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Maquiavel Pedagogo - Pascal Bernardin PDF
Maquiavel Pedagogo - Pascal Bernardin PDF
Capa
Folha de Rost o
Dedic at ória
Int roduç ão
As técnic as de manipulaç ão psic ológic a
A subm iss ão à aut oridade
O conf orm ism o
Norm as de grupo
Pé na port a
“Port a na cara”
Diss onânc ia cognit iva ou o espirit ualism o dialét ic o
Não pague a seus empregados
Você gost a de gaf anhot os frit os?
Inic iaç ão sexual de moç as
Cont at os ext rat errest res
Dram at iz aç ão
Dec is ão e disc uss ão de grupo
A avaliaç ão (dos alunos e dos prof ess ores)
A aplic aç ão da psic ologia soc ial na educ aç ão
A modif ic aç ão das atit udes
A aplic aç ão das Ciênc ias Soc iais
Mudar a atit ude: da pers uas ão ao engajam ent o
Condut as para mudar “as ideias”
A educ aç ão
A Unesc o, a educ aç ão e o cont role psic ológic o
A modif ic aç ão de atit udes em esc ala int ernac ional
A aplic aç ão das Ciênc ias Soc iais
A educ aç ão
Tot alit arism o?
A manipulaç ão da cult ura
A redef iniç ão do papel da esc ola e o ens ino mult idim ens ional
O ens ino não cognit ivo e mult idim ens ional
Ens ino acadêm ic o vers us aprendiz ado soc ial
A revoluç ão étic a
A esc ola cont ra a fam ília
O lugar da esc ola
A revoluç ão cult ural e int erc ult uralism o: hom enagem a Gramsc i
Reesc rever a hist ória
Aprender a aprender
Os IUFMS
A form aç ão dos prof ess ores
Pedagogias ativas e manipulaç ões psic ológic as nas salas de aula
Um projet o mundial
A desc ent raliz aç ão
A implem ent aç ão da ref orm a pedagógic a
A aut onom ia dos diret ores esc olares
Conc eder aut onom ia para dar conf ianç a aos prof ess ores
A desc ent raliz aç ão
Desc ent raliz aç ão e ens ino não cognit ivo
A avaliaç ão e a inf orm at iz aç ão do sist em a educ ac ional mundial
Os Est ados Unidos
As organiz aç ões int ernac ionais
A Franç a
A Europa
A revoluç ão pedagógic a na Franç a
A renovaç ão pedagógic a, os módulos e os cic los
‘La déc ennie des mal-appris’ de Franç ois Bayrou 183
A avaliaç ão
A form aç ão cont inuada
A inovaç ão pedagógic a
A desc ent raliz aç ão
As prim eiras medidas governam ent ais
A soc iedade dual
O baixo nível
O déf ic it dem oc rát ic o
A soc iedade dual
O tot alit arism o psic opedagógic o
Conc lus ão
Bibliograf ia Selet iva
Crédit os
INTRODUÇÃO
Uma revoluç ão pedagógic a bas eada nos res ult ados da pesquis a psic opedagógic a
está em curs o no mundo int eiro. Ela é conduz ida por espec ialist as em Ciênc ias da
Educ aç ão que, form ados todos nos mesm os meios revoluc ionários, logo dom inaram os
depart am ent os de educ aç ão de divers as inst it uiç ões int ernac ionais: Unesc o, Cons elho da
Europa, Com iss ão de Bruxelas e OCDE. Na Franç a, o Minist ério da Educ aç ão e os IUFMS1
est ão igualm ent e subm et idos a sua inf luênc ia. Essa revoluç ão pedagógic a visa a impor
uma “étic a volt ada para a criaç ão de uma nova soc iedade”2 e a est abelec er uma soc iedade
int erc ult ural. A nova étic a não é out ra cois a senão uma sof ist ic ada reapres ent aç ão da
utopia com unist a. O est udo dos doc um ent os em que tal étic a está def inida não deixa
margem a qualquer dúvida: sob o mant o da étic a, e sust ent ada por uma ret óric a e por
uma dialét ic a frequent em ent e not áveis, enc ont ra-se a ideologia com unist a, da qual apenas
a aparênc ia e os modos de ação foram modif ic ados. A part ir de uma mudanç a de valores,
de uma modif ic aç ão das atit udes e dos comport am ent os, bem como de uma manipulaç ão
da cult ura,3 pret ende-se levar a cabo a revoluç ão psic ológic a e, ult eriorm ent e, a revoluç ão
soc ial. Essa nova étic a faz hoje part e dos program as esc olares da Franç a,4 e é
obrigat oriam ent e ens inada em todos os níveis do sist em a educ ac ional.
Est ando claram ent e def inido o objet ivo, para atingi-lo são utiliz ados os res ult ados
da pesquis a pedagógic a obt idos pelos soviét ic os e pelos cript oc om unist as nort e-
americ anos e europeus. Trat a-se de técnic as psic opedagógic as que se valem de mét odos
ativos dest inados a inc ulc ar nos est udant es os “valores, as atit udes e os comport am ent os”
def inidos de ant em ão. Por essa raz ão foram criadas os IUFMS, que se empenham em
ens inar ess as técnic as de manipulaç ão psic ológic a aos fut uros prof ess ores.
Dent re os traç os mais relevant es dess a revoluç ão pedagógic a, é prec is o dest ac ar
os seguint es:
◆ test es psic ológic os, projet ados ou já realiz ados, em grande esc ala;
◆ inf orm at iz aç ão mundial das quest ões do ens ino e, part ic ularm ent e, o cens o (ora
em curs o) de toda a populaç ão esc olar e univers it ária, a pret ext o de “aperf eiç oam ent o do
ens ino”. Part ic ipam aí os test es psic ológic os. Novent a por cent o das crianç as nort e-
americ anas já foram fic hadas;
◆ asf ixia ou subordinaç ão do ens ino livre;
◆ pret ens ão a anular a inf luênc ia da fam ília.
A revoluç ão pedagógic a franc es a, aliás rec ent em ent e acelerada, insc reve-se ness e
quadro mundial. Nos últ im os anos, num eros as modif ic aç ões têm sido disc ret am ent e
int roduz idas no sist em a educ ac ional franc ês ou const it uem, atualm ent e, objet o de debat e.
Os elem ent os de anális e apres ent ados nos capít ulos seguint es vis am a evidenc iar a
coerênc ia do projet o mundial no qual eles se int egram.
A prim eira dess as ref orm as ocupa-se da form aç ão de prof ess ores. As esc olas
norm ais foram subst it uídas pelos Inst it ut os Univers it ários de Form aç ão de Mest res
(IUFMS). Eles se caract eriz am pela import ânc ia que neles se dá às “ciênc ias” da educ aç ão
e à psic opedagogia. Ess es inst it ut os preparam os prof ess ores para a sua nova miss ão:
redef inido o papel da esc ola, a prioridade é, já não a form aç ão int elect ual, mas o ens ino
“não cognit ivo” e a “aprendiz agem da vida soc ial”. Também aqui o objet ivo é modif ic ar os
valores, as atit udes e os comport am ent os dos alunos (e dos prof ess ores). Para isso, são
utiliz adas técnic as de manipulaç ão psic ológic a e de lavagem cerebral.
A ref orm a na form aç ão dos prof ess ores faz-se acompanhar de um cons iderável
esf orç o no campo da form aç ão cont inuada de todas as cat egorias de prof iss ionais da
educ aç ão: adm inist radores, prof ess ores, diret ores etc. devem igualm ent e est ar adapt ados
à nova miss ão da esc ola.
A revoluç ão pedagógic a está também pres ent e nos est abelec im ent os esc olares.
Ass im, a est rut ura das esc olas prim ária e mat ernal5 foi modif ic ada para subst it uir as
divers as séries por três cic los6 que reúnem alunos de níveis dif erent es. Os ens inos form al
e int elect ual são negligenc iados em proveit o de um ens ino não cognit ivo e
mult idim ens ional, privilegiando o soc ial. A ref orm a pedagógic a int roduz ida no Ens ino Médio
tende igualm ent e a uma prof unda modif ic aç ão das prát ic as pedagógic as e do cont eúdo do
ens ino.
Sim ult aneam ent e, um vast o dispos it ivo de avaliaç ão dos alunos é implem ent ado.
Por fim, ele deve ser inf orm at iz ado, para ser utiliz ado em carát er perm anent e, e abrangerá
o ens ino não cognit ivo, tal como a educ aç ão étic a, cívic a e soc ial.
Essa revoluç ão pedagógic a, int roduz ida disc ret am ent e, mediant e disc ret as
manobras, sem deixar ver sua arquit et ura geral, prec is a levar em cont a a res ist ênc ia dos
prof ess ores, que jam ais perm it iram o avilt am ent o de seu ofíc io e de seus alunos. Dess e
modo, aplic am-se técnic as de desc ent raliz aç ão, oriundas diret am ent e das técnic as de
adm inist raç ão e de gest ão de “rec urs os hum anos”. Cons egue-se com isso envolver, engajar
psic ologic am ent e os prof ess ores e, port ant o, reduz ir a sua opos iç ão. Os “projet os
esc olares” são a aplic aç ão diret a dess a filos of ia manipulat ória.
Adem ais, o nível esc olar cont inuará dec aindo, o que aliás não surpreende, já que o
papel da esc ola foi redef inido e que sua miss ão princ ipal não cons ist e mais na form aç ão
int elect ual, e sim na form aç ão soc ial das crianç as; já que não se pret ende fornec er a elas
ferram ent as para a aut onom ia int elect ual, mas ant es se lhes des eja impor, sub-
rept ic iam ent e, valores, atit udes e comport am ent os por meio de técnic as de manipulaç ão
psic ológic a. Com toda nit idez, vai-se des enhando uma dit adura psic opedagógic a.
No mom ent o mesm o em que os dem oc rat as maravilham-se de sua vit ória sobre o
com unism o, alguns obs ervadores se quest ionam, lembrando-se do que diss e Lênin: “É
prec is o [...] est ar dispost o a todos os sac rif íc ios e, inc lus ive, empregar – em caso de
nec ess idade – todos os est rat agem as, ardis e proc ess os ilegais, silenc iar e ocult ar a
verdade”.7 Sérias int errogaç ões subs ist em quant o à nat urez a e a prof undidade das
ref orm as empreendidas na ant iga URSS. Ess as int errogaç ões, que não poderiam ser
abordadas no âmbit o dess e opúsc ulo, form am-lhe, cont udo, a tram a.
Out ros há que evoc am a tese da convergênc ia ent re capit alism o e com unism o,
def endida ainda há pouc o por algum as organiz aç ões int ernac ionais, por A. Sakharov e por
tant os out ros. Sua perspect iva é mais ou menos ampla que a prec edent e? É ela, enf im,
mais just a? Não é noss a pret ens ão responder a ess as pergunt as, ligadas int im am ent e às
suspeit as que pes am sobre a perest roika.
Ent ret ant o, ess as int errogaç ões form am o pano de fundo dess e est udo. Esc rit o de
circ unst ânc ia, cuja redaç ão se ress ent e da brevidade do tempo que nos foi atribuído, ele
não pret ende out ra cois a senão esc larec er seus leit ores acerc a do que realm ent e está em
jogo nos debat es atuais conc ernent es à ref orm a do sist em a educ ac ional. Ele evit ará,
port ant o, abordar front alm ent e as quest ões de polít ic a int ernac ional. Const at a-se, porém,
que tais quest ões não poderiam perm anec er por muit o tempo sem respost a.
Há quem nos cens ure o fato de haverm os ins ist ido dem as iado no aspect o
cript oc om unist a da revoluç ão pedagógic a por nós expost a, privilegiando de fact o a prim eira
das duas hipót es es. Convim os com isso de boa vont ade, mas tem os duas raz ões para
haver ass im proc edido. Em prim eiro lugar, o aspect o cript oc om unist a dess a revoluç ão não
poderia ser seriam ent e cont est ado. Culm inânc ia dos trabalhos realiz ados desde há quas e
um séc ulo nos meios revoluc ionários nort e-americ anos, ret om ados e des envolvidos
ult eriorm ent e pela URSS e pela Unesc o, ela traz em si as marc as de sua origem. Além
diss o, rec onhec er tais origens, adm it ir que nos enc ont ram os face a uma tem ível manobra
cript oc om unist a, não exc lui, em abs olut o, a hipót es e globalist a da convergênc ia ent re
capit alism o e com unism o. Mais ainda, essa segunda hipót es e na verdade supõe a pres enç a
de um fort e elem ent o cript oc om unist a na soc iedade post erior à des apariç ão da cort ina de
ferro.
Ass im, rogam os ao leit or que cons idere como os fat os expost os nas páginas a
seguir se podem int egrar em dois quadros divers os de anális e e de int erpret aç ão, os quais
não pret endem os disc rim inar. Seria isso poss ível, aliás, cons iderando-se que os
acont ec im ent os est iveram subordinados a relaç ões de forç a ext rem am ent e complexas e
sut is, capaz es de orient ar a hist ória em uma direç ão imprevist a? E cons iderando que os
próprios prot agonist as est ão, em sua imens a maioria, tant o do Oest e quant o do Lest e,
inc onsc ient es do sent ido da Hist ória, que transc ende inf init am ent e a dialét ic a
cript oc om unism o vers us globalism o?
As organiz aç ões int ernac ionais pres ervam-se por meio de expedient es como este:
“As opiniões express as no pres ent e est udo são de int eira respons abilidade do aut or e não
ref let em nec ess ariam ent e o pont o de vist a da Organiz aç ão X”. Se essa ress alva é
verdadeira, strict o sens u, é nec ess ário, não obst ant e, cons iderar que a organiz aç ão
int ernac ional, que edit ou tais opiniões, julgou-as suf ic ient em ent e próxim as das suas, já que
não apenas deixou de cens urá-las mas, além diss o, garant iu e financ iou sua public aç ão.
Exat am ent e como a mídia, as organiz aç ões int ernac ionais exerc em sua inf luênc ia não
tant o pelas opiniões que def endem como por meio dos aut ores aos quais elas conc edem a
palavra e pelas tes es que elas dif undem, dess e modo, sob sua aut oridade. Adem ais, as
tes es que havem os de expor são todas elas repres ent at ivas das corrent es de ideias que
perpass am os meios globalist as. Nas ref erênc ias, menc ionarem os explic it am ent e as
public aç ões em que não são feit as quaisquer res ervas.
1 IUFM: Inst it ut o univers it ário de form aç ão de mest res.
2 Parlam ent o europeu, Doc um ent o de sess ão, Relat ório da com iss ão da cult ura, da
juvent ude, da educ aç ão e das mídias sobre La polit ique de l’éduc at ion et de la form at ion
dans la perspect ive de 1993, 27 mar. 1992, p. 33. A-3-0139/92.
3 Cf. Sem inário europeu de prof ess ores, Kolm arden, Norrköping, Suéc ia, 10-14 jun.
1985, La form at ion int erc ult urelle des ens eignants, Strasbourg, Cons elho da Europa, 1987, p.
19 e 20. [DECS/EGT (86) 83-F].
4 Cf. 4ª Conf erênc ia dos minist ros da educ aç ão dos est ados-membros da região
Europa, Perspect ive et tac hes du développem ent de l’éduc at ion en Europe à l’aube d’un
nouveau millenaire, Paris, Unesc o, 1988, p. 11 (ED-88/MINED-EUROPE/3). Doc um ent o
nat uralm ent e public ado sem res erva sobre as opiniões dispost as pelos seus aut ores.
5 Equivalent e à fase da crec he e da pré-esc ola no sist em a educ ac ional bras ileiro –
N. do T.
6 No sist em a educ ac ional franc ês, são três os cic los das séries inic iais, que
comport am de duas a três etapas, ass im organiz ados: cic lo dos prim eiros aprendiz ados:
pequena seç ão, média seç ão, seç ão maior; cic lo das aprendiz agens fundam ent ais: curs o
preparat ório e curs o elem ent ar 1; cic lo de aprof undam ent o: curs o elem ent ar 2, curs o
médio 1 e curs o médio 2 – N. do T.
7 V. Lenine, La maladie inf ant ile du comm unism e, Paris, Edit ions soc iales, Mosc ou,
Edit ions du progrès, 1979, p. 69.
CAPÍT ULO I
AS TÉCNICAS DE
MANIPULAÇÃO PSICOLÓGICA
A submissão à autoridade
Em uma série de experiênc ias célebres, o prof ess or Stanley Milgram evidenc iou de
maneira espet ac ular o papel da subm iss ão à aut oridade no comport am ent o hum ano.
Milgram9 repet iu suas experiênc ias com 300 mil pess oas, experiênc ias est as que foram
reproduz idas em num eros os país es. Os res ult ados obt idos são indisc ut íveis. A experiênc ia
de base envolve três pess oas: o pesquis ador, um supost o aluno, que na verdade é um
colaborador do pesquis ador, e o verdadeiro objet o da experiênc ia, o prof ess or. A
experiênc ia pret ende supost am ent e det erm inar a inf luênc ia das puniç ões no aprendiz ado. O
prof ess or deve ent ão most rar ao supost o est udant e ext ens as list as de palavras e, em
seguida, test ar sua mem ória. Em caso de erro, uma puniç ão prec is a ser impost a ao
colaborador. O objet o da experiênc ia ignora, nat uralm ent e, o stat us real do colaborador, e
crê que este, como ele próprio, não tem qualquer relaç ão com a organiz aç ão da
experiênc ia. As puniç ões cons ist em em desc argas elét ric as de 15 a 450 volts, as quais o
próprio prof ess or deve acionar cont ra o supost o est udant e, sit uado em uma peça viz inha.
A volt agem das desc argas aum ent a a cada erro com et ido. O colaborador, é claro, não
rec ebe ess as desc argas, cont rariam ent e ao que acredit a o prof ess or – este é quem
rec ebe, no iníc io do experim ent o, uma desc arga de 45 volts, para “ass egurar-se de que o
gerador func iona”. As reaç ões que o colaborador deve sim ular são est rit am ent e
codif ic adas: a 75 volts ele com eç a a murm urar; a 120 volts, ele rec lam a; a 150 volts ele
pede que parem com a experiênc ia e, a 285 volts, ele lanç a um grit o de agonia, depois do
qual se cala complet am ent e. É ass egurado ao prof ess or que os choques são doloros os mas
não deixam sequelas. O pesquis ador deve zelar para que a experiênc ia chegue a seu
term o, trat ando de enc orajar o prof ess or, caso este venha a manif est ar dúvidas quant o à
inoc uidade da experiênc ia ou caso des eje enc errá-la. Também ess es enc orajam ent os são
est rit am ent e codif ic ados: à prim eira objeç ão do prof ess or, o pesquis ador lhe responde:
“Queira cont inuar, por favor”; na segunda vez: “A experiênc ia exige que você cont inue”; na
terc eira vez: “É abs olut am ent e ess enc ial que você cont inue”; na quart a e últ im a vez:
“Você não tem esc olha. Deve cont inuar”. Se o prof ess or pers ist e em suas objeç ões após o
quart o enc orajam ent o, a experiênc ia é enc errada.
O res ult ado da experiênc ia é espant os o: mais de 60% dos prof ess ores levam-na
até o final, mesm o convenc idos de que est ão realm ent e adm inist rando corrent es de 450
volts. Em alguns país es, a taxa chega a alc anç ar 85%. É prec is o acresc ent ar que a
experiênc ia é ext rem am ent e penos a para os prof ess ores, e que eles vivenc iam uma fort e
press ão psic ológic a mas seguem, não obst ant e, até o fim.
Há algo, porém, ainda mais inquiet ant e. No caso de o prof ess or lim it ar-se a
simplesm ent e ler a list a de palavras, enquant o as desc argas são enviadas por out ra
pess oa, mais de 92% dos prof ess ores chegam a conc luir int egralm ent e a experiênc ia.
Ass im, uma organiz aç ão cuja operaç ão é set oriz ada pode-se tornar um cego e tem ível
mec anism o: “Esta é talvez a liç ão fundam ent al de noss o est udo: o com um dos mort ais,
realiz ando simplesm ent e seu trabalho, sem qualquer host ilidade part ic ular, pode-se tornar
o agent e de um proc ess o de dest ruiç ão terrível”.10
Houve quem cons iderass e a hipót es e de que, em tais experim ent os, os prof ess ores
davam livre curs o a pulsões sádic as. Mas essa hipót es e é fals a. Se o pesquis ador se
afast a ou deixa o loc al de experiênc ia, o prof ess or logo dim inui a volt agem das desc argas.
Quando podem esc olher livrem ent e a volt agem, a maioria dos prof ess ores emit e a
volt agem mais baixa poss ível.
A aut oridade do pesquis ador é um fat or fundam ent al. Se já de iníc io o colaborador
pede que pesquis ador troque de lugar cons igo, enc orajando em seguida o prof ess or a
cont inuar a experiênc ia, agora sobre o pesquis ador, suas rec om endaç ões não têm efeit o,
uma vez que ele não está invest ido de qualquer aut oridade.
Quando a experiênc ia envolve dois prof ess ores, um dos quais, atuando em
colaboraç ão com o pesquis ador, abandona prec oc em ent e a experiênc ia, em 90% dos cas os
o out ro prof ess or segue-lhe o exemplo.
Finalm ent e, e é isto o que mais cham a a atenç ão, nenhum prof ess or tent a det er a
experiênc ia ou denunc iar o pesquis ador. A subm iss ão à aut oridade é, port ant o, muit o mais
prof unda do que aquilo que os perc ent uais acim a sugerem. A cont est aç ão se mant ém
soc ialm ent e aceit ável.
Quais conc lusões se podem tirar dess a experiênc ia inúm eras vez es repet ida?
Inic ialm ent e, que exist em técnic as muit o simples que perm it em modif ic ar prof undam ent e
o comport am ent o de adult os norm ais. Em seguida, que ess as técnic as podem ser, e são,
objet o de est udos cient íf ic os aprof undados. Enf im, que seria bast ant e surpreendent e que
tais trabalhos foss em exec ut ados por mero amor à ciênc ia, sem qualquer aplic aç ão
prát ic a.
O conformismo
A tendênc ia ao conf orm ism o foi est udada por Asch,11 em sua célebre experiênc ia.
Ao sujeit o avaliado, apres ent a-se uma linha traç ada sobre uma folha; além dela, três
out ras linhas de comprim ent os divers os. Em seguida, se lhe pede para apont ar, ent re
ess as três linhas, aquela cuja medida é igual à da linha-padrão. Por exemplo: esta últ im a
mede quat ro polegadas, enquant o as linhas que devem ser a ela comparadas medem, cada
qual, três, cinc o e quat ro polegadas. À experiênc ia est ão pres ent es indivíduos ass oc iados
ao pesquis ador, que devem igualm ent e responder à quest ão. Est es, cujo papel real na
experiênc ia é ignorado pelo avaliado, dão, nos ens aios válidos, a mesm a respost a errônea,
combinada ant eriorm ent e à experiênc ia. O indivíduo test ado tem duas alt ernat ivas: ou dar
uma respost a errônea ou se opor à opinião unânim e do grupo. A experiênc ia é repet ida
divers as vez es, com dif erent es linhas-padrão e linhas para comparar. Há ocas iões em que
os colaboradores respondem de modo corret o (ens aios neut ros). Aproxim adam ent e três
quart os dos indivíduos realm ent e avaliados deixam-se inf luenc iar nos ens aios válidos,
dando uma ou várias respost as errôneas. Ass im, 32% das respost as dadas são errôneas,
mesm o que a quest ão não ofereç a, nat uralm ent e, qualquer dif ic uldade. Na aus ênc ia de
pressões, o perc ent ual de respost as corret as chega a 92%. Verif ic a-se também que os
indivíduos conf orm ist as, int errogados após a experiênc ia, depos it aram sua conf ianç a na
maioria, dec idindo-se pelo parec er dest a, apes ar da evidênc ia perc ept iva. Sua mot ivaç ão
princ ipal está na falt a de conf ianç a em si e em seu próprio julgam ent o. Out ros
conf orm aram-se à opinião do grupo para não parec er inf eriores ou dif erent es. Eles não têm
consc iênc ia de seu comport am ent o. Ass im, a perc epç ão de uma pequena minoria de
sujeit os avaliados foi modif ic ada: seus membros enxergaram as linhas tais como a
maioria as desc reveu. Lembrem os que o indivíduo não sof ria qualquer sanç ão caso errass e
ao responder, da mesm a form a que, na experiênc ia de Milgram, ninguém se iria opor a
quem des ejass e abort ar a experiênc ia.
Convém not ar que, se um dos colaboradores dá a respost a corret a, o indivíduo
avaliado ent ão se sent e libert o da press ão psic ológic a do grupo e dá, igualm ent e, a
respost a corret a, res ult ado que ilust ra bem o papel dos grupos minorit ários. A realidade
soc ial, cont udo, é para est es bem menos favorável, uma vez que as pressões ou sanç ões
são aí muit o mais int ens as.
Normas de grupo
A célebre experiênc ia de Sherif12 sobre o efeit o aut oc inét ic o evidenc ia a inf luênc ia
exerc ida por um grupo sobre a form aç ão das norm as e atit udes de seus membros. A
experiênc ia des enrola-se ass im: tendo-se inst alado um indivíduo, soz inho, em uma sala
esc ura, pede-se-lhe que desc reva os movim ent os de uma pequena font e lum inos a, a qual,
na verdade, acha-se imóvel. O sujeit o, não enc ont rando nenhum pont o de ref erênc ia, logo
com eç a a perc eber movim ent os errát ic os (efeit o aut oc inét ic o). Após algum tempo, pass a
a cons iderar que a amplit ude dos movim ent os osc ila em torno de um valor médio, que
varia de indivíduo para indivíduo. Se, ao cont rário, a experiênc ia é realiz ada com vários
indivíduos obs ervando a mesm a font e lum inos a e part ilhando ent re si suas obs ervaç ões,
surge logo uma norm a de grupo à qual todos se conf orm am. No caso de, post eriorm ent e,
um indivíduo ser deixado só, ele perm anec e, ainda ass im, conf orm ado àquela norm a de
grupo. Tendo-se repet ido a experiênc ia, propondo agora ao sujeit o out ras quest ões
ambíguas (est im at ivas de temperat ura, julgam ent os est ét ic os etc.), const at ou-se que,
quant o mais dif íc il era form ular um julgam ent o objet ivo, mais est reit a se faz ia a
conf orm idade à norm a de grupo.
Sherif generaliz a ess es res ult ados até “o est abelec im ent o de norm as soc iais, como
os est ereót ipos, as modas, as convenç ões, os cost um es e os valores”. Int errogando-se
sobre a poss ibilidade de “faz er com que o sujeit o adot e [...] uma norm a presc rit a, dit ada
por inf luênc ias soc iais espec íf ic as”, ele subm et e o indivíduo em test e à inf luênc ia de um
companheiro prest igios o (um univers it ário), e logra obt er que o sujeit o ingênuo modif ique
sua norm a e a subst it ua por aquela do companheiro de mais prest ígio.
Pé na porta
Freedm an e Fras er, em 1966,13 traz em à luz um fenôm eno conhec ido como pé-na-
port a. Trat em os brevem ent e de duas de suas experiênc ias.
Com a prim eira delas, se busc ava conhec er, em funç ão da maneira como era
form ulada a pergunt a, o perc ent ual de donas de casa dispost as a responder a uma enquet e
a respeit o de seus hábit os de cons um o. Est im ando que tal enquet e deveria ser longa e
aborrec ida, som ent e 22% aceit aram dela part ic ipar quando se lhes convidou a isso
diret am ent e. Mas os aut ores, dirigindo-se a uma segunda amost ragem, fiz eram prec eder à
pergunt a um proc ess o preparat ório bast ant e simples: três dias ant es de form ulá-la,
telef onaram aos membros dess e grupo, solic it ando-lhes que respondess em a oito
pergunt as acerc a de seus hábit os de cons um o em mat éria de produt os de limpez a.
Quando, três dias mais tarde, se lhes pediu para que se subm et ess em à mesm a enquet e
que fora feit a com os membros da prim eira amost ragem, a taxa de aceit aç ão elevou-se a
52%. Cham a a atenç ão o fato de que um proc edim ent o tão simples poss ua tam anho
poder.
Port ant o, o princ ípio do pé-na-port a é o seguint e: com eç a-se por pedir ao sujeit o
que faça algo mínim o (ato alic iador), mas que est eja relac ionado ao objet ivo real da
manipulaç ão, que se trat a de algo bem mais import ant e (ato cust os o). Ass im, o sujeit o
sent e-se engajado, ou seja, psic ologic am ent e pres o por seu ato mínim o, ant erior ao ato
cust os o.
Nout ra experiênc ia, os mesm os aut ores dividiram igualm ent e os part ic ipant es em
dois grupos. Os membros do prim eiro não foram subm et idos a qualquer preparaç ão
part ic ular. Aos membros do segundo grupo foi solic it ado que colass em (ato alic iador) um
ades ivo na janela. Pediu-se em seguida aos membros dos dois grupos que inst alass em,
cada qual em seu jardim, uma grande plac a – que chegava a enc obrir parc ialm ent e a
fac hada da casa – a qual rec om endava prudênc ia aos mot orist as. Enquant o o perc ent ual de
aceit aç ão, no prim eiro grupo, foi de apenas 16,7%, no segundo esse perc ent ual atingiu a
marc a de 76%. Ainda, convém not ar que, cont rariam ent e à pesquis a ant erior, nest a, as
duas experiênc ias foram conduz idas por duas pess oas dif erent es.
E não é só isso. A enorm e disparidade ent re ess es perc ent uais, cit ados logo acim a,
foi obt ida nos cas os em que o ades ivo também exort ava os mot orist as à prudênc ia. A
atit ude era a mesm a (ser favorável a uma condut a mais prudent e), tant o no ato alic iador
(fixar um ades ivo) quant o no ato cust os o (inst alar em seu jardim uma plac a sem graç a).
Acont ec e que, mesm o que essa condiç ão não seja atendida, podem-se obt er res ult ados
bast ant e signif ic at ivos. Convidando um terc eiro grupo, não para colar ades ivos que
rec om endass em uma condut a prudent e, mas para ass inar uma pet iç ão para mant er bela a
Calif órnia, os aut ores obt iveram uma taxa de aceit aç ão de 47,4% cont ra – not em os esse
valor – 16,7%, quando a dem anda não foi prec edida de nenhum ato alic iador. Ness e
prot oc olo experim ent al, a atit ude ref erent e a esse ato alic iador (ser favorável à
pres ervaç ão da qualidade ambient al) já não é a mesm a relac ionada ao ato cust os o
(est im ular uma condut a mais prudent e). Da mesm a form a, a nat urez a de um e de out ro
ato, ness e caso, dif erem: ass inar uma pet iç ão redigida por um terc eiro, comport am ent o
pouc o ativo e, de cert a form a, anônim o, não pode ser comparado ao fixar-se, no próprio
jardim, uma plac a de grandes dim ensões, comport am ent o ativo e pers onaliz ado. Ass im,
favorec er as divers as ass oc iaç ões e organiz aç ões não governam ent ais coloc a a populaç ão
no papel – ilus ório – de ator14 e modif ic a suas atit udes, levando-a, em seguida, a
empreender atos cada vez mais cust os os.
“Porta na cara”
Técnic a complem ent ar à prec edent e, a “port a na cara”15 cons ist e em apres ent ar,
de iníc io, um pedido exorbit ant e, que nat uralm ent e será rec us ado, depois do que se
form ula um segundo pedido, ent ão aceit ável. Em uma experiênc ia cláss ic a, Cit aldini et al.
solic it aram a alguns est udant es que acompanhass em, por duas horas, um grupo de jovens
delinquent es em uma vis it a ao zoológic o. Form ulada diret am ent e, essa solic it aç ão obt eve
som ent e 16,7% de aceit aç ão. Ent ret ant o, coloc ando-a após um pedido exorbit ant e, a taxa
elevou-se a 50%. Nat uralm ent e, um “pé na port a” ou uma “port a na cara” podem ser úteis
para se ext orquir um ato cust os o, o qual, por sua vez, cons ist irá em um ato alic iador, no
caso de um próxim o pé na port a. Com tal expedient e, é poss ível obt er comprom et im ent os
cada vez mais signif ic at ivos. Essa técnic a de “bola de neve” é efet ivam ent e aplic ada.
A teoria da diss onânc ia cognit iva, elaborada em 1957 por Fest inger,16 perm it e
perc eber o quant o noss os atos podem inf luenc iar noss as atit udes, crenç as, valores ou
opiniões. Se é evident e que noss os atos, em medida mais ou menos vast a, são
det erm inados por noss as opiniões, bem menos claro nos parec e que o invers o seja
verdadeiro, ou seja, que nossos atos possam modificar nossas opiniões. A import ânc ia
dess a const at aç ão leva-nos a dest ac á-la, para que, a part ir dela, se tornem vis íveis as
raz ões prof undas da ref orm a do sist em a educ ac ional mundial. Verif ic am os ant eriorm ent e
que é poss ível induz ir divers os comport am ent os, apelando-se à aut oridade, à tendênc ia ao
conf orm ism o ou às técnic as do “pé na port a” ou da “port a na cara”. Os fundam ent os que
servem de base a ess es atos induz idos reperc ut em em seguida sobre as opiniões do
sujeit o, modif ic ando-as (dialét ic a psic ológic a). Ass im, enc ont ram o-nos diant e de um
proc ess o ext rem am ent e poderos o, que perm it e a modelagem do psiquism o hum ano e que,
além diss o, const it ui a base das técnic as de lav agem cerebral.
Uma diss onânc ia cognit iva é uma cont radiç ão ent re dois elem ent os do psiquism o
de um indivíduo, sejam eles: valor, sent im ent o, opinião, rec ordaç ão de um ato,
conhec im ent o etc. Não é nada dif íc il provoc ar diss onânc ias cognit ivas. As técnic as de “pé
na port a” e “port a na cara” têm a capac idade de ext orquir a alguém atos em cont radiç ão
com seus valores e sent im ent os. O exerc íc io do poder ou da aut oridade (de um prof ess or,
por exemplo) perm it e que se alc anc e fac ilm ent e o mesm o res ult ado. A “clarif ic aç ão de
valores”, técnic a pedagógic a largam ent e utiliz ada, provoc a, sem qualquer aparênc ia de
coaç ão, diss onânc ias cognit ivas. (Exemplo: você está, em companhia de seu pai e de sua
mãe, a bordo de uma embarc aç ão que nauf raga; há disponível som ent e um colet e salva-
vidas. O que você faz?) A experiênc ia prova que um indivíduo numa sit uaç ão de
diss onânc ia cognit iva apres ent ará fort e tendênc ia a reorganiz ar seu psiquism o, a fim de
reduz i-la. Em part ic ular, se um indivíduo é levado a com et er publicam ente (na sala de
aula, por exemplo) ou frequent em ent e (ao longo do curs o) um ato em cont radiç ão com
seus valores, sua tendênc ia será a de modif ic ar tais valores, para dim inuir a tens ão que
lhe oprim e. Em out ros term os, se um indivíduo foi aliciado a um cert o tipo de
comport am ent o, é muit o provável que ele venha a racionalizá-lo. Convém not ar que,
ness e caso, trat a-se de uma tendênc ia est at íst ic a evident e, e não de um fenôm eno
sist em at ic am ent e obs ervado; as teorias que ref erim os não pret endem res um ir a tot alidade
da psic ologia hum ana, mas sim fornec er técnic as de manipulaç ão aplic áveis na prát ic a.
Dispõe-se, ass im, de uma técnic a ext rem am ent e poderos a e de fác il aplic aç ão, que
perm it e que se modif iquem os valores, as opiniões e os comportam entos e capac it a a
produz ir uma interiorização dos valores que se pret ende inc ulc ar. Tais técnic as requerem
a part ic ipaç ão ativ a do sujeit o, que deve realiz ar atos alic iadores os quais, por sua vez, os
levarão a out ros, cont rários às suas convicç ões. Tal é a just if ic aç ão teóric a tant o dos
métodos pedagógicos ativ os como das técnic as de lavagem cerebral.
“Os mét odos ativos, fundados sobre a part ic ipaç ão, são part ic ularm ent e
apt os a garant ir essa aquis iç ão [de valores úteis].” (Dec laraç ão mundial sobre
a educ aç ão para todos).17
Not em os, de pass agem, pois não seria ocas ião de aprof undar esse aspect o, o papel
fundam ent al des empenhado pelo sent im ent o de liberdade experim ent ado pelo indivíduo
durant e uma experiênc ia. Na aus ênc ia dess e sent im ent o, não se produz qualquer
diss onânc ia cognit iva e, cons equent em ent e, nenhum a modif ic aç ão de valor, já que o sujeit o
tem consc iênc ia de agir sob const rangim ent o e não se sent e minim am ent e engajado.
Ess as cons ideraç ões, bem como out ras sim ilares, no dom ínio da dinâm ic a de grupo, podem
lanç ar uma nova luz sobre import ant es proc ess os polít ic os ocorridos ness es últ im os anos.
Pass em os em revist a algum as experiênc ias ou obs ervaç ões célebres a respeit o da
diss onânc ia cognit iva.
A experiênc ia de Fest inger e Carlsm it h18 pode ser ass im res um ida: num prim eiro
mom ent o, os exam inandos devem realiz ar uma taref a manual repet it iva e ext rem am ent e
tedios a. Em seguida, o pesquis ador – pret ext ando uma indisponibilidade de seu colaborador
– lhes pede que apres ent em a taref a a out ros exam inandos, most rando-a como um
exerc íc io int eress ant e, praz eros o. Para que realiz em essa apres ent aç ão, a uns é oferec ido
um dólar, a out ros são oferec idos vint e dólares. Ao term o da experiênc ia, os indivíduos
dess es dois grupos são test ados, a fim de se conhec er suas atit udes reais em relaç ão
àquela taref a inic ial. Aqueles aos quais foram pagos vint e dólares desc reveram-na como
tedios a, enquant o os dem ais, que rec eberam um dólar, modif ic aram sua cogniç ão
relat ivam ent e à taref a e pass am não som ent e a cons iderá-la int eress ant e e praz eros a,
mas, ainda, most ram-se dispost os a part ic ipar de out ras experiênc ias sem elhant es. Os
prim eiros just if ic am sua ment ira adm it indo haver agido por int eress e na ret ribuiç ão, o que
já não podem faz er os do out ro grupo, aos quais se havia prom et ido um dólar apenas.
Coloc ados em sit uaç ão de diss onânc ia cognit iva, provoc ada pela cont radiç ão ent re sua
perc epç ão inic ial da experiênc ia e o ato que foram levados a com et er (ment ir a respeit o
do carát er da experiênc ia), sent em-se impelidos a reduz ir a diss onânc ia, e a maneira mais
nat ural cons ist e em modif ic ar sua opinião em relaç ão àquela perc epç ão inic ial.
