pelo contrario. Como aeducagao era entendida em sentido muito amplo, como convinha até mesmo aauto-estima em expanso dos profissionais da area, admitiam-se como alunos no mestrado pessoas graduadas nas mais diferentes especialidades. Nao tem sido raro o caso de graduados em Psicologia, Ciéncias Sociais, Economia, Letras ¢ outras areas, até mesmo das chamadas ciéncias da vida ou da terra, que buscam a pés-graduagio em educagio pela dificuldade de competirem nas respectivas areas. Oresultado combinado desse tipo de heterogeneidade deestudantes ede professores foi que grande parte do ensino acabouseresumindo numa série de introducdes, desenvolvidas a0 nivel das respectivas disciplinas de graduacao. Tal padrio de multiplicagio ampliada do baixo nivel foi incentivada pelas agéncias de fomento, nos anos 70, quando havia fartura de recursos para a pés-graduagiio. Mais importante do quea seriedade da busca de qualidade, ainda que demorasse um pouco, importava a demonstragio de resultados rapidos, conforme as priticas ufanistas da era Médici-Geisel. Mas, é preciso nao generalizar essa afirmagao. Estou ciente de que houve programas de pés-graduago em educagiio que incorporaram professores qualificados em Psicologia, Filosofia, Sociologia, etc., que nao encontravam espago nos departamentos especializados nas respectivas disciplinas. Uns retomaram suas carreiras em termos de ensino e da pesquisa, redefinindo praticas tematicas. Outros, no entanto, deixaram de focalizar temas propriamente educacionais, nem foram para isso chamados pelos novos colegas. Estou ciente, também, de que a reclamagio contraaheterogeneidade dos estudantes tem sido uma desculpa para professores que nao conseguem trabalhar adequadamente, preferindo projetar nos docentes as razdes de suas préprias dificuldades didaticas. Esse baixo nivel académico, em termos de ensino e da pesquisa acabou sendo reforgado por uma vaga politizagdo advinda da uta contra a ditadura militar. A necessidade de resistir as ideologias difundidas pelos intelectuais da ditadura obrigaram aisso. Diziam elas queerapreciso deixaras discussdes sem fim nem fundamento 174 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobreas condigdes sociais de produgao da sociologiada educagao: primeiras aproximacdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. sobre 0s objetivos da educagdo, em proveito dos meios, dito de outra forma, era preciso deixar de teoria e passar a pratica. O resultado foi a énfase na administragao e no planejamento educacional, ao lado da supervalorizagao da tecnologia educacional. Em reagaoa essas ideologias, houve uma procura da Sociologia, em busca de argu- mentos que pudessem por em evidénciaa discussio dos objetivos educacionais subjacentes, avaliados em fungdo dos destinatérios, cuja situagao social determinariao efeito dos meios de ensino. Para tanto, foram evocadas teorias de autores brasileiros (como a teoria da dependéncia) e estrangeiros (como a dos aparelhos ideolégicos de Estado e da violéncia simbélica). Tais autores foram lidos ¢ empregados quase sempre de maneira apressada e acritica, jd que seus intérpretes tinham pouca familiaridade com as questdes tedricas ¢ metodolégicas que acarretavam. Mesmo que essa digestio mal feita néo propiciasse 0 aprofundamento do conhecimento dos mecanismos de discriminagao da escola no Brasil, serviu para frear a ideologia da escola unificadora, a difusao da idéia de que a deficiente oferta de certos tipos de ensino seria o responsvel pela distribuigdo desigual da renda, a esperanga de que o bom funcionamento da escola seria resultado exclusivo ou mesmo preponderante da boa administragao. Por mais que compreendamos as razées ¢ nos solidarizemos com os propésitos generosos, ndo podemos deixar de mencionar as imagens caricatas que resultaram dessa digestao mal feita Aescola foi vista comose tivesse uma exagerada fungiio de socializagao antecipada, prefigurando tao exatamente a fabrica nas relagdes entre professores e alunos, que o contetido passou para segundo plano, quando nao totalmente desconsiderado. A instrumentalizagao dos professores pelos grupos dominantes foi suposto tao eficaz que resultava ininteligivel o discurso docente que tentava desvendar essa situagdo. O contetido da escola foi téo inteiramente