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Vetos Kantianos:

A Critica da razão pura (1781): neste laborioso texto, Kant se depara com a disputa epistemológica
entre empirismo e racionalismo. O objetivo central do livro é, de certa forma, investigar o âmbito de
validade do conhecimento para poder, assim, demarcar com objetividade a aceitação de certas
disciplinas como a matemática a física e a metafísica no terreno dos conhecimentos científicos. Para
poder demarcar o campo científico e ver quais destas disciplinas são nele admitidas, Kant precisa
investigar as origens, a matriz do conhecimento em geral. Isso significa uma crítica da razão na medida
em que ele não busca rejeitar o uso da razão, mas sim investigar as condições de possibilidade do
conhecimento posto criticamente sob a ótica da razão pura. Se os empiristas acreditavam que o
conhecimento advinha dos sentidos, enquanto que os racionalistas defendiam que vinha da razão, Kant
irá propor um meio termo. O conhecimento não pode ir exclusivamente ou da razão ou dos sentidos,
mas antes de uma síntese entre os dados da razão e os dados dos sentidos. Assim, Kant argumenta no
livro que a Psicologia Racional não poderia estar na esfera das ciências, pois não obedece a estes
critérios sob os quais ele define o conhecimento.

O que era esta Psicologia Racional? Até o séc. XVIII, mediante as especulações de filósofos como
Descartes e Leibniz, Christian Wolff construiu um saber que atendia pelo nome de Psicologia Racional.
Este saber não possuía qualquer aplicação clínica e não se dedicava ao estudo de patologias ou de
diagnósticos. Era um saber que pretendia apenas tornar as faculdades da alma transparentes aos olhos
da razão. Isto é, significava provar a imortalidade da alma, descobrir a substância desta alma e alcançar
as evidências do um conhecimento de si interno. Contudo, Kant fala que esta Psicologia Racional não
pode se situar no domínio da objetividade científica, pois carecia de importantes critérios sustentados
pelo sujeito transcendental. Que critérios são estes? Simples, esta alma que se pretende estudar na
metafísica não pode estar no tempo nem no espaço, pois ela é interna a nós. Logo não faz sentido
investigarmos qual sua substância, pois apenas o que está no espaço e no tempo possui substância. E
em segundo lugar, esta alma não é passível de quantificação, logo ela não pode ser estudada
matematicamente. Como a matemática é o critério de objetividade para a filosofia kantiana, o estudo
desta alma, por carecer de matemática, não pode ser objetivo.

Já numa outra obra intitulada “Princípios metafísicos da ciência da natureza”, de 1786, Kant dedica uma
segunda crítica à psicologia, mas aqui se trata da psicologia empírica. A crítica é foca em três principais
pontos: 1) faltava um elemento de modo similar à química, para com isto efetuar análises e sínteses.
2)Deveria se facultar a este elemento um estudo objetivo, em que o sujeito e objeto não se misturem
como na introspecção. 3) deveria se produzir uma matematização mais avançada que a geometria da
linha reta, apta a dar conta das suceções temporais da nossa consciência (o sentido interno).

Assim, Kant faz três vetos tanto à psicologia racional quanto à empírica. Resumindo: falta à psicologia
um objeto, um método e uma matematização. Estas três faltas são os três vetos Kantianos e para se
fazer uma psicologia científica os pensadores posteriores a Kant terão de superar estes vetos kantianos.
Eventos da Fisiologia:
Com a ajuda da fisiologia sensorial do século XIX a psicologia supera os vetos kantianos.

v 1830 - Johans Miller:

Teoria das energias nervosas específicas: Cada nervo sensorial está vinculado a uma energia específica.
Os graus dessas energias são chamados sensações (ex: graduações de cor, tons auditivos_

SENSAÇÕES candidatos à superação da crítica de FALTA DE UNIDADE

v 1860 – Von Hemlholtz:

Acredita que o nosso mundo não é um mero caos de sensações mas sim uma experiência composta por
sensações conjugadas inconscientemente a partir de nossas experiências passadas. Desenvolve o
método da introspecção experimental, que consiste em um relato do sujeito experimentado a partir de
um treino prévio, aonde o objetivo é dissociar da percepção as experiências anteriores e tentar
descrever sensações puras.

INTROSPECÇÃO EXPERIMENTAL candidada à superação da crítica de FALTA DE OBJETIVIDADE

v 1860 – Fechner:

Acredita em uma concepção espiritualista de mundo e como cientista procura uma maneira de vincular
o mundo físico ao mundo espiritual através da ciência. Desenvolve a fórmula de Weber de cálculo das
diferenças apenas percebíveis (d.a.p.) e chega à formula S = k . logE aonde S = sensação e E=estímulo.
Com essa fórmula Fechner estabelece uma relação entre um variável psicológica e uma variável física.

A fórmula de Fechner é candidata à superação da crítica de falta de FORMALIZAÇÃO MATEMÁTICA.

O.A.P=a–b
b
Em meados do século XIX a fisiologia tinha em mãos fatores que resolveriam o problema da psicologia
empírica de Wolff. Em +- 1870 funda-se a psicologia científica, embasada nessas contribuições.

PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA DA EXPERIÊNCIA


Psicologia Clássica

A psicologia como ciência da experiência tem seu início com WilheimWundt que, ao perceber os
supracitados experimentos que estavam sendo feitos no campo da Fisiologia, os utilizou para fundar o
que foi reconhecida como a primeira Psicologia científica. Discutamos mais a fundo suas características.
Objeto: Experiência Imediata
Questão: Como se dá a experiência imediata?
Método: Introspecção Experimental
Modelo: Fisiologia Sensorial

A psicologia de Wundt (reconhecida como o Voluntarismo) era, portanto, calcada neste modelo de
Fisiologia que já abordamos acima. Essa prática se dará então a partir de um extenso trabalho sobre as
sensações (o objeto da superação dos vetos kantianos na visão de Wundt), utilizando o método da
introspecção experimental (que Wilheim vai reconhecer como um método para chegarmos a essas
sensações) e a fórmula elaborada por Fechner para conseguir matematizar seus experimentos. Podemos
afirmar que, em essência, o paradigma mais fundamental e que resume uma parte da prática de Wundt
(lembrando que o estudo dele vai além, o que culminará na chamada Psicologia dos Povos, mas isso não
é o mais relevante para a prova) é a Hipótese da Constância, ou seja:

E --> S

Experiência --> S

Que pode ser traduzido: para cada Estímulo do mundo físico há uma Sensação correspondente e,
portanto, a nossa experiência seria obrigatoriamente reduzida a essas sensações que são correlatas
necessárias de certos estímulos.

É claro que, ao passar do tempo, esse paradigma fundamental, assim como a proposta da psicologia
protagonizada por Wilheim Wundt serão postos em questão. Podemos explicitar três dessas críticas:

1. Psicologia do Ato

Protagonizada por Franz Brentano, essa crítica (que efetivamente é mais filosófica que qualquer coisa)
se dará no objeto da Psicologia Clássica (ou seja, a de Wundt). Dirá Brentano que ela não deve se focar
em meros objetos físicos e descrevê-los, disseca-los a partir de sensações. A Psicologia, em sua
percepção, deveria lidar com os Atos Intencionais da consciência, ou seja, como que ela se dá como
sendo consciência de alguma coisa. Os Atos Intencionais, ou seja, como a consciência se dá, se vira para
o mundo, e o percebe, isso sim que deveria ser objeto da Psicologia, e não simplesmente os objetos
físicos e sua descrição sensorial.

2. Escola de Wurzburgo
A crítica desta escola se dará de um jeito diferente, sendo um pouco mais prática. Ela atacará a Hipótese
da Constância diretamente a partir de seus experimentos, trazendo à tona algo que não se remeteria a
estímulos simplesmente: as funções da consciência.

Observando a Hipótese da Constância podemos afirmar que se os estímulos da minha experiência forem
os mesmos, ela sempre se dará da mesma forma já que os estímulos tem sempre uma sensação
correspondente, e não várias. A experiência, então, se conta com os mesmos estímulos não deve variar
de forma alguma. Os teóricos da escola de Wurzburgo discordam.

Através de seus experimento conhecido como “Pensamento sem Imagem”, esses teóricos irão mostrar
como que há como a experiência mudar sem que mudemos os estímulos: basta pedir para que a
consciência exerça alguma função. Se pedirmos, por exemplo, para uma pessoa decorar as sílabas sem
nexo LaMaDi, apagarmos este estímulo de um quadro negro e pedirmos para ela repetir o que estava
escrito ele demorará um tempo ‘x’. Porém, se pedirmos para que ela repita as sílabas só que ao
contrário veremos que ela demorará um tempo ‘y’. Ora, vão pensar os teóricos de Wurzburgo, se não
mudamos os estímulos, porque a experiência mudou? Se a Hipótese da Constância vigorasse o tempo
teria que ser igual pois os estímulos são iguais. O que vemos, entretanto, não corrobora com isso. Há
algo, então, que não se remete a um mero correlato de estímulo com uma sensação específica – as
funções da consciência exemplificam isso.

3. Christian Von Ehrenfels

Este psicólogo pertencente à escola de Graz atacará, assim como os teóricos da escola de Wurzburgo, a
Hipótese da Constância, mas o fará como que de um modo invertido.

Imaginemos uma música qualquer, como por exemplo ‘Garota de Ipanema’. A reconhecemos
perfeitamente em nosso dia-a-dia quando toca. O curioso para Ehrenfels é que se ouvirmos esta música
em um tom diferente, seja acima ou abaixo do normal, ainda reconheceremos a mesma música. O que
instiga o psicólogo de Graz é que, a partir de lógica da Psicologia Clássica, se mudamos todos os
estímulos ao diminuirmos ou aumentarmos o tom a experiência como um todo tinha que
obrigatoriamente ter mudado. Porém, não é isso que acontece: todos os estímulos mudam mas
reconhecemos a mesma música. Apesar de reconhecermos a mudança de tom, mantemos algo na
experiência que não muda com a diferença de estímulos.

Ehrenfels irá, então, propor que há algo em nossa experiência que não se resume a estímulos somente:
há algo que existe para além deles que dá um conjunto, uma totalidade, uma globalidade para a
experiência: a gestaltqualitaten, ou seja as qualidades da gestalt. Lembremos que esse conceito de
Gestalt que Ehrenfels propõe não é igual ao que os gestaltistas da escola de Berlim irão propor.
A partir desse conceito cunhado por Christian, outros teóricos de outras escolas irão teorizar sobre ele a
fim de construir um novo paradigma, diferente do da Hipótese da Constância. Destaquemos as três
principais:

1. Escola de Graz: aquela a qual Ehrenfels pertence. Irá apontar dois níveis de nossa experiência:
um inferior que seria composto, de qualquer jeito, pelas nossas sensações (não rompe com a Hipótese
da Constância) e outro superior que seria a gestaltqualitaten, ou seja, a gestalt – que seria organizada
pelo nosso intelecto.

2. Escola de Leipzig: rompe com a Hipótese da Constância afirmando que o que formariam a
gestalt seriam nossos sentimentos. Não embasam suas afirmações em experimentos ou teorias
empíricas, portanto não vigoraram.