Ass im, uma press ão frac a (oferec er um dólar como prêm io), quer diz er, uma
press ão apenas suf ic ient e para induz ir ao comport am ent o busc ado, tem efeit os cognit ivos
muit o mais ext ens os que uma press ão mais fort e (oferec er vint e dólares). Esse fenôm eno
é bem conhec ido do “menagers”, que não ignoram que os dirigent es que perc ebem salários
menores são mais comprom et idos com o trabalho e na sua relaç ão com a empres a. Da
mesm a form a, os pedagogos puderam const at ar que uma ameaç a frac a, apenas suf ic ient e
para gerar o comport am ent o des ejado, é frequent em ent e mais efic az a longo praz o do que
uma ameaç a mais fort e. Ness e últ im o caso, a crianç a, consc ient e de que cede a uma
fort e press ão, cons erva seu des ejo inic ial, o qual ela deverá sat isf az er logo que poss ível.
Ent ret ant o, no prim eiro caso dá-se o cont rário: a crianç a tenderá a ent rar em diss onânc ia
cognit iva induz ida pela cont radiç ão ent re seu des ejo inic ial e seu comport am ent o efet ivo,
produz ido pela press ão psic ológic a ligada à ameaç a frac a. Exat am ent e como no caso dos
indivíduos subm et idos às experiênc ias de Fest inger e Carlsm it h, impõe-se a nec ess idade
de reduz ir essa diss onânc ia, o que se pode obt er mediant e o expedient e de desvaloriz ar o
comport am ent o proibido. A modif ic aç ão de atit ude e de comport am ent o é ent ão duradoura,
uma vez que, ness e caso, ocorreu uma interiorização da proibição.
Sob o pret ext o de divers if ic ar o menu de um colégio milit ar, inc luíram-se nele
gaf anhot os frit os,19 o que, convém not ar, não agradou a ninguém. Mas a apres ent aç ão
dess a novidade foi realiz ada de duas maneiras divers as: um grupo foi convidado a dela
part ic ipar por um sujeit o simpát ic o, enquant o o segundo grupo foi conf iado a um hom em
des agradável, que tinha mesm o por objet ivo forjar-se numa figura ant ipát ic a, efeit o que
obt inha – a par de out ros rec urs os – ao trat ar seu ass ist ent e de modo gross eiro. Realiz ada
a experiênc ia, const at ou-se que, ent re as pess oas que realm ent e com eram gaf anhot os
frit os, o perc ent ual de membros do segundo grupo que dec lararam haver gost ado era
signif ic at ivam ent e maior que o do prim eiro grupo. Enquant o est es podiam just if ic ar
int eriorm ent e seu ato, já que haviam agido mot ivados pela simpat ia do apres ent ador, os
membros do segundo grupo viram-se obrigados a enc ont rar uma just if ic aç ão do
comport am ent o que lhes fora ext orquido. Para reduz ir a diss onânc ia cognit iva provoc ada
pela cont radiç ão ent re sua avers ão por gaf anhot os frit os e o ato de comê-los, só lhes
rest ava mudar sua opinião a respeit o daquela avers ão.
Contatos extraterrestres
A senhora Keec h,21 fundadora de uma pequena seit a, diz ia rec eber mens agens
ext rat errest res que a inf orm avam sobre a iminênc ia do fim do mundo. Tendo sido
anunc iado o dia da cat ást rof e, convidaram-se os membros da seit a a se reunirem, na
véspera, para serem conduz idos à seguranç a do int erior de um OVNI, que aliás nunc a veio.
Fest inger est udava o grupo e se int eress ava pelo modo segundo o qual seus membros
realiz ariam a reduç ão da diss onânc ia cognit iva após o res ult ado, previs ível, dess e
mom ent o crít ic o. (Com efeit o, sabe-se que é bast ant e signif ic at ivo o invest im ent o
psic ológic o que ocorre em seit as; a diss onânc ia cognit iva que se gera em tais sit uaç ões é
cons iderável.) Tendo já pass ado a hora fat ídic a, a senhora Keec h dec larou ter rec ebido
uma nova mens agem, pela qual era inf orm ada de que a fé e o fervor de seus disc ípulos
haviam perm it ido que a cat ást rof e foss e evit ada. Ent ão est es, subm et idos a uma fort e
diss onânc ia cognit iva, apress aram-se a aceit ar tal explic aç ão, que lhes proporc ionava, a
um cust o baixo, reduz ir aquela diss onânc ia. Além diss o, pass aram ao pros elit ism o, atit ude
que haviam cuidados am ent e evit ado nos dias que prec ederam o dia fat ídic o.
Dramatização
Const at ou-se experim ent alm ent e que uma dram at iz aç ão, em que pese seu carát er
aparent em ent e lúdic o, é capaz de provoc ar diss onânc ias cognit ivas e as subs equent es
alt eraç ões de valor. A ident if ic aç ão ativ a ao papel ass um ido é suf ic ient em ent e fort e para
alic iar o ator. Esse surpreendent e res ult ado é inc ont est ável e firm em ent e est abelec ido. Ao
obrigar os indivíduos a agir em opos iç ão às suas convicç ões, sem const rangê-los
form alm ent e a isso, fac ilit a-se o surgim ent o de diss onânc ias cognit ivas e a cons equent e
organiz aç ão do univers o cognit ivo do ator. A dram at iz aç ão é a base do psic odram a, técnic a
psic ológic a corrent em ent e utiliz ada. Igualm ent e, a dram at iz aç ão const it ui uma das
psic opedagogias ativas mais poderos as e de uso mais com um; é ens inada nos IUFMS, por
exemplo.
Para que as experiênc ias mult ic ult urais dos alunos não sejam deixadas
ao acas o dos enc ont ros, pode-se mesm o sim ular, nas dram atizações, as
quais se inspiram na dinâm ica de grupos, o enc ont ro de pess oas
pert enc ent es a cult uras divers as. Já são propost as est rat égias de ens ino e
técnic as que oferec em aos alunos a poss ibilidade de explorar
sist em at ic am ent e sit uaç ões standard, de exerc er met odic am ent e seu
julgam ent o (o que perm it e desc obrir como func ionam os mec anism os de
julgam ent o), de clarificar os valores que eles enc ont ram ou desc obrem e de
coloc ar à prova os princ ípios das divers as crenç as. Há quem sust ent e que
ess as técnic as podem ser int roduz idas nas esc olas, e que já é hora de fazê-lo;
out ros há que sust ent am opinião cont rária, condenando essa inf lexão do ens ino
para um sent ido subjet ivist a e quas e terapêutico.22
Essa últ im a fras e é um exemplo not ável da dialét ic a utiliz ada const ant em ent e
pelas organiz aç ões int ernac ionais.
Ass inalem os um aspect o frequent em ent e pouc o conhec ido da dram at iz aç ão: a
redaç ão de text os, que se pode levar até à esc rit a de conf issões. Experim ent alm ent e,
provou-se que tais expedient es tem a capac idade de prom over uma mudanç a nas atit udes
de seus aut ores. Sabe-se, além diss o, que eles são part e int egrant e das técnic as de
lavagem cerebral.
As dec isões e disc ussões de grupo, por seu inegável carát er públic o, tem um alto
pot enc ial para prom over o engajam ent o. Elas const it uem uma das mais poderos as técnic as
para int roduz ir diss onânc ias cognit ivas. A terapia de grupo, técnic a psic ot erapêut ic a
cláss ic a, tem nelas um de seus elem ent os const it ut ivos fundam ent ais. Elas são também
utiliz adas pela pedagogia ativa, que frequent em ent e as apres ent a como exerc íc ios de
com unic aç ão. E são ens inadas nos IUFMS.
Claro está que a dinâm ic a de grupos apóia-se ainda sobre out ros elem ent os,
princ ipalm ent e afet ivos, mas não seria pert inent e det alhá-los aqui.
A avaliaç ão23 cons ist e em out ro meio ext rem am ent e efic az para conduz ir à
int erioriz aç ão de valores e de atit udes. Não é poss ível esc larec er os seus fundam ent os
rec orrendo-se a out ras teorias da psic ologia soc ial que não a do engajam ent o. Suas
conc lusões podem ser res um idas em pouc as palavras, diz endo-se que, por forç a do
exercício do poder personificado pelo avaliador, o sujeit o da avaliaç ão é levado a
interiorizar norm as soc iais. Esse proc ess o está na base da reproduç ão soc ial ou – se se
alt era a esc ala da avaliaç ão – da modif ic aç ão de valores. A avaliaç ão form at iva, conf orm e
seu nome indic a, visa express am ent e a ens inar o sujeit o. Quando aplic ada ao dom ínio da
étic a, leva a int erioriz ar valores e atit udes. Sob a form a de aut oavaliaç ão, ela acresc ent a o
engajam ent o do sujeit o à sua avaliaç ão. O est udo das divers as form as de avaliaç ão
(teorias da avaliaç ão) const it ui um component e import ant e da psic opedagogia e do ens ino
dispens ado nos IUFMS.
Import a agora ver como ess as técnic as são utiliz adas no ens ino e, de modo mais
geral, em toda a soc iedade.
8 Noss a sum ária expos iç ão das técnic as de manipulaç ão psic ológic a deverá
bas ear-se princ ipalm ent e sobre três obras relevant es: D. Winn. The Manipulat ed Mind.
London, The Oct agon press, 1984; R.V. Joule, J.L. Beauvois. Soum iss ion et idéologies. Paris,
PUF, 1981; R.V. Joule, J.L. Beauvois. Pet it trait é de manípulat ion à l’usage des honnêt es
gens. Grenoble, Press es univers it aires de Grenoble, 1987.
9 S. Milgram. Soum iss ion à I’aut orit é. Paris, Calm ann-Lévy, 1974.
10 S. Milgram. Obedienc e to Aut hority. New York, Harper & Row, 1974. Cit ado por
Winn, Op. cit., p. 47.
11 S.E. Asch, lnf luenc e int erpers onnelle. Les eff ets de la press ion de groupe sur la
modif ic at ion et la dist ors ion des jugem ents, In: C. Fauc heux, S. Mosc ovic i (eds.).
Psyc hologie soc iale théorique et expérim ent ale. Mout on Edit eur, Paris, 1971, p. 235-245.
12 M. Sherif. lnf luenc es du groupe sur la form at ion des norm es et des att it udes.
In: C. Fauc heux, S. Mosc ovic i (eds.), ibid., p.207-226.
13 Freedm an, J.L., Fras er, S.C. Complianc e wit hout press ure: the foot-in-the-door
tec hnique, Journal of Pers onality and Soc ial Psyc hology, vol. 4, n°2, p.195-202,1966.
14 Levando-a, também ilus oriam ent e, a “int ernaliz ar” o loc al de cont role (loc us of
cont rol).
15 R.B. Cialdini, J.E. Vinc ent, S.K. Lewis, J. Cat alan, D. Wheeler, B.L. Darby,
Rec iproc al conc ess ions proc edure for induc ing complianc e: the door-in-the-face tec hnique,
Journal of Pers onality and Soc ial Psyc hology, vol. 31 , n° 2, p.2O6-215, 1975.
16 L. Fest inger. A theory of cognit ive diss onanc e. Stanf ord Univers ity Press, 1968.
Ver também: Beauvois et Joule. Soum iss ion et idéologies. Op. cit., p. 49 sq.
17 WCEFA, Conf érenc e mondiale sur l’éduc at ion pour tous, 5-9 mars 1990, Jomt ien,
Thaïlande, Déc larat ion mondiale sur l’éduc at ion pour tous, New York, 1990, Unic ef, p. 5.
Essa dec laraç ão e o Plano de ação para sat isf az er as nec ess idades bás ic as de
aprendiz agem, que terem os ocas ião de cit ar ainda várias vez es, foram adot ados
unanim em ent e pelos part ic ipant es da Conf erênc ia mundial sobre educ aç ão para todos.
Organiz ada pelo PNUD, Unesc o, Unic ef e pelo Banc o Mundial, ela reuniu delegados de 155
país es e de vint e organiz aç ões int ergovernam ent ais. Ent re tais país es e organiz aç ões,
enc ont ram-se os seguint es: Bras il, Canadá, China, Franç a, RFA, Índia, Itália, Japão, Reino
Unido, URSS, USA, ONU, FAO, UNICEF, UNESCO, UNHCR, OMS, Com iss ão das com unidades
europeias, OCDE. Nat uralm ent e, esse doc um ent o foi public ado sem nenhum a res erva
acerc a das opiniões expost as por seus aut ores.
18L. Fest inger, J.M. Carlsm it h. Cognit ive cons equenc es of forc ed complianc e,
Journal of Abnorm al Soc ial Psyc hology, 58, p. 203-21 0, 1959. Vers ion franç ais e dans: C.
Fauc heux, S. Mosc ovic i. Psyc hologie soc iale théorique et expérim ent ale. Paris, Mout on
édit eur, 1971.
19Ver: Winn. The Manipulat ed Mind. Op. cit., p. 121.
20E. Arons on, J. Mills. The eff ect of severity of init iat ion on liking for a group, The
Journal of Abnorm al and Soc ial Psyc hology, vol. 59, sept. 1959, n 2, p. 177-181.
21L. Fest inger. A theory of cognit ive díss onanc e. Op. cit., p.252-259.
22OCDE/CERI. L’école et les cult ures. Paris, OCDE, 1989, p. 73. Advert im os para o
fato de que as ret ic ênc ias foram abandonadas desde ent ão. Essa obra foi redigida por um
membro do Sec ret ariado do Cent ro de Pesquis as e Inovaç ão do Ens ino (CERI) da OCDE. Ela
“apres ent a os res ult ados das anális es efet uadas pelo Sec ret ariado dos program as de
ens ino implem ent ados por divers os país es, a fim de responder ao des af io mult ic ult ural,
mult iétnic o e plurilinguíst ic o das soc iedades cont emporâneas” (p. 3). O pref ác io dess e
doc um ent o é de aut oria do diret or do CERI.
23 Beauvois et Joule. Soum iss ion et idéologies, Op. cit., p. 162 sq.
CAPÍT ULO II
A APLICAÇÃO DA PSICOLOGIA
SOCIAL NA EDUCAÇÃO
Educ ar e form ar24 foi public ado em 1989 por Jean-Marc Mont eil, prof ess or de
Psic ologia na Univers idade de Clerm ont-Ferrand, onde dirige o laborat ório de Psic ologia
Soc ial. Sua obra busc a “propor aos doc ent es, aos educ adores, aos respons áveis pela
form aç ão, algum as orient aç ões para a ação, e, aos est udant es e pesquis adores em
Ciênc ias Soc iais e Hum anas, uma font e de inf orm aç ão útil”.25 O objet o de tal trabalho
cons ist e, port ant o, na educ aç ão, e nele podem os enc ont rar, com proveit o para a noss a
invest igaç ão, as técnic as expost as no capít ulo ant erior.
Tal como nas sit uaç ões desc rit as no capít ulo ant erior, o foco aqui são as
dispos iç ões, as cogniç ões, as perc epç ões etc.: “Por trás dess es jogos de inf luênc ias, o que
se busc a é a mudanç a das dispos iç ões e dos comport am ent os, a modif ic aç ão das
cogniç ões do sujeit o” (p. 118).
“Os proc ess os de inf luênc ia soc ial podem ser def inidos, em sua acepç ão
mais espec íf ic a, como proc ess os que regem as modif ic aç ões de perc epç ões,
juíz os, opiniões, dispos iç ões ou comport am ent os de um indivíduo, modif ic aç ões
ess as provoc adas por seu conhec im ent o das perc epç ões, juíz os, opiniões, etc.
de out ros indivíduos.” (Dois e,26 1982, p. 87) (p. 116).
O capít ulo seguint e exam ina alguns fundam ent os das mudanç as de atit udes, de
opiniões, de crenç as, de comport am ent os ou de condut as; def ront arem os ent ão a
complexidade dos proc ess os de inf luênc ia soc ial, sua variedade, e as múlt iplas vias pelas
quais se est abelec em novas opiniões, atit udes ou condut as (p.11).
“Cons equent em ent e, compreende-se fac ilm ent e o int eress e em modif ic ar
a atit ude de uma pess oa se houver a int enç ão, em relaç ão a tal ou qual objet o,
de vê-la adot ar uma nova condut a.” (p. 127).
As técnic as utiliz adas são aquelas obt idas através da psic ologia soc ial. O aut or se
apóia princ ipalm ent e sobre trabalhos já cit ados aqui: a experiênc ia de Sherif sobre as
norm as de grupo (p. 118), os trabalhos de Asch sobre a conf orm idade (p. 119), os
trabalhos de Fest inger, Beauvois e Joule sobre a diss onânc ia cognit iva (p. 133) e os de
Kiesler sobre o engajam ent o (p. 142). As técnic as cláss ic as de manipulaç ão são
det alhadas: engajam ent o, diss onânc ia cognit iva, dinâm ic a de grupo (cap. 4), inf luênc ia do
prest ígio (p. 122), dram at iz aç ão.
Não haveria como mudar de tema ao mudar de rubric a. Com efeit o, é sempre de
inf luênc ia e de proc ess os de inf luênc ia que irá se trat ar, mas nos aplic arem os aqui a um
component e part ic ular do alvo de inf luênc ia: a atit ude (p. 126).
Dito sem rodeios, o sujeit o adere à sua dec is ão e, ass im, quant o maior o seu
engajam ent o em um comport am ent o, tant o “maior será a mudanç a de atit udes caso o
comport am ent o divirja das convicç ões ant eriores do sujeit o, e tant o maior será a
res ist ênc ia às propagandas ult eriores caso esse comport am ent o conc orde com as opiniões
prévias...” (Kiesler27, 1971, p.32). Que me perdoem a express ão taut ológic a, mas o
engajam ent o nos engaja.
Out ro pont o import ant e a ser aqui apres ent ado ao leit or para a boa compreens ão
dos propós it os que se seguirão cons ist e no fato de que alguns fat ores perm it em manipular
o engajam ent o: o carát er explíc it o do ato, sua import ânc ia, seu grau de irrevogabilidade, o
núm ero de vez es em que foi realiz ado, e, sobret udo, o sent im ent o de liberdade quando de
sua realiz aç ão (p. 143).
Nos dois exemplos esc olhidos, os indivíduos foram induz idos a prat ic ar uma
condut a cust os a em um cont ext o de liberdade. Ass im, as circ unst ânc ias seriam
aparent em ent e alic iant es a pont o de conduz ir um indivíduo a manif est ar comport am ent os
cont rários às suas convicç ões ou mot ivaç ões; comport am ent os aos quais lhe será
nec ess ário fornec er just if ic aç ões. Também se compreende que, engajado pelas
circ unst ânc ias, um indivíduo poss a, hoje, enxergar virt udes onde ant es não as via.
Apoiado sobre elem ent os dess a nat urez a, Joule logra dem onst rar, por via
experim ent al, que uma sit uaç ão de subm iss ão, ass oc iada a um sent im ent o de liberdade,
conduz os sujeit os a se engajar em um ato e, ult eriorm ent e, os impele a uma
rac ionaliz aç ão cognit iva ou a uma rac ionaliz aç ão em ato. Fenôm eno que most ra “que é por
um novo ato que os exam inandos cons eguem rec obrar algum equilíbrio cognit ivo, equilíbrio
esse abalado pela realiz aç ão de um prim eiro comport am ent o de subm iss ão... sendo a
funç ão prim eira de um tal fenôm eno a de faz er aparec er como rac ional um
comport am ent o ou uma dec is ão problem át ic a” (Joule,28 1986, p. 351). Enf im, como se
obs erva, as circ unst ânc ias reais ou habilm ent e manipuladas são capaz es de des enc adear
comport am ent os cont rários às noss as convicç ões e, port ant o, de nos levar a modif ic ar
noss as pos iç ões inic iais para conf orm á-las às noss as condut as.
O conjunt o dess es dados sugere, pois, de maneira ass az evident e, o peso não
negligenc iável das circ unst ânc ias e das sit uaç ões sobre a exec uç ão dos noss os
comport am ent os, sobre as cogniç ões que em seguida const ruím os e sobre os
comport am ent os fut uros que delas surgem como cons equênc ia (p. 145).
A educação
Rec ordem os que essa obra, int it ulada Educ ar e form ar, dirige-se aos doc ent es, aos
educ adores e aos respons áveis pela form aç ão. As técnic as dest ac adas abaixo são, dess e
modo, apres ent adas para fins explic it am ent e educ at ivos:
A abordagem educ at iva, nec ess ariam ent e pragm át ic a, deveria, parec e-
me, poder utilm ent e se inspirar em uma conc epç ão dess a nat urez a [que
ult rapass a “a ordem fict íc ia das aparênc ias, (...) para esc larec er as cam adas
dess e proc ess o”29 de inf luênc ia soc ial]. Trat ando-se igualm ent e dos jogos de
inf luênc ia esperam os ter-lhes ao menos fornec ido o gost o. (p. 126).
Ora, tais dinâm ic as [de des envolvim ent o e de mudanç as individuais e
colet ivas] est ão, enquant o objet o de est udos, inst aladas no coraç ão da
atividade cient íf ic a dos psic ólogos soc iais. Por isso, parec e-me que nada
impede, ant es o cont rário, de fornec er aos atores da educ aç ão, a todos os
atores da educ aç ão, saberes fundados sobre o indivíduo enquant o ser
soc ialm ent e ins erido e sobre os comport am ent os que det erm inam ou que
dec orrem dess as ins erç ões (p. 10).
Se tom arm os, por exemplo, as pedagogias não diret ivas, os trabalhos
conduz idos no cont ext o da teoria do engajam ent o as rec onduz em ao que elas
sem dúvida não deixaram jam ais de ser: a aplic aç ão cam uf lada de uma
diret riz que, em cert a époc a, tínham os algum a dif ic uldade para adm it ir
abert am ent e (p. 198).
Enf im, o aut or não se esquec e de acresc ent ar algum as palavras sobre a form aç ão
dos doc ent es:
Para a efic ác ia de sua ação, o prof iss ional [de educ aç ão ou form aç ão]
deve, pois, cons iderar, sim ult aneam ent e ou suc ess ivam ent e, abordagens
divers as. Uma tal condut a supõe, para que tenha algum a chanc e de suc ess o, a
adm iss ão e a ass im ilaç ão da ideia de um prof iss ional cont inuam ent e
inf orm ado sobre os des envolvim ent os das disc iplinas que est ão relac ionadas
com seu set or de atividade. Essa atit ude não ocorre sem embaraç os: ela
impõe pos iç ões drást ic as que cons ist em em cons iderar como nec ess ária a
vont ade, por part e do prof iss ional, de mant er-se inf orm ado, a vont ade dos
pesquis adores de venc er as próprias ret ic ênc ias, de dif undir o mais ampla e
acess ivelm ent e poss ível os saberes que eles produz em. Essa atit ude impõe,
ainda, às respect ivas inst it uiç ões , o coloc arem em prát ic a uma verdadeira
polít ic a de form aç ão prof iss ional cont ínua. Parec e que ainda est am os,
inf elizm ent e, ass az longe de uma tal sit uaç ão. Sem des esperar do tempo,
convém, todavia, que não nos abandonem os a ele (p. 28).
Desde que ess as linhas foram esc rit as (1989), os IUFMS foram criados para
preenc her essa lac una. Eles agora abarc am, além dos doc ent es do set or públic o, um
grande núm ero dos do set or privado.
24 Eduquer et form er, J.M Mont eil, Grenoble, Press es univers it aires de Grenoble,
1990.
25 Cit ado na segunda part e da orelha do livro.
26 W. Dois e, L’explic at ion en psyc hologie soc iale, Paris, PUF, 1982.
27 C.A. Kiesler, The psyc hology of comm itm ent experim ents linking behavior to
belief, New York, Academ ic Press, 1971.
28 R.V. Joule, Rat ionalis at ion et engagem ent dans la soum iss ion librem ent
cons ent ie, Thès e de doct orat d’état, Univers it é de Grenoble, 1986.
29 S. Mosc ovic i, Psyc hologie soc iale, Paris, PUF, 1984, p. 166.
CAPÍT ULO III
A UNESCO, A EDUCAÇÃO E O
CONTROLE PSICOLÓGICO
Em 1964, a Unesc o public ou um import ant e trabalho, int it ulado A modif ic aç ão das
atit udes.30 Em princ ípio, tal obra trat a das atit udes int ergrupos – rac iais, religios as e
étnic as –, mas as técnic as ali desc rit as, as mesm as que vim os ant eriorm ent e, são
perf eit am ent e aplic áveis a vários out ros dom ínios, como o aut or mesm o rec onhec e. Após
haver desc rit o a experiênc ia de Sherif sobre as norm as de grupo, acresc ent a:
No que conc erne à form aç ão e à modif ic aç ão das atit udes da soc iedade
em geral, os corolários dos res ult ados acim a menc ionados são evident es (p.
24; grif o noss o).
Igualm ent e, tendo desc rit o uma experiênc ia de Brehm e Cohen, ele ass evera que:
Os corolários dess es res ult ados, para a modif ic aç ão das atit udes no
plano da vida da soc ial, são evident es (p. 40).
Ass im, não é por acas o que esse trabalho se int it ule A modif ic aç ão das atit udes, e
não A modif ic aç ão das atit udes int ergrupos. A ext ens ão do campo de aplic aç ão dess as
técnic as de manipulaç ão psic ológic a, que atualm ent e abrange o sist em a educ ac ional
franc ês, just if ic a a import ânc ia que dam os a tal obra. Convém fris ar noss a int enç ão: não é
o objet ivo dess a public aç ão – o aperf eiç oam ent o das relaç ões int ergrupos – que
denunc iam os, mas sim os mét odos empregados para obt er esse res ult ado, susc et íveis de
ser utiliz ados para fins muit o divers os, conf orm e já vim os e volt arem os a ver. Adem ais, a
filos of ia polít ic a claram ent e manipulat ória que fundam ent a tais prát ic as press upõe um
desprez o abs olut o pela liberdade e dignidade hum anas e pela dem oc rac ia. Ver-se-á que o
aut or visa explic it am ent e à dif us ão das técnic as de manipulaç ão psic ológic a nas esc olas.
Compreende-se fac ilm ent e que um dispos it ivo ass im, uma vez est abelec ido, poderá ser
aplic ado para mudar as “atit udes soc iais em geral”, ao arbít rio dos int eress es dos
governant es. E, de fato, as public aç ões das organiz aç ões int ernac ionais disc orrem
frequent em ent e sobre a modif ic aç ão de atit udes étic as, cult urais, soc iais, polít ic as e
espirit uais.
O pref ác io (não ass inado) dess a obra proc ede claram ent e da Unesc o. Lê-se aí, em
part ic ular:
A Unesc o, que pers evera na sua ação em favor dos direit os do hom em e
que, ainda, part ic ipa com trabalhos cient íf ic os na luta cont ra o prec onc eit o e a
disc rim inaç ão, já há tempos cons idera a import ânc ia que tem o est udo da
modif ic aç ão das atit udes para as atividades educ at ivas que vis em a combat er
todas as form as de disc rim inaç ão. [...] Dr. Davis é membro do Depart am ent o
de Psic ologia da Univers idade de Illinois, onde ele exerc e as funç ões de
prof ess or e de pesquis ador. Após espec ializ ar-se em psic ologia soc ial e em
saúde ment al – aí compreendidos os aspect os pedagógic os dess as disc iplinas
–, tem-se dedic ado a pesquis as sobre a modif ic aç ão das atit udes em esc ala
int ernac ional (p. 3; grif o noss o).
Fras es bast ant e signif ic at ivas, que condens am em pouc as palavras os seguint es
tem as: modif ic aç ão de atit udes em esc ala int ernac ional, Pedagogia e Educ aç ão, Psic ologia
Soc ial. Algum as linhas adiant e, o mesm o pref ác io acresc ent a (um pont o cuja import ânc ia
tornar-se-á mais evident e adiant e nest e capít ulo):
Ainda que o cont eúdo do pres ent e invent ário implique unic am ent e, claro
está, a respons abilidade de seu aut or, que de modo algum é o port a-voz ofic ial
da Unesc o, o Sec ret ariado est im a que a import ânc ia das pesquis as
soc iopsic ológic as em quest ão bast a para just if ic ar a public aç ão dest e trabalho,
o qual, poss ivelm ent e, cons ist irá em um est ím ulo aos espec ialist as de
dif erent es áreas a dar pross eguim ent o às suas pesquis as ou, talvez, a
empreender novas (p. 3; grif o noss o).
Podem os port ant o conc luir que, inc ont est avelm ent e, poss uím os
conhec im ent os cuja aplic aç ão generaliz ada nos perm it e atingir noss os
objet ivos, a saber: aperf eiç oar as atit udes int ergrupos e as relaç ões ent re
grupos. Evident em ent e, a quest ão que se coloc a é a de saber como se podem
aplic ar ess es mét odos em larga esc ala. [...]
Pode-se ent ão diz er que poss uím os, pelo menos, vários dess es
conhec im ent os nec ess ários, mas que o que import a é tornar tais
conhec im ent os fac ilm ent e acess íveis, bem como ass egurar a sua aplic aç ão.
Esse proc ess o não se dará sem dif ic uldades, mas tais dif ic uldades não são
ins uperáveis (págs. 48-49).
Os est udos orient ados para a com unidade, os quais levam em cont a
esse fato [a tendênc ia à conf orm idade aos cost um es est abelec idos], vis am à
“rec onvers ão”, em cert o sent ido, de com unidades int eiras, nas quais é
nec ess ária a modif ic aç ão das norm as e das prát ic as est abelec idas, a fim de
aperf eiç oar as atit udes int ergrupos e de coloc ar todos os grupos em pé de
igualdade. Para tant o, faz-se nec ess ário apelar ao auxílio de polít ic os, de
líderes com unit ários, de emiss oras de rádio, da imprens a loc al e de out ros
“form adores de opinião”, a fim de provoc ar as mudanç as na com unidade
int eira (p. 55).
Não se poderia chegar a tais res ult ados, a uma modif ic aç ão de atit udes e de
comport am ent os em esc ala int ernac ional, sem coloc ar em prát ic a técnic as conf irm adas
cient if ic am ent e; tal é, efet ivam ent e, a pos iç ão def endida pelo aut or:
[...] pois, ass im como noss o mundo tecnológic o seria inc onc ebível sem o
progress o das ciênc ias, exat as e nat urais, do mesm o modo parec e evident e
que as ciênc ias soc iais têm um papel import ant e a des empenhar na res oluç ão
dos problem as hum anos de noss a époc a (p. 7).
Ent ret ant o, várias dess as quest ões, oriundas dos res ult ados de pesquis as
experim ent ais, repres ent am não som ent e um int eress e teóric o, mas, além
diss o, implic aç ões, de grande int eress e prát ic o para a tom ada de dec isões de
ordem geral, que dem andam program as de ação. Port ant o, trat arem os aqui,
brevem ent e, de alguns problem as teóric os levant ados por pesquis as rec ent es,
e de suas implic aç ões prát ic as.
Não se lim it ando a est udar os num eros os fat ores ass oc iados à
modif ic aç ão de atit udes, vários pesquis adores conc ent raram-se também na
quest ão do proc ess o mesm o de mudanç a, ou seja, na teoria da modif ic aç ão de
atit udes. Ent re as teorias relat ivam ent e rec ent es que têm est im ulado as
pesquis as, enc ont ra-se a da “diss onânc ia cognit iva”, de Fest inger (1957) (p.
39).
Além dos já cit ados trabalhos de Fest inger e de Sherif, o aut or apoia-se sobre os
de Asch (p. 20 e 24) e de Lewin (p. 26). As técnic as cláss ic as de manipulaç ão psic ológic a
são requis it adas: dram at iz aç ão ou psic odram a, manipulaç ão de grupos etc.:
Um dos corolários da teoria de Fest inger é o fato de que uma dec laraç ão
ou ação públic as em des ac ordo com a opinião privada do sujeit o podem gerar
nele uma diss onânc ia cognit iva e, ass im, em divers os cas os, acarret ar uma
modif ic aç ão de atit ude. Janis e King (1954, 1956) dem onst raram que os
exam inandos, quando levados a des empenhar uma atividade psic odram át ic a
em des ac ordo com sua opinião privada, podem sof rer, por caus a dess e
comport am ent o, uma modif ic aç ão de atit ude. Ass im, um psic odram a
improvis ado tende a ser mais efic az que um psic odram a det erm inado
previam ent e (p. 40).
Out ras provas dess a res ist ênc ia [a se deixar inf luenc iar pelos mét odos
de int rospecç ão] foram apres ent adas por Culberts on (1955) em um est udo
sobre a modif ic aç ão de atit udes de base afet iva mediant e o psic odram a. Esse
aut or desc obriu que o psic odram a const it ui um meio geralm ent e mais efic az
para modif ic ar tais atit udes (p. 19).
A experiênc ia esc olar pode des empenhar um papel capit al, ao
des envolver part ic ularm ent e aqueles aspect os da pers onalidade relac ionados às
int eraç ões soc iais da crianç a. A aplic aç ão das pesquis as sobre grupos
apres ent a igualm ent e uma import ânc ia part ic ular, uma vez que, como se sabe,
o proc ess o educ ac ional não cons ist e apenas na transm iss ão de inf orm aç ões,
mas se trat a, mais do que isso, de um fenôm eno alt am ent e complexo de
dinâm ic a de grupo, no qual int ervêm as relaç ões, de dif íc il anális e, ent re aluno
e prof ess or, e sobret udo ent re o aluno e seus pares. Na medida em que o
grupo de pares repres ent a para a crianç a um quadro de ref erênc ia, ele
cont ribui em larga medida para a modif ic aç ão das atit udes soc iais (p. 45).
São ess es fenôm enos de dinâm ic a de grupo e a manipulaç ão psic ológic a que lhes
parec em just if ic ar, como impresc indível, a int roduç ão das psic opedagogias.
Ao leit or dec ert o não esc apou o expedient e de rec rut am ent o das fam ílias, ao qual
faz eco esta out ra cit aç ão:
No que conc erne às relaç ões ent re pais e filhos, enc ont ram o-nos diant e
do seguint e problem a: para conduz ir as crianç as de modo a aperf eiç oar as
relaç ões ent re grupos, nec ess ário seria com eç ar pela modif ic aç ão de seus pais
(p. 45).
Porém, mais que dispos iç ões e comport am ent os, são os valores, que
fundam ent am um e out ro, que devem ser subvert idos:
Os teóric os modernos da educ aç ão compreenderam que a transm iss ão
de inf orm aç ões, por si só, não é suf ic ient e para que se atinjam os objet ivos da
educ aç ão, mas que a tot alidade da pers onalidade e, part ic ularm ent e, a sit uaç ão
de grupo inerent e ao proc ess o de aprendiz agem poss uem uma import ânc ia
capit al. Kurt Lewin, um dos grandes pioneiros da pesquis a e da ação
combinadas no campo da dinâm ic a de grupos, cont ribuiu muit o, junt o com
seus colaboradores, para dar à pedagogia essa nova orient aç ão. Ele salient ou a
nec ess idade de se cons iderar a educ aç ão como um proc ess o de grupo: o
sent im ent o, experim ent ado pelo indivíduo, de part ic ipar da vida de um grupo é,
segundo Lewin, de uma import ânc ia fundam ent al para a aquis iç ão de ideias
novas. Ele esc reveu31 (1948, p. 59): “Cons ideram os muit o import ant e que o
proc ess o de reeduc aç ão se dê numa atm osf era de liberdade e de
espont aneidade: é de vont ade própria que o indivíduo part ic ipa das sessões,
isent as, aliás, de todo form alism o; ele deve sent ir-se livre para express ar
suas crít ic as, em seguranç a afet iva e livre de qualquer press ão. Se a
reeduc aç ão signif ic a o est abelec im ent o de um novo superego, dec orre daí
nec ess ariam ent e que os objet ivos vis ados só serão atingidos quando a nova
série de valores aparec er ao indivíduo como algo que ele tenha esc olhido
livrem ent e” (p. 47).
Compreende-se fac ilm ent e, port ant o, a avers ão manif est ada por muit os daqueles
quem veem o noss o sist em a educ ac ional ser invadido pelas psic opedagogias: uma
mudanç a de valores const it ui uma revoluç ão – psic ológic a – muit o mais prof unda que uma
revoluç ão soc ial.
A educação
Às cit aç ões ant eriores, que fart am ent e dem onst raram o papel que alguns
pret endem para as ciênc ias soc iais na manipulaç ão psic ológic a das populaç ões,
acresc ent em os ainda as seguint es, que trat am part ic ularm ent e da educ aç ão:
Em sua [Adorno et al.] opinião, os res ult ados de suas pesquis as
poderiam ser aplic ados à educ aç ão, à pueric ult ura e às atividades de grupo que
se inspiram nos princ ípios da psic ot erapia colet iva (p. 16).
Os efeit os sobre os sist em as educ ac ionais subm et idos a tais inf luênc ias são,
nat uralm ent e, os já esperados:
Res um indo os efeit os da educ aç ão sobre o prec onc eit o, a disc rim inaç ão
e a aceit aç ão do fim da segregaç ão rac ial no sul dos Est ados Unidos, Tum in,
Bart on e Burrus (1958) ass everam que um aum ent o de inst ruç ão tende a
produz ir desloc am ent os perc ept íveis:
a) do nac ionalism o ao int ernac ionalism o, no plano polít ic o;
b) do tradic ionalism o ao mat erialism o, no plano da filos of ia soc ial geral;
c) do sens o com um à ciênc ia, como font es de provas aceit áveis;
d) do cast igo à rec uperaç ão, na teoria dos regim es penit enc iários;
e) da violênc ia e da ação diret a à legalidade, como meios polít ic os;
f) da severidade à tolerânc ia, em mat éria de educ aç ão inf ant il;
g) do sist em a pat riarc al à igualdade dem oc rát ic a, em mat éria de relaç ões
conjugais;
h) da pass ividade ao ímpet o criador, no que diz respeit o aos divert im ent os e
ao laz er.
Esse res um o parec e indic ar que a educ aç ão provoc a uma larga e
prof unda modif ic aç ão das atit udes soc iais em geral, num sent ido que deve
cont ribuir ao est abelec im ent o de relaç ões const rut ivas e sadias ent re os
grupos (p. 46; grif o noss o).
Imposs ível const at ar mais claram ent e que o que aí se busc a é, na realidade, uma
“larga e prof unda modif ic aç ão das atit udes soc iais em geral”, uma vez que dif ic ilm ent e se
ent ende de que modo uma simples educ aç ão dest inada a aperf eiç oar as relaç ões
int ergrupos poderia provoc ar essa “larga e prof unda modif ic aç ão das atit udes soc iais em
geral”. Not em os, cont udo, para rest abelec er a verdade, que não é um aum ent o da educ aç ão
que leva ao mundialism o, ao mat erialism o e à perm iss ividade – o que conduz a isso é um
aum ent o da educ aç ão revoluc ionária. Teria esquec ido o aut or que os séc ulos pass ados
puderam cont ar com hom ens erudit os, cuja cult ura, essa sim aut ênt ic a, nada tinha que
invejar às produç ões de Jack Lang?