associado 4 cultura da burguesia, que nao se compreendia como os proletérios passavam toda uma noite na fila para obterem vaga na escola piiblica quciria submeter seus filhos. A divisio do trabalho docente, especialmente nas habilitagdes do curso de Pedagogia foi tdo identificada com a manufatura, que ja nao se distinguia o produtor de mais-valia dos profissionais que com ela eram pagos. Tudo somado, esse padrao qualitativamente insatisfatério de desenvolvimento da pos-graduagao em educagdo teve pelo menos 0 mérito de manter vivos temas que a Sociologia tem ignorado. No entanto, isso nao justifica os efeitos negativos de uma incorporagio tio rapida quanto imprecisa das teorias sociolégicas. Sem a mediagao dos socidlogos, essas teorias foram freqiientemente empregadas de modo leviano, onde valia 175 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobre as condicdes sociais de produgiio da sociologia da educagai aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. mais a intengdo dos seus intérpretes do que as dos autores. Depois de usos ¢ abusos, foram descartadas como trastes intiteis, como se tenta fazer, agora, com a difusdo equivocada da categoria ‘eorias reprodutivistas, na qual se junta a produgao de autores tao distintos quanto Althusser, Bourdieu, Bowlws e Baudelot. Com isso, 0 campo educacional tornou-se fértil para a germinagao eo crescimento derepresentagdes equivocadas que se expressam em linguagem parasociolégica, e que tem sido eficazmente empregadas nas disputas que configuram esse campo. Vou indicar algumas dessas representagSes, as que me parecem mais importantes no momento atual. A primeira delas é a identificagdo do professorado com a categoria inclusiva dos trabalhadores, quando nado com o operariado. Ora, a identificagao do professorado com o operariado é mais metaférica do que real. Enquanto que os operarios perderam 0 controle sobre sua pritica produtiva, pela propria divisio social e técnica do trabalho no capitalismo, 0 mesmo nao se deu com os professores, apesar da tentativa de certos autores em demonstrar que o taylorismo chegou para ambos da mesma forma e na mesma intensidade. De fato, os professores continuam tendo (para o bem e para o mal) uma importante fatia de controle sobre 0 seu trabalho, 0 que exigiria deles uma postura consciente e conseqiiente a respeito dos efeitos nos alunos do ensino que ministram, coisa que 0 operario nao pode fazer, ainda que o deseje. A figura do patriio ¢ outro elemento de identificagaio metaférica entre professores ¢ operdrio. Enquanto o operario tem no patrao o comprador de sua forga de trabalho e 0 apropriador da mais-valia por ele produzida, o professor da rede publica imputa ao Estado a mesma fungao, buscando encontrar uma autoridade fantasiada contra quem direcionar sua agressividade (no sentido psicolégico do termo). No entanto, ¢ justamente ao Estado que os operarios (¢ outros trabalhadores) recorrem para a satisfagao de suas demandas educacionais, 0 que seria impossivel se fosse ele o apropriador de alguma “mais-valia pedagogica”. Essas metéforas tém efeitos negativos na pratica sindical ¢ politica, jA que as paralisagdes das aulas desgastam mais os prdprios professores do que a administrago municipal ou estadual visada. Como os professores estdo ideologicamente prisioneiros dessas metéforas, eles nfio conseguem encontrar outros caminhos para distinguir em suas pautas de reivindicagdes quais so as justas e quais as injustas, nem para encontrar formas de luta que nao disponham a maioria da populagao contra seu movimento; nem mesmo para evitar o paradoxal reforco dos seus principais contendores. Estudos sociolégicos sobre o magistério como profissdo, na linha da pesquisa municipal de Aparecida Joly Gouveia, poderiam contribuir para evitar esse tipo de idealizago do professor como profissional e como protagonista politico. 