3. Escola de Berlim: a escola que conseguirá propor um paradigma novo após romper com a
Hipótese da Constância. Estudemo-la mais a fundo:

Gestaltismo

Devemos primeiramente nos lembrar que quando ouvimos meramente ‘gestaltismo’ devemos
reconhecer a Escola de Berlim, pois foi esta que conseguiu efetivamente firmar um novo paradigma a
partir de novos problemas e modelos. Comecemos caracterizando-a:

Objeto: Experiência

Questão: Como se dá a experiência?

Método: Método Fenomênico

Modelo: Física Dinâmica

Devemos começar nossa compreensão do gestaltismo nos seus primórdios, ou seja, no que
efetivamente marcou a ruptura com o paradigma da Psicologia Clássica: o experimento do Phi-
Fenômeno por Max Wertheimer.

Consideremos duas bolinhas de luz, duas pequenas lâmpadas. Dependendo do tempo que
demorarmos para apagar uma e acender a outra podemos ter três tipos de resultado: no primeiro,
quando o tempo entre apagar uma e acender a outra é maior, vemos claramente uma acendendo,
apagando e a outra acendendo; no segundo, quando o tempo é muito pequeno, vemos as duas luzes
acesas ao mesmo tempo; no terceiro, entretanto, quando é um tempo entre os dois anteriores, vemos
algo de inusitado para Wertheimer: um ‘risco’ entre o apagar de uma luz e o acender da outra. Temos a
percepção de movimento da luz, que estaria passando de uma lâmpada para a outra. Ora, pensa
Wertheimer, que estímulo que temos para esta impressão de movimento (movimento aparente)? A
resposta é nenhum. Não há estímulo para essa sensação, ela provém de nossa experiência, de nossa
percepção. Se trata de uma ilusão de ótica que não se remeta a nenhum estímulo físico. O Phi-
Fenômeno vai além das críticas que já citamos pois vai mostrar como que há uma sensação (a de
movimento) que não vem de estímulos físicos, ou seja, não há um correlato para ela. Para conseguirem
ir além desta crítica, os gestaltistas buscaram na física dinâmica um novo modelo e novos paradigmas.
Elucidaremo-los a seguir, apontando especificamente as críticas ao modelo da Psicologia Clássica (os
preconceitos desta, como os gestaltistas dizem).

Primeiramente temos uma mudança entre Psicologia Clássica e Gestaltismo apontada logo no início
das caracterizações da última: o objeto. Enquanto que a Psicologia Clássica vai estabelecer a experiência
imediata como seu objeto, o Gestaltismo vai entender tal postulação como um preconceito. Para o
Gestaltismo, no plano psicológico só há a experiência, e o que importa é o estudo de suas condições de
possibilidade, independente desta ser produzida em um laboratório ou no nosso cotidiano. Por isso que
dizemos que o objeto desta psicologia é simplesmente a experiência, assim como essa se dá e é
organizada pelas leis da gestalt.

Outra mudança fundamental entre Psicologia Clássica e Gestaltismo é a do método: enquanto que a
primeira vai adotar a introspecção experimental, a última vai entender, novamente, que isto se trata de
um preconceito fisiológico, pois os sujeitos da experiência tinham que ser treinados para poder
participar dela. “O gestaltismo propõe em contrapartida outra metodologia: o método fenomênico. Aqui
o controle não é mais feito sobre o próprio sujeito, mas sobre as condições experimentais que são
apresentadas aos sujeitos, como as disposições perceptivas. Do sujeito se espera a sua descrição mais
pura, seja a de um adulto ou criança; de um indivíduo normal ou deficiente; civilizado ou primitivo;
homem ou animal. Com isso a psicologia pode sair da exclusividade do estudo dos indivíduos adultos,
normais, civilizados e treinados”. O laboratório, enfim, podia ser habitado por qualquer pessoa pois a
organização da experiência se daria sempre do mesmo jeito.

Quanto ao modelo, o Gestaltismo vai buscar na física dinâmica explicações que envolvem campo e
equilíbrio para fundamentar sua teoria das leis da gestalt, conseguindo assim uma base firme para erigir
um novo paradigma.

OBS: devemos lembrar sempre que quando falamos corriqueiramente de gestalt estamos tratando do
conceito que foi trabalho pela Escola de Berlim, e não o que Ehrenfels e a Escola de Graz criou, que seria
uma atividade intelectual. A gestalt de Berlim, a mais conhecida, é aquela que tem sua estruturação já
dada, intrínseca à percepção e que respeita as leis da gestalt.

Projeto de Psicologia como Ciência e Técnica da Adaptação

O Funcionalismo
O Funcionalismo, corrente de Psicologia em alta nos Estados Unidos no fim do século XIX e início do
século XX, se encaixa dentro das propostas de projeto de Psicologia como Ciência e Técnica da
Adaptação. Suas principais inspirações filosóficas podem ser traçadas no Pragmatismo, e seu contexto
histórico se remete ao Liberalismo. Um dos grandes nomes do Funcionalismo é Willian James, filósofo
que desenvolveu tanto ideias do Funcionalismo como do Pragmatismo em si.

Da importância do Liberalismo

O Liberalismo é um importante fator a se considerar quando se volta para o estudo do Funcionalismo,


tendo em vista que era uma importante forma de se governar nos Estados Unidos. Tal ideia se torna
importante quando o Funcionalismo se insere num paradigma mais adaptativo, e o Liberalismo pregava,
dentre outras formas de pensamento, a ideia de que o indivíduo deve ser gerido de acordo com a sua
liberdade individual. O funcionalismo, portanto, beberá desta fonte futuramente, pregando que se deve
gerir a natureza do indivíduo em prol de garantir sua liberdade, sempre respeitando esta natureza.