Por fim, a quest ão da form aç ão dos educ adores é trat ada ext ens ivam ent e:
As ideias pess im ist as de vários aut ores sobre a efic ác ia da educ aç ão
como um meio de aperf eiç oar as relaç ões ent re grupos [e as atit udes soc iais
em geral, como acabam os de ver] just if ic am-se desde que se fique lim it ado à
conc epç ão tradic ional de educ aç ão e que, nela, note-se tão-som ent e o aspect o
da com unic aç ão de inf orm aç ões. Mas não há quem se oponha a que os
conhec im ent os modernos sejam inc ulc ados ao educ ador a fim de lhe perm it ir
um des empenho mais efic az de sua taref a. Isso não quer diz er que todos os
prof ess ores devam rec eber uma form aç ão de psic ólogo, de soc iólogo etc., mas
sim que os princ ípios fundam ent ais da Psic odinâm ic a, da dinâm ic a de grupo e
da Soc iologia bem poderiam figurar no program a de sua form aç ão. Seria
poss ível – ainda que isso não seja o ess enc ial de noss a propost a – apres ent ar
os res ult ados das pesquis as sob uma form a apropriada, que as tornass e
int eligíveis aos educ adores que poss uem um conhec im ent o técnic o lim it ado da
pesquis a soc iológic a. É claro que, além diss o, seria poss ível dar uma
import ânc ia maior, nos program as das esc olas norm ais, às disc iplinas que se
relac ionam diret am ent e à quest ão do aperf eiç oam ent o das relaç ões ent re
grupos. Wats on32 (1956, p. 309) diz com muit a propriedade: “Import a é
trat arm os, não de modest os acrésc im os ao noss o atual program a de ens ino,
mas sim de transf orm aç ões prof undas em noss o plano de est udos, em noss o
modo de seleç ão de prof ess ores e em toda noss a conc epç ão de ens ino públic o.
Devem os ref let ir sobre a nec ess idade, para todos os dirigent es da área da
educ aç ão, de uma reorient aç ão e de compet ênc ias de ordem polít ic a” (p. 47).
Totalitarismo?
Em sua experiênc ia de form aç ão [nas esc olas norm ais], Tausc h utiliz ou
divers as noç ões próprias da Psic ologia Colet iva não Diret iva (Rogers,33 1951) e
dem onst rou que tais princ ípios são aplic áveis no dom ínio da educ aç ão. Da
mesm a form a, Wieder34 (1951) dem onst rou a aplic abilidade dos mét odos de
terapia colet iva em um “est udo comparat ivo da efic ác ia de dois mét odos de
ens ino da Psic ologia, cada curs o com 30 horas de duraç ão, para a modif ic aç ão
das atit udes ass oc iadas ao prec onc eit o rac ial, religios o ou étnic o”. Enquant o o
mét odo tradic ional, de expos iç ão seguida de disc uss ão, não alc anç ou modif ic ar
de modo signif ic at ivo as atit udes int ergrupos, um segundo mét odo, valendo-se
dos princ ípios da terapia colet iva, das técnic as não diret ivas e do soc iodram a,
favorec eu uma abert ura pess oal (des envolvim ent o da int uiç ão, maior aceit aç ão
de si, reduç ão das atit udes ligadas ao prec onc eit o rac ial, religios o ou étnic o)
(p. 48).
Lembrem os que não são apenas as atit udes int ergrupos que se busc a modif ic ar,
mas sim as atit udes soc iais em geral. Por out ro lado, conhec endo a forç a e o tenaz
enraiz am ent o dos prec onc eit os rac iais, religios os ou étnic os, que, não obst ant e, o poder
dos mét odos de manipulaç ão psic ológic a empregados logram sujeit ar, não há como deixar
de experim ent ar a mais viva inquiet aç ão, ao ver ess as mesm as técnic as empregadas
cont ra atit udes em geral menos fort em ent e enraiz adas, como as atit udes polít ic as,
econôm ic as, soc iais, ecológic as, étic as etc.
A manipulação da cultura
Toda revoluç ão psic ológic a requer uma revoluç ão cult ural. Post eriorm ent e,
ret om arem os det alhadam ent e esse ass unt o, cons iderando o quant o o sist em a educ ac ional
transf orm ou-se em um dos mais import ant es veíc ulos da revoluç ão cult ural. Em todo
caso, o aut or nos dá indic aç ões que merec em ser aprec iadas desde já:
O fato de que a cult ura e a soc iedade, em seu conjunt o, sejam um fat or
muit o import ant e na form aç ão, na cons ervaç ão e/ou na modif ic aç ão das
atit udes soc iais é uma evidênc ia à qual já nos ref erim os divers as vez es. Mas
em que medida os program as de ação prát ic a são realiz áveis, uma vez que
seu combat e se des enrola numa frent e tão vast a? Como se pode modif ic ar
uma cult ura, que repous a sobre tradiç ões sec ulares, ou ref orm ar toda uma
soc iedade? Sem dúvida, é dif ic ilm ent e imaginável que uma só pess oa ou
mesm o um pequeno grupo de pess oas poss a mudar complet am ent e, do dia
para a noit e, uma soc iedade moderna, de est rut ura dem oc rát ic a e pluralist a.
Por out ro lado, não é improvável que, mediant e esf orç os conc ret os e com a
aplic aç ão de conhec im ent os modernos, grupos de indivíduos poss am acelerar a
evoluç ão soc ial de maneira a redim ir cert os “atras os cult urais”, nem se pode
diz er que tais grupos não devam empreender tal ação (p. 57; grif o noss o).
Os est udos que acabam os de ref erir ilust ram simplesm ent e o fato de
que as mais import ant es mudanç as de atit ude e de comport am ent o no
conjunt o de uma soc iedade são poss íveis ao final de um cert o tempo.
Poderíam os cit ar muit os out ros cas os que conf irm am essa conc lus ão. Ess as
modif ic aç ões são o res ult ado cum ulat ivo dos esf orç os combinados de divers as
pess oas e organiz aç ões que utiliz am modos e mét odos dif erent es de
abordagem. Mas a quest ão que aqui nos int eress a saber é: em que medida é
poss ível agir sobre o conjunt o de uma soc iedade? Não nos seria poss ível, por
ora, exam inar em seus det alhes os vast os problem as de teoria soc ial
levant ados por essa quest ão, mas gost aríam os de ass inalar alguns mét odos
aplic áveis ness e nível. Não há dúvida de que, por exemplo, as dec laraç ões
públic as de alt as pers onalidades do governo e de out ros dirigent es cuja opinião
é respeit ada pela populaç ão podem exerc er uma enorm e inf luênc ia sobre as
atit udes e o comport am ent o dess a populaç ão. As medidas de ordem legislat iva
oferec em à soc iedade um out ro meio, um pouc o mais coerc it ivo, de exerc er
sua vont ade sobre os indivíduos que a compõem. Do mesm o modo, aquelas
forç as econôm ic as que agem sobre o conjunt o da soc iedade des empenham um
papel capit al na vida quot idiana dos indivíduos, condic ionando, ass im, suas
atit udes e seu comport am ent o. Por fim, menc ionarem os alguns dos grandes
problem as ligados ao emprego dos meios de inf orm aç ão, os quais const it uem
um dos princ ipais veíc ulos dos quais a soc iedade se utiliz a para com unic ar, a
seus membros, sua norm as cult urais e o comport am ent o que deles ela espera
(p. 58).
Porém, se cons ideram os os meios de inf orm aç ão, sob um ângulo mais
vast o, como inst rum ent os que perm it em à soc iedade modif ic ar as atit udes
dos indivíduos num sent ido des ejado, import a exam inar a quest ão relat iva à
int enç ão que orient a o emprego dos meios de com unic aç ão; dito de out ra
form a: trat a-se de saber quem dispõe dess es meios. Evident em ent e, essa
quest ão é bast ant e delic ada, e traz cons igo import ant es implic aç ões polít ic as,
que não irem os ponderar aqui. De qualquer modo, cabe-nos obs ervar que tal
quest ão não pode ser negligenc iada indef inidam ent e (p. 59).
A quest ão do emprego dos meios de com unic aç ão como inst rum ent os de
modif ic aç ão de atit udes coloc a, por si só, problem as gerais que convém sejam
cons iderados a part ir do pont o de vist a do conjunt o da soc iedade ou da cult ura
(p. 29).
30 E.E. Davis, La modif ic at ion des att it udes, Rapport et doc um ents de scienc es
soc iales, n° 19, Paris, Unesc o, 1964.
31K. Lewin, Res olving soc ial conf licts, New York, Harper Bros, 1948.
32 G. Wats on, Educ at ion and int ergroup relat ions, Columbia Teac hers College
Rec ord, 57, p. 305-9, 1956.
33 C.R. Rogers, Client-cent ered therapy: its current pract ic e, implic at ions and
theory. Bost on, Hought on, 1951.
34 G.S. Wieder, A comparat ive study of the relat ive eff ect iveness of two met hods
of teac hing a thirty-hour cours e in psyc hology in modifying att it udes ass oc iat ed with
rac ial, religious and ethnic prejudic e. Unpublished Ph. D. diss., New York tlnivers ity, New
York, 1951.
CAPÍT ULO IV
A REDEFINIÇÃO DO PAPEL DA ESCOLA
E O ENSINO MULTIDIMENSIONAL
Arm ado das técnic as menc ionadas acim a, é poss ível redef inir o papel da esc ola,
que deverá ent ão oferec er um ens ino mult idim ens ional: int elect ual, mas sobret udo étic o,
cult ural, soc ial, comport am ent al, e até mesm o polít ic o e espirit ual:
Qual conc epç ão do hom em subent ende a educ aç ão de hoje? O que pode
ela oferec er e o que podem oferec er os prof ess ores a seus est udant es? O
educ ador do fut uro deverá trabalhar muit o mais para est abelec er e
des envolver relaç ões hum anas e uma rede soc ial em sua class e, abst endo-se
da orient aç ão mediant e o ens ino exc lus ivam ent e int elect ual. Cabe aos
prof ess ores tant o transm it ir os saberes quant o compreender seus alunos, bem
como as atit udes dest es para com a educ aç ão, as atividades rec reat ivas, o
trabalho e as relaç ões sexuais.
O prof ess or deve est ar abert o ao diálogo com os jovens e lhes falar das
relaç ões hum anas, da étic a, dos valores, das atit udes e das modif ic aç ões de
atit udes, das ideologias, das minoridades étnic as, das enf erm idades, dos ideais
e das visões do fut uro. [...]
Os cont eúdos educ ac ionais devem preparar os jovens para seus papéis
fut uros (relaç ões sexuais, papéis parent ais e prof iss ionais, respons abilidades
cívic as). (Unesc o)35
Os país es hão de querer talvez fixar seus objet ivos espec íf ic os para a
déc ada de 90, relac ionando-os a cada um dos aspect os propost os abaixo: [...]
- expans ão dos serviç os de educ aç ão fundam ent al [que abrange, segundo
o gloss ário da Unesc o, fornec ido em doc um ent o anexo,36 a aquis iç ão de
conhec im ent os, de compet ênc ias, de atit udes e de valores] e de form aç ões
para out ras compet ênc ias ess enc iais dest inadas aos adolesc ent es e aos
adult os, sendo a efic ác ia das ações avaliada em funç ão da modif ic aç ão dos
comport am ent os e do impact o sobre a saúde, o emprego e a produt ividade;
- uma maior aquis iç ão por part e dos indivíduos e das fam ílias, em
virt ude do conc urs o de todos os canais de educ aç ão – inc lus ive a mídia, as
out ras form as de com unic aç ão modernas e tradic ionais e a ação soc ial –, de
conhec im ent os, compet ênc ias e valores nec ess ários para uma vida melhor e
um des envolvim ent o rac ional e durável, sendo a efic iênc ia dess as int ervenç ões
avaliada em funç ão da modif ic aç ão dos comport am ent os. (Dec laraç ão mundial)
37
No ent ant o, ess es res ult ados não devem provoc ar res ignaç ão nos
educ adores ou levá-los a conc luir que a esc ola não pode ter nenhum a
inf luênc ia real sobre as ideias polít ic as e ment ais da crianç a. Nada diss o é
verdade: a inf luênc ia da esc ola deve também ser avaliada em seu just o valor.
(Cons elho da Europa)38
Note-se que no Reino Unido foi feit o um esf orç o para def inir oito
dom ínios gerais que form ariam a base de um tronc o com um: “A criaç ão
art íst ic a, a étic a, as línguas, as mat em át ic as, a Fís ic a, as Ciênc ias Nat urais, a
educ aç ão soc ial e a inst ruç ão cívic a, a educ aç ão espirit ual” [OCDE,39 1983, p.
62]. Ness e caso, trat a-se de um ato norm at ivo e de uma est rut ura curric ular
que põem em evidênc ia a import ânc ia da educ aç ão espirit ual. (Unesc o)40
Preoc upados com ess as taref as bem mais progress ist as que os ens inam ent os
cláss ic os, os prof ess ores não poss uem mais, evident em ent e, nem tempo, nem as
compet ênc ias, nem o des ejo de prest ar um ens ino sólido. O desm oronam ent o do nível
esc olar é, pois, a cons equênc ia inelut ável dess a redef iniç ão da esc ola:
Essa vis ão expandida das respons abilidades do set or educ ac ional não
implic a som ent e uma maior relevânc ia dos cont eúdos de form aç ão e sua
adequaç ão ao ambient e soc ioec onôm ic o, mas também uma modif ic aç ão
radic al das finalidades dos sist em as educ ac ionais. É prec is o romper com uma
conc epç ão elit ist a, prof undam ent e anc orada nas ment alidades, tant o da part e
dos educ adores quant o da dos pais, que privilegia os aspect os mais
acadêm ic os de ens ino, e segundo a qual a esc ola prim ária prepara para o
ens ino sec undário, o qual, por sua vez, prepara para os est udos superiores. A
esc ola para todos deveria ser o inst rum ent o do des envolvim ent o individual e
do des envolvim ent o econôm ic o e soc ial, e não da mera reproduç ão soc ial a
serviç o de uma minoria.
Em relaç ão a isso, a mesa redonda trouxe à luz a nec ess idade de uma
educ aç ão “mult idim ens ional”, que leve em cons ideraç ão todos os aspect os da
crianç a em seu ambient e e não se lim it e à inc ulc aç ão som ent e de
compet ênc ias cognit ivas. Ass egurar o êxit o de todos signif ic a ant es modif ic ar
as finalidades dos sist em as de ens ino que privilegiam a compet iç ão e a
seleç ão, e, port ant o, modif ic ar os objet ivos e os crit érios de avaliaç ão dos
alunos, para evit ar que um frac ass o no exam e não conduz a à exc lus ão soc ial.
[...]
O esf orç o de reest rut uraç ão dos program as e mét odos esc olares, além
de objet ivar sua maior relevânc ia, deveria igualm ent e se aplic ar, na medida do
poss ível, em est abelec er um melhor equilíbrio ent re divers os tipos de
atividades, espec ialm ent e aquelas de carát er cognit ivo, as de carát er prát ic o e
até utilit ário (como o trabalho produt ivo) e as que favoreç am o
des envolvim ent o das capac idades pess oais da crianç a (criat ividade, inic iat iva,
curios idade, dest rez a, res ist ênc ia, soc iabilidade), as atividades art íst ic as e
criat ivas, a educ aç ão fís ic a, as atividades a serviç o da com unidade. Faz er com
que todo aluno poss a enc ont rar suc ess o numa dada atividade, e, ass im,
mult iplic ar as form as de exc elênc ia, é uma condiç ão ess enc ial para provoc ar
na crianç a uma atit ude pos it iva para com a inst it uiç ão esc olar, fornec er-lhe
uma mot ivaç ão e, dess e modo, aum ent ar suas chanc es de êxit o. (Unesc o)41
O ens ino mult idim ens ional compreende duas part es princ ipais: um ens ino étic o,
dest inado a modif ic ar os valores, as atit udes e os comport am ent os; e um ens ino
mult ic ult ural, depois int erc ult ural,42 dest inado a rem at ar essa revoluç ão psic ológic a
mediant e uma revoluç ão cult ural. Det alharem os ess es tipos de ens ino nos dois capít ulos
seguint es.
Os prof ess ores e adm inist radores de todas as cat egorias e de todos os
níveis deveriam est ar consc ient es do papel que exerc em no sist em a
educ ac ional atual e fut uro. Eles deveriam compreender que seus papéis e suas
funç ões não são fixos e imut áveis, mas que evoluem sob a inf luênc ia das
mudanç as que se produz em na soc iedade e no próprio sist em a educ ac ional.
Apes ar da divers idade dos sist em as educ ac ionais e das dispos iç ões que
conc ernem à form aç ão dos prof ess ores no mundo, há uma nec ess idade geral
de um exam e nac ional cuidados o e inovador, conduz ido de maneira realist a,
das funç ões e taref as atribuídas aos prof ess ores em term os de polít ic a e
legislaç ão nac ionais. Tais anális es em nível nac ional, conduz idas com a
part ic ipaç ão dos próprios prof ess ores [engajam ent o], deveriam levar à criaç ão
de perf is prof iss ionais educ ac ionais com uma clara def iniç ão dos papéis e
funç ões que a soc iedade lhes ass inala.
Medidas deveriam ser tom adas para ass egurar que sejam atendidas as
condiç ões nec ess árias a que os atuais e os fut uros prof ess ores est ejam
consc ient es das mudanç as em seu papel e est ejam preparados para ess es
novos papéis e funç ões:
a) O prof ess or está hoje cada vez mais engajado na exec uç ão dos novos
proc edim ent os educ ac ionais, explorando todos os rec urs os dos meios e
mét odos educ ac ionais modernos. Ele é um educ ador e um cons elheiro que
tent a des envolver as capac idades de seus alunos e alargar seus cent ros
de int eress e, e não uma simples font e de inf orm aç ões ou um
transm iss or do saber; o prof ess or atua em um papel fundam ent al ao dar
a seus alunos uma vis ão cient íf ic a do mundo.
b) Uma vez que o papel da esc ola não mais est eja lim it ado à inst ruç ão, deve
ent ão o prof ess or, além de suas obrigaç ões ligadas à esc ola, ass um ir
mais respons abilidades, em colaboraç ão com out ros agent es de educ aç ão
da com unidade, a fim de preparar os jovens para a vida em com unidade,
a vida fam iliar, as atividades de produç ão etc. O prof ess or deveria ter
mais poss ibilidades de se engajar em atividades no ext erior da esc ola e
fora do curric ulum, de guiar e de acons elhar os alunos e seus pais, e de
organiz ar as atividades de seus alunos durant e o laz er.
c) Os prof ess ores deveriam est ar consc ient es do papel import ant e que são
cham ados a exerc er nas com unidades loc ais como prof iss ionais e
cidadãos, como agent es de des envolvim ent o e de mudanç a, e lhes
deveriam ser oferec idas as poss ibilidades de des empenhar esse papel.
(Unesc o)43
Nat uralm ent e, ess as ideias fiz eram eco na Franç a. Louis Legrand, inst igador da
revoluç ão pedagógic a franc es a, prof ess or de Ciênc ias da Educ aç ão na Univers idade de
Strasbourg, ant igo diret or do Inst it ut o Nac ional de Pesquis a Pedagógic a e aut or de um
relat ório ao minist ro da Educ aç ão da Franç a int it ulado Por um colégio dem oc rát ic o,44 que
teve uma prof unda inf luênc ia sobre o sist em a educ ac ional franc ês, esc revia:
[Bas il Bernst ein] cham a código de série um sist em a de relaç ões
ess enc ialm ent e hierárquic as ent re os parc eiros. Ness e sist em a, o mais
propalado na Europa cont inent al, o educ ador está só em face do grupo de
alunos que lhe é conf iado. Ele fundam ent a seu ens ino sobre os program as e
inst ruç ões nac ionais, fundam ent ados eles mesm os sobre as disc iplinas
univers it árias de ref erênc ia. Ess as disc iplinas univers it árias fundam ent am, por
sua vez, a legit im idade dos educ adores na medida em que est es adquiriram
diplom as, just if ic ando sua compet ênc ia em suas disc iplinas. [...]
Em opos iç ão a esse sist em a geralm ent e propalado na Europa cont inent al,
def ine-se o que Bernst ein cham a de código int egrado. Em um sist em a
educ ac ional regido por esse código, o ess enc ial é a com unidade de base que
def ine livrem ent e e loc alm ent e suas norm as e seus regulam ent os. O ess enc ial
aqui não são mais as disc iplinas univers it árias e sua traduç ão para os
dif erent es níveis de ens ino, mas o próprio aprendiz e as condiç ões de um
aprendiz ado hic et nunc a part ir de sua experiênc ia própria. É o enc ont ro dos
objet ivos gerais de nat urez a fundam ent alm ent e educ ac ional e transf erível com
a realidade loc al dos alunos e de seu meio que perm it irá def inir a nat urez a dos
program as e dos mét odos. [...]
De um pont o de vist a est rit am ent e pedagógic o, levar em cont a as
preoc upaç ões loc ais e a realidade dos aprendiz es signif ic a privilegiar o est udo
do meio e des envolver projet os int erdisc iplinares. As disc iplinas univers it árias
perdem ass im sua sit uaç ão dom inant e e tornam-se auxiliares inst rum ent ais de
uma abordagem int erdisc iplinar, ou ant es transdisc iplinar, da realidade
est udada.
Mas, ao mesm o tempo, os crit érios de avaliaç ão se obsc urec em na
medida em que esse tipo de est udo tem át ic o privilegia o trabalho de equipe e
objet ivos afet ivos dif ic ilm ent e avaliáveis. Esse aspect o, que poderá ser
cons iderado como negat ivo, tem cons equênc ias sobre a est rut ura da esc ola. A
seleç ão tende a des aparec er em proveit o de um ens ino bast ant e
individualiz ado [int roduz ido rec ent em ent e sob a form a de módulos nos lic eus e
de cic los no prim ário] em grupos de idades het erogêneas [cic los agrupando
divers as class es no prim ário], o ess enc ial sendo aqui a form aç ão soc ial e a
aus ênc ia de segregaç ão. Além diss o, as norm as se acham nec ess ariam ent e
relat iviz adas, a fim de cons iderar a nat urez a da populaç ão esc olar acolhida em
sua tot alidade.45
Mas os pais julgam ess es “ens inos” não cognit ivos em seu just o valor e sabem
que as ref orm as em curs o penaliz arão suas crianç as, que chegarão à idade adult a
desprovidas de rec urs os cult urais. Compreende-se sem dif ic uldade que eles se ergam
cont ra esse avilt am ent o dos indivíduos e da educ aç ão que, longe de ser dem oc rát ic a, priva
as cam adas mais hum ildes de toda perspect iva de emanc ipaç ão int elect ual e soc ial,
enquant o ref orç a mais e mais as fac ilidades financ eiras e int elect uais que poss uem as
cam adas superiores para inst ruir suas crianç as:
Frequent em ent e, faz-se nec ess ário sust ent ar a ação dos pais e da
com unidade através de uma inf orm aç ão perm anent e e de atividades de
form aç ão, pois a int ervenç ão das fam ílias num âmbit o que elas não dom inam
pode se revelar nef ast a. Em um país afric ano onde a int roduç ão do trabalho
produt ivo havia conduz ido a um modo de avaliaç ão mult idim ens ional favorável
ao suc ess o dos alunos, os pais, habit uados a uma seleç ão orient ada pelo
frac ass o, exigiram o ret orno ao exam e tradic ional que privilegiava o cognit ivo,
menos favorável a suas crianç as. (Unesc o)46
35 Int ernat ional sympos ium and round table, 27 nov. – 2 dec. 1989, Beijing, China,
Qualit ies required of educ at ion today to meet fores eeable dem ands in the twenty-first
cent ury, Proc eedings, Unesc o, p. 12 e 13 (ED-89/CONF.810). Este sem inário, de alt íss im o
nível, foi honrado com a pres enç a, ent re out ras pers onalidades, de Colin. N. Power,
ass ist ent e do diret or geral da Unesc o enc arregado da educ aç ão, ass im como da pres enç a
de um ex-minist ro chinês das relaç ões ext eriores.
36 WCEFA, Conf érenc e mondiale sur l’éduc at ion pour tous, 5-9 mars 1990, Jomt ien,
Taïllande, Doc um ent de réf érenc e, Paris, WCEFA, 1990, p. ix.
37 WCEFA, Déc larat ion mondiale sur l’éduc at ion pour tous, Op. cit., Cadre d’act ion,
Art. 5 et 6, p. 4; grif o noss o.
38 34º sém inaire européen d’ens eignants du Cons eil de l’Europe, Donauesc hingen,
17-21 novembre 1986, L’ens eignem ent des droit s de l’homm e et de l’éduc at ion soc iale,
civique et polit ique, Strasbourg, Cons eil de l’Europe, 1987, p. 5. [DECS/EGT (86) 74-F].
Doc um ent o public ado sem res eva sobre as opiniões expost as pelos aut ores.
39 OCDE, L’ens eignem ent obligat oire face à l’évolut ion de la soc iét é, Paris, OCDE,
1983.
40 S. Rass ekh, G. Vaideanu, Les cont enus de l’éduc at ion, Paris, Unesc o, 1987, p.125.
Bem que não ref let indo “nec ess ariam ent e a vis ão da Organiz aç ão”, esse trabalho
import ant e é frequent em ent e cit ado.
41 Colloque Réus ir à l’école, Lisbonne/Est oril, Port ugal, 20-24 mai 1991. Rapport
final, Unesc o, p. 55 e 36; sublinham os. Esse colóquio foi abert o pelo Prim eiro Minist ro
port uguês. O doc um ent o cit ado não prec ede de nenhum a res erva sobre as opiniões
expost as pelos seus aut ores.
42 Mult ic ult ural: onde várias cult uras coexist em; Int erc ult ural: onde ess as
divers as cult uras fus ionaram-se para dar nasc im ent o a uma nova cult ura.
43 J. C. Pauvert, Senior educ at ional pers onnel: new funct ions and training, vol. 1,
Educ at ional studies and doc um ents, nº 52, Paris, Unesc o, 1988, p. 13. Sublinham os. O aut or
cita aqui a Rec om endaç ão nº 69 adot ada pela Int ernat ional conf erenc e on educ at ion, 35th
sess ion, Geneva, 27 August – 4 Sept ember 1975, The changing role of the teac her and its
inf luenc e on preparat ion for the prof ess ion and on in-servic e training, Paris, Unesc o, 1975.
(ED/IBE/CONFINT ED. 35/4 + Add.) Ele menc iona igualm ent e um doc um ent o de ref erênc ia
da mesm a conf erênc ia: Teac hers and other prof ess ionals in educ at ion: new prof iles and
new stat us. (ED/IBE/CONFINT ED.35/Ref.4.).
44 L. Legrand, Pour un collège dém oc rat ique, Paris, La Doc um ent at ion franç ais e,
1983.
45 L. Legrand, Les polit iques de l´éduc at ion, Paris, P.U.F, 1988, p. 58 sq.
46 Colloque Réuss ir à l’école, Op. Cit., p. 41.
CAPÍT ULO V
A REVOLUÇÃO ÉTICA
“Quant o aos princ ípios gerais, a lei nat ural, ao menos em sua
índole genéric a, não pode em abs olut o ser apagada dos coraç ões
dos hom ens. Cont udo, pode ser abolida em algum caso conc ret o
quando, por efeit o da conc upisc ênc ia ou de out ra paixão, a raz ão
se acha impedida de aplic ar o princ ípio geral a um ass unt o
part ic ular. Mas no que conc erne aos prec eit os sec undários, a lei
nat ural pode ser apagada do coraç ão dos hom ens seja por
pers uasões pervers as – da mesm a form a como também ocorrem
erros nas conc lusões nec ess árias de ordem espec ulat iva –, seja
por cost um es depravados e hábit os corrompidos”.47
Os dois elem ent os da revoluç ão psic ológic a que est udarem os nest e capít ulo são a
revoluç ão étic a – a subvers ão dos valores – e a revoluç ão cult ural. No inst ant e em que
voz es cada vez mais num eros as se erguem, na Franç a, para exigir uma renovaç ão da
educ aç ão cívic a e étic a, import a tom ar conhec im ent o da est rat égia do advers ário.
Os elem ent os const it ut ivos da nova étic a são os seguint es:
◆ os direit os hum anos (est endidos ao direit o soc ial: direit o à habit aç ão, à
alim ent aç ão, ao trabalho etc.);
◆ a bioét ic a;
◆ os direit os das crianç as (tem ível arma cont ra a fam ília);
◆ a educ aç ão para a paz, a conc órdia ent re as naç ões, o des arm am ent o, o
civism o pac íf ic o, a frat ernidade hum ana, a consc iênc ia da int erdependênc ia ent re as
naç ões (Unesc o);48
◆ a educ aç ão para o meio ambient e (Com iss ão de Bruxelas, Unesc o);
◆ a criaç ão de um “mundo mais just o e solidário, pilar da nova ordem
int ernac ional” (Parlam ent o Europeu);49
◆ a “experiênc ia da vida em uma soc iedade mult ic ult ural” (Parlam ent o Europeu;50
tem as sim ilares na Com iss ão de Bruxelas e na Unesc o);
◆ a tolerânc ia (Unesc o);
◆ a “pass agem da compet iç ão à cooperaç ão” (Unesc o);51
◆ o des envolvim ent o da consc iênc ia polít ic a (Parlam ent o Europeu,52 Unesc o 53);
◆ a “paz no espírit o dos hom ens” (Unesc o);54
◆ etc.
Perc ebe-se aí, sob uma hábil apres ent aç ão, a ret óric a cript oc om unist a. As duas
cit aç ões a seguir diss ipam as últ im as dúvidas:
O prof ess or radic al (no sent ido nort eam eric ano) def ende que o mundo é
injust o e que, onde reina uma paz superf ic ial, a “violênc ia est rut ural” é
endêm ic a. A express ão “violênc ia est rut ural” foi criada por Johan Galt ung
(diret or do Inst it ut o Int ernac ional de Pesquis as sobre a Paz, em Oslo), para
desc rever as condiç ões de opress ão e de exploraç ão, condiç ões nas quais são
violados os direit os hum anos.
Adem ais, uma vez que, ness a perspect iva, paz, just iç a e equidade são
virt ualm ent e sinônim os, não parec e poss ível que o est udo não seja seguido de
ação. A educ aç ão não pode perm anec er neut ra. Adam Curle, tit ular prec edent e
da cát edra de Est udos para a Paz da Univers idade de Bratf ord, dec larou: “Se
falam os dess a luta nas inst it uiç ões de ens ino, correm os o risc o de a
buroc rac ia, aperc ebendo-se subit am ent e de que realiz am os algo de
ext rem am ent e subvers ivo, venha a forç ar sua pes ada mão sobre nós. É um
perigo que eu conheç o e ao qual est ou pess oalm ent e expost o. No mom ent o
crít ic o, devem os cons iderar o que podem os faz er. Creio realm ent e que a
educ aç ão pela paz, em cert o sent ido, é uma atividade revoluc ionária”.55 É
prec is o subst it uir “educ aç ão pela paz” por “educ aç ão para os direit os
hum anos”. [...] É claro que nenhum prof ess or deveria inic iar um program a de
ens ino bas eado sobre um conjunt o de objet ivos radic ais sem uma est im at iva
complet a das prof undas implic aç ões de uma ação dess e tipo. [...]
Os est udant es devem ass im ilar a validade sempre atual dess es direit os
[liberdade religios a e polít ic a], mas, ao mesm o tempo, prec is am tom ar
consc iênc ia da cresc ent e import ânc ia atribuída pelos país es do Terc eiro Mundo
aos direit os econôm ic os e soc iais, como a previdênc ia soc ial, o pert enc im ent o
a sindic at os e um nível de vida aceit ável. (Cons elho da Europa)56
Mas os aspect os do program a que conc ernem à moral e à educ aç ão
cívic a são cons iderados igualm ent e import ant es, uma vez que não há
renovaç ão soc ial sem que haja novas relaç ões ent re os hom ens, novas
organiz aç ões e est rut uras soc iais, bem como novas utiliz aç ões e aplic aç ões do
saber no mundo do trabalho. (OCDE)57
A esc ola deve, port ant o, veic ular um ens ino de ordem étic a:
Ass im, é abs olut am ent e impresc indível e ess enc ial inc luir a quest ão dos
valores e acat ar sua disc uss ão no âmbit o da Esc ola, dos saberes que ela
transm it e e que fac ult a aos alunos const ruir, das condiç ões dess a transm iss ão
e dess a const ruç ão, do seu func ionam ent o como inst it uiç ão.58 (Cons elho da
Europa)
Trat a-se de uma nova moral, pret ens am ent e univers al, e a qual se cons idera como
elaborada cient if ic am ent e:
Aceit ar essa complexidade de exigênc ias étic as que já não se podem
lim it ar a códigos morais válidos para um grupo, mas que são transc endidas
por imperat ivos adm it idos univers alm ent e, e tom ar, de fato, consc iênc ia da
import ânc ia soc ioec onôm ic a e polít ic a dess es imperat ivos, eis os dois
elem ent os de uma educ aç ão que, “levando em cons ideraç ão as caract eríst ic as
afet ivas e cognit ivas do indivíduo, deve coloc á-lo em condiç ões de ass im ilar os
princ ípios que const it uem uma conquist a da étic a univers al”.59 (Unesc o)60
Port ant o, é uma nova étic a que se deve des envolver, com o auxílio da
educ aç ão e da inf orm aç ão [tant o isso é verdadeiro, que a objet ividade dest a é
um ideal de out ra era], a fim de modif ic ar as atit udes e os comport am ent os.
Poss uir uma conc epç ão global do noss o mundo é pens ar globalm ent e para agir
loc alm ent e. (Unesc o)61
Toda adoç ão de valores morais e de crenç as deve ser realiz ada
cient if ic am ent e. Devem os coloc ar e res olver todos os problem as a part ir da
pesquis a cient íf ic a; part ic ularm ent e, a quest ão da esc olha e da adoç ão das
ideias e das crenç as deve ser cons iderada de maneira cient íf ic a e com
atit udes cient íf ic as. (Unesc o)62
Seria nec ess ário salient ar que os valores religios os – de todas as religiões – são
os prim eiros vis ados? E que já não será poss ível transm it i-los?
O ens ino da étic a deve veic ular novos valores. Inic ialm ent e, porém, deve bloquear
a transm iss ão dos ant igos valores de uma geraç ão a out ra:
O paradoxo res ide just am ent e em cons eguir dar lugar à transm iss ão e à
rec epç ão de norm as e valores herdados, bem como à form aç ão de
capac idades crít ic as para const ruir e des envolver livrem ent e norm as e valores.
(Cons elho da Europa)63
Com efeit o, exist e atualm ent e uma enorm e exigênc ia, da part e da
soc iedade, relat ivam ent e aos sist em as de educ aç ão, a fim de que eles
auxiliem mais a juvent ude a adquirir comport am ent os e valores que lhes
perm it am enf rent ar com êxit o as dif ic uldades do mundo moderno. As fam ílias
sent em-se cada vez menos capaz es de ass um ir suas taref as educ at ivas
tradic ionais, face à complexidade dos problem as e a uma mass a inabarc ável
de inf orm aç ões; elas des ejam, port ant o, que uma maior import ânc ia seja dada
aos aspect os étic os, morais e cívic os da inst ruç ão educ at iva. Essa evoluç ão na
divis ão das respons abilidades está ligada ao des ejo de uma desc ent raliz aç ão e
de uma maior part ic ipaç ão de todos os atores, dos pais em part ic ular, no
func ionam ent o da inst it uiç ão. (Unesc o, 4a Conf erênc ia dos Minist ros da
Educ aç ão)64
A desc ent raliz aç ão e a part ic ipaç ão perm it em engajar os pais em polít ic as às
quais, de out ro modo, eles se oporiam. Volt arem os a esse tema em capít ulo ult erior.
Dest ac am os som ent e que, no nível pré-esc olar, uma educ aç ão que
privilegie o aspect o afet ivo, e que, não obst ant e, forneç a o conhec im ent o de
cert os dados e noç ões elem ent ares, deveria ser part e do proc ess o educ ac ional.
Por sua vez, as divers as form as de educ aç ão ext raesc olar, part ic ularm ent e os
program as educ at ivos dif undidos pela mídia, poderiam cont ribuir para a
neut raliz aç ão da transm iss ão “fam iliar” dos prec onc eit os. (Unesc o, 4a
Conf erênc ia dos Minist ros da Educ aç ão)65
No caso da educ aç ão fam iliar, na maior part e do tempo, essa
transm iss ão não é consc ient e. Os cons elhos e as ordens dados pelos pais,
pelos avós, pelos viz inhos, além de poss ivelm ent e cont radit órios, não tornam o
indivíduo, ass im educ ado, consc ient e de sua liberdade pess oal e das esc olhas
étic as que ele poderia faz er. Adem ais, essa transm iss ão implíc it a compreende
os valores tradic ionais ligados ao meio soc ial ou a um meio religios o em
part ic ular. Enf im, em noss o mundo cont emporâneo, econôm ic a e polit ic am ent e
tum ult uado, onde a mídia, cobrindo o mundo int eiro, inf orm a sem tom ar em
cons ideraç ão quaisquer ref erênc ias morais, ess es valores nem sempre são
transm it idos, e, quando o são, sof rem o impact o des est abiliz ador dess a
“superinf orm aç ão”.
Em res um o, para superar esse modo pouc o seguro de transm iss ão, para
seguir rumo a uma tom ada de consc iênc ia pess oal e a uma esc olha de valores
univers alm ent e válidos, é nec ess ária uma educ aç ão form al que explic it e ess es
valores. Essa explic it aç ão pode e deve ser feit a pela esc ola. O espírit o crít ic o
[das crianç as], tendo por objet o os valores morais, e a ref lexão étic a são,
port ant o, os objet ivos da educ aç ão form al nas inst it uiç ões esc olares, a fim de
que cada crianç a, cada jovem poss a, livrem ent e, form ar uma consc iênc ia
étic a, a qual lhe perm it a disc ernir o just o do injust o e des envolver atit udes e
comport am ent os fundados sobre o respeit o ao out ro, sobre a compreens ão do
bem com um à hum anidade: os direit os hum anos e a paz. (Unesc o)66
Essa pseudoliberdade deve, port ant o, conduz ir inelut avelm ent e a int erioriz ar os
mesm os valores: os do cript oc om unism o. Além diss o, duas páginas adiant e, o aut or
menc iona explic it am ent e os direit os da crianç a, os quais, nada acresc ent ando aos direit os
hum anos e ao direit o civil e penal, não têm, e não poderiam ter, out ra finalidade senão um
ataque à fam ília.