176 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdessobreas condigdes sociais de produgaoda sociologia da educagao: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. Mas, nés préprios - os socidlogos - devemos ser objeto de pesquisa de uma sociologia das profissdes. Dificil tarefa essa, ade tocar no nervo sensivel docorporativismo, Teriamos de examinar sem idéias preconcebidas as motivagdes, os mecanismos de pressio € 0s efeitos priticos da longa campanha pela regulamentagdo da profissdio, bem como a recente destegulamentagio. Teriamos deexaminar, também, as motivagdes, os mecanismos de pressio e os possiveis efeitos priticos da inclusdo da Sociologia como disciplina do curriculo do ensino de 2° grau. Ela tem sido saudada como uma conquista da categoria Conquista corporativa, sem davida. Quem perde com a entrada da Sociologia no curriculo do 2 grau € coisa que ndo tenho visto os sociélogos dizerem. Mas, como foi que ela chegou ai? Embora a parte central do curriculo do ensino de 1? ¢ 2 graus ainda nao estivesse delineada, em Ambito nacional, cada estado entendeu que deveria apontar em sua Constituigdo (1989) disciplinas ou atividades. Nao foi dificil perceber a preocupagaio com © atendimento de interesses de certos grupos profissionais ¢ de fazer da escola ponto de partida para a solugio de problemas muito variados: desde 0 meio ambiente até a profissionalizacdo, com presenga certa para a educagiio fisica e os desportos. O Estado do Rio de Janeiro ficou obrigado a ministrar 0 ensino de Sociologia nas escolas publicas privadas de 2° grau e Minas Gerais, a fazé-lo nas escolas piblicas desse grau, No Ceard, onde as previsdes curriculares foram mais ambiciosas, as escolas piblicas ¢ privadas deveriam ministrar, obrigatoriamente, nogdes de: direitos humanos; defesa civil; regras de transito; efeito das drogas, do alcool e do tabaco; direito do consumidor; sexologia; ecologia; higiene ¢ profilaxia sanitaria; cultura cearense, abrangendo os aspectos historicos, geograficos, econdmicos e sociolégicos do estado e seus municipios; Sociologia; folclore; cooperativismo ¢ associativismo. Em outros estados, a Sociologia entrou no curriculo do 2° grau sem precisar de dispositivo constitucional, o que sugere que a eficdcia dos grupos de pressao foi ainda maior do que nos casos mencionados acima. Acertadas as contas com 0 corporativismo (0 que jé ndo pouco), os socidlogos daeducagdonio deveriam deixar decontribuir com aanélise da ideologiado comunitarismo. Nos anos 70, um novo termo foi ganhando espago no vocabulério politico e, especialmente, no educacional: comunidade. Dizia-se que a escola deveria estar voltada para a comunidad; que a gestio da escola deveria ser comunitéria; que somente com a participagdo dacomunidade seria possivel uma escola democratica; queaescola comunitéria € que seria a verdadeira escola piblica. Supunha-se que pelo simples fato de viverem na mesma localidade (um arraial interiorano, um bairro periférico de cidade grande ou uma favela, por exemplo), de terem problemas comuns (como abastecimento de Agua, esgotos, coleta de lixo, transporte, posse da terra) os seus moradores formariam comunidades, Com isso, deixava-se de perceber as 17 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobreas condigdes sociais de produ¢o da sociologia da educagao: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. relages de exploragao que freqiientemente existem no seu interior, assim como a identificagdo de seus membros com os grupos situados fora do arraial, da favela ou do bairro periférico, de onde eles esperam sair na primeira oportunidade. Da mesma forma, nao se percebia como os pequenos agregados ditos “comunitérios” possuiam, freqiientemente, mecanismos decontrole social mais fortes do que as associagdes voluntarias. No que se refere propriamente & educago - nao necessariamente a escola - a ideologia do comunitarismo é essencialmente prejudicial 4 construgio da democraciae até mesmo da urbanidade, como mostrou Richard Sennett. A énfase na comunidade local como agente de ago politica, articulada com a crenga muito difundida de que a aproximagao entre as pessoas (0 intimismo) é um bem moral, acaba por resultar naquilo que esse autor denominou de “as tiranias da intimidade”’. ‘As tentativas de criagdo de “comunidades”, seja para o culto da mitologia construida sobre a crenga de que a impessoalidade da cidade grande é um mal social, seja para a defesa de interesses politico-econdmicos comuns, correm o grande risco de cafrem numa situagdo bem diferente da idealizada pela motivagio inicial: a manuteng3o da “comunidade” como um fim em si mesmo. Ea celebragio do gueto. Oprimeiro efeito prejudicial ¢a fungdo de