Da importância do Pragmatismo

O Pragmatismo foi uma importante corrente filosófica nos Estados Unidos, e foi iniciada por Charles
Peirce. Peirce pretendia utilizar o Pragmatismo como um modo de se pensar a prática da ciência, e deste
modo analisar quais e tais ideias intelectuais poderiam ser utilizadas como hipóteses testáveis de fato.
Willian James bebeu desta fonte ao aproveitar o lado “prático” do Pragmatismo de Peirce, mas expandiu
sua atuação para a análise de qualquer ideia e de sua validade, se focando no seu valor prático, de
utilidade. Cisões e diferenças à parte, o importante do Pragmatismo de James para o Funcionalismo é
como este modo de fazer filosofia encara o que é verdadeiro como o que funciona na prática,
analisando as consequências dessa ideia para verificar sua validade ou não. Desta forma, o
Funcionalismo analisará a mente não em si mesma, mas enquanto seus efeitos práticos e como ela nos
conduz a uma forma de adaptação perante as situações que se apresentam a nós.

O Funcionalismo

O foco do Funcionalismo é a Ação. Como dito anteriormente, a Ação é o meio de se estudar a mente, de
modo que esta Ação se dá de forma adaptativa em nossas vidas. Esta análise da consciência em ação irá
influenciar, por exemplo, a prática escolar, quando inspirará o movimento a Escola Nova, uma espécie
de reforma pedagógica alicerçada nos estudos funcionalistas. A consciência só surge quando estamos a
resolver um problema, e ela nos conduz à solução deste. Logo, um bom professor é aquele que, ao
ensinar, propõe bons problemas para serem solucionados, despertando a consciência e a inteligência
dos alunos.

Das outras influências para o Funcionalismo

O Funcionalismo ainda foi influenciado por outras fontes, como a Psicologia Comparada e a Diferencial.
Enquanto a primeira se valia de estudando homens e animais (tal qual a biologia e os estudos de
morfologia) e comparando seus estados mentais (por exemplo, Romanes ao investigar o relato de
colonizadores e comparar seus estados mentais com o de animais), a segunda irá estudar as diferenças
entre as capacidades mentais, e não apenas os estados mentais, tendo em Francis Galton um expoente,
que estudava tanto a mente pelos seus princípios e leis universais bem como pelas diferenças mentais
entre as pessoas. Estas psicologias influenciarão o Funcionalismo, que toma de empréstimo seus
métodos e passará a não apenas estudar a adaptação por meio da Ação, mas sim a promove-la com suas
técnicas.

Projeto de Psicologia como Ciência e Técnica da Adaptação: Funcionalismo

Objeto: Consciência em Ação

Objetivo: Como se dá a Adaptação

Método: Introspecção / Psicologias Comparada e Diferencial

Modelo: Biologia

O Behaviorismo

O Behaviorismo foi uma corrente de Psicologia que veio em grande parte das mesmas ideias e
inspirações do Funcionalismo, mas desenvolveu-se em parte como crítica a esta escola anterior e erigiu-
se sob um mesmo Modelo (o da Biologia), mas com uma proposta bastante diferente. Iniciado por John
Watson, um funcionalista, se constituirá como uma das grandes formas de psicologia a criticar os
métodos considerados não científicos desta. Tem também como expoente tardio Skinner, que
desenvolverá seu trabalho em cima do projeto de Watson, mas particularizando-o de formas específicas.

Behaviorismo Metodológico

Watson era um funcionalista, mas que, por diversas vezes, notou inconsistências nas teorizações do
Funcionalismo. Os principais problemas que encontrava estavam na questão metodológica de análise da
consciência enquanto ente que só podia ser observado durante uma ação do indivíduo. Watson
sustentava que, se a consciência só pode ser observada durante a ação, é portanto ocasional, e não
constante. Também se configurava como inatingível, pois só podia ser acessada por intermédio da Ação,
e não acessada em si mesma, diretamente. Desta forma, sugeriu uma nova forma de encarar o estudo
da adaptação do indivíduo, fazendo um pequeno desvio metodológico onde não mais a consciência ou a
mente seriam estudadas, mas o corpo, que era o único ente acessível do processo. Há uma nuance a ser
apontada: Watson, neste momento, não nega a existência da consciência, mas apenas propõe que se
deixe ela de lado, pois, na prática, é possível pular a etapa onde ela aparece, já que a única coisa
acessível de fato é o corpo, que age em nossa adaptação, e não a mente/consciência.

Behaviorismo Ontológico

O Behaviorismo Ontológico se configura quando, no cenário da Psicologia mundial, acontece uma série
de casos e estudos diversos que fomentaram uma nova inspiração para Watson. Passando brevemente
em revista, temos os casos de Lloyd Morgan, Pfungst, Thorndike e Pavlov.

Lloyd Morgan, Pfungst e Clever Hans


Morgan advogava que as explicações para o comportamento animal na época se valiam de maneiras
muito complexas na hora de fornecer justificativas plausíveis para os atos dos animais. Essa crítica toma
força justamente com o caso estudado por Pfungst, que fora convocado a estudar o caso de Clever Hans
(Hans, o Malandro, em tradução livre), um cavalo creditado por saber contar os dias da semana, bem
como realizar operações aritméticas mais simples. Pfungst estudou o animal e percebeu que este, ao
invés de realmente saber fazer contas ou contar o dia da semana (ou ainda estar possuído por algum
tipo de espírito, explicação corrente na época para casos inexplicáveis), apenas “lia” o comportamento
das pessoas que se aproximavam dele. Ao perguntarem o dia da semana, o bater de cascos do cavalo
era modulado pela percepção dele de como a pessoa reagia à proximidade de acerto, e parava os
toques no momento aproximadamente certo, que fora denunciado pela pessoa. A aparente futilidade
do caso reforça a crítica de Morgan, onde Hans não era um cavalo inteligente, apenas “malandro”,
sendo a complexidade de seu comportamento creditada às teorias da época.