O lugar da escola
Subjac ent e a ess as quest ões está a do lugar da escola em relação às outras
instituições sociais. O jovem está ins erido em uma rede de inst it uiç ões e de poderes que
cont ribuem para a sua form aç ão e que, ao mesm o tempo, colaboram e disput am ent re si
para impor sua inf luênc ia, seu modo de pens ar, suas norm as. Por com odidade, far-se-á
opos iç ão ent re o que conc erne à fam ília e o que conc erne ao Estado, à socie dade
[amálgam a revelador]; esf era do priv ado, do indivíduo e de seu grupo soc ial em opos iç ão
a uma esf era pública, colet iva. Hoje em dia, essa dualidade torna-se complexa em virt ude
do cresc ent e peso da mídia e do grupo de pares como vet ores muit o efic az es de
transm iss ão cult ural. A mídia, princ ipalm ent e, viola as front eiras ent re o públic o e o
privado, int roduz indo, aí, uma indist inç ão que nem o carré blanc nem o zapping cons eguem
res olver, a fim de rest it uir a cada um a sua liberdade.67
Essa dist inç ão público-priv ado poss ui um valor operat ório bem divers o conf orm e
os Est ados europeus. Do pont o de vist a hist óric o, todos foram marc ados princ ipalm ent e
pela inf luênc ia das igrejas crist ãs, mas também pelo judaísm o e, alguns, cada vez mais
num eros os, pelo Islã, ao mesm o tempo que uma corrent e laic a, agindo de modos divers os,
vem-se igualm ent e afirm ando, sobret udo na Franç a. A tradiç ão inst it uc ional dess a opos iç ão
públic o-privado e dess a divers idade hist óric a res ide na exist ênc ia de uma inst it uiç ão ou de
uma educ aç ão religios a mais ou menos int egrada nos horários esc olares e enc arregada,
exc lus ivam ent e ou não, de uma educ aç ão para a vida soc ial e os valores. O que aqui está
em jogo é de espec ial int eress e: trat a-se da poss ível def iniç ão colet iva de princ ípios
com uns para a vida em soc iedade e da inc umbênc ia, pelas inst it uiç ões esc olares, de sua
transm iss ão. Sejam quais forem os des envolvim ent os do ens ino religios o e de sua
pres enç a nos sist em as esc olares, a educ aç ão cívic a, em uma dim ens ão europeia, exige
uma abordagem convergent e das regras da vida em com um, ainda que o respeit o à
liberdade individual, part ic ularm ent e à liberdade de consc iênc ia, seja um elem ent o
const it ut ivo da ident idade europeia.
Na medida em que a educ aç ão cívic a é também um ensinam ento de valores,
não pode est ar isent a das quest ões acerc a de sua origem, de sua definição, da
legitim idade daqueles que têm a inc umbênc ia de ens iná-la. Para uns, a esc olha dos
valores e dos princ ípios que serão ens inados depende da fam ília, de suas crenç as,
sobret udo religios as, a únic a garant ia cont ra os tot alit arism os de Est ado e ideológic os;
para out ros, som ent e uma inst it uiç ão fundada sobre princ ípios e valores proc lam ados
univers ais garant e uma educ aç ão para a liberdade, oferec e a cada um a poss ibilidade de
acess o ao out ro e pres erva a coes ão do corpo soc ial, para além das crenç as part ic ulares.
(Cons elho da Europa)68
Ass im, pouc o nos espant a const at ar o que o aut or esc reve, algum as páginas
adiant e, coloc ando o habit ual pret ext o da coes ão do corpo soc ial acim a dos risc os do
tot alit arism o:
Ins ist o mais uma vez que é urgent e e indispens ável debat er [a quest ão
dos valores e do laic ism o], que todos os sist em as de ens ino devem conc ordar
em explic it ar e trat ar pos it ivam ent e a quest ão dos valores, que o laic ism o
revis it ado é a orient aç ão mais apropriada para pens ar noss as regras de vida
em com um e o func ionam ent o das esc olas, no respeit o às liberdades
individuais e aos direit os hum anos, em luta cont ra todo tipo de disc rim inaç ão.
(Cons elho da Europa)69
Duas páginas ant es, o aut or não evit ara menc ionar os mét odos pedagógic os ativos:
Parec e que a maior part e das rec om endaç ões ins ist em, desde há muito
tempo, na necessidade de aplicar métodos pedagógicos ativ os, de
des envolver o sens o de respons abilidade ent re os alunos, de lhes ens inar a
aut onom ia, de dif erenc iar as abordagens. (Cons elho da Europa)70
Há aut ores que são mais explíc it os:
Na origem dess a ref lexão de ordem pedagógic a, dec ert o enc ont rar-se-á a
cláss ic a opos iç ão ent re inst ruç ão e educ aç ão, ent re esc ola e fam ília. Será
prec is o deixar à esf era privada da fam ília o enc argo e a respons abilidade de
educar, apoiando-se para tal numa étic a? Agir de out ro modo não seria
romper com a neut ralidade da esc ola, com sua funç ão ess enc ial de
transm iss ão de conhec im ent os objet ivos? Cont udo, a esc ola não pode lim it ar-
se a ens inar. De maneira implíc it a ou explíc it a, ela é port adora de valores e os
transm it e. Ela educ a, port ant o. Vale dizê-lo e afirm á-lo claram ent e. (Cons elho
da Europa)71
Enf im, conc luím os com uma cit aç ão espant os a:
Os debat es, as pesquis as e mesm o as hes it aç ões dos respons áveis pela
educ aç ão ou dos repres ent ant es dos prof ess ores most ram que, se a prom oç ão
da educ aç ão moral nos program as esc olares parec e cada vez mais nec ess ária,
a implem ent aç ão de uma ação dess a nat urez a const it ui para muit os país es
um problem a ao mesm o tempo priorit ário e ainda sem soluç ão, tant o no
toc ant e aos que conc ebem os planos de est udos quant o no toc ant e às
condiç ões do proc ess o de form aç ão dos prof ess ores; todo educ ador
ins uf ic ient em ent e preparado para propor disc ussões de carát er étic o fic ará
ret ic ent e, pela just a raz ão de tal empreendim ent o lhe parec er ao mesm o
tempo import ant e, complic ado e crivado de arm adilhas. Seria, port ant o,
convenient e faz er a devida dist inç ão ent re hes it aç ão e indif erenç a, ou ent re o
tempo nec ess ário ao perf eit o cont role da modif ic aç ão dos valores e um
supost o eclips e da moralidade e da educ aç ão moral. (Unesc o)72
Espant os a conf iss ão na qual o aut or rec onhec e que a dec adênc ia moral de noss os
dias, que se poderia atribuir a uma “indif erenç a moral” ou a um “supost o eclips e da
moralidade”, está, na realidade, relac ionada ao “tempo nec ess ário ao perf eit o cont role da
modif ic aç ão dos valores”, à revoluç ão psic ológic a. Ou, ainda, que a ruína dos valores
morais é tão som ent e uma cons equênc ia, esc olhida deliberadam ent e e consc ient em ent e
ass um ida, de um projet o de subvers ão dos valores que não se pode realiz ar em praz o
muit o breve. Dess e modo, a esc alada da crim inalidade, da ins eguranç a, da delinquênc ia, do
cons um o de drogas, a des est rut uraç ão psic ológic a dos indivíduos que se seguiu ao
avilt am ent o moral e à cons equent e dest ruiç ão do tec ido soc ial são as cons equênc ias de
uma polít ic a consc ient e. Port ant o, a manobra dest inada a modif ic ar os valores art ic ula-se
ass im: inic ialm ent e, impedir a transm iss ão, espec ialm ent e por meio da fam ília, dos
valores tradic ionais; face ao caos étic o e soc ial daí res ult ant es, torna-se imperat ivo o
ret orno a uma educ aç ão étic a – cont rolada pelos Est ados e pelas organiz aç ões
int ernac ionais, e não mais pela fam ília. Pode-se, ent ão, induz ir e cont rolar a modif ic aç ão
dos valores. Esquem a revoluc ionário cláss ic o: tese, ant ít es e e sínt es e, que explic a a raz ão
por que, chegada a hora, os revoluc ionários se faz em os def ens ores da ordem moral. E por
que, nolens, volens, os part idários de uma ordem moral inst it uc ionaliz ada se enc ont ram
frequent em ent e lado a lado com os revoluc ionários.
47 São Tom ás de Aquino, Somm e théologique, la-2ae, qu. 94, ar. 6, Paris, Edit ions
de la revue des jeunes (trat ado La Loi), 1935.
48 Ver: S. Rass ekh, G. Vaideanu, Les cont enus de l’éduc at ion, Op. cit., Unesc o.
49 Parlam ent o europeu, La polit ique de l’éduc atìon et de la form at ion dans la
perspect ive de 1993, Op. cit., p.33.
50 Parlam ent o europeu, La polit ique de l’éduc atìon et de la form at ion dans la
perspect ive de 1993, Op. cit., p. 18.
51 Simpós io int ernac ional e mesa redonda: Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. cit., Unesc o, p. III 7.
52 Ver: Parlam ent o europeu, La polit ique de l’éduc at ion et de la form at ion dans la
perspect ive de 1993, Op. cit., p. 19.
53 S. Rass ekh, G. Vaideanu, Les cont enus de I’éduc at ion, Op.cit., Unesc o, p. 169,
196. Ver também: Congrès int ernat ional sur La paix dans l’esprit des homm es, 26 juin -
1er juillet 1989, Yam ouss oukro, Côte d’lvoire, Relat ório final, Unesc o, p. 43. Esse congress o
reuniu uma plêiade de pers onalidades.
54 Ibid.
55 A. Curle, Cont ribut ion of educ at ion to freedom and just ic e, in M. Haavelsrud
(ad.) Educ at ion for peac e: ref lect ion and act ion, LPC Scienc e and Tec hnology Press,
Guilf ord, 1976, p. 75.
56 Derek Healer, Hum an right s educ at ion in schools: conc epts, att it udes and skills,
Strasbourg, Cons elho da Europa, 1984, p.6 et 7. [DECS/EGT (84) 26].
57 OCDE/CERI, La réf orm e des programm es scolaires, Paris, OCDE, 1990, p. 43.
Relat ório “public ado sob a respons abilidade do Sec ret ariado geral da OCDE” (p. 3) que
“const it ui o res ult ado de um est udo sobre a evoluç ão dos program as de est udos,
empreendido em 1987 pelo Com it ê Diret or do Cent ro para Pesquis a e Inovaç ão no Ens ino
(CERI)” (p. 7).
58 F. Audigier, Ens eigner la soc íét é, transm ett re des valeurs, Strasbourg, Cons eil
de l’Europe, 1992, p. 9 [DECS/SE/Sec (91) 12]. Grif o no original.
59 Cf. Conf érenc e int ergouvernem ent ale de 1983 pour la coopérat ion int ernat ionale,
la compréhens ion et la paix.
60 G. Beis, Pour une éduc at íon aux valeurs éthiques, Paris, Unesc o, 1987, p.41
(BEP/GPI/3 et BEP-87/WS/5).
61 Congrès int ernat ional sur la paix dans I’esprit des homm es, Relat ório final, Op.
cit., Unesc o, p. 43.
62 Simpós io int ernac ional e mesa redonda: Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. cit., Unesc o, p. 67.
63 F. Audigier, Ens eigner la soc iét é, transm eft re des valeurs, Op. cit., Strasbourg,
Cons eil de l’Europe, 1992, p. 10.
64 Quat rièm e conf érenc e des minist res de I’Educ at ion, Perspect ive et tâc hes, Op.
cit., Unesc o, p. 11.
65 Ibid, p. 14.
66 F. Best, Educ at ion, cult ure, droit s de I’homm e et compréhens ion int ernat ionale,
Paris, Unesc o, p. 2. Sem data.
67 O carré blanc é um sinal utiliz ado pelas redes de televis ão franc es as para
advert ir aos telespect adores que um program a é inadequado para menores de idade; já o
zapping é o fenôm eno inic iado com o advent o do cont role rem ot o, com o qual os
telespect adores pass eiam por divers os canais da TV – N. do T.
68 F. Audigieri, Ens eigner la soc iét é, transm ett re des valeurs, Op. cit., p. 11. Grif o
no original; grif os noss os.
69 Ibid., p. 15. Grif o no original.
70 Ibid., p. 13. Grif o no original.
71 48° Sem inaire du Cons eil de I’Europe pour ens eignants, Donauesc hingen, 25-30
juin 1990, Scienc es, éthique, droit s de I’homm e et éduc at ion, Strasbourg, Cons eil de
I’Europe, 1991, p. 10 [DECS/EGT (90) 23]. Grif o no original.
72 S. Rass ekh, G. Vaideanu, Les cont enus de l’éduc at ion, Op. cit. Unesc o, p. 165.
CAPÍT ULO VI
A REVOLUÇÃO CULTURAL E
INTERCULTURALISMO:
HOMENAGEM A GRAMSCI
O mult ic ult uralism o está sendo int roduz ido nos IUFMS e no ens ino esc olar, como o
prova, ent re out ros doc um ent os, o cat álogo do CNDP (Cent ro Nac ional de Doc um ent aç ão
Pedagógic a). A cult ura franc es a é coloc ada no mesm o nível que as dos povos mais
dist ant es de nós, tant o fis ic am ent e quant o psic ologic am ent e. As cit aç ões em seguida
most ram a verdadeira face do mult ic ult uralism o:
Não se poderia rec onhec er mais claram ent e que a educ aç ão mult ic ult ural visa a
uma revoluç ão psic ológic a, cujas cons equênc ias são dif ic ilm ent e avaliáveis. Os meios
empregados devem, port ant o, est ar à alt ura da apost a:
O int erc ult ural afet a, ass im, o conjunt o da inst it uiç ão educ ac ional: o
ens ino pré-esc olar, as línguas, a elaboraç ão dos program as, os manuais e
out ras ferram ent as pedagógic as, a adm inist raç ão, os exam es, o cont role e a
avaliaç ão, as atividades ext raesc olares, os laç os ent re a esc ola e a
com unidade, os serviç os de orient aç ão e os serviç os auxiliares, a preparaç ão
para a vida adult a, a form aç ão inic ial e cont ínua dos prof ess ores, a luta cont ra
a xenof obia e o rac ism o. (Cons elho da Europa)81
A exist ênc ia, na Suéc ia, de uma dec is ão governam ent al que obriga todos
os prof ess ores a part ic ipar do des envolvim ent o da educ aç ão int erc ult ural é um
fato capit al, de vez que delim it a um cenário e conc ret iz a as aspiraç ões à
mudanç a. (Cons elho da Europa)82
Não pode se compreender o int erc ult uralism o a não ser na perspect iva globalist a,
tal como express a no Doc um ent o de ref erênc ia da Conf erênc ia mundial sobre a educ aç ão
para todos:
73 Sém inaire européen d’ens eignants, La form at ion int erc ult urelle des ens eignants,
Op. cit., Cons eil de l’Europe, p. 19.
74 OCDE/CERI, La réf orm e des programm es, Op. cit., p. 43.
75 OCDE/CERI, L’école et les cult ures, Op. cit., p. 69.
76 Ibid., p. 8.
77Ibid., p. 21.
78 Ibid., p. 70.
79 Ibid., p. 72.
80 Ibid., p. 86.
81 La form at ion int erc ult urelle des ens eignants, Op. cit., p. 12.
82 Ibid., p. 32.
83 WCEFA, Conf érenc e mondiale sur l’éduc at ion pour tous, 5-9 mars 1990,
Jomt iem, Thaïlande, Doc um ent de réf érenc e, Paris, WCEFA, 1990, p. 12. Itálic os noss os. De
acordo com uma técnic a experim ent ada, o pref ác io dess e doc um ent o menc iona que “o
pres ent e doc um ent o não express a nec ess ariam ent e uma tom ada de pos iç ão por part e da
Com iss ão int erinst it uiç ões nem das organiz aç ões que, a tít ulo princ ipal ou ass oc iado,
apadrinharam ou coapadrinharam a Conf erênc ia mundial”. No ent ant o, nas linhas ant eriores,
desc obrim os que: “Para est abelec er o pres ent e doc um ent o de ref erênc ia, o Sec ret ariado
exec ut ivo da Com iss ão int erinst it uiç ões (const it uída pelo Banc o mundial, o PNUD, a Unesc o
e o Unic ef em vist a da organiz aç ão da Conf erênc ia mundial) se inspirou de num eros os
relat órios e est udos, sugest ões de três ofic inas técnic as das quais part ic iparam
espec ialist as de cinc o cont inent es” (p. iii).
84 Int ernat ional sympos ium and round table, Qualit ies required of educ at ion
today…, Op. cit., Unesc o, p. II 8.
85 G. Orwell, 1984, Folio, Gallim ard, p. 79-80.
CAPÍT ULO VII
REESCREVER A HISTÓRIA
A educ aç ão para a paz, a conc órdia ent re as naç ões, o des arm am ent o, o civism o
pac íf ic o, a frat ernidade hum ana, a consc iênc ia da int erdependênc ia ent re as naç ões e “a
experiênc ia da vida em uma soc iedade mult ic ult ural” não se poderiam sat isf az er com o
ens ino da hist ória como é feit o atualm ent e. Des ejar-se-ia elim inar os divers os conf lit os
ent re naç ões, etnias ou religiões que, com ou sem pret ens a raz ão, cons ist iriam um
obst ác ulo à educ aç ão para a paz. Convém, port ant o, reesc rever a hist ória, projet o
ess enc ialm ent e tot alit ário. Nat uralm ent e, cont udo, não se poderia compreender a hist ória
quando se busc a sist em at ic am ent e ocult ar todos os elem ent os que, opost os à ideologia
ofic ial, são não obst ant e um de seus aut ênt ic os mot ores. Ass im, pret ende-se com et er
uma verdadeira mut ilaç ão psic ológic a, que deve amput ar, das geraç ões fut uras, as suas
raíz es, bem como lhes imposs ibilit ar toda a verdadeira compreens ão polít ic a:
Rec ordem os que as public aç ões das inst it uiç ões int ernac ionais com frequênc ia
est endem os direit os hum anos – que não são def inidos em part e algum a – aos direit os
soc iais: direit o à habit aç ão, ao trabalho, à alim ent aç ão etc.
É revolt ant e a pouc a import ânc ia que se dá à apres ent aç ão objet iva dos fat os,
quando, seis linhas ant es, os aut ores diz iam:
No mais das vez es, um tal orient aç ão [“que tende ao fort alec im ent o da
cooperaç ão, da conc órdia e da paz int ernac ionais ou à garant ia dos direit os
hum anos” – não cognit iva, port ant o] produz uma modif ic aç ão e um
enriquec im ent o dos cont eúdos e das disc iplinas tradic ionais, disc iplinas cuja
atualiz aç ão deveria ser ass egurada mediant e um esf orç o cont ínuo de pesquis a
pedagógic a e com base em uma utiliz aç ão sist em át ic a dos res ult ados das
ciênc ias soc iais e hum anas [part ic ularm ent e a psic ologia e a soc iologia], a fim
de ref orç ar o impact o pret endido. (Ibid.)
Os trabalhos de revis ão dos manuais esc olares se mult iplic am em
esc ala nac ional e bilat eral; a atual atm osf era, de menor tens ão, não perm it iria
avanç ar mais e pret ender, para as disc iplinas mais sens íveis, uma cooperaç ão
mult ilat eral, capaz de def inir orient aç ões com uns no que tange aos program as
e aos manuais esc olares? (Unesc o, 4a Conf erênc ia dos Minist ros da
Educ aç ão)88
Aprender a aprender
As soc iedades e, mais part ic ularm ent e, suas inst it uiç ões governam ent ais
devem ser cons ideradas ess enc ialm ent e como “sist em as aprendiz es”. As
soc iedades mais apt as a apres ent ar suc ess o serão aquelas cuja capac idade de
aprendiz agem é alta: flexíveis, elas são capaz es de ant ec ipar e de
compreender as mudanç as, bem como de se adapt ar a elas. Tais soc iedades
se benef ic iam da part ic ipaç ão ativa dos cidadãos no proc ess o de
aprendiz agem. Ao longo dess a aprendiz agem, a hist ória deverá ser reesc rit a e
reint erpret ada. (Unesc o)89
Esse proc ess o cont ínuo de alt eraç ões aplic ava-se não som ent e a jornais,
mas também a livros, periódic os, panf let os, cart az es, folhet os, film es,
regist ros sonoros, caric at uras, fot ograf ias; era aplic ado a toda espéc ie de
lit erat ura ou doc um ent aç ão que tivess e qualquer signif ic ado polít ic o ou
ideológic o. Dia a dia, e quas e minut o a minut o, o pass ado era atualiz ado. Dest a
form a, era poss ível dem onst rar, com prova doc um ent al, a correç ão de todas
as prof ec ias do Part ido. Jam ais perm anec ia no arquivo qualquer not íc ia, art igo
ou opinião que ent rass e em conf lit o com as nec ess idades do mom ent o. Toda a
hist ória era um palimps est o, raspado e reesc rit o tant as vez es quant as foss em
nec ess árias. Em nenhum caso seria poss ível, uma vez feit a a operaç ão, que se
provass e qualquer fraude. (Orwell, 1984)90
86Quat rièm e conf érenc e des minist res de l’Educ at ion des états membres de la
région Europe, Rapport final, Paris, Unesc o, 1988, p. 17. (ED-88/MINEDEUROPE). Doc um ent o
public ado nat uralm ent e sem res ervas acerc a das opiniões expost as por seus aut ores.
87 Quat rièm e Conf erênc ia dos Minist ros da Educ aç ão, Perspect ives et tâc hes, Op.
cit., Unesc o, p. 12. Grif o noss o.
88 3. Ibid., p. 16.
89 Int ernat ional sympos ium and round table, Qualit ies required of educ at ion
today..., Op. cit., Unesc o, p. 34. Not ar-se-á, de pass agem, que as raz ões pelas quais se
deve “aprender a aprender” aparec em igualm ent e. Cria-se uma ment alidade privada de de
qualquer ref erênc ia est ável, abert a à inovaç ão, à mudanç a, ou seja, à simples moda, de
maneira que, a essa nova ment alidade, a mera noç ão de verdade seja algo est ranho e, por
isso mesm o, fac ilm ent e manipulável.
90 G. Orwell, 1984, Folio, Galim ard, p. 62.
CAPÍT ULO VIII
OS IUFMS
Os objet ivos prec edent es são muit o ambic ios os e requerem dos prof ess ores uma
form aç ão em Psic opedagogia. Na Franç a, os IUFMS foram criados explic it am ent e para esse
fim. Ass im, o dec ret o de 18 de out ubro de 1991,91 que fixa as modalidades do
rec rut am ent o dos alunos dos IUFMS, est ipula que:
Numa prim eira etapa da prova [de franc ês], o candidat o fará a sínt es e
de text os e doc um ent os relat ivos à aquis iç ão e ao ens ino da língua franc es a e
deve res olver uma quest ão de Gram át ic a ou de voc abulário; numa segunda
etapa, ele analis ará e crit ic ará doc um ent os pedagógic os relat ivos a esse
ens ino na esc ola prim ária. [...]
Numa prim eira etapa da prova [de Mat em át ic a], o candidat o analis ará
sit uaç ões [!] ou res olverá problem as; numa segunda etapa, ele analis ará e
crit ic ará doc um ent os pedagógic os relat ivos ao ens ino da Mat em át ic a na esc ola
prim ária. [...]
[O conc urs o ext erno compreende uma] prova oral [de adm iss ão],
perm it indo ao candidat o:
- dem onst rar sua apt idão para art ic ular seus conhec im ent os, sua
capac idade de ref lexão e sua experiênc ia no dom ínio da Educ aç ão: Filos of ia da
Educ aç ão, des envolvim ent o fis iológic o e psic ológic o das crianç as e dos
adolesc ent es, abordagem psic ológic a e soc iológic a dos proc ess os de
aprendiz agem e da vida na esc ola e na soc iedade [...]
Cada uma dess as provas [do segundo conc urs o int erno] poss ibilit a
verif ic ar se o candidat o avalia corret am ent e as abordagens didát ic as e os
proc edim ent os pedagógic os relat ivos ao ens ino, na esc ola prim ária, da
disc iplina da prova, e se ele dom ina os conhec im ent os cient íf ic os nec ess ários.
A prova cons ist e na anális e de doc um ent os pedagógic os relat ivos a
quest ões que nec ess ariam ent e faz em ref erênc ia aos cont eúdos ens inados pela
esc ola prim ária no âmbit o de cada disc iplina.
Os IUFMS franc es es int egram, port ant o, um projet o mundial de form aç ão de
prof ess ores sust ent ado por pedagogias ativas e que visa a modif ic ar prof undam ent e o
papel da esc ola:
Como já se pode press ent ir, a prom oç ão dos novos cont eúdos (know-
how, valores, atit udes, conc epç ão do mundo) e a sua int egraç ão nos planos de
est udos implic am uma revis ão vast a e prof unda do sist em a educ ac ional, já
que isso afet a, a um só tempo, as est rut uras, a form aç ão de prof ess ores, as
atit udes e as ment alidades. (Unesc o)92
O aperf eiç oam ent o da form aç ão dos prof ess ores, tant o a inic ial quant o a
cont inuada, a revis ão dos manuais [mais part ic ularm ent e de hist ória] e a
produç ão de novos mat eriais e de public aç ões pedagógic as auxiliares,
int erdisc iplinares e atualiz ados, são de uma import ânc ia cruc ial em se
trat ando de inc ulc ar nos alunos os valores e princ ípios enunc iados na
Rec om endaç ão sobre a Educ aç ão para a Compreens ão, a Cooperaç ão e a Paz
Int ernac ionais e a Educ aç ão Relat iva aos Direit os do hom em e às Liberdades
Fundam ent ais adot ada pela Unesc o em 1974 [em seu período abert am ent e pró-
com unist a]. Import a que os prof ess ores de todas as mat érias rec ebam uma
form aç ão que os torne apt os a proc eder segundo uma abordagem hum anist a.
(Unesc o, 4ª Conf erênc ia dos Minist ros da Educ aç ão)93
Não é poss ível – não mais – pens ar em est ender os program as de
educ aç ão mult ic ult ural a todas as crianç as se o conjunt o do corpo doc ent e não
rec eber uma sólida form aç ão teóric a sobre os problem as levant ados pelas
int eraç ões ent re cult uras dif erent es, o que implic a est udos em Filos of ia, em
Ant ropologia Cult ural, em Linguíst ic a, em Soc iologia da Educ aç ão e em
Psic ologia do Conhec im ent o. Não bast a dem onst rar que a educ aç ão bilíngue ou
os curs os de L1 e L2 são, sob cert as condiç ões, efic az es; também é prec is o
que as esc olas com uns – e não som ent e as esc olas experim ent ais ou de
vanguarda – disponham de equipam ent os, de rec urs os, de meios que lhes
perm it irão atender a ess as condiç ões. (OCDE)94
A form aç ão deve perm it ir que os est udant es tom em consc iênc ia de seus
próprios comport am ent os e valores. É prec is o inc it á-los a analis ar e a
modif ic ar est es na perspect iva de seu des envolvim ent o pess oal. ...
Seria nec ess ário que a form aç ão aprim orass e a apt idão dos est udant es
para inc ut ir uma int eligênc ia int ernac ional em seus alunos e prepará-los para
trabalhar numa soc iedade mult ic ult ural. (Cons elho da Europa)95
Os problem as se coloc ariam ent ão em term os de cont eúdo e de mét odo,
ins ist indo-se part ic ularm ent e nas maneiras de inf luenc iar as atit udes e os
julgam ent os dos alunos-prof ess ores. (Cons elho da Europa)96
[A] ref lexão [se apoia] nas caract eríst ic as de um program a de form aç ão
pedagógic a cujo objet ivo é preparar o fut uro prof ess or para exerc er sua
prof iss ão em uma esc ola cada vez mais mult ic ult ural. (Cons elho da Europa)97
Esse cont ext o, cont udo, cria um espaç o privilegiado no qual se pode lut ar
cont ra ess es elem ent os negat ivos, acelerar as inic iat ivas em curs o no campo
da educ aç ão para uma soc iedade mult ic ult ural, inc luindo aquelas que tangem à
form aç ão dos prof ess ores e se bas eiam no pluralism o cult ural e na
equiparaç ão das oport unidades. (Cons elho da Europa)98
Todos, dos diret ores e adm inist radores aos empregados de esc rit ório e
os dem ais não doc ent es, têm nec ess idade de uma rec ic lagem [no que
conc erne ao int erc ult uralism o]. Esse grupo empregou, em seguida, um cert o
núm ero de est rat égias vis ando a venc er a res ist ênc ia à mudanç a, e propôs
modelos de program as de form aç ão de pess oal. (Cons elho da Europa)99
A form aç ão de pess oal doc ent e pret ende igualm ent e abri-los às inovaç ões
perm anent es em mat éria de Pedagogia e cont eúdos educ at ivos e faz er deles agent es
dóc eis de polít ic as educ at ivas cada vez mais revoluc ionárias:
Quaisquer que sejam as mudanç as vis adas nos sist em as educ ac ionais,
haverá sempre a nec ess idade da est reit a cooperaç ão dos prof ess ores para
preparar e exec ut ar ess as ref orm as e inovaç ões. A cont ribuiç ão e a aceit aç ão,
por part e dos prof ess ores, dess as mudanç as são uma condiç ão nec ess ária
para sua dif us ão e efic ác ia. Tornou-se evident e que a form aç ão dos
prof ess ores deveria ter laç os mais est reit os e mais bem organiz ados com a
pesquis a educ ac ional [tram adas na Franç a por meio dos IUFM], a conc epç ão
dos curríc ulos e a produç ão de mat eriais pedagógic os de tal modo que, ao
longo de suas carreiras, poss am os prof ess ores ser part e ativa no proc ess o
complexo graç as ao qual as inovaç ões pedagógic as vêm à luz (mesm o no
modest o nível da prát ic a do ens ino) e se dif undem.100
Abordam os ainda o tema da form aç ão cont ínua dos prof ess ores, dos diret ores e
out ros prof iss ionais de ens ino dos sist em as educ ac ionais. Em nada dif erindo do tema dos
IUFMS e já tendo sido por nós enc ont rado várias vez es, trat arem os rapidam ent e do
ass unt o: o dout rinam ent o e a manipulaç ão devem tornar-se perm anent es e não se lim it ar
à form aç ão inic ial.
A int roduç ão, nos program as, dos tem as de educ aç ão com voc aç ão
int ernac ional, a elaboraç ão de manuais esc olares e guias sobre ess es tem as
para os prof ess ores são menc ionados por muit os país es. Ess as atividades são
sust ent adas por toda uma série de pesquis as – de que part ic ipam as
univers idades – e por sem inários e colóquios de espec ialist as. Num eros os
país es menc ionam o seu int eress e pelas public aç ões das Naç ões Unidas e da
Unesc o sobre ess es tem as. A rec ic lagem para preparar os prof ess ores para
ess as novas taref as é uma preoc upaç ão com um a muit os Est ados.
(Unesc o)101
No térm ino de sua form aç ão, os prof ess ores devem ens inar o novo curric ulum
com a ajuda de pedagogias ativas. Esc ondendo-se atrás dos direit os hum anos, cuja
def iniç ão eles se furt am a dar – direit os que, est endidos, diss im ulam as reivindic aç ões
com unist as –, os psic opedagogos querem inc ulc ar em seus alunos uma ment alidade
colet ivist a:
Ao proc urar form at ar as atit udes de seus alunos, os prof ess ores
conf ront am-se com uma das taref as mais dif íc eis. Quais são os mét odos de
ens ino mais adequados para conduz ir ao suc ess o? O pont o fundam ent al cabe à
esc ola, que deve coloc ar em prát ic a o que ela prega. Segundo as palavras da
compilaç ão de sugest ões da Unesc o, o ens ino dos direit os hum anos deve andar
a par da prát ic a quot idiana dos direit os e dos deveres na vida quot idiana.
Ass im, a atm osf era de uma esc ola deve ser aquela de uma com unidade na
qual todos os indivíduos rec ebam o mesm o trat am ent o. Os princ ípios dos
direit os do hom em devem ser vis íveis na organiz aç ão e na condut a da esc ola,
nos mét odos utiliz ados nas salas de aula, nas relaç ões ent re os prof ess ores e
os seus alunos e ent re os próprios prof ess ores, ass im como em sua
cont ribuiç ão para o bem-est ar de toda a com unidade ext raesc olar.102
As atividades prát ic as [pedagogias ativas] são mais efic az es que o
ens ino pass ivo, com os alunos colados às cart eiras, sobret udo se há nos
alunos um manif est o int eress e pela com unidade loc al. Se uma atividade dess e
tipo não for poss ível, devem ser rec om endadas atividades de subst it uiç ão tais
como o jogo e a sim ulaç ão [dram at iz aç ão]. Ass im, a form at aç ão das atit udes
e a aquis iç ão de know-how tornam-se indiss oc iáveis dos mét odos de ens ino
utiliz ados. (Cons elho da Europa)103
Os cons elhos de um grupo de pares podem ser propost os pelo psic ólogo
esc olar, em lugar de uma int ervenç ão prevent iva. Os valores podem ser
transm it idos graç as aos novos meios de com unic ar. Os valores não são
transm it idos pelo est udant e quando são impost os, mas sim quando
experim ent ados e aprec iados na vida quot idiana. Ent re os novos meios de
com unic ar valores há, por exemplo, a dram at iz aç ão e o trabalho em grupo
onde os valores podem ser apres ent ados ao est udant e de uma maneira mais
experim ent al e mais compreens ível. (Unesc o)104
Pesquis as realiz adas com alunos pert enc ent es a um ext ens o leque de
país es des envolvidos ou em vias de des envolvim ent o most raram que, em
geral, os ens inam ent os rec ebidos na esc ola têm pouc a inf luênc ia sobre as
crenç as ant eriores. Os alunos podem seguir com suc ess o os ens inam ent os
dispens ados pelo sist em a educ ac ional e obt er seus diplom as sem, cont udo,
relac ionar ess es ens inam ent os com suas ideias ant eriores nem cons iderá-los
úteis ou nec ess ários para guiar a sua vida quot idiana.
A import ânc ia do envolvim ent o das ideias ant eriores do aluno no
proc ess o educ ac ional está agora em vias de se tornar mais amplam ent e
aceit a. Ao invés de ser ignoradas, ess as ideias são cada vez mais
cons ideradas como rec urs os para o ens ino. Além diss o, o próprio ens ino é
conc ebido com o int uit o de mudar as crenç as do aluno e des envolver modos
alt ernat ivos de compreens ão das sit uaç ões.
Além do rec onhec im ent o da import ânc ia do envolvim ent o dos
conhec im ent os e crenç as ant eriores do aluno, essa nova perspect iva sobre o
ens ino ins ist e igualm ent e sobre a cent ralidade do aprendiz no proc ess o do
ens ino. A maior part e dos ens inam ent os, para serem ass im ilados, exigem
indivíduos que tenham fort es mot ivaç ões para aprender e que sejam
ativam ent e envolvidos, fís ic a e/ou ment alm ent e, no trat am ent o de
inf orm aç ões. Sob tais condiç ões, os ens inam ent os podem reorganiz ar as ideias
dos alunos e agir sobre elas.
O rec onhec im ent o da cent ralidade da respons abilidade dos alunos em seu
próprio ens ino orient a a ref orm a que conduz a ambient es de ens ino mais
abert os e mais flexíveis, no âmbit o da esc ola e no da form aç ão perm anent e.
Tais ambient es de ens ino enf at iz am as seguint es caract eríst ic as:
- Dar aos alunos a poss ibilidade de negoc iar e de fixar os próprios
objet ivos [engajam ent o];
- Fornec er acess o flexível e abert o aos rec urs os;
- Ins ist ir mais sobre os ens inos experim ent ais;
- Utiliz ar nos program as de aprendiz agem novas tecnologias e out ros
rec urs os de maneira int erat iva e não “transm iss iva” [cláss ic a];
- Fornec er poss ibilidades de esc larec er ideias e perspect ivas novas e
alt ernat ivas, bem como ref let ir sobre isso (quer essa atividade se dê
individualm ent e ou em grupo, por meio de disc ussões e debat es) [clarif ic aç ão
dos valores];
- Ins ist ir mais na ação como res ult ado dos ens inam ent os (isto é, opor o
que os jovens podem faz er ao que eles podem conhec er);
A adoç ão dess as caract eríst ic as nas esc olas e nas salas de aula, ass im
como nos out ros ambient es de ens ino, exigirá grandes mudanç as em noss o
pens am ent o e em noss as prát ic as educ at ivas.
Perc ebem os, durant e program as de educ aç ão de adult os em relaç ão à
saúde e ao des envolvim ent o agríc ola, que as ideias ant eriores das pess oas
devem ser trat adas seriam ent e e que é nec ess ária uma abordagem do ens ino
mais orient ada para a ação/objet ivo [behaviorism o]. Perc ebe-se que a maior
part e das ideias das pess oas, ass im como as prát ic as que se est endem por
toda uma vida, não serão modif ic adas ao se lhes inc ulc ar um novo saber. A
experiênc ia prova que, para ocorrer uma mudanç a, as crenç as prec is am ser
reveladas e rec onhec idas, e que as mudanç as têm mais chanc es de se
produz ir quando as pess oas est ão envolvidas nos program as de ação nos quais
taref as são empreendidas. (Unesc o)105
Essa últ im a cit aç ão, de import ânc ia capital, revela os objet ivos reais da
pedagogia centrada no aluno (“cent ram ent o” no aluno).
Um projeto mundial
Os IUFMS franc es es int egram, port ant o, um projet o mundial, tal como o
most raram as cit aç ões prec edent es, e em part ic ular aquelas ext raídas da Dec laraç ão
mundial sobre a educ aç ão para todos:
A fim de res olvê-los, cabe a nós não som ent e rec onhec er a
int erdependênc ia dos divers os set ores de noss a econom ia e de noss a vida
cot idiana, mas também adm it ir a nec ess idade de adot ar novas abordagens e
novas atit udes. A soc iedade fut ura deve poder cont ar com seu sist em a
educ ac ional para os inc ulc ar, se quis erm os enc ont rar soluç ões válidas para
ess es múlt iplos problem as. Ao mesm o tempo, é nec ess ário que
compreendam os que ess es problem as não são som ent e int erdisc iplinares, mas
também int ernac ionais e que eles não podem, port ant o, ser res olvidos em
nível nac ional. (Unesc o. 4ª Conf erênc ia dos Minist ros da Educ aç ão)106
As inic iat ivas de form aç ão [de prof ess ores] em nível exc lus iva e
meram ent e nac ional não bast am: não podem dar suf ic ient e impuls o para a
compreens ão int ernac ional des ejada pela Unesc o tant o no dom ínio da
Pedagogia como no da étic a e dos direit os hum anos. (Unesc o)107
O pont o mais import ant e é que deveria haver um curríc ulo univers al,
int ernac ional e padrão, est abelec ido sob os auspíc ios das Naç ões Unidas. Em
part ic ular, esse curríc ulo padrão deveria ser dif undido a part ir das séries de
manuais esc olares padroniz ados elaborados sob os auspíc ios da Naç ões
Unidas. [...]
Isso prova ainda a nec ess idade de séries de manuais int ernac ionais
padroniz ados e de um curríc ulo int ernac ional padrão ens inado pelos
prof ess ores que rec eberam uma form aç ão padroniz ada.
[...]
Enquant o uma geraç ão não tiver rec ebido os ens inam ent os de um
curríc ulo int ernac ional padrão, todos rac ioc inarão segundo os velhos esquem as
ment ais que, por fim, são fat ais para a hum anidade. Ass im, des ejam os
rec eber a anuênc ia volunt ária dos dif erent es parc eiros da educ aç ão, fam ílias,
organiz aç ões prof iss ionais, ass oc iaç ões religios as e cult urais, adm inist raç ões e
exérc it o. Para o bem de todos, des ejam os rec eber seu apoio na
int ernac ionaliz aç ão e padroniz aç ão da educ aç ão. (Unesc o)108
Esperam os, port ant o, que o Com it ê Nac ional do Ens ino Cat ólic o seja levado a
rec ons iderar os acordos que est abelec eu com o governo, os quais ent regam a form aç ão
dos prof ess ores do ens ino privado aos IUFMS. Quem sabe chegue a quest ionar também a
“tradiç ão de inovaç ões pedagógic as” do ens ino cat ólic o, que seu sec ret ário geral de ent ão,
o padre Cloupet, def endia durant e as ass embleias nac ionais em maio de 1993.