vigilancia ede teste que a*comunidade” passa a exercer sobre seus membros, de modo a evitar as agdes € os pensamentos divergentes, visando a reforgar a identidade comum. Dito de outro modo, é 0 sectarismo, a intolerancia e a pratica do expurgo em nome da defesa da “comunidade”. O segundo efeito prejudicial da ideologia do comunitarismo na educagao é a busca da homogeneidade, nao se levando em conta que as pessoas s6 podem crescer através de processos que propiciem seu encontro com pessoas, coisas ¢ situagdes desconhecidas, diferentes das que lhes so familiares. Nada mais anti-educativo (no sentido valorativo do termo) do que proteger as criangas e os jovens na “redoma comunitiria”, que os dispensa de correr 0 risco de submeter suas crengas, seus valores, seus hdbitos e até sua linguagem ao confronto dos estranhos, dos diferentes. Por outro lado, nao tem fundamento a crenga dos anarquistas europeus dos século XIX, revivida no Brasil durante a luta contra a ditadura militar. Segundo essa crenga, quanto menor o agrupamento humano maior a possibilidade de uma mudanga de qualidade do poder, de modo que, no limite, ele perderia seu cardter de dominago para se tornar visivel, contestivel e destituivel. Com efeito, do mesmo modo que um pai pode tiranizar o filho, num pequeno grupo doméstico, o prefeito ou omandao local de uma pequena cidade pode tiranizar sua “comunidade”, mais facilmente do que numa metrépole, pois naquela, onde todos se conhecem, nem mesmo existe um espago (geogrifico e social) onde alguém possa se esconder ou passar desapercebido. 178 CUNHA, Luiz Antonio, Reflexdessobreas condigdessociais de produgaioda sociologia da educagao: primeiras aproximagdes, Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. Neste sentido, vale destacar que a penetragaio dessa ideologia acaba ocorrendo nas mentes de quem procura estudar com objetividade a questo das “escolas comunitarias”, até mesmo quando rejeitam, manifestamente, a idéia da “comunidade” com a conotagao aqui criticada. E 0 caso da nao percepgao de que o abandono do termo “favela”, de Obvia conotagdo negativa, em proveito de “comunidade”, de sutil conotagao positiva, resulta mais da ago ideolégica dos “assessores”, ou seja, dos intelectuais que “animamo trabalho comunitério”, com seus preconceitos pequeno-burgueses, temerosos de ofender 0 “povo pobre”, do que a umaalegada tomada de “consciénciade classe” pelo (lumpen) proletariado residente nas areas miseraveis das periferias urbanas. A valorizagao idealizada da cultura da “comunidade” (e da “cultura popular”) leva os intelectuais que a promovem a incentivar as formas espontineas de reagio contra a explorag&o a que as classes trabalhadoras so submetidas. Mas, pouco ou nada além disso. O viés anti-intelectualista que esses intelectuais envergonhados de sua condigao difundem impedem na pratica que essas formas esponténeas de reagdio e as idéias ingénuas que as representam sejam refinadas, apuradas ¢ sistematizadas, pelo confronto comas concepgdes cientificas a respeito da sociedade e da historia. Por raz6es histéricas, esas concepgdes s6 puderam se desenvolver fora do dmbito da “cultura popular” ¢ até mesmo fora do pais (fora das “comunidades”, portanto), determinadas que foram pelo maior amadurecimento das lutas sociais (Iutas de classe e outras) e das organizagdes que delas e para elas brotaram, tanto nos paises capitalistas centrais quanto nos paises socialistas. Tal concepgao de educagio e de escola resulta de uma visio ingénua da teoria da pratica, pois identifica 0 concreto ao imediato e, em conseqiiéncia, privilegia o ‘conhecimento que nasce da participagaio em grupos primarios, de relagao face a face, em detrimento do conhecimento produzido de forma cada vez mais especializada na sociedade contemporinea, mas tio socialmente necessdrio quanto aquele. Em suma, essas diferentes nuances de pensamento celebram (até mesmo em eruditas teses doutorais) a “comunidade”, 0 pequeno grupo, o saber empirico, a espontaneidade, a organizagio em fungio de reivindicagées imediatas. De todo modo, independentemente das intengdes, as tentativas de se aliviarem as necessidades mais urgentes da populagdio em matéria de educaciio, acabam por diminuir a pressio sobre o Estado para que responda as demandas educacionais dessa populacdo, a comecar pelo direito a educagdo priméria, de 1° grau, fundamental ou qualquer outro nome que se dé ao ensino destinado a todos. Mais do que resultado de manifestagdes espontineas, a transferéncia de respon- sabilidades educacionais escolares para as “comunidades” tem sido induzida pelo proprio Estado, de modo que elas passem a aceitar uma escola barateada (em termos, financeiros e pedagégicos), além de reforgar os padrées populistas que persistem fortes no Brasil. 