Thorndike e a Lei do Efeito

Ainda no ensejo das inspirações para o desenvolvimento do Behaviorismo Ontológico, temos Thorndike,
que, ao realizar um estudo com gatos presos numa gaiola em estado de privação (com fome e sede),
constata que estes, em busca de livrarem-se de sua prisão, realizam diversos comportamentos até que,
ao acaso, um dos comportamentos (por exemplo, se debater na jaula) ocasionava a abertura da porta.
Este comportamento que ao acaso resolveu um problema será recordado pelo animal em ocasiões
semelhantes, e a este princípio é dado o nome de Lei do Efeito. Esta lei afasta novamente a importância
da consciência na resolução de problemas, já que o acaso foi quem solucionou o mistério de como abrir
a porta, e não a mente do animal.

Pavlov e a Reflexologia

Por fim, temos o estudo de Pavlov, um reflexólogo russo que estudava os esquemas de estímulo-
resposta. Seu clássico experimento envolveu cães em estado de privação que eram apresentados a um
naco de carne acompanhado de um toque de um sino. Toda vez que os cães viam a carne, salivavam
devido à fome, e constatou-se que, com o tempo, eles associaram o toque do sino com o pedaço de
carne. Culminou-se numa situação onde bastava o toque do sino para se eliciar dos animais a salivação.
Os cães parearam o estímulo condicionado (carne) ao estímulo incondicionado (toque do sino) na hora
da produção da resposta (salivação). Portanto, o estímulo incondicionado (toque do sino) era o
suficiente para conseguir a resposta (salivação). Novamente percebemos como a mente se afasta das
explicações dos comportamentos dos animais, agora pelas vias da reflexologia e da fisiologia.

Com este cenário configurado, em 1913 Watson publica uma espécie de manifesto que propõe o
abandono da consciência como foco de estudos. Em 1919 Watson publica um segundo manifesto, desta
vez afirmando que a consciência e a mente são apenas comportamentos. Nota-se portanto a diferença
entre a proposta Behaviorista inicial e esta, onde, agora, mente e consciência não são apenas deixadas
de lado, mas negadas categoricamente. Este é, sobretudo, um estado do Behaviorismo onde ele se
configura de forma materialista.

Behaviorismo Radical
O Behaviorismo Radical foi proposto por BurrhusFrederic Skinner, um behaviorista tardio que irá propor
novas formas de conceber o Behaviorismo. Skinner ficou famoso por fazer a distinção entre
condicionamento reflexo (de inspiração pavloviana) e o operante, que envolvia o condicionamento de
comportamentos até então sem “motivo” (como, por exemplo, levantar aleatoriamente um braço,
diferente da salivação, que era biológica). Também foi forte em sua teoria a introdução de uma terceira
variável no famoso esquema E -> R behaviorista (estímulo – resposta), o Reforço, sendo este aquilo que
aumenta a probabilidade de ocorrência do comportamento reforçado. É importante ressaltar que
Skinner não nega a existência da mente, tal qual Watson no segundo momento de seu projeto de
Behaviorismo, mas sim propõe alternativas para a concepção mentalista (existência de uma
mente/consciência).

Skinner irá pensar de modo a evitar essa concepção mentalista, relegando às contingências ambientais
boa parte dessas explicações. Posteriormente, após receber duras críticas à importância das
contingências, irá propor a ideia do Comportamento Verbal. Este nos diferencia dos animais, não só
servindo como forma de agir pelos outros (ordens), mas também descrevendo o ambiente à nossa volta
(o que ele chama de “Tato”) e ainda agindo como um reforçador das condutas. Vemos que o
Behaviorismo de Skinner se mantém com a temática da Adaptação, tal qual o Funcionalismo, mas saindo
da ideia de uma Ação transcendente que vem da Consciência e entrando na ideia de uma Ação que vem
de um comportamento interno, o Comportamento Verbal.

Projeto de Psicologia como Ciência e Técnica da Adaptação: Behaviorismo

Objeto: Comportamento

Objetivo: Como se constitui o comportamento / Como moldá-lo

Método: Observação / Comparação / Diferenciação de Comportamentos

Modelo: Biologia (Adaptação)

Das Técnicas de Governo de Si

Podemos notar que, nesta breve exposição da Psicologia como Ciência e Técnica da Adaptação, houve
uma forte importância do tema da Adaptação do indivíduo à uma situação. Seja pelas vias do
Liberalismo, que visa gerir a conduta dos indivíduos pela sua liberdade e através da sua própria natureza,
seja por beber de fontes da Biologia e da Teoria da Evolução das Espécies de Charles Darwin, notamos
como se torna um problema gerir e adaptar as condutas das pessoas.

Observamos, portanto, que tanto o Funcionalismo como o Behaviorismo se constituem como Técnicas
de Governo de Si, no momento em que se preocupam em conduzir as condutas dos indivíduos de modo
que estes se adaptem melhor (seja no contexto da Escola Nova da época do Funcionalismo, seja com
Skinner e seus esquema de reforçamento). Mais ainda, o Behaviorismo se mostra como o auge destas
técnicas, visando por fim um Auto-Governo dos indivíduos em suas próprias vidas.