Num eros as voz es se elevaram, tant o na direit a como na esquerda, para pregar a
desc ent raliz aç ão ou a desc onc ent raç ão do sist em a educ ac ional franc ês. Os pont os
princ ipais dest a ref orm a são os seguint es:
◆ conc eder aut onom ia aos chef es de est abelec im ent o;
◆ desc ent raliz ar para perm it ir a part ic ipaç ão das colet ividades territ oriais e dos
agent es econôm ic os;
◆ dot ar os prof ess ores de uma maior conf ianç a.
Ess es princ ípios podem parec er salut ares e capaz es de cont ribuir para a melhoria
da sit uaç ão do sist em a educ ac ional franc ês, embora não expliquem por que o atual
sist em a cent raliz ado brusc am ent e deixou de parec er sat isf at ório, pouc o após o iníc io da
revoluç ão pedagógic a. No ent ant o, é prec is o cons iderar as circ unst ânc ias de sua aplic aç ão;
em part ic ular não poderiam ser negligenc iadas a inf luênc ia das Ciênc ias da Educ aç ão e das
pedagogias ativas, por um lado, e a das inst it uiç ões int ernac ionais, por out ro lado.
As inst it uiç ões int ernac ionais compet ent es em mat éria de educ aç ão (Cons elho da
Europa, Unesc o e OCDE) trabalham desde há muit os anos em colaboraç ão est reit a com os
num eros os minist érios da Educ aç ão, e em part ic ular com o minist ério franc ês. Com a
ajuda da proxim idade geográf ic a, os func ionários franc es es int ervêm frequent em ent e na
qualidade de experts junt o a tais inst it uiç ões. Exist e, dess e modo, um cons ens o prof undo
ent re todas as adm inist raç ões nac ionais – mais part ic ularm ent e a franc es a – e
int ernac ionais.
Não podem os, pois, negligenc iar o peso dess as últ im as em um projet o de ref orm a
nac ional, ainda mais quando o trat ado de Maast ric ht (Art. 165, 3) est ipula que “A
Com unidade e os Est ados membros favorec em a cooperaç ão com os país es terc eiros e as
organiz aç ões int ernac ionais compet ent es em mat éria de educ aç ão, e em part ic ular com o
Cons elho da Europa”. Ora, est as inst it uiç ões que trabalham desde há muit os anos sobre o
tema da desc ent raliz aç ão desnat uram prof undam ent e os objet ivos dest a.109
Como já o vim os, a ref orm a pedagógic a que ocorre atualm ent e em num eros os
país es quer subst it uir os ens inam ent os cláss ic os e cognit ivos por um ens ino
“mult idim ens ional e não cognit ivo” que toque em todos os component es da pers onalidade:
étic o, afet ivo, soc ial, cívic o, polít ic o, est ét ic o, psic ológic o. Trat a-se de esvaz iar os
ens inam ent os de seus cont eúdos (cognit ivos) para subst it uí-los por um dout rinam ent o
cript oc om unist a e globalist a, que vise a modif ic ar os valores, as atit udes e os
comport am ent os. Ess as ref orm as pedagógic as doravant e goz am de um amplo cons ens o
ent re os dirigent es da Educ aç ão Nac ional e são veic uladas pelos IUFMS,110 o INRP,111 o
CNDP,112 os CRDP113 e os prof iss ionais das ciênc ias da educ aç ão com o acordo tác it o da
FEN. Falt a, no ent ant o, a aceit aç ão do conjunt o da soc iedade e do corpo doc ent e, o qual,
até o mom ent o, sempre opôs uma res ist ênc ia pass iva, mas det erm inada, a toda tent at iva
que tende a esvaz iar o ens ino de seu cont eúdo. A desc ent raliz aç ão é o inst rum ent o pelo
qual isso é alc anç ado, criando-se uma dinâm ic a de grupo em esc ala esc olar e com unal,
utiliz ando-se da psic ologia do engajam ent o e das técnic as de manipulaç ão cláss ic as.
O “projet o de esc ola” perm it e a aplic aç ão conc ret a dess as ideias no ens ino
prim ário. Todos as esc olas são atualm ent e obrigadas a implem ent ar tal projet o. Eis a
def iniç ão dada a ele por uma public aç ão do Cent ro Regional de Doc um ent aç ão Pedagógic a
de Nant es:
O projet o pedagógic o engaja colet iva e individualm ent e os prof ess ores de
uma esc ola, de um cic lo ou de um mesm o nível de ens ino... Cent ra-se nos
aprendiz ados e se ref ere aos text os ofic iais. Seu campo de aplic aç ão se
est ende para além da sala de aula, na esc ola, e mesm o [para além] de seu
ambient e próxim o ou dist ant e. [...]
O projet o educ ac ional engaja tant o os prof ess ores quant o os não
prof ess ores da com unidade educ ac ional. Não diz respeit o apenas ao aluno, mas
à crianç a enquant o indivíduo, cuja melhor ins erç ão poss ível na esc ola e na
soc iedade é vis ada através da abert ura para uma maior respons abilidade e
aut onom ia... Seu campo de aplic aç ão se amplia para uma rede mais ou menos
est endida em torno da esc ola.
O projet o de esc ola perm it e a realiz aç ão dos objet ivos nac ionais em
cont ext os espec íf ic os: compreende tant o os projet os pedagógic os def inidos
pelos prof ess ores quant o os projet os educ ac ionais que congregam todos os
parc eiros da esc ola.114
Como todo o “pess oal mult iplic ador”, os diret ores esc olares são objet o de grande
atenç ão por part e dos poderes públic os franc es es115 ou int ernac ionais; o Cons elho da
Europa lhes cons agrou vários est udos. As conc lusões são sempre as mesm as: é prec is o
conc eder aut onom ia aos diret ores esc olares para que eles poss am agir. Mas os
func ionários franc es es e int ernac ionais dão um sent ido bem part ic ular a essa propos iç ão.
Para eles, o diret or é o agente de mudança (change agent) por exc elênc ia, que deve
utiliz ar sua “habilidade” psic ológic a e sua ciênc ia de manipulaç ões de grupo para faz er a
equipe de prof ess ores aceit ar as ref orm as pedagógic as desc rit as ant eriorm ent e, as quais
de out ro modo ela rec us ar-se-ia sempre a aplic ar. Conc ebe-se, pois, fac ilm ent e que o
diret or da esc ola deva dispor de uma grande aut onom ia para adapt ar sua polít ic a aos
part ic ulares embaraç os loc ais que enc ont re. Por out ro lado, conc eder aut onom ia ao diret or
o envolve na ref orm a; part ic ipando nela ativam ent e, ele se enc ont ra em uma sit uaç ão
psic ológic a que não lhe perm it e se opor, crit ic ar o que ele mesm o foi levado a faz er pass o
a pass o, pé na port a após pé na port a.
Torna-se evident e a part ir dos est udos de cas os que um dos princ ipais
obst ác ulos para a inovaç ão é a res ist ênc ia à mudanç a, part ic ularm ent e da
part e daqueles que têm por miss ão implem ent ar o projet o no meio esc olar.
Alguns faz em not ar que a inovaç ão tropeç a nas tendênc ias cons ervadoras da
colet ividade; isso não impede que, em cada grupo – pais ou prof ess ores –,
alguns sejam sempre favoráveis a uma mudanç a pos it iva, e o apoio de uns
servirá para compens ar as reaç ões negat ivas de out ros. É prec is o igualm ent e
cont ar com as forç as int ernas ext rem am ent e poderos as que guiam cada um
de nós e que nos impelem a res ist ir à mudanç a. Os sent im ent os dif erent es
experim ent ados pelos part idários e advers ários da inovaç ão podem
frequent em ent e ser font e de conf lit os no int erior da própria esc ola.
Diss o deriva a nec ess idade de os diret ores, cons elheiros e inspet ores
conhec erem e dom inarem melhor ess es fenôm enos a fim de poder ajudar o
corpo doc ent e a superar tais obst ác ulos, por exemplo, coloc ando em evidênc ia
seus sent im ent os e relaç ões. É prec is o que os diret ores aprendam,
part ic ularm ent e, a trat ar tais sit uaç ões com habilidade e delic adez a, para
ref orç ar no seio da equipe doc ent e (e out ros prof ess ores e parc eiros) o
espírit o de cooperaç ão e o sent im ent o de um objet ivo com um a ser atingido
[dinâm ic a de grupo]. Os trabalhos de pesquis a most ram claram ent e que os
diret ores des empenham um papel de todo import ant e com relaç ão a isso,
desde que est ejam convenc idos. (Cons elho da Europa)116
Quando o diret or sabe como os prof ess ores mudam, quando conhec e as
caus as de res ist ênc ia à mudanç a, as condiç ões propíc ias ao suc ess o das
mudanç as e os post ulados e variáveis ligados à mudanç a, pode-se cons iderar
que ele – ou ela – está em boa pos iç ão para esf orç ar-se por int roduz ir as
inovaç ões em sua esc ola. É evident e que no princ ípio o diret or deverá utiliz ar-
se conc ret am ent e de cert as est rat égias, mét odos e medidas para ser efic az.
Quando exam inam os as est rat égias e os mét odos de um pont o de vist a
mais geral, podem os ret er a tipologia das est rat égias de inovaç ão propost a por
Chin e seus disc ípulos.117 Segundo essa tipologia, exist em três tipos de
est rat égias:
a) est rat égias coerc it ivas que dependem do acess o aos rec urs os
polít ic os, jurídic os, adm inist rat ivos e econôm ic os;
b) est rat égias empíric o-rac ionais bas eadas no post ulado de que o hom em
é rac ional e será sobret udo sens ível às explic aç ões e dem onst raç ões lógic as;
c) est rat égias norm at ivas e reeduc at ivas que suponham que toda
inovaç ão efic az pass e por uma mudanç a de atit udes, de relaç ões, de valores e
de compet ênc ias e, port ant o, pela ativaç ão de forç as no int erior do sist em a
client e. (Cons elho da Europa)118
É evident e que as inst it uiç ões int ernac ionais trabalham princ ipalm ent e, e mesm o
exc lus ivam ent e, apoiadas nas est rat égias do terc eiro tipo, que são na verdade técnic as de
manipulaç ão psic ológic a.
Not em os, enf im, que o “projet o de esc ola” const it ui um pass o cons iderável em
direç ão à aut onom ia dos diret ores.
Conceder autonomia para dar confiança aos professores
O diret or esc olar não pode, no ent ant o, malgrado toda sua “habilidade”, garant ir
soz inho o suc ess o das ref orm as. É prec is o nec ess ariam ent e envolver os prof ess ores, o
que é poss ível na Educ aç ão nac ional e alhures em virt ude da desc ent raliz aç ão na
adm inist raç ão esc olar (aut onom ia) que perm it e utiliz ar a dinâm ic a de grupo, a psic ologia
do engajam ent o, a int eraç ão e a negoc iaç ão. Cons egue-se ass im a aceit aç ão das “ref orm as
pedagógic as” pelos prof ess ores, que esvaz iam seus curs os de seu cont eúdo acadêm ic o e o
subst it uem por um ens ino mult idim ens ional e não cognit ivo. Trat a-se de um res ult ado
not ável, pois num eros as ref orm as da educ aç ão, na Franç a ou no ext erior, frac ass aram por
caus a da opos iç ão pass iva dos prof ess ores que se rec us avam a renunc iar aos cont eúdos
acadêm ic os. Novam ent e, part ilha dess a perspect iva o “projet o de esc ola”, que ins ist e no
trabalho em equipe dos prof ess ores para criar uma dinâm ic a de grupo e engajá-los na
polít ic a da esc ola. Eis algum as cons ideraç ões bast ant e esc larec edoras do Cons elho Europeu
sobre ess es pont os:
Lembrem os que, ao longo dess e capít ulo, as ideias cent rais de int eraç ão
e negoc iaç ão devem est ar pres ent es ao espírit o. A inovaç ão, para ser coroada
de êxit o, exige a part ic ipaç ão ativa daqueles que são seus agent es, e mais
amplam ent e de todos os que serão afet ados por sua aplic aç ão e suas
cons equênc ias. [...]
No anexo IV do pres ent e relat ório, o Prof ess or R. Vanderberghe
apres ent a a noç ão de abordagem regress iva (backward mapping), na qual vê
um meio de prom over a part ic ipaç ão dos int eress ados nas divers as etapas
preparat órias à inovaç ão. Em vez de part ir do pont o de vist a dos que têm
poder de dec is ão na adm inist raç ão cent ral, essa abordagem toma como base
de part ida a opinião daqueles que serão def init ivam ent e cham ados a traduz ir a
inovaç ão em fat os. [...]
Diss o dec orre que as inic iat ivas só terão chanc e de êxit o caso todas as
inst ânc ias do sist em a educ ac ional não se cont ent em em “aceit ar” as
mudanç as previst as, mas “se engajem” a dar pross eguim ent o a tais
mudanç as. De fato, é pouc o provável que um simples ass ent im ent o seja
suf ic ient e para modif ic ar os mec anism os no sent ido des ejado pela inovaç ão.
Por out ro lado, se todas as part es se engajarem, pregarão em toda part e e em
conc ert o a caus a do novo program a.
Vem os que uma cois a é aceit ar, out ra, se engajar: aquele que se engaja
compreende e medit a os princ ípios que guiarão a inovaç ão, enquant o aquele
que aceit a rest ringe-se a endoss ar as propos iç ões feit as, condiç ão às vez es
nec ess ária à manut enç ão de seu emprego ou a uma prom oç ão. (Cons elho
Europeu)119
A descentralização
Para os alt os func ionários int ernac ionais, a desc ent raliz aç ão em esc ala regional ou
com unal não deve som ent e perm it ir a int erf erênc ia às colet ividades territ oriais e aos
agent es econôm ic os. Ela visa fundam ent alm ent e a criar, em esc ala nac ional, um cons ens o
acerc a das ref orm as pedagógic as desc rit as ant eriorm ent e, e de fato inac eit áveis, nelas
envolvendo toda a soc iedade. Ela tende igualm ent e a faz er da educ aç ão um dos tem as
ideológicos unificadores da socie dade, por isso mesm o susc et ível de utiliz aç ões e
desvios bem vast os. Trat a-se, port ant o, de uma manobra totalitária.
Conc ebem os ent ão que também aqui haverá “res ist ênc ias à mudanç a” e que será
nec ess ário most rar “habilidade”. Mais uma vez, tal res ult ado não pode ser obt ido sem o
comprom et im ent o das pess oas envolvidas, e a psic ologia do engajam ent o é novam ent e
cham ada a cont ribuir, mas dest a vez na esc ala da colet ividade loc al:
Sendo complexas e variadas as nec ess idades educ ac ionais fundam ent ais,
faz em-se nec ess árias, a fim de sat isf az ê-las, est rat égias e ações
mult iss et oriais que est ejam int egradas no esf orç o de des envolvim ent o global.
Se quis erm os que a educ aç ão fundam ent al seja novam ent e perc ebida como
respons abilidade da soc iedade int eira, muit os parc eiros devem ass oc iar seus
esf orç os aos que as aut oridades do ens ino, os prof ess ores e dem ais
prof iss ionais do ens ino faz em para des envolvê-la. Isso supõe que parc eiros
muit o variados – fam ília, prof ess ores, com unidades loc ais, empres as privadas
[part ic ularm ent e aquelas do set or da inform ação e da com unicação],
organiz aç ões governam ent ais e não governam ent ais etc. – part ic ipem
ativam ent e da planif ic aç ão, gest ão e avaliaç ão das múlt iplas form as de que se
revest e a educ aç ão fundam ent al. (Dec laraç ão mundial)120
Eis alguns ext rat os do relat ório final de um colóquio de alto nível organiz ado pela
Unesc o em Port ugal que trat am da desc ent raliz aç ão:
Ter-se-á not ado o papel dos psic ólogos e a conf iss ão cínic a relac ionada à dinâm ic a
de grupo que perm it e exerc er o cont role soc ial sobre os indivíduos, ness e caso os
prof ess ores, por int erm édio de seu grupo de pares. Aqui ainda, os “projet os de esc ola”
franc es es, que devem inc luir os “parc eiros loc ais da esc ola”, inspiram-se ness a filos of ia.
Em noss o país, a desc ent raliz aç ão é def endida em part ic ular por Louis Legrand,
pers onalidade que teve inf luênc ia cons iderável no sist em a educ ac ional franc ês. A cit aç ão
seguint e, ext raída de um de seus esc rit os, revela as ligaç ões prof undas e bast ant e
import ant es que exist em ent re desc ent raliz aç ão e ens inos não cognit ivos:
Bas il Bernst ein dest ac a duas caract eríst ic as dess e sist em a. Em prim eiro
lugar, a nec ess idade de um acordo ideológic o ent re os parc eiros e o carát er
explíc it o dess e acordo [donde a criaç ão dos IUFMS, dest inados a ass egurar
esse “acordo ideológic o” e aprof undá-lo]. No código seriado, a ideologia
também exist e, mas perm anec e implíc it a. No código int egrado, os dif erent es
parc eiros devem est ar de acordo sobre as esc olhas de valores explic it am ent e
def inidos. [Seria exagero falar aqui em dit adura ideológic a e psic ológic a?]
Por out ro lado, se o código seriado, pelas norm as impost as, pode convir
a prof ess ores rec ém-chegados, não ocorre o mesm o com o código int egrado.
O func ionam ent o de um est abelec im ent o regido por esse código nec ess it a de
um cons iderável invest im ent o temporal e afet ivo, ou seja, de prof ess ores mais
bem form ados e mais ent us iasm ados por um ideal [inc ulc ado nos IUFMS].
Em mat éria de ens ino, a dialét ic a cent raliz aç ão-desc ent raliz aç ão tem,
pois, uma import ânc ia cons iderável na medida em que se liga a conc epç ões
muit o dif erent es da educ aç ão e dos valores que esta implem ent a. Ess es
valores podem pert enc er à pers onalidade de base de uma populaç ão e ser o
frut o da hist ória. Mas, como dest aquei no iníc io dest e capít ulo, essa esc olha
de valor pode se tornar polít ic a na medida em que está explic it ada e insc rit a
num projet o de soc iedade. Dess e pont o de vist a, a cent raliz aç ão em mat éria
de educ aç ão liga-se a um corpo de dout rinas agrupado em torno de valores
est reit am ent e ligados. Em prim eiro lugar, a unidade nac ional traduz indo-se pela
univers alidade da lei e das norm as que ela veic ula. Em segundo lugar, a
just iç a, na medida em que se pres um e que essa ordem aplic ada a todos cria
as condiç ões de uma igualdade de oport unidades. O código seriado, com seus
program as aplic áveis em qualquer lugar e seus exam es impess oais válidos no
conjunt o do territ ório nac ional, emerge como a garant ia de tal just iç a. Liga-se
enf im, e a cont rário, ao valor do indivíduo, na medida em que essa just iç a
impess oal leva à compet iç ão, class if ic aç ão segundo o mérit o e dess e mesm o
modo à just if ic aç ão da seleç ão. Essa ordem finalm ent e funda no nível do
direit o o ‘elit ism o republic ano’, produt o do mérit o individual e da just iç a.
Acresc ent em os ainda a import ânc ia ass oc iada ao saber como inst rum ent o de
libert aç ão do hom em e penhor do progress o colet ivo.
Por opos iç ão, a desc ent raliz aç ão liga-se durant e a maior part e do tempo
a out ros valores, e privilegia o func ionam ent o em código int egrado. Em
prim eiro lugar, a vivênc ia relac ional e a convivênc ia. O que import a aqui não é
um saber abst rat o e univers al e a compet iç ão pela exc elênc ia individual; mas
um saber na vida em com um e part indo do rec onhec im ent o pos it ivo da
divers idade. A tolerânc ia int elect ual do código seriado, que geralm ent e não é
senão uma fac hada que esc onde o carát er imperat ivo da “raz ão”, cede aqui o
prim eiro lugar a uma tolerânc ia afet iva que põe em prim eiro plano as
qualidades “do coraç ão”. É por isso que a desc ent raliz aç ão em mat éria de
educ aç ão liga-se a uma out ra sens ibilidade relat iva à ‘just iç a’. Esta, sempre
pres ent e, não é mais impess oal. Leva em cont a as condiç ões soc iais da
aprendiz agem; é sens ível às ‘def ic iênc ia soc iais’, proc ura compens á-las com
técnic as de apoio que não são som ent e int elect uais, mas também afet ivas e
nas quais a het erogeneidade dos grupos não é senão um aspect o.
É por isso que a esc ola ness as condiç ões deve abrir-se ao meio e à
fam ília, prim eiro lugar de soc ializ aç ão. O prof ess or não é mais o
repres ent ant e de uma disc iplina: é também o ‘tut or’, o auxílio afet ivo à
dispos iç ão, laço vivent e ent re a fam ília e a esc ola.
Compreende-se ent ão por que a esc olha de uma polít ic a educ ac ional em
mat éria de cent raliz aç ão ou de desc ent raliz aç ão liga-se est reit am ent e à
ideologia conf orm e foi dito no capít ulo II.124
Alguns terão julgado as cons ideraç ões prec edent es dem as iado teóric as, e fadadas
ao frac ass o as técnic as que elas prec oniz am. É prec is o também ins ist ir no fato de que os
proc edim ent os das inst it uiç ões int ernac ionais desc rit os ant eriorm ent e são frut o de muit os
dec ênios de trabalho e de que foram longam ent e test ados e aperf eiç oados por equipes de
psic ólogos, pedagogos e espec ialist as em ciênc ias hum anas. São o res ult ado de um
“progress o cient íf ic o”, também aplic ado com suc ess o no campo da adm inist raç ão de
empres as. Seria ent ão de todo ilus ório esquivar-se do problem a fec hando os olhos,
querendo acredit ar que não darão os res ult ados previst os. A tít ulo de exemplo,
ass inalem os que as técnic as de desc ent raliz aç ão foram experim ent adas na China e em
Port ugal, onde verdadeiram ent e rev olucionaram o sist em a educ ac ional.
As técnic as ant eriorm ent e desc rit as, frut o da cooperaç ão pedagógic a mundial, são
dif undidas por inst it uiç ões int ernac ionais. São veic uladas na Franç a por dirigent es da
Educ aç ão nac ional, pelos IUFM, INRP, CNDP, CRDP e pelos prof iss ionais de Ciênc ias da
Educ aç ão. Se o sist em a franc ês viess e a ser desc ent raliz ado, conf orm e está em quest ão,
as técnic as seriam ent ão nat uralm ent e adot adas no conjunt o do territ ório sem que
ninguém se lhes pudess e opor. Import a convenc er-se também de que o problem a subs ist e,
cert am ent e de modo menos int ens o, no sist em a cent raliz ado atual.
Se a anális e acim a pode parec er um tant o quant o surpreendent e, com a maior
part e dos tem as evoc ados não tendo sido ainda objet o de debat e públic o, é cont udo
conf irm ada explic it am ent e por Ant oine Prost, aut or do relat ório ao minist ro da Educ aç ão
sobre Os lic eus e seus est udos125 e ant igo cons elheiro do sr. Roc ard, que esc reveu
rec ent em ent e:126 “É prec is o descentralizar, cert am ent e, mas de modo mais radic al
ainda: no nível das escolas, e não no das regiões. É o únic o modo de perm it ir que a
inst it uiç ão esc olar res olva a quest ão pedagógica”. Vindo de um soc ialist a expert em
mat éria de Educ aç ão, que sabia, ao esc rever ess as linhas, que seu part ido perderia o
poder, uma conf iss ão de tais dim ensões merec e ser longam ent e medit ada.
109 Trat ado da União Europeia, ass inado a 7 de Fevereiro de 1992 na cidade
holandes a de Maast ric ht. Cons idera-se ‘país es terc eiros’ aqueles que não são membros da
União Europeia – N do T.
110 IUFM – Inst it ut o Univers it ário de Form aç ão de Mest res.
111 INRP – Inst it ut o Nac ional de Pesquis a Pedagógic a.
112 CNDP – Cent ro Nac ional de Doc um ent aç ão Pedagógic a.
113 CRDP – Cent ro Regional de Doc um ent aç ão Pedagógic a.
114 G. Fauc on, Guida de l’inst it ut eur e du prof ess eur d’école, Paris, Cent re régional
de doc um ent at ion pédagogique de Nant es, Hac hett e, 1991, p. 10.
115 Bullet in off ic iel du ministère de l’Éduc at ion nat ional de 4, 18 e 25 de junho de
1992 e 16 de julho de 1992.
116 Projet nº 8 du CDCC, L’innovat ion dans l’ens eignem ent prim aire, Rapport final,
Strasbourg, Cons eil de l’Europe, 1988, p.54 [CDCC (88) 13 et DCES/EGT (87) 23]. Rapport
publié sans rés erve sur les opinions expos ées par ses aut eurs et qui ref lèt e – un acc ord
sur chaque point import ant et sur les opt ions prés ent ées de l’ens emble des membres du
groupe de projet (p. 2). Sublinhado no text o.
117 Chin et al., General strat egies in aff ect ing changes in hum an syst ems, in W.
Bennis et al. (edit ors), The planning of change, New York, Holt, 1969.
118 32e sém inaire d’ens eignants du Cons eil de l’Europe, Donauesc hingen, 23-28 juin
1986, Le rôle du chef d’établiss em ent dans l’innovat ion à l’école prim aire, Strasbourg,
Cons eil de l’Europe, 1987, p. 13. Rapport publié sans rés erve sur les opinions expos ées par
ses aut eurs [DECS/EGT (86) 72-F].
119 L’innovat ion dans l’ens eignem ent prim aire, Op. cit., p. 44 sq. Sublinhado no
text o.
120 WCEFA, Dec laraç ão mundial sobre a educ aç ão para todos, Op. cit., Quadro de
ação, Art. 11, p. 5. Dest ac am os.
121 Colóquio Réuss ir à l’école, Op. cit., Unesc o, p. 3.
122 Ibid., p. 19. Dest ac am os.
123 Ibid., p. 23. Dest ac am os.
124 L. Legrand, Les polit iques de l’éduc at ion, Paris, PUF, 1988, p. 62.
125 A. Prost, Les lyc ées et leurs études. Au seuil du XXIe sièc le, Paris, ministère
de l’Educ at ion nat ionale, Servic e inf orm at ion, 1983.
126La Revue des deux Mondes, Set. 92, p. 20. Negrit o noss o.
CAPÍT ULO X
A AVALIAÇÃO E A INFORMATIZAÇÃO
DO SISTEMA EDUCACIONAL MUNDIAL
Com o ens ino se “aperf eiç oando”, a avaliaç ão dos est udant es deve ser igualm ent e
modif ic ada. Em det rim ent o do acadêm ic o e do cognit ivo, o ens ino torna-se desde já
“mult idim ens ional” e inc umbido, por isso mesm o, de todos os component es da
pers onalidade: étic o, afet ivo, soc ial, polít ic o, est ét ic o, psic ológic o... Est es são os dom ínios
que prec is am ser priorit ariam ent e cont emplados pelas polít ic as de avaliaç ão
internacionais planif ic adas em esc ala mundial. Ass im, nos Est ados Unidos, já se avalia o
civ ism o das crianç as. Também a Franç a está res olut am ent e engajada ness e sent ido, e,
ass im, dent re as dispos iç ões relat ivas aos alunos às quais os prof ess ores tiveram de dar
cumprim ent o, pela prim eira vez, em 1992, enc ont ram-se: “Ass um ir respons abilidades nos
níveis da class e e da esc ola”, “Conhec er divers os aspect os do pat rim ônio cult ural, a
exist ênc ia de out ras civiliz aç ões e de out ras cult uras”,127 “Afirm ar sua esc olhas e seus
gost os est ét ic os: explic it á-los e part ilhá-los”, “Ident if ic ar alguns dos grandes problem as do
mundo, most rar-se sens ível a ess as quest ões”.128
Mas, além da legít im a inquiet aç ão que sem elhant e inic iat iva pode susc it ar, não se
pode esquec er que a avaliaç ão visa fundam ent alm ent e a int erioriz ar os valores, as atit udes
e os comport am ent os des ejados pelos governant es:
Será int eress ant e exam inar o cont eúdo e os term os dos indic adores de
perf orm anc e à medida que eles se propagam de um sist em a de ens ino a
out ro. Os prof ess ores ens inarão para responder às exigênc ias do sist em a de
avaliaç ão e os alunos, conf orm em ent e, aprenderão. Ass im, é de import ânc ia
prim ordial que os dispos it ivos de avaliaç ão, de acompanham ent o e de cont role
públic o do func ionam ent o do sist em a ref lit am plenam ent e as ref orm as dos
program as e da pedagogia que se des eja implem ent ar. (OCDE)129
Os Estados Unidos
Exporem os inic ialm ent e a sit uaç ão do sist em a educ ac ional nort e-americ ano, que
está, no que conc erne a essa ref orm a, alguns anos à noss a frent e. Trat a-se, convém
ins ist ir, de fat os provados, bem est abelec idos, e não de projet os:
◆ Um núm ero cresc ent e, e já signif ic at ivo, de alunos do prim ário são subm et idos
a test es psic ológic os dest inados a det erm inar tant o seus perf is psic ológic os como suas
dispos iç ões psic ológic as.
◆ Ess es test es perm it em, da mesm a form a, det erm inar a dispos iç ão dos pais,
ref let idas por aquelas perc ebidas nas crianç as. Perm it em também, mediant e a comparaç ão
ent re o iníc io e o fim do ano esc olar, avaliar a inf luênc ia dos prof ess ores.
◆ Conf orm e os res ult ados que apres ent em em tais test es, os alunos são ass im
subm et idos a “curs os” espec iais, bas eados em livros e film es conc ebidos por psic ólogos e
dest inados a modif ic ar seu comport am ent o de acordo com as técnic as elaboradas pelos
behaviorist as. O behaviorism o é uma esc ola de Psic ologia que conc ebe o hom em como um
tipo de máquina, à qual bast a int roduz ir os inputs corret os – em part ic ular a educ aç ão –
para obt er os “corret os” outputs. Tais curs os espec iais não são senão manipulaç ão
psic ológic a, de rest o noc iva, dest inada a “des enc orajar a transm iss ão de cert as atit udes
aprendidas com os pais”.130 Trat a-se, port ant o, de utiliz ar “a educ aç ão como inst rum ent o
para condic ionar a vont ade do povo”.131
◆ Menc ionem os de pass agem que, segundo as teorias behaviorist as, o nível
esc olar des ejado deve ser o da “compet ênc ia mínim a”. Isso se traduz, de fato, numa baixa
cat ast róf ic a do nível esc olar: após ess as ref orm as, o núm ero de ilet rados nort e-
americ anos pass ou de 18 a 25 milhões em pouc os anos. Desde ent ão, o governo não mais
fornec eu est at íst ic as...
◆ Os res ult ados dos test es psic ológic os est ão aloc ados numa únic a base de
dados inf orm at iz ada que conc ent ra todas as inf orm aç ões ref erent es aos Est ados Unidos.
◆ Os organism os nort e-americ anos envolvidos tenc ionam ligar essa base de
dados a out ras sim ilares exist ent es no mundo. As organiz aç ões int ernac ionais não opõem,
nat uralm ent e, qualquer obst ác ulo a isso.
◆ Tudo isso foi feit o sem que o povo nort e-americ ano foss e inf orm ado e só foi
desc obert o de modo fort uit o.
As organizações internacionais
A polít ic a nort e-americ ana de avaliaç ão e de inf orm at iz aç ão faz part e de um
proc ess o mundial. Ass im, já em 1982, podia-se ler em uma public aç ão “preparada para o
Gabinet e Int ernac ional de Educ aç ão” da Unesc o:
No dom ínio afet ivo, não se dispõe ainda [1982] de uma taxonom ia
sat isf at ória. Na maior part e das pesquis as, só se ret ém afinal o que diz
respeit o às atit udes, enquant o a avaliaç ão dest as perm anec e via de regra
bast ant e rudim ent ar. Os import ant es trabalhos de J. Raven sobre o ass unt o
não produz iram ecos prof undos.
Quant o ao dom ínio psic om ot or, a sit uaç ão é ainda menos sat isf at ória.
Surpreende ainda mais o fato de que exist am trabalhos parc iais de grande
prec is ão mas que, até onde sabem os, jam ais foram coordenados ou
art ic ulados a fim de form ar o esperado inst rum ent o tant o da avaliaç ão quant o
da const ruç ão de curríc ulos [...] [Verem os ainda que desde ent ão essa lac una
foi preenc hida.]
Uma nova tendênc ia [1982] de pesquis a em mat éria de aquis iç ões
mínim as é exemplif ic ada pelos trabalhos de J. Raven, que, pela prim eira vez,
parec e-nos, levant a o problem a das chaves do saber-ser ou, se pref erir, da
aprendiz agem ess enc ial no dom ínio afet ivo. [...]
Stuff lebeam dist ingue sete dom ínios prim ários [nos quais se deve
proc eder à avaliaç ão]: int elect ual, afet ivo, psíquic o, moral, est ét ic o,
prof iss ional e soc ial; ele se pos ic iona claram ent e, ass im, no nível dos valores.
[...]
Por compet ênc ias ent endem-se os conhec im ent os, os saberes, os saber-
ser ou, de modo mais geral, os comport am ent os dos quais o est udant e deve
adquirir o dom ínio. Ess as compet ênc ias são def inidas a part ir de uma
conc epç ão explíc it a do papel a cumprir [behaviorism o]; elas são avaliadas em
term os que perm it em a avaliaç ão dos comport am ent os do est udant e em
relaç ão a compet ênc ias det erm inadas. [...]
Há também divergênc ias quant o à dim ens ão dos módulos [nos quais o
ens ino deve est ar subm et ido à avaliaç ão]. Ora, a dim ens ão dos módulos
repres ent a um aspect o capit al em um sist em a que busc a univers aliz ar-se, no
int erior de um sist em a ou de um subs ist em a educ at ivo part ic ular, a princ ípio,
e, depois, ent re sist em as regionais, nac ionais, e mesm o, a seguir,
int ernac ionais. [...]
Uma vez que toda pesquis a cient íf ic a comport a uma avaliaç ão,
quant it at iva e/ou qualit at iva, não deve caus ar surpres a que tal dom ínio [o da
avaliaç ão] se benef ic ie de modo espec ial do cresc ent e des envolvim ent o da
pesquis a em Educ aç ão em geral, bem como das imens as poss ibilidades
abert as pela inf orm át ic a. [...]
Ass inalem os, por fim, que o prim eiro banc o int ernac ional de quest ões é
atualm ent e implem ent ado pela Ass oc iaç ão Int ernac ional para a Avaliaç ão do
Rendim ent o Esc olar (IEA). [...]
Os test es sob medida: rumo à individualiz aç ão dos test es
Esse novo pass o adiant e, de uma import ânc ia cons iderável, é tornado
poss ível graç as à exist ênc ia de banc os de quest ões e pelo acelerado
des envolvim ent o da inf orm át ic a.
O princ ípio geral é o seguint e: um indivíduo ent ra em int eraç ão com um
banc o de quest ões por meio de um term inal; seu nível aproxim at ivo de
apt idões e de conhec im ent os é avaliado por um test e de ent rada. [...]
Segundo Carroll, o test e sob medida não traz progresso significativ o
para a avaliaç ão das apt idões intelectuais. Com acert o, ele nota “que o
proc edim ent o é há tempos utiliz ado em test es individuais como a esc ala de
Binet”.132
Por out ro lado, fica cada vez mais evident e que essa técnic a pode ser de
muit o proveit o para a prát ic a educ ac ional, sobret udo para:
– a avaliaç ão form at iva (diagnóst ic a);
– a avaliaç ão som at iva;
– a const ruç ão prat ic am ent e inst ant ânea, pelos mest res, de test es
adapt ados às suas liç ões em um dado mom ent o e para determ inados
alunos;
– a aut oavaliaç ão. [...]
[Vim os que a avaliaç ão form at iva – da qual o aut or nos dá uma def iniç ão
rest rit a, def iniç ão que a denom inaç ão mesm a cont radiz – e a aut oavaliaç ão
const it uem poderos os meios de int erioriz aç ão de valores e atit udes.]
De 1966 a 1973, uma vist oria realiz ada em seis disc iplinas e atividades
(leit ura, inglês ou franc ês como segunda língua, ciênc ias, civ ism o, anális e de
text os) envolveu 22 país es e reuniu 150 milhões de inf orm aç ões. [...]
Além diss o, a experiênc ia operac ional adquirida em mat éria de vist orias
norm at ivas e a const it uiç ão, em divers os país es, de equipes espec ializ adas na
mat éria, abriram cam inho à “pilot agem” (monit oring) sist em át ic a dos
sist em as esc olares. Trat a-se de organiz ar vist orias perm anent es, ou
rec orrent es, perm it indo est abelec er em que medida os objet ivos coloc ados são
atingidos e, ass im, obt er uma avaliaç ão perm anent e, ou quas e perm anent e,
das nec ess idades.
Atualm ent e, a realiz aç ão mais complet a ness e âmbit o é a da Nat ional
Ass essm ent of Educ at ional Progress (NAEP), nos Est ados Unidos. A NAEP
empreendeu uma pesquis a nac ional cent rada nos conhec im ent os, nas
habilidades e nas atitudes dos jovens nort e-americ anos nos princ ipais
dom ínios da aprendiz agem esc olar. [...]
Conc ret am ent e falando, os objet ivos busc ados são: [...]
3. Realiz ar sondagens part ic ulares acerc a de cert os aspect os das
perf orm anc es esc olares. Por exemplo, no que conc erne à compreens ão da
leit ura ou às habilidades a serem adquiridas para faz er face às nec ess idades
vit ais ess enc iais, para est udar os hábit os de cons um o etc.
4. Reunir dados, analis á-los e redigir a seu propós it o relat órios
dest inados a vários públic os [...]
5. Enc orajar e prest ar ass ist ênc ia às pesquis as que se apoiam nos dados
reunidos pelo NAEP, esperando que as conc lusões dess es est udos venham a
ser úteis tant o àqueles que devem tom ar dec isões em mat éria de educ aç ão
como aos exec ut ores [...]
Atualm ent e, a avaliaç ão é feit a [pelo NAEP] para quat ro faixas etárias (9
anos, 13 anos, 17 anos e adultos entre 26 e 35 anos). Até o mom ent o, dez
disc iplinas e atividades foram objet o de avaliaç ão: as ciênc ias, a express ão
esc rit a, o civ ism o, a compreens ão da leit ura, a Lit erat ura, a Mús ic a, a
Hist ória, a Geograf ia, as mat em át ic as, a form aç ão prof iss ional e a educ aç ão
art íst ic a [...]