179 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexdes sobreas condigdes sociais de produgio dasociologia da educagao: primeiras aproximagdes, Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. O interesse do Estado no incentivo dessas iniciativas ¢ duplo: 1) cooptar as liderangas, fazendo-as intermedidrias entre as demandas da populagio e as “realizagdes” do governo, intermediagao essa muito titil para atenuar as pressdes imediatas e para efeito eleitoral; e IT) diminuir os gastos com os servigos publicos demandados pela populagao de baixa renda, que ¢ chamada a entrar com parte dos recursos (principalmente a forga de trabalho, mediante a valorizacao do “‘mutirao” e outras formas de auto ajuda) e a diminuir as expectativas de qualidade ¢ amplitude dos servigos pretendidos, que devem ficar “no nivel da comunidade”. Enquanto essas representagées ingressavam no campo educacional, o que houve com a Sociologia que teve reduzido o interesse pela educagio? Primeiramente, vale retomar a afirmagao do principio deste texto, a propdsito da indugio governamental (Anisio Teixeira na rede INEP) para as pesquisas em Sociologia da Educaciio. Por que serd que essa indugdo é assim tao vital para os sociélogos a tomarem como objeto? Outros temas prescindem de indugaio governamental para terem nossa atengdo: militares, sindicatos, partidos politicos, minorias, movimentos sociais, entre outros, Com efeito, sdo temas que adquiriram importéncia no meio académico devido a sua relevancia social. Mas, isso so foi possivel porque os socidlogos os consideraram relevantes. Quanto a educagao, nao me resta diivida da importanciaa ela conferida por toda a populagaio. Seja vista como requisito paraa obtengaio de ocupagiio remunerada, sejacomo meio de fixar 0 homem 4 terra, seja como disciplinadora dos desviantes, seja como libertadora, a educagao estd posta como um dos mais graves “problemas nacionais” (no sentido que Florestan Fernandes deu a esse termo). Por que serd que os socidlogos - particularmente os universitérios - a desprezam? Gostaria de oferecer a discussio uma hipétese para responder a questo. Com a excegdo dos pedagogos, os professores universitérios - inclusive os socidlogos - nao se véem como educadores. Para eles somente 0 so os professores da faculdade (centro ou departamento) de educagaio. Quantas vezes nao teremos ouvido 0 vocativo: “vocés, educadores...”? ‘A questo da identidade profissional dos educadores universitarios, que nao se entendem com tais, é um importante tema de pesquisa socioldgica: como se ajustam (?) priticas cada vez mais formalizadas e pré-configuradas para a formagio do lado, digamos, técnico do professor/pesquisador universitdrio (enquanto bidlogo, psicélogo, engenheiro, fildsofo, etc.) ¢ as priticas informais e difusas para a formagao do lado docente? Para um lado, a profissionalizagao cada vez mais sofisticada, para outro o diletantismo resistente e complacente. 180 CUNHA, Luiz Antonio. Reflexées sobre as condig&es sociais de produgdo da sociologia da educagao: primeiras aproximagdes. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992, O que ocorreéaimprovisagao, que permite a revelagio do talento, Em mais de uma universidade, presenciei colegas meus dizerem, com sorrisos de aprovagao geral, que nao davam importancia alguma a didatica. No entanto, usavam uma didatica, mesmo sem 0 saberem, com efeitos que desconheciam. Nao posso deixar de me lembrar dos idedlogos que falam do fim da ideologia (ou, mais recentemente, da historia e da luta de classes). De todo modo, o diletantismo docente é 0 complemento da improvisagao do corpo docente. Sera que o diletantismo docente resulta da rejeicdio das disciplinas didatico- pedagégicas conhecidas durante a licenciatura? Mas, como se produziria essa rejeigao no caso