EPISTEMOLOGIA GENÉTICA
Contexto: O solo histórico no qual se sedimentou o pensamento psicológico de Jean Piaget corresponde
a um período de desenvolvimento inspirado tanto pela biologia quanto pelo funcionalismo. Formado na
Faculdade de ciências Naturais da Universidade de Neuchâtel, Piaget obteve seu doutorado em Zoologia
em 1918, o que indica um profundo interesse pelas ciências naturais. Contudo, para muito além de
qualquer abordagem naturalista, o percurso de amadurecimento do seu pensamento indicou tanto um
contato com a psicanálise (foi aluno de Bleuler e Jung) quanto com a pedagogia e psicologia francesa
(atuou no laboratório de Binet e trabalho com Henri Piéron, por exemplo). Assim indicamos que o
projeto empreendido por Piaget não só buscou inspiração em diferentes campos, como também
dialogou com diferentes esferas da psicologia. Em 1921 foi convidado a atuar no Instituto Jean-Jaques
Rousseau e em 1955 na Faculdade de Ciências Naturais em Genebra funda-se o Centro Internacional de
Epistemologia Genética.

A Epistemologia Genética pode ser entendida, de certa forma, como herdeira do funcionalismo em solo
europeu. Já este, o funcionalismo, pode ser descrito como um protesto contra a psicologia da
consciência voltada para o estudo da estrutura da mente e defendida por Wundt; pois focaliza no
funcionamento da mente e o seu papel na adaptação do organismo ao ambiente. A ênfase que se
colocava no papel ativo do organismo sobre o ambiente indica uma tomada de posição em relação às
outras possíveis abordagens propostas na época. Pois indica uma rejeição tanto da perspectiva inatista
(como aquela que existe no gestaltismo), que atribui a organização da experiência psicológica à
estruturas determinadas a priori, quanto ao ambientalismo próprio do Behaviorismo, que atribui todo
desenvolvimento e aprendizagem a um condicionamento imposto pelo meio.

Piaget buscou esclarecer a pergunta “o que possibilita o conhecimento?” indicando uma terceira via que
não redundava nas propostas inatistas ou ambientalistas. Ele indicou o papel da ação do indivíduo no
meio, mostrando tanto a transformação deste quando daquele. Isto é, o indivíduo, com seu movimento
espontâneo sobre o mundo, modifica tanto o ambiente quanto a si mesmo. Uma abordagem
epistemológica se incide sobre a questão do “conhecimento”, contudo o conhecimento que Piaget se
propõem estudar é aquele que se edifica pela atividade individual do sujeito no mundo; daí a proposta
de focar numa ontogenia (história individual) ao invés de uma filogenia (história da espécie).

“Esta tradição europeia busca explicar os fenômenos psicológicos do ponto de vista genético-funcional,
ou seja, pela qual as estruturas mentais são construídas a partir de uma gênese na história do sujeito
psicológico e da ação como um processo de adaptação. Esta ação não é unilateral, mas circular e
interacionista, e nela ambiente e organismo, sujeito e objeto se determinam reciprocamente.” (pag 111.
Pluralidade)

Teoria: Uma vez já tendo entendido o contexto no qual se posicionou Piaget, devemos agora elucidar os
principais conceitos que esclarecem essa interação do indivíduo no meio durante a maturação e
desenvolvimento do seu aparelho cognitivo e do psiquismo.

Para explicar o tal movimento, Piaget propõem a tese de que os mecanismo cognitivos constituem
simultaneamente a resultante dos processos autorreguladores gerais da organização viva e os órgãos
especializados da regulação nas trocas com o meio. Essas trocas com o meio, por sua vez, são
determinadas por três leis fundamentais: Assimilação, acomodação e equilibração.

Assimilação: corresponde ao processo cognitivo de colocar (classificar) novos eventos em esquemas


existentes. É a incorporação de elementos do meio externo (objeto, acontecimento, ...) a um esquema
ou estrutura do sujeito. Noutras palavras, é o processo pelo qual o indivíduo cognitivamente capta o
ambiente e o organiza possibilitando, assim, a ampliação de seus esquemas. Na assimilação o indivíduo
usa as estruturas que já possui.

Acomodação: É a modificação de um esquema ou de uma estrutura em função das particularidades do


objeto a ser assimilado.

A acomodação pode ser de duas formas, visto que se pode ter duas alternativas:

Criar um novo esquema no qual se possa encaixar o novo estímulo, ou

Modificar um já existente de modo que o estímulo possa ser incluído nele.

Após ter havido a acomodação, a criança tenta novamente encaixar o estímulo no esquema e aí ocorre a
assimilação.

Por isso, a acomodação não é determinada pelo objeto e sim pela atividade do sujeito sobre este, para
tentar assimilá-lo.

O balanço entre assimilação e acomodação é chamado de adaptação.

Equlibração: Corresponde à tendência autorreguladora para a conservação de equilíbrio com o meio.


Assim, diante de uma situação problema, o organismo vivo tende a se reequilibrar com o meio mediante
os processos de assimilação ou acomodação para a resolução do problema.

Assim, Assimilação e acomodação são mecanismos complementares, não havendo assimilação sem
acomodação, e vice-versa. A adaptação do sujeito ocorre através da equilibração entre esses dois
mecanismos, não se tratando, porém, de um equilíbrio estático, mas sim essencialmente ativo e
dinâmico.

Contudo, a maturação do aparelho cognitivo ocorre em etapas, cada uma correspondendo ao nível de
desenvolvimento individual. Piaget aponta dois conceitos para explicar o funcionamento da cognição
humana: esquemas e operações.

Esquemas: corresponde àquilo que numa ação é transponível e generalizável de uma situação para a
seguinte. Ou seja, o que há de comum nas diversas repetições e aplicações da mesma ação. (o ato de
escrever, por exemplo, pressupõem um esquema).
Operações: já as operações correspondem aos estágios de maturação da cognição e da inteligência. Eles
são quatro: sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e operatório formal.