Na psic om et ria propriam ent e dita, os progress os são também
express ivos. [...] Mais conc ret am ent e, e em comparaç ão com as ant igas
técnic as de correç ão de respost as adivinhadas, o sist em a de aut oavaliaç ão dos
graus de cert ez a da respost a dada, levado ao est ado operac ional por Lec lercq,
fornec e não som ent e uma soluç ão sat isf at ória a um problem a há anos mal
res olvido, mas abre, ainda, perspect ivas educ at ivas cons ideráveis. (Unesc o)133
Os ext rat os prec edent es const am de uma public aç ão de 1982. De lá para cá, a
inf orm at iz aç ão do sist em a educ ac ional mundial foi planif ic ada. O Plano de ação adot ado
durant e a Conf erênc ia mundial sobre a educ aç ão para todos – ainda que evit ando
cuidados am ent e a palavra inf orm at iz aç ão – est ipula que:
Em todos os país es, os serviç os e proc edim ent os técnic os de colet a, de
proc ess am ent o e de anális e de dados sobre educ aç ão fundam ent al podem ser
melhorados a bem de sua utilidade. [...] Desde que se compreende a
import ânc ia dess as aquis iç ões [de dados], faz-se nec ess ário elaborar sist em as
que poss ibilit em a avaliaç ão da perf orm anc e de cada um dos estudantes e
dos mec anism os de form aç ão, ou aperf eiç oar, vis ando a esse fim, os
sist em as já exist ent es. Os dados provenient es da avaliaç ão dos proc ess os e
res ult ados deveriam const it uir a base de um sist em a integrado de
inf orm aç ão sobre a gest ão da educ aç ão fundam ent al. (Dec laraç ão mundial)134
Segundo o gloss ário fornec ido pelo Doc um ent o de ref erênc ia da Conf erênc ia
mundial sobre a educ aç ão para todos,135 “educação básica se ref ere à educ aç ão cujo
objet ivo é suprir as nec ess idades educ ac ionais bás ic as”. Por out ro lado, de acordo com o
mesm o gloss ário, “Necessidades educacionais básicas ref erem-se aos conhec im ent os,
compet ênc ias, atit udes e valores nec ess ários à sobrevivênc ia das pess oas, à melhoria de
sua qualidade de vida e à cont inuidade de seu aprendiz ado”.
O leit or haverá not ado que não se trat a de simples est at íst ic as – que, ref erindo-se
à psic ologia dos alunos, seriam já bast ant e inquiet ant es –, mas sim de dados individuais
relat ivos “a cada um dos est udant es”. Ess es dados devem ser reunidos em esc ala
int ernac ional:
São num eros as as atividades que os país es podem exerc er
conjunt am ent e, em apoio aos esf orç os que realiz am em âmbit o nac ional para
implem ent ar seus planos de ação em favor da educ aç ão bás ic a. [...] Essa
form a de colaboraç ão regional [quer diz er, cont inent al, segundo a term inologia
das inst it uiç ões int ernac ionais] parec e part ic ularm ent e apropriada aos seis
dom ínios [...] (II) o aperf eiç oam ent o da colet a e da anális e de inf orm aç ão.
(Dec laraç ão mundial)136
Para que ess es projet os não term inem como let ra mort a, o Plano de ação prevê
uma colaboraç ão int ernac ional dest inada a ajudar os país es mais pobres:
O apoio int ernac ional poderia prover a form aç ão e o des envolvim ent o
inst it uc ional nos dom ínios da colet a de dados, da anális e e da pesquis a; da
inovaç ão tecnológic a e dos mét odos pedagógic os. Tal apoio poderia ainda
fac ilit ar a implem ent aç ão de sist em as de gest ão inf orm at iz ados. (Dec laraç ão
mundial)137
As inst it uiç ões mult ilat erais e bilat erais deveriam se empenhar em
apoiar [financ eiram ent e], desde que inst adas pelos governos, as inic iat ivas de
carát er priorit ário empreendidas, princ ipalm ent e em nível nac ional [...], em
set ores como os seguint es:
a) Elaboraç ão de planos de ação mult iss et oriais, nac ionais e
inf ranac ionais, ou a atualiz aç ão dos planos já exist ent es [...] desde os iníc ios
dos anos novent a. Muit os país es em des envolvim ent o têm nec ess idade tant o
de ajuda financ eira quant o de auxílio técnic o, part ic ularm ent e para a colet a e a
anális e de dados e para a organiz aç ão de cons ult as int ernas. (Dec laraç ão
mundial)138
A colet a de dados tem, port ant o, a mais alta prioridade (a) em um plano de oito
itens (a-h).
A Europa
A Europa seguiu doc ilm ent e ess as rec om endaç ões, adot ando uma “Res oluç ão do
Cons elho e dos Minist ros de Educ aç ão reunidos no Cons elho [de] 25 de novembro de 1991,
a respeit o da pesquis a e das est at íst ic as em mat éria de educ aç ão na Com unidade
Europeia”:
O Cons elho das Com unidades Europeias e os minist ros de Educ aç ão,
reunidos no Cons elho:
const at am a nec ess idade de uma base sólida de inf orm aç ões, de
est at íst ic as adequadas e de pesquis as comparat ivas, com o fim de aprof undar
a cooperaç ão em mat éria de educ aç ão que foi por eles inst it uída mediant e a
Res oluç ão de 9 de fevereiro de 1976;
cons iderando que, para tal fim, seria indic ado:
[...]
- int ens if ic ar os esf orç os para est abelec er est at íst ic as adequadas e
comparáv eis sobre educ aç ão no âmbit o da Com unidade Europeia;
[...]
cons iderando a pesquis a em mat éria educ aç ão já realiz ada não som ent e
em nível nac ional, mas também as que foram empreendidas pelas
organiz aç ões int ernac ionais e europeias, tant o governam ent ais como não
governam ent ais:
est im ulam uma dif us ão mais vast a, na Europa, dos res ult ados dos
projet os de pesquis a no nível de Est ados-membros e no nível da Com unidade,
ass im como ent re as organiz aç ões int ernac ionais e as europeias, sobre tem as
de int eress e para a polít ic a de educ aç ão dos Est ados e dest ac ando os
dom ínios priorit ários para a cooperaç ão;
[...]
est im ulam a cont inuidade e o aperf eiç oam ent o da atuaç ão dos serviç os
da Com iss ão, espec ialm ent e da Eurost at, em est reit a colaboraç ão com os
serviç os dos Est ados-membros, da Organiz aç ão de Cooperaç ão e de
Des envolvim ent o Econôm ic os (OCDE) e da Organiz aç ão das Naç ões Unidas
para a Educ aç ão, a Ciênc ia e a Cult ura (Unesc o). Onde a exist ênc ia de
est at íst ic as perm it iss e, essa ação poderia ser cons agrada part ic ularm ent e ao
est udo dos indic adores e à colet a de est at íst ic as que dest aquem os dom ínios
priorit ários para a cooperaç ão em mat éria de educ aç ão. (Grif o noss o)
As pesquis as aludidas pela res oluç ão suprac it ada são dec ert o menos perigos as que
a poss e dos dados individuais. Não obst ant e, é prec is o cons iderar que elas const it uem um
prim eiro pass o rumo ao est abelec im ent o de arquivos individualiz ados e que, além diss o,
elas perm it em det erm inar a média dos perf is psic ológic os e dif erenc iar a pedagogia de
acordo com as regiões, os lic eus e mesm o as class es. A pedagogia cent rada no aluno não
é senão a últ im a etapa.
A rede europeia de banc os de dados sobre a educ aç ão é igualm ent e menc ionada:
A cooperaç ão europeia ent re operadores de banc os de dados sobre a
educ aç ão e a form aç ão foi cons olidada pela criaç ão, em 1988, da Ass oc iaç ão
Europeia para o Des envolvim ent o dos Banc os de Dados sobre a Form aç ão e a
Educ aç ão (EUDAT), relac ionando ent re si os operadores de banc os de dados
nac ionais. Em 1989, um sist em a experim ent al de acess o diret o a divers os
banc os nac ionais de dados cons agrados à form aç ão (curs os e qualif ic aç ão) foi
criado mediant e o aport e de um CD-ROM, int it ulado “ROMEO”. Ele foi objet o
de uma dem onst raç ão durant e a conf erênc ia sobre “A Europa e suas
compet ênc ias”. (Com iss ão das Com unidades Europeias)139
A Com iss ão das Com unidades Europeias “apoia o des envolvim ent o”140 dess e
sist em a.
A França
Isso tudo pode parec er meio irreal; a mesm a sit uaç ão, cont udo, está em vias de
se est abelec er na Franç a, com a int roduç ão, não de est at íst ic as, mas de dados individuais.
Vejam os, como exemplo, o que indic a uma public aç ão ofic ial do Minist ério da Educ aç ão
Nac ional, pref ac iado por Lionel Jospin, ao final do ano de 1991:
- avaliaç ões de inic iat iva loc al ou regional efet uadas sobret udo a part ir
de banc os de dados elaborados nos níveis acadêm ic o e depart am ent al, se
exist ent es, ou daqueles banc os que atingem progress ivam ent e o nível nac ional
mediant e grupos de trabalho que ass oc iam os respons áveis, os pesquis adores
e os exec ut ores.141
Ass im, desde o fim do ano esc olar de 1991-1992, os prof ess ores tiveram de
responder a 160 quest ões para cada aluno. Ent re ess as quest ões, a prim eiras diz iam
respeit o às atitudes da crianç a, ou seja, à sua psic ologia e à sua ins erç ão soc ial,
avaliadas de acordo com crit érios soc ialist as e globalist as. Not em os, além diss o, que o
acent o das novas diret ivas para o ens ino prim ário rec ai fort em ent e sobre a soc ializ aç ão
das crianç as. Eis algum as das inf orm aç ões que os prof ess ores devem atualm ent e fornec er
por cada aluno do terc eiro cic lo do prim ário. Const at ar-se-á a import ânc ia dada ao ens ino
não cognit ivo e mult idim ens ional e à soc ializ aç ão:
Compet ênc ias transvers ais [não cognit ivas e mult idim ens ionais]:
Aquis iç ão da aut onom ia; aprendiz ado da vida soc ial;
– conhec er e exerc er as respons abilidades pess oais;
– enunc iar regras;
– ident if ic ar alguns import ant es problem as mundiais; manif est ar
sens ibilidade em vist a de tais problem as;
– dem onst rar criat ividade, invent ividade, curios idade;
– afirm ar suas esc olhas e seus gost os est ét ic os: explic it á-los e
compart ilhá-los;
[...]
Compet ênc ias de ordem disc iplinar:
[...]
Educ aç ão Cívic a;
– conhec er os deveres e direit os das crianç as, do hom em e do cidadão;
– conhec er o func ionam ent o de uma ass oc iaç ão, de uma cooperat iva;
– conhec er as inst it uiç ões polít ic as da Franç a e uma inst it uiç ão
int ernac ional;
– conhec er um import ant e serviç o públic o;
[...]
Educ aç ão art íst ic a;
– educ aç ão mus ic al;
[...]
– analis ar e codif ic ar os elem ent os sonoros;
– realiz ar produç ões pess oais ou colet ivas;
[...]
Art es plást ic as
[...]
– enc ont rar regras de organiz aç ão
[...]
– conhec er aspect os do conjunt o de proc edim ent os do art ist a;
– expor seu próprio conjunt o de proc edim ent os;
Educ aç ão fís ic a e esport iva [...]
Ass um ir dif erent es papéis:
– de organiz ador;
– de jogador;
– de árbit ro;
Conhec er a aplic ar as regras:
– de prát ic a esport iva;
– de atividades de express ão.142
Lembrem os que tais ens inam ent os não-cognit ivos e soc iais se faz em em
det rim ent o da form aç ão int elect ual, com vint e por cent o das pess oas abaixo dos 25 anos
não alc anç ando o dom ínio da leit ura e da esc rit a. Ass im, as geraç ões fut uras são privadas
dos inst rum ent os int elect uais que lhes teriam perm it ido dom inar, sem dif ic uldades, e em
seu devido tempo, as quest ões abordadas no ens ino não cognit ivo. Além diss o, elas
poderiam tê-lo realiz ado com toda independênc ia de espírit o, livres para form ar elas
mesm as uma opinião sem sof rer uma dout rinaç ão prec oc e. Pois nem todos têm,
nec ess ariam ent e, a mesm a opinião que o governo sobre os “import ant es problem as do
mundo”, os “direit os da crianç a”, as “inst it uiç ões int ernac ionais” e o movim ent o
ass oc iat ivo, para não falar no dom ínio art íst ic o, onde a pass agem de Jack Lang está viva
na lembranç a de todos. Est am os, com isso, aut oriz ados a pens ar que, ult rapass ado cert o
lim it e, já não se trat a da soc ializ aç ão das crianç as, mas sim da colet iviz aç ão dos
espírit os?
Aplic ando a polít ic a prec oniz ada pela Dec laraç ão Mundial sobre a Educ aç ão para
Todos, o Minist ério da Educ aç ão Nac ional143 implem ent ou igualm ent e a avaliaç ão do
alunos no segundo ano do lic eu:
Um ano mais tarde, em març o de 1993,144 foram public ados dois text os relat ivos
à avaliaç ão em CE2145 e 6e146, bem como sobre a “ampliaç ão do banc o de inst rum ent os
de avaliaç ão para o prim ário e o cic lo de obs ervaç ão dos colégios”. Nota-se aí uma
evoluç ão signif ic at iva:
Como se havia previst o inic ialm ent e, dec idiu-se, em conc ordânc ia com a
direç ão das esc olas, est ender a elaboraç ão dess es inst rum ent os de avaliaç ão a
out ras disc iplinas (Hist ória, Geograf ia, educação cív ica, Biologia [à Bioét ic a,
enf im], ciênc ias fís ic as e Tecnologia. (Grif o noss o)
Enf im, uma vez que o êxit o da operaç ão depende de condiç ões técnic as –
princ ipalm ent e das dispos iç ões implem ent adas a fim de favorec er sua
utiliz aç ão pelos prof ess ores –, a fac ilit aç ão do cálc ulo cont inuará sendo
auxiliada mediant e a dispos iç ão do program a CASIMIR 2, aperf eiç oado em
alguns det alhes, de acordo com as obs ervaç ões e propost as realiz adas por vós
a esse respeit o. Isso deve perm it ir a colet a, o proc ess am ent o, a anális e e o
aproveit am ent o dos res ult ados em Língua Franc es a e Mat em át ic a, de modo
separado ou conjunt o, a fim de efet uar cruz am ent os ent re as duas disc iplinas.
(Ibid.)
Ess es res ult ados serão est abelec idos à base de amostragens
representativ as em nív el nacional das esc olas que poss uem alunos nos
níveis cons iderados. A realiz aç ão das amost ragens será realiz ada ao final de
set embro; será convenient e, port ant o, que o conjunt o dos est abelec im ent os
públic os e privados, ligados a voss a academ ia, sejam inf orm ados sobre a
nec ess idade de cons ervar os cadernos dos alunos após a rest it uiç ão dos
res ult ados às fam ílias; em tempo convenient e, serão dadas inst ruç ões às
inst it uiç ões de pesquis a para o envio dos cadernos ao DEP; tais cadernos
deverão ser rest it uídos aos est abelec im ent os após a colet a inf orm at iz ada de
dados. (Ibid. – grif o noss o)
Ass im, pôde-se not ar a int roduç ão, em um espaç o de um ano, da avaliaç ão em
Educ aç ão Cívic a e o “fornec im ent o sist em át ic o de inf orm aç ões” em nível nac ional.
Nat uralm ent e, as etapas ult eriores da generaliz aç ão do sist em a são a sua ext ens ão ao
ens ino não cognit ivo, já inic iada mediant e a avaliaç ão no dom ínio da educ aç ão cívic a, e a
const it uiç ão de uma rede inf orm at iz ada abrangendo todos os comput adores dos
est abelec im ent os esc olares. Além diss o, busc a-se des envolver a avaliaç ão, até torná-la
perm anent e. Ora, sabe-se que ela const it ui – sobret udo na form a da aut oavaliaç ão – uma
técnic a poderos a de int erioriz aç ão de valores e de atit udes.
Um out ro doc um ent o, public ado em 1992, traz ia o seguint e em seu pref ác io,
ass inado pelo diret or de Avaliaç ão e Prospect iva e pelo diret or das esc olas:
A disponibiliz aç ão, aos prof ess ores, dos inst rum ent os de avaliaç ão é uma
das missões conf iadas à Direç ão de Avaliaç ão e Prospect iva.
Ela tem por objet ivo o des envolvim ent o em noss o sist em a educ ac ional,
além das operaç ões pont uais sobre as aquis iç ões dos alunos, de uma
verdadeira cult ura de avaliaç ão.
A criaç ão de um banco de instrum entos de avaliaç ão, dest inado aos
prof iss ionais das esc olas maternais [!] e elem entares, insc reve-se ness a
polít ic a.
Lim it ada por enquanto em seu campo, vist o que tem vis ado som ent e à
Língua Franc es a e à Mat em át ic a, e porque não pret ende ser exaust iva em seu
modo de apres ent aç ão, uma vez que se acha impress o sobre o suport e
tradic ional do papel, esse banc o, não obst ant e, é vist o desde já como uma útil
ferram ent a, ainda que esteja, é claro, em aperfeiçoam ento.148
Em term os de psic ologia soc ial, tal modo de proc eder equivale a um “pé na port a”.
Por out ro lado, conc ebe-se sem dif ic uldade que a avaliaç ão do ens ino de nível mat ernal não
dirá respeit o aos ens inos acadêm ic os, mas princ ipalm ent e à Psic ologia, à afet ividade e à
ins erç ão soc ial das crianç as.
A int roduç ão de uma cult ura de avaliaç ão perm anent e – que perm it irá que se evit e
a repet iç ão de operaç ões pont uais –, de um modo de utiliz aç ão flexível e evolut ivo dos
inst rum ent os de avaliaç ão, não pode se dar sem que os est abelec im ent os tenham acess o
a “novas tecnologias”. Com essa est rut ura já inf orm at iz ada, obviam ent e se deverá dispor
as inf orm aç ões em redes a fim de perm it ir o seu acess o a part ir de um únic o banc o
inf orm at iz ado de inst rum ent os de avaliaç ão. Atualm ent e, a cada prof ess or é atribuído, pelo
Minist ério da Educ aç ão, um núm ero de ident if ic aç ão, sec ret o, que deve servir de chave
inf orm át ic a para o acess o a essa rede.149 Pode-se tem er, com raz ão, que os dados das
avaliaç ões, est endidos ao ens ino não cognit ivo, como a educ aç ão cívic a, sejam em breve
acess íveis mediant e essa rede inf orm át ic a únic a. Bast ará, ent ão, apenas est oc á-los em
um banc o de dados únic o, tal como já acont ec e nos Est ados Unidos. O abs urdo de rec olher
por duas vez es os dados, prim eiro em nível dos est abelec im ent os esc olares e, depois, em
nível nac ional, a part ir de amost ragens, não poderia subs ist ir por muit o tempo. Os
espec ialist as em Ciênc ias Hum anas e Soc iais terão em mãos um tem ível inst rum ent o para
o est udo e a modif ic aç ão dos comport am ent os. Um art igo public ado por Le Figaro (7 de
out ubro de 1992), int it ulado Os est udant es regist rados em fic has, só pode faz er cresc er
esse rec eio:
Fic har os est udant es do colégio e os do lic eu é uma das preoc upaç ões de
Jack Lang, que, para esse fim, lanç ou uma vast a operaç ão experim ent al em
divers os est abelec im ent os de ens ino. Mas o ext rem ado minist ro da Educ aç ão,
no calor da ação, parec e não haver respeit ado a legislaç ão em vigor. [...]
Ofic ialm ent e, o objet ivo alegado pelo minist ro, a fim de just if ic ar a
inst it uiç ão dess es arquivos inf orm at iz ados centralizados, seria a realiz aç ão
de est at íst ic as dem ográf ic as e sociais que poderiam, em seguida, por
exemplo, ser cruzados com os resultados escolares [part ic ularm ent e, não
cognit ivos]. [...]
O Minist ério da Educ aç ão Nac ional, ness e epis ódio, dá most ras de uma
curios a obst inaç ão: “O proc ess o ingress ou em sua últ im a etapa”, esc reveu um
reit or a seus diret ores e supervis ores. “Trat a-se de um ato ess enc ial, e se faz
nec ess ário que todos os est abelec im ent os produz am, em tempo útil, os dados
ref erent es à esc olaridade, de acordo com a form a requerida”. Out ro há que
chega ao pont o de ameaç ar seus subordinados: “Os senhores não proc ederam
ao trabalho de const ruç ão da base de dados dos alunos... Ass im, fic am
obrigados a produz i-la no praz o mais breve: o des at endim ent o dess a dem anda
caus ará um tal dano à academ ia int eira, que hei de me ver na obrigaç ão de
ent regar um relat ório a respeit o à adm inist raç ão cent ral, apes ar das
cons equênc ias que daí res ult arão para os senhores mesm os”. [...]
O fic ham ent o progride, as inf orm aç ões conf idenc iais circ ulam, enquant o
a CNIL (Comm iss ion inf orm at ique et libert és) ainda não rec ebeu o doss ier
complet o da dem anda de hom ologaç ão do Minist ério da Educ aç ão Nac ional. [...]
Em pouc as palavras, a experiênc ia atual não tem base legal algum a. [...] Quais
são as verdadeiras raz ões, imperios as e sec ret as, dess e fic ham ent o de
alunos? (Grif o noss o)
Como acredit ar, vendo o segredo que os envolve, que os test es prec edent es –
inc lus ive Educ aç ão Cívic a – não deverão aproxim ar-se dess as bas es de dados? Como
acredit ar que os test es psic ológic os, desde já dif undidos pelo Inst it ut o Nac ional da
Pesquis a Pedagógic a, não serão logo inf orm at iz ados e utiliz ados em grande esc ala? Um
dess es test es, public ado em uma obra dedic ada à avaliaç ão form at iva,150 é int erpret ado
segundo o diagram a de anális e apres ent ado mais adiant e.
Lembrem os que, se perm it em det erm inar o perf il psic ológic o do indivíduo, os
test es psic ológic os perm it em igualm ent e a sua modif ic aç ão e a int erioriz aç ão, pelo sujeit o
avaliado, dos valores des ejados:
Não é grat uit am ent e que muit os dirigent es gost am de evoc ar o carát er
“form ador” da avaliaç ão, e também não é sem mot ivo que o apelo aos
prof iss ionais da psic ologia pers onalist a (uso de test es...) tem sido
imperios o.151
A página 521 e seguint es da obra de Perett i, já cit ada, que se ref erem a out ro
test e psic ológic o, cont êm alguns parágraf os que convém cit ar:
O mét odo das conf iguraç ões é uma ext ens ão do mét odo Q. Do pont o de
vist a teóric o, como o mét odo Q. de Stephens on, ele cent ra-se na subjet ividade
do indivíduo. Ent ret ant o, ela se fundam ent a sobre uma ampliaç ão da noç ão de
eu (self), indo além da conc epç ão mais fenom ênic a (Stephens on-Rogers). O
mét odo das conf iguraç ões visa, por um lado, as part es consc ient es do eu, as
dif erent es imagens do eu, mas atent a igualm ent e às part es mais ou menos
inc onsc ient es que const it uem as tensões do eu, suas ans iedades e os
mec anism os de def es a em face delas. [...]
O mét odo das conf iguraç ões tem por objet ivo, ness e caso, desvendar
tant o o eu do indivíduo como o seu eu grupal. Isso fornec e a poss ibilidade de
apreender, com um mesm o inst rum ent o, num eros as variáveis ligadas ao eu de
um indivíduo bem como a ent idade grupal manif est ada pelas forç as dinâm ic as
do grupo. [...]
O inst rum ent o M.I.P.G. pode ser utiliz ado:
1) para avaliar a mudanç a produz ida por uma int ervenç ão em um grupo.
[...]
O mét odo das conf iguraç ões é aqui aplic ado à pesquis a do eu dos
prof ess ores. Tem por objet ivo evidenc iar e compreender o eu prof iss ional dos
prof ess ores enquant o ent idade mult idim ens ional, inc luídas aí as relaç ões
consc ient es e as inc onsc ient es do indivíduo, cons igo mesm o, e aquelas com
out ras pess oas que int ervêm em seu ambient e prof iss ional. [...]
O inst rum ent o M.I.S.P.E. pode ser utiliz ado:
[...]
4) Para avaliar as mudanç as ocorridas ao longo de um período de
form aç ão dos prof ess ores. Os test es são realiz ados no iníc io e no final da
form aç ão.
5) Para avaliar, em Psic opat ologia, os efeit os de uma terapia a que
est eja subm et ido o prof ess or.
127 Minist ério da Educ aç ão Nac ional, Direç ão das esc olas, livret o esc olar individual
conc ernent e ao Cyc le des apprent iss ages fondam ent aux, cyc le 2, 1992.
128 Minist ério da Educ aç ão Nac ional, Direç ão das esc olas, livret o esc olar individual
conc ernent e ao Cyc le des apprent iss ages fondam ent aux, cyc le 3, 1992.
129 OCDE/CERI, La réf orm e des programm es, Op. cit., p. 55.
130 Beverly K. Eakm an, Educ at ing for the New World Order, Port land, Oregon, USA,
Halcyon Hous e, 1991, p. 31.
131 Ibid., p. 224.
132 J.C. Carroll, Meas urem ent of int ellect ual abilit ies, In P. Suppes ed., Impact of
res earc h in educ at ion, Washingt on D.C., Nat ional Academy of Educ at ion, 1978, p. 47.
133 De Landsheere, La rec herc hé expérim ent ale en éduc at ion, Paris, Unesc o,
Delac haux & Niest lé, 1982, p. 53-73; dest ac am os. A Unesc o renova no pref ác io “seus
vívidos agradec im ent os à Gilbert De Landsheere pela cort es ia com a qual ele respondeu à
(seu) pedido, ass egurando, de qualquer maneira, o lanç am ent o dest a nova coleç ão” e
ass inala, como de hábit o, que “as ideias e as opiniões express as nest a obra são as do
aut or e não ref let em nec ess ariam ent e os pont os de vist a da Unesc o” (p. 4) que financ ia,
no ent ant o, a dif us ão daquelas.
134 WCEFA, Déc larat ion mondiale sur l’éduc at ion pour tous, Op. cit., Cadre
d’act ion, p. 11; dest ac am os.
135 Op. cit.
136 Ibid., p. 17.
137 Ibid., p. 19.
138 Ibid., p. 20.
139Act ivit és de la Comm iss ion des comm unaut és européennes dans les dom ains
de l’éduc at ion, de la form at ion et de la polit ique de la jeuness e em 1989, rapport ées pour
la Comm iss ion des comm unaut és européennes, Task Forc e ress ourc es hum aines,
éduc at ion, form at ion et jeneuss e par l’Unit é européenne d’EURYDICE, Bruxelles,
Comm iss ion des comm unaut és européennes, Task Forc e ress ourc es hum aines, éduc at ion,
form at ion et jeneuss e, juin 1990. (TFRH/134/91-FR). p. 65.
140 Comm iss ion of the European comm unit ies, Report on the act ivit ies of the
Comm iss ion of the European comm unit ies in the field of educ at ion, training and yout h
during 1990 (pres ent ed by the Comm iss ion), Bruxelles, Comm iss ion des comm unaut és
européennes, 24 janvier 1992 [SEC(91) 2409 final], p. 88.
141 Ministère de l’Educ at ion nat ionale, de la jeuness e et des sports, Direct ion des
écoles, Les cyc les à l’école prim aire, Paris, Hac hett e, CNDP, 1991, p. 20.
142 Ministère de l’Educ at ion nat ionale, Direct ion des écoles, [livret scolaire
individual conc ernant le] Cyc le des approf ondiss em ents, cyc le 3, 1992.
143 Bullet in off ic ial du ministère de l’Educ at ion nat ionale (BO) du 23 janvier 1992,
p. 10 e 11.
144 BO du 11 mars 1993, p. 876 sq.
145 Corresponde à 3ª série do Ens ino Fundam ent al.
146 6ª série do Ens ino Fundam ent al.
147 1º ano do Ens ino Médio (ant igo sec undário).
148 Ministère de l’ Educ at ion nat ionale, Direct ion de l’évaluat ion et de la
prospect ive, Direct ion des écoles, Aide à l’évaluat ion des élèves, Cyc le des apprent iss ages
prem iers, 1992. Dest ac am os. Ver, igualm ent e, o BO de 16 jun. 1994 que relat ou a avaliaç ão
no prim ário em mat éria de “educ aç ão da pess oa e do cidadão”.
149 BO du 10 sept embre 1992; BO du 13 mai 1993, p. 1.609.
150 Sob direç ão de André de Perett i, Rec uil d’ inst rum ents et de proc ess us
d’évaluat ion form at ive, Paris, INPR, 1980, Tomo I, p. 194. Onde se enc ont rará muit os
out ros test es psic ológic os.
151 Beauvois et Joule, Soum iss ion et ideologies, Op. cit., p. 176.
CAPÍT ULO XI
A EUROPA
A OCDE, o Cons elho da Europa e a Unesc o não dispõem, no mom ent o, de nenhum
poder exec ut ivo. Verem os que, não obst ant e, sua inf luênc ia é real e que ela se exerc e
sobre as inst ânc ias governam ent ais de noss o país. A Europa sof re também essa
inf luênc ia:
Res oluç ão do Cons elho e dos Minist ros da Educ aç ão reunidos no seio do
Cons elho de 14 de Dez embro de 1989
Relat iva à luta cont ra o ins uc ess o esc olar
O Cons elho e os Minist ros da Educ aç ão aqui reunidos,
[...]
consc ient es de que o des envolvim ent o da dim ens ão mult ic ult ural nos
sist em as educ ac ionais perm it iria lut ar mais efic azm ent e cont ra o ins uc ess o
esc olar;
[...]
Adot am a seguint e res oluç ão:
1. Os Est ados-membros, no âmbit o das respect ivas polít ic as
educ ac ionais e das suas est rut uras inst it uc ionais, esf orç ar-se-ão por combat er
o ins uc ess o esc olar de form a int ens iva e por orient ar as suas ações numa das
direç ões a seguir espec if ic adas:
[...]
1.3. Ref orç ar a esc olaridade pré-prim ária, que cont ribui, espec ialm ent e
ent re as crianç as dos meios desf avorec idos, para uma melhor esc olaridade
post erior [soc ializ aç ão prec oc e];
1.4. Adapt ar o func ionam ent o do sist em a esc olar, nom eadam ent e
através:
– da renovaç ão dos cont eúdos, mat eriais de apoio e mét odos de ens ino e
de avaliaç ão,
– da aplic aç ão de pedagogias dif erenc iadas,
[...]
– da reduç ão das rupt uras est rut urais ou func ionais, mediant e:
• a desc ompart im ent aç ão e a int erdisc iplinaridade [ens ino
não-cognit ivo];
• a cont inuidade educ at iva de um ano para o out ro, de um
cic lo para o seguint e [pedagogia cent rada no aluno];
As cit aç ões que se seguirão provêm de um text o153 originado da própria Com iss ão
das Com unidades Europeias. Ele é dest inado “ao Cons elho e [aos] minist ros de Educ aç ão
[que] solic it aram à Com iss ão, o quant o ant es poss ível, a apres ent aç ão de propos iç ões para
uma nova etapa de cooperaç ão conc ret a em nível com unit ário” (p. 1). Esse text o, port ant o,
ref let e com fidelidade o parec er da Com iss ão e nos esc larec e acerc a de sua polít ic a
educ ac ional.
A Com iss ão se pos ic iona desde a perspect iva de uma int egraç ão europeia dos
sist em as educ at ivos, prelúdio de uma int egraç ão mundial:
Em cert o núm ero de Est ados-membros, novas orient aç ões ou ref orm as
do ens ino sec undário, algum as em grande esc ala, est ão em preparaç ão ou já
em vigor para faz er face aos des af ios dos anos novent a. Dent ro de uma
perspect iva de const ruç ão da Europa, é cruc ial que ess as ref orm as ocorram
mediant e uma art ic ulaç ão com a evoluç ão de out ras part es da Com unidade.
Uma int ens if ic aç ão da troc a de experiênc ias e da int eraç ão ent re os Est ados-
membros faz-se indispens ável para uma mút ua tom ada de consc iênc ia acerc a
dos impact os que suas novas polít ic as podem ter sobre a Com unidade e sobre
o fut uro dos jovens e para cont ribuir na elaboraç ão de um quadro com um
europeu, no qual devem evoluir as polít ic as nac ionais. (p.3)
O objet ivo pers eguido é, nat uralm ent e, a “mudanç a”:
A adapt aç ão da educ aç ão à evoluç ão do cont ext o econôm ic o e soc ial e
das nec ess idades individuais vê-se travada pela falt a de capac idade dos
sist em as para gerar e est im ular a inovaç ão e a mudanç a. A gest ão, o
financ iam ent o e o est ím ulo à inovaç ão no sist em a esc olar devem tornar-se
prioridade polít ic a de prim eira ordem. As condiç ões para a mudanç a devem ser
criadas, e mesm o acompanhadas de um rec onhec im ent o conc ret o, para
enc orajar – no terreno dos est abelec im ent os esc olares e ent re os prof ess ores
– o comprom et im ent o com a inovaç ão e o aprendiz ado de como geri-la. Um
modo import ant e de alc anç ar tal objet ivo cons ist e em garant ir maior
aut onom ia [desc ent raliz aç ão] e flexibilidade, a fim de se capac it ar os
est abelec im ent os a responder à evoluç ão das nec ess idades. É indispens ável
sens ibiliz ar e form ar os diret ores e prof ess ores a fim de os mot ivar e
preparar para a tom ada de tal inic iat iva e para a respons abilidade por um
trabalho ass im inovador. Import a ainda ref orç ar o papel que os inspet ores,
cons elheiros pedagógic os e out ros serviç os podem des empenhar para o
est ím ulo e apoio dess e proc ess o nas esc olas. As ações de tipo plano-pilot o ou
zona de inovaç ão educ ac ional deveriam ser utiliz adas de modo mais
sist em át ic o, como inst rum ent os de des envolvim ent o e de aplic aç ão da
inovaç ão. (p. 3 sq.)
A form aç ão cont inuada dos prof ess ores tem um lugar import ant e ness e projet o:
A mudanç a nos est abelec im ent os esc olares pass a pelos prof ess ores, e a
form aç ão cont inuada tem um papel-chave na preparaç ão deles. Em geral, a
form aç ão cont inuada propõe aos prof ess ores que aprof undem a sua disc iplina
ou a sua didát ic a, mas raram ent e lhes oferec e a poss ibilidade de des envolver,
sobre o plano individual ou no nível do seu est abelec im ent o, as capac idades
nec ess árias para gerir a inovaç ão e cons olidar novas respons abilidades. Na
maior part e dos sist em as educ ac ionais, a part ic ipaç ão em atividades de
form aç ão cont inuada é fac ult at iva [!] para os prof ess ores e oferec ida por
organism os ext ernos ao est abelec im ent o esc olar. A ação com unit ária ness e
dom ínio deveria, por cons eguint e, est im ular e ref orç ar medidas que
perm it iss em:
– part ir das nec ess idades e dos objet ivos de des envolvim ent o do
est abelec im ent o esc olar para a ação de form aç ão, apoiando-se sobre o próprio
est abelec im ent o e envolvendo, quant o poss ível, o conjunt o dos prof iss ionais de
ens ino;
– inc ent ivar os est abelec im ent os esc olares a uma aut oanális e, vis ando
ao conhec im ent o de suas nec ess idades de form aç ão, e atribuir-lhes a
respons abilidade de implem ent ar os seus próprios program as de form aç ão,
valoriz ando, ness e âmbit o, o papel da ação inovadora como experiênc ia
form adora [dinâm ic a de grupo em esc ala inst it uc ional]; […]
– invoc ar sist em at ic am ent e o pot enc ial de form aç ão oferec ido pela
cooperaç ão ent re os est abelec im ent os esc olares e o seu ambient e
soc ioec onôm ic o, por exemplo, no âmbit o de est ágios, de vis it as ou de
dest ac am ent os junt o a empres as [engajam ent o da colet ividade e ens inos não
cognit ivos];
– est im ular novas form as de conc ert aç ão ent re os prof ess ores de um
mesm o est abelec im ent o para int roduz ir uma maior flexibilidade na aplic aç ão
dos program as e para explorar todo o pot enc ial de ação inovadora (p. 6 sq.).
Aqui, a “inovaç ão” pedagógic a visa ainda a aum ent ar o campo dos
ens inos não cognit ivos:
A fut ura ação com unit ária nest e dom ínio deveria, port ant o, inc ent ivar um
rec urs o maior e mais divers if ic ado a novas ações, do tipo da experim ent ada
no Program a Trans iç ão, para perm it ir uma melhor respost a, no ens ino
sec undário, às nec ess idades dos jovens em sit uaç ão de frac ass o esc olar ou
com dif ic uldades. Nest a perspect iva, conviria:
– reexam inar as dispos iç ões que orient am os program as esc olares e os
mét odos pedagógic os, e adapt á-las de maneira dif erenc iada, de acordo com o
nível dos alunos;
– utiliz ar mais sist em at ic am ent e as sit uaç ões pedagógic as
ext raesc olares para ref orç ar a mot ivaç ão e des envolver as capac idades
pess oais dos jovens;
– aperf eiç oar os mét odos de avaliaç ão e de cert if ic aç ão a fim de validar
um leque mais divers if ic ado de aquis iç ões, de experiênc ias e de capac idades
independent em ent e do nível dos alunos (p. 9).
Nest a perspect iva, a Com iss ão propõe que o Program a a est abelec er,
com base no suc ess o do segundo Program a Trans iç ão, const it ua também um
plano [...] de apoio às int ervenç ões dest inadas a des envolver a cooperaç ão
int erc ult ural nas zonas de populaç ão pluriétnic as (p. 1 sq.).
Por últ im o, querem os menc ionar est as palavras que tom am todo o seu sent ido na
perspect iva dest es ens inos mult idim ens ionais, um verdadeiro cont role psic ológic o dos
indivíduos:
Obs erva-se igualm ent e uma expect at iva cresc ent e perant e as esc olas,
no sent ido de que pres ervem o cont at o com os alunos e ass egurem uma
cont inuidade aos que abandonam a esc ola ao final da esc olaridade obrigat ória e
arrisc am não avanç ar em sua form aç ão.
A ação com unit ária deveria, por cons eguint e, ajudar os Est ados-membros
a apoiar os est abelec im ent os esc olares a fim de lhes perm it ir […]
implem ent ar um dispos it ivo de acompanham ent o dos jovens que arrisc am não
pross eguir sua form aç ão para além da esc olaridade obrigat ória (p. 10).
O Parlam ent o Europeu não tem nenhum poder legislat ivo real. Os doc um ent os que
public a, porém, são reveladores da inf luênc ia das conc epç ões psic opedagógic as sobre as
inst it uiç ões europeias. A res oluç ão154 que vam os agora cit ar – de 15 de maio de 1992 –
tem sido adot ada rec ent em ent e:
A expos iç ão dos mot ivos155 dest a res oluç ão é igualm ent e reveladora da inf luênc ia
exerc ida pelas conc epç ões psic opedagógic as sobre o Parlam ent o europeu:
152 Cons eil des Comm unaut és européennes, Sec rét ariat general, Text es relat ifs à
la polit ique européenne de l’éduc at ion, Supplém ent à la trois ièm e édit ion (déc embre 1989),
Luxembourg, 1990, p. 117 sq. (JO C 27 – 6.1.1990).