dos profissionais que nao as experimentaram nem tiveram contato com seus colegas dessa area, em universidades ainda muito compartimentadas? Sera que o diletantismo resulta da descrenga para com a Pedagogia, identificada com as politicas educacionais que ainda no conseguiram levar em conta, no Brasil, ciclos das lavouras para a fixagdo dos periodos letivos? Nem o conhecimento disponivel sobre ‘uso do espago ¢ os materiais de construgao para a edificagaio dos prédios escolares? Nem as priticas produtivas para a dimensao profissionalizante dos curriculos escolares? Nem as praticas da comunicagao de massa, dominantemente visual, para as matérias de ensino escolar? Longe de mim sugerir a licenciatura - a que ai est - como requisito para magistério superior. Mas, sera que nao faz falta um aprendizado sistematizado sobre os procedimentos didaticos mais elementares, ainda que fosse a mera critica dos casos horripilantes de que esto cheios os cursos superiores das melhores universidades? ee Para finalizar, gostaria de dizer que a mim parece existirem razdes para um moderado otimismo quanto ao futuro da Sociologia da Educagio em nosso pais. Embora os socidlogos tenham sido sovinas em tomar a educag&io como objeto, a demanda para isso é grande. Ainda que a sociologizagdo da Pedagogia tenha levado a resultados insatisfatérios, os numerosos artigos, as teses e dissertagdes, bem como as idéias que se difundiram durante as duas tltimas décadas fizeram do social uma presenga constante no discurso académico, sindical e governamental. Tomar essa dimensio social e fazé-la combustivel ¢ motor do pensamento sociolégico, é tarefa que somente a nés, socidlogos, pode caber. Se é dificil que acontega uma indugdo governamental como ado INEP de Anisio Teixeira, por que nao se pensar em iniciativas internas as universidades que possam surtir 0 mesmo efeito? 181 CUNHA, Luiz Antonio, Reflexes sobreas condigdes sociais de produgdo da sociologia da educagao: primeiras aproximages. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. Neste sentido, ouso sonhar. Eo ago imaginando que se criasse um programa de pos-graduagaio em Sociologia da Educagao, destinado a graduados em Ciéncias Sociais, reunindo num mesmo espaco institucional (e por que nao geografico?) socidlogos, antropdlogos e politélogos produtores com essa especialidade. Esta celebrag&io do termo do primeiro ciclo da fértil produgao académica de Aparecida Joly Gouveia, por que nao transformé-la em idéia-forga e inicio de iniciativas que levem a coisa desse tipo? Se der certo, estardo sendo recriadas as condigdes sociais de produgio da Sociologia da Educagao, de modo a tirar proveito dos ganhos para a disciplina do aumento exponencial da interagao entre os pesquisadores, de sua colaboragiio em projetos comuns e - por que nao? - do confronto de suas idéias e praticas. Mesmo que isso nao esteja num horizonte visivel, gostaria de terminar com o apelo para o estudo de um tema que espero ter destacado suficientemente em sua relevancia e urgéncia: 0 diletantismo docente. Recebido para publicagao em junho/1992 CUNHA, Luiz Antonio, Considerations ofthe Social Conditions of Production of Sociology of Education. First Approaches. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 4(1-2): 169-182, 1992. ABSTRACT: Despite the remarkable development of academic research in Brazil in recent years, Brazilian sociologists have given little importance to education as a subject of research and thematic specialization, Formerly, the situation was different, when, in the fifties and sixties, Educational Sociology benefitted from production of knowledge. The article tries to broach the issue of this underrating, in the attempt to explain it from the social framework of direct university production, correlated to the internal organization of teaching and research, the "new" social division of academic work brought about by the University Reform of 1968 fostered by the military regime, which institude the Faculties of Education. As arelated problem and throughout the explanation, the autor emphasizes dilletantism in teaching. UNITERMS: education, Sociology of Education, university, university reform, academic research, dilletantism in teaching, 182

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