“Piaget busca demosntrar, em primeiro lugar, que a inteligência é constituída de um conjunto de


esquemas de conhecimento do real progressivamente construídos a partir da atividade do sujeito sobre
o ambiente. (...) Assim, cada novo objeto a ser conhecido pelo sujeito passa a ser assimilado, isto é, o
sujeito aplica nele os esquemas já adquiridos anteriormente. Ao sentir a resist~encia do objeto o sujeito
acomoda os esquemas anteriores, isto é, adapta-se às características do novo objeto. Esse processo
resulta em uma nova equilibração, ou seja, o novo esquema, construído na relação sujeito-objeto, é
então incorporado à estrutura anterior do sujeito.” (pag 251)

Objeto: o conhecimento e inteligência

Objetivo: entender a gêneses dos processos cognitivos e da inteligência

Método: experimentação clínica

Modelo: Funcionalismo adaptativo e Biologia

CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS DA COGNIÇÃO


Cenário: gestaltismo fraco; construtivismo, clínica e principalmente behaviorismo: fortes.

1950 - Revolução cognitivista: O projeto pretende retomar o que havia deixa de fora da abordagem da
época: a MENTE
O conceito de mente é reabilitado pois algo se empõe como mais forte perante as críticas sofridas pelo
behaviorismo: a invenção do computador, uma inteligência artificial, é patrocinador da revolução
cognitivista.
Até então não se estudava a mente e a cognição humana pois isso não era algo objetivo como o estudo
do comportamento oferecia. Quando se constrói uma máquina que reproduz atividades mentais
humana, questiona-se a subjetividade insuperável atribuída à mente.
O que é tomado como marca do pensamento? A lógica. A lógica matemática rege o funcionamento do
computador e esse é tido como um simulador da mente.
Projeto da psicologia enquanto ciências e tecnologias da cognição:

Objeto: Cognição
Questão: Como se dá o processamento de informação?
Método: Simulação computacional/ outros
Modelo: Computacional/ outros

v COGNITIVISTAS (Chomsky, Fodor)


Nos anos 60 havia uma forte crença de que o computação se desenvolviria de modo a dar conta de
tudas as funções mentais. Portanto, fazem uma associação strictu sensu entre a cognição humana e o
funcionamento do computador.

Teoria da modularidade da mente: Concepção de que ela é composta por uma série de módulos/
programas fechados/encapsulados, que organizam linearmente informações provindas dos nossos
sentidos em informação processada (objetos, linguagem, etc). Esses módulos são inatos e não evoluem
ou modificam-se no decorrer da experiência.
Entendem a mente a partir de um modelo computacional

Teoria das redes neurais(McCulloch, Pittis): Supõs que o funcionamento cerebral não é composto por
módulos fechados de processamento linear, mas de um processamento em rede. A informação é
melhor processada em modelos abertos, integrados. É um modelo flexível, há vários caminhos de
processamento diferentes. A mente seria composta por redes neurais. Essas redes não são pré-
determinadas, como no modelo anterior, mas se constróem ao longo da vida a partir de alguns termos
básicos.

TEORIA DA ENAÇÃO OU AUTOPOIESIS (Varela): Diz que para além dos módulos ou de redes neurais
existe uma realidade fora de nosso organismo que não é independente dele, organismo e meio não são
entidades diferenciadas. O desenvolvimento de um indivíduo não é somente o de sua estrutura orgânica,
mas também do seu mundo ao redor.
Acoplamento Estrutural: Organismo e meio são termos secundários, pois existe anteriormente um
acoplamento e o indivíduo é efeito desse. Nós produzimos um mundo “externo” pelas coordenações de
nossas ações, mas não existe uma dimensão independente “lá fora”.
Existe uma deriva natural: O meu acoplamento com o mundo se transforma. O conhecimento está na
relação entre organismo e meio. O organismo não cresce perante ao meio e sim concomitantemente. O
organismo se transforma ao mesmo passo em que o mundo se transforma.
Passam a entender de uma maneira distinta o que é vida e o que é cognição. Enquanto se está
adaptado se tem um conhecimento do mundo. A cognição e a adaptação são termos da relação.

PSICANÁLISE
Contexto: Nos séculos XVII e XVIII vemos um saber sobre a loucura baseada em formulações
taxonômicas (uma medicina classificatória). Assim ela se encontra no mesmo domínio das demais
doenças: no corpo. Ela é uma doença dos nervos; isto é, ela ainda não é avaliada como uma doença
mental, mas antes como um anomalia nos nervos que impede o paciente de representar o mundo tal
como ele o é.

No séc. XIX, vemos a loucura se configurar num âmbito diferente do corporal. Surge aqui o conceito de
alienismo: uma alienação do sujeito que se refere eminentemente ao campo do mental. Assim o
tratamento do louco passa a se modular por uma série de técnicas diversas daquelas dos séculos
anteriores. Surgem os asilos com seus tratamentos morais, um espaço dedicado à manifestação da
loucura na sua verdade na qual o delírio se apresenta manipulado pelo psiquiatra visando uma correção
moral do comportamento do louco. Encontramos exemplos deste tipo de abordagem nos trabalhos de
Pinel e Esquirol.