153 Comm iss ion des Comm unaut ées européennes, Programm e de travail de la
Comm iss ion vis ant à prom ouvoir l’innovat ion dans l’ens eignem ent sec ondaire dans la
Comm unaut é européenne, (Comm unic at ion de la Comm iss ion), Bruxelles, 14 oct obre 1988
[COM(88) 545 final].
154 Journal off ic ial des Comm unaut és européennes du 15.6.92, n. C 150/366, 13,
Rés olut ion A-3-0139/92.
155 Parlem ent européen, Doc um ent de séanc e, Rapport de la comm iss ion de la
cult ure, de la jeuness e, de l’éduc at ion et des médias sur La polit ique de l’éduc at ion et de la
form at ion dans la perspect ive de 1993 de Mme Anna M.A. Herm ans, Strasbourg, Parlem ent
européen, 27 mars 1993, p. 13 sq. (A3-0139/92).
CAPÍT ULO XII
A REVOLUÇÃO PEDAGÓGICA NA FRANÇA
Dest ac a-se com toda a clarez a, a part ir dos relat órios dess es país es
[realiz ados em respost a a um quest ionário da OCDE/CERI], que no ens ino
prim ário, tant o ou mais que no ens ino sec undário, ass ist e-se a uma
reavaliaç ão e a uma reest rut uraç ão prof unda dos program as. Uma revoluç ão
silenc ios a. Est aria em vias de ocorrer uma revoluç ão silenc ios a e disc ret a no
ens ino prim ário? A uma quest ão como essa, deve-se responder de modo
prudent e. A maior part e das inf orm aç ões e das disc ussões acerc a dos
cont eúdos dos est udos que se enc ont ram nos relat órios nac ionais –
compreendendo-se aí o debat e geral a respeit o do tronc o com um das mat érias
fundam ent ais – se ref ere implic it am ent e ao est udo sec undário. Ent ret ant o,
tudo parec e indic ar – sobret udo na Franç a, onde o Minist ério da Educ aç ão
preparou um plano prospect ivo, e na Itália, onde essa taref a foi conf iada a
uma equipe de espec ialist as – que espírit os invent ivos ocupam-se ativam ent e
do program a da esc ola prim ária. (OCDE, 1990)156
E cert am ent e o senhor Lang é um espírit o invent ivo. Mas o amor da just iç a obriga
a diz er que o terreno havia sido preparado desde longa data. Most ram os já a inf luênc ia
exerc ida pelas organiz aç ões int ernac ionais sobre a conc epç ão franc es a acerc a da form aç ão
de mest res (IUFM), da desc ent raliz aç ão, da avaliaç ão etc. Part ic ularm ent e na Franç a, há
quem trabalhe com prof undidade ness e sent ido, como Louis Legrand, o qual, lembrem o-
nos, teve enorm e inf luênc ia sobre o sist em a educ ac ional franc ês. A aceit aç ão das prát ic as
psic opedagógic as em noss o país deve-lhe muit o:
As ref orm as propost as pelo senhor Legrand est ão muit o próxim as daquelas
def endidas em public aç ões int ernac ionais:
É aqui que reenc ont ram os a convergênc ia ent re os mét odos ativos e os
objet ivos que acim a desc revi. Nunc a a “nova educ aç ão” foi apenas um conjunt o
de técnic as. Fora, ant es, uma filos of ia. A filos of ia que hoje proponho à esc ola
dem oc rát ic a é de inspiraç ão idênt ic a, talvez de idênt ic o cont eúdo.
Em prim eiro lugar, seu objet ivo é a soc ializ aç ão pos it iva dos educ andos.
Ness e sent ido, a educ aç ão deve cons ist ir prim ordialm ent e em ação, e som ent e
de modo sec undário deve ser conhec im ent o.160
Convém habit uar [o aluno] a viver em com unidade, numa sit uaç ão de
respeit o rec íproc o e de cooperaç ão. Convém habit uá-lo a respeit ar o ambient e
que condic iona noss a sobrevivênc ia.
Ass im, o mest re de amanhã deverá ele mesm o est ar convenc ido dess es
valores fundam ent ais. A form aç ão int elect ual que ele rec eba será ent ão
tom ada em perspect iva étic a, em conf orm idade com ess es valores. O que
signif ic a que o ess enc ial da sua form aç ão será a criaç ão de novas atit udes
mediant e a ação, e não som ent e pela rec epç ão de novos disc urs os.161
É dent ro dess e quadro ment al que se deve sit uar a int roduç ão da renovaç ão
pedagógic a nos lic eus e nos cic los de educ aç ão prim ária.
A renovaç ão pedagógic a dos lic eus, empreendida a part ir de 1992,162 art ic ula-se
princ ipalm ent e em torno aos tem as seguint es:
- ens ino não cognit ivo e mult idim ens ional;163
- dif erent es conc epç ões do saber;164
- soc ializ aç ão dos alunos;165
- avaliaç ão form at iva;166
- aut oavaliaç ão;167
- pedagogia cent rada no educ ando;168
- pedagogia por objet ivos169 [behaviorism o e engajam ent o];
- pedagogia ativa;170
- form aç ão cont ínua de prof ess ores.171
Os módulos, capit al inovaç ão pedagógic a da ref orm a, const it uem um quadro
ext rem am ent e flexível, perf eit am ent e adapt ado à pedagogia cent rada no aluno, à sua
soc ializ aç ão e ao ens ino não cognit ivo em geral:
É fác il rec onhec er ness as últ im as linhas a utiliz aç ão das técnic as de engajam ent o
e de dinâm ic a de grupo, com o objet ivo de venc er as “res ist ênc ias à mudanç a” por part e
dos prof ess ores, conf orm e trat am os já em det alhes no capít ulo sobre a desc ent raliz aç ão.
De acordo com o Le Figaro,175 “Desde já [...] a ref orm a vem gerando um rec uo
dram át ic o no ens ino da cult ura geral no prim eiro ano do ens ino médio”. Vis ando a
int roduz ir o ens ino não cognit ivo e os mét odos pedagógic os ativos nas salas de aula, ela
lim it a muit o severam ent e as opç ões e o tempo dedic ado à cult ura cláss ic a. Enf im,
menc ionem os que os univers it ários, ainda que, por ora, em menor medida, são do mesm o
modo atingidos pela revoluç ão pedagógic a.
A int roduç ão dos cic los nas esc olas prim árias visa aos mesm os objet ivos. De fato,
os cic los perm it em ao prof ess or acompanhar seus alunos durant e muit os anos; favorec em
a cont inuidade exigida pela pedagogia cent rada no educ ando. Adem ais, não sendo separadas
as class es ao fim de cada ano esc olar, fica ref orç ada a soc ializ aç ão dos alunos. O
opúsc ulo int it ulado Les cyc les à l’école prim aire,176 public ado em 1991 pela Direç ão das
esc olas do Minist ério da Educ aç ão Nac ional, e edit ado pelo CNDP, é prec edido por um
pref ác io de Lionel Jospin, ent ão minist ro da Educ aç ão. Part ic ularm ent e, ele afirm a que:
“Coloc ar a crianç a no cent ro do sist em a educ ac ional é sobret udo tomá-la tal como ela é,
com suas capac idades e def ic iênc ias”.177
É também, e princ ipalm ent e, prat ic ar a pedagogia cent rada no aluno. A cit ada obra
des envolve o pens am ent o do minist ro:
Para atingir esse objet ivo [80% de suc ess o no bac178], a nova polít ic a
se propõe, conf orm e est ipula a Lei de orient aç ão em seu art igo prim eiro, a
“organiz ar o serviç o públic o de educ aç ão (...) em funç ão dos alunos” e a
prom over, conf orm e dispõe o art igo 4º, um “ens ino adapt ado a sua
divers idade, mediant e uma cont inuidade no proc ess o educ at ivo no dec urs o de
cada cic lo e ao longo de toda a form aç ão esc olar”. Trat a-se de coloc ar, de
modo mais res olut o, a crianç a no coraç ão do sist em a educ ac ional e de
perm it ir uma adapt aç ão mais fina de acordo com cada caso. Ass im, a
cons ideraç ão da het erogeneidade dos alunos redef ine a ação do prof ess or,
tant o em relaç ão àquele que aprende quant o ao que ele deve aprender.
Essa anális e conduz nat uralm ent e aos princ ípios que fundam ent am a
nova polít ic a para a esc ola:
- int roduz ir uma maior flexibilidade no exerc íc io de aprendiz agem dos
alunos e na organiz aç ão do trabalho dos prof ess ores, a fim de garant ir uma
melhor cont inuidade dess a aprendiz agem; [...]
Enf im, essa anális e evidenc ia a nec ess idade de mobiliz ar e de
respons abiliz ar os atores loc ais, os únic os capaz es de prom over essa nova
polít ic a e de fazê-la conc ret iz ar-se no quadro do projet o da esc ola.
Garant ir a cont inuidade da aprendiz agem
A cont inuidade da const ruç ão e da aquis iç ão de saberes pela crianç a é
uma das garant ias do êxit o esc olar. A organiz aç ão em cic los plurianuais,
def inida pela Lei de orient aç ão em seu art igo 4º e pelo dec ret o relat ivo à
organiz aç ão e ao func ionam ent o das esc olas mat ernais e elem ent ares,
sobret udo em seu art igo 3º, deve perm it ir a garant ia dess a cont inuidade.179
Conf orm e o leit or deve ter adivinhado, o ens ino não cognit ivo não está à margem
dess as diret riz es: “Nest e text o, três tipos de compet ênc ias foram dist inguidas: –
compet ênc ias transvers ais, relat ivas às atit udes da crianç a [...]”:180
Muit os pais queixam-se da cresc ent e inf luênc ia que os grupos de pares exerc em
sobre seus filhos. Esse fenôm eno não é espont âneo. É o res ult ado de uma polít ic a de
soc ializ aç ão deliberada, que visa a faz er do grupo de pares o grupo de ref erênc ia. Não é de
espant ar que, cada vez mais, torna-se dif íc il transm it ir valores às crianç as, bem como
uma cult ura e uma educ aç ão que se dif erenc ie daquela medíoc re veic ulada pelo grupo. O
cont role soc ial efet ua-se ent ão pelo grupo de pares, mais rec ept ivo às inf luênc ias
dom inant es do que o seria um indivíduo isolado.182
Franç ois Bayrou, minist ro da Educ aç ão Nac ional, expôs suas conc epç ões sobre
educ aç ão em uma obra int it ulada La déc ennie des mal-appris,184 public ada em 1990. Ant es
de apres ent ar suas tes es, convém sit uar rapidam ent e o seu aut or, a fim de busc ar evit ar
equívoc os e ideias prec onc ebidas. O Franç ois Bayrou é, ant es de tudo, um crist ão, e não
hes it a em faz er a prof iss ão do seu credo (p. 19). Não caus ará espant o saber que sua
carreira polít ic a se tenha des enrolado no âmbit o do CDS,185 part ido do qual não se poderia
suspeit ar de cript oc om unism o ou de ult ra-liberalism o. Além diss o, o aut or é prof ess or de
let ras e, como tal, def ens or da “cult ura de ref erênc ias” (p. 92 sq.). Apes ar diss o, porém,
Bayrou ret om a tes es próxim as o bast ant e daquelas das inst it uiç ões int ernac ionais para
que poss am os nos conf orm ar a elas. Para que não nos compreendam mal: não o
suspeit am os de cript oc om unism o ou de qualquer out ra tendênc ia inc onf ess ável. Não
suspeit am os que trabalhe em segredo para a dest ruiç ão ou para a subvers ão da fé,
objet ivo maior do globalism o. Ent ret ant o, nos é forç os o rec onhec er que a inf luênc ia
ideológic a das inst it uiç ões int ernac ionais e das tes es revoluc ionárias est endem-se para
além de suas front eiras nat urais. Não obst ant e, se nos faz nec ess ário prec is ar – e o leit or
talvez tenha tom ado consc iênc ia diss o a part ir das cit aç ões – que as tes es pedagógic as
revoluc ionárias raram ent e se most ram à luz do dia. Apres ent em-se como “melhoram ent o
do ens ino”, “progress o pedagógic o”, “aut onom ia dos prof ess ores” e out ras fórm ulas
sedut oras. Não irem os atribuir a Franç ois Bayrou int enç ões tenebros as. O pior de que se
pode acus á-lo é de deixar-se inf luenc iar, em cert a medida, por tes es oriundas de
organiz aç ões como a Unesc o, que ele cita explic it am ent e (p. 29), cujas opiniões
revoluc ionárias têm carát er públic o.
Franç ois Bayrou res um e sua vis ão acerc a da ref orm a do sist em a educ ac ional na
seguint e fras e:
Tal é, a meus olhos, o triângulo de ouro dess a revoluç ão magist ral que
se cham a respons abilidade, e, part ic ularm ent e, respons abilidade pedagógic a:
em cada uma das pont as do triângulo est ão: a inovaç ão [pedagógic a] des ejada
e não apenas tolerada, a avaliaç ão sist em át ic a e anual de cada uma das
class es de cada prof ess or, e uma form aç ão cont ínua que se sust ent a sobre os
suc ess os const at ados.186
Pode-se rec onhec er aí três dos princ ipais tem as da revoluç ão pedagógic a conduz ida
pelas inst it uiç ões int ernac ionais bem como o engajam ent o dos prof iss ionais, aqui cham ado
respons abiliz aç ão. A ref orm a propost a por Bayrou deixa ent rever igualm ent e uma
realidade, que diz respeit o ao engajam ent o dos prof iss ionais e que não aparec e na cit aç ão
acim a: a desc ent raliz aç ão. Apres ent arem os pass o a pass o suas tes es acerc a dess es
quat ro pont os.
A avaliação
Franç ois Bayrou é um part idário convict o da avaliaç ão e “fic ou muit o cont ent e com
a inic iat iva de avaliaç ão au cours élém ent aire et en class e de sixièm e” (p. 171).187
Segundo ele, a avaliaç ão deve poss ibilit ar que cada prof ess or cons iga avaliar melhor seus
res ult ados pedagógic os e, ass im, aperf eiç oar o seu trabalho (p. 170 sq.). Ele não pret ende
com isso exerc er qualquer press ão sobre os prof ess ores, mas des eja apenas torná-los
respons áveis e neles faz er nasc er “um est ím ulo pess oal, int erior” (p. 176). O aut or
preoc upa-se ainda com os aspect os afet ivo, psic ológic o, relac ional, cívic o e moral do
ens ino e da educ aç ão (p. 173), não hes it ando em empregar o term o “espirit ual”.
Evident em ent e, ess es aspect os não poderiam ser quant if ic ados. Mas a relaç ão espirit ual
ent re mest re e aluno est ará “desde logo mens urada”, uma vez que “não pode haver relaç ão
espirit ual de qualidade sem que a qualidade do trabalho esc olar na sala de aula test em unhe
essa relaç ão” (p. 175). Enf im, Bayrou menc iona o IEA e o NAEP, de que já trat am os no
capít ulo ant erior, bem como as campanhas int ernac ionais de avaliaç ão, e parec e favorável
a uma part ic ipaç ão da Franç a em tais campanhas.
Lembrem os que o NAEP avalia, além das mat em át ic as, tão caras a Bayrou,
também o civism o e as atit udes dos nort e-americ anos, e que o IEA criou a prim eira banc a
int ernac ional de quest ões. Des ejam os que Franç ois Bayrou compreenda o quant o suas
pos iç ões – muit o respeit áveis em si mesm as – podem ser det urpadas de modo a int egrar
um projet o mundial revoluc ionário. É pouc o provável, por exemplo, que a avaliaç ão poss a
furt ar-se por muit o tempo ao ens ino não cognit ivo e que ela não sirva para avaliar os
prof ess ores. Ass im, est es não terão out ra alt ernat iva senão inc ulc ar em seus alunos os
valores des ejados.
A formação continuada
Franç ois Bayrou faz-se também def ens or da form aç ão cont inuada, que ele insc reve
no círc ulo da qualidade – comparaç ão inf eliz, já que o círc ulo da qualidade cons ist e numa
técnic a manipulat ória fundada na dinâm ic a de grupo e no envolvim ent o dos prof iss ionais.
Bayrou pret ende ainda dispens ar o prof ess or de suas atribuiç ões durant e duas horas por
sem ana, a fim de cons agrá-las à form aç ão cont inuada e à avaliaç ão anual.
Nat uralm ent e, uma ref orm a dess e tipo faria todo sent ido se as inst it uiç ões
respons áveis pela form aç ão dos prof ess ores não foss em o que de fato são. Mas Bayrou
est aria dispost o a se opor firm em ent e às inst it uiç ões int ernac ionais, suprim ir os IUFMS e
impedir os espec ialist as em Ciênc ias da Educ aç ão de exerc er sua funç ão, ainda que tais
ciênc ias event ualm ent e des aparec ess em? Claro está que não se conc ebe tal ref orm a
senão movida por uma vont ade polít ic a prof unda e inf lexível. Além diss o, após a
elim inaç ão das psic opedagogias, será ainda ass im imperios a a nec ess idade da form aç ão
cont inuada?
A inovação pedagógica
Franç ois Bayrou se opõe “à panac eia pedagógic a” (p. 123). Apres ent ando o exemplo
dos Est ados Unidos e do desc alabro de seu sist em a educ ac ional, ele denunc ia os equívoc os
de uma form aç ão de prof ess ores ins uf ic ient e do pont o de vist a acadêm ic o. Som os
obrigados a conc ordar com ele ness e pont o, se bem que faz endo not ar que a
desqualif ic aç ão do ens ino não poss a ser atribuída exc lus ivam ent e a isso, ao menos no
toc ant e à esc ola prim ária. Mas a impress ionant e queda do nível esc olar nos Est ados
Unidos tem ainda uma out ra caus a: a int roduç ão das psic opedagogias, da “inovaç ão
pedagógic a”, em que se verif ic am os objet ivos não cognit ivos. Ora, Franç ois Bayrou é um
ardent e def ens or da inovaç ão pedagógic a, “des ejada, em vez de tolerada” (p. 185). Som ent e
uma “revoluç ão suave” (p. 111) nas prát ic as pedagógic as teria perm it ido evit ar a
det erioraç ão do sist em a educ at ivo franc ês. Um “grande avanç o didát ic o” (p. 186) é ent ão
des ejável, tendo por base a form aç ão cont inuada. Ora, tem os dem onst rado, e prova-o a
experiênc ia em todos os país es em que as psic opedagogias foram int roduz idas, que um
“grande avanç o pedagógic o” é, tant o no ent endim ent o dos psic opedagogos quant o no dos
fat os, um grande avanç o revoluc ionário, e um grande rec uo int elect ual. Cert am ent e, há
melhoram ent os pedagógic os – sec undários – que poderiam ser dif undidos. Mas endoss ar
um movim ent o de ref orm a pedagógic a equivale a desc ons iderar os hom ens e as
inst it uiç ões, nac ionais e int ernac ionais, que cont rolam o dom ínio pedagógic o; é faz er
abst raç ão da inf luênc ia polít ic a das inst it uiç ões int ernac ionais, de sua inf luênc ia
pedagógic a, exerc ida pelos IUFMS, pelo CNDP etc., e da inf luênc ia ideológic a que exerc e a
paraf ernália int elect ual que está na base das psic opedagogias. É lanç ar-se às goelas do
lobo.
A descentralização
Ant es de tudo, lembrem os que, no âmbit o de noss a anális e, desc ent raliz aç ão e
desc onc ent raç ão podem ser equiparadas.
A conveniênc ia da desc ent raliz aç ão, para Franç ois Bayrou, é evident e (p.138).
Diant e do gigant ism o do sist em a educ ac ional franc ês, ela const it ui o únic o modo
apropriado de gest ão. Ent ret ant o, não haveria como, sem criar graves des equilíbrios ent re
as regiões, desc ent raliz ar igualm ent e a cont rat aç ão de pess oal e a elaboraç ão dos
program as. Ass im, som ent e a gest ão de pess oal e de mat erial é previst a. Part ic ularm ent e,
o papel do diret or da esc ola deve ser ref orç ado (p. 136). O projet o de desc ent raliz aç ão
provavelm ent e se insc reve, ainda que Bayrou não o menc ione, na perspect iva de uma
“mudanç a em prof undidade” da esc ola, o que “requer a part ic ipaç ão ativa [dos]
prof ess ores” (p. 156). Da mesm a form a, uma “ampla desc ent raliz aç ão” perm it iria a toda
soc iedade franc es a a part ic ipaç ão no ens ino (p. 191).
Convém repet ir que tais projet os não podem ser ext raídos do mesm o ambient e no
qual eles se devem ins erir. Se eles podem dar exc elent es res ult ados em out ras
circ unst ânc ias, não há qualquer raz ão para pens ar que, na sit uaç ão atual, o ens ino não
cognit ivo, a dout rinaç ão prec oc e e a manipulaç ão psic ológic a deixariam de ser os prim eiros
a adent rar o espaç o ass im abert o.
As ideias de Franç ois Bayrou dariam os res ult ados esperados desde que inexist iss e
o elem ent o ant agônic o const it uído pelo dom ínio psic opedagógic o. Mas os revoluc ionários se
lanç am, há muit as déc adas, a trabalhos aprof undados, dos quais seus advers ários
geralm ent e faz em pouc o caso. Bast a lembrarm o-nos da pouc a cons ideraç ão em que se
têm a psic ologia e a soc iologia. Na mesm a ordem de ideias, é prec is o menc ionar também
o desprez o que até bem pouc o se tinha com relaç ão às inst it uiç ões int ernac ionais. Esse
desc onhec im ent o, essa ignorânc ia mesm a, da est rat égia e das técnic as do advers ário bem
pode conduz ir a erros de anális e que acarret am pes adas cons equênc ias. Em mat éria de
educ aç ão, import a cons iderar que advers ários e part idários da revoluç ão não def inem da
mesm a maneira o papel da esc ola. Seria ent ão des ejável implem ent ar o sist em a
educ ac ional que est es últ im os conc eberam, para mudar os valores, as atit udes e os
comport am ent os, a fim de dest ruir o ens ino acadêm ic o? Não negligenc iem os o trabalho
ideológic o e pedagógic o realiz ado pela Revoluç ão, com todos os agent es e organiz aç ões
dos quais ela se sabe valer.
Previs ivelm ent e, “Franç ois Bayrou” não som ent e não rejeit a a ação empreendida
por seus predec ess ores, mas, ainda, com relaç ão a vários pont os, aprova os objet ivos e os
princ ípios”,188 e “mesm o Jack Lang dec larou-se ‘de acordo sobre o ess enc ial’ com o seu
suc ess or”.189 As inovaç ões pedagógic as int roduz idas por Jack Lang foram mant idas por
Franç ois Bayrou. Ele “aprova o princ ípio”190 da educ aç ão por cic los que int roduz a
pedagogia cent rada no aluno. Os módulos, “que func ionam bem”,191 foram mant idos,
cont rariam ent e ao parec er da com iss ão enc arregada dess a quest ão. Eles proporc ionam a
int roduç ão do ens ino não cognit ivo e da pedagogia cent rada no aluno nas esc olas de Ens ino
Médio, em det rim ent o dos curs os cláss ic os. As carreiras tecnológic as e prof iss ionais, que
pouc o int eress am aos def ens ores do ens ino, foram, ass im, as mais prejudic adas pela
“renovaç ão pedagógic a”.192 E nem podem esperar qualquer melhoria, uma vez que,
segundo o minist ro, “a ref orm a foi boa”.193 Não se manif est ou nenhum a urgênc ia em
fec har os IUFMS, que seria prec is o desm ant elar – valendo-se da des ordem de opos iç ão e
do cons ens o geral – já nos prim eiros dias do mandat o de Édouard Balladur. A
inf orm at iz aç ão pers ist e; os prof ess ores da esc ola prim ária são agora gerenc iados, cada
um por seu nome, mediant e um sist em a inf orm at iz ado que “tem por objet ivo [...] o
guiam ent o nac ional e acadêm ic o”,194 e, acresc ent am os, individual. A desc onc ent raç ão da
gest ão de pess oal nas univers idades – inic iada por Franç ois Fillon, minist ro do Ens ino
Superior e da Pesquis a – está em curs o.195 Esperam os que Franç ois Bayrou tome
consc iênc ia o quant o ant es das raz ões do apoio, suspeit o, de Jack Lang.
156 CERI/OCDE, La réf orm e des programm es scolaires, Op. cit., p. 57.
157 Louis Legrand, L’école unique: à quelles condit ions?, Paris, Scarabée, 1981, p.
73.
158 Ibid., p. 67 sq.
159 Ibid., p. 61.
160 Ibid., p. 97.
161 Ibid., p. 190.
162 Bullet in Off ic iel du 4 juin 1992. Ver, igualm ent e, BO de 3 junho 1993.
163 Ibid., p. 1572-1 e 1573-1.
164 Ibid., p. 1576-2.
165 Ibid., p. 1574-1.
166 Ibid., p. 1580-2.
167 Ibid., p. 1576-2.
168 Ibid., p. 1572-1 e 1576-1.
169 Ibid., p. 1573-2 e 1577-1.
170 Ibid., p. 1580-1 e 1587-2.
171 Ibid., p. 1577-2. Ver, igualm ent e, BO’S de 5 nov. 1992, 28 jan. 1993, 18 mar.
1993 e 15 abr. 1993.
172 Ver a esse respeit o Legrand, L’école unique, Op. cit., cap. XI.
173 Nós renunc iam os a dec if rar ess as propos iç ões sibilinas no quadro dest a obra.
174 BO 4 jun. 1992, p. 1570 sq.
175 Le Figaro, 9 abr. 1993, p. 11.
176 Ministère de l’Educ at ion nat ionale, de la jeuness e et des sports, Direct ion des
écoles, Les cyc les à l’école prim aire, Paris, CNDP, Hac hett e Ecoles, 1991.
177 Ibid., p. 4.
178 De acordo com o site do Ministère de l’Éduc at ion Nat ionale franc ês,
corresponde ao diplom a que marc a o fim dos est udos sec undários e abre acess o ao ens ino
superior. Const it ui o prim eiro est ágio no ens ino univers it ário – N. do T.
179 Ibid., p. 11 sq.
180 Ibid., p. 23.
181 Ibid., p. 86.
182 Rec onhec e-se aqui a proxim idade com as idéias de Skinner.
183 A déc ada dos mal-inst ruídos – N. do T.
184 F. Bayrou, 1990-2000. La dec ennie des mal-appris, Flamm arion, 1990. Poder-se-
á cons ult ar igualm ent e com proveit o o BO de 23 de junho de 1994, que cont ém, sob a
form a de 155 propos iç ões do Minist ro, o Nouveau cont rat pour l’ école.
185 Cent res des Dém oc rat es Soc iaux – N do T.
186 Ibid., p. 185.
187 1º e 6º anos do ens ino fundam ent al, respect ivam ent e – N. do T.
188 Le Monde, 2 maio 1993, p. 13.
189 Le Figaro, 30 abr. 1993, p. 9.
190 Le Monde, 3 maio 1993, p. 13.
191 Le Figaro, 30 abr. 1993, p. 9.
192 BO 4 jun. 1992, p. 1570 sq.
193 Libérat ion, 30 abr. 1993, p. 22.
194 BO 27 maio 1993, p. 1713-1.
195 Le Monde, 16 maio 1993, p. 16.
CAPÍT ULO XIII
A SOCIEDADE DUAL
O baixo nível
Os capít ulos prec edent es most raram de modo sat isf at ório que não é de caus ar
espant o a queda impress ionant e do nível esc olar. Há mais ainda: os próprios sect ários da
revoluç ão pedagógic a rec onhec em que ela pers egue objet ivos polít ic os e soc iais e que não
busc a, de modo algum, aprim orar a form aç ão int elect ual dos alunos. Inic ialm ent e,
apres ent am os uma cit aç ão que, tirada de uma obra de Louis Legrand, conc erne
diret am ent e à Franç a. Após isso, seguir-se-ão alguns elogios e apologias da ignorânc ia.
Finalm ent e, porém, não é que haja uma opos iç ão fundam ent al ent re as
técnic as dos mét odos ativos, rec om endados ofic ialm ent e, e os objet ivos
lat ent es da esc ola tais como os exigem o sist em a de seleç ão e tais como os
prof ess ores, pris ioneiros do sist em a, os pers eguem. Pois, se se prec oniz am os
mét odos ativos como técnic as capaz es de melhor atingir os objet ivos
int elect uais cláss ic os, a part ir dos quais se proc ede à seleç ão, está-se
tom ando a via errada. A pedagogia form al impos it iva é a únic a que convém
prim eiram ent e a esse tipo de seleç ão. A inef ic ác ia das medidas est rut urais de
dem oc rat iz aç ão caus a espant o. Cont udo, pret ende-se mens urar essa
dem oc rat iz aç ão à base de test es de conhec im ent os ou de nível geral (QI) que
reproduz em e sist em at iz am os res ult ados esperados da pedagogia cláss ic a. O
problem a não é, port ant o, técnic o, é um problem a polít ic o e filos óf ic o.196
Esc rit o que faz eco àqueles de um dos “grandes” pedagogos nort e-americ anos do
iníc io do séc ulo, como se vê pelo trec ho que se segue:
Muit os hom ens viveram, morreram e se fiz eram célebres, marc aram
époc a até, sem haver poss uído jam ais qualquer fam iliaridade com os esc rit os.
O saber que os ilet rados adquirem é, enf im, provavelm ent e mais pess oal,
mais diret o, mais próxim o do seu meio e, provavelm ent e, para uma grande
part e, mais prát ic o. Além diss o, eles evit am fat igar a vist a tant o quant o se
resguardam da exc it aç ão ment al e, ainda, são eles provavelm ent e mais ativos
e menos sedent ários. Adem ais, é poss ível – a despeit o dos est igm as com que
noss a époc a inst ruída marc ou essa inc apac idade – que aqueles que dela
padec em, não som ent e levem uma vida útil, feliz e virt uos a, mas, que, além
diss o, sejam verdadeiram ent e cult os. Os ilet rados est ão livres de cert as
tent aç ões, como a das leit uras inept as e vic ios as. Talvez sejam os inc linados a
atribuir dem as iada import ânc ia às capac idades e às disc iplinas nec ess árias ao
dom ínio dess a arte.197
O aut or dess as linhas surpreendent es, esc rit as em 1911, é o prof ess or G.S. Hall,
que criou o prim eiro laborat ório de Psic ologia dos Est ados Unidos. Ele exerc eu uma
inf luênc ia cons iderável sobre a Psic ologia e a Pedagogia nort e-americ ana e, fato digno de
nota, foi o prof ess or de John Dewey, o pedagogo nort e-americ ano que est eve à frent e da
“revoluç ão pedagógic a” em seus iníc ios. Not em os, cont udo, que essa conf iss ão brut al nada
acresc ent a, em verdade, à série de apologias dos mét odos de ens ino não cognit ivo.
John Dewey pode ser legit im am ent e cons iderado o pai da Pedagogia moderna, e
não há como subest im ar a inf luênc ia que ele exerc eu sobre ela. Para que se faça uma
ideia dess a inf luênc ia, lembrem os que um de seus alunos, Elwood P. Cubberly, tornou-se
chef e do depart am ent o de educ aç ão de Stanf ord, que acolheu William C. Carr, um dos
fundadores da Unesc o. (Pode-se est im ar melhor a import ânc ia dess as filiaç ões int elect uais
quando se sabe com que cuidado os est udant es são selec ionados em cert as disc iplinas,
nas quais eles são subm et idos, aliás, a uma dout rinaç ão da qual a form aç ão dada nos
IUFMS não é senão uma pálida cópia). Os disc ípulos de Dewey criaram cát edras de
“Ciênc ias” da Educ aç ão por todo o territ ório dos Est ados Unidos. Desde aí, ass oc iando-se
aos ram os soviét ic os, part iram para a conquist a do mundo e das inst it uiç ões
int ernac ionais. A inf luênc ia de Dewey sobre a Pedagogia moderna e sua orient aç ão
ideológic a foi, port ant o, det erm inant e, e é prec is o lembrar-se diss o ao se ler as
espant os as cit aç ões adiant e. Soc ialist a furios am ent e cont rário a todo individualism o,
Dewey ass anha-se cont ra a int eligênc ia:
A últ im a res ist ênc ia do isolam ent o ant iss oc ial e oligárquic o é a
perpet uaç ão da noç ão puram ent e individual da int eligênc ia.198
Ass im, para Dewey, a soc ializ aç ão deve-se faz er acompanhar pela dest ruiç ão da
cult ura, da inst ruç ão e da int eligênc ia, noç ão “puram ent e individual”. Port ant o, não poderia
haver soc ializ aç ão sem a deprec iaç ão do pens am ent o individual e da inst ruç ão.
Uma vez que o saber seja cons iderado como provenient e do int erior dos
indivíduos [!] e que ness e âmbit o se des envolva, os laç os que unem a vida
ment al de cada um à dos seus sem elhant es são ignorados e negados. Uma
vez que o component e soc ial das operaç ões ment ais é negado, faz-se dif íc il
enc ont rar os laç os que devem unir um indivíduo a seus sem elhant es. O
individualism o moral provém da separaç ão consc ient e de dif erent es ent idades
vivas; ele finc a suas raíz es na conc epç ão de consc iênc ia segundo a qual cada
pess oa é um cont inent e isolado, abs olut am ent e privado, int rins ec am ent e
independent e das ideias, des ejos e objet ivos de out rem.199
A trágic a def ic iênc ia das esc olas de hoje em dia [1899] res ide no fato de
elas busc arem form ar os fut uros membros de uma soc iedade na qual o
espírit o soc ial é eminent em ent e def eit uos o.
[...]
A simples acum ulaç ão de fat os e de saberes é uma atividade de tal
modo individual que ela tende muit o nat uralm ent e a se transf orm ar em
egoísm o. Não há qualquer just if ic aç ão soc ial para a simples aquis iç ão de
ciênc ia, ela não fornec e qualquer ganho soc ial nít ido.
Algum as páginas após, Dewey acresc ent a:
A int roduç ão das ocupaç ões ativas, do est udo da nat urez a, da ciênc ia
elem ent ar, da Arte, da Hist ória; a relegaç ão das disc iplinas puram ent e
simbólic as e form ais a uma pos iç ão sec undária; a modif ic aç ão da atm osf era
moral das esc olas... não são simples acident es, mas são fat os nec ess ários à
evoluç ão soc ial em seu conjunt o. Falt a som ent e religar todos ess es fat ores,
dar-lhes sua int eira signif ic aç ão e ent regar a poss e complet a de noss as
esc olas, sem conc essões, às ideias e aos ideais daí dec orrent es.200
A ant iga Psic ologia cons iderava o espírit o como ent idade individual, em
cont ado diret o e imediat o com o mundo ext erior. [...] A tendênc ia atual
cons idera o espírit o como uma funç ão da vida soc ial – inc apaz de operar e de
se des envolver a part ir de si mesm o, mas requerendo os stim uli cont ínuos
oriundos dos organism os soc iais e enc ont rando sua subst ânc ia no soc ial. A
teoria da heredit ariedade fam iliariz ou-nos com a conc epç ão de capac idades
individuais, tant o ment ais quant o fís ic as, herdadas da raça: elas form am um
capit al que o indivíduo herda do pass ado e do qual ele é depos it ário para o
fut uro. A Teoria da Evoluç ão nos fam iliariz ou com a conc epç ão segundo a qual
o espírit o não pode ser cons iderado como uma poss ess ão individual, exc lus iva,
mas como o term o dos esf orç os e ref lexões da hum anidade.201
As cons ideraç ões prec edent es, que privilegiam sist em at ic am ent e o colet ivo, ou
mesm o o colet ivism o, em det rim ent o do individual, não teriam como, abs olut am ent e,
just if ic ar a inc ult ura. Ent ret ant o, não nos espant em os diant e da queda do nível esc olar a
que elas inelut avelm ent e conduz em. Deliberadam ent e provoc ada, essa desvaloriz aç ão
busc a dest ruir a int eligênc ia, “noç ão puram ent e individual”, ant iss oc ial e reac ionária.
O déficit democrático
Ent ret ant o, a int roduç ão dos ens inam ent os não cognit ivos (que busc aria,
lembrem o-nos, não a dem oc rat iz aç ão dos est abelec im ent os, mas sim a soc ializ aç ão dos
alunos) teria benef ic iado as class es menos favorec idas? De modo algum, e os res ult ados
da “dem oc rat iz aç ão” do ens ino, na qual se insc reve a inst auraç ão da esc ola únic a,202 são
irref ut áveis. Eis a sent enç a def init iva pronunc iada cont ra ela por Ant oine Prost, alto
dirigent e do SGEN-CFDT, ant igo membro do gabinet e de Mic hel Roc ard: “Os res ult ados
surpreendem: a dem oc rat iz aç ão do ens ino está complet am ent e est agnada há duas
déc adas”.203
Tent ei conhec er com prec is ão, tom ando o exemplo da região de Orléans,
o que realm ent e se havia pass ado com o ens ino na Franç a no últ im o terç o de
séc ulo. Pens o haver most rado que a dem oc rat iz aç ão progrediu até o iníc io dos
anos sess ent a, dent ro de uma est rut ura esc olar pens ada por cons ervadores
dot ados de uma int enç ão convenient em ent e reac ionária de def es a e de
ilust raç ão das Hum anidades, enquant o que, ao cont rário, as ref orm as de 1959,
de 1963 e de 1965, que pret endiam ass egurar a igualdade de oport unidade nas
esc olas e a dem oc rat iz aç ão do ens ino, não fiz eram de fato senão organiz ar o
rec rut am ent o da elit e esc olar no seio da elit e soc ial. Esse res ult ado não me
alegrou em nada, mas me parec e inc ont ornável. Também eu, no iníc io dos
anos sess ent a, fui part idário convict o dess as ref orm as cujos res ult ados
cont radiz em as int enç ões. Meu prim eiro livro foi uma def es a em seu favor,
quando tais ref orm as não est avam conc luídas. A verdade é que não crit ic o
ninguém: const at aç ões não são condenaç ões.204
Quaisquer que tenham sido suas lim it aç ões, o ens ino das déc adas ant eriores
oferec ia a cada um poss ibilidades de emanc ipaç ão, tant o int elect uais como cult urais e
individuais, prof iss ionais ou soc iais, bem superiores às do sist em a que vigora atualm ent e.
Out ra cois a não se deve ver aí senão a cons equênc ia inelut ável de uma ref orm a que
pret ende ant es veic ular valores e um tipo de ens ino não cognit ivo, desprez ando tot alm ent e
o est rago provoc ado às crianç as que rec ebem uma tal form aç ão. Ass im, espant ar-se-á
alguém quando a polít ic a atual – a respeit o da qual cript oc om unist as e globalist as est ão
em perf eit o acordo – susc it a opos iç ões inst int ivas tant o à direit a quant o à esquerda, ent re
os advers ários do trat ado globalist a de Maast ric ht? Mas tais efeit os pervers os deveriam
caus ar surpres a, quando o objet ivo do sist em a educ ac ional, após ter sido radic alm ent e
modif ic ado, cons ist e agora em soc ializ ar os alunos em vez de dem oc rat iz ar o ens ino?
Em dez embro de 1989, à époc a da ext int a URSS, o dout or Povalyaev, chef e do
set or de soc iologia do Minist ério da Bielorrúss ia, em sua int ervenç ão em um sem inário de
alto nível da Unesc o, dec larou:
Um dos paradoxos da soc iedade moderna é o de que ela não tem
nec ess idade de um grande núm ero de pess oas inst ruídas. A seleç ão se opera
por meio do que se cham a “elit e soc ial”, que realiz a o trabalho int elect ual
nec ess ário. Aos dem ais compet e ou a exec uç ão das dec isões ou o exerc íc io de
cargos subalt ernos. É evident e que há uma part e da populaç ão que não exec ut a
nenhum dess es trabalhos. Essa tendênc ia dif ere ent re os país es e seus graus
de des envolvim ent o. Em sínt es e, a soc iedade apenas raram ent e cons egue
equilibrar suas dem andas com as de seus cidadãos e suas capac idades.
(Unesc o)205
As linhas acim a perm it em compreender que o aut or se coloc a desde a perspect iva
de uma socie dade dual, quando ele enunc ia na página seguint e que:
Exist em prof undas dif erenç as em mat éria de educ aç ão, dif erent es
tendênc ias e dif erent es program as. Deveria haver mais poss ibilidades para as
class es e para as unidades de ens ino espec ial dedic adas a crianç as dot adas e
talent os as. É som ent e sobre uma base ass im que o pot enc ial int elect ual da
soc iedade pode ser revigorado.206
Por essa raz ão, a ideia de lic eus int ernac ionais para crianç as dot adas
parec e muit o apropriada. O conc eit o de int elect o é um conc eit o int ernac ional e
hum ano. Os mais dot ados e os mais talent os os devem rec eber o melhor.207
Ass im deveria ser, port ant o, a educ aç ão fut ura: para a mass a, o ens ino não
cognit ivo, pura dout rinaç ão esvaz iada de toda subst ânc ia int elect ual; para a elit e, uma
verdadeira form aç ão int elect ual (est ando ela mesm a sujeit a a algum a cauç ão) nec ess ária
ao trabalho int elect ual. Seria ingenuidade, cont udo, supor que essa elit e est aria a salvo da
dout rinaç ão com uno-globalist a e que esta seria res ervada som ent e ao povo. Conc ebe-se
fac ilm ent e que a “form aç ão ideológic a” – rebat iz ada com o nome de “educ aç ão cívic a”–
que por ela seria rec ebida, haveria de ser muit o mais severa. Não obst ant e, essa elit e
poss uirá cert os inst rum ent os int elect uais que lhe perm it iriam a emanc ipaç ão.
Para que sejam os bem compreendidos: não se trat a de advogar em favor de uma
esc ola únic a, que, como vim os, term ina por negligenciar os mais hum ildes, mas sim de
dar a cada um conf orm e suas capac idades, em vez de subm et er a uma esc ravidão
psic ológic a e int elect ual aqueles que não tiveram ocas ião de pert enc er, por mérit o ou por
nasc im ent o, à elit e. Nada tem os a opor ao projet o de dar o melhor som ent e àqueles que o
podem rec eber. Mas ninguém poderia adm it ir que “a soc iedade moderna [...] não tem
nec ess idade de um grande núm ero de pess oas inst ruídas”, a não ser quando se cons idera a
sit uaç ão a part ir de uma perspect iva merc ant il e ult raliberal, ou tot alit ária e
cript oc om unist a. Que se ofereç a aos dem ais o que eles podem ass im ilar, que não se lhes
fec he sist em at ic am ent e o acess o à inst ruç ão, à verdadeira cult ura e à liberdade int elect ual
e espirit ual. Que não se lhes prive dos verdadeiros inst rum ent os de libert aç ão.
Adem ais, a não ser que se acredit e na tot al inc ompet ênc ia de noss os governant es
– desc ulpa sob a qual, é verdade, eles se abrigam com frequênc ia –, é dif íc il negar que a
derroc ada do pens am ent o e o mass ac re dos inoc ent es foram planif ic ados desde longa
data, que o delírio esc olar e o des alent o do ens ino208 são a culm inânc ia de um proc ess o
revoluc ionário empreendido, com muit a luc idez, desde quas e um séc ulo. A quest ão das
elit es se coloc a de modo inelut ável. Como um sist em a ass im garant e a seleç ão e a
form aç ão de suas indispens áveis elit es? Pois, claro está, ninguém – seja à direit a, seja à
esquerda – pôde jam ais acredit ar seriam ent e em sua des apariç ão, e apost ar na soc iedade
sem class es, ou no dogm a do part ido, vont ade emanada desde as mass as populares, ess as
fábulas dest inadas a mist if ic ar o povo. Sem coloc ar em dúvida a sinc eridade de um
Ant oine Prost, realm ent e preoc upado com a queda do nível esc olar, não se fica aut oriz ado
a pens ar que a quest ão das elit es talvez tenha esc apado aos def ens ores da inc ult ura? Pois
os Stanley Hall, os John Dewey – prof ess ores univers it ários – e out ros inc ens adores do
ens ino não cognit ivo têm, por sua vez, rec ebido uma exc elent e educ aç ão, a qual lhes
perm it e não serem enganados por tal disc urs o. Próxim os ao poder, pert enc ent es às elit es
polít ic a e int elect ual, e suf ic ient em ent e inst ruídos para saber que a Revoluç ão nec ess it a de
sábios, eles não ignoram que as soc iedades não teriam como ser governadas, ou mesm o
cons ervadas enquant o tais, por indivíduos que não houvess em rec ebido out ra cois a que um
ens ino não cognit ivo e mult idim ens ional. Não se pode supor, com realism o, que ess es
hom ens de poder – os quais dão provas, por meio de seus esc rit os, de poss uir grandes
conhec im ent os e prof undas int uiç ões psic ológic as e soc iológic as – cheguem a conc eber,
mesm o que por um inst ant e, que noss as soc iedades podem ser governadas por ilet rados.
Pois, sendo ass im, como se daria a seleç ão e a form aç ão das elit es?
Aqui, dois modelos se def ront am, e logo se aproxim am. Em prim eiro lugar, um
modelo com unist a de seleç ão e de form aç ão das elit es sobre bas es int elect uais rigoros as
– mas arbit rárias –, sob o cont role do Est ado; em seguida, um modelo ult raliberal em que
a reproduç ão soc ial se efet ua mecânic a e inexoravelm ent e. O tour de forc e do globalism o
cons ist e em haver cons eguido aproxim ar duas conc epç ões aparent em ent e irrec onc iliáveis:
a seleç ão das elit es sobre bas es int elect uais não exc lui a reproduç ão soc ial; por raz ões
soc iológic as, ela a requer frequent em ent e. E, por out ro lado, que import a?, não é a
ext raç ão soc ial da elit e que tem import ânc ia, mas sim a ideologia – globalist a – que lhe é
inc ulc ada. Ess as duas filos of ias tot alit árias, igualm ent e hegelianas, chegaram
def init ivam ent e a uma sínt es e, conc ret iz ada pela Dec laraç ão Mundial sobre a Educ aç ão
para Todos, adot ada unanim em ent e por 155 país es e por cerc a de vint e organiz aç ões
int ernac ionais – o que não deve em nada surpreender. Bast ant e próxim as uma da out ra,
seu únic o des ac ordo está em qual modelo econôm ic o deve ser aplic ado. Est ando res olvido
o problem a – provis oriam ent e, pois não se renunc iou a faz er “evoluir as ment alidades” –, a
convergênc ia ent re capit alism o e com unism o, anunc iada por Sakharov, pode ent ão efet uar-
se sem dar cont ra obst ác ulos maiores.209 Ambos conc ordam acerc a da nec ess idade de
mant er uma cast a dirigent e, inst ruída, separada de um povo ignorant e. A elit e poss uiria
ent ão um modo de cont role soc ial abs olut o, e a reproduç ão soc ial, ass egurada por meio do
ens ino privado independent e,210 desviado de sua miss ão, deve garant ir a perenidade de seu
poder. Apenas os elem ent os mais brilhant es da class e popular, selec ionados a part ir de
crit érios igualm ent e indet erm inados, lograriam esc apar, graç as às suas qualidades, ao
“rec rut am ent o da elit e esc olar no seio da elit e soc ial” tal como já ocorre. Porém,
invers am ent e, a elit e seria subm et ida a uma dout rinaç ão hegeliana, globalist a e tot alit ária,
que a todo mom ent o ameaç aria com o ret orno ao com unism o, de acordo com a
advert ênc ia de Gorbatc hev, a qual, com exc eç ão dos leninist as, a quem ela dec ert o não
pass ou desperc ebida, não foi suf ic ient em ent e not ada:
Para coloc ar um term o a ess es rum ores e a ess as espec ulaç ões, que se
mult iplic am a Oest e, eu gost aria de uma vez mais faz er not ar que tem os
conduz ido todas as noss as ref orm as em conf orm idade com a via soc ialist a. É
dent ro do quadro do soc ialism o, e não no ext erior, que havem os de busc ar as
respost as a todas as quest ões que se impõem. É em funç ão dess es crit érios
que nós avaliam os tant o os noss os suc ess os como os noss os erros. Aqueles
que esperam que venham os a nos afast ar da via soc ialist a hão de
dec epc ionar-se prof undam ent e. Cada elem ent o do program a da perest roika – e
o program a no seu conjunt o – fundam ent a-se int eiram ent e sobre a ideia de
que, quant o mais soc ialism o, mais dem oc rac ia.211
Pois não exist e qualquer cont radiç ão ent re dem oc rac ia aparent e e soc ialism o,
como o pres ent e trabalho busc a dem onst rar. Def init ivam ent e, import a compreender que o
soc ialism o não é um sist em a econôm ic o, mas um sist em a soc ial, que pode muit o bem
acom odar-se ao capit alism o, para dele logo des embaraç ar-se, se nec ess ário, uma vez que
a revoluç ão psic ológic a tenha sido conc luída. O cont role psic ológic o, por int erm édio da
educ aç ão, da mídia, da gest ão de empres as e do cont role soc ial, realiz ado graç as à
desc ent raliz aç ão de todas as atividades, e não da educ aç ão apenas, conduz a uma
soc iedade igualm ent e tot alit ária, na qual os modos prim it ivos de cont role foram
subst it uídos por técnic as de cont role não avers ivas, das quais o povo não tem consc iênc ia.
Manipulado, ele não se aperc ebe de que seu comport am ent o é cont rolado, de modo divers o,
com mais efic ác ia do que qualquer out ro tipo de cont role a que ele est aria subm et ido num
sist em a tot alit ário, no qual sua revolt a lat ent e haveria de lhe garant ir sua últ im a prot eç ão
psic ológic a. O leit or nos há de perdoar por não poderm os des envolver ess es pont os no
âmbit o dest e opúsc ulo.
A sociedade dual
A Nova Ordem Mundial inst ala seus repres ent ant es sobre cada cont inent e –
cham ado “região” pelos inic iados – e em cada país. Ass im se cria uma cast a de
tecnoc rat as, separada do povo, cois a que os europeus já conhec em. Dec ert o, a soc iedade
deve ser, segundo os ideólogos globalist as, uma soc iedade dual. Trat a-se aqui de um
conc eit o de base, sem o qual não é poss ível compreender as ref orm as em curs o, tant o no
set or do ens ino quant o nos dem ais. Soc iedade dual: os dirigent es e os dirigidos, a elit e e o
povo. Há quem diga: os senhores e os esc ravos.
A sit uaç ão pres ent e não inspira qualquer otim ism o. Em cert os país es
des envolvidos, a delinquênc ia juvenil aum ent a. As drogas, o roubo, o hom ic ídio
e a prom isc uidade espalham-se ent re a juvent ude. Se, uma vez chegados à
idade adult a, ess es jovens venham a ter em suas mãos o noss o fut uro, noss o
dest ino será a cat ást rof e. A perspect iva deve ser ainda mais angust iant e
desde que a mesm a sit uaç ão venha a ocorrer nos país es em des envolvim ent o.
O sist em a atual de educ aç ão não pode furt ar-se à sua respons abilidade na
taref a de evit ar essa cat ást rof e iminent e.212
No que conc erne aos país es des envolvidos, perc ebe-se, no dom ínio da
cult ura, divers as tendênc ias fundam ent ais e de longo praz o, def inidas por,
ent re out ros, Willis Harm an:213 [...] d) des envolvim ent o de uma “elit e do
saber”, ou seja, uma elit e dirigent e merit oc rát ic a, cuja asc ens ão seja
fundam ent ada no saber [tecnoc rat as não eleit os e, port ant o, dispens ados de
responder sobre seus atos diant e dos eleit ores].214
Talvez a caract eríst ic a mais impress ionant e do debat e relat ivo ao
univers alism o seja, em se trat ando de direit os hum anos, o abism o que separa
as “pess oas de dent ro” (as que part ic ipam do debat e a tít ulo prof iss ional,
como diplom at as, repres ent ant es de organiz aç ões não governam ent ais [ONGS]
e alguns univers it ários) das “pess oas de fora” (cujo int eress e geralm ent e é
temporário e que cons ideram o projet o desde uma pos iç ão rem ot a).215
O trabalho int elect ual, bem como o poder, será ent ão res ervado a uma elit e
tecnoc rát ic a que terá rec ebido, som ent e ela, a form aç ão int elect ual (conc ebida por quem e
segundo quais crit érios?) nec ess ária à realiz aç ão dess e trabalho. Uma vez que “a
soc iedade moderna [...] não tem nec ess idade de um grande núm ero de pess oas inst ruídas”,
a soc iedade dual deve ter um sist em a educ ac ional igualm ent e dual:
Ao mesm o tempo, a funç ão soc ial da educ aç ão, que se exprim e por sua
dem oc rat iz aç ão, gerou um igualit arism o vulgar que se manif est a pela
separaç ão da educ aç ão em dois tipos: a educ aç ão para as mass as e uma
educ aç ão de qualidade, res ervada a uma elit e. Pode-se const at ar que os
res ult ados quant it at ivos da educ aç ão são invers am ent e proporc ionais à sua
qualidade e que a seleç ão soc ial vem-se tornando cada vez mais ref inada e
inf orm al.216
Ora, conf orm e já vim os, não se pode afirm ar que “os res ult ados quant it at ivos da
educ aç ão são invers am ent e proporc ionais à sua qualidade”; o sist em a educ ac ional franc ês,
que se dem oc rat iz ava “até ao iníc io dos anos sess ent a”, seria a prova do cont rário se não
tivess e sido feit o em pedaç os pela revoluç ão psic opedagógic a. Ao cont rário, foi a pret ens a
dem oc rat iz aç ão do ens ino – que visa, na realidade, à soc ializ aç ão dos alunos – que
“organiz ou o rec rut am ent o da elit e esc olar no seio da elit e soc ial”. Port ant o, por que
pers everar no cam inho do ens ino não cognit ivo e da soc ializ aç ão dos alunos, que conduz iu
à sit uaç ão cat ast róf ic a que conhec em os? Apenas a vont ade de mant er o povo na
ignorânc ia e de impor o globalism o explic aria tudo isso?
Qual é, port ant o, a raz ão dess e ódio à cult ura aut ênt ic a e à int eligênc ia, dess as
agressões inint errupt as cont ra as fac uldades da abst raç ão? Querer-se-ia banir os
transc edent ais e os univers ais do ens ino franc ês e do espírit o dos hom ens? Não cess ará
esse proc ess o ant es que Arist ót eles, Plat ão, São Tom ás de Aquino e Sant o Agost inho
tenham sido tornados inac ess íveis às geraç ões fut uras? Des ejar-se-ia int erdit ar a elas o
acess o aos univers os int elect uais?
Ai de vós, legist as, porque tom ast es a chave da ciênc ia! Vós mesm os
não ent rast es e impedist es os que queriam ent rar!217
A mass a, a quem toda a form aç ão int elect ual será rec us ada, rec eberá, não
obst ant e, uma “educ aç ão” dest inada a evit ar a pret ens a “cat ást rof e iminent e”. Conf orm e já
havíam os afirm ado, é um erro pens ar que a elit e esc apará tot alm ent e a essa “educ aç ão”,
a essa dout rinaç ão, ainda que dif erenç as import ant es poss am exist ir ent re a ideologia
dest inada às mass as e aquela ens inada à elit e. A ideologia globalist a será, dess e modo,
impost a tant o às mass as quant o à elit e, por meio de mét odos psic opedagógic os e segundo
a ref orm a est rut ural do sist em a educ ac ional que analis am os.
A elit e, que será ess enc ialm ent e coopt ada – term o elegant e a masc arar uma
dit adura –, apes ar de uma aparênc ia de dem oc rac ia que se poderá mant er durant e algum
tempo, deve ser rec rut ada exc lus ivam ent e ent re os globalist as. Aderir à ideologia
globalist a será, port ant o, e já o é frequent em ent e, a condiç ão sine qua non, o pass aport e
que perm it e abandonar a manada:
A educ aç ão deverá levar em cont a as prováveis divisões do mundo
durant e um período que será de turbulênc ia. Enquant o algum as soc iedades
aprenderão a se int egrar no conjunt o, out ras viverão mais ou menos para e no
int erior de cert os grupos – mesm o que se trat e dos tradic ionais “Est ados-
naç ões” –, corporaç ões ou “gangues”. Ainda no int erior das soc iedades poderá
haver um dualism o: de um lado, grupos frequent em ent e de base geográf ic a,
relat ivam ent e consc ient es e seguros de si mesm os, porém igualm ent e
sens íveis ao cont ext o global, no qual eles evoluem, e também à sua dim ens ão
fut ura. Ao mesm o tempo, haverá out ros grupos, relat ivam ent e inc onsc ient es
de si mesm os ou da sit uaç ão do planet a, vivendo ao azar. Est es últ im os serão
os que devem conc luir que a quest ão da sobrevivênc ia só diz respeit o a uma
tribo, a uma cast a, a um det erm inado âmbit o geográf ic o ou mesm o a um
Est ado-naç ão.218
Esc revem os acim a a palavra “manada” propos it alm ent e, uma vez que ela sugere
muit o bem a conc epç ão que os globalist as têm dos povos, rebanho que se conduz ao
abat edouro. Todos aqueles que já enc ont raram func ionários int ernac ionais – ou seus
clones, que gost am de ass inalar sua pres enç a nas inum eráveis ram if ic aç ões das
organiz aç ões supranac ionais – não podem deixar de fic ar espant ados com o desprez o, e
mesm o a raiva, que a maior part e dent re eles dedic a aos povos e, part ic ularm ent e, às
suas ment alidades: “dif erent em ent e do impaludism o e de out ras caus as de mort alidade
ent re adult os nos país es em des envolvim ent o, a AIDS não poupa as elit es”.219
Ocorre que, de fato, é no dom ínio das ment alidades, dos psiquism os, que se sit ua
o hiat o ent re os globalist as e o povo. Os prim eiros com ungam de um ideal mess iânic o e
mundial, e já adot aram um novo sist em a de valores, uma nova ment alidade e um novo
psiquism o, relegando à “lixeira da hist ória” o legado das civiliz aç ões ant eriores, frut o de
evoluç ões soc iais milenares, de inum eráveis frac ass os e ajust am ent os suc ess ivos, com a
inc orporaç ão, de maneira orgânic a, do gênio das geraç ões ant eriores:
Os dif erent es fat ores que condic ionam o est abelec im ent o de uma
soc iedade de paz têm sido frequent em ent e evoc ados, a com eç ar pelo da
dim ens ão polít ic a. A revis ão radic al da perc epç ão de conjunt o dos problem as
da cooperaç ão int ernac ional, que implic a a abordagem evoc ada acim a, requer
uma ment alidade polít ic a nova.220
Os povos, mais prudent es e menos propens os a se deixar seduz ir pela últ im a
utopia da moda,221 ligados à realidade do trabalho, curvados sobre a terra ou sujeit ados à
máquina, talvez rec onheç am inst int ivam ent e, sem poder just if ic á-lo, mas com just ez a,
todo o valor de quant o herdaram e os perigos imens os de uma revoluç ão tant o soc ial
quant o psic ológic a. Ass im, os globalist as choc am-se cont ra dois obst ác ulos maiores: a
est rut ura soc ial que se reproduz a part ir de uma evoluç ão muit o lim it ada quant o a seus
eixos princ ipais; e a ment alidade popular, transm it ida de geraç ão em geraç ão:
Ainda que o mundo dec lare sua int enç ão de cooperar para a inst auraç ão
de um des envolvim ent o sust ent ável, fundado sobre a unic idade do mundo,
rec onhec endo que a époc a atual repres ent a um período de trans iç ão, os
paradigm as e os mét odos de pens am ent o não est ão adapt ados.222
A Nova Ordem Mundial trabalha sobre a reproduç ão soc ial, no que res ide o dom ínio
das ciênc ias soc iais que est udam, part ic ularm ent e, os “fat ores que favorec em a mudanç a
soc ial”, o que, traduz ido da língua de pau globalist a, signif ic a: as técnic as de inf luênc ia e
de cont role soc ial que conduz em à revoluç ão silenc ios a e doce (menc hevique). Mas não é
ass im tão fác il transf orm ar a ment alidade de um povo e, ainda que os com unist as tenham
obt ido signif ic at ivos res ult ados ness e dom ínio, a revolt a lat ent e dos povos que lhes
est avam subm et idos denunc ia os lim it es com os quais as técnic as elem ent ares colidem. É
dess e modo que o desprez o dos globalist as pelos povos, diant e da res ist ênc ia pass iva
dest es, se transf orm a rapidam ent e em ódio, dado o obst ác ulo enorm e que essa res ist ênc ia
repres ent a à cons ec uç ão de seus planos, por transm it ir, de geraç ão a geraç ão, uma
heranç a e uma ment alidade sobre as quais se puderam const ruir todas as obras de arte e
os milagres do espírit o que a hum anidade adm ira – e que a Nova Ordem Mundial des eja
esvaz iar de sua subst ânc ia ou apagar da mem ória dos hom ens. Não nos deixem os enganar.
Após déc adas de trabalho, é chegada a hora de empregar det erm inadas técnic as para
modif ic ar a ment alidade dos indivíduos e dos povos. A ref orm a da educ aç ão mundial em
curs o visa prec is am ent e a int roduz i-las em noss as soc iedades.
196 Louis Legrand, L’école unique, à quelles condit ions?, Op. cit., p. 96.
197 G. Stanley Hall, Educ at ional problems, Nova Iorque, 1911, II, p. 443-444. Cit ado
por S.L. Blum enf eld, N.E.A., Trojan hors e in americ an educ at ion, Bois e, Idaho, USA,
Paradigm Company, 1990, p. 107.
198 J. Dewey, Liberalism and soc ial act ion, Nova Iorque, G.P. Putnan’s Sons, 1935,
p. 52. Cit ado por Blum enf eld, Ibid, p. 106.
199 J. Dewey, Dem oc racy and educ act ion, Nova Iorque, Macm illan, 1916, Free Press
Peperback Edit ion, 1966, p. 297. Cit ado por Blum enf eld, Ibid, p. 106.
200 J. Dewey, The school and soc iety, Chic ago, 1889; reimpress o em: J. Dewey,
The middle works, 1899-1924, vol. 1: 1899-1901, Joann Boydst on, Sout hern Illinois
Univers ity Press, 1976, p. 19. Cit ado por Blum enf eld, Ibid., p. 106.
201 J. Dewey, Ibid., p. 69. Cit ado por Blum enf eld, Ibid., p. 106.
202 Esc ola únic a: no âmbit o educ ac ional franc ês, conc epç ão, de pret ensões
dem oc rát ic as, de um sist em a esc olar bas eado na seleç ão para o ens ino superior mediant e
o crit ério do mérit o, e não segundo condiç ões soc ioec onôm ic as – N. do T.
203 A. Prost, L’ens eignem ant s’est-il dem oc rat is é?, PUF, coll. “Soc iologies”, 1986.
Cit ado por Ph. Nemo, Pourquoi ont-ils tué Jules Ferry?, Paris, Grass et, 1991, p. 32.
204 Ibid., p. 201 ss., cit ado por Ph. Nemo, Ibid., p. 33.
205 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. Cit., Unesc o, p.38. Grif o noss o.
206 Ibid., p. 37.
207 Ibid.
208 M. Jum ilhac, Le mass ac re des innoc ents, Paris, Plon, 1984. A. Finkielkraut, La
déf ait e de la pens ée, Paris, Gallim ard, 1987. J. Capelovic i, Em plein délire scolaire, Paris,
Carrère, 1984. J. de Rom illy, L’ens eignem ent en dét ress e, Paris, Juliard, 1984.
209 Seria abus ivo relac ionar direit a e esquerda a capit alism o e com unism o. Por
out ro lado, as elit es polít ic as acham-se longe de est ar tot alm ent e convert idas ao
globalism o e, em todos os part idos, enc ont ram-se opos it ores a essa polít ic a. O próprio
part ido com unist a a combat e, atac ando o seu cont ingent e ult raliberal. Não obst ant e, direit a
e esquerda sof rem a inf luênc ia int elect ual de ideologia globalist a, sendo a direit a mais
sens ível ao seu component e ult raliberal, e a esquerda ao seu component e soc ial
(cript oc om unist a). Claro está que tal polít ic a const it ui uma traiç ão tant o da direit a como
da esquerda, e um dos objet ivos do pres ent e trabalho é o de cham ar a atenç ão dos
eleit ores e das elit es polít ic as para esse fenôm eno e para o que aí está realm ent e em
jogo.
210 “Ens eignem ent libre hors cont rat”, no original; corresponde a uma inic iat iva de
esc olas cat ólic as que prom ovem uma educ aç ão orient ada por valores crist ãos tradic ionais,
à margem das diret riz es do Minist ério da Educ aç ão Nac ional franc ês – N. do T.
211 M. Gorbatc hev, Perest roïka, J’ai lu, p. 44.
212 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. Cit., Unesc o, p. 104.
213 Ver seu art igo: “La soc iet é americ aine em changem ent”, em: Perspect ives
dif erent es d’avenir de l’ens eignem ent aux Etats-Unies d’Amérique et em Europe, Paris,
OCDE, 1972.
214 S. Rass ekh, G. Vaideanu, Op. Cit., p. 89.
215 Colóquio organiz ado pela ONU, em Genebra, dias 16 e 17 de dez embro de 1985,
L’univers alit é est-elle menac ée?, Nova Iorque, Naç ões Unidas, Depart am ent o da
Inf orm aç ão, 1987, p. 56. Esse colóquio cont ou com a pres enç a de vários minist ros.
216 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. Cit., Unesc o, p. 93.
217 Lc 11, 52 (da Bíblia de Jerus além) – N. do T.
218 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. Cit., Unesc o, p. 35. Grif o noss o.
219 Banc o Mundial: Rapport sur le développem ent dans le monde 1991,
Washingt on, Banc o Mundial, 1991, p. 73. Esse import ant e relat ório é prec edido de um
pref ác io ass inado pelo pres ident e do Banc o Mundial.
220 Congress o Int ernac ional sobre a Paz no Espírit o dos Hom ens, Rapport final,
Op. Cit., Unesc o, p. 23.
221 “O peixe morre pela cabeç a”. Provérbio russ o.
222 Ibid., p. 15.
CAPÍT ULO XIV
O TOTALITARISMO PSICOPEDAGÓGICO
A revoluç ão psic opedagógic a é, port ant o, ess enc ialm ent e tot alit ária. Nasc ida nos
meios revoluc ionários que, com a perest roika e a ref orm a est rut ural, mudaram, não de
objet ivo, mas de est rat égia, ela pret ende levar a cabo uma revoluç ão psic ológic a que será
seguida, inelut avelm ent e, de uma revoluç ão soc ial. Globalist a e cript oc om unist a, hegeliana,
ela busc a subm et er o indivíduo ao Est ado, tant o em seu comport am ent o quant o em seu
psiquism o e em seu próprio ser:
A revoluç ão psic ológic a é veic ulada, inic ialm ent e, pelo sist em a educ ac ional. Muit os
out ros dom ínios são igualm ent e envolvidos ness a taref a, tais como a mídia, a
adm inist raç ão de empres as e a gest ão de rec urs os hum anos, os set ores organiz ados da
soc iedade civil e mesm o as inst it uiç ões religios as, que se busc a inc luir no proc ess o. Todos
são, port ant o, envolvidos, tant o crianç as como adult os. Por out ro lado, a subvers ão do
sist em a educ ac ional não envolve unic am ent e os prim eiros, mas sim o conjunt o da
populaç ão – adult os inc lus ive. A ref orm a psic ológic a e a lavagem cerebral em esc ala
mundial não poderiam deixar ninguém iles o. Eis as palavras prof eridas por um cons elheiro
de Est ado chinês em seu disc urs o de abert ura de um sem inário de alto nível, ocorrido na
Unesc o:
Adent ram os o séc ulo XXI. O des af io que a educ aç ão deve enf rent ar é
global e severo. Por essa raz ão, a miss ão da educ aç ão será, ao mesm o tempo,
árdua e glorios a. Ness e vigés im o prim eiro séc ulo, aquele que cont rolar a
educ aç ão terá a inic iat iva. O conc eit o de educ aç ão deve ser ainda renovado. A
educ aç ão será perm anent e; a soc iedade em seu conjunt o a terá sob os olhos;
a est rut ura da educ aç ão será mais flexível e mais divers if ic ada, form ando
uma rede que se est ende por todo o conjunt o da soc iedade. (Unesc o)225
Tais ref lexões não aparec em isoladas:
Do mesm o modo, o Quadro de ação aprovado junt o com a Dec laraç ão mundial
sobre a educ aç ão para todos, na pres enç a de delegados de 155 país es, ass evera também
(p. 13) que os
organism os fam iliares e com unit ários, organiz aç ões não governam ent ais,
e out ras ass oc iaç ões volunt árias, sindic at os de prof ess ores, out ros grupos
prof iss ionais, empregadores, a mídia, part idos polít ic os, cooperat ivas,
univers idades, inst it uiç ões de pesquis a, organism os religios os, etc. – além de
aut oridades respons áveis pela educ aç ão e por out ros depart am ent os
minist eriais e adm inist rat ivos (trabalho, agric ult ura, saúde, inf orm aç ão,
com érc io, def es a etc.)
deveriam ser “mobiliz ados de modo efic az a fim de des empenharem seu papel
durant e a implem ent aç ão do plano de ação”.
223 S. Rass ekh, G. Vaideanu, Op. cit., p. 138, cit ando o pref ác io de Dr. F. Robaye,
tomo II, Taxonom ie des object ifs pédagogiques, B. S. Bloom (Mont réal, 1978).
224 Ibid., p. 228. As propost as cit adas são de Bert rand Russ ell.
225 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Final Report, Op. Cit., Unesc o, p. III 21.
226 Simpós io int ernac ional e mesa redonda, Qualit ies required of educ at ion today...,
Op. Cit., Unesc o, p. 53.
227 Congress o int ernac ional sobre a paz no espírit o dos hom ens. Cit aç ão final, Op.
cit., Unesc o, p. 81.
CONCLUSÃO
O papel da esc ola está em vias de ser radic alm ent e redef inido por meio de um
proc ess o ant idem oc rát ic o no qual as ref orm as são int roduz idas sub-rept ic iam ent e, sem
expor nada do que está nelas implíc it o e sem jam ais most rar nem sua lógic a nem sua
finalidade real: a “mudanç a” soc ial.
A esse respeit o, podem ser opost as dif erent es conc epç ões dess a
form aç ão [dos prof ess ores]: “acadêm ic a” (que enf at iz a a sólida aquis iç ão de
conhec im ent o da disc iplina); “prát ic a” (que dá mais import ânc ia à experiênc ia
como base da compet ênc ia pedagógic a); “tecnológic a” (na qual a efic ác ia do
ens ino é avaliada cient if ic am ent e); e “crít ic a” ou “soc ial” (na qual os
prof ess ores são cons iderados como os agent es da mudanç a na esc ola e na
soc iedade).228
Os elem ent os ess enc iais da revoluç ão psic opedagógic a são a revoluç ão étic a e a
revoluç ão cult ural na vis ão de mundo dos prof ess ores, a “inovaç ão” pedagógic a que
int roduz nas esc olas as técnic as de lavagem cerebral, a form aç ão inic ial e perm anent e dos
prof ess ores, a desc ent raliz aç ão do sist em a educ ac ional e a inf orm at iz aç ão do proc ess o de
avaliaç ão dos alunos. Todos ess es elem ent os est ão pres ent es nas ref orm as int roduz idas
ness es últ im os anos na Franç a, e ameaç am mudar radic alm ent e a finalidade de noss o
sist em a educ ac ional.
O fec ham ent o dos IUFMS, do CNDP, dos CRDPS, da INRP, a supress ão da form aç ão
cont inuada de prof ess ores e dem ais prof iss ionais do ens ino, o banim ent o das
psic opedagogias, o ret orno aos program as ant eriores etc, são também medidas a se tom ar
com urgênc ia. Da mesm a form a, o desm ant elam ent o (cois a bem mais delic ada) das redes
pedagógic as int ernac ionais deveria ser realiz ado, com eç ando-se por inf orm ar noss os
viz inhos acerc a dos perigos a que est ão expost os.
Teríam os afast ado, com isso, todo o perigo? O problem a é, na verdade, mais
vast o. Trat a-se da aplic aç ão das Ciênc ias Hum anas e Soc iais à revoluç ão, aplic aç ão esta
que não se lim it a apenas ao dom ínio do ens ino. Em part ic ular, as técnic as de
desc ent raliz aç ão e de engajam ent o de pess oal são bem conhec idas dos adm inist radores e
alc anç am, por seu int erm édio, um núm ero cons iderável de indivíduos. Tais técnic as
perm it em a int erioriz aç ão sim ult ânea de valores colet ivist as (trabalho em equipe) e de
valores liberais, mat erialist as e merc ant is (produt ividade, perf orm anc es). Mais ainda do
que sobre as noss as, é poss ível est im ar o impact o prodigios o que técnic as ass im podem
ter sobre as soc iedades do Terc eiro Mundo. Not em os, de pass agem, que ess as
obs ervaç ões coloc am em evidênc ia os movim ent os que agit am atualm ent e os meios
com unist as e o sindic alism o franc ês, divididos ent re def ens ores e advers ários do
engajam ent o, mediant e compens aç ão, de pess oal. Compreenda-se bem: o que de fato está
em jogo é algo muit o mais prof undo. Trat a-se da aceit aç ão ou da rec us a do modelo
cons ens ual globalist a, ass im como dos valores – dos cont eúdos lat ent es – que ele veic ula
e obriga a int erioriz ar. Trat a-se da aceit aç ão ou da rec us a de uma dit adura psic ológic a
ins idios a.
Da mesm a form a, se pôde compreender o seguint e: a out ra ameaç a provém das
inst it uiç ões int ernac ionais, cujo papel det erm inant e em mat éria de educ aç ão deixam os
claro. Most ram os também toda a import ânc ia que ess as inst it uiç ões dão à pesquis a e à
aplic aç ão das Ciênc ias Hum anas e Soc iais, cujo campo de atuaç ão est ende-se para além
do âmbit o do ens ino. Vim os também que ess as organiz aç ões conduz em uma polít ic a
revoluc ionária cript oc om unist a e globalist a. Além diss o, o seu papel cresc e a cada dia.
Será prec is o lembrar da conf erênc ia do Rio ou das negoc iaç ões do Gatt,229 para fic arm os
apenas com as mais espet ac ulares? Ins ens ivelm ent e, conf orm e aos princ ípios
menc heviques, o cent ro de dec is ão da polít ic a franc es a se desloc a em direç ão a out ros
lugares. Ins ens ivelm ent e, ess es novos cent ros de dec is ão est abelec em uma dit adura
psic ológic a mundial que nada deixa a des ejar ao Adm irável mundo novo; tampouc o a 1984.
A opress ão psic ológic a, da qual vim os os prim eiros sint om as, bas eia-se nas ideias
de Skinner sobre os modos de cont role “não avers ivos”, que não susc it am opos iç ão. Sendo
por isso mesm o dif íc il de combat er, ela deve ser inic ialm ent e desm asc arada e denunc iada,
most rando-se o que ela é: uma dit adura psic ológic a. Som ent e depois diss o, quando os
povos tenham tom ado consc iênc ia da malignidade dos proc ess os empregados cont ra eles,
para modif ic ar seus valores e sua psic ologia, para atent ar, enf im, cont ra o seu ser, só
ent ão a opos iç ão será poss ível.
Trat a-se, evident em ent e, de uma manobra polít ic a que deve, para traz er todas as
vant agens a seu lado, apoiar-se sobre todos os part idos polít ic os ligados ao respeit o pela
dem oc rac ia, pela liberdade e pela dignidade hum ana. Enquant o membro da soc iedade – que
não conf undim os com o Est ado –, apelam os a todos os part idos polít ic os para que
public am ent e tom em pos iç ão sobre essa quest ão que, não duvidem os diss o, const it ui um
dos des af ios mais import ant es dos próxim os anos. Apelam os ainda para que, ass im que o
poss am, atendam à urgênc ia das medidas que se impõem para dar cabo a esse proc ess o
tot alit ário.
Enf im, gost aríam os de nos dirigir a todos aqueles que, seguros de poss uir a
verdade e cegos o bast ant e para não duvidar da nobrez a de sua caus a, coloc am tant o
ardor revoluc ionário em lavar o cérebro de seus sem elhant es, em pôr fogo na ment e dos
hom ens, em neles inc ut ir a revolt a e em ult im ar a revoluç ão psic ológic a: est ão seguros de
que não faz em o jogo do advers ário? Est ão seguros de que ele não os conduz irá aonde não
querem ir?
228OCDE/CERI, La form at ion des ens eignants, Adendo ao CERI/CD(89)11, Paris,
OCDE, 1990, p. 10. Nota do Sec ret ariado da OCDE/CERI.
229Acordo Geral de Tarif as e Com érc io. Em inglês: General Agreem ent on Tariffs
and Trade – N. do T.
BIBLIOGRAFIA SELETIVA
Nós não ignoram os o tempo dispens ado para a maior part e de noss os leit ores.
Ass im, reduz irem os noss a bibliograf ia a uma únic a obra, capit al, que nos abriu os olhos
sobre a revoluç ão do sist em a educ ac ional americ ano e ao qual nós devem os muit o. Nós
rec om endam os enf at ic am ent e a leit ura dess a obra.
Beverly K. Eakm an, Educ at ion for the New World Order, Port land, Oregon, USA,
Halcyon Hous e, 1991. ISBN: 0-89420-278-2.
Essa obra pode ser enc om endada por int erm édio de uma livraria franc es a.
Maquiavel Pedagogo – ou o minist ério da ref orm a psic ológic a
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Ediç ão bras ileira aut oriz ada ao Inst it ut o Olavo de Carvalho pelo aut or.
1ª ediç ão – janeiro de 2013 - CEDET
Traduç ão:
Alexandre Müller Ribeiro
Revis ão:
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Revis ão de provas:
Tom Perroni
Bernardin, Pasc al
Maquiavel Pedagogo: ou o Minist ério da Ref orm a Pedagógic a / Pasc al Bernardin; Traduç ão
de Alexandre Müller Ribeiro
Tít ulo Original: Mac hiavel pédagogue ou Le Ministère de la réf orm e psyc hologique.
e-ISBN 978-85-67394-10-7
1. Cont role Soc ial 2. Psic ologia 3. Educ aç ão I. Pasc al Bernardin II. Tít ulo
CDD 303.3