Porém, paralelo ao advento do alienismo, temos na virada do séc. XVIII para o séc. XIX o surgimento da
anatomia clínica e da medicina moderna, que postulava que toda doença decorria de alguma lesão
tissular (lesão do tecido). Haveria em toda e qualquer doença um componente orgânico. È neste cenário
que se configura a psiquiatria organicista do séc. XIX que vai buscar uma série de métodos e teorias para
ancorar na loucura um fundamento orgânico e substancial. Contudo, temos aqui três figuras centrais
que buscaram mostrar, contra a psiquiatria organicista, que há uma impossibilidade de se fundamentar
a loucura num substrato orgânico:

Teorias:

Morel e a teoria da Degenerescência: A substancialidade da loucura passa a pertencer ao âmbito


familiar. Isto é, procura-se na família uma causa embrionária para a loucura. Assim, através do
interrogatório, recorria-se às lembranças infantis no sentido de encontrar nelas qualquer marca que
indicasse uma predisposição à loucura. Seriam lembranças tanto individuais quanto referentes à família.
EX: caso de “monomania assassina”: o “torcer repolhos na infância” como um traço que indicaria um
predisposição ao assacinato.

Moreau de Tours: Utilizava-se uso de drogas, como haxixe, para produzir um si mesmo os sintomas da
loucura e poder, assim, descrever um saber direto sobre a loucura (em oposição ás práticas indiretas,
como interrogatório ou observação). A loucura seria aqui produzida experimentalmente e tal “produção”
não dependeria apenas do uso de drogas, mas os próprios sonhos seriam uma expressão dessa
experiência. Assim o sonho também reproduz as mesmas características da loucura.

Charcot e a Teoria do Trauma: as doenças remetidas ás lesões orgânicas apresentavam uma


sintomatologia regular. Já as doenças, como neuroses, não. Elas apresentavam uma irregularidade
quanto aos seus sintomas. A histeria está dentro desta esfera. Charcot busca demonstrar como a
histeria carecia de uma lesão anatômico-tissular. Isto é, não haveria uma causa orgânica para sua
manifestação. Contudo, com o uso da hipnose, ele conseguiu mostrar a existência de uma regularidade
na histeria. Mas o que estaria na base desses sintomas seria um acontecimento traumático que levaria a
perturbação dos instintos.
O médico então, pede para que o paciente em estado hipnótico narre sua história pessoal para
identificar o momento traumático responsável pela histeria. Depois disso, ainda em estado hipnótico, o
paciente teria seu sintoma erradicado pelo médico. Isto é, o médico se demonstraria capaz de
reproduzir uma regularidade sintomática no paciente hipnotizado.

Charcot nota que haveria nos casos traumáticos componentes sexuais que desempenhariam um papel
importante para o trauma. Porém, hesitando diante de tal conclusão, ele tende a se afastar de tais
conclusões. Tais constatações serão retomadas por Freud.

Psicanálise:

Inicialmente Freud acolhe o método hipnótico e a teoria do trauma de Charcot, porém a serviço do
método catártico. Este corresponde à suposição de que o momento do trauma será carregado de uma
descarga afetiva que se conserva na lembrança do ocorrido. Tal lembrança seria afastada da esfera
consciente e, como parte da terapia, buscaria se fazer o paciente relembrar do trauma para revive-lo
promovendo, então, uma ab-reação do afeto. Todo afeto encapsulado e latente teria um descarga
abrupta caracterizada como catarse.

Entretanto Freud abandona a hipnose com a justificativa de que nem todos os pacientes seriam
hipnotizáveis e que, alem disso, a hipnose seria o sintoma apenas momentaneamente. Ele passa a dotar
então o método da associação livre. Esta, ainda dentro do modelo catártico, consistiria em dar voz ao
paciente para que este pudesse manifestar sua loucura de forma livre e pelo discurso poder reviver o
trauma reprimido numa ab-reação.

Somente ao abandonar a hipnose Freud concebe a ideia de resistência: mecanismos de defesa pelos
quais os pacientes tendem a negar ou contornar suas ideias reprimidas. Tal resistência ficou óbvia para
Freud quando este percebeu a dificuldade de suas pacientes em se aproximar das cenas infantis dos
acontecimentos traumáticos. Outro problema foi o surgimento da figura do “pai perverso” dos relatos
das suas pacientes o que o levou a supor uma não correspondência entre o real e o dito. Isto é, ou Viena
estaria abarrotada de “pais pedófilos” ou o discurso das pacientes estaria impregnado de uma fantasia.

O que aparece em jogo então era a realidade da fantasia narrada. Não se trata mais de referencia a fala
a um acontecimento real, mas antes de poder tratar os sentimentos que se evidenciam pelo discurso. O
próprio discurso, por mais fantasioso que seja, ele tem sua própria realidade narrativa. Não se trataria
mais de promover uma catarse, mas sim, de poder proporcionar um trabalho elaborativo a partir das
representações do sujeito.

O método catártico só será abandonado com o abandono da teoria do trauma. Pois, aqui, vemos Freud
questionar a ocorrência real do trauma. O trauma não ocorre no real, mas sim num outro plano que se
efetiva pela narração do sujeito.

A fantasia estaria relacionada a um desejo inconsciente. Temos aqui uma substituição da teoria do
trauma por uma nova teoria do desejo. O desejo encontrará formas tortuosas de manifestação: os
sonhos. Freud afirma que só podemos falar de uma sexualidade infantil se deslocarmos o entendimento
da sexualidade de um modelo genital pautado num instinto de reprodução para um modelo pulsional
pautado na busca por satisfação.

Resumo:

1) Substituição de uma teoria do trauma por uma do desejo.

2) Substituição da noção de instinto por uma de pulsão

3) Substituição do método de hipnose para um de associação livre.

4) A teoria da degenerescência, que indicava uma causa na infância para a ocorrência da loucura, passa
para uma exploração dos fatores constitutivos do sujeito que tem suas bases na sexualidade infantil.

5) Há uma passagem do método de entrevista psiquiátrica como o interrogatório de Morel para o


método da associação livre.

O sonho, argumentado por Moreau de Tours como experiência de loucura, vira espaço para
interpretação dos desejos inconscientes.

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